Mostrar mensagens com a etiqueta segurança. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta segurança. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18889: A travessia do Rio Corubal em Cheche: inquérito (1): resposta de Domingos Gonçalves (ex-alf mil da CCAÇ 1546 / BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)



Guiné > Zona Leste > Região do Boé > Cheche > 6 de Fevereiro de 1969 > A jangada, de reserva, com sobreviventes da tragédia de Cheche, no Rio Corubal, na retirada de Madina do Boé (*)

Foto (e legenda): © Paulo Raposo (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Resposta, de ontem, às 8h55,  do Domingos Gonçalves Gonçalves ao nosso inquérito sobre a travessia do rio Corubal em Cheche.

[Foto à direita: Domingos Gonçalves foi alf mil da CCAÇ 1546 / BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68): tem cerca de 6 dezenas de referências no nosso blogue]
Bom dia,

A jangada era manobrada por um nativo, que residia no Che-Che. Em 1966 transitávamos com alguma segurança do Gabú, até ao Che-Che.


Não tinham lugar emboscadas, nem havia colocação de minas. Os problemas, graves, começavam depois da travessia do rio.

A jangada daquela época era insegura. O pessoal passava para o outro lado em pequenos grupos.

Recordo-me de pelo menos uma viatura carregada de munições ter caído no rio, com a respectiva carga.

Um abraço


2. Inquérito sobre a travessia do rio Corubal em Cheche:  questões a responder, no todo ou em parte,  por quem lá esteve ou por lá passou até ao trágico dia 6 de fevereiro de 1969 (Op Mabecos Bravios, retirada do aquartelamento de Madina do Boé e do destacamento de Cheche):

(i) quem manobrava a jangada ?

(ii) em princípio havia duas jangadas, sendo uma de reserva ?

(iii) também havia m sintex ou equivalente para ligar as duas margens ?

(iv) qual era a lotação habitual da jangada ? E a máxima ? Dois pelotões, 60 homens ? Menos, talvez 40 ?

(v) no caso das viaturas, a jangada podia transportar quantas e quais de cada vez ? Uma GMC ? Dois Unimog 404 ? Três Unimog 411 (burrinhos) ?

(vi) havia instruções  (explícitas, escritas ou orais) de segurança ?

(vi) no teu tempo, havia uma tabanca, em Che-Che, na margem esquerda (ou margem sul)  ? Eram fulas ? Era grande ou era pequena ? Quantas moranças tinha ? Havia milícias, abrigos, população em autodefesa ?

(vii) de que lado é que podia vir uma emboscada ou flagelação ? Da margem esquerda/sul (tabanca Cheche) ou do lado direita/norte  (destacamento de Checje / estrada de Canjadude) ? Ou de ambos ? 

(viii) alguma vez apanharam com minas anfíbias, minas /AC, minas A/P ou armadilhas, no rio, no ancoradouro, ou nas margens, ou na picada que leva até lá ?

(ix) imagino que os reabastecimentos fossem um inferno, e pior ainda no tempo das chuvas...

 (x)  quem guarnecia o destacamento de Cheche ? Talvez a CCAÇ 5, que estava em Canjadude, "Os Gatos Pretos", uma africana, a que pertenceu o nosso camarada e colaborador permanente, o José Marcelino Martins, fur mil trms ? Ou era outra subunidade ?

(xi) quantos homens tinha o destacamento de Cheche ?  Um pelotão ? Tinha armas pesadas (morteiro 81, metralhadora pesada, canhão s/r...) ?

(xii) quando se vinha do norte (estrada de Gabu e Canjadude) e  se fazia a trasvessia para o outro lado (tabanca de Cheche, destacamento de Béli, quartel de  Madina),  ficava  uma força a fazer a segurança ?... Era só o destacamento de Cheche ?  ou havia reforço da guarnição ?

 (xiii) O cabo que atrvessava o rio,  não era de aço, mas sim de  corda... Certo ? De aço seria pesadíssimo... E estava sempre montado e esticado ?

(xiv) e a jangada tinha motor auxiliar ? A jangada também era puxada a força de braço ? 

(xv) houve, no teu tempo, algum acidente ou incidente com a jangada ? Alguém (ou viatura) caído ao rio ?

(xvi) qual seria a largura e a profundidade do rio em Cheche ? No tempo seco e no tempo das chuvas
? (O desastre do dia 6/2/1969 foi no tempo seco...).

(xvii) Mais algum comentário ou observação:

_____________________________________________

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16791: Inquérito 'on line' (91): A "batota" que fazíamos no mato ?... Tenho dificuldade em responder por dois motivos: (i) a decisão não estava nas minhas mãos; e (ii) no Xime não podíamos deixar de privilegiar o conceito "A segurança, em primeiro lugar"... (Jorge Araújo, ex-Fur Mil Op Especiais, CART 3494, Xime e Mansambo, 1971/74)


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > c. 1969/70 > Xime > Margem esquerda do Rio Geba > O cais do Xime... que alimentava o "ventre do leste"... Por aqui passaram milhares de homens, viaturas, equipamentos, armas, munições, géneros alimentícios, etc. Desembarcados das LDG, seguiam depois pela estrada (alcatroada já no tempo do Jorge Araújo ) Xime-Bambadinca-Bafatá-Nova Lamego-Piche, etc. até pontos mais longínquos, já fronteira (Sare Bacara, Pirada, Canquelifá, Bajocunda, etc.).

Havia um aquartelamento na margem esquerda, guarnecido por uma companhia de quadrícula, além de um Pel Art (obus 10.5). Havia ainda uma tabanca (c. 250 habitantes), e no regulado do Xime três destacamentos de milícias (Amedalai, Demba Taco e Taibatá)..

Na margem direita do Rio Geba, frente ao Xime, situava-se a povoação e destacamento do Enxalé, /povoação outrora importante?.  A montante do Xime  ficava o reordenamento (e destacamento) de Nhabijões, os destacamentos de Mato Cão, Missirá, Finete, o qiartel de Bambadinca...Entre Xime e Bambadinca, no Rio Geba Estreito, circulavam as embarcações civis (também conhecidas por "barcos turras")...

Foto: © Arlindo Teixeira Roda (2010) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Comentário (*) do nosso camarada e colaborador assíduo do nosso blogue, Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Especiais da CART 3494. Xime e Mansambo, 1971/74),  


Camaradas,

Como certamente aceitarão, vivi como elemento do colectivo da CART 3494 muitas emoções/tensões na geografia do Xime (1972/73), umas mais fortes outras mais suaves, mas todas juntas dão corpo ao meu “livro de memórias” daqueles anos, experiências únicas e, até ver, inesquecíveis. Desde emboscadas em situação adversa e em inferioridade numérica, naufrágio, mortes e outras situações já descritas em narrativas publicadas anteriormente, tenho uma colecção de eventos que fazem de mim uma “pessoa rica” ou que dão título à formação militar que conclui em Lamego: «A sorte protege os audazes».

Quando se aborda a temática «A batota que fazíamos na guerra»…, tenho muitas dificuldades em responder, na medida em que não dependia de mim decidir sobre o que quer que fosse, pois estava sujeito à hierarquia, e quando entrava em operações mais problemáticas, as informações que me transmitiam eram escassas ou quase nulas.

Por outro lado, a situação geográfica do aquartelamento do Xime, não permitia fazer muitos “desvios” aos que faziam parte do “protocolo”, em que a principal missão estava relacionada com o conceito de Segurança, tarefa prioritária e diária que fazia parte da agenda dos diferentes Grupos de Combate.

Todas elas teriam de ser cumpridas com o máximo de rigor e superior atenção, pois tínhamos de garantir a segurança possível em parte do troço que ligava o Xime a Bambadinca, por causa/efeito do tráfego rodoviário que aí ocorria, uma vez que a possibilidade mais exequível para chegar à capital [Bissau], ou desta ao extremo leste do território, de que são exemplos: Bafatá, Contuboel, Nova Lamego, Piche, Canquelifá, Paunca, Galomaro, Mansambo, Xitole, Saltinho, …, só poderia acontecer por via marítima [Rio Geba].

Porque o cais do Xime era utilizado diariamente, quer como ponto de chegada e/ou de partida, por onde circulavam semanalmente centenas de militares e civis e uma vasta panóplia de produtos e equipamentos, este assumia-se como local político-militar-económico estratégico por excelência.

