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quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18274: Memória dos lugares (374): Gadamael, c.1967/68, ao tempo da CART 1659, 'Zorba' (Manuel Cibrão Guimarães, ex-fur mil, CCAÇ 1620, Bissau, Cameconde, Cacine, Sangonhá, Cacoca, Cachil e Bolama, 1966/68)


Foto nº 1 > Guiné > Região de Tombali > Gadamael   > CCAÇ 1620 > c. 1967/68 > Passeio de "sintex". (Ao tempo ainda não havia o "cais de Gadamael" onde, em 1973, descarregava o batelão BM3, que abastecia Gadamaele  Guileje... Recorde-se que o rio que banhava Gadamael Porto era o Sapo, afluente do Rio Cacine


Foto nº 1 A > Guiné > Região de Tombali > Gadamael  > CCAÇ 1620 > c. 1967/68 > Passeio de sintex. Pormenor. da esquerda para a direita, "eu, o fur at inf da minha companhia, de apelido Viegas,  que está a remar, mais dois militares da minha companhia, de que não me lembro o nome, e  sentado à popa, de bigode, o   2º sargento que respondia pela CART 1659, que estava em Gadamael. Íamos de Sangonhá a Gamadael, em coluna auto. Eu era furriel mecânico auto. Este é um momento de descontração, no rio [Sapo} que  banhava Gadamael... A estrada na altura era transitável de Cacine a Guileje, passando por Cameconde, Cacoca e Sangonhá. De Mejo para Buba é que não... A minha companhia esteve de agosto de 1967 a março de 1968 em Sangonhá, com um pelotão destacado em Cacoca, e que era rendido ao fim de um mês. Em Cacoca ocupávamos as instalações de um comerciante branco, oriundo da região de Aveiro, que se chamava Tonecas. Com a guerra, ele  abandonou Cacoca, e ficou só com o estabelecimento de Cacine. Conheci-o em Cacine. Negociava produtos (frutas, coconote, etc.) com tipos da Guiné-Conacri que iam lá de barco, e tinham salvo-condutos passados pela NT, eram também 'agentes duplos' que davam informações sobre o que se passava do lá da fronteira. Em Cacoca também havia intercâmbios deste género , os tipos da Guiné-Conacri iam lá visitar os parentes e vender e comprar produtos".

Foto (e legenda): © Manuel Cibrão Guimarães (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Tombali > Mapa de Cacoca (1960) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Sangonhá, nas proximidades da fronteira com a Guiné-Conacri, tendo a norte Gadamael e Ganturé, e a sul Cacoca e Cameconde  (e a sudoeste Cacine, vd. mapa de Cacine e mapa geral da província)

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)




[Foto à direita: Manuel Cibrão Guimarães:
natural de Avintes, V. N. Gaia, vive em Rio Tinto, Gondomar]

1. Continuação da publicação de uma seleção de fotos do
álbum do nosso grã-tabanqueiro nº 766, Manuel Cibrão Guimarães, ex-fur mil, mec auto, da CCAÇ 1620 (Bissau, Cameconde, Cacine, Sangonhá, Cacoca, Cachil e Bolama, 1966/68). (*)

Antes de ir para o Cachil (em março de 1968, e onde esteve até 1/7/1968), a CCAÇ 1620 tinha assumido, em 5 de janeiro de 1967, a responsabilidade do subsetor de Cameconde, rendendo, por troca, a CCAÇ 799 (Cacine e Cameconde, 1965/67), e passando a integrar o dispositivo e manobra do BCAÇ 1861 e depois do BART 1896. É nessa altura que a CCAÇ 1620 tem um pelotão destacado em Cacine.

Em 1 de agosto de 1967, por rotação com a CART 1692, assumiu a responsabilidade do subsector de Sangonhá, com um pelotão destacado em Cacoca, mantendo-se no mesmo sector do BART 1896.

A foto que publicamos hoje, tirada em Gadamael, é do tempo em que a CCAÇ 1620 esteve em Sagonhá (agosto de  1967 / março de 1968). O Manuel Cibrão Guimarães passou, portanto,  sensivelmente o mesmo tempo (7 meses) erm dois sítios do regulado de Cacine: em Cacine e em Sangonhá.


22 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18238: Tabanca Grande (457): Manuel Cibrão Guimarães, ex-fur mil, CCAÇ 1620 (Cameconde, Sangonhá, Cachil, Cacine, Cacoca, Gadamael, 1966/68)... Senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 766.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20471: Tabanca Grande (489): Alexandre Margarido, ex-cap mil grad inf, op esp / ranger, último cmdt da CCAÇ 3520 (Cacine, Cameconde, Quinhamel, 1972/74)...Senta-se à sombra do nosso poilão sob o nº 801


Guiné > região de Tombali > Cacine > CCAÇ 3520 > 1973 > Uma pausa no rio Cacine, nos "turbulentos acontecimentos" de Guileje / Gadamael, em maio e junho de 1973. Alexandre Margarido CCAÇ 3520

O Alexandre Margarido, novo membro da Tabanca Grande, com o nº 801

Fotos (e legendas): © Alexandre Margarido (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Setor de Cacine > Cameconde > 1968 > Disparo noturno do obus 8.8 > Foto do álbum do António J. Pereira da Costa, que era na altura alferes QP da CART 1692/BART 1914 (Cacine, Cameconde, Sangonhá e Cacoca, 1967/69).

Foto (e legenda): © António J. Pereira da Costa (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso camarada Alexandre Margarifo, ex-cap mil op esp / ranger, último comandante da CCAÇb 3520 (Cacine, Cameconde, Guileje, Gadamael e Quinhamel, dez 1971-mai 1974).

Data - terça feira, 17/12/2019, 21h17
Assunto -  Adesão à Tabanca Grande

Caro Luis Graça,

Tenho acompanhado este Blog, com regularidade e considero do máximo interesse todo o trabalho, até aqui desenvolvido, para que não se percam, nos meandros dos interesses, que jogam com os ex-combatentes, as suas memórias e as experiências de vidas, aqui tão bem representadas.

