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terça-feira, 21 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25546: Viagem a Timor-Leste: maio/julho de 2016 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte II - A caminho das montanhas



Timor Leste > Com c. 15 mil km2, e mais de 1,3 milhões de habitantes, ocupa a parte oriental da ilha de Timor, mais o enclave de Oecusse e a ilha de  Ataúro. Antiga colónia portuguesa, tornou-se independente desde 2002, depois de ter sido  invadida e ocupada pela Indonésia durante 24 nos, desde finais de 1975.   Liquiçá (em tétum,  Likisá) é um município, visível neste mapa, com a capital na  cidade do mesmo nome, a 32 km a oeste de Díli, a capital do país. A cidade de Liquiçá tem 19 mil habitantes. Nas montanhas fica Manati / Boebau, onde a ASTIL construiu uma escola para crianças do pré-escolar e 1º ciclo.

Infografia : Wikipédia > Timor-Leste |  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné 





Lourinhã > Praia da Areia Branca > 2 de dezembro de 2017 > Por ocasião de um almoço de um grupo de amigos de Timor-Leste, no restaurante Foz: em primeiro plano, Rui Chamusco e Gaspar Sobral, cofundadores e líderes da ASTIL.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação das crónicas do Rui Chamusco, relativamente à sua primeira viagem e estadia de dois meses em Timor-Leste (partiu  de Lisboa a 5 de maio de 2016 e deixou Dili em 7 de julho, de volta a casa) (*). 

O Rui Chamusco, nosso tabanqueiro nº 886, é professor de música, do ensino secundário, reformado, natural do Sabugal, a viver na Lourinhã. Tem-se dedicado de alma e coração a um projeto de solidariedade no longínquo território de Timor-Leste (a 3 dias de viagem, por avião). É cofundador e líder da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor-Leste.

 A ASTIL irá construir e inaugurar, em março de 2018,  a Escola de São Francisco de Assis (ESFA), nas montanhas de Liquiçá (pré-escolar e 1º ciclo). 

A primeira viagem do Rui a Timor Leste, em maio de 2016, é exploratória mas é nessa altura que ficará decidido construir-se uma escola nas montanhas de Liquiçá, em Manati / Boebau. Nesta viagem (e estadia de dois meses) , fez-se acompanhar do luso-timorense Gaspar Sobral, outro histórico da ASTIL, que há 38 anos não visitava a sua terra natal.  Em Dili eles vão ficar na casa do Eustáquio, irmão (mais novo) do Gaspar Sobral.

Dessas crónicas de 2016,  sob a forma de diário, decidimos publicar a maior parte dos apontamentos,  dado o interesse documental que nos parece ter  para os nossos leitores que, como nós,  ainda sabem pouco da história e da cultura dos nossos amigos e irmãos timorenses.



Viagem a Timor: maio/julho de 2016 - Parte II:  a caminho das montanhas

por Rui Chamusco


(Continuação)

 Dia 14 de maio de 2016, sábado  – Dia de muitas emoções

Já estava previamente combinado. O Gaspar, aproveitando a sua estadia em Timor, quis reunir todo a família. É que ele atualmente é o irmão mais velho dos 5 ainda vivos. E como a irmã mais nova, a Benedeta, fez 52 anos há dias,  aproveitaram a ocasião para celebrar os dois acontecimentos. 

Agora imaginem a agitação e o reboliço quando todos estavam presentes: bebés, crianças, jovens, adultos, netos, tios, primos, cunhados, sogros – uma panóplia de parentescos capaz de embaralhar qualquer um. 

E no meio de tudo isto o malae (que sou eu) tentando adaptar-se a esta grande família dos Sobral que, segundo se crê, é a única existente em todo o território timorense. Tarde e noite muito animada pelos cumprimentos efusivos que a toda a hora aconteciam, e também, por que não, pelo som e as canções das crianças acompanhadas por mim no acordeão. 

À noite cantaram-se os parabéns à Bene que nos deliciou com o saboroso bolo de anos. Depois foi a ceia para mais de 50 pessoas. 

Para terminar o Gaspar fez o grande (fala que se farta) discurso da praxe – um momento emocionante que algumas vezes o levaram às lágrimas. Segundo entendi, tratava-se de um apelo à unidade da família, tentado justificar alguns desentendimentos havidos, apelando ao perdão e à união da família Sobral.

“Se Maomé não vai à montanha, vai a montanha a Maomé”

De manhã, mais uma viagem em mota para mandar fazer as fardas para a Adobe. Saltando poças e charcos porque tinha chovido muito no dia anterior, lá fomos rumo a Dili a caminho do alfaiate. Mesmo junto à berma da estrada, numa barraca das habituais, ali estava o artista rodeado de trapalhadas (farrapos, cadernos de apontamentos, fita métrica, máquinas de costura e outras coisas mais). Feito o negócio, vai de tirar as medidas certas à garota para que daqui a oito dias se possam vir levantar.

Mais uma pequena viagem e outra paragem para comprar sapatos e meias e algum material escolar. Loja chinesa. com certeza.

Depois foi a grande surpresa: visita ao David, um timorense que eu apoiei nos seus tempos de estudante em Coimbra e que eu só conhecia de voz por telefone. 

Também ele ficou surpreendido pois nunca pensou ser visitado na sua casa por alguém que ele sempre desejou conhecer. Várias vezes marcamos encontro em Portugal mas nunca se concretizou. Momentos agradáveis com a presença de bastantes familiares que iam chegando. 

Hoje o David trabalha com a primeira dama, mulher do primeiro ministro. E, claro, disponibilizou-se logo para o que for preciso, com vontade de que a gente se encontre em Dili.

Chegando a casa e já arrumadas as compras decidimos telefonar a D. Basílio, bispo de Baucau. Outra grande surpresa, sobretudo para ele, pois nunca teria pensado que o Rui estivesse em Timor. Basílio e eu fomos colegas de trabalho durante dois anos, na equipa de pastoral da comunidade emigrante de Gentilly nos arredores de Paris. Há 34 anos que não nos vemos. Está combinado um encontro nos próximos dias, em Dili. Espero dar- lhe aquele abraço que em tempos nos unia e fortificava. “Bien sûr”!...

Dia 15  de maio de 2016, domingo – A visita do Felisberto Oliveira da Silva

Hoje, domingo, tivemos a visita do vizinho Felisberto. Já falei deste senhor como figura e personalidade invulgar, a fazer lembrar o sábio filósofo que, de livros nos côvados dos braços, passeia a sua interpretação da vida, falando com convicção das suas experiências de vida e das sua ideias e pensamentos sobre os mais diversos temas.

Homem inteligente, com sentido crítico acentuado que Deus lhe concedeu e com acontecimentos ricos de significado. Eu e o Gaspar parecíamos dois alunos ávidos do seu saber. Durante uns bons minutos deu-nos a conhecer pontos essenciais da vida atual, sempre documentado por capítulos e versículos da Bíblia que sabia de cor. 