.Deste modo o nosso grande objectivo operacional era garantir a máxima segurança a todos os que dela necessitavam naquele troço, todos os dias, entre as 07.00/07:30H até ao pôr-do-sol ou, em situações particulares, até que ficassem concluídas as actividades portuárias, no local conhecido por Ponta Coli, onde os grupos escalados das diferentes Unidades de quadricula foram surpreendidos por bigrupos de guerrilheiros do PAIGC, no caso da CART 3494 em 22ABR1972 e 01DEC1972, daí resultando baixas de ambos os lados. 

Outro tipo de segurança que realizávamos estava relacionada com a protecção às embarcações que navegavam no Geba, onde os Gr Comb da CART 3494, algumas vezes reforçados por Gr Comb da CCAÇ 12,  percorriam os itinerários ícones do Xime, como sejam os exemplos de «Ponta Varela», «Madina Colhido», «Gundaguê Beafada» e «Poindon», em patrulhamentos ofensivos, montagem de emboscadas e outras missões/acções mais específicas, umas vezes com contactos outras de sentido inverso.

Perante o exposto, em que situações era possível “fazer batota”?.

Ab. Jorge Araújo

_______________


quarta-feira, 12 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12827: Memórias de um Lacrau (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) (Parte VII): Fotos de estrada, onde a velocidade máxima era de 40 km (e nas povoações, 35 km)


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70)  > Saída de Nova Lamego para Canquelifá com "armas, bagagens, mulheres e filhos dos nossos soldados" (1)


Guiné > Zona leste > ; Região de Gabu >  Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > Saída de Nova Lamego para Canquelifá com "armas, bagagens, mulheres e filhos dos nossos soldados"  (2)


Guiné > Zona leste > ; Região de Gabu >  Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > Saída de Nova Lamego para Canquelifá com "armas, bagagens, mulheres e filhos dos nossos soldados"  (3)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) &gt > > Estrada de Piche-Ponte Caium (1)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) &gt > Estrada de Piche-Ponte Caium (2)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) &gt > "Viatura nossa que sofreu uma mina na estrada de Cabuca" (1)


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) &gt > "Viatura nossa que sofreu uma mina na estrada de Cabuca" (1)


Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: L.G.]





1. Continuação da publicação das Memórias de um Lacrau ... Texto e fotos enviadas, em 9 de fevereiro último, pelo Valdemar Queiroz, nosso novo tabanqueiro, nº 648 [, em Contuboel, 1969, acima] (*)

Diz a última parte do texto, muito laconicamente:

"Depois, a partir de Nova Lamego, andámos em intervenção na zona leste, a nível de dois pelotões, por Cabuca, Cancissé, Madina Mandinga, Dara, Piche, Ponte Caium, Dunane, com permanência perlongada em Canquelifá, até nos fixarmos em Paunca e Guiro Iero Bocari."

Vamos apresentar fotos, com legendas destes vários lugares por onde passou o nosso camarada Valdemar Queiroz, esperando que ele e outros "lacraus" complementam esta informação.

Hoje  são  fotos de  "estrada", em que os heróis eram os condutores auto... Pormenor de segurança: a velocidade máxima das viaturas militares, no CTIG, era de 35 km nas povoações e 40 km nas estradas (?)...

_______________

Nota do editor:

(*) Vd. últino poste da série > 10 de março de  2014 > Guiné 63/74 - P12820: Memórias de um Lacrau (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) (Parte VI): Fotos de Nova Lamego: a escola de cabos: eu, com os soldados do meu pelotão Alauro, Boi, Saliu, Alseine e Adulo

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10890: (In)citações (46): Em louvor das canoas nhomincas... e a propósito da notícia do trágico naufrágio de 28 /12/2012, ao largo de Bissau (Patrício Ribeiro)


Guiné-Bissau > Bolama > s/d > Cais > Uma canoa nhominca, para transporte de passageiros. A sua lotação máxima são 100 passageiros.

Foto: © Patrício Ribeiro (2009). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do nosso amigo e camarada Patrício Ribeiro [, foto á direita, quando fuzo em Angola](*):


Data: 31 de Dezembro de 2012 18:02

Assunto: Guiné-Bissau de luto nacional por causa de naufrágio de piroga  + Canoas Nhomincas


Luís

Não me apetece comentar [, a notícia do trágico naufrágio ocorrido em 28 de dezembro, ao largo dop porto de Bissau, com um canoa sobrelotada, que vinha de Bolama] (**), mas...

Já viajei nestas canoas nhomincas, algumas centenas de horas (, talvez até milhares),  para todas as Ilhas dos Bijagós.

Para Bolama, viajei muitas dezenas de vezes, em diversas embarcações. Quer nestas canoas, ou pequenos botes, algumas vezes durante a noite. Nos últimos tempos em barcos grandes, que até há pouco tempo faziam a carreira duas vezes por semana, e que agora estão avariados.

Algumas vezes nestas viagens tinha por companhia o Comandante Alpoim Calvão, meu comandante na Escola de Fuzileiros em 68/69, que lá tem, [em Bolama,]  uma fábrica de descasque de caju e dá emprego a mais de 200 pessoas.

Em 2012, viajámos juntos 2 vezes, 5 horas para cada lado. Os barcos tinham que passar por Bolama de Baixo, devido ao calado, não podiam passar pelo canal.

As canoas passam pelo canal de Bolama com a maré cheia, levam 2,5 horas em cada percurso. Nesta época do ano, há marão entre a Ilha das Areias até Bissau, o lugar pior é já perto de Bissau, as ondas são maiores e apanha também as correntes sempre muito fortes das marés, foi o que aconteceu infelizmente, com esta.

As coisas nem sempre correm bem, nesta época do ano entre Dezembro e Janeiro, devido aos ventos que provoca o marão, que são ondas de 1 até 2 metros.

É que devido a estas desgraças, há 3 ou 4 anos o governo decretou, que todas as embarcações tinham que ter: (i) um rádio de comunicação; e (ii) coletes salva vidas para todos os passageiros, e que (iii) cada embarcação só podia levar um determinado número de pessoas.

Já estive algumas horas à espera que a polícia marítima fizesse sair os últimos que entravam contra as ordens dos marinheiros da embarcação... É muito difícil... Ninguém quer sair... Toda a gente se conhece... São todos amigos... Não há respeito pelas autoridades... E a hora da maré não espera... É tudo contra relógio!

A maioria das vezes lá segue viagem com o dobro ou o triplo dos passareiros. Uma vez de Bubaque para Bissau, contei 200 pessoas numa canoa grande, trazia a mais, 100 pessoas, não foi nada fácil chegar ao destino…

Já passei por grandes problemas que davam para contar durante horas, mas como dizem os meus amigos... "chego sempre"... E eu acrescento: até agora, felizmente! Foi numa destas canoas "nhominca", que fiz a viagem para a fragata Vasco da Gama, acompanhado de outros portugueses [, em 1998]…

Por vezes quando todos entram em pânico, é necessário tomar algumas atitudes pouco "recomendáveis" e tomar conta da embarcação, que o digam os meus colaboradores, ou alguns nossos amigos, que brincam com o que às vezes tenho que fazer, para que tudo corra bem. "É necessário que cada um fique no seu lugar, não deixar que corram todos para o mesmo lado".

As canoas nhominca são as melhores embarcações e que se adaptam ao mar desta costa de África. O povo Nhominca foi quem as construiu há séculos, propositadamente para este mar!...

Já mandei construir algumas destas canoas, que depois entrego aos projectos, em pequenos estaleiros em Bissau, ou no grande estaleiro de Zinguichor, no Senegal. A maior concentração destas embarcações que já vi, foi em St. Louis, no norte do Senegal, umas largas centenas! Elas percorrem todo o mar costeiro, nesta costa de África, à pesca.

Boas festas

Patricio Ribeiro
IMPAR Lda
Av. Domingos Ramos 43D - C.P. 489 - Bissau ,
Tel / Fax 00 245 3214385, 6623168, 7202645, Guiné Bissau
Tel / Fax 00 351 218966014 Lisboa
  www.imparbissau.com
impar_bissau@hotmail.com

_____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 24 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10715: (In)citações (45): Carlos Guedes e Teco com livro sobre a CCAÇ 726, em preparação (Virgínio Briote)


(**) Excerto de notícia  da Lusa, publicada no JN - Jornal de Notícias, de 2 de janeiro de 2013:

(...) A polícia marítima da Guiné-Bissau confirmou, esta quarta-feira, que subiu para 29 o número de mortos no naufrágio de uma piroga em 28 de dezembro ao largo de Bissau.