O meu nome Alexandre Augusto Martins Margarido, fui o último Capitão Miliciano, da Companhia Independente de Caçadores nº 3520, com a Especialidade de Operações Especiais.

Estive na Guiné desde Dezembro de 1971 a Maio de 1974, tendo a minha Companhia, passado por Cacine, Cameconde, Guileje, Gadamel e finalmente Quinhamel, até ao seu regresso ao Funchal, onde se tinha formado.

Conforme as normas da Tabanca, envio duas fotos, uma actual, a outra tirada no Rio Cacine, numa pausa dos acontecimentos turbulentos de 1973, solicitando a entrada, e prometendo o envio de uma das muitas histórias, que fizeram parte dessa minha estadia, por terras da Guiné.

Forte abraço,

Alexandre Margarido
Ex-Capitão Miliciano Ranger

2. Resposta do editor Luís Graça:

Alexandre, és recebido de braços abertos, e muito provavelmente serás o último (**)  a franquear, este ano  o "hall" de entrada da Tabanca Grande (, digo "hall", porque não temos portas, nem janelas, nem porta de armas, nem  cavalos de frisa, nem fiadas de arame farpado, nem valas, nem abrigos, nem espaldões...).

Como sabes, somos uma "comunidade virtual" de antigos camaradas de armas, que passaram pelo TO da Guiné, de 1961 a 1974, fazendo a guerra e a paz...Costumamos dizer que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... O que é verdade, temos gente, amigos e camaradas da Guiné, um pouco por toda a parte, dos Estados Unidos à Austrália, de Ponte de Lima ao Funchal, de Faro a Bissau, passando por Macau, Cabo Verde, França, Brasil, Alemanha, e por aí fora...

Da tua companhia, a CCAÇ 3520, "Estrelas do Sul" (que nome poético!), tu passarás a ser, se não me engano, o terceiro representante, depois do José Vermelho, nosso grã-tabanaqueiro nº 471, fur mil (CCAÇ 3520 - Cacine, e CCAÇ 6 - Bedanda, CIM - Bolama, 1972/74) e depois do Juvenal Candeias, alf mil at inf, que entrou para a Tabanca Grande  em 6 de maio de 2009

Mas, deixa-me lembrar-te, tu já nos tinhas feito uma "visita" em 2013 (*), comentando esse "resort" turístico que era Cameconde no teu/nosso tempo... Na altura, a Tabanca Grande "partiu mantenhas" contigo e convidou-te  para te sentares "aqui, debaixo do nosso mágico e fraterno poilão"... Não entraste em 2013, entras agora no final de 2019.  E o lugar que te calha é já o 801.. (Já podes ver o tem nome, na lista alfabética, de A a Z, que consta na coluna do lado esquerdo do nosso blogue.)

E vais concerteza ajudar-nos a manter viva e sempre fresca esta "fonte de memórias" onde vem beber a rapaziada que esteve na Guiné, em "comissão de serviço", uns no "back office", outros no "front office"... Partilhamos memórias (e afetos), contamos as nossas histórias... sem censura, sem juízos de valor, sem picardias, sem ressentimentos, procurando contar a verdade e só a verdade.

Senta-te, desfruta a nossa companhia, vai dando notícias, vai participando (com textos, comentários, fotos...) e, entretanto, faz o favor de ser feliz e tem um bom e santo Natal.


Guiné > Mapa geral da província ( 1961) > Escala 1/500 mil > Posição relativa de Cameconde, a guarnição militar portuguesa mais a sul, na região de Quitafine, na estrada fronteiriça Quebo-Cacine... Em 1968 era o batalhão que estava em Buba (BART 1896, 1966/68) quem defendia esta importante linha de fronteira...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013)


3. Sobre a CCAÇ 3520, eis aqui a  ficha da unidade, segundo a Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), 7º vol - Fichas das Unidades, Tomo II (Guiné), Lisboa, EME/CECA, 2002:

 (i) Mobilizada pelo BII 19 (Funchal);

(ii) Parte para o TO da Guiné em 20/12/1971 e regressa a 37/3/1974;

(iii) Passou por Cacine (mas também Cameconde) e Quinhamel;

(iv) teve quatro comandantes: cap inf Herberto Amaro Vieira Nascimento; cap mil Jaime Cipriano da Costa Rocha Quaresma; cap mil inf Armando Pimenta Cristóvão; e cap mil grad inf Alexandre Augusto Martins Margarido.
___________

Notas do editor_

(*) Vd. poste de 21 de fevereiro de  2013 > Guiné 63/74 - P11129: (Ex)citações (213): Cameconde, hoje seria um lugar de absurdo, de pesadelo e de loucura... (Alexandre Margarido, ex-cap mil, CCAÇ 3520, Cacine e Cameconde, 1972/74)

(...) Cameconde era um daqueles locais onde apenas os combatentes portugueses conseguiam manter-se durante anos, sem enlouquecerem, face à falta de condições mínimas de subsistência. Inclusive a água e os mantimentos tinham que ser transportados, numa coluna diária por um trilho rasgado na selva.

As altas temperaturas dentro dos abrigos, os insectos, as cobras que deslizavam da selva durante a noite, procurando o calor dessas fortificações, autênticos fornos, a exposição a atiradores e às flagelações por RPG, tudo isso, recuando 40 anos nas minhas memórias, era impensável ser suportado nos dias de hoje.

Obrigado por manterem vivas essas memórias.(...)


(**)  Último poste da série > 21 de novembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20369: Tabanca Grande (488): Miguel José Ribeiro da Rocha, ex-Alf Mil Inf.ª da CCAÇ 2367/BCAÇ 2845 (Olossato, Teixeira Pinto e Cacheu, 1968/70), tertuliano com o número 800 da nossa Tabanca

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Guiné 63/74 - P5113: Histórias de Juvenal Candeias (5): Vicente, o Piu


1. O nosso Camarada de Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520 - Cameconde, 1971/74 – enviou-nos mais uma história das suas memórias da guerra:

Camaradas e Amigos,

Um grande abraço e espero que estejam todos em plena forma.

