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sábado, 12 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4940: Filatelia(s) (1): Amílcar Cabral (1924-1973), "fundador da nacionalidade" (João Lourenço)

Guiné-Bissau > 4 selos, de 1, 2.5, 5 e 10 pesos, respectivamente, com a efígie de Amílcar Cabral (1924-1973), "Fundador da Nacionalidade", comemorativos da proclamação (unilateral) da independência, em 24 de Setembro de 1973.

1. Mensagem, de 4 de Julho de 2009, do nosso camarada João Lourenço, da Figueira da Foz
que foi Alf Mil, comandante do PINT (Pelotão de Intendência) 9288, Cufar, 1973/74) (*)

Assunto - Recordações da Guiné


Meu caro Luís Graça,

Encontrei, nos meus arquivos do tempo, esta recordação. Nem sei se, para além do valor sentimental, vale alguma coisa. Se entre os nossos bloguistas algum filantelista souber, que o diga... São, ao que julgo, a 1ª edição de selos da Republica da Guiné-Bissau e comprei-os lá.

Um Abraço
João Lourenço


2. Comentário de L.G.:

Meu caro João, obrigado pela tua lembrança. Em matéria de filatelia, a minha literacia é muito fraca, para dizer nula... Não sou coleccionador, mas reconheço que os selos têm (ou tinham), em muitos países (incluindo o nosso), um certo valor sentimental, estético, iconográfico, documental... Já aqui publicámos alguns selos, da época colonial... Vamos agora dar início a uma nova série, para publicar imagens digitalizadas de selos, tanto da época colonial (que circularam até Março de 1975), como da época posterior à independência. Que apareçam os filatelistas (há mais camaradas, como o Jorge Picado, o Beja Santos e a Henriques Cerqueira, a mandar-nos selos).
__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:

19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4377: Tabanca Grande (145): João Lourenço, ex-Alf Mil do PINT 9288 (Cufar, 1973/74)

20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4389: (Ex)citações (28): Ah! Grande Lourenço ou… confessando os nossos pecadilhos de Cufar 1973/74 (António Graça Abreu)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4415: (Ex)citações (29): A Guiné que todos temos um pouco na alma (João Lourenço)

terça-feira, 26 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4415: (Ex)citações (29): A Guiné que todos temos um pouco na alma (João Lourenço)

1. Mensagem de João Lourenço (*), ex-Alf Mil do PINT 9288, Cufar, 1973/74, com data de 24 de Maio de 2009:

Assunto: P4393 (**)

Li o artigo enviado pelo nosso companheiro Eduardo Alves, sobre a visita que fez à Guiné-Bissau....

Ao contrário de alguns, nada me choca na mensagem que o nativo de Pirada fez passar, ao dizer: - "Sim é a Guiné Portuguesa"... Eles são seres pensantes, podem não ter instrução nos nossos moldes, mas a cor da pele não lhes retira a capacidade de pensar, temos caucasianos que se esquecem mais fácilmente do que é importante para as pessoas... são vulgarmente conhecidos por políticos profissionais... não se lhes conhece emprego... só o de político...

Mas ainda a propósito deste encontro, relato um pequeno episódio, tenho mais, acontecido na Guiné no pós 25/04/1974.

Fiquei de conserva até 5/10/1974, dia em que me virei para o Cap. Clemente e disse:

- Tou farto desta m... vou-me embora. Comprei um bilhete de ida na TAP com o meu dinheiro e dei de frosques com uma guia passada à pressa no BIG.

Assim e entre muitas deslocações que fiz, esta é a parte interessante, estive em Farim a fazer a liquidatária. A dada altura um soldado do PAIGC veio cumprimentar-me, vinha fardado com o que restava de um camuflado nosso, chamou-me pelo meu posto e nome, tinha desertado havia uns meses do BIG ou de Cufar, não me lembro ao certo, e apresentou-me seu Comandante e legitimo representante do Povo da Guiné-Bissau... tudo bem, estávamos em paz. Dirigiu-se a mim com pose militar e disse-me:

- Coment sa vá?... Bien?

Fiquei siderado..., falo algum francês, melhor do que escrevo, e daí em diante foi a língua possível entre nós, porque nem crioulo falava. Penso que este episódio se encaixa na verdade escondida do que era e ainda é hoje a pobre Guiné-Bissau, de que todos nós trouxemos um pouco na alma.

Até dia 20.
Um abraço e publica o que achares interessante deste meu contributo para o blogue.
João Lourenço
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4377: Tabanca Grande (145): João Lourenço, ex-Alf Mil do PINT 9288 (Cufar, 1973/74)

(**) Vd. poste de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4393: Tabanca Grande (146): Eduardo Alves, ex-Soldado Condutor Auto da CART 6250 (Mampatá, 1972/74)

Vd. último poste de 20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4389: (Ex)citações (28): Ah! Grande Lourenço ou… confessando os nossos pecadilhos de Cufar 1973/74 (António Graça Abreu)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4377: Tabanca Grande (145): João Lourenço, ex-Alf Mil do PINT 9288 (Cufar, 1973/74)

1. Mensagem do nosso no tertuliano João Lourenço (*), ex-Alf Mil do PINT 9288, Cufar, 1973/74, com data de 18 de Maio de 2009:

Conforme prometido junto 2 fotos antigas e 3 actuais, deixo ao teu critério a escolha para o blog.

Um Abraço
João Lourenço


2. Comentário de CV:

Caro João Lourenço

Estás formalmente apresentado à Tertúlia com o envio e publicação das fotos da praxe.

Uma vez que vais estar presente no nosso próximo Encontro, será mais fácil reconhecer-te.