Fonte da polícia marítima disse à agência Lusa que até terça-feira foram oficialmente contabilizados 29 mortos, depois de ter sido encontrado o corpo de um homem de 30 anos junto ao cais do porto comercial de Bissau.

O corpo foi levado para a morgue do hospital Simão Mendes, disse a fonte da polícia marítima, que confirmou que nos últimos dias têm sido encontrados corpos de náufragos "em lugares diferentes".

A mesma fonte confirmou também que a Policia Judiciaria (PJ) já tomou conta do caso estando neste momento a ouvir as pessoas diretamente envolvidas no acidente, nomeadamente o capitão do porto da ilha de Bolama, de onde partiu a piroga que naufragou, o dono da embarcação e a tripulação da mesma. (...)

No discurso à Nação por ocasião do fim do ano, o Presidente de transição da Guiné-Bissau, Serifo Nhamadjo exigiu que as pessoas responsáveis pelo naufrágio sejam encontradas e castigadas para que situações do género não voltem a acontecer no país.

Cinco dias após o naufrágio, a polícia marítima e a capitania dos portos de Bissau continuam sem saber quantas pessoas poderiam estar na piroga uma vez que os números de passageiros oficialmente transportados pela embarcação não coincide com aquele que tem sido referido pelos passageiros sobreviventes do naufrágio.

O delegado da polícia marítima de Bolama alega que a embarcação transportava 97 pessoas e os passageiros afirmam que seriam entre 150 a 200 pessoas. (...)

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7484: FAP (58): Se perguntar não ofende... Qual era a segurança dos camiões com bombas de avião que circulavam entre Bissau e Bissalanca ? (Nelson Herbert)

1. Comentário do nosso amigo Nelson Herbert ao poste P7303:

 Em miúdo, em Bissau,  um aspecto que sempre moveu a minha curiosidade, devido em parte à natureza letal da coisa (quiçá esteja errado),  era a aparente facilidade com que as bombas dos aviões eram por vezes expostas, em camiões abertos, defronte à messe dos sargentos da Força Aérea,  que eram meus vizinhos...

Era comum ver os tais longos camiões militares, de cor azul, a cor da força aérea, com carregamento de bombas (umas 10 a 20 peças), estacionados à porta da messe... Tudo assim exposto, com a criançada brincando ao largo...

Calculo que,  na viagem de regresso à Base de Bissalanca, tenha virado hábito dos motoristas desses camiões estacionar à porta da messe, para uma cervejinha qualquer... Quem sabe ?

Hoje pergunto: tal exposição não feria os mais elementares códigos de segurança ? Que riscos comportava ?  Ou era tudo natural e da praxe ?

Nelson Herbert

[ Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

Foto: Bomba de Fiat G-91, de 750  libras. Cortesia do blogue do nosso camarigo Victor Barata, Especialistas da Base  Área 12 Guiné 1965/74 (a quem retribuímos as saudações bloguísticas pela quadra festiva de Natal e Ano Novo.
______________

Nota de L.G.: Último poste desta série > 16 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 – P7452: FAP (57): Será que a cúpula do PAIGC queria ganhar a guerra? (António Martins de Matos)

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7308: Em busca de... (149): Imagens ou notícias de Fuzos & Chaimites, em Bissau, em Janeiro de 1970 (a/c de Blogue Barco à Vista)




Guiné > Zona leste > Região de Gabú > Piche > CCAÇ 3546 (1972/74) > s/d >  Chaimite, atravessando o Rio Geba   Esta viatura blindada deveria, possivelmente, pertencer ao Esq REex Fox 8840 (Bafatá, 1973/74). Foto do álbum fotográfico do nosso camarada Jacinto Cristina (residente em Figueira de Cavaleiros, Ferreira do Alentejo), que esteve 14 meses destacado na Ponte de Caium. A foto  não traz legenda. Na imagem consegue-se "identificar" dois graduados, um capitão e um alferes...

Foto: © Jacinto Cristina (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.



1. Questão que um nosso leitor, Duarte, oficial superior do Exército, no activo (que eu não identifico pelo apelido, por razões de deontologia profissional),  me pede para levar ao conhecimento aos camaradas que estiveram no TO da Guiné:

 Data: 17 de Novembro de 2010 15:46
Assunto: Questão para blogue 

Caro Luís,

Tenho acompanhado o seu blogue e noto que vai de vento em popa! É um facto inegável que tem contribuído, juntamente com os seus camaradas,  para a redacção de livros sobre o conflito colonial, por tal Bem Hajam!

Desta vez peço-lhe um favor para auxiliar o meu jovem amigo, autor do blogue Barco à vista [, foto à esquerda]. Tem publicado artigos interessantes relacionados com a Marinha, no entanto merece toda a ajuda possível, dado a qualidade dos seus textos e modo agradável como escreve.

Está a escrever um artigo sobre as CHAIMITES que os Fuzileiros receberam na 2.ª metade dos anos 70, tendo apoio de muito militares da Armada.

No entanto, há coisas que a sua rapaziada certamente pode melhor ajudar ou neste caso confirmar, segundo ele teve conhecimento, alguns «Fuzos» na Guiné, ao que parece em Janeiro de 1970, fizeram um breve passeio nas Chaimites do Exército na própria cidade de Bissau, durante uma operação urbana.

A ideia é pedir o favor que questione o pessoal que participa no seu blogue, se recorda e confirma o referido.

Um abraço
Duarte

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, Duarte, pelas simpáticas palavras que nos dirige... A caminho dos 7 anos de existência na blogosfera, temos às vezes dúvidas sobre o sentido e o alcance da missão, e perguntamos, como o poeta, se vale(u) a pena... É a chamada dúvida metódica,útil para nos mantermos centrados no objectivo primordial de sermos um blogue, pacífico e pacificador, de ponte(s) (não de ponta, muito menos de ponta-e-mola)... 

Mas deixemo-nos de filosofias, e vamos lá ao seu apelo... Camaradas: quem se lembra de ver Chaimites & Fuzos a passear, em Janeiro de 1970, na Praça do Império, em Bissau ? Dão-se alvíssaras a quem mandar fotos e/ou notícias...

Temos já meia dúzia de referências, no nosso blogue (II Série)  a esta viatura blindada. Clicar aqui. Em 1973/74, na zona leste, parece que era frequente as Chaimites proporcionarem alegres (e despreocupados) passeios anfíbios no Rio Geba, como se pode ver na foto reproduzida acima ... Não consta que tenha havido acidentes, no rio, com estas gloriosas máquinas anfíbias... Mais comentários, para quê ? Os artistas são portugueses...

 Mas já que falamos de Chaimites, quero recordar aqui, ao nosso camarada António Carlos Ferreira (ex-furriel Mortágua, Esquadrão de Reconhecimento Fox 8840, Bafatá,  1973/74)  que ele aceitou o meu convite para integrar a nossa Tabanca Grande, tendo ficado de enviar histórias e imagens desse tempo (ele bateu todo o leste mas também o sul com as suas gloriosas Chaimites)... É o proprietário da Adega Típica A Pharmácia,  Rua Brasil 81/85, Coimbra, E-mail: adegapharmacia@gmail.com;  Contactos:  telemóvel: 917213076 / telefone  239 404 609).
_____________

Nota de L.G.: 


domingo, 7 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5778: Efemérides (45): O desastre do Cheche, visto por quem esteve lá e perdeu 11 homens do seu grupo de combate (Rui Felício, Alf Mil, CCAÇ 2405, Galomaro, 1968/70)

Guiné > Zona Leste > Região do Boé > Cheche > 6 de Fevereiro de 1969 > A jangada, de reserva, com sobreviventes da tragédia de Cheche, no Rio Corubal, na retirada de Madina do Boé (*)

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados

Guiné > Zona Leste > Subsector de Galomaro > CCAÇ 2405 > 1969 > Dulombi > Na messe, os alferes milicianos Raposo (à direita) e Rijo (à esquerda); de costas, os furriéis milicianos Cândido e Magno. Os Alf Mil Paulo Raposo e Jorge Rijo estavam, em Cheche, no dia de 6 de Fevereiro de 1969.

Foto: © Paulo Raposo (1997). Direitos reservados

Jantar a bordo do Uíge, a caminho da Guiné > Finais de Julho/princípios de Agosto de 1968 > Os quatros alferes milicianos da CCAÇ 2405: David e Raposo, do lado esquerdo; Felício e Rijo, do lado direito.