A história que hoje vos envio é, sobretudo, uma homenagem a um grande amigo e companheiro de armas.

As fotografias já estão velhinhas, mas é o que tenho sobre o tema. Se conseguirem melhorar a qualidade... fico-vos grato, como de costume.

Até breve.

VICENTE, O PIU

O Vicente era o Furriel de Minas e Armadilhas do 2º Grupo de Combate da CCaç. 3520! Popularmente era conhecido por Piu, alcunha que nada tinha a ver com um temperamento piedoso, mas simplesmente com o seu vício de caçador de passarada!

Era ele, provavelmente, quem mais contribuía para o moral elevado das nossas tropas. Embora não fosse aquilo a que habitualmente chamamos uma figura carismática, o Vicente era a boa disposição permanente e contagiante, que nos permitia rir com gosto e facilidade!

Era o homem sempre pronto a pregar partidas aos camaradas!

O Vasconcelos, Furriel de Artilharia em Cameconde, homem dos obuses 14, era uma das suas principais vítimas! Pequenino e bom de bola, fazia inveja ao Garrincha, de tal modo as suas pernas eram arqueadas, e, segundo o Piu, bastante feias! Por essa razão, andava sempre de calças e só tomava banho à noite e sozinho! Salvo quando o Vicente lhe colocava baldes de água em cima das portas por onde ele ia passar!

O Piu e o Zé Vermelho em Cacine: dois grandes malucos!

O Vasconcelos veio à Metrópole de férias e terá conhecido, numa festa, uma miúda por quem se apaixonou! Quem escolheu para confessar a sua paixão? Exactamente o Piu, que explorou exaustivamente a situação, obtendo informação detalhada! Estava em marcha mais uma partida!

O correio enviado diariamente por Cameconde aguardava transporte em Cacine.

A correspondência chegava e partia de Cacine, na melhor das hipóteses uma vez por semana, em avioneta Dornier 27. O pessoal que estava destacado em Cameconde recebia o correio no dia seguinte, através da coluna auto que todas as manhãs ligava os dois aquartelamentos.

Com alguém em Cacine feito com o Piu, o Vasconcelos começou a receber correspondência da sua paixão, aerogramas que eram escritos e falsificados em Cameconde pelo Piu, vinham a Cacine e voltavam a Cameconde, sempre que havia correio geral a distribuir. Naturalmente que as respostas do Vasconcelos nunca passavam de Cacine, voltando a Cameconde, onde eram entregues ao Piu.

O Alcino Sá e o Piu na praia de Cacine: tempo de lazer.

O detalhe da tramóia incluía carimbos e restantes pormenores que faziam acreditar no realismo da correspondência!

O conteúdo, inicialmente erótico, posteriormente pornográfico, com inclusão de sexo virtual, era do conhecimento de todos, apenas o Vasconcelos desconhecia a partida!

Estava cada vez mais apaixonado… e continuava a confessá-lo ao Piu com quem, ainda por cima, comentava o correio que recebia da sua paixão!

A partida durou as semanas que o Piu entendeu e quando se fartou… escreveu uma última missiva, identificando-se, descompondo o Vasconcelos e chamando-lhe alguns nomes que pouco abonavam a sua masculinidade!

Acabou, assim, deste modo abrupto, um passatempo que animou, durante algum tempo, o destacamento de Cameconde, buraco do… cú do mundo, onde nada existia e nada acontecia, para além de umas bazucadas com maior frequência que a desejada!

O Romeiro era outra habitual vítima! Deitava-se muito cedo e o seu quarto era mesmo ao lado do bar de Sargentos em Cacine, onde os noctívagos se reuniam até altas horas da noite!

Certa noite o Vicente aparece com uma corda que previamente atara à cama do Romeiro e ordena:

- Quando eu disser, toda a gente puxa a corda e grita… terramoooooto!

O resultado foi fantástico: o Romeiro salta da cama como o pai Adão quando veio ao mundo, atravessa toda a messe de sargentos a correr, e só pára na parada com todo o mundo a rir!

Alcino Sá, Piu, Costa Pereira, um djubi, Carlos Alves, Juvenal Candeias: em Cameconde, impecavelmente fardados, ou foi dia de festa ou de visita importante.

Ou o Cunha, que por vezes era afectado por sonambulismo!

Uma noite levanta-se, agarra na G3 e corre para a rua a gritar:

- Eu dou cabo dos gajos… eu dou cabo dos gajos!...

Foi o Vicente que o foi buscar e acalmar… antes de ele começar a disparar!

Mas o Vicente não era apenas isto!...

O Vicente era furriel de minas e armadilhas… ou apenas de armadilhas?!

- Não monto minas para os gajos levantarem e voltarem a montá-las contra nós! As armadilhas não levantam! Ou caem nelas ou rebentam-nas! – Dizia com convicção.

Sempre que, a seguir a um campo de minas encontrava munições de kalash espetadas no chão a formar a palavra PAIGC, não saía dali sem deixar a sua armadilha e CCAÇ 3520 escrito no chão com munições de G3!

- Eles voltam sempre ao local do crime! – Afirmava!

Um dia levantámos umas minas anti-pessoal de origem chinesa, tipo queijo da serra em plástico cor verde azeitona! Para nós, habituados aos caixotes PMD6, esta marca era um problema! Estávamos todos à rasca no manuseamento das ditas, até que o Piu disse:

- Dêem cá o material e deixem-me trabalhar sozinho!

Entrou para a casota do gerador, em Cameconde, e o pessoal ficou cá fora, nervoso, sem saber o que a intervenção do Piu iria provocar!