Deixo-te um abraço virtual e votos de boa saúde.
Carlos Vinhal
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 17 de Maio de 2009 >
Guiné 63/74 - P4366: Tabanca Grande (144): João Lourenço, ex-Alf Mil, PINT 9288, Cufar (1973/74)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4370: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é grande (10): Reencontrei o meu Comandante (Fernando Franco)

1. Mensagem de Fernando Franco, ex-1.º Cabo Caixeiro do Pelotão de Intendência (PIAD), Cufar, 1973/74, com data de 17 de Maio de 2009:

Assunto: Ao fim de 35 anos

Amigos Luís Graça e Carlos Vinhal,
o António Graça de Abreu disse que vocês mereciam uma estátua, mas eu digo que só isso era pouco.

Passo a explicar. O ex-Alf Mil João Lourenço foi meu Comandante de Pelotão. PINT 9288 de Cufar. Daí para cá nunca mais soube nada dele.

Assim, gostaria de deixar aqui a minha alegria por ele ter tropeçado no vosso/nosso blogue e dar-lhe as boas vindas.

É mais um membro da Intendência (bianda) para o nosso grupo e com muitas histórias para contar, pois passou uns maus bocados.

Fernando Franco


2. Comentário de CV:

O nosso Blogue, além de ser um repositório da história da guerra na Guiné entre os anos 1963 e 1974, tem proporcionado reencontros de camaradas que não sabiam de si desde a passagem à disponibilidade. Ao longo dos poucos anos que o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné leva na sua existência, tem proporcionado muitas alegrias, muitos reencontros e o refazer de amizades, não esquecidas, mas interrompidas.

Sou, eu próprio, um exemplo, pois acabei por encontrar, graças ao nosso Blogue, um ex-Comandante com quem tinha inclusive feito uma Operação, mas que o tempo acabou por apagar da lembrança. Recorrendo à memória e às fantásticas fotos que religiosamente guardamos, refazemos o passado e alimentamos uma amizade tão profunda quanto desinteressada.

Luís, para ti as minhas homenagens.
CV
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Notas CV:

(*) Vd. poste de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3943: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (5): Quero exprimir a minha revolta (Fernando Franco)

Vd. último poste da série de 13 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4335: O mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande (9): Sinofilias (Jorge Picado / António Graça de Abreu)

domingo, 17 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4366: Tabanca Grande (144): João Lourenço, ex-Alf Mil, PINT 9288, Cufar (1973/74)

Guiné > Região de Tombali > Cufar > Foto (obtida por Luís Graça) de um slide do António Graça de Abreu, apresentado no dia 2 de Outubro de 2008, na Biblioteca-Museu República e Resistência / Espaço Grandella, por ocasião da conferência do nosso amigo e camarada sobre o seu livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (2007), no âmbito do ciclo de conferências "Memórias literárias da guerra colonial" (I Série, 2008)...

Essa foto, carregada de luto, impotência e dramatismo, foi reproduzida no seu livro, página 201, com a seguinte legenda: "Buraco de mina-anticarro, na picada de Cufar para o porto interior"... Foi no dia 2 de Março de 1974, sábado, um "dia do diabo" (sic)...

Entre Cufar e o porto do rio Manterunga, numa picada que não teria mais de cem metros, batida milhares de vezes pelos jipes e demais viaturas militares, os guerrilheiros do PAIGC lembraram-se de lá deixar uma brinquedo de morte: uma vulgar mina anti-carro, reforçada por uma bomba de um Fiat (!) que não tinha explodido... Um jipe do pelotão da Intendência, o PINT 9288, comandado pelo Alf Mil Lourenço, accionou o engenho.

Os cinco ocupantes, dois militares, brancos (O Fur Mil Pina e o Sold Jeová), e três civis, estivadores, guineenses, encontraram aqui a morte (*)...

Mais à frente, outra mina, enterrada no lodo do rio, provocou a explosão, em cadeia, de batelões atracados ao cais e carregados de bidões de gasolina... Cerca de duas dezenas de estivadores perderam a vida... Um espectáculo dantesco, escreveu o António..."Vi coisas nunca vistas e que nunca mais quero ver"...

Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.


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1. Mensagem, de hoje, de João Lourenço:

Meu caro Luís,
"Tropecei" no teu blogue e gostava não só de me encontrar com o pessoal das nossas "férias tropicais" como de pertencer ao grupo e ir ao almoço de dia 20.

Fui o 1º Comandante do PINT 9288, estive lá em Cufar até ao terrível dia da morte do meu Furriel Pita e do Jeová no mesmo Jipe que eu próprio tinha conduzido na estrada para o porto interior nesse dia de manhã cedo, antes de ir em serviço a Bissau chamado pelo Cap Manuel Duran Clemente, meu 2º Comandante.

Estive no Hospital com o Pita o pouco tempo em que o coração dele resistiu ao destino que era inevitável. Hoje resta apenas a memória gravada no monumento em Belém de homenagem a todos os que deram a vida. Tal como a maioria, nunca soube o nome do Jeová, penso que estará homenageado no mesmo monumento.

Convivi com a CCaç 4740, o CAOP 1, ainda me lembro de alguns, poucos, bons momentos, como a célebre recepção aos piras em que lhes demos arroz com marmelada..., antes de vir a nossa janta reforçada, etc.

Lembro-me bem do Baía e de mais alguns, havia o Furriel Cardoso, um moço do Norte que era Bate-chapas... um 1º Cabo que ficou no BINT de Bissau, que era aqui da Figueira onde habito agora e que gostava de voltar a encontrar,etc.

Não percebo muito de informática mas tenho ajuda em casa, contacta-me logo que possível. 