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados


 Guiné > Zona Leste > Sector L5 > Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2405 (1968/70) > Embora pertencente ao BCAÇ 2852 - cujo comando e CCS estavam sedeados em Bambadinca -, a CCAÇ 2405 não teve grandes contactos com o pessoal da CCAÇ 12 (a quem eu pertenci: Contuboel e Bambadinca,Maio de 1969/Março de 1971).  Daí que só no I Encontro Nacional do nosso blogue, na Ameira, Montemor-O-Novo (organizado pelo Paulo Raposo e pelo Carlos Marques dos Santos), em 14 de Outubro de 2006, é que eu tive o prazer de conhecer pessoalmente o Rui Felício, a par de outros dois baixinhos de Dulombi, o Paulo Raposo e o Vitor David.

Esta foto do Rui, sentado num abrigo - em princípio, de uma  tabancas em autodefesa do sector L5, em 1969 - , foi-nos enviada pelo Victor David, seu camarada, outro alferes da companhia e nosso tertuliano, que também terá servido de fotógrafo de ocasião, segundo presumo. Não tenho informações precisas sobre a data nem o local. (LG)

Foto: © Victor David (2006). Direitos reservados. 


1. Reprodução do poste, da I Série, de 12 Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 - DXXVI: O desastre do Cheche: a verdade a que os mortos e os vivos têm direito (Rui Felício, CCAÇ 2405)

Texto do Rui Felício (ex-Alf Mil da CCAÇ 2405, Galomaro, 1968/70) (**). (Vd. poste anterior desta série  Efemérides ***.).

1. Comentário a propósito do post escrito pelo camarada José Martins sobre o desastre na travessia do Rio Corubal em 6 de Fevereiro de 1969 (1)

Preâmbulo

Acabei de ler um texto escrito pelo camarada José Martins onde relata a sua experiência na zona de Madina do Boé.

Embora tenha reconhecido que não assistiu directamente ao que se passou no célebre e lamentável desastre do Cheche, ocorrido no fatídico dia 6 de Fevereiro de 1969, o José Martins conheceu bem o local e a região e desenvolveu a sua descrição socorrendo-se de relatos e documentos alusivos ao sucedido.

E nota-se pelo seu relato que sofreu muito, e que ainda hoje sente as marcas do desastre, passados 37 anos sobre a sua ocorrência.

Ninguém, bem formado e sensível, poderia nunca, de resto, ficar indiferente a semelhante tragédia, ainda que, como o narrador José Martins, não tenha dela sido testemunha ocular.

Imagine-se então a ferida profunda que aquele desastre deixou a quem, como eu e muitos outros, foi não só testemunha ocular mas também, e principalmente, interveniente e vítima do colapso da artesanal jangada que servia de transporte aos militares e equipamentos que participaram na complexa, perigosa e cansativa operação de resgate da Companhia de Caçadores que se evacuou do célebre aquartelamento de Madina do Boé.

Desastre onde pereceram, segundo as estatísticas oficiais, 47 militares, onze dos quais, do pelotão que eu comandava… Permito-me destacar dois deles pelas relações especiais de amizade e de confiança que neles depositava, sem esquecer obviamente a dor causada pela morte de todos os outros:

(i) um, o furriel Gregório Rebelo, açoriano de sotaque cerrado e quase ininteligível que assumia as funções, embora não protocolares, de meu substituto em todas as circunstâncias, no comando do pelotão, e que mantinha a orgânica disciplinar e operacional da pequena unidade militar;

(ii) o outro, o soldado Octávio Barreira, transmontano de gema, homem rude, de uma só palavra, de têmpera sã, de antes quebrar que torcer, mas capaz de morrer para salvar a vida do seu amigo, e a quem eu atribuira as funções, também não protocolares, de meu guarda-costas.

Quem passou pela guerra colonial sabe que a escolha do guarda-costas recaía invariavelmente no soldado em que o alferes depositava maior confiança e amizade.

Aliás, como também é sabido, a designação de guarda-costas não tem a mínima conotação com a ideia que na vida civil se faz de alguém com este titulo ou funções. O guarda-costas era, acima de tudo, o soldado às ordens, o confidente, o amigo…. E muito menos, ou quase nada, o protector da integridade fisica do alferes, ao contrário do que se possa pensar.

A perda destes treze homens, que recordo com saudade e dor, sempre que a memória da Guiné me vem à lambrança, e que ajudei a formar para a guerra, em Abrantes e Santa Margarida, após oito meses de convivência próxima nas diversas tabancas onde o pelotão esteve destacado, foi um choque tremendo, inolvidável, cuja lembrança ainda hoje me faz arrepiar a alma e assomar as lágrimas.

Sobre o desastre do Corubal

Feito o preâmbulo, entro de imediato no motivo que me levou a servir-me do espaço disponibilizado pelo camarada Luis Graça a quem, sem o conhecer pessoalmente [, conhecemo-nos deopois no nosso I Encontro Nacionala, na Ameira], desde já transmito o meu aplauso pela feliz e dinâmica iniciativa da criação deste blogue.

É que é importante que seja a nossa geração, aquela que interveio, por obrigação ou por convicção ou por ambas as coisas, na guerra da Guiné, que tem que dar testemunho o mais exacto possível daquilo que por lá se passou.

Se assim não fôr, corremos o risco de a história ser deturpada, porque feita com base em documentos ou relatos nem sempre seguros, nem sempre fiéis… É por isso que, correndo o risco de desencadear alguma polémica, que não pretendo, achei que devia esclarecer alguns pontos do relato feito pelo José Martins a que atrás aludi.

Deduz-se daquele relato, publicado no blogue, que o desastre teria acontecido essencialmente devido a três factores:

(i) Os militares descomprimiram e tentaram encher os cantis com água do rio, o que terá provocado, depreende-se, o desiquilíbrio da estabilidade da jangada;

(ii) Teria sido ouvido um som abafado, semelhante a uma morteirada, que teria provocado agitação entre os militares e, em consequência, desiquilibrado a jangada;

(iii) Que, após o acidente, a água do Rio Corubal terá tomado um tom avermelhado, querendo com isso dizer-se que os crocodilos que habitavam as águas do rio, teriam consumado a morte dos militares que cairam à água.

A versão dos acontecimentos, veiculada pelo José Martins, assenta, como já se disse, em relatos e documentos sobre os factos, dado que este camarada, como ele próprio confirma, não assistiu ao que se passou. Mas, não obstante a presumível credibilidade das fontes a que recorreu, posso garantir que não foi exactamente assim que as coisas se passaram.

E digo isto com a mais profunda convicção e a mais inabalável certeza de alguém que estava na jangada, caiu à água, nadou durante uns cinco minutos e a ela retornou após a mesma se ter de novo equilibrado.

São factos que não se apagarão jamais da minha memória, por mais anos que viva, e apesar de não estar de posse de documentos que os comprovem...


2. O fime da SIC sobre o desastre do Rio Corubal

O mais curioso é que no filme, da autoria de José Saraiva, realizado por Manuel Tomás, que foi visto há uns anos atrás, por muitos milhares de portugueses através da sua transmissão pela SIC e pela distribuição de um vídeo feita na mesma altura pelo Diário de Notícias, são apresentadas aquelas mesmas razões como causas imediatas do desastre.

Já nessa altura contestei as conclusões do filme, e fi-lo por escrito e em reunião pessoal com o Director de Informação da SIC, Dr. Alcides Vieira, estando presente o realizador Manuel Tomás, que dirigiu a realização do filme.

Refiro que a carta entregue na SIC foi subscrita não só por mim mas por dezenas de ex-militares da CCAÇ 2405 que, por coincidência nessa mesma altura, no almoço de confraternização anual, a leram e assinaram.

A contestação dos factos descritos no filme foi feita nessa reunião na SIC, com a prévia concordância do Comandante da Operação, Brigadeiro Hélio Felgas, e estando presentes, além de mim próprio, o Capitão Miliciano José Miguel Novais Jerónimo e o Alferes Miliciano Paulo Enes Lage Raposo [ ambos da CCAÇ 2405].

E ela foi por nós solicitada à SIC em virtude do impacto que a exibição do filme teve nos ex-militares que a ele assistiram e que tinham estado presentes na jangada naquele dia do desastre. Com efeito, no próprio dia da exibição do filme comecei a receber telefonemas de antigos camaradas, um tanto decepcionados e alguns até revoltados, pela inexactidão dos pormenores que ali eram descritos.

Todos nós três, presentes na dita reunião, participámos na operação de evacuação de Madina do Boé, e todos estavamos presentes no local do acidente no Cheche naquele dia 6 de Fevereiro de 1969.