Cerca de meia hora depois, abre-se a porta e ele aparece, com ar triunfante, as minas desmontadas e apenas um ferimento na palma da mão, tipo picada para análise, provocado pelo percutor!

A polivalência do Vicente não ficava por aqui!

Ele era um óptimo caçador… daí a alcunha!

Quando a comida era escassa, lá ia o Piu à caça! A maioria das vezes sozinho, não queria ninguém a espantar os animais!

Passadas umas horas era vê-lo chegar, sempre com um número considerável de rolas à cintura… e o jantar estava salvo! Já não era dia de macaco ou de arroz com atum!

Outra das facetas do Vicente, era a sua sensibilidade para a música!

Os improvisos de bateria eram comuns!

Horas passadas de auscultadores, indiferente a tudo e a todos, mesmo às flagelações diurnas a Cameconde com RPG7, observando tranquilamente do varandim da messe, o fumo dos rebentamentos e comentando:

- Os gajos continuam a ter as mesmas referências de tiro! Elas continuam a rebentar longe!

O Vicente, um verdadeiro fenómeno do humor, era natural do Entroncamento! Chegou da tropa e foi conduzir comboios para a linha de Sintra! Um dia alguém lhe disse:

- Oh Piu, andas a matar gajos no túnel do Rossio?

Ao que ele respondeu:

- Não pá! Eu só os ajudo a suicidarem-se!

Infelizmente o Vicente deixou-nos em Novembro passado! Um sacana de um cancro na próstata, não detectado a tempo, pregou-lhe a partida definitiva e levou-o desta para melhor!

- Vicente, lá, onde estiveres, foi um grande gozo recordar-te, nesta minha singela homenagem!

Um abraço do,
Juvenal Candeias
Alf Mil da CCAÇ 3520

Fotos: © Juvenal Candeias (2009). Direitos reservados.
_____________
Notas de M.R.:

Vd. último poste da série em:

sexta-feira, 16 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22377: Tabanca Grande (521): Manuel Domingos Ribeiro, ex-Fur Mil Art MA da CART 6552/72 (Cameconde, Cacine, Cabedu e Catió, 1972/74) que se senta no lugar 844 do nosso Poilão


1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano, Manuel Domingos Ribeiro, ex-Fur Mil Art/MA da CART 6552 (Cameconde, Cacine, Cabedu e Catió, 1973/74), com data de 15 de Julho de 2021:

Sou Manuel Domingos Carneiro Ribeiro, natural de Rio Tinto, Concelho de Gondomar, morador na freguesia de Cête, Concelho de Paredes, Distrito do Porto.

Ex-Furriel Mil Atirador de Artilharia/Minas e Armadilhas e pertenci à CART 6552.

Fui mobilizado para servir na ex-Província Ultramarina de S. Tomé e Príncipe em Outubro de 1972, mas fui desviado para a Guiné em Maio de 1973, onde estive até 7 de Setembro de 1974.

Junto, como é da praxe 2 fotografias, uma atual e outra do tempo da Guiné - Cameconde, Cacine, Cabedu e Catió.

Sou seguidor do blog desde 2011, mas só agora consegui tentar inscrever-me.

Junto com a minha foto do tempo da Guiné a bordo de uma lancha da Marinha com destino a Cacine, seguem mais duas de Cameconde.

Sem mais de momento
Os cumprimentos
Manuel Ribeiro


Fur Mil Manuel Domingos Ribeiro a caminho de Cacine.
Manuel Domingos Ribeiro, "hoje"
Vistas parciais de Cameconde

********************

2. Nota do coeditor:

Caro Manuel Domingos,
Muito bem-vindo à tertúlia, em nome de quem te deixo desde já um abraço. Ficas com o lugar n.º 844, à sombra do nosso Poilão, "sítio" onde poderás publicar as tuas memória escritas e fotografadas.

Quase ias perdendo a grande oportunidade da tua vida. Já viste o desperdício de uma comissão de serviço em S. Tomé, quando a Guiné estava aqui tão perto? Também não sei o que esperavas, sendo Atirador e tendo o curso de Minas e Armadilhas, e tudo, o que ias fazer para uma ilha paradisíaca, armadilhar coqueiros? Fazer tiro ao alvo?

Agora a parte séria. A vossa Companhia foi para Cameconde (subsector de Cacine) quando aquilo estava mesmo muito quentinho. Não nos queres dar o teu testemunho daqueles últimos dias, já que a CART 6552 ali permaneceu até à entrega do aquartelamento ao PAIGC?

Parece que o vosso destino era entregar aquartelementos porque após a retirada de Cameconde foram para Cabedu, onde também passaram o testemunho ao PAIGC. De tudo isto nos poderás falar e enviar fotos dos momentos mais marcantes do fim da nossa permanência na Guiné.

Uma nota de rodapé para te dizer que, morando tu no Grande Porto, tens perto de ti a Tabanca dos Melros, com sede e Museu na Quinta dos Choupos, em Fânzeres/Gondomar, onde no segundo sábado de cada mês a malta se reune para conviver a apreciar deliciosos almoços servidos pelo nosso camarada Gil Moutinho, ele próprio ex-Fur Mil Piloto que sobrevoou os céus da Guiné. Como os tempos vão conturbados é melhor confirmares.

E pronto, aqui fica o abraço dos editores deste Blogue com a certeza da nossa disponibilidade para dar estampa às tuas memórias e fotos dos teus, e nossos, tempos de combatentes à força.

CV

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11109: O Nosso Livro de Visitas (162): João Vaz, natural de Teixoso, Covilhã, naturalizado francês, vive em Pau, perto de Lurdes... Foi 1.º cabo apontador de obus, esteve na BAC 1, entre 1968 e 1970, e passou por Bissau, Cameconde, Buba e Cuntima



Guiné > Região de Tombali > Mapa de Cacoca / Gadamael (1960) (Escala 1/50 mil). Posição relativa de Cameconde. Se não erro, depois da  retirada de Sangonnhá e Cacoca,  Cameconde, a sul de Gadamael,  era a nossa única guarnição do regulado de Cacine na região abrangida pela carta de Cacoca.

 Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Telefonou-me, este fim de semana, um camarada da diáspora, João Vaz, hoje naturalizado francês, Jean Vaz. Vive na cidade de Pau, perto de Lurdes, no departamento dos Pirinéus Atlânticos.

O João é natural de Teixoso, Covilhã. Foi 1º cabo apontador de obus, de rendição individual, tendo estado na BAC (Bateria de Artilharia de Campanha), entre 1968 e 1970. Passou seis meses em Cameconde. Voltou a Bissau, e foi de novo colocado no mato, em Buba. Acabou a comissão em Cuntima. Ainda chegou a estar escalado para Gandembel, mas safou-se.

Era tradição na BAC passar-se um ano no mato e outro em Bissau.

O João Vaz vem a Portugal todos os anos. É assíduo e apaixonado visitante do nosso blogue. Gostaria de encontrar malta do seu tempo, e nomeadamente da BAC. Convidei-o para integrar a nossa Tabanca Grande e participar no nosso próximo VIII Encontro Nacional, que se vai realizar em Monte Real, em 22 de junho próximo. Vamos ficar em contacto. Aqui fica o seu mail: jean.vaz@sfr.fr

Eis aqui alguns camaradas que estiveram em (ou passaram por) Cameconde (que, tanto quanto sei, seria um destacamento de Cacine, pelo menos no tempo do Augusto Vilaça):

Tony Grilo, ex-sold apontador de obús 8,8 cm, BAC 1,  Cabedu, Cacine e Cameconde, 1966/68(, vive no Canadá);

Júlio Dias, Pel Rec Daimler 2049 (Cacine e Cameconde, 1968/70) /, vive em Sidney, Austrália);

Juvenal Candeias, ex-alf mil, CCAÇ 3520, Cameconde, 1971/74;
Augusto José Saraiva Vilaça, ex-fur mil da CART 1692/BART 1914 (Sangonhá e Cacoca, 1967/69):

António José Pereira da Costa (Cor art ref, ex-alferes de art na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69;  e ex-cap  e cmdt  das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74).
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segunda-feira, 6 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21144: Notas de leitura (1292): “BC 513 - História do Batalhão”, por Artur Lagoela, edição de autor, Junho de 2000 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Abril de 2017:

Queridos amigos,
Lê-se este histórico do BCAÇ n.º 513, e temos que preitear o denodo e os sacrifícios que este contingentes provaram em Aldeia Formosa, na ocupação de regiões abandonadas como Gadamael, Guileje ou Mejo, na abertura de itinerários, e no esforço de cortar o corredor de Guileje, procurando algum domínio da chamada fronteira Sul.
Há algo de épico neste relatos, no destemor destes Pelotões Daimler e Fox, nos levantamentos de dezenas e dezenas de minas anticarro, nas flagelações, na reação às emboscadas. Um histórico que permite avaliar os duros combates que se travaram para fixar populações e tropas, naquele combate sempre atrabiliário entre combater forças de guerrilha que podia atuar tanto a partir de uma base externa como, como se comprovará, a partir de bases como Salancaur. Haverá um momento, a partir de 1968, em que se contestará este tipo de dispersão de forças, criticando a fundo a existência de aquartelamentos que marcavam presença mas que não possuíam capacidade ofensiva.
Lê-se agora à distância dos anos que foi esta fixação que teve o mérito de travar a avalancha de um PAIGC que sonhava em mostrar o Sul com uma total zona libertada.

Um abraço do
Mário


BCAÇ n.º 513, a divisa era “Ceder Nunca” (2)

Beja Santos

O livro intitula-se BC 513 História do Batalhão, por Artur Lagoela, edição de autor, 2000. Para quem esteja reticente e cético quando à importância destes documentos, mais a mais publicados muitas décadas depois dos acontecimentos vividos, recomendo vivamente a leitura deste histórico. E por razões muito simples: o investigador ou o simples leitor interessado vão aqui encontrar informações sobre o estado do Sul da Guiné em 1963 e como reagiram as nossas tropas a uma situação verdadeiramente caótica em que a guerrilha, por força da intimidação, do terror puro ou das muitíssimas formas de apoio que recebeu, se assenhoreou do terreno, havia que o repelir. E há algo de épico nas lutas travadas pelos diferentes contingentes BC n.º 513, num tempo em que as autometralhadoras puderam ter um papel relevante e os sapadores viveram assoberbados a detetar e a levantar minas antipessoal e anticarro.

Primeiro esforço de guerra, reocupar o Chão Fula, depois procurar atuar no corredor de Guileje, criar novos destacamentos, como o Mejo, Colibuia e Guileje. Escreve o autor que em toda a região não havia um único europeu, no meio de toda aquela desarticulação, uns procuraram apoio em Buba e Aldeia Formosa, muitos aderiram ao PAIGC e outros refugiaram-se na República da Guiné. Havia que convencer os Fulas a cultivar o arroz, que antes da guerra era cultivado pelos Balantas, pois bem, o Forreá autoabasteceu-se, quando o BC 513 deixou a zona Sul, 30 tabancas ficaram organizadas em autodefesa com redes de arame-farpado e com abrigos. Os Fulas armados atuaram na região de Incassol e causaram destruições ao inimigo. Em 29 de Novembro de 1964, Guileje foi pela primeira vez atacada, todas as casas da tabanca foram incendiadas e destruídas.