Fala razoavelmente o português porque fez parte durante três anos da unidade policial portuguesa que serviu em Timor; fez um curso intensivo de formação para ser professor, profissão que também exerceu; foi comandante das tropas da resistência; foi prisioneiro dos indonésios e agora, segundo testemunhas, passa o tempo lendo muito, escrevendo e partilhando as suas ideias. Já tenho o seu aval para quando quiser lhe telefonar ou o visitar. Parece que frequentemente é visitado para ser entrevistado. A sua coerência é muito apreciada. Das suas ideias não abdica seja perante quem for, mesmo em face dos indonésios.

Uma grande lição de vida!...

Dia 16 de maio de 2016, segunda feira – Ida à embaixada e outros sítios

Mais uma vez de táxi, a caminho da embaixada de Portugal porque o Gaspar não descansa enquanto os nossos nomes não forem lá registados. Não vá o diabo tecê-las, vale mais prevenir que remediar. À chegada ao edifício deparamo-nos com um grande grupo de timorenses que procuram obter o cartão de cidadão português, a fim de puderem entrar na Europa, Portugal e Inglaterra sobretudo, para estudar ou trabalhar.

Pois é! Aqui em Timor Portugal ainda tem algum significado. Falar português confere estatuto de gente importante que dá acesso a portas e caminhos por que muitos anseiam.

Um grande desejo é de ir estudar para Portugal. Gente que vem das universidades portuguesas tem quase garantido um bom emprego.

Na embaixada, lugar esquisito pois pouco conforto apresenta, pouca atenção nos deram: simplesmente o número de telefone da embaixada e o e-mail, aconselhando-nos a fazer o registo por correio eletrónico.

Depois fomos ao Páteo, beber um café dos nossos e fazer algumas compras, algumas bem portuguesas como o garrafão de vinho Castelões e latas de sardinhas Ramirez.

Longe da pátria, tudo sabe bem, nem que seja uma côdea de pão para matar saudades.

Telefonema para Austrália

Mais outra surpresa. Quando saí de Malcata,  prometi à família que, aproveitando a vinda a Timor, iria visitar o primo Quim, a residir na Austrália. Hoje foi o dia escolhido para lhe telefonar. Com sucesso, pois fui atendido de imediato. Conversámos de algumas coisas e ficou combinado de que, antes de regressar a Portugal, lhe iria fazer uma visita. Ficou com o meu contato para poder-me telefonar.

Já não vejo o primo Quim há mais de 30 anos, pelo que o nosso encontro vai ser com certeza emocionante, a lembrar os nossos tempos de infância,  os lugares de Malcata, as pessoas que já partiram e as que ainda vivem. Espero ansiosamente pelo encontro…

As influências e as cunhas

Ontem esteve connosco uma jovem de Luiquiçá, parente da família Sobral, que há três anos terminou o ensino secundário com a média de 19 valores. Não conseguiu entrar na universidade porque não tinha lá dentro ninguém da família. Segundo as más línguas, é assim que aqui funciona o acesso ao ensino superior. É muito difícil entrar lá dentro, sem alguém de referência.

É pena que assim seja pois há por aqui muito talento perdido. Normalmente quem vai estudar para Portugal, Indonésia ou outros países são filhos de ministros, de presidentes; muitos sem preparação intelectual para poderem progredir nos seus estudos. 

Daí que muitos voltam para Timor sem nada feito ao fim de alguns anos, para ocupar cargos públicos para os quais não estão bem preparados. Dizem os críticos que isto mais tarde ou mais cedo vai dar buraco pois a incompetência de muitos funcionários públicos é bem evidente

Aqui como noutros lados do mundo desaproveitam-se os dotados, os capazes, os inteligentes para dar lugar à banalidade, às cunhas, às influências. Ai Timor, Timor! Muito caminho te espera… Desejo-te todo o bem do mundo.

Noite 17 de maio de 2016, terça feira – Uma noite no hospital

Outra experiência diferente. Ontem a Adobe quando regressou a casa vinda da escola manifestava alguma tristeza provocada com certeza pelas dores. Estava com febre e pedia aconchego da mãe e do pai. Metade do comprimido para a febre deixou-a arrebitada mas, por volta das 1.30 da manhã, começo a ouvir o seu choro e as vozes do pai e da mãe que tentavam desesperadamente consolá-la. Levantei-me à pressa e quando apareci em cena já estavam com ela ao colo para a levarem ao hospital. Claro que me dispus logo a ir também. Assistida prontamente por quem estava de serviço, com boa observação médica que lhe administrou os respetivos remédios. Esteve em observação e tratamento até às 6.00h da manhã, hora do regresso a casa.

Pois é, nem sempre a vida é cor de rosa. Quantas vezes, para sermos solidários, temos de passar noites em branco. Quantas vezes temos de carregar as dores dos outros… Já alguém fez isso por nós, portanto não há nada de heroico nesta ação. Fica-nos a satisfação de um dever cumprido, de uma obra de misericórdia aplicada. (...)


Dia 18  de maio de 2016, quarta feira - Afinal, os bispos também mentem. Que Deus lhes perdoe!....

Hoje é o dia combinado para o encontro com o D. Basílio, por proposta sua, Ficou de ligar para dizer a hora mais conveniente. Se quem espera desespera, bem desesperado fiquei pois durante o dia todo não houve qualquer contato da sua parte. O encontro foi para as urtigas. Não sei se ainda o vou encontrar, mas se for caso, vai ter que me ouvir.

É assim que se respeitam os amigos? Afinal os bispos também mentem. Que Deus lhes perdoe!...


Dia 19 de maio de 2016, quinta feira  - Mais histórias (acontecimentos reais ) que nos fazem pasmar

Logo de manhã cedo começamos a ouvir relatos que deviam constar no catálogo das obras de misericórdia. À minha frente estava Bartolomeu Pinto, um rapaz entre os trinta e quarenta anos, simpático e que canta e toca guitarra muito bem, mostrou-nos as cicatrizes do antebraço, braço e cabeça. 

Sem que ninguém o esperasse, este jovem foi atacado por um senhor à catanada, só por estar a mexer no presépio. Foi no dia 23 de Dezembro de 2007. Esteve dois dias em coma, depois foi recuperando progressivamente. As forças da ordem, que por acaso era a GNR, quiseram prender o agressor, tendo a vítima declarado que não queria que ele fosse para a prisão. Não tinha nada contra ele e que “se Deus lhe perdoa sempre por que é que ele não lhe devia perdoar.” 

Vejam esta nobreza de sentimentos, próprio do Ano da Misericórdia que este ano a Igreja celebra. Apesar de tudo, o ministério público acusou o réu que, em julgamento,  apanhou dois anos de prisão. Bartolomeu nada pode fazer para que o condenado tivesse de cumprir a pena. Mas quando saiu da prisão foi ter com ele para o abraçar. Grande Bartolomeu! Obrigado pela lição do perdão,,,

Mesmo em atalho de foice, outro exemplo de perdão. Não fixei o nome do herói, mas trata-se de um combatente da resistência a quem um invasor indonésio cortou a mão.

Quando se esperava um sentimento de vingança,  este senhor respondeu a quem o questionava: “se encontrar esse indonésio vou cumprimentá-lo e dar-lhe um aperto de mão. Que importa ter perdido a mão. Importante mesmo é a nossa independência”. 

Sem explicação humana. Este povo é mesmo assim: muito crente, capaz de lutar e de perdoar as ofensas, ( assim como nós perdoamos?...