O Capitão Jerónimo, comandante da CCAÇ 2405, e eu próprio, estávamos na jangada no momento do acidente, onde se encontrava também o Alferes Miliciano Jorge Rijo, oficial da CCAÇ 2405, com o seu pelotão.

O Alferes Miliciano Paulo Raposo, também oficial da CCAÇ 2405, já tinha feito a travessia do rio na viagem anterior, e encontrava-se na margem norte do Corubal com o seu pelotão, observando a tragédia.

Na referida reunião da SIC, o realizador Manuel Tomás argumentou que o filme fora realizado com fundamento em entrevistas e em documentos oficiais militares a que tinha tido acesso, pelo que considerava o filme suficientemente documentado.

E disse que esses documentos atestavam as razões acima referidas, isto é, que a jangada se virou porque, no essencial, teria havido disparos de morteiro que, supostamente vindos do IN, teriam criado o pânico nos militares, os quais, ao agitarem-se, teriam provocado o desiquilíbrio da jangada.

Perante a irredutível posição da SIC em manter a versão veiculada pelo filme, nada mais nos restou do que desistirmos do pedido que lhe fizémos para que fosse proporcionado esclarecimento público sobre as conclusões desse filme.

Foi dito, nessa reunião, ao Dr. Alcides Vieira e ao Sr. Manuel Tomás,  que, por muito credíveis que pudessem parecer os documentos militares em que fundamentaram a versão filmada, nenhum deles jamais desmentiria ou apagaria da minha memória e dos meus camaradas o que realmente se passou.

Mais importante que os documentos preparados no silêncio dos gabinetes militares, sabe-se lá com que inconfessados motivos, era a indesmentível memória daqueles que tinham sido protagonistas e vítimas do desastre.

É com o mesmo espírito de esclarecimento da verdade dos factos que volto hoje ao assunto, desta vez no ambiente mais acolhedor de um blogue criado e gerido por alguém como o Luis Graça que, tendo estado na Guiné, sabe melhor que ninguém que não queremos honrarias, distinções ou protagonismo público.

Queremos tão só que a história seja o mais verdadeira e exacta possivel... Esse é o legado que queremos deixar aos vindouros, para que jamais seja ignorado o sacrificio de uma geração inteira, retirada à sua despreocupada juventude para fazer uma guerra em longínquas terras, em nome dos seus deveres e obrigações para com a sua Pátria.


3. A verdade do que sucedeu

Mas então, o que se passou realmente naquela manhã de 6 de Fevereiro [de 1969]?

A CCAÇ 2405, comandada pelo Cap Mil Inf Novais Jerónimo, integrava a coluna militar que tinha partido na manhã do dia anterior de Madina do Boé, rumo ao Cheche, e tinha como missão escoltar a Companhia de Caçadores [1790] evacuada daquele aquartelamento e que era comandada pelo Cap Inf Aparício (que, após o 25 de Abril, veio a assumir a função de Comandante Geral da PSP de Lisboa).

Ao fim desse dia a coluna chegou às imediações do rio Corubal, junto ao local de cambança para o Cheche. E durante toda a noite a jangada fez contínuas viagens transportando pessoal de apoio e, sobretudo, equipamentos militares e de transporte.

Ao amanhecer, as viagens de transporte entre as duas margens continuaram consecutivamente, até que chegou o momento em que na margem sul do rio Corubal já só restavam quatro grupos de combate, todos eles comandados pelos respectivos alferes, bem como os capitães Aparício e Novais Jerónimo. Além destes, encontrava-se o 2º Comandante da Operação [Mabecos Bravios], um major cujo nome já não recordo.

Segundo a rotina estabelecida e as instruções recebidas pelo responsável pela condução da travessia (Alf Mil Diniz), esperávamos na margem do rio que este responsável mandasse entrar metade do pessoal ainda ali estacionado, ou seja, dois dos quatro pelotões acima referidos.

É que a jangada, segundo bem explicou o alferes Diniz, tinha uma lotação de segurança de um máximo de 60 homens (2 pelotões). E o alferes Diniz assim fez, à semelhança do que tinha já feito dezenas de vezes ao longo da noite, zelando para que a carga da jangada não excedesse os limites de segurança estabelecidos.

Mandou entrar o meu pelotão e o do Alferes Rijo, ficando na margem para a viagem seguinte, os dois pelotões da Companhia do Capitão Aparício. Subitamente porém, assisti a uma conversa entre o 2º Comandante da Operação e o Alferes Diniz, em que este foi intimado pelo referido 2º Comandante a mandar embarcar os dois pelotões restantes, dado que não se podia atrasar mais a operação.

Apesar dos argumentos do Alf Diniz, tentando que em vez dos 4 pelotões embarcassem apenas dois, prevaleceu a autoridade da patente militar mais alta e assim acabaram por embarcar os 4 pelotões, para a derradeira viagem da jangada...


E foi de facto a sua derradeira e trágica viagem... Ainda não estavam percorridos 10 metros e já a jangada submergia e, de seguida, se virava projectando para a água quantos nela seguiam... E não me recordo de ter ouvido qualquer disparo de morteiro, antes do desastre... E não me lembro de ter detectado antes qualquer sinal de pânico entre os soldados... Aliás, a sua experiência operacional no teatro de guerra era já apreciável e não entrariam em pânico por um simples disparo de morteiro que estou seguro que não existiu.

Houve alguns disparos de morteiro, é verdade, mas após o desastre e feitos pelas NT, no intuito de prevenir qualquer aproveitamento do IN que eventualmente estivesse emboscado nas imediações.

Exceptuando os militares que infelizmente pereceram afogados no Corubal, passados poucos minutos, todos restantes retornavam à jangada que, pouco depois, se reequilibrou e retomou a sua viagem para a margem norte do rio. E eu fui um deles... Depois de me ter libertado da espingarda, das cartucheiras, das botas e das granadas, cujo peso me puxava inexoravelmente para o fundo...

Em nenhum momento descortinei qualquer tipo de pânico quando regressei à jangada e, talvez nervosos ainda do desastre, todos sorriamos e aceitávamos o banho forçado como uma dádiva divina depois de vários dias de sede e calor.

Ninguém se apercebeu de nenhum camarada em aflição ou pedindo socorro. Ninguém sequer sonhou que a tragédia tivesse atingido as proporções que tomou. Só na margem norte do rio, quando mandei formar o meu pelotão e o vi reduzido a quase metade é que tive consciência da desgraça que tinha acontecido.

E foi então que, algo descontrolado, me dirigi à margem do rio que engolira os meus soldados na esperança de ainda ver alguém... Mas a tragédia estava consumada de forma silenciosa, definitiva e rápida.

Em resumo e concluindo:

(i) O desastre do Cheche ficou a dever-se, em minha opinião, ao excesso de peso entrado na jangada;

(ii) E ela é corroborada por todos aqueles que, como eu, viajavam na jangada e que em conversas a seguir ao desastre manifestaram a mesma opinião;

(iii) Note-se que a mesma jangada tinha já feito dezenas de travessias sob as ordens directas do Alf Diniz sem nunca se ter detectado qualquer problema;

(iv) Esse problema surgiu de forma trágica na última travessia, ou seja, naquela em que o responsável Alf Diniz não pôde efectivamente proceder segundo o que estava estabelecido, deixando entrar na jangada o dobro da sua capacidade, por ordem do 2º Comandante da Operação a que, pela natureza da hierarquia militar, não poderia opor-se;

(v) Mas fê-lo, e disso dei testemunho no âmbito do inquérito que se seguiu, advertindo previamente o seu superior hierárquico para o facto de estar a infringir as determinações que tinha sobre a forma de fazer a travessia do rio e da lotação definida para a embarcação;

(vi) E estou convencido que a rapidez do desaparecimento das vítimas nas águas calmas, escuras e profundas do Corubal, se ficou a dever ao facto de todos transportarem consigo pesado equipamento de guerra que lhes tolheu os movimentos e os conduziu para o fundo do rio, de forma tão rápida, com a agravante de que a maior parte deles não sabia nadar;

(vii) Finalmente, não posso deixar de fazer referência ao que o José Martins diz ter ouvido de "alguém que esteve no centro do acontecimento" de que as águas tomaram um tom avermelhado.

(viii) Sei da existência de crocodilos naquele troço do rio Corubal.

(ix) Sei que alguns dos corpos de soldados encontrados dias mais tarde, apresentavam sinais de terem sido dilacerados por crocodilos.