O autor descreve a situação geral na fronteira Sul, recorda que o rio Cacine com os seus inúmeros braços penetra até próximo de Guileje. A zona de fronteira é constituída por uma estreita faixa de terreno entre Cacine e Guileje. Nas regiões de Guileje e Aldeia Formosa formam-se dois corredouros terrestres de comunicação com o interior separado pelos rios Cumbijã e seus afluentes Balana e Balanazinho. Ao longo de toda a faixa terrestre entre Cacine e Guileje corre uma estrada que se prolonga através das pontes sobre os rios Balana e Balanazinho para Mampatá e Aldeia Formosa. Esta estrada liga as povoações de Cacine, Cacoca, Sangonhá, Ganturé, Gadamael, Guileje, Gandembel (destruída) e Mampatá. A subversão armada manifestou-se na região de Sangonhá, onde os grupos aliciadores da FLING foram dominados e ultrapassados pelo PAIGC, este teve grande apoio dos Beafadas da região. Assaltos armados às casas comerciais de Gadamael Porto e Cacoca e outros atos de rebelião conduziram a região à colaboração integral com o inimigo, a autoridade portuguesa volatizou-se. A região Fula de Guileje foi abandonada.

Segue-se o histórico da progressão das forças do BC n.º 513. Em 17 de Dezembro de 1963 ocupou-se Gadamael, construindo-se aquartelamento a partir do nada. De 4 a 8 de Fevereiro do ano seguinte ocupou-se Guileje. Em 20 de Fevereiro abriu-se o itinerário Guileje - Gadamael. De 21 a 25 de Fevereiro ocupou-se Ganturé. De 7 de Março a 15 de Abril houve patrulhamentos nos itinerários Aldeia Formosa – Gadamael – Guileje – Mejo, as forças do PAIGC emboscaram por diversas vezes. Em 21 de Maio ocorreu a abertura o itinerário Gadamael – Sangonhá e ocupou-se Sangonhá que logo fio atacada com invulgar violência. Em 24 de Julho deu-se a abertura do itinerário Sangonhá – Cacoca. Deu-se por concluída a abertura do itinerário Aldeia Formosa – Cacoca ao longo de toda a fronteira Sul. Nos regulados de Guileje, Gadamael e Cacine as populações sentiram-se mais seguras. A CART n.º 496, instalada em Cacine passa a executar patrulhamentos na direção de Cameconde. Entre 30 de Novembro e 10 de Dezembro fez-se a abertura do itinerário Cacoca – Cacine e a ocupação de Cameconde. Dava-se por concluída a abertura do itinerário Cacine – Cacoca – Guileje – Mampatá – Aldeia Formosa – Buba. Para completar a ligação por estrada entre as companhias do designado Setor E, faltava abrir à circulação o troço Cacoca – Cacine. Diz o autor que o moral do inimigo era de prever que fosse elevado já que tinha até então oposto com êxito grande resistência à entrada das tropas de Cacine em Cameconde. O PAIGC alardeava que a tropa nunca entraria em Cameconde. É neste contexto que decorre a operação “Fecho”, perfura-se o itinerário Cacine – Cameconde com o apoio da Força Aérea, intervêm uma Companhia de Artilharia e um Pelotão de Reconhecimento, vai à frente o Pelotão Daimler 947 reforçado, seguem sapadores, enquanto as forças navais executam uma operação de diversão.

Haverá muito tiroteio, mas a estrada que segue para Cacoca foi aberta e o Comandante do Batalhão faz os seus comentários:  
“a. A abertura do itinerário Cacoca – Cameconde – Cacine foi feita por duas colunas de Cavalaria, reforçadas, partindo simultaneamente uma de Cacoca e outra de Cacine. Todos os Pelotões de Reconhecimento de Cavalaria ao serviço do BC 513, estavam desejosos de tomar parte nesta operação com a qual se completava a missão geral que lhes fora atribuída de ligar por estrada Buba com Cacine. Não foi, porém, possível atribuir tal missão ao Pelotão FOX 888 que não convinha retirar da Aldeia Formosa. Este facto e o conhecimento das dificuldades criadas pelo IN ao movimento das nossas tropas no sentido Cacaca – Cameconde, levou-nos a decidir que desta vez a acção principal fosse feita no sentido Cacine – Cameconde e portanto em força, reservando para a outra coluna uma progressão mais lenta e cuidada. Isto obrigou a transferir previamente para Cacine, por barco, todos os materiais necessários à instalação das defesas iniciais e também o pessoal da CCS (sapadores) que tinha a missão de as construir. Ali se concentrou ainda um novo Pelotão de Reconhecimento de Cavalaria, o Pelotão Daimler 947.
b. A ocupação de Cameconde era uma velha aspiração da CART n.º 496. O moral da Companhia subiu muito com a sua realização.
c. Saliente-se o extraordinário esforço despendido pelo Pelotão FOX 963 que no dia 29 tivera de acorrer de Ganturé a Guileje em situação de emergência e no dia 30 se deslocou para Cacoca para logo no dia imediato executar a acção.
d. Contudo, as honras inteiras desta acção cabem ao Pelotão Daimler 947, que suportou todo o peso do inimigo com a maior coragem e decisão, acabando por expulsá-lo do seu último reduto”.

Mas a luta pelo domínio das comunicações do setor não tinha pausas. O PAIGC levava a efeito inúmeras emboscadas ao longo de todos os itinerários controlados pelas nossas tropas em especial no de Buba – Aldeia Formosa e Rio Balana – Gadamael, implantou minas, montou emboscadas, muitas vezes conjugadas com o rebentamento de fornilhos. Empenhou-se na destruição das principais pontes e pontões do setor. Na totalidade, o IN implantou 66 minas anticarro, das quais foram detetadas e levantadas 46.

Até 1965, data da sua transferência para a ilha de Bissau e região de Nhacra, o BCAÇ nº 513 averba inúmeras ações que irão ser descritas no próximo e último texto que dedicamos a uma unidade que teve um comportamento admirável num dos teatros de operações mais hostis, entre 1963 e 1965.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de junho de 2020 > Guiné 61/74 - P21120: Notas de leitura (1291): “BC 513 - História do Batalhão”, por Artur Lagoela, edição de autor, Junho de 2000 (1) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitáfine


1. O nosso Camarada de Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520 - Cameconde, 1971/74 – enviou-nos mais uma história das suas memórias da guerra:

Camaradas,

Para rentrée, aqui vai mais um retalho das minhas recordações de Cacine!

