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segunda-feira, 15 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22009: Notas de leitura (1347): "A Batalha do Quitafine", por José Francisco Nico; edição de autor, 2020 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Março de 2021:

Queridos amigos,
 
O livro do General José Francisco Nico relata o conjunto de missões que conduziram ao aniquilamento da artilharia antiaérea do PAIGC na península de Quitafine. O autor aparece munido de credenciada documentação e testemunhos apropriados. A descrição de tudo quanto vai acontecer em 1968, ficará para o próximo texto. 

O General Nico não se circunscreve à problemática da Força Aérea, tece juízos negativos ao modo como se pôs termo à guerra colonial e aos consequentes atropelos à dignidade humana ocorridos na descolonização. Talvez mal informado quanto ao modo como se conduzia a guerra no solo, tece considerações quanto à presença do PAIGC em bases, e fala no título da própria obra na fantasia das áreas libertadas. 

Bem documentado sobre o que se passa na Força Aérea, talvez não tenha tido tempo para ler a Resenha das Campanhas de África, edição do Estado-Maior do Exército, no que tange à Guiné, quando a ler ficará seguramente surpreendido, pois além dos abastecimentos provindos da Guiné Conacri e do Senegal havia bases que podiam ser destruídas num dia e eram reconstruídas noutro, faz parte da essência das guerras de guerrilha, a generalidade da população aceitava esta dolorosíssima guerra do jogo, como ficou comprovado.
 
É a permanente tendência de confundir a nuvem com Juno, a árvore com a floresta.

Um abraço do
Mário



Memórias da destruição da artilharia antiaérea do PAIGC, na península do Quitafine (1)

Mário Beja Santos

Trata-se de uma edição de autor, a segunda, com data de novembro de 2020. Esta obra do Tenente-General Piloto-Aviador José Francisco Fernandes Nico encerra volumosas considerações sobre estratégia político-militar de guerrilha e contraguerrilha, tece considerações altamente críticas sobre os acontecimentos do 25 de Abril e o processo da descolonização e dá-nos um quadro das diferentes operações que decorreram entre outubro de 1967 e janeiro de 1970 que levaram à eliminação sistemática da artilharia antiaérea do PAIGC pela Esquadra 121 do Grupo Operacional 1201. 

O autor observa na introdução que ainda se verificaram episódios isolados do emprego deste tipo de artilharia, passados em Gandembel (28 de julho de 1968) no ataque a Ganturé (6 de janeiro de 1969) e em Sare Morso (1 de julho de 1970), referindo que depois deste último episódio não se verificaram novas ocorrências até ao aparecimento, em março de 1973, dos mísseis Strela-2.



Inicia o seu livro com o que ele chama confronto de assimetrias, no caso o isolamento político português que não aceitava negociações com os movimentos de libertação e as vantagens que o PAIGC detinha dada a natureza dos apoios que recebia. Em muitas das suas declarações o autor está próximo das tomadas de posição sustentadas pelo regime de Salazar e Caetano, diz abertamente que Portugal tinha uma visão para o futuro dos seus territórios que passava por uma comunidade multirracial alicerçada numa interação histórica. 

Não esquece de mencionar que havia portugueses aliados dos movimentos de libertação, o MFA era liderado por oficiais com ligações aos movimentos oposicionistas e, em particular, com ligações ao PCP. Nunca se compromete com o que teria sido um desfecho promissor para as independências das colónias, apresenta explicações miríficas, que talvez tivessem cabimento no caso de não ter havido, como houve, uma escalada sem retorno nos conflitos bélicos, de tal modo, como hoje é sabido por documentação publicada nos últimos anos, que o próprio Marcelo Caetano passou os últimos meses a procurar soluções de autodeterminação para Angola e Moçambique e mandou secretamente também, encetar conversações com o PAIGC para se encontrar um cessar-fogo. 

Toda esta situação de descalabro não merece nenhum comentário ao autor, mas formula um juízo sentenciador:

“Quando se conclui que a estratégia seguida numa guerra deixou de ter condições de sucesso, e a derrota se apresenta inevitável, é mandatório a adoção de uma outra com novos objetivos, mas que continue a defender, tanto quanto possível, o interesse nacional. A cedências total aos adversários, sem ouvir ou considerar as populações dos territórios, não foi outra estratégia, mas uma derrota perante as exigências dos oponentes. Uma nova estratégia teria que assumir a descolonização perante a ONU, para neutralizar a justificação da guerra, e uma continuação da contenção militar do inimigo direto que viesse a permitir um acordo realmente negociado”.

Mirífica proposta, basta recordar que a direção do PAIGC estava pressionada pelos movimentos congéneres de Angola e Moçambique para obter rapidamente o reconhecimento da independência, para não haver recuos, e se o novo governo português obstaculizasse se intensificasse a guerra na Guiné, o que já não era plausível, a partir de junho de 1974 encetaram-se conversações que marcaram o recuo das posições portuguesas, as nossas tropas declaradamente depuseram as armas, enquanto a população recebia os guerrilheiros com sinais de entusiasmo. 

Tudo isso está demonstrado, era impensável instituir qualquer outra estratégia, como a do referendo, Spínola bem ensaiou essa movimentação, pronto o PAIGC ameaçou com a continuação da guerra, seria o descalabro.

O autor faz referências aos primeiros anos da defesa antiaérea do PAIGC, elenca as baixas em voo havidas, o que se chama artilharia antiaérea é uma expressão que só ganha verdadeiramente conteúdo de 1966 para 1967, o apoio técnico-militar cubano revelou-se fulcral, em meados de 1966 o avião G-91 passou a fazer parte das operações, dando-lhes uma maior proteção. 

Obviamente que o autor nos faz compreender as razões da escolha da península de Quitafine, para a implantação da artilharia antiaérea e para o uso do slogan de área libertada. Um tanto à revelia do assunto, e porventura para demonstrar à saciedade que as áreas libertadas eram uma pura mistificação propagandística, refere que os ataques provinham de grupos que vinham do exterior e que para o exterior retiravam. 

Há aqui manifesta falta de cuidado na leitura dos relatórios militares. Creio que as edições do Estado-Maior do Exército sobre as campanhas de África, caso vertente da Guiné, são eloquentes quanto à permanência de bases flexíveis nas proximidades de muitíssimos destacamentos. Não falo só do que vivi, tinha a cerca de 20 quilómetros do meu principal destacamento Madina e Belel, no Cuor, estava rigorosamente proibido de me afoitar até ali com um pelotão, todos os anos havia uma operação à região, habitualmente mal sucedida, havia população que cultivava os terrenos e contatos estavam estabelecidos com a população civil, aparentemente sobre a nossa direta custódia, ainda hoje não se fez um estudo que nos desse uma ideia do que era verdadeiramente o duplo controlo. 

Recorde-se o Xime ou o Xitole ou Mansambo, no setor de Bambadinca: patrulhamentos, colunas de abastecimento, emboscadas e de vez em quando uma operação. O PAIGC estava de pedra e cal no regulado do Xime no Burontoni, Ponta do Inglês, Ponta Luís Dias, Tabacutá, Mina, Galo Corubal. 

Depois do 25 de Abril, o Brigadeiro Hélio Felgas, que foi Comandante do Agrupamento de Bafatá, e responsável pela Operação Lança Afiada, que movimentou um bom número de companhias durante doze dias se esfalfaram em toda esta região do Xime, Mansambo e Xitole, encontraram uns velhinhos e uns carregadores, obviamente que ninguém esteve interessado no contato direto, regressaram nas calmas, teceu um comentário sobre a natureza da guerra de guerrilhas, alegando que era manifestamente impossível perante gente ideologicamente firme, e com um elevado sentido de organização da população civil, pondo em causa a estratégia deste tipo de operações de bate e foge. Foi o que aconteceu, do princípio ao fim da guerra.

Voltemos à artilharia antiaérea, o autor fala-nos das munições usadas pelos equipamentos do PAIGC (munições tracejantes), casos de deteção, contextualiza a eficácia do poder aéreo na Guiné, como se foi descobrindo a guerrilha antiaérea, a tática usada pela guerrilha para passar despercebida durante os voos de reconhecimento e chegamos aos primeiros meses das operações. É referenciada uma operação abortada, a operação Apocalipse, que o Coronel Krus Abecassis, então Comandante da Zona Aérea em 1966, delineou e que foi rejeitada pelo os seus oficiais, entendia-se que o risco era demasiado elevado. 

É nesse ano que a tática antiaérea se alterou radicalmente com a chegada das antiaéreas fixas, bem ilustrada na obra e até a sua localização, dá-se conta da capacidade desta contraguerrilha antiaérea e regista-se o seu posicionamento. E em março de 1968 começa a missão que conduzirá ao seu aniquilamento.

(continua)

Imagem de um Fiat G-91, extraída do livro Portugal’s Guerrilla Wars in Africa: Lisbon’s Three Wars in Angola, Mozambique and Portuguese Guinea, 1961-74, por Al J. Venter, Edições Helion & Company Limited, 2013, livro acessível em pdf  aqui.

Metralhadora pesada ZPU-4, extraída do trabalho A Guerra das Antiaéreas na Guiné (1965/1970), por José Matos, acessível em https://www.revistamilitar.pt/artigo/1355.
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22008: Notas de leitura (1346): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte III: Rui Angel, aliás, Pedro Rodriguez Peralta, capitão do exército cubano, o mais famoso prisioneiro da guerra colonial... Aqui tratado com humor desconcertante (e humanidade) (Luís Graça)

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21028: Os nossos últimos seis meses (de 25abr74 a 15out74) (20): Fotos do álbum do José Lino Oliveira (ex-fur mil amanuense, CCS/BCAÇ 4612/74, Mansoa, Cumeré e Brá, 12jul74 - 15out74) - Parte II: O adeus a Mansoa: 9 de setembro de 1974: o fur mil op esp / ranger Eduardo Magalhães Ribeiro arria a bandeira verde-rubra, na presença dos representantes do MFA e do PAIGC












 Guiné > Região do Oio > Mansoa > CCS/BCAÇ 4612/74 (12jul74-15/10/74) >  9 e setembro de 1974 > Cerimónia da entrega (simbólica) do território aos novos senhores da Guiné, o PAIGC,  e  da retirada, ordeira, digna e segura, das últimas tropas portuguesas. Mansoa, em pleno coração do território, na região do Oio, serviu perfeitamente para esse duplo propósito... São fotos históricas, em que se vê o nosso coeditor Eduardo Magalhães Ribeiro, fur mil op esp / ranger, a arriar a bandeira verde-rubra. (O MR é membro da nossa Tabanca Grande, há mais de 15 anos, desde 1/11/2005 (*)...

Já agora, pergunta-se: de quem era o camião , de cor vermelha ou grená, que está estacionado frente ao pau da bandeira ? Devia ser do PAIGC ou ao serviço do PAIGC...