(x) Mas sei também que as águas, naquele dia, e após o acidente, apenas apresentavam o tom natural verde escuro de um rio calmo e profundo e tenho dúvidas que os crocodilos tivessem estado presentes naqueles momentos, com o ruído de helicópteros sobrevoando as águas a baixa altitude, na tentativa de encontrar e socorrer algum soldado em dificuldades.

(xi) Não devemos dramatizar mais o que só por si já foi suficientemente dramático (2)...


4. Breves dados sobre a CCAÇ 2405 (1968/70)

Composição da CCAÇ 2405:

A CCAÇ 2405, à data dos acontecimentos, tinha a sua sede em Galomaro (3).

Comandante: Cap. Mil. José Miguel Novais Jerónimo

1º Grupo de Combate – Alf Mil Jorge Lopes Maia Rijo
2º Grupo de Combate – Alf Mil Vitor Fernando Franco David
3º Grupo de Combate – Alf Mil Rui Manuel da Silva Felício
4º Grupo de Combate – Alf Mil Paulo Enes Lage Raposo


O 2º Grupo de Combate, comandado pelo Alf Mil Vitor David, não integrou a Companhia na operação de evacuação de Madina do Boé, ficando na sede da Companhia em Galomaro, onde porém a acompanhou através dos meios rádio.

As baixas resultantes do desastre do Cheche foram sofridas pelos 1º e 3º Grupos de Combate, que viajavam na jangada na altura do acidente.


Rui Felício
(Ex-alf mil inf CCAÇ 2405

[ Fixação / revisão de texto / bold a cores / título: L.G.]
_________

Notas de L.G.

(1) Vd. post do José Martins > 6 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - D: Madina do Boé, 37 anos depois

(2) Vd os posts anteriores sobre este tópico:

17 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIX: Antologia (7): Os bravos de Madina do Boé (CCAÇ 1790)

(...) "Apresentação do livro de Gustavo Pimenta, sairómeM - Guerra Colonial (Palimage Editores, 1999), no Porto, Cooperativa Árvore, em 10 de Dezembro de 1999. Autor do texto: José Manuel Saraiva, jornalista do Expresso" (...)

2 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre do Cheche, na retirada de Madina ...

(...) "Este documento, que me chegou às mãos através do Humberto Reis, relata a dramática operação em que participou a CCAÇ 2405, sedeada em Galomaro, e pertencente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), operação essa que tinha em vista operação essa que tinha em vista retirar as NT da posição insustentável de Madina do Boé, cercada pelo PAIGC"(...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXX: A retirada de Madina do Boé (José Martins)

(...) "O mês de Fevereiro de 1969 tivera inicio há poucos dias quando passou, no aquartelamento de Canjadude, uma coluna cuja missão era retirar a Companhia de Caçadores nº 1790 do seu destacamento de Madina do Boé. Paralelamente a guarnição do posto do Cheche, pertencente à Companhia de Caçadores nº 5, também retiraria e juntar-se-ia à nossa companhia em Canjadude" (...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXI: Comentário de Afonso Sousa ao texto sobre a retirada de Madina do Boé

(...) "Emociona este seu testemunho. Eu só faço uma pequena ideia do sofrimento de todos vocês, naquele momento trágico, nas horas e nos dias seguintes - em terras de solidão, em paragens dos confins da Guiné" (...).

(3) Em Fevereiro de 1969, a CCAÇ 2405 era a unidade de quadrícula de Galomaro, pertencendo ao Sector L1, e estando afecta por isso ao comando do BCAÇ 2852, sediado em Bambadinca.
__________

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4760: Pensamento do dia (17): Recordando as Picas (Jorge Teixeira/Portojo)

1. Mensagem de Jorge Teixeira (Portojo) (*), ex-Fur Mil do Pelotão de Canhões S/R 2054, Catió, 1968/70, com data de 29 de Julho de 2009:

Caro camarada e amigo Vinhal

Para publicar se tiver interesse.
Na secção que achares melhor.

Um abraço especial para ti.
Jorge Teixeira




Recordando as Picas

As Picas em acção na estrada Catió/Ganjola

Foto: © Jorge Teixeira (Portojo) (2009). Direitos reservados.


Rebuscando o baú fui dar com esta foto de meados de 1968. Nessa altura ainda tinha a mania das fotos - a máquina por vezes era emprestada para também ficar com uma recordação e que em devido tempo seria mandada para casa, demonstrando assim que tudo estava bem no paraíso de férias que era Catió e arredores.

Ora esta dita foto foi feita na estrada Catió/Ganjola [leia-se: Gandjola,que ficava a norte de Catió] e que era percorrida se não todos, quási todos os dias, com reabastecimentos lá para o destacamento.

Chegados a uma determinada altura, a coisa já era tão normal que quási passava a descontracção. Mas sempre era picada a dita estrada, o que demorava a fazer nos seus primeiros 6 a 7 km umas três horas bem puxadas. A parte restante até ao rio [de Ganjola] já era feita só pelas viaturas, ficando o pessoal da pica no remanso à espera do regresso.

Mas o importante da foto é que se podem ver na perfeição os nossos simpáticos e quási infalíveis detectores de minas, mais conhecidos como as Picas. Ora digam lá, camaradas, vocês que bem conheceram estes artefactos, se não mereciam estar em destaque nos vários Museus Militares espalhados pelo País Portugal?

Quantos picadores nos salvaram a vida com estas belezas? Mas quantos deles foram também traídos por elas?

A nossa homenagem a todos os picadores das estradas da Guiné.


Um abraço para a Tabanca e até à próxima
Jorge Teixeira
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 30 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4614: Controvérsias (23): Milicianos… eram os peões das nicas! (Jorge Teixeira)

Vd. último poste da série de 15 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3208: Pensamento do dia (16): E não se pode exterminá-la ?... A epidemia de cólera em Bissau (Sofia Branco, Público)

terça-feira, 8 de julho de 2008

Guiné 63/74 - P3034: Blogues da nossa blogosfera (1): Bissau Calling (Joaquim Mexia Alves)

A Guiné-Bissau é como um sorriso do outro mundo

Mensagem do Joaquim Mexia Alves, de 23 de Junho:

Caro Luis e camarigos,

Chamo a atenção para um blogue, dum portugês chamado Miguel Girão de Sousa, e que é o "Conselheiro Político, de Protocolo e de Informação Pública da Missão da União Europeia de Apoio à Reforma do Sector de Segurança da Guiné-Bissau" (1).

O blogue chama-se Bissau Calling ( http://bissaucalling.blogspot.com/) e tem como subtítulo "A Guiné-Bissau é como um sorriso do outro mundo".

Começou há pouco tempo [, Maio de 2008,] e tem fotografias óptimas.

Aqui fica a sugestão (2).

Abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves
__________

Edição de vb:

(1) Para quem estiver interessado em conhecer um pouco melhor a Missão da União Europeia de Apoio à Reforma do Sector de Segurança da Guiné-Bissau, clique aqui.


(...) "The EU has decided to establish an advice and assistance mission in support of the Security Sector Reform (SSR) in Guinea-Bissau. The mission will be undertaken in partnership with the Guinea-Bissau authorities. It will be conducted under the ESDP (European Security and Defence policy).

Called 'EU SSR Guinea-Bissau', the mission will provide advice and assistance on reform of the security sector in Guinea Bissau in order to contribute to creating the conditions for implementation of the National Security Sector Reform Strategy.

The mission is part of a coherent EU approach and complementary to the European Development Fund and other European Community activity.
General Esteban Verástegui has been appointed as the Head of Mission for EU SSR Guinea-Bissau " (...).


(2) Aqui vai um excerto de um poste, para amostra:

"Estava eu a ler com a A. e mais algumas pessoas o Anunciador, jornal escolar de referência do Liceu Dr. Rui de Barcelos, quando me deparo com o seguinte texto que não resisto em partilhar: 'Em negócios, como turistas ou para visitar familiares e amigos, são cada vez mais os visitantes (estrangeiros e nacionais) que chegam à cidade de Bissau. Para uma estadia mais curta ou mais prolongada, há diversas opções para passar o tempo em Bissau: visitar monumentos de referência histórica, fazer desporto, assistir a espectáculos variados, tomar um café ou um refresco, repousar, dançar, entre outros…' Não imaginam as filas de espera para visitar o Palácio Presidencial, os museus e igrejas (entre outros...). Ao fim de semana é para esquecer. Pior do que em Paris ou Amesterdão. Só mesmo com bilhete reservado... A Turangra devia pensar mais neste destino. "
in Bissau Calling, de 7 de Julho de 2008

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2508: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (16): Dicas para o viajante (Vitor Junqueira)

Guiné-Bissau > Bissau > Abril de 2006 > Um rua, esburacada, da capital... Foto do nosso querido amigo Hugo Costa, filho do Albano Costa, de Guifões, Matosinhos. O Hugo já foi duas vezes à Guiné-Bissau, em Novembro de 2000, com o pai e outros camaradas nossos, e em Abril de 2006, com um grupo onde se incluía o A. Marques, o Xico Allen e a Inês Allen (1).

Foto: © Hugo Costa (2006). Direitos reservados.

1. Penso que será útil voltar a reproduzir aqui um poste em que o nosso querido amigo e camarada Vitor Junqueira nos deixou as suas dicas de viajante que conhece a África e a Guiné-Bissau onde tem ido com alguma frequência. Além da sua experiência de andarilho do mundo (o Vitor foi, em tempos, oficial da marinha mercante), o Vitor é um homem de bom senso e de grande sensibilidade humana, generosidade e camaradagem.

O Vitor, que vive em Pombal e que é médico, tem estado afastado do nosso convívio por razões técnicas: está há meses sem computador pessoal e, portanto, com mais dificuldades em visitar o nosso blogue e ver os nossos mails. Todos temos sentido a sua falta. Mas eu respeito o seu silêncio, embora esperando que seja transitório. Recorde-se que o Vitor foi o entusíastico e generoso organziador do 2º encontro da nossa Tertúlia, em Abril de 2007 (2)

Em jeito de pequena homenagem ao nosso Vitor - de cujos poestes temos saudades (3) - , aqui ficam as dicas que ele escreveu, em tempos, em resposta a um pedido de ajuda , feito à nossa tertúlia por um ex-combatente, António Osório, de Vila Nova de Gaia, que estava a pensar em ir voltar à Guiné, em viagem organizada (que eu não cheguei a saber se concretizou)...

É de ter em conta que o texto, embora datando de há um ano e picos, não perdeu actualidade, frescura e pertinência... E só podia ter sido escrito por ele, que é dos nossos tertulianos mais talentosos em matéria literária... Outros achegas, de camaradas e amigos da Guiné-Bissau que lá tenham ido recentemente, também serão bem vindas para publicação aqui no nosso blogue... Ver também o portal do nosso amigo e camarada Carlos Fortunato> Guiné-Bissau > Viagens (actualizado em 31/08/2007). (LG).


2. Poste de 7 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1255: Dicas para o viajante e o turista (1): A experiência e o saber do Vitor Junqueira

(...) Prezado Osório,

Eu sou o Vitor Junqueira de Pombal e estou a responder ao pedido de esclarecimento acerca da eventual programação de uma viagem que pretende fazer à Guiné Bissau, na companhia de sua esposa.

De facto já viajei por diversas vezes para a Guiné, mas não vou fazê-lo no próximo dia 17 Novembro de 2006 (e como eu gostaria!). Posso no entanto dar-lhe algumas indicações baseadas na minha experiência pessoal. Assim

1- Viagem:

Vai a qualquer agência de viagens e compra as passagens na TAP, que é actualmente o único operador. Os preços subiram muito nos últimos tempos devendo rondar os 700 euros + taxas [Actualmente andará pelos mil euros, tudo incluído].

2- Vistos:

A própria agência que vender as passagens, deverá encarregar-se desse assunto. O preço anda à volta de 40 euros por pessoa + o trabalho da agência. Deverá entregar os passaportes + duas fotografias de cada passageiro com uma semanita de antecedência, que é para não haver surpresas.

3 - Hotel:

Recomendo o Hotel 24 de Setembro (4). Fica localizado na zona de Sta. Luzia sendo as suas instalações resultantes do aproveitamento, para esse fim, do antigo clube de oficiais. A baixa fica à distância de um agradável passeio a pé. A zona é calma e segura, mas os cuidados habituais não podem ser descurados.

Note que pelos padrões europeus, os hotéis são maus e caros. Lençóis limpos, ar condicionado ainda que barulhento e água para o banho (quantas vezes despejando o caneco por cima da cabeça!), é tudo quanto podemos exigir. No hotel que referi, se optar por ele, vão pedir-lhe por um quarto duplo cerca de 50.000 CFA, equivalente a 16 contos, com pequeno almoço. Mas se negociar um pouco e disser que é amigo do Sr. Manuel Neves, um empresário meu amigo com bons contactos junto da gerência, talvez lho deixem por 35.000 (11 contos). Para fazer a reserva, contacte o sr. Moisés que é uma espécie de subdirector através do telef. 00.245.7237570.

Em Bissau, existem vários restaurantes, aceitáveis, com preços que não sendo baratos também não são exorbitantes. Quando forem para o interior, previnam-se com água, fruta e conservas. Até podem (e devem) levar umas latitas de cá.

4 - Bagagem:

A roupa deve ser apenas a estritamente necessária para a estadia, transportada em sacos que caibam nos porta-bagagens da cabine (evitar as malas de porão), e adequada ao clima: dias quentes e relativamente húmidos sem chuva durante o dia, mas frescos à noite durante o mês de Janeiro.

Não esquecer de meter no saco uma pequena quantidade de sabão rosa ou azul. Uma T shirt, umas cuecas ou um par de meias, lavam-se à noite e deixam-se a secar frente ao ar condicionado. No dia seguinte ... é só vestir. E na falta de sabonete, champô ou creme de barbear, entra o sabãozito. De resto, quanto menos tralha, melhor.

5 - Segurança:

Na Guiné não há registo de criminalidade violenta exercida contra os turistas. Eu nunca tive qualquer problema, e posso garantir que se pode viajar tranquilamente por todo o território sem qualquer receio. No entanto, água benta e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.

Como é sabido, a pequena delinquência existe em todo o mundo. Vamos então tomar algumas precauções. Em primeiro lugar, é fundamental não dar nas vistas. Para tanto, comecemos pelas roupas, que devem ser tanto quanto possível idênticas às das pessoas que lá vivem e trabalham. São de excluir os calções, roupas ou calçado de marca, objectos de ouro, relógios caros (ou de estimação!), máquinas de filmar ou fotogáficas a tiracolo (sempre no bolso, excepto quando estão a ser utilizadas ...). O mesmo para o telemóvel.

Relativamente aos documentos, eu costumo levar apenas o passaporte e uma fotocópia do BI para trazer no bolso no país de destino, para além dos meios de pagamento que tenciono utilizar. Note que isto é válido para os países pouco desenvolvidos, como para os ditos civilizados. Toda aquela carteirada de documentos que habitualmente nos acompanha para todo o lado, fica de férias em Portugal. E no cofre do hotel (quando existe), ficarão guardados, o passaporte, os valores em dinheiro, o cartão de crédito e os objectos valiosos. Nunca deixe quaisquer valores à vista no quarto. As malas devem ter fecho de segurança ou um bom cadeado.

O regresso ao hotel ser feito a pé, deve ocorrer antes do anoitecer. Na rua, as conversas ou qualquer comentário entre si e a esposa devem ser feitos de modo a que outras pessoas não se apercebam do seu conteúdo ou da razão da vossa presença no país (turismo, visita a familiar, trabalho etc.), nem mesmo da nacionalidade. Para qualquer digressão nocturna, chamem não o António (!) mas o táxi.

6 - Saúde (5):

Não recomendo a profilaxia anti-palúdica. É preferível fazer a prevenção através da observação de algumas regras e comportamentos. Durante o dia pas de problème! Mas se a zona a visitar for particularmente húmida (pantanosa), pode usar-se um bom repelente, comprado em Portugal. Existem à venda de diversas marcas, com excelentes características cosméticas.

À noite, no restaurante, discoteca ou simples passeio, usar sempre roupa com mangas compridas e calças, cobrindo as partes expostas (mãos e face) com o repelente (spray ou stick).

As meias de desporto (Sportzone, por ex.) são também uma boa opção, pois oferecem algum conforto aos pés durante as caminhadas e à noite, dada a sua espessura, impedem que o ferrão dos mosquitos nos atinja a pele dos tornozelos. Até podemos meter as calças por dentro delas.

Para aquelas pessoas que se sentem mais seguras se tomarem o comprimido contra a malária (ou paludismo, é a mesma coisa), o medicamento que recomendo é o MEPHAQUIN. Toma-se um comprimido uma semana antes do embarque, outro na véspera da partida e daí para a frente, um por semana sempre no mesmo dia. Mínimo: 4 semanas de tratamento.