Dia 20 de maio de 2016, sexta feira –  Dia da Restauração da Independência

Hoje é dia da restauração da independência. Mas não foi por isso com certeza que hoje o pessoal da casa foi à missa às 6.00h da manhã, menos eu e o Gaspar. Perguntei porquê a missa tão cedo e responderam-me que aqui sempre foi assim.

Fomos outra vez a Dili, para levantar as fardas de Escola da Adobe. Azar! Estava fechado, talvez por ser o dia da restauração da independência. Mas o alfaiate mandou-nos lá ir hoje. Não se lembrou ou mentiu. Em poucos dias já levei dois tampos (mentiras).

Aqui, à minha frente, está o Gaspar a discursar, sempre o mesmo discurso, sobre o estado das coisas em Timor. Fala com razão mas a forma de o dizer não é a mais própria. Quer caçar moscas com vinagre. Não sei se terá algum êxito. Não sei se se esquece do que já disse, mas o facto de se repetir vezes sem conta cansa que se farta o pessoal (os ouvintes). 

Os irmãos dizem-lhe que tenha cuidado com o que diz porque as paredes ouvem e a situação pede contenção. Parece que “as secretas” estão em ação e, quando assim é,  todo o cuidado é pouco. Eu cá para mim estou-me nas tintas. Vamos resolver os nossos assuntos, quanto antes melhor, por que me estou marimbando para as quezílias internas.

Amanhã vamos para a montanha, para Boibau. Muita apreensão pois para além da aventura há quem diga que é uma loucura. A distância é curta mas o caminho é terrível, cheio de buracos, subidas e descidas. A ver vamos!... Mas mais ou menos 3 horas de caminho temos de contar. 

Dia 21 de maio de 2016, sábado - A caminho da montanha

 Eram mais ou menos 14 horas quando o jipe do Anô ficou pronto para arrancar: 6 pessoas dentro, mais as trouxas que cada um decidiu levar. A emoldurar o momento estava o rancho de crianças, à volta de 15, que ajudavam a fazer a festa. Foi uma despedida repleta de alegria. 

Depois foi andar, andar, andar  por mares (caminhos) nunca antes navegados numa casca de noz a rebentar por tudo o que era sítio, sob um calor húmido e abafado, resistindo às contrariedades que a cada passo se nos deparavam. Uma verdadeira prova de resistência a qual nem todos aguentaram. 

Enquanto eu cantava de galo, sempre bem disposto e a causar surpresa aos timorenses da comitiva, o amigo Gaspar foi uma desgraça, incapaz de suportar o seu corpo e a sua mente até ao fim. Queixas, vómitos, má disposição – muito reles,  afinal. Para quem duvidava da minha forma física,  foi uma chapada na cara. Toma, Gaspar! Para as outras vezes não ponhas em causa as capacidades dos outros. Valeram-te as viagens de moto. Caso contrário nem sei como chegarias a Boebau.

A receção no casebre Sobral onde vive a família do Don José foi acolhedora, ainda que eu tenha sido mirado de alto abaixo por todos. Não sei se gerei desconfiança ou medo, particularmente às crianças. Embora muito recomendado pelos familiares do Gaspar, há sempre alguma reserva em face de um malae (estrangeiro), mesmo que chegue com boas intenções. 

Todos são informados, em grupo ou individualmente, que a nossa visita se deve a um projeto de solidariedade de construção de uma escola, e que viemos para falarmos sobre o assunto. No domingo, dia seguinte, visitamos os túmulos/jazigos dos avós paternos do Gaspar, que estão em fase final de recuperação. Momentos emotivos com todos os presentes. 

O sr. Sobral era a autoridade máxima da região, uma espécie de comandante de posto, com tudo o que necessitava para tal função (armas, símbolos de chefia…etc…) uma pessoa estimada e respeitada por todos. Eu próprio fui testemunha. Justifica-se portanto o investimento em preservar as suas memórias. Bem o merecem.

Depois, sempre a subir e eu à frente por entre o capim até outro casebre onde nos esperava outra família. Aí  foi servido a cada um um coco que um moço de pé leve foi colher lá nas alturas. O coco que melhor me soube em toda a minha vida. 

Novas conversas sobre o projeto, que nos levaram a marcar uma reunião às 3 da tarde para tomarmos uma decisão: “Uma escola ou uma igreja", como alguém pretende?...

Convidamos o chefe do suco de Leotalá (presidente da Junta) que nos facilitou os cadernos de registo de crianças. À hora marcada começamos a reunião. Com o assunto já bem estudado e perante a pergunta “O que vos faz falta em Boebau Escola ou Igreja?"  

Todos foram unânimes: “queremos a escola, porque há muitas crianças que não vão às escolas circundantes”. 

Segundo os cadernos do suco, vivem em Boebau / Manati mais de 400 crianças das quais só 110 frequentam as escolas. A razão principal da falta à escola é o tempo que se demora no caminho, mais ou menos 5 horas diárias a pé que as crianças têm de fazer. Entenderam o sacrifício desta gente? 

Então ficou decidido, com o apoio de todos e em particular do chefe de suco, que irá ser construída uma escola, mais ou menos o projeto que trouxemos de Portugal, ficando o Anô encarregado de adaptá-lo às condições reais do local de construção. 

Com o orçamento a apresentar (mais ou menos 30.000 euros), a ordem é de avançar de modo a que a escola possa ser inaugurada em Janeiro de 2017, início do ano letivo em Timor. O trabalho mais difícil da nossa visita a Timor, tomada de decisões, está feito. 

Vamos continuar a lutar e a desenvolver o nosso projeto, seja em Timor seja em Portugal. Queremos fazer alguma coisa por esta gente tão necessitada mas tão querida. E Vamos conseguir!...



Alguns episódios na montanha

(i) Francisco da Conceição e a sua mulher parece que estavam já a nossa espera: a Marcelina, o Abeca e eu. 

Os cumprimentos efusivos da praxe, a conversa puxa conversa, o ritual da mama (mascar betel, areca e cal), equiparado ao vício do tabaco e histórias de vida que nos fazem pasmar. 

O sr. Francisco, homem pequeno e franzino vive aqui com a sua segunda mulher, sem filhos. No tempo da invasão indonésia a sua primeira mulher e os seu cinco filhos foram mortos. Mesmo assim, manifesta alegria de vida que nem a sua pobreza (miséria) consegue esconder. Pergunto-me: o que é preciso para ser feliz?... 

Junto às casas aqui próximas colocaram um posto de alta tensão. No entanto ninguém tem luz elétrica nestas paragens. Socorrem-se de “pequenos painéis solares que proporcionam uma débil luminosidade, incapaz de carregar um telemóvel". Por outro lado o senhor Francisco queixa-se que a pequena plantação de betel está a diminuir desde que existem ali implantados os postes. 

Aqui como noutras partes do mundo os pobres são explorados sem qualquer tipo de compensação. O pobre cada vez mais pobre e o rico cada vez mais rico. Para onde vamos?


(ii) O Eustáquio mostrou-nos lá do alto os montes e vales por onde andou escondido e errante com a mãe e alguns irmãos durante três anos. 