Um abraço
Cumprimentos
João Lourenço
(Ex Alferes Miliciano Lourenço)

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2. Comentário de L.G.:

João: 
Sê bem vindo. Sabes que a "malta da bianda" nos era muito querida... Além disso vejo que és da Figueira: Temos vários camaradas daí, que já pertencem à nossa Tabanca Grande (António Pimentel, Vasco da Gama, Artur Soares, etc. - cito de cor). Vou tomar boa nota do teu pedido, incluindo a a inscrição no nosso encontro, a 20 de Junho. Vou publicar a tua mensagem, na série Tabanca Grande... Do CAOP 1, do teu tempo de Cufar, tens cá o António Graça de Abreu. E do BINT, o Baía (aqui na foto, à direita) bem como o Franco (que estava em Bissau).

Se tiveres, duas fotos digitalizadas (uma antiga e outra actual), seria óptimo. Se não, mandas mais tarde. Boa saúde para ti.

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3. Eis como o António Graça de Abreu saudou a entrada do novo membro da nossa Tabanca Grande:

Meu caro Luís:
Tu mereces uma estátua! Agora, graças a ti, descubro o Lourenço.
Junto cópia do mail que lhe enviei para teu conhecimento.

Vou para Macau 6º. feira, dia 22 de Maio. Regresso de Macau dia 5 de Junho. Lá vai ser lançado o meu último livro, Poemas de Han Shan. Han Shan é um homem fabuloso, meio budismo zen, meio quase tudo.

Claro que estarei no nosso encontro na Ortigosa, dia 20. Dia 3 de Julho parto para Xangai com os meus filhos (a minha mulher já lá estará) e só regresso de Xangai no dia 3 de Setembro. Não viajo para a China há quatro anos, vou-me reciclar.

Estarei sempre atento ao blogue e tenho quase toda escrita uma longa Carta Aberta a Salazar e a Marcelo Caetano que depois peço para tu publicares.

Obrigado pelo teu infatigável labor por todos nós.
Um abraço,
António Graça de Abreu

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4. Mail enviado pelo Graça de Abreu ao João:

Lourenço, caríssimo:
És um dos que faltava na minha lista de gente importante de Cufar. A companhia 4740 (os açorianos, o cap, Dias da Silva, etc.) já está, fui a dois convívios desses homens que foram nossos companheiros em Cufar.

Sou o alf mil António Abreu do CAOP 1. Vivemos no mesmo quarto durante uns meses, Junho a Novembro de 1973, creio. Fazíamos lá uns jantares meio-escondidos com frangos assados roubados do teu pelotão de intendência. Conto tudo isso no meu Diário da Guiné que quero que leias.

Depois de Cufar, foste para Bambadinca e Bissau.

Na altura eu escrevi um diário de guerra. Foi publicado em 2007, com o título Diário da Guiné. Lama, sangue e água pura [vd. capa, foto à esquerda].

Tu, Lourenço, entras no livro, até transcrevo na íntegra um aerograma que me enviaste de Bambadinca. Há dois anos não te pedi autorização para o publicar porque ignorava por completo o teu paradeiro.

Vou mandar-te o livro pelo correio, dá-me-me a tua morada e, se vais ao encontro do blogue Luís Graça e Amigos na Ortigosa, dia 20 de Junho, encontramo-nos lá. Faremos contas do livro e um esfuziante balanço das nossas vidas. Podes também telefonar-me.

Um abraço e até breve.
António Graça de Abreu

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5. Resposta do L.G. ao António:

António:
A estátua, não, muito obrigado. Mas a tua amizade, sim, acho que a mereço... Ainda bem que o 'puzzle' vai-se completando, ainda bem que tu encontraste mais um camarada de Cufar...Tens alguma foto do Lourenço? Podes mandar-me o aerograma digitalizada, que ele te mandou de Bambadinca?... Vou ver, agora com outros olhos, o teu Diário...

Quanto à viagem à China... Sabes o que se passou em Macau durante a Revolução Cultural? Se souberes algo sobre isso, escreve... Teve, de certo, influência na 'nossa' guerra... Que seja uma bela jornada para todos vós, a viagem à China... 
Luís

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6. Segunda mensagem do dia, enviada pelo João Lourenço:

Meu caro Luís, 
Vou precisar de mais informações, morada, para ir ter com o pessoal da "bianda" no dia 20 [de Junho, à Ortigosa]. Já entrei em contacto com o Abreu... um espectáculo. Sabes alguma coisa do pessoal dos outros PINT, o 9286, 9287 e 9285?

A única notícia que tive em muitos anos foi o falecimento precoce, por doença, do meu colega do PINT de Farim, que era do Porto, o Alferes Lima. Nada sei do Luís Beiroco, de Buba, nem do Carlos Mota, de Bambadinca.

Tinhamos no Pint 9288 um rapaz aqui da Figueira que era o nosso Cabo cortador/magarefe, ficou em Bissau sempre, talvez o Franco ou o Martins se lembrem e saibam dele. Se souberem avisem.

Um abraço
João Lourenço
___________

Nota de L.G.:

(*) Sobre a Intendência e sobre este dia negro para o BINT, em Cufar, vd. postes de:

23 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3229: História resumida da Companhia de Terminal e do Batalhão de Intendência (José Martins)

12 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3196: Em busca de...(39): Companhia Terminal (Bissau, 1973/74) (Daniel Vieira)

20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2462: Convívios (38): Minitertúlia da Intendência / Administração Militar, Belém, Lisboa, 18 de Janeiro de 2008 (Fernando Franco)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1195: Ameira: O nosso encontro fez-me bem à alma (Fernando Franco)

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3943: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (5): Quero exprimir a minha revolta (Fernando Franco)

1. Mensagem do nosso camarada Fernando Franco, ex-1.º Cabo Caixeiro do Pelotão de Intendência (PIAD), Cufar, 1973/74, com data de 26 de Fevereiro de 2009:

Amigos, há muito que ando afastado de escrever algo, mas não de visitar o nosso blogue e não fosse um conselho do meu psiquiatra, que em vez de me alienar de tudo sobre a Guiné, deveria fazer o contrário, porque me ia sentir e dormir melhor, se tal me agradasse como vinha acontecendo.