Fotos (e legenda): © José Lino Oliveira (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Mansoa > 1974 > José Lino Oliveira

1. C
ontinuação da publicação do álbum fotográficos do José Lino [Padrão de] Oliveira [ex-fur mil amanuense, CCS/BCAÇ 4612/74, Mansoa, Cumeré e Brá, 12-7-1974 / 15-10-1974, a mesma unidade a que pertenceu o nosso coeditor Eduardo Magalhães Ribeiro; membro da nossa Tabanca Grande desde 31/12/2012; vive em Paramos, Espinho] (**)

Parte II - Mansoa > 9 de setembro de 1974

Mas este, não seria ainda o último ato da soberania portuguesa...O BCAÇ 4612/74 seria colocado depois de 9/9/1974, no BENG 447, em Brá, Bissau, e,  conforme informação (e fotos, estas já de melhor qualidade,  do José Lino Oliveir, a publicar nos dois próximos postes), a útima bandeira portuguesa a ser arriada, no CTIG, seria no próprio "dia do  embarque", ou seja, mais de um mês depois, em 15/10/1974

E, "por coincidência, também foi o Magalhães Ribeiro a arriar a Bandeira", diz o José Lino Oliveira.. Será que o nosso "ranger" (e querido coeditor, anigo e camarada MR) confirma ?

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Notas do editor:

Mansoa > 9 de setembro de 1974 >
Comissário político do PAIGC,
Manuel Ndinga, prestando declarações
à imprensa. Foto: Eduardo Magalhães
Ribeiro (2005)
(*) Vd. poste de 1 de novembro de 2005 > Guiné 63/74 - P284: Tabanca Grande: Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-Fur Mil Op Esp do BCAÇ 4612/74 - Eu estava lá, na entrega simbólica do território (Mansoa, 9 de Setembro de 1974)

(...) Eu estive na Guiné, em Mansoa, em 1974, na CCS do BCAÇ 4612/74 (o último batalhão que partiu para a Guiné e também o último que de lá saiu), e participei, ali, na entrega do aquartelamento ao PAIGC e na simbólica entrega do território, que incluiu uma muito concorrida cerimónia do último arriar de bandeira nacional, com cerimónia oficial, na Guiné, e o hastear da primeira bandeira da Guiné-Bissau.(...)

(...) "Estiveram presentes nessa cerimónia: a CCS do BCAÇ 4612/74, comandada pelo major Ramos de Campos; o comandante  do mesmo batalhão, ten cor Américo C. Varino; um grupo de combate, um grupo de pioneiros, Maria Cabral (viúva de Amilcar Cabral) e o comissário político Manuel Ndinga, do PAIGC [, foto à direita]; e, pelo CEME do CTIG, o major  Fonseca Cabrinha. (...)

(...) "A bandeira foi arriada por mim, à data furriel miliciano de operações especiais, Eduardo José Magalhães Ribeiro. À cerimónia compareceram ainda 
uns largos milhares de nativos locais, de diversas etnias: 
papéis, balantas, fulas, futa-fulas, mandingas, manjacos, etc., 
e umas dezenas de jornalistas de todo o mundo. (...)

(...) Um guerrilheiro do PAIGC hasteia a bandeira da nova República da Guiné-Bissau. Os inimigos de ontem dão-se as mãos e prometem cooperar, no futuro, numa base igualitária, falando a mesma língua. Sob a bandeira do PAIGC os vários povos da Guiné lutaram pela indepência mas é através da língua portuguesa (oficial) que se entendem. (...)

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20988: 16 anos a blogar (13): Excursão à revolta do 25 de Abril: cosmopolita e elitista, em Lisboa; de oficiais e cavalheiros, no Porto; e a do dia 26, em Bissau, ou a pressa do MFA em se libertar da Guiné - Parte II (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

1. Em mensagem do dia 13 de Maio de 2020, o nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), enviou-nos um texto alusivo ao 25 de Abril em Lisboa e ao dia 26 em Bissau, de que se publica hoje a segunda e última parte.


Excursão à revolta do 25 de Abril: 
Cosmopolita e elitista, em Lisboa; de oficiais e cavalheiros, no Porto; e a do dia 26, em Bissau, ou a pressa do MFA em se libertar da Guiné. 


Parte II

Gen Carlos Azeredo
No Porto, o Tenente-Coronel Carlos Azeredo e a sua malta do MFA gastaram apenas 8 minutos a consumar o êxito do 25 de Abril em todo o Entre Minho e Douro - até o Covid-19 acha que o Norte é uma nação -, fizeram apenas duas prisões, o 2.º Comandante e o Comandante da Região Militar, e por menos de 24 horas, e decidiram não prender o seu General Comandante, sem dúvida pessoa importante, considerando que aquele Quartel General era a sua residência familiar, a sua filha estar de casamento marcado para o dia 27 e serviço da boda contratado para ser servido seu Salão Nobre.

Em Lisboa, o 25 de Abril foi feito à grande e à escala de Clausewitz; no Porto foi feito à “Português Suave” e à moda de D. Afonso Henriques, em Guimarães!

O “vírus” do MFA surgiu na Guiné, em 1972, o General Spínola o seu profeta e os capitães “seus rapazes” da Spinolândia os seus apóstolos, no contexto da sua ambição de substituir o Almirante Américo Tomás no cargo de Presidente da República, para o que contava com a cumplicidade de Marcello Caetano; tendo-lhe este roído a corda, ao saber que diligenciava apoios políticos de Sá Carneiro, de Pinto Balsemão e da Ala Liberal e de Mário Soares, Salgado Zenha, da Acção Socialista Portuguesa, mantendo a cumplicidade com os seus capitães, como “barriga de aluguer” para a mudança. A influência do feitiço da Guiné e da dinâmica do pensamento e acção de Amílcar Cabral a contaminar militares e políticos portugueses, e, plausivelmente, a grande oportunidade perdida de dar um fim decente e justo às guerras ultramarinas.

Em 1972, o PAIGC estava na mó de baixo e o seu “balneário” de guineenses e cabo-verdianos era um saco de gatos. Foi quando Amílcar Cabral foi à Rússia implorar armamento da última geração. Ouvi Nino Vieira dizer na RTP que ele agitava o catálogo do míssil Strela enquanto implorava aos seus interlocutores: - A nossa luta está a morrer de sede; a União Soviética tem nesta arma a nossa salvação. Não nos deixem morrer de sede.

A União Soviética não se fez rogada e veio em seu socorro, redimensionou o armamento do PAIGC e, em Março de 1973, o seu semi-secreto míssil Strela chegava à Guiné e os seus operadores prontos para retirar a supremacia do seu céu aos pássaros metálicos de Base Aérea n.º 12, em Bissalanca.

Sendo a espinha dorsal do Exército, a classe dos Capitães é tradicionalmente refilona, qual espinha na garganta das hierarquias. No meu tempo já reclamavam contra as “violências do Ministério do Exército”. A revolta antecedente, o 28 de Maio de 1926, havia sido detonada por capitães (mas com hierarquia, o General Gomes da Costa o seu chefe) e foi a guerra do Ultramar que fez esgotar o prazo de validade dos quase 50 anos de centuriões e de convívio da classe com o regime do Estado Novo.

O 25 de Abril de 1974 foi detonado pela mesma classe dos Capitães, “rapazes da Guiné” na sua maioria, improvável, por ser um colectivo, e horizontal, sem chefe nem hierarquias. Uma revolta acéfala, quase perfeita, mas com consequências.

 Junta de Salvação Nacional

A operação “Viragem Histórica” não deixou cair o poder na rua, o MFA não quis o poder formal e personificou-o de imediato nos seus “padrinhos” Generais António de Spínola, Costa Gomes e na Junta de Salvação Nacional. Os seus actores regressaram aos seus quartéis, o Major Otelo, seu comandante operacional em Lisboa, voltou a instrutor na Academia Militar, o Tenente-Coronel Azeredo, seu comandante operacional no Porto, manteve-se sem comando nem comandados, a aguardar a Junta Médica do Hospital Militar, para o passar à reserva como “deficiente mental” e o Capitão Vasco Lourenço, o seu enfant terrible e locomotiva da revolta, protagonizou-o no seu desterro nos Açores.

A par da vitória do movimento em todo o universo português, da efectivação em Lisboa do poder político e da cadeia de comando militar, do Minho a Timor, na manhã do dia 26, o MFA de Bissau detonou a sua própria revolta, desnatou o Comando Militar na Guiné da sua cúpula, alardeando que o PAIGC e a Guiné eram a mesma coisa, os seus factores não eram arbitrários e começou a fazer o seu caminho, mais para se libertar e libertar Portugal da Guiné que libertar do seu povo. Com tão insano proceder num estado de guerra, o MFA da Guiné tornou-se em potencial vitorioso do PAIGC, e, sem ter legitimidade, subtraiu a Portugal o seu peso negocial.

Acontecera a primeira deriva do MFA. Não é preciso galões para saber que a melhor negociação é sempre conseguida a partir de posição de força e não com piedosas declarações de intenção da capitulação.

O MFA abriu avenidas a movimentos de opinião, legalizou 13 partidos políticos, 10 revolucionários de esquerda, apenas 3 moderados, decretou a proscrição dos movimentos da Direita e ele mesmo se dividiu em duas 2 facções político-militares: os spinolistas, representando cerca de 20%, tendenciais a um certo cesarismo, personificado pelo General Spínola e os “puros”, representando 80%., mais ou menos afectos à personalidade do General Costa Gomes.

Com o PREC (Processo Revolucionário em Curso), o MFA “empalmou” os spinolistas, passou a dividir o poder com a rua e a sua massa dos “puros” dividir-se-á em 3 facções: os moderados, da democracia por eleições justas e livres, respaldados no General Costa Gomes; os gonçalvistas, filo-comunistas ou engrenados nas suas estruturas partidárias, afectos ao General Vasco Gonçalves; e copconistas, os esquerdistas contestatários da democracia formal e os revolucionários da democracia directa, que converteram e alçaram a seu profeta Otelo Saraiva de Carvalho, ora graduado em Oficial-General.

As consequências da acefalia hierárquica do MFA começavam a vir ao de cima: o divisionismo resultou no PREC, no abandalhamento dos quartéis, que espantou o mundo e tanto maculou a honra castrense das FA Portuguesas, a tragédia da descolonização do Ultramar e a acelerada instalação do caos na organização económica da Sociedade portuguesa. O MFA que se portara à altura de todas as solicitações militares, parecia desconhecedor do seu próprio povo e da sua história.

Cap Salgueiro Maia
Os efeitos da sua acefalia e do seu colectivismo tiveram a sua evidência logo no seu primeiro momento vitorioso: aceitaram que Marcello Caetano, já rendido ao MFA e prisioneiro do Capitão Salgueiro Maia, lhes escolhesse o General Spínola para Presidente da Junta de Salvação Nacional/ Presidente da República de Portugal e, por inerência, Supremo Comandante das Forças Armadas!...

O MFA começou o seu desvario menos de 2 meses após o sucesso da sua revolta, ao tirar o tapete ao Prof. Palma Carlos e ao seu Governo, na sua falta de análise da discrepância da lógica civilista e de “estado de direito” do Governo com a lógica militar e voluntarista do seu Programa, e, enquanto noviços da democracia, sobrepuseram-se a democratas militantes, ajuizaram o valor da sua proposta ao Conselho de Estado, órgão composto por 12 militares e 7 civis, com poderes constituintes, escolhidos pelo MFA, como golpe conspirativo. Em última análise, propunha-se a busca de um “quadro jurídico”, pela troca da prioridade de Descolonizar, Democratizar e Desenvolver, pela de Democratizar, Descolonizar e Desenvolver, com começo na rápida eleição do Presidente da República e por um governo legítimo, empossado por ele.

Republicano e civilista, para o I Governo Provisório só o Povo legitimava o poder, uma cabeça um voto era urgente, um direito inalienável, daí a prioridade atribuída à democratização; para os “Capitães de Abril”, o poder residia no Programa do MFA, a sua legitimação residia no seu colectivo e no poder das suas armas, o controle político do Governo era uma prerrogativa revolucionária da Comissão Coordenadora, a descolonização tinha prioridade sobre a democracia formal.