Remarcou em particular o monte onde foram apanhados pelos indonésios (uma casa com telhado verde no cimo de um monte) e o local de passagem do rio onde se deu o ”milagre” da casa que os protegeu de noite e que desapareceu ao romper do dia. 

A convicção do relato é tão forte que duvidar do que conta é um risco. O Eustáquio tinha 11 anos de idade percorria todos aqueles montes até Liquiçá para comprar sal que depois ia vendendo pelo caminho. Ainda hoje é frequente o negócio das crianças que passam com frequência pelos arruamentos e veredas dos bairros locais,  apregoando e vendendo produtos diversos.

(iii) Os obstáculos do caminho são uma constante. 

Hoje no regresso da montanha deparamo-nos com uma sinalização que nos indicava perigo. Uma vara e um senhor que ao avistar o gipe pagero azul chamou à atenção do aluimento duma passagem sobre troncos.

 Depois de inspecionado o perigo saímos da viatura e o corajoso e habilidoso Anô arranca sobre a faixa disponível conseguindo chegar são e salvo à outra margem. 

Nada mais houve a registar para além dos buracos constantes destas vias. Mas soubemos depois que o caminho estava intransitável e que corria uma informação falsa a nosso respeito: “foi um pagero azul que provocou a situação.” Sabemos também que não há estrutura nem serviços estatais que resolvam estas situações. Têm de ser os habitantes locais. E viva o povo!...

(Continua)

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos: LG)

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Conta solidária da Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste (ASTIL)

IBAN: PT50 0035 0702 000297617308 4

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Nota do editor:

(*) Vd. poste anterior da série > 20 de maio de  2024 > Guiné 61/74 - P25544: Viagem a Timor-Leste: maio/julho de 2016 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte I: As primeiras emoções e impressões

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25544: Viagem a Timor-Leste: maio/julho de 2016 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte I: As primeiras emoções e impressões


Lourinhã > Praia da Areia Branca > 2 de dezembro de 2017 > Almoço de um grupo de amigos de Timor-Leste, no restaurante Foz: em primeiro plano, Rui Chamusco e Gaspar Sobral, cofundadores e líderes da ASTIL 

Foto (e legenda): © Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Rui Chamusco passou a integrar desde 10 de maio último a nossa Tabanca Grande (*). É cofundador da ASTIL, com a sua conterrânea,  Glória Lourenço Sobral, professora do ensino secundário,  e  com o marido desta, Gaspar Costa Sobral,  luso-timorense que, em Angola, antes da independência, era topógrafo.  

ASTIL é a sigla da Associação dos Amigos Solidários com Timor-Leste, criada em 2015, com sede em Coimbra. Entre outros projetos desenvolvidos pela ASTIL,  destaque-se a Escola de São Francisco de Assis (ESFA), nas montanhas de Liquiçá (pré-escolar e 1º ciclo) e o apadrinhamento de crianças em idade escolar. (Havia, então, em Boebau,  150 crianças sem acesso à educação.)

O Rui, professor de música, do ensino secundário, reformado, natural do Sabugal, e a viver na Lourinhã, tem-se dedicado de alma e coração a este projeto no longínquo território de Timor-Leste. (A ESFA foi inaugurada em março de 2018: custou então 50 mil dólares, sem contar com muita da mão-de-obra "pro bono")

Regressou há dias, ao fim de 3 meses, de mais uma estadia (a quinta), desde 2016.  (Voltou lá em 2018, 2019, 2023 e 2024.) Falei com ele ao telefone, ainda estava "todo partido" da longa viagem (são mais de 14 mil quilómetros de distância, e uma diferença de 8 horas entre Lisboa e Dili).

Desde a sua primeira viagem a Timor-Leste, no início de maio de 2016, que ele vai escrevendo umas "crónicas" para os membros da ASTIL e demais amigos.  Na minha caixa de correio tenho  recuperar algumas dessas crónicas (de 2018 para cá). Em Dili ele costuma ficar na casa do Eustáquio, irmão (mais novo) do Gaspar Sobral. 

Pedi-lhe, entretanto, cópia das crónicas de 2016, a primeira vez que ele pisou a terra sagrada de Timor Lorosa'e. (Partiu a 5 de maio e regressou a 7 de julho.)

Vamos publicar alguns excertos, dado o interesse documental que têm para os nossos leitores que querem saber mais da história e da cultura dos nossos amigos e irmãos timorenses.

 Viagem a Timor: maio/julho  de 2016 - Parte I: as primeiras  emoções e impressões

por Rui Chamusco 


Descrição pormenorizada – acontecimentos e peripécias dos amigos Gaspar Sobral e Rui Chamusco

Depois de muitos trabalhos de preparação (vacinas, consultas, contactos, marcação de dias da viagem, obtenção de bilhetes e outras coisas mais) eis-nos a caminho: a primeira etapa da consagração do projeto de solidariedade “ uma escola em Timor “. 

As expectativas são muitas, as dificuldades muitas mais, mas a força e o querer que isto aconteça superam qualquer intento de desânimo ou de desistência.

Dia 5, 6 e 7 (quinta, sexta e sábado), maio de 2016 

Fundadores: Rui Chamusco,
Glória Sobral e Gaspar Sobral


Em casa dos amigos Tó Barroco e Mila em Odivelas, pelas 6 da manhã começam os primeiros rumores com os serviços da casa de banho que um a um utiliza, antes de um ligeiro pequeno almoço e da partida para o aeroporto da Portela (Lisboa). 

Às 8.30h começamos o chek-in e o controle de bagagens. Às 11.00h entrada para o avião da British Airways rumo a Londres. Aí permanecemos até às 20.00h, seguindo depois até.ao aeroporto de Singapura durante um percurso de mais de 13 horas de avião.

Chegada ansiada ao mundo indonésio e que ali nos albergou até às 9.00h do dia seguinte, com partida para Dili (Timor) onde chegamos pelas 14 horas, contando com as horas do fuso horário respetivo.

Em Dili descemos da aeronave sob um calor sufocante, tal o grau de humidade da temperatura ambiente. Mesmo assim nada que nos impedisse do grande regozijo de pisar o solo timorense. 

Grande expectativa, depois de cumprirmos as formalidades exigidas, de conhecermos a família do amigo Gaspar que, antecipadamente avisada, estava a nossa espera. Beijos e abraços, com momentos fortes de emoção. É que Gaspar há 16 anos que não visitava à sua terra natal.

Surpresa ou coincidência

Enquanto esperávamos pela realização do check-in Singapura / Dili, surge precisamente à minha frente uma figura conhecida e com a qual em tive contatos há quase meio ano na preparação desta visita a Timor. Nada mais nem nada menos que o frei Padre Fernando Cabecinhas, provincial dos Capuchinhos de Portugal, que vem em visita às comunidades missionárias de Tíbar e Laleia. 

Foi uma alegria imensa de parte a parte pois, para além de recordarmos tempos passados, eu como diretor do seminário menor e ele como aluno, pusemos em dia a conversa sobre a vida de capuchinhos que outrora foram meus companheiros. 

Ficou logo ali delineada uma visita a Tibar, a fim de encontrar e abraçar o Pe. António Pojeira. Por razões de circunstância a visita ficou adiada mas que, logo que possível será concretizada.