Do estojo de primeiros socorros deve constar também o paracetamol como analgésico e antipirético, um anti-inflamatório - por ex., Donulide, ou Voltaren para quem não sofre do estômago - , um anti-diarreico que pode ser o Imodium, um antibiótico multi-usos de que uma boa referência continua a ser o Clavamox, Augmentim, etc. Um ligadura de 7 cm (largura) e alguns pensos rápidos podem ser úteis.

Mas tão importante quanto isto tudo, é fazer um bom seguro de viagem, que garanta a evacuação aérea de urgência e/ou repatriamento em caso de doença súbita ou acidente.

7 - Meios de pagamento:

EURINHOS, muitos! Notas de 5, 10, 20 e 50. E algumas moedas para dar, muito parcimoniosamente, aos putos que constituem a comissão de boas vindas, logo à chegada ao aeroporto e que não deixarão de ser bastante persuasivos em algumas ruas de Bissau, mas não no mato.

Os câmbios fazem-se na rua em Bissau, onde aparecem os angariadores. Eu prefiro as Casas de Câmbio que se encontram praticamente todas concentradas numa rua da cidade. Cada euro vale à roda de 650 francos CFA (Communauté Francofone Africaine). [Actualmente, 1 Euro = 655,597 CFA].

Para as crianças das aldeias a visitar, é conveniente levar alguns rebuçados, que não derretam com o calor. Esferográficas e outro material escolar assim como roupas são muito apreciados mas muito difíceis de distribuir visto que é impossível levar quantidades que contemplem mais do que uma dezena ou duas de crianças, e elas caem-nos em cima como um enxame. Fica ao critério de cada um, mas se optarem por levar, então entreguem a alguém da tabanca e essa pessoa é que fará a distribuição.

[Vd. também, nas Informações Úteis, a informação sobre Bancos, em Bissau, no sítio oficial do Simpósio Internacional de Guiledje (6)].

8 - Deslocações:

Táxi ou Toca-Toca (transporte colectivo). O táxi, bem negociado, pode ser uma boa solução e vai a todo o lado. Em Bissau, numa papelaria próxima dos Correios vendem-se óptimos mapas rodoviários da Guiné de que convém adquirir um exemplar logo à chegada, a fim de planear as viagens.

Uma boa norma consiste em viajar sempre na companhia de um guineense da sua confiança que lhe poderá ser recomendado por um amigo, alguém do hotel, um comerciante ...

9 - Nota final:

Os tempos mudaram, e a nossa relação com os guineenses não pode ser a mesma que se verificava quando por lá passámos há trinta e tal anos, com uma guerra então em curso. Eles estimam-nos, mas apreciam muito o tratamento de igual para igual.

Nunca se descuide com qualquer atitude de sobranceria ou arrogância tão frequente em pessoas que visitam África pela primeira vez. Evite o tratamento por TU, mesmo tratando-se de jovens ou crianças.

Nunca desdenhe dos produtos ou das intenções dos vendedores de rua. Sorria, converse com eles sem lhes transmitir a falsa ilusão de que está interessado se não for esse o caso, mas nunca lhes vire as costas. Nem os ignore baixando a cabeça e seguindo em frente. Uma moedita, nem que seja apenas de 20 cêntimos, que se dá a um garoto por aqui, a outro por ali, pode operar milagres no campo da comunicação.

Corresponda sempre a uma saudação e tome a iniciativa de cumprimentar quando achar que a bola está do seu lado. Para isso basta levantar o braço e fazer um ligeiro aceno de cabeça. Por outro lado, são proscritos os salamaleques bem como as atitudes de subserviência. Mostre compreensão pelas manifestações de pobreza ou mesmo miséria, material e humana, que vai sem dúvida encontrar. Não escarneça delas através do riso ou do gesto.

Do mesmo modo, situações ou atitudes que para nós podem parecer caricatas ou mesmo condenáveis, como por exemplo a abordagem por uma autoridade maltrapilha e ignorante, devem ser tratadas com pézinhos de lã. E muita compreensão.

Não se esqueça que estas pessoas podem não ter recebido um único salário desde há meses encontrando-se em situação desesperada. O lado positivo da coisa é que um qualquer berbicacho se pode resolver-se com uma discreta gratificação de 500 ou 1000 CFA. A melhor forma de lidar com esta gente é nós próprios deixarmos a cabeça de europeu aqui em Portugal e no seu lugar atarrachar uma de africano à chegada.

Durante a viagem é que não sei como vai ser! Em qualquer lado, cidade ou interior, não deixe de manifestar um particular respeito pelos idosos a quem tratará por Tio ou Tia. Sendo a população maioritariamente muçulmanna (2/3), a família tem para eles um valor que entre nós já lá vai. Por isso leve fotografias dos filhos e netos que mostrará quando achar oportuno. Vai ver quanto sobe no patamar da consideração desta gente simples. Se a sua máquina fotográfica ou de filmar é digital, mostre-lhes no display algumas das fotos que tirou e recolha um endereço para mais tarde enviar as cópias. Nunca prometa nada se não tenciona cumprir. Um africano nunca esquece o bem ou mal que lhe fizerem.

Dito isto, resta-me desejar-lhe boa viagem e uma óptima estadia.

Cumprimentos

Vitor Junqueira,
ex-Alf Mil da CCAÇ 2753 - Os Barões

(Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá , 1970/72).

________

Notas de L.G.:

(1) Vd. postes de:

28 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCVIII: A tertúlia do Porto (Albano Costa)

4 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXXI: Do Porto a Bissau (1): o jipe está de saída (Albano Costa)

(2) Vd. poste de:

9 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1649: 2º Encontro da nossa tertúlia: Pombal, Restaurante Manjar do Marquês, 28 de Abril de 2007 (Vitor Junqueira / Luís Graça)

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1709: Tertúlia: Encontro em Pombal (1): Malta de cinco estrelas (José Martins)

(3) Vd. postes do Vitor Junqueira:

18 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1084: O guerrilheiro desconhecido que foi 'capturado' no K3 por um básico da CCAÇ 2753 (Vitor Junqueira)

23 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1110: Do Bironque ao K3 ou as andanças da açoreana CCAÇ 2753 pela região de Farim (Vitor Junqueira)

30 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1133: Origem da expressão 'Siga a Marinha" (Vitor Junqueira)

31 de Outubro de 2006> Guiné 63/74 - P1224: Blogue: não ao politicamente correcto (Vitor Junqueira)

11 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1266: Estórias de Bissau (1): Cabrito pé de rocha, manga di sabe (Vitor Junqueira)

31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação (Vitor Junqueira)

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1581: O elogio dos pára-quedistas das 121ª e 122ª CCP (Nuno Mira Vaz / Vitor Junqueira)

30 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1716: Tertúlia: Encontro em Pombal (7): Camaradas radicais (Paulo Santiago / Vitor Junqueira)

3 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1725: Tertúlia: Encontro em Pombal (10): O nosso bom gigante J. Mexia Alves (Vitor Junqueira)

3 de Maio de 2007 > Guine 63/74 - P1728: Tertúlia: Encontro em Pombal (11): A parábola do porco e da tesoura de barbeiro (David Guimarães / Vitor Junqueira)

(4) Vd. poste de 4 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2503: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (15): Chegada a Bissau, 29 de Fevereiro, formalidades, recepção, hotéis

(5) Sítios sobre Consulta do viajante / Medicina tropical

(i) UCS - Unidade de Cuidados Integrados, SA (Grupo TAP) > Consulta do viajante

Vd. folhetos da UCS sobre:

Quando Viaja de Avião,

Doenças Tropicais - Malária

Diarreia do Viajante.


(ii) Instituto de Higiene e Medicina Tropical > Consulta do viajante / medicina tropical

Rua da Junqueira, 96,
1349-008 Lisboa
Telefones: 213652600 geral - 213627553 directo

(iii) Outros sítios (em inglês):

http://www.who.int/ith/en/

http://www.cdc.gov/travel/

http://www.istm.org/

http://www.safetravel.ch/safetravel/

http://www.astrium.com/


(6) Lista dos bancos existenets em Bissau:

Banco da África Ocidental (BAO)Rua Guerra Mendes, 18A/18C, C.P. 1360 – Bissau;
Tel: (245) 20 34 18 / 19 Fax: (245) 20 34 12

Banco Regional de Solidariedade (BRS)
Rua Justino Lopes
Tel: +245 20 71 12 /3

Banco da União (BDU)
Av. Domingos Ramos
Tel: +245 20 71 60

Ecobank Guiné-Bissau
Avenida Amílcar Cabral
Tel: +245 20 73 60 / 1