Como tal aqui estou revoltado, para me juntar a tantas outras vozes indignadas, com o que se escreve sobre nós , ex-combatentes.

Falam e escrevem como tivessem, alguma vez, sentido na pele o medo de morrer ou ficar mutilado, numa guerra que nos impuseram e a que não fugimos, simplesmente enfrentámos cada um à sua maneira... E como escreve o Mário Fitas, “fomos combatentes e não assassinos”.
Escreverem sobre as noites e dias sucessivos que passámos em alerta máximo nos ataques, patrulhas, colunas militares ou outras operações sempre com os nossos mil sentidos a funcionar em pleno, isso não merece a pena falar ou escrever, pois será que alguma vez aconteceu?

Apesar de ter sido um felizardo em relação a outros camaradas que frequentam o nosso blogue, digo bem alto e escrevo que passei por alguns momentos desses e que ainda hoje me atormentam com noites mal dormidas, momentos de solidão e má disposição, enfim igual a tantos outros camaradas que sofrem, ainda na pele, todos esses momentos nas nossas mentes.
Cada um tenta superar esses momentos de crise duma forma ou doutra e todos temos a certeza, os que estivemos na guerra “não fomos assassinos mas sim combatentes”.

Um abraço para todo o pessoal da Tabanca Grande
Fernando Franco

OBS: Negrito da responsabilidade do editor
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3942: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não asssassinos (4): Compreendo o que vos vai na alma (Virgínio Briote)

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3328: Memórias literárias da guerra colonial (7): O baptismo de fogo de A. Graça de Abreu, em Cufar, aos 17 meses (Luís Graça)

Guiné >Região de Tombali > Cufar> O António Graça de Abreu, no aeroporto de Cufar, em Dezembro de 1973, posando junto a umn heli, Allouette III. No mês anterior, o aquartelamento de Cufar tinha sofrido uma flagelação com foguetões 122, e um ataque com RPG [lança-granadas foguete] e armas automáticas, nas proximidades dos arame farpado... Dezete meses depois do início da comissão, o António recebia finalmente o tão desejado quanto temido baptismo de fogo. Recorde-se que o António Graça de Abreu foi Alf Mil, CAOP 1,Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar (1972/74)

Foto: © António Graça de Abreu (2008). Direitos reservados.


1. Com muita graça e alguma ironia, dizia há dias o Graça de Abreu que ele, na Guiné, tinha pertencido à "sacrossanta administração militar" (*) ... Tudo isto por que nunca se ter considerado "propriamente um operacional", muito embora estivesse integrado num comando de agrupamento operacional (CAOP1, localizado sucessivanente em Canchungo, Mansoa e depois Cufar, 1972/74).

Escrever um diário (secreto) aos 25 anos e decidir depois publicá-lo aos 60, é um acto de coragem mas também de grande maturidade humana e de honestidade intelectual. Não se trata de memórias, reconstituídas (e reconstruídas) muitos anos depois. Aqui é-se confrontado com factos e emoções em primeira mão. Aqui um homem faz strip-tease, desnuda-se, expõe-se em público... Não dá para fazer maquilhagem.

No seu livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Águi Pura (Lisboa: Guerra e Paz. 2007. 220 pp), o António revela e revela-se. Os seus leitores passam a saber muito mais coisas dele e sobre ele, relativos ao período da sua vida entre os 25 e os 27 anos, incluindo aspectos da sua vida íntima, para além da sorte e do azar na guerra e da sua vida e da vida dos seus camaradas, no dia-a-dia, no TO da Guiné, entre 22 de Junho de 1972 (quando chegou a Bissau) e 17 de Abril de 1974 (último dia em que escreveu o seu diário, na véspera do regresso a Lisboa, uma vez finda a comissão).

Na realidade, o António era um aspirante a oficial miliciano, com a especialidade de atirador de infantaria, e curso de dois meses de minas e armadilhas, que chegara a estar mobilizado para a Guiné (CCAÇ 3460 / BCAÇ 3863)... Só que à última hora teve de ser operado a "uma velha luxação crómio-clavicular no ombro direito" (pp. 53/54). Como consequência, foi reclassificado, por razões médicas, em "Secretariado, Serviço de Pessoal"... e desmobilizado. Nunca mais pensou no raio do Ultramar! Na época, era a Sorte Grande, a Taluda, o Euromilhões, para jovens como nós!...

Ficou, entretanto, como alferes amanuense, no Regimento de Infantaria 1, na Amadora, no batalhão de mobilização... Mas não há bela sem senão: acontece que o nosso camarada, ao fim de 2 anos de tropa, na Metrópole (tinha entrado em Outubro de 1970), tem o azar de voltar a ser mobilizado... e novamente para a Guiné... E desta vez para um CAOP.

Não ficou em Bissau, na guerra do ar condicionado - como dizíamos nós, operacionais, com desprezo, por quem ficava no back office, no bem-bom, "longe do Vietname" - foi para o mato, "um mato mais dócil, mas mato" (p. 16), chefiar uma secretaria... E ei-lo, em 26 de Junho de 1972, "sentado à minha santa secretária de guerra, com uma ventoínha por cima a refrescar"...
- E quanto a 'embrulhanço' ? - pergunta o leitor, curioso e já algo impaciente e incrédulo.

O tempo flui, corre, escoa-se, enquanto tudo, à volta, parece embrulhar (um termo que é,de resto, caro ao nosso autor), e o homem lá se vai prepando psicológica, mental, fisica e logisticamente para o inevitável baptismo de fogo ...