Surpresa nº2

Tinha que ser! Por mais voltas que desse a passadeira das bagagens as nossas malas não apareceram. Revisão dos espaços, contatos telefónicos não serviram de nada. À nossa preocupação juntaram-se muitos outros que abnegadamente tentaram resolver a situação, mas o único que nos garantiram é que no próximo sábado (oito dias depois) as malas seriam entregues. A ver vamos!...

Amanhã, domingo, dia 8,  iremos à Plaza de Timor ( supermercado ) a fim de comprarmos algumas roupas, pois o calor húmido que se faz sentir obriga-nos a mudar de trajes com frequência. Entretanto, como diz um ditado timorense, “ nada se perde; apenas se esquece” (Saçan lá lácon; só halu han deit). Que assim seja…

A visita ao cemitério de Santa Cruz

Com a família Soveral como guia, fomos de imediato visitar esta lugar de memórias, e particularmente a campa do pai desta família José Alves Sobral, vítima de doença em 1975. Muita emoção, lágrimas e choro sobretudo por parte do Gaspar. 

A mim impressionou-me imenso o facto de se verem ainda em várias campas (também do sr. Sobral) as marcas dos tiros que no ataque de 12 de Novembro de 1992 o exército indonésio disparou e matou mais de 200 timorenses. 

De seguida fomos de karreta até à zona habitacional da família, em Ailok laran – aldeia da Ribeira Maloa, também conhecido por suco de Bairro Pitê (nome do administrador que lhe deu o nome). 

Muita gente à espera do Gaspar e do malae (português), que sou eu. Irmã, irmãos, cunhadas, filhos, sobrinhos, vizinhos, amigos… um corrupio de gente e sobretudo de crianças que, em face dos visitantes, tudo querem ver e saber. 

Um ambiente stressante mas que sabe bem. Todos se desfazem em simpatia, mesmo que a linguagem falte. Vendo e ouvindo os seus clamores e as suas histórias até às tantas da noite, mesmo que caindo de sono. O tempo é pouco para tanta vida pujante. Só crianças à nossa volta são treze. Ou seja, crianças e adultos da família Sobral são mais de 20 pessoas a fazer serão.

A vida e o bem estar desta gente

Há 14 anos que Timor é independente, com órgãos próprios de governação. Muita coisa já foi feita mas muito mais há que fazer. Tenho o privilégio de estar a viver com as pessoas do povo e não em hotel. Isto permite-me embarrar-me, comer e beber, cantar, tocar, estar com eles à conversa, escutar as ânsias e anseios das pessoas quiçá mais desprotegidas. Nada que possa alterar as características deste povo que nasce, vive e morre com o sorriso sincero nos rostos.

 Hoje observei as três crianças do Anô que iam ser batizadas. A mais pequena, que nem dois anos tem, desfaz-se em sorriso impossível de descrever. Como não ficar ligado a esta gente? Não há nada que pague esta oferta.

Faltam muitas condições de conforto e de bem estar a que um europeu está habituado. Mas sobram valores e relações humanas que são riqueza e património deste povo. 

Destaco em particular o valor da família. Viver em família é um processo natural. Na família Sobral todos são de todos, não há portas nem barreiras, os maiores cuidam dos mais pequenos, o respeito dos mais velhos está garantido com o beijo e reverência (beija e encosta a cabeça na mão do adulto), gesto repetido todos os dias ao fazer o cumprimento. 

Tenho a sorte de já ter entrado no coração desta gente. Sou tratado como o Ti Rui ou, melhor ainda, como irmão Rui. Nada melhor que me possam oferecer do que esta fraternidade voluntária.

A empatia com a natureza

Aqui nada se perde. O aproveitamento da natureza é feito com respeito pela mesma, que tudo nos dá. É mãe… Ervas, plantas, aves, animais pessoas tudo aqui convive numa perfeita harmonia e promiscuidade. Sem agressões, com mútuo respeito. Gostaria que assim fosse em todo o mundo. Não se estraga, não se abusa. Não se vive em opulência, serve-se o necessário, chega para toda a gente. 

Que bom saborear os pratos típicos tradicionais! Sedok (arroz com feijão fore), mostarda em planta, papaia, folha de abóbora, betal, areca, calai, etc… etc… que para além de alimentação se utilizam também com fins terapêuticos. A envolver este cenário há um jardim natural bem conhecido dos residentes pelos seus nomes e utilidades. 

Um verdadeiro hino ao Criador.

A vontade enorme de aprender português

Quase todos os dias me deparo com crianças que, servindo-se de um manual escolar, tentam fazer os trabalhos de casa seja onde for, até em cima da campa da avó Felismina Sobral. Posso confirmar que estas crianças têm avidez de saber. A ler, a cantar, sozinhas ou em grupo mas quase sempre em português. É por isso que não posso ficar indiferente. 

Com a guitarra do irmão Eustáquio tento ensinar canções através do melhor processo de aprendizagem: lendo em voz alta, mandando repetir, tocando a melodia, fazendo os gestos, acompanhando… O resultado está à vista. Estão gostando tanto que já dizem: “ quando irmão Rui for embora a gente vai chorar”. Derretem-me literalmente o coração…

Hoje de manhã, dia 8, fui encontrar a Adobe, uma das filhas do Eustáquio, quase deitada no chão de mosaico sobre um livro e a soletrar palavras em português. Não aguentei mais. Chamei o pai e a mãe e propus-lhes: ” Eu gostava de ser padrinho desta menina. Apoiar os seus estudos e seguir o seu desenvolvimento. Aceitam?” 

De imediato foi dado o consentimento. Um beijo e um abraço selaram este acordo. De agora em diante procuraremos o que for melhor para a Adobe.

Dia 10 (terça-feira): encontro informal com ex-combatentes da resistência

Quase podemos dizer que, desta gente que habita o bairro, não há ninguém que direta ou indiretamente não tenha estado envolvida com a invasão indonésia. A casa que habitamos da família Sobral foi totalmente destruída e arrasada. Hoje está reconstruída.

Igual sorte tiveram as casas em redor. De modo que é muito fácil encontrar testemunhos e antigos combatentes normalmente afetos à Fretilin. Todos têm a sua história mas destaco em particular alguns ex-prisioneiros que com coragem e inteligência aguentaram e escaparam (sobreviveram) às torturas infligidas.

Abeca Sobral, homem de estatura franzina que o vento pode levar, relata que na prisão ra torturado com socos no estômago que, segundo ele,  só por milagre não o mataram.

Diz que à frente das grades da prisão passou alguém de cujas botas se desprendeu um pequeno papel (recorte de revista ou jornal que ainda hoje guarda consigo e que me foi mostrado) que habilmente conseguiu obter e onde estava (está) escrita uma oração a Santo Exposito. Diz Aveca que esta oração lhe deu a força necessária para resistir a tudo: “davam-me socos no estômago e nada sentia; parecia que estavam batendo em borracha”. 

Aveca está vivo, com a sua família no bairro Ailok laran, como a maioria dos irmãos e com um cargo de funcionário público na administração do Estado: chefe de serviços no registo predial de Dili.

Eustáquio, outro dos irmão que nos alberga, é taxista e conta que ele, a mãe, os irmãos tiveram que fugir e se refugiar na montanha durante três anos. Caminhavam de noite e de dia escondiam-se. 