E, enquanto considerou que, com a transferência da ditadura portuguesa para a ditadura dos seus partidos únicos e armados, sem permissão de outros partidos políticos nem quaisquer eleições, os povos do Ultramar ficariam automaticamente “livres”, o MFA procrastinou durante mais de 2 anos a democracia a Portugal, impôs-nos eleições constituintes, legislativas e presidenciais, e, após a instituição da nossa democracia pluralista, ainda a tutelou durante 7 anos com um Conselho da Revolução.

Gen Vasco Gonçalves
O MFA dos Capitães abrira-se às hierarquias, a Comissão Coordenadora alçou o seu presidente, Coronel Vasco Gonçalves à chefia do II Governo Provisório e começou a fazer o seu caminho para retirar o General Spínola de inquilino do Palácio de Belém, tecendo uma “teoria da conspiração”, ao embargar a manifestação em seu apoio, a ”Maioria Silenciosa”, segundo os seus promotores, coordenada pelo Tenente-Coronel Fernando Cavaleiro, que havia comandado a “Operação Tridente” e derrotado o PAIGC nas ilhas do Como, Caiar e Catunco, ou a conspiração do “28 de Setembro”, segundo o MFA e políticos apoiantes, que o COPCON desmantelou, a prender organizadores e manifestantes, a dinamizar cortes das estradas, barricadas e a permitir que milícias populares molestassem e prendessem pessoas a eito, por impulsão do fogoso Capitão Vasco Lourenço, o que o popularizará como o Capitão “Melena e Pá”. Vasco Lourenço aqueceu o forno e Otelo Saraiva de Carvalho coseu o pão. Como esse poder na rua foi concessão do COPCON, o evento serviu para germinar a facção político-militar copconista ou revolucionária, a que ele dará o seu patrocínio.

O Primeiro-ministro Vasco Gonçalves ascendeu ao generalato, formou e chefiou mais 3 governos provisórios mas populistas, o germe da facção político-militar gonçalvista, e, sem mandato do povo e na ausência de qualquer quadro político democrático, mudou profunda, embora provisoriamente, a nossa organização económica, com não raros atropelos à nossa realidade de 3.º país mais antigo do mundo, o respeito merecido pelos 900 anos de independência, de instituições governamentais e de história e, no referido à descolonização, os deveres e responsabilidades contraídos por Portugal para com os seus povos, ao longo de 500 anos da sua soberania ultramarina.

Em 11 de Março de 1975, eclodiu em Lisboa uma esquisita tentativa de golpe de Estado, anti-MFA, por terra e pelo ar, com o pretexto de prevenir o massacre de largas dezenas de militares e civis sob o nome código de “Matança da Páscoa”, a perpetrar por revolucionários naturais e internacionais (até constava haver tupamaros aboletados no Ralis!…), segundo informações do governo franquista de Madrid. O MFA superou-o e aproveitou para retirou a facção spinolista da circulação, catrafilando-a e a muitos civis na cadeia; os escapados à captura foram conspirar para a Espanha, organizaram-se no MDLP, e, por ironia do destino, constituirão o potencial estratégico dos moderados do 25 de Novembro, que meter na cadeia os gonçalvistas e os copconistas

11 de Março de 1975

Senti revolta, quando proeminentes Capitães de Abril não tiveram pejo em ir a Cuba pavonear-se de revolucionários e reverenciar Fidel Castro, apenas um ano era passado sobre a crise dos 3 G´s, planeada e comandada por oficiais do exército regular cubano, destacados para o PAIGC, que ajudaram a matar 63 e a ferir gravemente em combate 269 seus e nossos camaradas de armas, o preço do nosso sangue desses eventos bélicos; e o MFA não teve pejo em disponibilizar o aeroporto da ilha de Santa Maria, Açores, a Cuba, para escala técnica do trânsito do exército cubano, a substituir-se a Portugal em Angola, a ajudar o MPLA a espoliar os bens e na expulsão de centenas de milhares de portugueses, muitos com apenas a roupa do corpo (os Retornados).

É a memória que faz a História e não o contrário. Um facto não comentado e quase desconhecido: em 1973, a agenda de Marcello Caetano passara a inscrever a autodeterminação do Ultramar africano. Os Estados Unidos e a União Soviética “estiveram” na operação “viragem Histórica”?

Em 25 de Abril de 1974, a esquadra da NATO da operação “Daw Patrol” estava fundeada no Tejo e o MFA sabia - o então Comandante Rosa Coutinho estava de serviço ao “quarto da noite” no Comiberlant, em Oeiras, - que não dispararia sobre os revoltosos, não obstante a fragata canadiana Huran apontar os seus canhões ao Terreiro do Paço. Quando do 11 de Março de 1975, a informação da “Matança da Páscoa” teve origem em Moscovo e o evento coincidiu com a operação “Intex 75” da NATO, com passagem por Lisboa.

A prioridade civilista “democratização” não vingou sobre a prioridade militar “descolonização”. Na afirmativa, será plausível os contactos preliminares bilaterais terem passado a negociações sérias, prevenidos o êxodo ou o milhão de retornados do Ultramar, os mais de dois milhões de mortos das guerras civis subsequentes e o empobrecimento de colonizador e de colonizados e até os legítimos interesses dos 500 anos de soberania portuguesa salvaguardados.

A FNLA e o MPLA tinham perdido a guerra de Angola por falta de comparência, as negociações da sua autodeterminação estavam praticamente concluídas com Jonas Savimbi e a UNITA, a conceder em 1975, trabalho começado pelos Generais Costa Gomes e Bettencourt Rodrigues e levado a bom porto pelo Eng.º Santos e Castro e os Generais Soares Carneiro e Passos Ramos (irmão do major homónimo assassinado no Pelundo-Guiné). No respeitante a Moçambique, havia negociações conduzidas pelo Eng.º Jorge Jardim. A Guiné era o nosso calcanhar de Aquiles, mas havia contactos com o PAIGC, do Comandante Alpoim Calvão e Luís Cabral.

Começar a descolonização pela Guiné e não por Angola terá sido o maior erro estratégico do MFA ou da descolonização portuguesa. O Programa do MFA inscrevia-a, mas nem a discutira nem a planeara, houve navegação à bolina, não se olhou para as origens das ondas e foi liquidada com a acelerada retracção militar, sem equidade, pelo abandono, para espanto do mundo - e Portugal ficará sob o protectorado do FMI, Fundo Monetário Internacional.

Portugal foi a única potência que fez a descolonização, a empobrecer colonizador e descolonizados.

Eleições Legislativas de 1975

Na sua curta era, o MFA garantiu-nos as eleições constituintes e legislativas e fez outras coisas notáveis, como o Recenseamento Eleitoral, a organização do regresso de centena de milhares de refugiados e a instituição do IARN, que realizou a sua integração plena.

A coragem e a generosidade são fontes do erro e foram apanágio dos “Capitães de Abril”. Mas o seu maior legado é a nossa Democracia.
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de Maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20984: 16 anos a blogar (12): Excursão à revolta do 25 de Abril: cosmopolita e elitista, em Lisboa; de oficiais e cavalheiros, no Porto; e a do dia 26, em Bissau, ou a pressa do MFA em se libertar da Guiné - Parte I (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

domingo, 17 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20984: 16 anos a blogar (12): Excursão à revolta do 25 de Abril: cosmopolita e elitista, em Lisboa; de oficiais e cavalheiros, no Porto; e a do dia 26, em Bissau, ou a pressa do MFA em se libertar da Guiné - Parte I (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

1. Em mensagem do dia 13 de Maio de 2020, o nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66), enviou-nos um texto alusivo ao 25 de Abril em Lisboa e ao dia 26 em Bissau, de que se publica hoje a primeira parte.


Excursão à revolta do 25 de Abril: 
Cosmopolita e elitista, em Lisboa; de oficiais e cavalheiros, no Porto; e a do dia 26, em Bissau, ou a pressa do MFA em se libertar da Guiné. 


Parte I

Abril legou a Maio a Primavera, o seu esplendor e a pandemia do Covid-19, esse sinistro vírus rotundo e cornudo.

Os poetas cantam que “a primavera vai e volta sempre,/A mocidade vai e não volta mais”, as zaragatoas neofaríngeas ajudam a confirmar que esse malvado pode ir e voltar, os epidemiologistas consideram-no democrático, mas, do seu regime, nós apenas vamos conhecendo, hora a hora, dia a dia, o número de infectados, dos seus condenados à morte, e experimentado o confinamento e a distanciação social - a praxis das ditaduras (ou ele não seja made in China).

O confinamento encurta o prazo de validade do nosso grupo etário, provoca o esvaziamento das garrafeiras, cuida da alteração dos valores da nossa composição química, com erupções de ácido úrico, diabetes, colesterol, a escalada da tensão arterial, e, no relativo à distanciação social, cuida de enfraquecer a nossa resistência mecânica, com o reumático e pela rarefacção daqueles movimentos mecânicos de corpo a corpo, para os quais os irracionais têm época própria, mas que a espécie humana exercita todo o ano. Que a Ciência, essa divina componente da espécie humana, o sepulte rapidamente no inferno.

Panorâmica da Avenida dos Aliados, no Porto, a 1 de maio de 1974. O primeiro 1º de Maio em liberdade
Foto e legenda com a devida vénia a Expresso

Como os ecos das celebrações “nacionais” do 25 de Abril e do 1.º de Maio ainda não se esvaíram, começo a servir esta prosa memorialista, confeccionada nessa ditadura temporal do Covid-19, pondo o avental de contestatário: não perdi nem a devoção ao 25 de Abril nem a estima pelos “capitães de Abril”, sou crítico da impreparação política e derivas do MFA, sou contrário aos feriados nacionais do 25 de Abril e do 5 de Outubro, porque celebram as mudanças de regime, pela sua lógica triunfalista, divisionista, o oposto da união, e, em desafio à gramática, sou crítico de se grafar República Portuguesa e não República de Portugal.

A celebração do 1.º de Maio, pela sua dimensão mundial, abrangente pelo seu sentido de exaltação da dignidade do trabalhador e do emprego, como criadores de toda a riqueza da espécie humana, da sua distribuição, equitativa como direito natural, é merecedora do decreto de feriado nacional.

Invocando o princípio de equidade e considerando a nossa maioridade cívica um dado adquirido, preconizo a substituição de alguns feriados nacionais, celebrativos das mudanças de regime e religiosos (dias santos) por outros, celebrativos da nossa história e identidade, por exemplo da fundação da nacionalidade, da independência nacional, da Batalha Real (de Aljubarrota), do nosso primeiro Descobrimento marítimo, etc.

A celebração do primeiro 1.º de Maio de 1974 do após 25 de Abril foi de toda a gente, abrangente, à dimensão nacional, ainda a CGTP nem era ideológica nem havida cometido o seu pecado original de complementar um partido político, um milhão de pessoas celebrou-o em Lisboa, um pouco menos celebrou-o no Porto, o país um mar de unidade nacional, de maturidade cívica e a primeira evidência da pureza e sinceridade do ideal dos “capitães de Abril”, cujas projecções matemáticas davam 95% de adesão à sua revolta. Foi um massivo aval do Povo ao MFA.