Seria interessante se conseguísseis juntar uma carta da região que é mencionada - Cacine, Cameconde e Cassacá.

Os especialistas sois vós, eu não sei fazer isso.

Fico-vos a dever uma cervejinha ou mesmo uma bazuca!

Anexo também duas fotos do "Desembarque da LDG “Montante” em Cacine" para acompanhar esta história:

Fotos do desembarque da LDG "Montante" em Cacine

Anexo também duas fotos do "Desembarque da LDG “Montante” em Cacine" para acompanhar esta história:

HÁ PERIQUITOS (*) NO QUITÁFINE

A região do Quitáfine, a Sul de Cacine, era considerada o santuário do PAIGC, que aí estava fortemente instalado e provido de dispositivos de segurança, que tornavam os nossos movimentos impossíveis, salvo com utilização de meios excepcionais.

Trilhos minados e sentinelas avançadas, permitiam-lhes uma tranquilidade apenas quebrada pelos obuses de 14 cm, disparados do nosso destacamento de Cameconde!

Os efectivos de que dispunham com um grupo especial de 20 lança-granadas, responsável pelas constantes flagelações a Cameconde, apoiado por um bigrupo disperso pela zona de Cassacá e Banir (onde se supunha estar o comando), eram reforçados por uma vasta população armada em auto-defesa, distribuída, entre outras, pelas tabancas de Ponta Nova, Bijine, Dameol, Cassacá, Banir, Campo, Cassebexe e Caboxanque.

O PAIGC furtava-se sistematicamente ao contacto, optando por uma estratégia defensiva de protecção às populações que controlava, privilegiando as flagelações e a colocação de engenhos explosivos!

Quem circulava a Sul de Cambaque (que distava cerca de 3 Km de Cameconde) tinha como certo algumas surpresas no trilho! Provavelmente um campo de minas e a seguir (algum humor-negro), munições de Kalash espetadas no chão formando a palavra PAIGC!

O Quitáfine permitia ainda ao PAIGC, um reabastecimento regular e seguro, processado a partir da República da Guiné, através de vários rios, em especial o Caraxe e o Camexibó!

Ao dispositivo militar juntava-se uma mata densa intransponível!

Os pára-quedistas, após uma operação no Quitáfine, só à noite conseguiram chegar a Cameconde, com grande dificuldade e orientados pelo clarão da queima de cargas de obus, em cima dos abrigos!

O grupo de Marcelino da Mata, largado de helicóptero, fez um golpe de mão a Cabonepo, a base do PAIGC mais a Norte do Quitáfine, onde estaria instalado um posto transmissor. Quando chegou, após lenta progressão através da mata… não havia lá nada… a base tinha sido abandonada momentos antes!

O Quitáfine era, efectivamente, o santuário do PAIGC, desde o início da guerra! Foi ali que se realizou, na tabanca de Cassacá – a 15 Km de Cacine e a 8 Km de Cameconde -, em meados de Fevereiro de 1964, o 1º Congresso do PAIGC, com a presença de Amílcar Cabral, Luís Cabral, Aristides Pereira e outras individualidades do Partido!

ACÇÃO PERIQUITO

A CCaç 3520 tinha chegado ao porto de Cacine, a bordo da LDG Montante, em 24 de Janeiro de 1972, para render a CCaç 2726 – companhia açoriana comandada pelo Capitão Magalhães -, o homem que retorcia as pontas do bigode com cera e a quem o tabaco nunca faltava! Dizia-se mesmo, à boca pequena, que, quando o tabaco acabava em Cacine, o PAIGC deixava, no mato, uns macitos para o Capitão! Rumor ou realidade… ninguém sabe! Ficou por provar!

Decorria ainda o período de sobreposição, que se prolongou até 22 de Fevereiro, quando foram recebidas instruções de Bissau, para ser preparada uma operação ao Quitáfine – Cabonepo e… Cassacá!

Seríamos, então, ainda bastante inexperientes, mas nunca aquilo a que alguém chamou um verdadeiro bando, embora a preparação que recebêramos para a guerra fosse bastante incipiente, com uma IAO feita no Cumeré, que pouco valor guerreiro nos acrescentara.

A formação garantida pelos oficiais e sargentos da companhia, essa sim permitia que o pessoal se apresentasse bastante bem preparado!

Os comentários e interrogações começaram a surgir entre as poucas pessoas que tinham conhecimento da operação!

Como vamos entrar no Quitáfine, com tudo minado e com sentinelas avançadas?

Qual será o grupo de combate eleito, quem serão os milícias que o acompanham?

Porque vamos intervir a nível de grupo de combate, quando estão estacionadas duas companhias em Cacine, enquadradas por capitães do quadro?

Será que com mais efectivos e um comando experiente e profissional, não poderíamos tentar um assalto frontal à base de Cassacá?

Parece que uns sentiam que a comissão estava terminada e o embarque estava à vista, enquanto outros, recém-chegados, temiam que a sua estreia no teatro de operações não fosse a mais auspiciosa… pelo que ninguém considerava ser o melhor momento para pôr em prática uma operação de grande envergadura!

Assim sendo, avançou um grupo de combate de periquitos, reforçado por alguns milícias, para um terreno totalmente hostil e com efectivos IN muito superiores!

Enfim, o moral das tropas era elevado e os madeirenses eram gente de muita coragem!...

Cassacá, 16 de Fevereiro de 1972

Exactamente no 8º Aniversário do 1º Congresso do PAIGC, exactamente no mesmo local! Se alguém o pensou… ninguém o confessou!

A lotaria contemplou o 1º Grupo de Combate do Alferes Alexandre Margarido (mais tarde Spínola viria a graduá-lo como Capitão), uma escolha certa, seria aquele que estaria melhor preparado, tanto pela sua formação em Operações Especiais, como pelas suas características pessoais!