Numa certa noite uma tempestade de chuva se anunciava. A mãe e os filhos procuravam refúgio para se albergarem do mau tempo. Foi então que a mãe lhes diz: “vamos para aquela casa que ficaremos a salvo”. Aí descansaram até de manhã e, surpresa das surpresas, quando acordaram não viram casa nenhuma. A mãe, já falecida, e os irmãos ainda presentes testemunham que isso foi verdade. Milagre talvez, mesmo que os psicólogos e psicanalistas digam que foi alucinação coletiva. Ouvir para crer, é o que nos resta… 

No entanto quero salientar a convicção de quem passou por isso e relata o acontecimento. O final desta fuga não foi feliz. Acabaram por ser apanhados pelas forças indonésias que os reportaram para Dili. Já na sua terra (arredores de Dili) constataram com tristeza que a casa de família tinha sido completamente arrasada e queimada. O Eustáquio prometeu que iria recuperá-la, o que hoje em dia é jáum facto.

Felisberto é um dos vizinhos do casal Sobral, foi preso pelos indonésios que o levaram para uma prisão na Indonésia. Já na cela bem apertada teve de socorrer-se da sua imaginação para se poder livrar dos calabouços. Quem não quiser ler feche os olhos porque o que vem a seguir nem todos os estômagos suportam. O Felisberto teve uma ideia de merda. Foi ao balde para onde fazia as necessidades, e com as mãos cobriu a cabeça de merda. Uma, duas, três vezes…até que os responsáveis da prisão o consideraram maluco e o libertaram. Dizem os vizinhos que ele ficou mesmo afetado, não regula bem. Ainda agora o avistei no seu território.

José Sobral, já falecido, também foi preso pelos indonésios e,  segundo contam os irmãos, foi sujeito a uma série de perguntas em linguagem Bahasa da qual ele nada entendia. Pelo sim pelo não decidiu responder sempre sim com aceno de cabeça. Cada resposta, cada sessão de pancadaria.

Enfim estes e outros testemunhos são para entender o que esta gente sofreu por  quererem continuar a ser portugueses. O amor e a paixão por tudo o que se relaciona com Portugal é impressionante.

Dia 10 (terça feira) – Viagem em microleta até Dili rumo à escola de Taibessi

Como já relatei anteriormente decidi apadrinhar uma menina do casal Eustáquio/Aurora e seguir o seu percurso. Adobe está no 4º ano de escolaridade na Escola Farol.

Devido ao seu interesse pela língua portuguesa procuramos uma escola de referência onde Adobe possa aprender corretamente o português. Indicaram-nos a escola de Taibessi para onde nos dirigimos em microleta

Bem atendidos pelo porteiro timorense e pelas duas professoras que nas suas salas lecionavam , expusemos a situação que não foi logo resolvida porque a professora coordenadora –Teresa Nora – já não estava. Por contato telefónico foi marcado encontro no dia seguinte às 8.00 horas. Esta viagem teve a particularidade de entrar na microleta com uma cabeçada estrondosa que me ativou as ideias, e uma grande chuvada ao chegarmos a casa em que os chinelos de dedo no pé são a melhor solução para não molhar os sapatos.

Não posso deixar de registar o grande jogo de futebol a que assisti no largo da casa Sobral: seis miúdos do bairro, sem camisa, descalços e com os calções a cair jogavam  desalmadamente sob chuva intensa com dribles impressionantes, fintas e defesas corajosas, em que o único interesse é o jogo pelo jogo, sem árbitros, sem limites de campo, sem faltas. Um verdadeiro jogo de amigos e de convívio.

Dia 11 (quarta feira) – De novo rumo a Taibessi

Eram 7 horas da manhã e já estávamos prontos para o arranque. Foi então que avistei o Eustáquio com a sua mota e dois capacetes. Só então compreendi que um era destinado para mim. 

Nunca pensei correr a cidade de Dili em mota. Eustáquio a conduzir, eu atrás do condutor e a Adobe à frente lá fomos de novo a caminho de Taibessi. Muito bem recebidos pela professora Teresa Nora. que compreensivamente resolveu o problema. A Adobe vai ficar na Turma B do 4º ano e hoje mesmo fomos tratar do boletim de transferência á escola de Farol. Amanhã iremos de novo entregar os documentos solicitados para conclusão do processo.

Dia 12 (quinta feira)

Dito e feito! A Zinigia (Adobe) já está na Turma do 4º ano B. Foi logo integrada na aula de ginástica. Mais uma vez realço pela positiva a forma amável e interessada da Professora Teresa Nora, bem como do professor da Turma. Orgulho-me da classe profissional a que pertenço, embora na reforma.

Noite atribulada deste dia 12!

 A partir das 3 horas da manhã tive de sair da cama e ir para o exterior porque o amigo Gaspar (raios o partam!... ) resolveu pôr-se à conversa vom o mano Eustáquio. Mais parecia um monólogo que um diálogo pois só ele é que pregava. Irritado com as sua baixas frequências, tomei a decisão de me livrar desse ruído perturbador e fui sentar-me no canto mais sossegado do recinto. 

Dormi um pouco mas os mosquitos (melgas) começaram a zunir, pelo que me levantei de mansinho na intenção de regressar à minha tarimba. Azar dos azares, todas as portas estavam fechadas. Daqui até o sol raiar foi um pandemónio de mudança de cadeiras, de posições, de pensamentos de revolta e eu sei lá que coisas mais. Sei que não foi por mal, pois pensavam que eu já estaria dentro, mas lá que custou a passar a noite custou.

 Hoje mesmo vou tentar recuperar a energia pois este santo corpinho ficou todo amassado das andanças da noite.

Viagem em Táxi

Mais uma experiência de viagem, em táxi, do mano Eustáquio à escola de Taibessi.

Pensando que seria melhor do que o transporte de ontem, tenho de concluir que, apesar das confusões de trânsito, a viagem de mota foi mais segura e agradável. Estranhei que o carro andasse, mesmo a cair aos bocados, mas lá fomos ao nosso destino e chegamos sãos e salvos a casa.. 

Tantas dificuldades materiais que esta gente suporta, mas nada que os impeça de chegar onde querem chegar. Cada um tenta desenrascar-se como pode, mesmo que para isso seja necessário dar um murro no carro para que uma porta se abra.

Aqui é assim: oficinas e mecânicos pouco se vêem. Cada um tenta ser mecânico à sua conta. Por isso não é de admirar que os carros e as motas estejam tão mal tratados. O que importa é que andem, porque de comodidades ninguém esteja à espera. Se o motor não arranca empurra-se, pois mão de obra é coisa que aqui não falta. E viva o desenrascanço!...

Mais uma vítima (política) inocente

Hoje o Gaspar estava atónito a pensar no que o irmão lhe contara. Um amigo foiinterrogado (talvez por alguém das secretas indonésias, pelos vistos realidade existente em Timor), se conhecia o Gaspar Sobral. Como negou que o conhecia levou tanta pancada que o deixaram cego. 