No referido neste blogue à celebração pelo PAIGC do 28 de Maio de 1965 com a CArt 676, em Pirada, a efeméride da gestação do regime do Estado Novo não era feriado nacional, mas o PAIGC sinalizava-a com bombardeamentos nocturnos e a fogachar as tabancas fronteiriças; desgastar o moral e matar a tropa era o seu intento, mas as granadas são cegas e geralmente matavam e estropiavam crianças, mulheres e velhos, seus compatriotas.

O PAIGC celebrou o 28 de Maio de 1965 não só em Pirada, mas também noutras quadrículas; chamou a minha CCav 703 à colação da sua celebração, sobre a população fula e mandinga da tabanca de Buruntuma, no extremo Leste, com tiro tenso e curvo, de armas ligeiras em proximidade e de armas pesadas em território estrangeiro, o seu gozo e o nosso mau bocado duraram menos de 5 minutos – arriscamos o envolvimento à sua retaguarda, no estrangeiro - e o resultado da sua celebração foi: PAIGC, 2 (mortos) – Tropa e população, 0 (mortos).

As suas flagelações sobre a CCav 703 e a populosa tabanca de Buruntuma tornaram-se rotineiras – pela alvorada, pela hora do almoço e pela hora de recolher. Nesse mesmo ano, obrigou-nos a participar na sua comemoração nocturna do 19 de Setembro, aniversário do seu líder Amílcar Cabral, e, também, na celebração nocturna de 24 de Setembro, aniversário da sua fundação, paternidade que ele nunca usurpou, mas que “historiadores” do politicamente correcto teimam em lhe imputar, expropriando-a ao pedreiro comunista Rafael Barbosa. Porquê? Por a PIDE não o ter liquidado, hospedado no Tarrafal e por ele ter regressado a Bissau “reeducado”, adversário do PAIGC e entusiasta do spinolismo.

O engenheiro agrónomo Amílcar Cabral só não foi hóspede do Tarrafal, quando estudava os solos e subvertia o “proletariado rural” do sul e do leste da Guiné, porque o Governador Comandante Melo e Alvim, bom conhecedor do povo e da realidade guineense, o estimava e não deixou. Liderou a guerra de libertação da Guiné, é o pai da Nacionalidade bissau-guineense, não foi o pai fundador do PAIGC, mas seu padrasto.

Para não deixar os meus parcos créditos de veterano e de cronista da Guerra da Guiné arrastar-se pelas ruas da amargura, não resisto em abordar os acontecimentos do mês de Maio de 1973 – as celebrações bélicas do PAIGC sobre Guileje, Gadamael e Guidaje -, ou “crise dos 3 G´s”, cuja extensão e profundidade provocaram a gestação do 25 de Abril e serviram de rampa de lançamento à sua declaração unilateral de independência.

O impensável aconteceu na guarnição de Guileje, nesse mês de Maio de 1973. A guerra contava 12 anos, muito aguerrida e dura no sul, e, pela primeira vez, um oficial superior do Exército Português baixou a espada, de renúncia ao combate e à soberania de Portugal sobre o sector militar que comandava, concedendo às FARP a sua primeira libertação territorial - o seu aquartelamento fortificado, deserto de tropa, e a sua tabanca, deserta de gente.

A “Operação Amílcar Cabral” havia sido idealizada por ele, e, em sua memória póstuma, o PAIGC confiou o planeamento e o seu comando no terreno a oficiais cubanos, seus cooperantes. Nesse mês de Maio de 1973, as suas FARP (Forças Armadas Revolucionárias Populares) de Nino Vieira (comandante) e Pedro Pires (comissário político) fizeram da tabanca, das suas acessibilidades e do aquartelamento de Guileje, no sul, o seu campo de tiro tenso e curvo, montaram emboscadas sangrentas nas suas acessibilidades, a privá-la de água e reabastecimentos, orientaram e acertaram-lhe com mais de 900 obuses.

Guiné > Região de Tombali > Guileje > 22 de Maio de 1973 > A população e os militares abandonaram Guileje, às 5,30h, a caminho de Gadamael. Esta foto, dramática, é da presumível autoria do Fur Mil Carlos Santos, da CCAV 8350 (1972/74), segundo informação do seu e nosso camarada e amigo José Casimiro Carvalho, também ele da mesma unidade ("Os Piratas de Guileje") mas que nesse dia estava em Cacine. Faz parte do parte do acervo fotográfico do Projecto Guiledje. 
Foto: AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados. [ Editada por C.V.]

Por sua análise da situação, o comandante do sector Major Coutinho e Lima reagiu a esse dilúvio de metralha inimiga pelo descarte ao combate, optou pela economia de sofrimento, sangue e na prevenção a aprisionamentos. Contrariando as ordens presenciais do Comandante-Chefe, manobrou a retirada ordenada da guarnição para Gadamael Porto, secundada pelo êxodo da totalidade população, na sua aversão à sua “libertação” pelo PAIGC. Terá negligenciado que transferia a problemática de Guileje para essa tabanca e subavaliado a elevada remuneração que concederá à avidez territorial do PAIGC e da sua propaganda internacional: abandonou a principal base fortificada de soberania portuguesa, na extensa fronteira entre Buruntuma e Aldeia Formosa (Quebo), e, pela sua incompatibilidade com a táctica furtiva dessa retirada, teve de deixar para trás 2 obuses de 140, autometralhadoras Fox, granadeiros Whaite, camiões Mercedes e Berliet, morteiros de 82, de 107, bazucas de 89, algumas G3, bens de aquartelamento e provisões da intendência, incluindo os whisquies do seu bar de oficiais, mapas do Estado-Maior, etc., etc.

Então, a partir de 28 de Maio de 1973, o PAIGC passou a içar a sua bandeira no pau da bandeira, na parada desse aquartelamento fortificado, que pertencera à bandeira nacional, e o mundo viu-se invadido pela sua propaganda gráfica e audiovisual, com enfoque nos cenários do abandono pelo Exército Português das instalações, do içar da sua bandeira e daquele volumoso espólio de guerra, acreditamos que deixado inoperativo. E foi a crise de Guileje que credibilizará junto da OUA, da ONU e das chancelarias de países ocidentais a futura manobra do PAIGC da declaração unilateral da independência, no Boé, em 24 de Setembro seguinte, que encravilhou mais a diplomacia de Portugal.

Como Guileje era uma base bem armada e com abrigos de betão armado, construídos pela Engenharia militar, os planeadores dessa operação não previam a sua autoderrota, o seu principal objectivo seria a captura de alguns prisioneiros, para trunfo e trofeu, (a “Operação Mar Verde” tornara a sua cadeia em Conacri devoluta de militares portugueses). Este sucesso artilhou-lhes o etos belicista, as FARP avançaram do estrangeiro o seu armamento pesado cerca de 15 km no interior da Guiné e sacrificaram a tabanca de Gadamael-Porto com o seu dilúvio de metralha, apenas protegida com valas a céu aberto, ora pejada de gente em pavor, de tropa desmoralizada e à beira de um ataque de nervos.

Ouvi o comandante Pedro Pires dizer na RTP que as coordenadas e a precisão do tiro curvo sobre Gadamael lhes foram facultadas por um desses mapas de Estado-Maior, deixado para trás em Guileje. Depois de terem gasto mais de 1000 obuses a destruir instalações e a revolver o espaço de Gadamael Porto, investimento alto mas de parcos os resultados, as FARP foram forçados à retirada acelerada para os seus refúgios no estrangeiro, ameaçadas pelo general “época das chuvas” e já a confrontar-se com os reforços de tropas especiais, vindas de Cufar, de Bissau e até de Guidaje, em reforço da sua defesa, sua missão extensiva ao assalto e destruição das suas bases de retaguarda, em Kandiafara, Simbel e Tarsaia, na Rep. da G-Conacri, manobra idêntica à que havia destruído e pilhado a base de retaguarda em Cubam-Hori no Senegal, que alimentava a operação sobre Guidaje.

Major Correia de Campos
Nesse mesmo mês de Maio de 1973 e quase em sintonia com os desenvolvimentos em Guileje, as FARP de Chico Té (comandante) e Manuel dos Santos (comissário político), cumprindo e sintonizados com o planeamento e o comando operacional e oficiais cubanos, também cercaram a tabanca de Guidaje por todos os lados, na fronteira com o Senegal, despejaram mais de 1000 obuses sobre ela, mas nem conseguiram o seu isolamento e nem puderam lançar-se ao seu assalto, planeado para o dia de 23 Maio. Os Fuzileiros, a Companhia de Paraquedistas 121, comandada pelo Capitão Moura Calheiros e a CCav 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia, furavam o seu isolamento, o Tenente Coronel Correia de Campos, comandante do sector, embargava a repetição de Guileje. Quando os seus subordinados lhe abordaram a retirada para Bigene, plantou-se na frente do cavalo de frisa, impecavelmente fardado, a agitar o pingalim, de pistola em punho e a dizer-lhes:
- Só por cima do meu cadáver!

As valas de Guidaje  
Com a devida vénia a SPM 0018 - CCAÇ 3

E as FARP tiveram de desmontar o cerco a Guidaje e manobrar a retirada para os seus abrigos no estrangeiro, já a contas com uma manobra de envolvimento montada pelo Batalhão dos Comandos Africanos à sua base de retaguarda de Cumbam-Hori, no Senegal, comandado pelo Tenente-Coronel Almeida Bruno, as suas subunidades comandadas pelos Capitães Raul Folques, Matos Gomes e António Ramos, que eliminaram o seu coordenador, tenente cubano Raul Abade, lhes causaram elevadas baixas, entre nativos e cooperantes estrangeiros, e a perda de 100 armas automáticas, 100 morteiros de 60, 81 e 120, 14 canhões e de 100 toneladas de munições.

Os dois oficiais Correia de Campos e Salgueiro Maia, que em Maio de 1973 se notabilizaram no contexto bélico de Guidaje, virão a ser essenciais ao sucesso da revolta do dia 25 de Abril, em Lisboa, com os seus desempenhos no Terreiro do Paço, no Largo do Carmo, etc. Se muitos foram os chamados, estes foram dos decisivos.

Se o 25 de Abril é contentamento e cantado como um “dia inteiro e limpo” (poesia de Sophia), pela sua bondade intrínseca e virtude profissional dos seus actores, a estragação ou pecados do MFA são susceptíveis de reparos, por se ter contraído o esquerdismo, a doença infantil das revoluções e pelas derivas ao seu ideal.

O Major Otelo Saraiva de Carvalho ter-se-á inspirado no pensamento (formado e estruturado na Casa dos Estudantes do Império) e na acção (tirocinada na China e como comandante supremo da Guerra da Guiné) de Amílcar Cabral, para planear e comandar a operação “Viragem Histórica” vulgo “25 de Abril”.

Amílcar Cabral planeou o dispositivo subversivo e militar da sua guerra sobre um mapa escolar da Guiné, o leste contrariou-o, os fulas ciosos de poderem fazer a sua própria libertação e ganhou-a sem Marinha nem Força Aérea; o Major Otelo planeou essa operação sobre um mapa do ACP das estradas de Portugal, mas o Norte dos “portugueses dos mais antigos” quis fazer o próprio golpe – e o MFA ganhou e sem precisar da Marinha e da Força Aérea.

Em Lisboa, o Major Otelo e o estado-maior da conspiração precisaram das tropas do Centro, Lisboa e Sul, de meter muita gente na prisão, sob o pretexto da sua importância e gastaram 20 horas até à vitória da revolta, e ficou a dever a sua materialização sem combate, incruenta, ao “espírito da Guiné” do Coronel Romeiras Júnior, comandante do RC7, ao desempenho e espírito de missão do Capitão Salgueiro Maia, da sua malta, da malta das guarnições de Tomar e de Estremoz, e, sobremaneira, à consciência do Comandante António Louçã, que desobedeceu à ordem recebida pelos canais hierárquicos e não disparou sobre a sua manobra no Terreiro do Paço as granadas de urânio empobrecido que municiavam dos canhões da sua fragata Gago Coutinho – Salgueiro Maia e a sua malta teriam sido dizimados.
(O MFA do PREC cometeu a insanidade de sinalizar ambos de “reaccionários”)…

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20971: 16 anos a blogar (11): Poema de João Afonso Bento Soares, maj gen ref, sobre a sua terra natal: "Meimoa, Princesa da Cova da Beira"

terça-feira, 28 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20914: 16 anos a blogar (6): Os dias de Abril, mês “de águas mil”, de Constituições, de Revoltas e de Revoluções, que mudaram Portugal (2) (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

1. Em mensagem do dia 27 de Abril de 2020, o nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66) enviou-nos a II parte de Os dias de Abril, mês "de águas mil"


Os dias de Abril, mês de “Águas mil”, de Constituições, de Revoltas, de Revoluções, dos… das Celebrações, Grupos de Risco e do Cofinamento, que mudaram Portugal - Parte II

(Continuado)

Em meados de Abril de 1974, feitas 6 reuniões plenárias à escala dos 3 Ramos das FA, a última em Cascais, mobilizadora de cerca de 200 conjurados, e um mês passado sobre a falhada “Revolta das Caldas”, a Comissão Coordenadora do MFA tinha acelerado e terminado o seu trabalho de casa – a máquina conspirativa estava montada e bem oleada.

A malta conspiradora das Caldas havia-se precipitado. À data da sua saída, a inter-relação dos conjurados limitava-se à ligação, não havia nem plano de acção militar nem programa político, mas apenas um rascunho de cariz político-militar, da autoria do Major do SAM Moreira de Azevedo e o Movimento dos Capitães/Movimento das Forças Armadas encontrava-se neste pé: logo que fossem muitos, entregariam ao Chefe seu elegido (General Spínola) um ultimato para ele apresentar ao Chefe do Governo (Marcello Caetano). Se este o aceitasse, tudo bem; se o recusasse, meteria o General Spínola “dentro”, na Trafaria (com o amparo do livro Portugal e o Futuro) e então eles accionariam o seu chefe profissional, General Costa Gomes.

Uma evidência da falta de equidade de funções, peculiar à comunidade militar. Os generais não substituiriam os capitães e os capitães a tratar de substituir os generais…

Ernesto Melo Antunes
Em 23 de Abril de 1974, o MFA iniciou a acção directa. A participação de oficiais da Marinha, da Força Aérea, as adesões dos seus camaradas milicianos (os espúrios) e de uma proporção significativa de oficiais superiores estavam consolidadas, havia o Programa político, elaborado por uma comissão coordenada pelo açoriano Major de Art.ª Melo Antunes e, também, o Plano da operação militar com o código de “Viragem Histórica”, elaborado por uma comissão coordenada pelo natural moçambicano Major de Art.ª Otelo Saraiva de Carvalho.

Escolhido o dia 25 de Abril para seu dia D e a 1H00 para sua hora H, efeméride da queda do Fascismo na Itália, inspirador do nosso regime do Estado Novo, a sua equipa operacional, comandada pelo Major Otelo, dedicou esse dia a entregar rádios, códigos e senhas aos conjurados, e, em simultâneo, o Major Melo Antunes, numa discriminação positiva ao Partido Comunista e ignorando o Partido Socialista e a Ala Liberal, entregava ao casal Carlos Brito e Zita Seabra, responsáveis da DROL (Direcção Regional da Organização de Lisboa) do PCP, cópias do Plano da operação militar e do Programa Político do MFA – as únicas cópias saídas da intimidade dos conspiradores.

A participação do Povo no êxito do 25 de Abril incruento é facto acontecimental; a participação do povo logo na alvorada da sua manobra militar é um mito.

Ao começo da madrugada de 1 de Abril de 1974, Zeca Afonso encerrou o seu espectáculo do Coliseu dos Recreios com a canção Grândola, vila morena, que havia lançado na Galiza, o Major Otelo estava na plateia, o seu ouvido reteve-a e será a elegida para senha da hora H – a Rádio Renascença transmitiu-a aos 20 minutos da madrugada de 25 de Abril.

O primeiro conspirador a mostrar serviço ao Posto de Comando do MFA, na Pontinha, foi o Capitão Teófilo Bento: ouvida a cantiga do Zeca Afonso, ele, o Tenente Manuel Geraldes e a sua malta da Escola da Administração Militar, especialistas de “apontadores da Bic” e não de apontadores da G3, acabavam de ocupar o Mónaco, nome de código da sua vizinha a RTP.

Jaime Neves
O segundo a sair terá sido o Major Jaime Neves e a sua malta dos Comandos; será recorrente na afirmação de que, quando chegou ao Terreiro Paço, por volta das 6H00 da manhã, com a missão de ocupar os ministérios militares e de prender os respectivos ministros, já havia massas trabalhadoras, vindas da Outra Banda e com palavras de ordem, de apoio à “revolução”. Desconfiado de estar a protagonizar uma revolução comunista, “a coisa era tão secreta e chegara a esse nível”, em vez de apresentar serviço na Pontinha, exigiu explicações ao Posto de Comando, o Major Otelo sossegou-o, e só não desistiu, porque o Capitão Salgueiro Maia e a sua malta da EPC de Santarém começaram a chegar.

A sua perplexidade permitiu que os chefes militares tivessem escapado (momentaneamente) à prisão, derrotando com os machados de guerra dos guerreiros da sua decoração a parede de tijolo, divisória entre o Ministério do Exército e o Ministério da Marinha, apanharam o autocarro e foram parar ao Regimento da PM, à Calçada da Ajuda, onde montaram o Posto de Comando da contra-revolta. Integrou-se activamente na manobra do Salgueiro Maia, foi negociador decisivo, na Ribeira das Naus, na contenção dos blindados Patton que os chefes que não prendera mandaram contra eles, vindos da mesma Calçada, originários do RC7. E ainda efectuará a prisão o General Louro de Sousa, Quartel-Mestre General, - o Comandante do CTIG da Guiné da “Operação Tridente”, à ilha do Como, em princípios de 1964.

O que o Posto de Comando do MFA e o notável soldado e futuro Brigadeiro Comando Jaime Neves não sabiam – este terá partido sem saber – que a sua colisão mental com o surgimento daquela malta, madrugadora e animada, era circunstancial a essa a manobra “secreta” do Major Melo Antunes, que pusera o Carlos Brito a mobilizar a massa trabalhadora da Cintura Industrial de Lisboa para o Terreiro do Paço e pusera a Zita Seabra a mobilizar a massa estudantil (a UEC) a apoiar todo o militar da revolta que encontrasse na rua.

E essas massas desempenharam-se eficazmente; foram o “fermento” que levedou a massa de adesão do Povo.

Se o Capitão Teófilo Bento e a sua malta do SAM foram meteóricos na ocupação da RTP, objectivo não armado, o MFA de Lisboa, não obstante o seu poderio de homens e de fogo, demorou 17 horas a tomar o poder em Lisboa, encheu o Forte da Trafaria de presos, enquanto ao MFA do Norte, enformado por 60 militares, divididos em 5 grupos, comandado pelo então Tenente-Coronel Carlos Azeredo, bastaram 8 minutos para cumprir todas as missões e tomar o poder no Porto – e não meteu ninguém na cadeia.

Às 14H02 entraram em acção e às 14H10 já tinham libertado toda a região de Entre Minho e Douro.

A primeira fractura do MFA também se deu no Norte.

Carlos de Azeredo
O Tenente-Coronel de Cav.ª Carlos Azeredo planeara e executara o 25 de Abril nortenho em parceria com os Majores Eurico Corvacho, Gonçalves Borges e o Capitão Nogueira de Albuquerque, não poderia comandar a Região Militar, por não exercer o comando de unidade, havia requerido a demissão do Exército (o ministro tencionava deferi-la, sob o pretexto de ser paciente de “de doença mental”), mas recusou cumprir a ordem do Posto de Comando na Pontinha, de sair da cena e deixar o comando para o Major Corvacho; no seu entender, os chefes do MFA eram os Generais Spínola e Costa Gomes.

Em corolário a tantas horas de indecisão, a partir do meio-dia desse dia libertador emergiram no Porto não as massas populares de apoio, mas a turbamulta. Molestava-se pessoas, montava-se cercos aos quartéis da GNR, apedreja-se as esquadras da PSP e outras instituições do Estado, incendiavam-se carros, partia-se montras e assaltava-se lojas. Presenciei a Eng.ª Civil Virgínia Moura, que havia conhecido no contexto das obras da Ponte da Arrábida, como autora do projecto do nó e do viaduto de Sto. Ovídeo, em Gaia, a incitar a multidão e a alçar-se ao seu comando, para a temeridade de cercar e assaltar a PIDE – negligenciando o seu armamento.

Foi quando entrou em cena outro oficial também já fora da tropa e também Eng.º Civil – o Coronel Mário da Ponte (que me honrou com a sua amizade, durante mais de 40 anos). Foi para o Quartel-General, puxou dos galões, pôs a PM e a tropa na rua, a restaurar e a manter ordem pública, desmobilizou o cerco à PIDE, no dia seguinte mandou para casa o seu pessoal secundário e o seu pessoal estrutural foi largado no Alto da Carriça, na estrada de Braga, postura que manteve enquanto o Coronel de Inf.ª Passos Esmeriz, que comandava o RI 6, na Senhora da Hora, não foi assumir esse posto, por vontade da maioria dos oficiais dessa Região Militar.

Mário Soares e Álvaro Cunhal
Com o regresso de dois políticos, o optimista e exilado Mário Soares, vindo de Paris, que se apeou na Estação de S. Apolónia, no dia 28, e o céptico e fugitivo Álvaro Cunhal, vindo de Praga, que, no dia 30, desembarcou no Aeroporto da Portela, a revolta passou a tridimensional - os “capitães de Abril” e mais esses dois, como os corifeus do Socialismo…

Há camaradas da Tabanca Grande participantes na operação “Viragem Histórica”? Eu, no 25 de Abril, não pequei por omissão: voluntariei-me e fui recusado.

Naquele dia inicial inteiro e limpo (Sophia), estacionei o carro na Praça da República (então trabalhava no cimo da Rua do Almada) e dirigi-me ao camarada furriel que vi a comandar uma secção em posição de fogo, nos cruzamentos da Rua João da Regras e da Rua da Boavista. Admitindo tratar-se de exercício citadino, comentei o seu realismo e ele disse-me que não era exercício, era uma revolta para derrubar o Governo. Alertei-o do perigo do RC 6, ali tão perto, e ofereci-me a ir para a torre da Igreja da Lapa e fazer a vigilância aérea dos eixos de aproximação dos seus blindados, e ele desarmou a minha disponibilidade, dizendo-me que toda a tropa do Porto estava alinhada com a revolta. Eram 8H30 da manhã…

Naquele tempo também me sentia rebelde, ofereci os meus préstimos (intempestivos), o 25 de Abril recusou-os, mas, modéstia aparte, não deixou de me obsequiar: os Trabalhadores honram o 1.º de Maio como o seu dia e eu não só, mas também - é o dia do meu aniversário!

A celebração desta efeméride, via skype, por aquela meia dúzia de velhotes e “Capitães de Abril” sobrevivos, a cujo grupo etário pertenço, cercados por todos os lados pelo vírus Covid-19, a sua nostalgia de combatentes, no Ultramar e na Metrópole, ao serviço do seu Povo, ora em distanciamento social e em confinamento por um inimigo invisível, a sua exortação aos médicos, enfermeiros e demais pessoal do SNS, para personificarem os “capitães de Abril” da sua derrota, comoveram-me às lágrimas.

E, parafraseando o Almirante Pinheiro de Azevedo, protagonista de dois 25´s, o de Abril e o de Novembro: Não gosto de confinamento; chateia-me estar confinado.

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OBS:- Escolha e edição das fotos da responsabilidade do editor
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Notas do editor

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sábado, 25 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20902: 16 anos a blogar (4): Os dias de Abril, mês “de águas mil”, de Constituições, de Revoltas e de Revoluções, que mudaram Portugal (1) (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66) com data de 24 de Abril de 2020:


Os dias de Abril, mês “de águas mil”, de Constituições, de Revoltas e de Revoluções, que mudaram Portugal

A condição de reformado fez-me cliente assíduo (ou rato) de arquivos e bibliotecas, e, graças ao longo tempo em que me enfronhei no “Portugaliae Monumenta Historica” (5 grossos volumes), cheguei à conclusão de que D. Afonso Henriques foi o primeiro “capitão de Abril” da nossa História, ao ter escolhido esse mês para organizar e comandar a revolta do nascimento de Portugal.

Começou por se tornar soldado, ao auto-armar-se cavaleiro, “como os reis”, tomando em sua mão a espada e ungindo o seu bico com sangue do corte no seu pescoço e não com sangue do corte dos seus testículos, como era próprio dos dependentes; a culminar dois anos de reuniões conspirativas e como líder, no dia 5 (seria no dia 25?) de Abril de 1127, trocou a malta de Coimbra pela malta do Norte, “furtou” os castelos do Neiva e de Faria, “para fazer guerra à mãe” e fundar a nossa Nacionalidade.

Nuno Tristão
A Guiné que nos é tão cara, mátria de um lugar de memórias, que a História já regista no blogue LG&C, foi descoberta por Nuno Tristão, em meados de Abril de 1446, mas África a sul do Sahara já não era virgem de portugueses: parte da sua malta já havia andado a “inventar” o mulato pelas suas praias e ele pagou com a vida a sua ida para o mato nessa então Guinela.

No descobrimento do Brasil e Novo Mundo (a América), por Pedro Álvares Cabral, em finais de Abril de 1550, dois grumetes da sua malta navegante aproveitaram a ida à missa campal de Acção de Graças para desertar para o mato – são os primeiros “cara” da “invenção” do mestiço.

O rei de Portugal por uma semana, D. Pedro IV, em Abril de 1826, explicitou e outorgou a Carta Constituição da Monarquia Portuguesa, a nossa primeira Constituição abrilista e a nossa segunda Constituição vintista.

D. Maria II, a brasileira nossa rainha, em Abril de 1838, jurou a nossa segunda Constituição abrilista e 3.ª Constituição da Monarquia Portuguesa.

A redacção da 1.ª Constituição Política da República, a nossa 3.ª Constituição abrilista e a 4.ª de Portugal, foi iniciada em Abril de 1911.

A “Operação Georgette" do exército alemão, desencadeada em Abril de 1918, derrotou na Flandres francesa o Corpo Expedicionário Português, sob a dependência do comando inglês, - a Batalha de La Lys. Em 22 dias de combates, os soldados portugueses sofreram quase tantas baixas como as sofridas nos 13 anos da Guerra do Ultramar do nosso tempo.

(Foi na 1.ª Grande Guerra. Se Portugal não tivesse entrado, o seu Ultramar seria perdido para a Alemanha ou Inglaterra, mas a nossa geração teria sido poupada à sua guerra, desencadeada em 1961). A Constituição Política da República Portuguesa, explicitada pelo Estado Novo, que nos fará conhecer a geografia da Guiné e andar durante dois anos aos tiros e a bombardear as suas matas e bolanhas, entrou em vigor em 11 de Abril de 1933, sendo a nossa 4.ª Constituição abrilista.


Adiante, adiante, a dar lugar a memórias do nosso tempo.

O guineense Amílcar Cabral, jovem eng.º agrónomo, benfiquista ferrenho e putativo génio inspirador e o motor da liquidação do Império português, em carta de Abril de 1950 à sua namorada, a colega flaviense Maria Helena, opinava essa Constituição como “dos mais belos documentos da igualdade dos homens (…) com práticas diametralmente opostas”.

Salazar esconjurou o golpe palaciano de 11 de Abril de 1961, a abrilada da sua demissão, da autoria do seu ministro da Defesa, General Botelho Moniz, não obstante apoiado pelo seu ex-PR General Craveiro Lopes e inspirado pela embaixada dos Estados Unidos; outra oportunidade que nos teria livrado de dar com os costados na Guerra da Guiné.

O nosso conhecido navio Niassa zarpa de Lisboa, em 21 de Abril desse ano, carregando o primeiro contingente de tropas – a decisão de Salazar, de “rapidamente e em força para Angola”, que assumira o ministério da Defesa.

A 4.ª Comissão Especial entrou e andou clandestinamente no sul da Guiné, entre 1 e 8 de Abril de 1972, chegou a Cubacaré e conseguiu dependurar a bandeira da ONU no galho duma árvore.

José Medeiros Ferreira
Em Aveiro, realizou-se nos princípios de Abril de 1973 o 3.º Congresso da Oposição Democrática, com o beneplácito da lei e a presença de alguns oficiais da Marinha e do Exército, putativos “capitães de Abril”, a primeira reunião pública em que foi publicamente advogado o início das conversações, pelo fim das guerras do Ultramar. A mudança de regime à mão armada não foi abordada e a tese do socialista Medeiros Ferreira (lida pela sua mulher, pela sua situação de desertor) de Descolonizar, Democratizar e Desenvolver, foi ruidosamente contestada pelas correntes de opinião revolucionárias, marxista e maoísta.

Na esteira desse congresso, em 14 de Abril desse ano, um grupo de ex-oficiais milicianos, evocando que “não seriam a geração da traição”, anunciou a organização do I Congresso dos Combatentes, a realizar em princípios de Junho, livre de antagonismos e de facções, a sua comissão executiva central era formada por três oficiais deficientes da Guerra do Ultramar e o seu Presidente da Mesa será o General Reformado António Augusto dos Santos, a pedido do ministro da Defesa.
A reunião da malta do QP, no Agrupamento de Transmissões da Guiné, resultou na contestação de 51 oficiais à motivação e ao conteúdo do Congresso dos Combatentes, o oficial guineense Marcelino da Mata e o oficial cabo-verdiano Rebordão de Brito, condecorados com a “Torre Espada”, foram os subscritores do telegrama de repúdio, o General Spínola proibiu a representação da Guiné e o Ministro da Defesa proibiu aos militares do QP da sua representação. Pouco depois e cavalgando a onda das reacções corporativas da classe dos Capitães aos Decretos-Lei n.º 353 e 373/73, “do Curso de Promoção a Capitães Milicianos”, os então Majores Ramalho Eanes e Carlos Fabião, prós e o Capitão Vasco Lourenço, fogoso anti-spinolista, recolheram centenas de assinaturas de contestação e de requerimentos de demissão de Capitães do QP.
A comissão executiva lisboeta do Congresso dos Combatentes correspondeu à turbulência criada pelos prós e contras ou pela direita e a esquerda com a demissão, o Dr. José Vieira de Carvalho, ex-alferes miliciano combatente, presidente da sua comissão no Norte e Presidente da Câmara Municipal da Maia agarrou a sua organização e dinamização, a dar nas vistas com os “rateres” do escape e com o amarelo-torrado do seu Renault 5 – a novidade automobilística na altura – mas demitiu-se, ao chegar a hora.

Gen António de Spínola
O General Spínola reuniu em Bissau cerca de 400 oficiais do mato, em 16 de Abril de 1973, para lhes dar directivas e lhes anunciar o “fim da guerra” da Guiné, convicto da situação de fraqueza do PAIGC, confiante no êxito dos três Majores na negociação da rendição premiada dos seus bi-grupos no Chão Manjaco e optimista quanto ao efeito dominó dessa rendição nos combatentes das regiões Leste e Sul.
O Capitão Vasco Lourenço, comandante da quadrícula de Cuntima, criticou essa sua táctica e estratégica com tal veemência, que ele o tomou de ponta.
De facto, o PAIGC aproveitou-se do contexto da trégua para essas reuniões no Chão Manjaco para reabastecer os seus combatentes na região Norte, e, em 20 de Abril, correspondeu ao dia D dessa manobra com o assassinato desses três Majores negociadores e dos seus quatro acompanhantes.

Duas semanas depois da reunião de Bissau, o General Spínola aterrou na tabanca de Cuntima, em visita de inspecção ao comando do Capitão Vasco Lourenço e à sua CCaç 2549, pegou-lhe por tudo e por nada, ameaçou-o com a transferência para Jolmete, a fazer a aprendizagem de comando com o seu capitão miliciano e mandou distribuir uma circular pelas unidades, a divulgar o seu relatório acerca da inaptidão do Comandante da Companhia de Cuntima.

A companhia a nomadizar em Jolmete era comandada pelo transmontano António Carlos Almendra, alferes miliciano graduado em capitão, ora Coronel na reforma, merecedor de 15 louvores e de 10 condecorações, então camarada do camarada e tabanqueiro Manuel Resende. Diz-se que durante os 18 meses do exercício desse comando, ele fora sempre abonado do soldo de alferes e que a diferença para o soldo capitão terá saído do próprio bolso do General Spínola.

Mas o General Spínola e o Capitão Vasco Lourenço não se ficaram por aqui.

O I Congresso dos Combatentes, mais ou menos nacionalista, decorrerá de 1 a 3 de Junho de 1973, no auge das violentas batalhas dos 3 G´s – Guidaje, Guileje e Gadamael -, travadas pelas reservas de infantaria e pela parafernália da artilharia de última geração do PAIGC, planeadas e comandadas por oficiais do exército regular cubano, que nos custaram 63 mortos e 269 feridos militares, 15 mortes e 18 feridos civis e 6 aviões abatidos – 4 DO e T6 de pistão e 2 Fiat G 21 de propulsão.

O Tenente-Coronel, Comandante do Agrupamento de Transmissões da Guiné e anfitrião da reunião anti-Congresso dos Combatentes irá hospedar-se no Palácio da Praça do Império, e sentar-se na cadeira que fora do General Bettencourt Rodrigues, alçado pelo “golpe de Bissau”, em 26 de Abril de 1974, e o COPCON lisboeta catrafilará o Dr. Vieira de Carvalho no Forte de Caxias, durante 9 meses, sob ameaças de fuzilamento, acusado do delito de organizador desse Congresso e como fundador e dirigente do Partido do Progresso.

O I Congresso dos Combates funcionou de embrião ao MFA, Movimento das Forças Armadas, acontecera o advento da revolta do 25 de Abril e o Capitão Vasco Lourenço como o seu profeta.

(Continua)
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Nota o editor

Último poste da série de 23 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20893: 16 anos a blogar (3): o obus de Bambadinca (foto do Frederico Amorim, autor da página "Mundo do Fred", 26/4/1997)

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Guiné 61/74 - P19767: (In)citações (130): As Comemorações de Abril, A Memória e a História (José Manuel Matos Dinis, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2679)

Com a devida vénia ao fotógrafo Alfredo Cunha


1. Por proposta de José Marcelino Martins e concordância do autor, aqui deixamos este extenso, mas interessante artigo de opinião sobre as Comemorações do 25 de Abril de autoria de José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71).

Originalmente publicado no seu facebook em 5 partes, por ser um pouco longo, optamos por publicar tudo de uma só vez aqui no Blogue.


AS COMEMORAÇÕES DE ABRIL, A MEMÓRIA E A HISTÓRIA - Parte 1

1 de Julho de 1972. De Lisboa para Bissau, um meio aéreo da FAP transportou três capitães, a saber: Jorge Golias e Matos Gomes, oficiais do QP, e José Manuel Barroso, miliciano, este com destino ao Gabinete de Informação e Comunicação do ComChefe.

Golias viria a publicar um livro, no qual afirma que os três estabeleceram uma interessante conversa sobre a condição política e militar que afectava o ultramar português. Chegados a Bissau comprometeram-se a reunir e alargar as conversas a novos camaradas, o que terá acontecido. O autor reivindica para o mencionado encontro a génese do golpe militar.
Sobre as razões apressadamente reunidas para justificação da insubordinação militar: democracia, desenvolvimento e descolonização não fez qualquer referência.

Naquela época - 1972 - a situação militar nos territórios ultramarinos podia caracterizar-se assim: controlada na Guiné e em Moçambique; dominada em Angola.

Naquele tempo, a Guiné era um pequeno território com cerca de trezentos mil habitantes, de escassos recursos e infraestruturas, onde se vivia uma economia de guerra. A política "Por Uma Guiné Melhor" parecia dar resultado e as massas apoiavam o regime. A guerra movida pelo IN era descontrolada e tanto afectava as NT como a população condicionada às minas, aos assaltos e às flagelações. Eram os portugueses que lhes prestavam o auxílio possível sempre que afectadas. Angola e Moçambique, pelo contrário, apresentavam notáveis índices de desenvolvimento e crescimento económico e social, entre 8 e 10% na costa oriental, e 20% em Angola. Eram sociedades em rápido processo de educação e modernização, tanto de equipamentos públicos como empresariais, e altamente exportadoras.

A metrópole registava índices de crescimento económico de cerca de 7%, e crescia em todos os domínios, salientando-se a melhoria dos salários, que então permitiam maior desafogo, melhoria na habitação - quando se desenvolveram grandes urbanizações em Oeiras, Amadora, Sintra, Loures, Almada, Barreiro, para só falar na cintura de Lisboa. Havia muita capacidade de absorção de mão-de-obra, nos serviços, na indústria e na função pública. Os automóveis particulares aumentavam exponencialmente, as casas para além de electrodomésticos, passavam a contar com televisão e gira-discos. O Algarve, embora mal servido de acessos, já era destino de férias de muitos nacionais. O fim-de-semana à inglesa generalizara-se, e começava o modelo americano, com folga de dois dias. Politicamente assistira-se à regularização dos esquemas da segurança-social, CGA/MSE e CNP.
O País vivia em equilíbrio económico-financeiro, com elevadas reservas em ouro e divisas, e sem dívidas ao estrangeiro.

Entretanto dava-se a revolução sexual, e a luta da mulher pela igualdade de direitos, acompanhava a luta de salário igual para trabalho igual. A mulher saía de casa e dirigia-se para o trabalho em condições idênticas às dos homens. Vulgarizava-se o uso da mini-saia, das roupas cingidas e dos generosos decotes. Na praia também era adoptado o biquini, e a mulher prosseguia o caminho da independência pela sedução. As jovens mulheres de alguns capitães também se enquadravam nesta onda, e eram frequentes as intrigas que afectavam os casais, ou os maridos mobilizados em África.

Em 1973, com o recrudescimento da guerra na Guiné, a que os poderes político e militar não deram resposta adequada, a situação sofreu perturbações. Os militares exigiam mais equipamentos e mais contingentes, a que Caetano não respondia, nem evitava esse mal-estar institucional, chegando ao ponto de propor a entrega do poder aos militares, que rejeitaram. Apesar de sobre a questão ultramarina, Espanha França e Alemanha darem apoios políticos a Portugal, e os EUA revelarem maior compreensão às teses portuguesas, o Governo mostrava-se tolhido. Outras nações, pontualmente, também se associavam com apoios.


AS COMEMORAÇÕES DE ABRIL, A MEMÓRIA E A HISTÓRIA - Parte 2

Em 26 de Dezembro de 1971 Spínola despediu-se de um contingente militar que regressou à metrópole. Discursou como habitualmente, e referiu que os "traidores" estavam na retaguarda. Não os mencionou, mas é fácil inferir que se dirigia a elementos do Governo Central. Já andava às turras, e a partir de 1973 parecia querer tudo, para combater o que antes parecia ter controlado, o IN.

Entre aquelas datas deu bastas provas de querer vir a ser Presidente da República. Desdobrava-se em entrevistas e fomentava reportagens. Parecia um senhor da guerra, um líder incontestado. No entanto, tenho dele amargas recordações, como as que deram ocasião ao assassínio de três majores, um alferes e uma praça. Foi muita e grave a ingenuidade do General. Não ficou por aí. Ambicioso, deixou-se seduzir pela ideia de invadir Conakry, o que seria natural num acto de guerra contra o IN. O auto-proposto Comandante e criador da ideia, é que não soube combater a outra ideia de promover um golpe de estado noutro país, o que não teria sido mau de todo, se não tivesse havido tantas fugas de informação que ditaram o falhanço quase total da operação invasora. Eram ambos muito ambiciosos e descuraram aspectos essenciais. Queriam a glória de engalanar a História de Portugal, mas os resultados foram fracos e poderiam ter sido piores, conforme o testemunho de um importante e destacado participante (não o cito por estar vivo). Mas o ComChefe ainda deu mais provas de desnorte, fechando, reabrindo e voltando a fechar aquartelamentos; permitindo novos aquartelamentos com a água à distância (v.g. Guilege e Bajocunda); mandando tapar as valas de protecção a Pirada com o argumento de que aquela era uma região pacífica e controlada, embora poucos dias após tenha ocorrido um milagre a favor das NT em resultado da invasão da localidade durante uma projecção de cinema.

Spínola também não foi capaz de controlar o erário, pela criação de equipas de auditoria para disciplina da quadrícula, promoção ao bem-estar físico e moral da tropa. Foi um ver se-te-avias, com os maus resultados que se adivinham, embora os relatórios, de baixo para cima, mencionassem sempre o elevado moral do pessoal. Mentira!
O General também parecia estar a jogar em dois campos: com o prestígio internacional, que o obrigava a mostrar aceitação pelo "politicamente correcto", e com a desculpa da insuficiência de meios para a defesa daquele torrão pátrio. Foi quando, com os outros comandantes-chefes, rejeitou a tomada do poder proposta por Caetano.

Com o aparecimento dos Strela - mísseis terra-ar que provocaram alguns estragos iniciais, acentuou-se o sentimento de perturbação e o desejo de muitos militares pelo abandono do território. A guerra era feita em grande parte pelos milicianos, e os capitães em geral procuravam a segurança dos aquartelamentos. Havia dignas excepções, mas eram isso mesmo excepções. Com isso, alastrava a falta de liderança sobre o pessoal, com a consequente quebra da disciplina. S.Exa. também elegia os favoritos e os trastes, por vezes com critérios de pouca compreensão e aceitação. Na transição de 73 para 74, face à acumulação de erros que pareciam dar vantagem ao IN, já o MFA levava adiantada a sua vocação de protesto, e avançava à luz-desarmada com a sua campanha de abandono dos territórios africanos.

Todos sabiam. Sabia a PIDE, os altos comandos militares e o Governo.
Ninguém, nem os mais moralistas, se empenharam na defesa de quantos se bateram pela Pátria, metropolitanos e africanos, dando do País a imagem de cobardia e traição que desqualifica os povos. Entretanto, formara-se no exterior, o Partido Socialista, que em 25 de Abril teria 20 a 30 militantes, conforme refere Rui Mateus na sua obra "Contos Proibidos".
Pouco antes, PCP e PS assinaram um pacto de cooperação contra o Governo e por um novo regime pretensamente democrático.

Em resultado da luta dos movimentos de libertação contra o designado colonialismo português empurrados pela miopia e desinteresse ocidental para os braços da URSS, os anos decorridos, as diferentes circunstâncias que afectavam os mobilizados, e a intensificação da luta na Guiné, dariam lugar ao chamado Movimento dos Capitães, que derrubaria a ditadura do Estado Novo. Esse movimento "pacífico", sem oposição e sem objectivos políticos claros, alegadamente provocado por razões de natureza corporativa - o governo derrogara a lei relativa à progressão dos capitães milicianos, e pela derrota psicológica dos militares portugueses que levaram ao abandono dos territórios, daria lugar a um período de enorme perturbação e ruína, quer em termos materiais, quer em termos morais e anímicos, de que o País ainda sofre, com consequências impossíveis de avaliar, como tentarei mostrar numa terceira parte. A glória da miséria estava para chegar.


AS COMEMORAÇÕES DE ABRIL, A MEMÓRIA E A HISTÓRIA - Parte 3

A guerra de África que assolou os territórios portugueses a partir de 1961, ocorreu em plena "guerra fria", período dominado pela rivalidade das duas grandes potências, ambas interessadas na expansão e domínio das regiões sob as suas influências. Os EUA contavam desde a 2.ª GGM com parte ocidental da Europa, a mais desenvolvida, com algumas regiões asiáticas, a Oceânia e as américas, com excepção da pequena Cuba. Por seu lado, a Rússia dominava os países da Europa oriental sob a URSS, como se todos esses povos comungassem do mesmo entusiasmo. Ainda estendia influências noutras regiões asiáticas, e, enquanto beneficiária estratégica da Conferência de Bandung, mostrava-se a maior colaboradora dos novos países afro-asiáticos que saíram dos diferentes regimes coloniais. Acolhia e formava os jovens dos movimentos emancipalistas, que também instruía e municiava. A África era a sua principal área de influência, e território de conhecidas reservas minerais.

Em 1973 formou-se o Partido Socialista, que logo foi acolhido pela Internacional Socialista, uma organização de países de índole social-democrática, em geral desenvolvidos e instruídos. Entre eles, avultava a Suécia, onde Olof Palme mostrava toda a vontade de acabar com os regimes coloniais, e exercia grandes pressões para que os territórios naquela condição colonial, ascendessem às respectivas independências. Quer isto dizer, que um teórico esforçava-se para libertar o mundo "colonizado", sem dele mostrar ideias coerentes sobre as multidões que se propunha libertar, nem as circunstâncias em que essas regiões viviam e conviviam. Os territórios de influência anglófona, francófona, italiana e espanhola, logo consubstanciaram pelo abandono o slogan dos "novos ventos da história", que deram origem a novos países ditos progressistas, porque acolhiam-se à área de influência russa. O PS de então tinha beneficiado da generosidade de Palme, Brandt e Janitschek - 1.º Ministro austríaco, quer em meios políticos, quer em apoios financeiros, que se prolongaram por vários anos. Donde, politicamente, os socialistas portugueses não poderiam afastar-se com notoriedade, e ficavam vinculados à ideia da descolonização, sem que essa fosse ou não debatida como a melhor solução para africanos e portugueses. Por esta ocasião, cerca de metade do contingente militar que combatia os movimentos era proveniente dos recrutamentos locais, o que também poderia ter sido entendido como uma demonstração de vontade desses militares para continuarem portugueses. Condição que verifiquei mais de vinte anos depois, quando fiz deslocações ao interior da Guiné e de Moçambique, onde era abordado calorosamente por indivíduos da minha geração, que ainda se reivindicavam de portugueses, e exibiam cartões de identificação civis e militares. Portanto, os socialistas em geral, nacionais ou estrangeiros, estavam vinculados a uma ideia teórico-política sobre a descolonização, também ela representativa de interesses próprios de sobrevivência. De qualquer modo, era intolerável a intromissão desses países nas orientações internas de outros, para mais membros comuns da EFTA.