Passa o tempo de Cachungo (até 1 de Fevereiro de 1973) bem como o tempo de Mansoa (de 3 de Fevereiro até 19 de Junho de 1973)... Passam-se os meses e até o primeiro ano, e nada de baptismo de fogo. Claro, há a guerra ali tão próxima, os camaradas feridos e mortos... no mato. O nosso catecúmeno veio, ainda virgem, à Metrópole, de férias (sortudo, por duas vezes, primeiro em Novembro/Dezembro de 1972 e depois em Abril de 1973), até ser mudado, de armas e bagagens, para o temível sul... Ele e o seu CAOP1.

Cufar... "É melhor do que eu imaginava. Em termos de guerra, segurança pessoal, companheiros de armas e instalações" (25 de Junho de 1973, p. 121)... E foi verdade: passaram-se os meses, aproximava-se o ano da peluda (1974), e nada! O nosso alferes já se resignava a voltar para casa, sem o retemperador, iniciático, imprescindível baptismo de fogo... Até que... a coisa aconteceu (p. 159)...

Fica aqui o relato dessa cena - a sua primeira vez, debaixo de fogo - na primeira pessoa do singular. Espero que o António me perdoe o atrevimento, quiçá o abuso. Quis-lhe fazer uma pequena surpresa e, de certo modo, um homenagem, uma pequena homenagem.

Ele merece: além de ser actor, foi um observador participante, disciplinado, atento, informado e honesto da realidade político-militar do TO da Guiné, na fase terminal da guerra (estará em Cufar, no sul, até ao início de Abril de 1974)... Mesmo em condiçõs adversas, soube manter e escrever regularmente o seu diário e sobretudo conseguiu transmitir-nos (até agora, como ninguém, com grande riqueza de detalhes) o quotidiano, intra-muros, de três importantes aquartelamentos, em três regiões distintas - Canchungo (norte), Mansoa (centro) e Cufar (sul), que foram sede de comando de agrupamento operacional (CAOP).

Fá-lo com talento literário, mas também - e não menos importante - com sensibilidade, solidariedade, portugalidade, compaixão e sentido de humor. Embora situando-se, na época, politicamente à esquerda, o António não permite que as suas observações sobre a Guiné, a guerra, o PAIGC e as NT sejam deturpadas pelo viés ideológico... Recusa o estereótipo e o preconceito. É crítico em relação às suas fontes de informação. Não embandeira em arco (seja a favor do PAIGC, seja das NT).

Depois de viajar pelo mundo (e sobretudo pela China, que é a sua segunda pátria), o António regressou um dia, "lavando a alma na espuma das lágrimas", e em boa hora decidiu "desenterrar" o seu diário e os seus aerogramas, para fazer contas com o passado e partilhar connosco "o quotidiano da guerra da Guiné", numa época em que o PAIGC já usa contra nós meios tecnológicos da guerra convencional (morteiros 120, foguetões 122, mísseis terra-ar...).

De referir, ainda, que em Cufar o António conviveu (e fala desse convívio com apreço e amizade) com gente de outras unidades, de que destaco o Pel Int 9288 (representado na nossa Tabanca Grande pelo ex-1º Cabo António Baia) (**) e a açoriana CCAÇ 4740 (também muito bem representada, entre nós, pelo António Manuel Salvador, igualmente ex-1º Cabo Enfermeiro).

Mas demos à palavra ao nosso autor:

Cufar, 14 de Novembro de 1973

Vieram os 'jactos do povo', como os guerrilheiros lhes chamam. Gostei, desta vez não apontaram aos vizinhos do lado, era connosco e, como costuma acontecer, tivemos sorte. Foram disparados oito foguetões 122 e só rebentaram três, a mais de quinhentos metros de Cufar.

Eram oito da noite, eu estava no gabinete do capitão a jogar xadrez com o Eiriz, o alferes das transmissões, quando ouvimos o silvo de um foguetão e um primeiro rebentamento. Saltámos rapidamente para a vala situada ao lado do edifício onde já havia gente abrigada, caímos uns por cima dos outros e ficámos quietinhos, à espera. Uns dez minutos depois, porque não havia mais foguetões, saímos da vala, não muito assustados. Foi um ataque pequeno, daqueles que só servem para criar insegurança e medo.

O médico, o Bastos [, um antigo condiscípulo do Porto, no tempo do Liceu D. Manuel II], ficou por baixo de uma molhada de alferes e saiu da vala zangadíssimo, agastado com o Miguel Champalimaud (sobrinho do António Champalimaud, o 'tio Patinhas' português). O rapaz caíra-lhe em cima e, com os foguetões a rebentar, o Miguel peidara-se, cagara-se como um rei por cima da cabeça do Bastos. Uma cena de antologia digna do Chaplin, do 'Charlot nas Trincheiras da Guiné'.


Feitas as contas, nos últimos oito meses, o IN havia flagelado vários aquartelamentos na região, por diversas vezes. Retomando o diário do António(15 de Novembro de 1973, p. 159), "Catió 'embrulhou' seis vezes, o Chugué vinte, Cobumba doze, Caboxanque quatro, Cadique dez, Cafal quinze, Cafine catorze, Bedanda onze e Cufar apenas três".

Comparado com os vizinhos, os de Cufar podem dar-se por felizes, resume o António: "Não nos podemos queixar, somos uns privilegiados, vivemos no buraco mais seguro do sul da Guiné".

O António não perdeu o sentido do humor, depois desta primeira (ao que parece, se bem li o seu diário com atenção) experiência de contacto com o IN, na realidade, uma vulgar flagelação, à distância. Mas que metia respeito, metia... E por que não medo, como o António admnite explicitamente ? Se não sentíssemos medo, nunca poderíamos avaliar, correctamente, as situações de perigo, e decidir em conformidade "lutar ou fugir"...Foi o medo (e não a temeridade) que nos transformou em espécie biológica bem sucedida, em termos evolutivos. Foi o "flight or fight" que nos deu as competências para lidar com as situações de vida ou de morte, de risco, de perigo...

O nosso escritor aproveita, então, a seguir, a oportunidade para descrever, com muito humor, os apuros em que andou o "meu tenente-coronel B", periquito, aquando da flagelação a Cufar. Ele não assistiu à cena, mas socorre-se do relato, divertidíssimo, em primeira mão, dos "meus soldados" [do CAOP1] que foram testemunhas presenciais (pp. 159-160).

Cufar, 15 de Novembro de 1973

(...) Aos primeiros rebentamentos, o tenente-coronel atirou-se para a vala mais próxima do seu quarto. Vinha em tronco nu, só tivera tempo de vestir as calças. Já havia soldados abrigados e chegaram mais nuns tantos que se atiraram de cabeça para dentro da vala caindo aos molhos em cima do tenente-coronel.

A vala, além de enlameada, albergava um formigueiro de formigas baga-baga, uns bichos quase do tamanho de um dedo que trepam pelo corpo e mordem, têm umas pinças tipo caranguejo que espetam na carne e fazem sangue. Ora no fim do ataque, o pessoal começou a sair da vala, o tenente-coronel foi um dos últimos e guinchava de dor. Caíra e permancera mais de um quarto de hora em cima do formigueiro das baga-baga. As formigas haviam-lhe entrado pelas calças, subido até aos testículos e mordiam-no todo. Tinha ainda formigas espetadas nas costas. O nosso Chefe de Estado Maior metia pena. Tirara as calças em frente aos soldados e, em cuecas, com gritos de dor, uma a uma, ia arrancando as formigas que estavam cravadas no seu corpo. Tratou-se de uma cena nunca vista nos aerópagos da guerra" (...).


São cenas de guerra como estas que ficaram na memória daqueles homens e que eles um dia contaram (ou hão-de contar) aos seus netos...

Mas, depois disso, houve mais embrulhanços em Cufar, no tempo em que ele lá esteve (pp. 164-165):

Cufar, 26 de Novembro de 1973


" 'Embrulhámos' outra vez e hoje foi mais teso, mais duro. Os guerrilheiros atacaram apenas a um quilómetro de distância, a coisa foi rápida, uns dez minutos de fogo, a típica flagelação, o dispara e foge, mas palavra, desta vez tive mais medo, até porque me estreei a ver as granadas de RPG deixando o rasto luminoso, voando não para um qualquer aquartelamento nosso vizinho, mas em direcção a mim e rebentando não muito longe da minha cabeça. Não dá conforto nenhum" (...). (Negritos meus, LG).

O António consulta o calendário e conta os riscos que faltam para a peluda:

(...) "Faltam-me três meses e vinte e oito dias para terminar oficialmente a comissão. Agora, nestes últimos quinze dias, fomos flagelados por duas vezes. Não estou a gostar. Quantos ataques me esperam ainda ? É aguentar e cara alegre! Os guerrilheiros não me vão propriamente dar um enorme pontapé no cú e fazer com que eu entre de jacto pelas bocarras do inferno" (...)

Houve uma terceira flagelação a Cufar, de novo com foguetões 122, em 4 de Dezembro de 1973, às 9h15 da noite (p. 166)... Até que chegou o ano da peluda.

A 4ª flagelação a Cufar foi no dia 20 de Janeiro de 1974, às 10h da noite... O PAIGC fez questão de assinalar, em toda a região sul, o 1º aniversário do assassinato de Amílcar Cabral, atacando Gadamael, Cafal, Cafine, Cadique, Cobumba, Bedanda, Chugué e Catió, além de Cufar. O António lia a revista Vida Mundial e ouvia uma cassete com o Concerto de Aranjuez, do espanhol Joaquim Rodrigo. No momento do ataque, teve a brilhante ideia de gravar, por cima, outra música, esta de guerra, como ele nos conta no seu diário (21 de Janeiro de 1974, pp. 186-189) (***).

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 7 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3276: Memórias literárias da guerra colonial (3): O poder na ponta das espingardas, segundo A. Graça de Abreu (Parte I) (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

(***) Vd. poste de 6 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1499: A guerra em directo em Cufar: 'Porra, estamos a embrulhar' (António Graça de Abreu)

Ficheiro áudio com ataque a Cufar, 20 de Janeiro de 1974

Junto envio também uma transcrição de um ataque no dia 20 de Janeiro de 1974 e também um link com o ficheiro audio com o respectivo ataque.

http://pwp.netcabo.pt/0240632001/ataqueguine.mp3

Gostava muito de ver estes meus (nossos) textos no seu blogue da Guiné.
Abraço, António.

Cufar, 20 de Janeiro de 1974

(…)
Boum, boum, pum, catrapum, pum.
- Aí está, um ataque!...Caralho! Um ataque, foda-se!
Tá, tá, tá, tá, tá.
-Um ataque, caralho! Venham mais. Aí vêm elas!...
Boum, boum…
-Tumba, um foguetão, caralho!...
Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, pum.
- Dá mais, Manel! Estamos a levar no coco, estamos a embrulhar, caralho!
Pum, catrapum, tá, tá, tá, tá, tá, tá…
-Espera aí um bocadinho!
Boum…
-Espera aí que me eu vou-me já vestir, espera aí um bocadinho!
-Tumba, aí vem outra… Toma lá mais!...Espera aí um bocadinho, João…
Boum, boum…
-Estou-me a vestir, é preciso é calma!
Boum, pum, pum…
-Espera aí um bocadinho, estou-me a vestir, é preciso é calma.
Boum, boum…
-Estamos a embrulhar, caralho! É preciso ter calma. Estou no meu quarto. Hoje é o dia…
Boum, boum…
-Tumba, tumba, tumba!...
Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, pum, catrapum, pum...
-Espera aí. Eh, com um filha da mãe!
Boum, boum…
-Ah, grande embrulhanço! Manda mais, João!
Boum, boum…
-Toma lá mais!...
Tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, catrapum, pum, pum, boum, boum...
-Isto é a sério, isto não é a brincar.
Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, pum, pum…
-Olha p’rá aquilo! Porra, estamos a embrulhar, o que é preciso é calma!... Estou-me a vestir…
Boum, boum, tá, tá, tá, tá, pum, pum…
-Já estou vestido.
Boum, boum…
-Porra! Tumba, tumba, aí vem outra, aí vai outra!...
Pum, pum, pum, pum, boum, boum…
-Caralho!
Boum, boum, pum, catrapum, pum, pum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, boum, boum…
-Porra, estão todas a cair p’ra ali, caralho!...
Tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá…
-Aí vêm outras. Eh, eh, eh! Já estou vestido.
Boum, pum, pum, tá, tá, tá, tá, tá, tá, tá, boum, boum…
-Aí vem outra!
Pum, pum…
- Tumba! Devem vir mais.
Boum, boum…
- A lógica da guerra, pá, é impressionante! Eu estava aqui sossegadinho, pá, elas começaram a cair… Aí vêm mais, aí vêm mais!...
Boum, boum, tá, tá, tá, tá, tá tá, tá, tá, tá, tá, pum, pum, catrapum, pum, pum…
- Deixei-me estar sozinho aqui no quarto, mas estou nervoso! Os nossos amigos estão a lembrar-se de nós!
Pum, pum…
- Tumba, tumba!
Boum…
- Ah, Cufar de um caraças!... Eh, eh! Guiné, Guiné, 20 de Janeiro de 1974!.. Ah, caraças!...
Boum…
- Isto é morteirada! Ora bem, deixa lá apagar a ventoinha. Só mandaram estas?...
Boum, pum…
- Aí vai outra! Aí vem mais! Isto agora são morteiradas nossas. Aí vai outra!
Boum…
- Já acabou o ataque?... Vamos embora, já estou cá fora!
(Meti o gravador ligado a gravar no bolso da perna direita do camuflado e fui ter com os meus soldados.)
Boum, pum, pum…
- Toma, toma, porra! Aí está!...
Estão bem?...
Boum, pum, pum…
(Voz de soldado):
- Se calhar a minha tabanca deve estar mas é toda fodida!
Boum…
(Confusão de vozes).
- Foda-se. São nossas ou são deles, caralho? Já acabou, os gajos?...
(Voz):
- São nossas.
Boum…
(Voz de soldado)
- Não gravou isto, meu alferes?
- Está a gravar, oh, homem, está a gravar esta merda!
Boum…
- Já acabou. Aí vai mais, caralho! Quem é que está aí metido na vala, deitado no buraco?
Boum…
(Confusão de vozes)
- Aí vai mais uma, toma lá mais fartura!
(Voz de soldado):
- Isto é RPG que rebenta no ar e rebentou uma canhoada.
Boum…
(Voz de soldado):
- A minha chinela, perdi a puta da sapatilha.
(…)
- Os gajos já pararam. Agora são só nossas. Os gajos já não estão a mandar nada, agora é o obus de Catió.
(Voz de soldado):
- Carrega-lhe, é o primeiro ataque do ano. Os cabrões atacam até acabarem as munições. Mas cuidado com os gajos no fim do ataque…
(…)
(Confusão de vozes)
(Voz de soldado):
- Vê se encontram a minha sapatilha.
Boum…
- Oh, Loureiro (soldado condutor do nosso CAOP1), o que é que você está a fazer deitado no buraco?
(Soldado Loureiro):
- Estava entretido…
(Voz de soldado):
- Agora já acabou, mas pode vir ainda uma retardada, mas isso é pouca coisa.
(Voz de soldado):
- Eu vi o very-light no ar e depois, foda-se, foi sempre fogachal.
(Confusão de vozes)
(Voz de soldado ):
- Olha se eu estivesse na minha tabanca lá em baixo, deve estar toda fodida…
(…)
(Voz de soldado):
- Alguém viu a minha sapatilha?...
Boum…
(…)
- Espera aí que eu vou mijar, estou a precisar!
(Voz de soldado)
- Oh, meu alferes, não mije para dentro da vala, caralho!
- Oh, pá, não faz mal.
(Voz de outro soldado):
- Ora, um gajo, num ataque, mesmo com merda e mijo, e tudo, vai!
Boum…
(Voz de soldado):
- Eu perdi a minha sapatilha, isso é que foi o caralho!

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)







Guiné > Região de Tombali (Catió) > Cufar > Rio Cumbijã >1973 > Três fotos que documentam as brutais consequências do accionamento de duas minas, colocadas pela guerrilha do PAIGC junto ao cais acostável de Cufar e ao destacamento do PINT (Pelotão de Intendência) 9288 (1)... A viatura, onde seguia o Fur Mil Pita da Silva e mais militares (dois morreram), ficou completamente desfeita, tendo sido projectada a 100/150 metros...

O 1º Cabo Enfermeiro assistiu a esta tragédia... Numa das fotos pode ver-se a cratera originada pela explosão... O Fernado Franco não sabe se os dois soldados do seu pelotão que morreram, vieram ou não para Continente, ams ele fez Guarda de Honra aos seus restos mortais, "até Hospital de Brá"...

Um outra mina, escondida no lodo, foi accionada por um barco, ao atracar ao cais. O barco, que levava carga da Intendência, pegou fogo e ficou destruído...