O Gaspar profundamente chocado e desconhecedor do acontecimento manifestou de imediato a vontade de conhecer esse senhor e de lhe agradecer ter-lhe salvo a pele. Parece que este episódio e esta procura pelo Gaspar remonta aos tempos da Expo Sevilha, onde Gaspar e mulher participaram ativamente na manifestação Pró Timor contra a Indonésia.

Postal de Timor

Gostaria de uma pincelada poder descrever o que por aqui se passa mas não é nada fácil prescindir de pormenores que constantemente nos atraem pela positiva ou pela negativa.

Dalguns já dei conta mas muitos mais afloram sempre que ouvimos alguém. Por exemplo,  o fosso existente entre a classe política e o povo. Sabiam que um assessorde ministro ganha 5.000 dólares enquanto que um contínuo do ministério no escalão máximo ganha 200$? 

As estruturas do estado e da Igreja são as mais vistosas da cidade; a classe média vive em bairros na periferia onde o desenvolvimento e as condições sociais deixam muito a desejar. Existe lixo espalhado por todo o lado e a sensibilidade para a preservação e limpeza do ambiente é coisa de futuro. Muito caminho há a fazer…

O trânsito é intenso e bastante desordenado. Mesmo assim condutores de toda a classe de veículos manifestam grande destreza e habilidade pois o número de acidentes é pouco relevante. Os produtos locais chegam a todo o lado, ainda que não haja carros e câmaras de frio que acondicionem os materiais. Todos os dias, a toda a hora, são músicas e reclames a anunciarem o que se vende: carnes, peixes, hortaliças, sementes, água, roupas, bugigangas, cada vendedor com o seu estilo e meio próprio. Mas o que mais me chamou a atenção, pelos sons que produziam, eram dois leitões pendurados em vara levada ao ombro, que se desfaziam em gemidos apelando a socorro. Dói de ver, mas é assim a cultura deste povo.

Hoje, dia 12, véspera da Senhora de Fátima, anunciam-se procissões noturnas por todo o lado. O sentimento religioso deste povo é grande e creio que sincero. Crianças e adultos todos trauteiam melodias portuguesas a Nossa senhora bem conhecidas. Nas casas, nos carros, nas mikroletas avistam-se imagens de santos e santas que nos fazem crer estar numa grande igreja. Não têm medo nem vergonha de mostrarem a sua fé e aquilo em que acreditam. Fé ou religião… Mas quem somos nós para criticar ou julgar a convicção dos outros? Respeito meus senhores!...

Dia 13, sexta feira – O reencontro com as malas e a visita a Tíbar

Como diz o ditado timorense “as coisas não se perdem; apenas se esquecem”. Finalmente chegaram as nossas malas. Por onde andaram ninguém sabe mas, logo que se avistaram, os donos até sorriram. Foi uma alegria enorme poder tocar-lhes, abri-las e confirmar que nada faltava, mesmo tendo sido abertas. A simpatia dos funcionários do aeroporto foi imensa, ( claro que houve gorgeta!), tudo facilitando para que a nossa alegria fosse completa.

Do aeroporto dirigimo-nos para Tíbar, visitar a comunidade de Capuchinhos que aí está radicada. Outra enorme alegria ao poder abraçar o meu amigo Pe. António Pojeira,colegas de seminário e de fraternidades durante bastantes anos. Foi uma conversa para recordar vivências e episódios das nossas vidas em comum, reforçada pelas intervenções do caro amigo Pe. Fernando, provincial do capuchinhos em Portugal e pelas intervenções adequadas do amigo Gaspar, seu irmão chaufer do táxi e sobrinhos Anô e Rosana que tanto nos ajudaram na recuperação das maletas e outras démarches.

A chegada ao pátio foi como já se esperava: uma curiosidade enorme em ver e ouvir o acordeão e depressa se transformou no “pátio das cantigas”. Toda a criançada acudiu deimediato e as canções já aprendidas desfilaram pelas gargantas de todos os presentes:saia velhinha, as pombinhas da Cat’rina, o mar é lindo e mais modas de que esta gentemuito gosta. Deu bem para suar… Logo a seguir tanta chuva, tanta chuva de que não hámemória no meu cérebro.

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)

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Conta solidária da Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste (ASTIL)

IBAN: PT50 0035 0702 000297617308 4

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Nota do editor:

segunda-feira, 13 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25517: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (46): Viva o po(l)vo... da Lourinhã!


XV Quinzena Gastronómica do Polvo, Lourinhã, 10-24 de maio de 2024. Fonte: CM Lourinhã


1. Por estes dias, e até 24 do corrente, decorre a XV Edição da Quinzena Gastronómica do Polvo, no concelho da Lourinhã, a 70 km a norte de Lisboa...

O nosso vagomestre de serviço, que esteve 22 meses na Guiné, em 1969/71,  sem provar um arrozinho de polvo, um polvo à lagareiro  ou as patanicas de polvo (sabores da sua infância, quando o polvo era a comida dos pobres), não podia deixar de assinalar na agenda este evento gastronómico, que já vai na 15ª edição.

Não lhe pagam para fazer publicidade, mas o nosso vagomestre não pode deixar de prestar um serviço público aos seus conterrâneos que do mar à mesa nos oferecem estes pesticos... São 25 restaurantes com um cardápio de mais de 6 dezenas de receitas de povo:

 (...) "Desde os clássicos e tradicionais Polvo à lagareiro, Arroz de polvo ou Salada de polvo, até opções mais inovadoras e arriscadas, os restaurantes locais não se deixaram intimidar pela exigência do público e, mais uma vez, aprumaram a arte de cozinhar o polvo. 

"Os visitantes poderão mergulhar na onda de sabores de entradas como Carpaccio de polvo trufado, na fusão de técnicas culinárias italianas com sabores tradicionais presentes numa Bruscheta de polvo ou numa Polpette de polvo com maionese de polvo e alcaparras. 

"Ainda neste mar de irreverência, marcam presença pratos como o Cachorro de polvo com bacon fat mayo, pickle de couve e batata palha, Francesinha de Polvo com Aguardente DOC Lourinhã e Polvo com açafrão, risotto preto e frutos do mar. Para terminar, um Brownie de café com creme de Mascarpone e chantilly de polvo deixa a vontade obrigatória de guardar espaço para a sobremesa.

Os amantes de boa comida terão a oportunidade de explorar uma variedade de pratos de polvo confecionados por 25 restaurantes da região da Lourinhã. Cada espaço terá o desafio de apresentar as suas propostas únicas, destacando as diferentes e criativas formas de cozinhar este prestigiado ingrediente." (...) (Fonte: 
CM Lourinhã)

Este ano, a Quinzena Gastronómica do Polvo conta com a participação dos seguintes restaurantes (passe a publicidade):

2. Já em tempos o nosso "vagomestre" homenageou este evento que leva à mesa do povo...  o polvo da Lourinhã


O polvo que, no tempo dos reis,  ia à mesa do povo...

por Luís Graça

Agora o polvo, o povo, serve-se
com batatas assadas a murro, pum!!!,
anuncia o cozinheiro-mor do reino.

Já lá vai o tempo das favas contadas,
do bico calado e pé ligeiro,
a era do cheiro a esturro,
o regime do come e cala-te,
e do lápis-lazúli do censor.
Agora a dieta é chique, é mista,
cale-te e não comas,
muito menos fillet mignon,

Nem sequer rosbife,
que já não há almoços grátis, avisa o vedor,
ameaça o almoxarife, aconselha o dietista.

Urra!, sim, senhor,
pois se o reino é porco e glutão,
e se o tesouro está sem tostão,
então que viva o polvo, o povo,
à lagareiro, alarve,
e que à sobremesa se sirvam passas do Algarve,
manda sua alteza, el-rei,
de todos o primeiro cãocidadão.

Mas agora quem está no pedestal, e mija de alto,
é o Burnay, o banqueiro, croupier do casino real.
Viva o povo dos polvos,
o terceiro estado da nação,
morra o polvo dos povos,
sem eira nem beira.
O polvo apanhado nos covos,
nas minas e armadilhas
dos senhores da terra e do mar,
e depois afogado em puro azeite virgem de oliveira,
no caldeirão de todas as batalhas,
travadas e por travar.

O polvo, o povo,
apanhado nas malhas da história, em contramão,
nos buracos negros da memória,
nas falhas da terra opaca, nas marés rasas.
Sem honra, sem glória, sem grandeza!

Bom povo, grande besta de carga,
pobre polvo, cuja rede neuronal tentacular
é comida à mesa, de garfo e faca,
p'lo pregador predador.
Resta-te a triste consolação
de seres tema de quinzena, patriótica e gastronómica.
E quiçá a vitória amarga de ires à mesa
do senhor comendador, industrial de exportação,
que fez do globo uma banda filarmónica.

Acabaram-se os privilégios do sangue,
morte ao arroz de cabidela,
morte ao frango, morte ao capão,
E que o coelho não se zangue
por ser roubado e despromovido
no tacho e na panela.
Ladrão mais finório é larápio,
diz o léxico do tempo novo que aí vem,
viva o funcho e a beringela!

E vai de frosques, o senhor doutor,
dos cânones e das leis,
que de fraque senta-se o regedor,
no chão do piquenicão,
onde quem mais ordena é o polvo, o povo,
no cardápio, democrático, do barracão do petisco.
Mas, atenção, mais vale prevenir o risco
de o poder cair na rua,
sob o tentáculos do inteligente polvo
e os alvoroços do estúpido povo.

Produto gourmet, produto manufaturado
de todas as maneiras e feitios,
batido, dançado, cantado,
algemado, açoitado, degradado, 
exportado, e outrora (em)bebido
em sangue suor e lágrimas.
Povo desalmado, acéfalo,
povo (en)cantado, afadistado, cefalópode,
grelhado, alimado, escalado, 
escalfado, esfolado, escalpelizado,
salteado em fricassé e até enlatado 
em óleo vegetal na ração de combate
do soldado da guerra colonial da Guiné.
Ou era óleo de fígado de bacalhau, camaradas ?
Que a gente sempre ouviu dizer mal
do rancho, do vagomestre, e do comandante...
Mas quem diz, ufa!, que não aguenta,
na tropa amocha, na terra ou no mar,
que, quando bate na rocha,
quem se lixa é o polvo, o polvo!

Enchamuçado, encapuçado, emboscado,
enforcado, fatiado, espalmado em filhós, 
embrulhado em pataniscas,
frito, fuzilado, seco ao sol no telhado,
teso que nem um carapau.
E até, imagine-se, pizzado!,
sim, muitas vezes pisado, humilhado e ofendido.
Que o polvo, o povo,
pouco esquelético mas mimético,
na ausência de espinha (dorsal),
adapta-se bem à nouvelle cuisine
e aos caprichos dos novos chefs.

Mas, o que mais irrita,
o amigo secreto do polvo, do povo,
que não tem limousine e anda a pé,
são os donos da cozinha, os magarefes,
mal entroikados,
que falam em nome dele, o povo,
e que, de garfo e faca em riste, ou até à espadeirada,
o imolam pelo fogo,
e o guarnecem, com a batata frita de Bruxelas!...

Abaixo o fascismo sanitário,
viva o cardápio proletário!,
glória ao arroz de polvo,
malandrinho, de coentrada...
E saúde e longa vida para o povo, agora pobrezinho,
que dantes também comia iscas... com elas!

Lourinhã,
Quinzena Gastronómica do Polvo,
10 de junho de 2014,
revisto em 13 de maio de 2024.
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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25376: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (45): "Chef" Alice, guardiã dos saberes (e dos sabores) culinários associados ao sável do Douro (que já não há): frito com açorda de ovas com com arroz de feijão, era a comida dos pobres, que não tinham a "burla", na Quaresma...

terça-feira, 23 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25429: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (35): A Casa dos Direitos (antiga esquadra policial), no centro histórico de Bissau










Guiné-Bissau > Bissau > Casa dos Direitos, na Rua Guerra Mendes, no centro histórico da cidade, a "Bissau Velha"  > Um projeto de várias organizações da sociedade civil (oito), que lutam pela defesa e promoção dos direitos humanos

Fotos (e legenda): © Patrício Ribeiro (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Patrício Ribeiro:  nosso correspondente em Bissau, colaborador permanente da Tabanca Grande para as questões do ambiente,  economia e geografia da Guiné-Bissau, onde vive desde 1984, e onde é empresário, fundador e diretor técnico da Impar Lda; tem mais de 150 referências no blogue; autor da série, entre outras, "Bom dia desde Bissau".


1. Mensagem de Patricio Ribeiro;

Data - sábado, 20/04/2024 11:07

Assunto - Fostos da Amura e da Casa dos Direitos

Luís,

Umas fotos da Amura, para muitos recordar (*).

Envio também da Casa dos Direitos, onde antigamente era a 1.ª Esquadra onde muitos passaram nas masmorras... e onde hoje mais uma vez vou trabalhar.

O tempo está ótimo em Bissau, mais logo devem voltar a estar 41º de temperatura.

Abraço, Patrício


2. Comentário do editor LG:

A Casa dos Direitos tem sítio na Net (um blogue)  e página no Facebook.

Ficamos a saber que, "localizada no edifício da Primeira Esquadra / Prisão de Bissau, a Casa dos Direitos é actualmente um espaço de encontro entre vários sectores da sociedade guineense, à volta da realização de um conjunto de direitos humanos."

Ver também artigo de José Alves Jana, "7Margens", 10 de dezembro de 2022 > [Crónicas da Guiné – 2] A “Casa dos Direitos”, chão sagrado dos Direitos Humanos:

(...) "Depois da independência, na altura o partido único continuou a usar este espaço como estabelecimento prisional. Era, até então, um centro de tortura, de restrição de liberdades, de violação grosseira dos DH. E mesmo depois da “abertura democrática”, funcionou como estabelecimento prisional.

As exigências internacionais obrigaram o Estado da Guiné-Bissau a criar melhores condições prisionais. Foram criados dois centros, em Mansoa e em Bafatá. Com a transferência dos reclusos, esse grupo de organizações achou por bem fazer uma transformação deste espaço – de violação grosseira dos DH para promoção e defesa dos DH. O projeto de transformação foi financiado pela Cooperação Portuguesa [na Guiné-Bissau]. " (...)  (Gueri Lopes Gomes)
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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de abril de  2024 > Guiné 61/74 - P25421: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (34): A fortaleza da Amura