Na metrópole, entretanto, dava-se continuidade ao projecto de Sines, que pretendi consagrar a "zona do escudo" face aos eventuais boicotes externos, mas tinha virtude de desenvolver o País com vista à auto-sustentação económica. Foi um projecto muito arrojado, que ficou a meio caminho dos objectivos, e poderia ter estimulado a novos desenvolvimentos.

Entretanto, Spínola regressara à metrópole em nítido conflito com o Governo, e deixou no ar, fruto da sua ambição, a ideia de que poderia apadrinhar o movimento dos capitães.
Enquanto isso, os principais órgãos de comunicação-social davam à luz muitas notícias de sinais contrários à política prosseguida, muitas vezes com origem em fontes ou jornalistas comprometidos, que a censura não detectava ou não podia neutralizar. Também os estudantes aumentavam o banzé sobre o destino próximo da mobilização para a guerra, que efectivamente já durava em demasia. Havia, pois, uma predisposição para uma mudança, pese embora que não se sabia para quê.
A par disso, a população branca nas colónias aumentava significativamente, porque os desmobilizados tinham encontrado ali excelentes oportunidades profissionais e para organização das suas vidas. Muito longe iam os tempos coloniais, apesar da estratificação social característica de povos nos inícios do contacto com a civilização. Crescia o número dos casais mistos, e consequentemente dos filhos mulatos. Também a Administração e empresas empregavam muitos funcionários e gestores, em ambiente de grande harmonia. Dizia-se de Angola, que seria um novo Brasil.


AS COMEMORAÇÕES DE ABRIL, A MEMÓRIA E A HISTÓRIA - Parte 4

Em 1974 Caetano estava abúlico e o Governo tinha a noção de estar a prazo. Digamos que fazia a gestão corrente, desejoso de ser substituído.
"Em Maio de 73 promoveu-se na Guiné a primeira tomada de posição colectiva de grande notoriedade. Foi a propósito do chamado Congresso dos Combatentes do Ultramar, uma iniciativa de antigos oficiais milicianos, apoiada pelo Governo", que na Guiné teve resposta negativa. Em 17 de Agosto, em Bissau, o alargado grupo de capitães antes referido, reuniu para análise de um carta a enviar às altas instâncias políticas e militares. Era em tom duro, e foi amenizada em virtude de várias opiniões, o que gerou a intervenção de Golias, que disse ter sido tão suavizada, que parecia uma carta de amor, e acrescentou, que também deviam ter discutido a guerra, que só poderia ser resolvida com o fim do regime, o que se conseguiria com uma revolução. Estava dado o mote. A carta foi enviada e assinada por cerca de cinquenta oficiais, mas as autoridades não reagiram, melhor, promoveram os capitães mais antigos. Quando Bettencourt Rodrigues tomou posse, já o Movimento dos Capitães estava lançado. Conforme descreve Golias, em finais de 73, Matos Gomes regressou de férias na metrópole e carregava uma pilha de livros "Por Uma Democracia Anticapitalista", de Sottomayor Cardia, que revendeu a preço de custo. Foi esse livro que pôs muitos capitães em contacto com a política, uma espécie de manual escolar que lhes permitiu sentirem-se preparados para a revolução. Golias, ingenuamente, ainda acrescenta o estímulo da leitura de "Textos Políticos", de Cabral, e evidencia uma frase inspiradora: "os nossos povos fazem a distinção entre o governo colonial fascista e o povo de Portugal: não lutamos contra o povo português". E fez fé! Também os portugueses nunca lutaram contra o povo espanhol, guerrearam contra o exército e a cavalaria de Espanha.

Quando Spínola publicou "Portugal e o Futuro", embora estribado pelas teses caetanistas do estado federativo, suscitou grande controvérsia entre os "duros do regime", os intelectuais abertos à liberalização das relações com o ultramar, os chamados europeístas, e a imensidão de patetas que gostam de pronunciar-se sobre o que não sabem, e não têm outros interesses específicos.
Por essa ocasião, e pelo indisfarçável andar da carruagem, Kissinger referiu que a tendência comunista para alcançar o poder em Portugal, seria um castigo bastante para a leviandade dos portugueses, mas preocupado com o resto da Europa do sul, onde os comunistas tinham atingido posições relevantes, deslocou-se a Moscovo para breve conversação sobre a partilha do mundo.

Entretanto, na metrópole já o "movimento" reunia muitas dezenas de oficiais, ingénuos e desconhecedores de como se governa uma nação, pelo que trago à lembrança um episódio pífio de um batalhão que se recusara a embarcar para Guiné, e seguira fraccionado em diferentes levas. Em Fevereiro de 74, o comandante desse batalhão urdia o seu plano para capturar o ComChefe e o Estado-Maior. Note-se, porém, que na política os serviços de informação e contra-informação desempenham importantes papéis, e em Março de 74 chegou a constar o boato de um plano do PAIGC para invadir a Guiné, coisa palerma, tendo em conta que eles seriam 5 a 6 mil guerrilheiros, e só a tropa de recrutamento local, que integrava companhias, pelotões e pelotões de milícias andariam pelos 20 a 25 mil elementos, incluindo um bom número de tropa especial. Houve portanto, um trabalho de desmoralização e desqualificação em relação ao inimigo, que fez exorbitar o desespero da tropa, e o desprezo pelos portugueses de cor.
Apesar de tudo, e decorrente de passagens narradas, Portugal talvez vivesse o período histórico de maior esplendor, pois crescia económica e financeiramente, modernizava-se em equipamentos e infraestruturas, e não tinha dívida externa, salvo a que respeitou a um sindicato bancário que financiava a obra de Cahora Bassa.


AS COMEMORAÇÕES DE ABRIL, A MEMÓRIA E A HISTÓRIA - Parte 5

Em 1974 ainda não havia MFA nem Programa. Segundo Sanches Osório, o Movimento dos Capitães tinha características exclusivamente profissionais: "eram apresentadas reivindicações que assentavam nas remunerações e que afectavam o prestígio dos oficiais do quadro permanente". Nunca tive oportunidade de conhecer as razões que afectavam o prestígio desses oficiais. Talvez as intrigas familiares que surgiam no meio castrense, e de que fui testemunha.

Em Fevereiro o Gen. Spínola publicou "Portugal e o Futuro". O marcelismo criou ilusões em sectores da oposição do que resultaram cisões. Era uma expectativa de primavera política, mas que esteve sempre condicionada aos duros do regime. Quer dizer, Caetano não foi capaz de provocar, não digo a ruptura, mas uma nova orientação no horizonte nacional, muito menos no que à guerra dizia respeito. Fez brandas reformas sociais, de que se destacou a regulamentação da Previdência e das relações laborais; e imprimiu algum dinamismo a projectos de industrialização e desenvolvimento. Mas os ultras do regime estavam interessados em persistir e torciam o nariz às mudanças. O livro de Spínola abordava com riqueza de argumentos o tema ultramarino, de vincada inspiração de Caetano, mas a corrosão da sua influência e a situação quente que se vivia, não lhe terá permitido apoiar o General, que por sua vez, confiava demais nos seus alegados méritos, e terá dado à estampa com o objectivo de alcandorar-se como favorito à presidência da República. Apesar de relevantes obras em curso tanto na metrópole como no ultramar, e do progresso económico e social constatados, o Governo foi incapaz de se impor, quer pela moralização do sistema, quer pela determinação dos militares em acabarem com a guerra, ainda que satisfeitas algumas exigências, se para tal fosse necessário. O azar, é que os militares já estavam decididos pela derrota consubstanciada pelo abandono de terras e gentes em África. Depois houve o episódio da apresentação da "brigada do reumático", a que faltaram os dois mais prestigiados generais, respectivamente Chefe e Vice-Chefe do EMFA. Nova e importante derrota para o regime, e impulso precioso para os capitães.

E chegou o dia, mais condizente com um filme de ficção, do que com a realidade revolucionária e perigosa que alguns militares gostam de fanfarronar.
Até o MFA pareceu apanhado de surpresa, dada a falta de confiança evidenciada pelos que ficaram a aguardar os acontecimentos, mas, principalmente, pela ausência de um Programa definitivo sobre o método e os objectivos do golpe, o que só viria a concretizar-se meses mais tarde na sequência de diversas alterações ao texto revolucionário. "As ligações políticas do Movimento dos Capitães foram realizadas pelo Maj. Melo Antunes o qual estava estreitamente ligado, através da CDE, ao Dr José Tengarrinha. Tudo leva a crer, assim, que o tom que foi dado às manifestações populares de apoio ao Movimento foi orientado pelo MDP/CDE, com conhecimento de Melo Antunes", cfr Sanches Osório.
Segundo o mesmo autor "o MFA estaria apenas unido em dois objectivos comuns: derrubar o Governo, e caminhar para o progresso e a justiça social. A forma de alcançar esse progresso e essa justiça social é que não foi analisada na altura". O MFA até ao dia D sabia que os portugueses não queriam para o ultramar uma política de terra queimada. Mas logo surgiram os adeptos do abandono imediato do ultramar, prova flagrante de que não tinham a mínima percepção, nem dos interesses envolvidos, nem das obrigações decorrentes da soberania, muito menos das condições que permitiam ao País viver com desafogo para o desenvolvimento que se registava. Apenas reproduziam "slogans" característicos da luta anti-colonial, o equivalente a terem bebido do IN a justificação para o seu acto revolucionário. Tal pobreza daria de imediato lugar a conflitos internos e à confusão no desenrolar da actividade revolucionária, tantas vezes criminosa.

Soares, líder de um mini-partido apoiado por centrais sindicais suecas e por uma fundação alemã, chegou em júbilo e apoiado por milhares ainda por converter. Cunhal chegaria a seguir, mais formal e recebido por Soares, que parecia conceder-lhe o lugar de primeiro combatente contra o velho regime. Todavia não se mostraram cooperantes na construção democrática por um estado digno e sadio. Ambos viriam a integrar o 1.º Governo Provisório, um grosseiro equívoco para um País pertencente à NATO. Depois, apesar da contenção da organização comunista que aproveitou as oportunidades, o processo terá sido condicionado pelo acordo entre Kissinguer e Brejnev sobre o destino português, estabelecido em Moscovo algum tempo antes.

Fontes:
"O Equívoco do 25 de Abril", de Sanches Osório;
"Revolução e contra-Revolução em Portugal (1974-1975)", de Armando Cerqueira;
"Contos Proibidos", de Rui Mateus;
"A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães", de Jorge S. Golias, para além de reflexões minhas e de outras leituras
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19707: (In)citações (129): Feliz e santa Páscoa, com um abraço transatântico do nosso camarada da diáspora luso-americana José Câmara (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73)