Às vezes esquecemo-nos destes valorosos camaradas da Intendência que, à parte roubarem-nos uma ou outra caixa de uísque ou de cerveja, também corriam riscos de vida nos seus destacamentos e nas viagens que faziam pelas rios e braços de mar da Guiné, acompanhando as colunas logísticas...

Fonte de informação: Fernando Franco & António Baia, entrevistados na Ameira, em 14 de Outubro de 2006... (LG)

Foto: © Fernando Franco (2006). Direitos reservados.
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Nota de L. G.:

(1) Vd. post anterior, com data de hoje > Guiné 63/74 - P1283: Os nossos intendentes, os homens da bianda (Fernando Franco / António Baia)

Guiné 63/74 - P1283: Os nossos intendentes, os homens da bianda (Fernando Franco / António Baia)

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Guiné > S/d > Parte de um documento das NT, de contrapropaganda, em português e em crioulo de caserna, dirigido aos guerrilheiros do PAIGC e à população sob o seu controlo: "Bó presenta na otoridade: Tabanca está contente, tabanca tem bianda, tabanca tem doutor. No mato só mofineza, no mato só fome, no mato só muri"...

A bianda tinha um papel fundamental no moral das nossas tropas... À Intendência competia pôr, a tempo e horas, nos seus entrepostos os comes-e-bebes (do arroz às batatas, do uísque à cerveja) indispensáveis a cada uma das unidades de quadrícula ou de interveção, estacionadas no interior...

Foto: © José Teixeira (2006). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Vista aérea da tabanca de Bambadinca, tirada no sentido sul-norte. Em primeiro plano, a saída (lado leste) do aquartelamento e posto administrativo, ligando à estrada (alcatroada) Bambadinca-Bafatá. Ao fundo, o Rio Geba Estreito, por onde chegavam, vindos de Bissau - depois de passaram por pontos temíveis como a Ponta Varela e o Mato Cão - as embarcações civis, motorizadas, de pequeno calado, fretadas pelo BIG- Batalhão de Intência Geral.

Na foto, assinaladas com um círculo a amarelo, são visíveis as instalações do Pelotão de Intendência (PINT), junto ao Rio Geba. Por aqui passava grande parte do abastecimento em géneros, destinado às numerosas unidades da Zona Leste (que estava dividida em 5 sectores).O abastecimento dos frescos (legumes, fruta...) era, em geral, feito por aeronaves (DO 27), que também traziam o precioso correio...


Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71). © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.




Guiné > Bissau > Batalhão de Intendência Geral (BIG) > 1974 > O Fernando Franco, 1º cabo Caixeiro. Foto: © Fernando Franco (2006)

Guine > Região de Tomboli > Cufar > PINT 9288 > 1974 > O 1º cabo enfermeiro Báia. Foto: © António Báia (2006). Direitos reservados.

Já aqui falámos do nosso intendente Fernando Franco: esteve no BIG (Batalhão de Intendência Geral) em Bissau entre 1973 e 1974 numa CIAG (Companhia de Intendência de Apoio Directo). Desencontrámo-nos no 10 de Junho de 2006, em Belém, viémos a conhecer-nos, pessoalmente, na Ameira, a 14 de Outubro de 2006 (1).

No final de Junho ele mandou-me a chapa da praxe: "Luís, conforme o pedido aqui vai uma fotografia de quando ainda era magro, em Bissau, onde estive, de 20 de Abril 1973 a 11 de Setembro 1974. Como podes ver pela data a minha unidade, CIAD, foi quase das últimas a sair da Guiné"... Enquanto ouvia o Adeus, Guiné... e o barco ou o avião não chegava...

Mais recentemente (4 de Outubro de 2006), ele teve a gentileza de mandar-me os seus dados biográficos: Nascido e criado em Lisboa (Bairro da Graça), trabalhou e estudou de noite. Na tropa, tirou a especialidade em Administração Militar e embarcou para a Guiné como 1º Cabo Caixeiro, integrado numa CIAD (Companhia de Intendência de Apoio Directo), em 20 de Abril de 1973. A sua comissõa foi até mesmo ao fim da nossa presença na Guiné... Rgressou a casa a 11 de Setembro de 1974.

"Casado há 32 anos, tenho um casal de filhos e mais recentemente uma netinha. Profissionalmente passei pela área de escritório e contabilidade. Nestes últimos 16 anos, estive na área dos camiões pesados (compras de material), e actualmente estou no Desemprego, ou à espera da reforma. Seja o que Deus quiser! Um forte abraço. Fernando Franco"... Mora na Venda Nova, Amadora.

2. Outro camarada da Intendência, que eu conheci em 14 de Outubro de 2006, na Ameira (2), foi o António Báia, 1º cabo enfermeiro num PINT (Pelotão de Intendência)... É amigo do Fernando Franco (cujo e-mail partilha provisoriamente.

Reza assim a sua biografia: Nasceu em Beja em 1951, foi sempre bom rapaz, tendo trabalhado como serralheiro até assentar praça na mesma cidade em Janeiro de 1972. De seguida foi tirar a especialidade de enfermeiro em Coimbra, acabando por seguir para a Guiné, em Abril de 1973, integrado numa Companhia de Intendência, com sede em Bissau. O seu pelotão foi destacado para Cufar ( PINT 9288 – Cufar, Os Pioneiros). Regressando para o Continente em 11 de Setembro de 1974.

"Casei há 28 anos, tenho um rebento do melhor que se pode pedir. Profissionalmente e após findar o serviço militar, ingressei como funcionário Ministério Justiça, mas actualmente já estou aposentado. Um grande abraço. António Báia"... Mora nos Moínhos da Funcheira, Amadora.
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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 15 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira: foi bonita a festa, pá... A próxima será no Pombal (Luís Graça)


(2) Vd. post de 20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1195: Ameira: O nosso encontro fez-me bem à alma (Fernando Franco)