O 1º Grupo de Combate seria apoiado por um grupo de milícias, formado pelos melhores elementos da respectiva companhia!

A operação foi preparada em detalhe, vindo mesmo um Major de Operações de Bissau que a comandaria o pessoal desde… Cacine! Haveria apoio aéreo de dois helicanhões! Sabia-se, então, que a abordagem ao Quitáfine se faria através do Rio Cacine primeiro, e do seu afluente Rio Poxiuco depois, dada a impossibilidade de o aceder por terra e a necessidade de não perder o factor surpresa!

Hora de partida… havia apenas dois sintex para transportar o pessoal ao longo dos rios! Nada de grave! Tudo se desenrasca! O restante pessoal será transportado em canoas gentílicas!

A viagem é lenta! Os sintex puxam as canoas para que se ganhe algum tempo! A organização é impecável e os meios fazem inveja aos exércitos melhor equipados!

A Armada Invencível chega, finalmente, ao ponto previsto para o desembarque! Os operacionais, depois de camuflarem os barcos, para reutilizarem no regresso, penetraram na mata, tentando chegar de surpresa à base do PAIGC, em Cassacá!

Andam, andam, andam… até que é avistado, já perto de uma tabanca, um solitário nativo armado! Um dos milícias, contra todas as instruções recebidas, faz fogo… o alarme estava dado!...

O cagaçal feito pela população da tabanca, incitando à descoberta e captura do grupo, é enorme!

Quebrara-se o efeito surpresa, o PAIGC poderia organizar-se e os efectivos com que contava na zona eram muito superiores e, naturalmente, melhor conhecedores da zona de acção!

A ocorrência é do conhecimento imediato do comando, em Cacine, que decide sobrevoar o local da operação numa avioneta Dornier 27, que após verificar a situação no terreno, ordena a retirada!

O pequeno grupo constata, porém, que a retirada não seria fácil!

Em pouco tempo a maré baixara, a armada estava atascada na bolanha, o rio era apenas um fio de água, insuficiente para garantir o reembarque e a retirada dos candidatos "a apanhar o IN pelas costas".

Um daqueles pequenos pormenores que, a falharem na hora “h”, transformam muitas operações planeadas ao detalhe em autênticos desafios de sobrevivência e desenrascanço!

O pequeno grupo encontrava-se assim entre a espada e a parede ou… pior, entre uma armada atolada na bolanha e 10 Km de terreno hostil, ocupado por largas dezenas de guerrilheiros e centenas de habitantes armados!

Que fazer então?

O alferes conferenciou com os seus graduados e com os elementos da milícia mais experientes, excelentes caçadores e determinantes neste terreno, não apenas para evitar o contacto com o inimigo, mas também para detectar e evitar as minas e armadilhas colocadas nos trilhos!

Acabaram por decidir criar uma manobra de diversão!

Iniciaram, então a progressão, como se o objectivo fosse chegar à base de Cassacá, para evitar que o inimigo descobrisse as embarcações, entretanto guardadas por uma secção e, simultaneamente, ganhar o tempo necessário para que a maré subisse e a armada pudesse navegar!

Não foi preciso caminhar muito para se pressentir uma emboscada de um grupo numeroso, mas barulhento, o que permitiu aos periquitos mergulharem na mata!

Com os dedos nos gatilhos mergulhados em absoluto silêncio - determinado pelo medo ou pelo treino? – o pequeno grupo, assistiu ao desencadear de forte tiroteio a uns 100 metros, não traindo a sua posição, facto este que constitui condição essencial para evitar um previsível desastre!

A situação, contudo, estava a tornar-se insustentável! A pouca experiência de movimentação na mata iria, certamente, acabar por denunciar as suas posições no terreno!

Entretanto o tempo decorrido permitiu, certamente, que os sintex e as canoas pudessem flutuar, pelo que não foi necessário simular mais o falso avanço para Cassacá!

Mas como chegar às embarcações sem ser detectado, com guerrilheiros e população armada em sua perseguição?

O alferes solicitou o apoio aéreo, que com umas valentes bujardas largadas cirurgicamente pelos helicanhões, criaram uma verdadeira confusão entre os guerrilheiros, permitindo aos piras, já então detectados e perseguidos de perto, chegarem às embarcações, entretanto já a flutuar!

Uma autêntica saga!

O reembarque foi um sucesso, mas o regresso iria representar uma nova aventura!

Avariou-se o motor de um dos sintex, o que obrigou à formação de um comboio naval indescritivel! À cabeça desse "comboio" seguia o único sintex com
motor que rebocava o outro sintex e ainda meia dúzia de canoas. Esta formação arrastou-se penosamente ao longo do Rio Cacine, por longas horas, com a pequena ondulação a ameaçar permanentemente o seu afundamento.

Completamente ensopados e exaustos, os homens desta operação de periquitos, tinham, no cais de Cacine, todos os restantes elementos das duas companhias à sua espera! Com tanto rebentamento e explosão, ninguém acreditava que todos ali chegassem… sem um arranhão!

Da nossa parte acabou assim, deste modo frustrante, com um indigno fogo de artifício (de apenas um tiro), a comemoração do 8º Aniversário do 1º Congresso do PAIGC em Cassacá!

À noite, com pompa e circunstância a Maria Turra (nome por que era conhecida a locutora IN da rádio oficial do PAIGC), anunciava o aniquilamento completo do grupo que tentara o assalto a Cassacá!...

Pois é… poderia mesmo ter acontecido…

Um abraço do,
Juvenal Candeias
Alf Mil da CCAÇ 3520

Nota 1: (*) Na Guiné, os periquitos ou piras, era a designação dada aos tropas recém-chegados ao território.

Nota 2: O relato desta história teve a colaboração directa do Alexandre Margarido, que ainda hoje não sabe como saiu vivo do Quitáfine, e a quem agradeço com um grande abraço.

Fotos: © Juvenal Candeias (2009). Direitos reservados.
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Notas de M.R.:

Vd. último poste da série em: