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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Guiné 63/74 - P9771: Os nossos últimos seis meses (de 25abr74 a 15out74) 11): Cartas de Paunca, SPM 5668, Parte I (J. Casimiro Carvalho, Fur Mil Op Esp., CCAÇ 11, mai-ago 1974)







Guiné > Região de Gabu < Paunca > CCAÇ 11 (1969/74) > c. maio / Junho de 1974 > Tempos de esperança e de temor > O fur mil op esp J. Casimiro Carvalho, "herói de Gadamael", entre os fulas...


Fotos: © José Casimiro Carvalho (2007). Todos os direitos reservados.




1. Por ocasião do nosso I Encontro Nacional, na Ameira, Montemor-o-Novo, em 14 de Outubro de 2006, conheci pessoalmente o José Casimiro Carvalho, camarada que teve a grande generosidade de me confiar, na altura,  um valioso conjunto de cartas e aerogramas enviados a amigos e familares no período em que esteve em Guileje, Cacine e Gadamael (1972/73),  e depois em Colibuía-Cumbijã, já em 1974, e ainda Bissau e Paunca (a seguir ao 25 de abril de 1974).


Um seleção de excertos das suas "cartas do corredor da morte" (*)  já aqui foram publicadas oportunamente. Está na altura, por ocasião do nosso VII Encontro, em Monte Real, mo próximo dia 21, de lhe devolver os originais (!). Devo dizer que ele fez questão de os ofertar, em 2008, ao Núcleo Museológico Memória de Guiledje, por ocasião do Seminário Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de março de 2008). Manifestou-me expressamente essa intenção. Em bora hora não lhe fiz a vontade, ficando eu com os originais e entregando ao museu um coleção de cópias (digitalizadas pela Fundação Mário Soares). Estou por isso em condições, cinco anos e emio depois,  de lhe devolver os originais que ele agora, sim, vai poder oferecer a uma das suas filhas, conforme é seu desejo.  São coisas pessoais e intransmissíveis, e eu fico contente de servir de "correio", entregando as cartas e os arorgramas, enviados em 1972, 1973 e 1974, de diferentes SPM: 2728 (CCAV 8530, Guileje, Gadamael, Colibuía, Cumbijã, Bissau, 1972/74) e 5668 (CCAÇ 11, Paunca, 1974).


Entretanto, fiz ainda uma seleção da correspondência relativa à sua curta mas algo atribulada passagem pela zona leste da Guiné (Nova Lamego e Paunca).


Esta correspondencia é mais um elemento, importante, para a elucidação e compreensão do período final da guerra na Guiné, tanto no sul (Guileje e Gadamael) como na zona leste (Paúnca). Recorde-se o que o nosso ranger  escreveu sobre essas peripécias em chão fula (*)


 O que se passou em Paunca já aqui foi descrito no nosso blogue: os quadros (metropolitanos, brancos) da CCAÇ 11 foram expulsos do quartel de Paunca, sob ameaça de armas, pelos soldados fulas, amotinados. Recorde-se que a  CCAÇ 11, tal como a minha CCAÇ 12, tinha-se formado originalmente em Contuboel (de Maio a Julho de 1969), fazendo parte da "nova força africana" de Spínola. Estive, portanto,  com eles menos de dois meses, em Contuboel, com a malta da CCAÇ 11 (ou melhor, na altura, a CART 11) a que pertencia o meu amigo Renato Monteiro, o mediático homem da piroga no Geba . 


A seguir ao 25 de Abril de 1974, fugido do inferno de Guileje e Gadamael, caído de paraquedas em Paúnca, na CCAÇ 11, o Casimiro Carvalhos vai conhecer o desespero e a raiva dos nossos aliados fulas, na fase do cessar-fogo e retração do nosso dispositivo militar no TO da Guiné... Este é um dos episódios mais chocantes da guerra da Guiné, aqui contados pelo nosso herói de Gadamael. Só é pena que ele tenha sido tão parco em palavras, no que diz respeito a este final da sua comissão ... 

2. CCAÇ 11, Paunca, Agosto de 1974
por J. Casimiro Carvalho




(i) Com uma arma apontada nas costas pelos seus próprios soldados 


(...) [Em 8 de Julho de 1973, saímos de Cacine, em LDG, a caminho de Bolama, e daqui] fomos para o Cumeré tirar outro IAO . Eu fui para Prabis com mais 12 homens, outros foram para Quinhamel ou Bijemita (??). Depois fomos para Colibuía-Cumbijã [janeiro-março de 1974], e aí fui destacado para rendição individual, sendo transferido para Bissau a fim de tirar estágio de Companhias Africanas, e durante esse estágio deu-se o 25 de Abril [de 1974].


Fui então para Paunca, CCAÇ 11 – Os Lacraus, onde me mantive até ao fim da minha comissão [ A primeira carta que temos de Paunca, é datada de 14 de maio de 1974, e foi escrita á máquina, e era dirigida à "maninha. Em 30 de abril de 1974, ainda estava em Bissau e dá conta, à mãe, em carta, do ambiente que se vive na cidade, com ]. Não sem antes levar um susto de morte, pois os militares africanos da CCAÇ 11 sublevaram-se. Quando eu estava a dormir, ouvi tiros, vim em calções com a Walther à cintura até ao paiol. Quando lá cheguei, eles estavam a armar-se e a disparar para o ar e eu, quando os interrogava pelo motivo de tal, senti o cano de uma arma nas costas, ordenando-me que seguisse em frente (até gelei)...Juntaram todos os quadros brancos e puseram-nos no mato...assim mesmo.


(ii) Socorridos no mato pelos inimigos de ontem!


Caminhámos muito, de noite, desarmados, e fomos até um acampamento de guerrilheiros do PAIGC, contámos a situação e eles mandaram um punhado deles a Paunca. Gritaram então lá para dentro:
- Têm 5 minutos para se entregaram e restituir o quartel aos brancos ou destruímos tudo! - Eles, os fulas, entregaram-se.


No fim, já de abalada, fomos ao paiol, juntámos todas as granadas e explosivos, e eu fui encarregado de os fazer explodir , ao redor de uma enorme árvore. Que cogumelo de fogo, impagável !


(iii) Por fim, a peluda...


Fui encarregado de comandar uma coluna de 22 viaturas até Bissau, por Fajonquito, Jumbembem Farim, Mansoa, Nhacra…Bissau. Ao fazer o espólio, não tinha G3, mas , como não tinha…
- Ó pá, estiveste em Guileje ?... Então ‘tá bem, não entregas.


A seguir vim de avião para a peluda. (...).


3.  Cartas de Paúnca, SPM 5668: Em 20 de maio de 1974, J. Casimiro Carvalho escreve um aerograma à mãe, Angelina Carvalho, então a residir em Vila Nova de Gaia:



Paunca, 20 de maio de 1974

(...) Então o Luís, está em Lamego ? Mande dizer o nº dele e o nome todo e qual é o SPM dele, pois eu estou perto. [O aerograma é acompanhado de um esboço do mapa, com a posição relativa de três localidades: Paunca - Pirada - Nova Lamego] (...)

(...) Ontem  estive de sargento de piquete e fui guardar um recinto onde havia batuque. Olha, é bonito, os fulas a lutar género luta greco-romana, eles muito fortes , e ao som da batucada. Até vibrei.

Não tenho feito nada, é só dormir, não saí nenhuma vez para o mato, pois aqui é raro, e isso só por si já vale muito. É menor o perigo que corremos. Um beijo do seu José Casimiro.

No mesmo dia escreve ao pai, Ângelo Carvalho, também outro areograma, do  SPM 5568:

Paunca, 20/5/74

Paizinho: (...) Vou pô-lo ao corrente, mais ou menos, do que se passa por aqui: Há 8 dias, fomos informados que daí em diante não podíamos fazer fogo de armas pesadas, a não ser em caso de ataque ao quartel. No mato, mesmo que encontremos um Grupo IN, só abrimos fogo se eles abrirem, e neste caso [devemos] tentar acabar com o tiroteio, logo que possível. A aviação não bombardeia. 


Quando foi formado o Governo Provisório, o presidente do Senegal,  Senghor, enviou o seu avião pessoal a Lisboa, para ir buscar o representante da Junta [de Salvação Nacional] e tentar um acordo prévio de cessar-fogo, do qual ficou assente: o PAIGC anulou todas as operações de grande vulto (como a de Guileje) que estavam planeadas para o fim da época seca, ou seja, "agora", enquanto que Portugal se comprometeu a não abrir fogo sobre guerrilheiros do PAIGC, prioritariamente.


Portanto temos praticamente um cessar-fogo não oficial, que será oficializado em Londres, no dia 25, entre Aristides Pereira e Portugal. Isto está a correr pelo melhor, não acha ? Nós andamos todos contentes, se bem que isto a mim não me vem beneficiar quanto ao fim da comissão que se avizinha. (...).

Primeira parte do documento [, Informação,] escrito à máquina e datado de Paunca, 7 de junho de 1974, dando conta dos primeiros contactos das NT com os guerrilheiros do PAIGC, no subsetor de Paunca

Paunca, 10/6/1974

Esboço de aerograma (3 folhas), escrito no dia de Portugal [10 de junho de 1974]. Uma parte do conteúdo seguirá para mãe, em carta manuscrita, enviada nesse mesmo dia. Outra parte foi [ou já tinha sido dactilografada, com data de 7/6/74] sob a forma de uma espécie de comunicado [ Informação,] cujos destinatário(s) se desconhece.


(...) GUERRA E...PAZ


Guerra... palavra que pouco dignifica. Guerra, sinónimo de destruição. Prenúncio do fim. Mas... também há a paz. E para isso se está a tarablhar neste momenmto em todo o Portugal.


Ontem [leia-se: 6 de junho de 1974], algures na Guiné, tropas portuguesas (brancas), comandadas por um oficial superior, dirigiram-se em missão de paz a um destacamento inimigo, em território português, perto da fronteira com o Senegal, deixando todo o armamento nas viaturas [e] deparando com uma colossal e bem montada emboscada de segurança. Numa atmosfera de confiança,  inimigos de ambos os lados cumprimentaram-se, os dois comandandantes inimigos entraram num amistoso diálogo, findo o qual se chegou à conclusão que... o PAIGC, como nós, anseia pela paz.


Esses mesmos inimgos disseram que teriam imenso prazer em contactar com tropas africanas, em serviço nas nossas fileiras, para trocarem impressões e concluirem o que mais lhes interessava.


Hoje [, 7 de junho,], algumas dezenas de tropas africanas, comandadas pelo mesmo oficial superior, dirigiram-se ao mesmo local, procedendo como no dia de ontem. Encontraram um clima de amizade, não foram molestados, e até foram obsequiados com galhardetes e emblemas do PAIGC. Também se procedeu à troca de pequenas peças de fardamento.


Imaginem, um momento tão importante, um momento nunca conseguido durante tantos anos de guerrilha. Parece inconcebível. Mas aconteceu. Nunca em toda a história mundial, que eu saiba, antes mesmo de um cessar-fogo, se viu istio, duas forças inimigas, como uma família, reunidas em franca amizade, esquecendo  todos os antecendentes, pois eles sabem que com isso contribuem para finaliziar o que há tanto tempo vem vitimando e continuaria a vitimar inocentes [...]


Estou deveras emocionado, eu que como tanto outros vi tombarem amigos, companheiros de farra e de luta, amigos para o bem e para o mal, e para quê ?  [...]


Ficou, nesse encontro, determinado que amanhã o inimigo vinha a um quartel nosso visitar-nos, conhecer-nos, nós que nos matavámos [uns aos outros] sem nos vermos. Enfim, agora como está previsto,  conhecer-nos-emos, se não houver imprevistos, e eu, que tanto os odiei, com o ódio que ganhei com a guerra, devido ao sangue que vi derramar, irei... talvez - quem sabe ? - ABRAÇÁ-LOS. Sim, porque eles lutaram para defenderem o que por direito lhes pertencia, um chão deles, bravos soldados como nós.

Fica aqui, pois, o meu desejo para que tudo se desenrole como desejamos, no dia de Portugal, nas conversações de Londres. Somos livres, mas ainda não temos a PAZ.

Um militar que anseia pela Paz.




4. Num segundo poste, divulgaremos mais alguns excertos de cartas escritas pelo J.Casimiro Carvalho, em Paunca, em junho de 1974. Não tenho nenhuma missiva em que ele relate à mãe, ao pai ou a outros familiares a situação de insubordinação dos soldados da CCAÇ 12, situação essa que  terá ocorrido por volta de 21 agosto de 1974 [ data em que o PAIGC tomou conta da povoação e aquartelamento, segundo o relatório da 2ª rep/QG/CTIG, já aqui divulgado]. (***)

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sexta-feira, 4 de junho de 2010

Guiné 63/74 - P6530: O Nosso Livro de Visitas (89): O Alenquer, condutor, Pel Rec Fox 42 (Aldeia Formosa, Guileje, Ganturé, Sangonhá, Cacoca, 1962/64)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > A Fox MG-36-24, que pertenceu aos Pipas, foi sendo sucessivamente rebaptizada: Bêbeda, Diabos do Texas... Segundo Nuno Rubim, "a matrícula da Fox é a mesma que consta numa fotografia tirada por elementos do PAIGC em Maio de 1973, quando ocuparam o quartel! Portanto a Bêbeda ( que vai ficar para a história, representada com essa mesma inscrição no diorama de Guileje ....) terá servido desde 1965 até 1973, integrada nos sucessivos Pel Rec Fox que por lá passaram"... A foto de cima foi gentilmente cedida pelo Teco (Alberto Pires), da CCAÇ 726. (*)


Foto: © Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.


1. Comentário, com data de 1 do corrente,  ao Poste P5797:

Anónimo deixou um novo comentário na sua mensagem "Guiné 63/74 - P5797: Grupo dos Amigos da Capela de...":


É de certo modo gratificante visitar este blogue, onde se podem recordar nomes de locais por demais conhecidos embora já se tenham passado quarenta e muitos anos.

Fala-se aqui em vários lados da localidade de Guileje, onde nós chegámos pela primeira vez em finais de 1963, vindos de Aldeia Formosa, e aí montámos o primeiro aquartelamento, seguindo-se depois Ganturé, Sangonhá, Cacoca,  etc...

Pertencendo ao Pelotão de Reconhecimento Fox 42, por esses locais andámos apoiando as tropas que se iam instalando ao longo desse percurso a caminho de Gadamael onde se encontrava, isolada por terra, uma Companhia de Caçadores.

Talvez mais tarde eu volte e conte algo do que presenciei na Guiné entre 1962 e 1964.

Fui condutor de uma Autometralhadora daquele Pelotão, era conhecido por O Alenquer, por ser natural daquele concelho embora habite em Amadora desde 1965.

2. Comentário de L.G.: 

Camarada Alenquer, obrigado por apareceres.  Na volta, a gente cá de te espera. És mesmo velhinho... Há pouca malta desse tempo e ainda para mais dos Pel Rec Fox. E muito menos ainda  do teu  42... Por dever de memória e sobretudo de camaradagem, aparece. Ficas desde já convidado a ingressar no nosso blogue... Um Alfa Bravo. Luís

___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de


9 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2090: Pelotões de Reconhecimento Fox em Guileje (Nuno Rubim)



domingo, 14 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 – P5814: Estórias de Guileje (7): O percurso da CCAV 8350 (Manuel Reis, ex-Alf Mil At Inf da CCAV 8350)


1. O nosso Camarada Manuel Reis (*), ex-Alf Mil At Inf da CCAV 8350, (Guileje, 1972/74), enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 9 de Fevereiro de 2010:

Camaradas,

Este texto é a descrição, em linhas gerais, do percurso da C.CAV 8350, Piratas de Guileje. É omissa a parte referente a Guileje e Gadamael, por todos já deveras conhecida.

Narrativa de alguns acontecimentos que marcaram o percurso da C. CAV. 8350.

Aos meus furriéis e soldados que nunca esquecerei

Nos meados do mês de Julho, cuja data não consigo precisar, a Companhia foi enviada para Cacine para aguardar embarque numa L. D. G. com destino a Bissau. Para trás, ficara Guileje e Gadamael. Connosco vão, para sempre, as marcas desses dias atribulados.

A estadia de dois ou três dias em Cacine foi maravilhosa. Com a compreensão e amabilidade da maioria dos camaradas da Companhia aí sediada, pode-se descomprimir um pouco.

Para o Juvenal Candeias e Catarino (a quem desejo uma rápido restabelecimento) e extensivo a toda a Companhia fica o meu sincero agradecimento por tudo o que nos propiciaram, num momento tão difícil.

Ao cair da tarde, sentado junto de uma das frondosas árvores e com o olhar perdido nas águas tranquilas e cálidas do rio Cacine, o meu pensamento voava para Coimbra, terra que me perfilhou e me fez homem.

Eram momentos únicos, em que tentava libertar a mente de um pesadelo, que ainda hoje subsiste.

Aqui as noites eram passadas num salutar convívio, em que a partilha de opiniões nos convidava a entrar pela noite dentro. Os temas abordados eram, inevitavelmente, o aproximar do fim da guerra. Tivemos a oportunidade de conhecer alguns pormenores da invasão à Guiné-Connakry e algumas das causas do seu fracasso. Foram dos momentos mais agradáveis que vivi no teatro de operações da Guiné.

Ao entrar para a L.D.G. deparo com o Comandante, meu conterrâneo, meu amigo, meu companheiro nos tempos estudantis de Coimbra. Luís Pato é o seu nome, esse mesmo, do bom vinho bairradino… Nada mau para começar, pensei…

Colocados no Cumeré fomos submetidos a instrução de reabilitação, orientada pelos Oficiais da Companhia de Comandos. Aqui valeu-nos o bom senso do Alferes, Comandante da Companhia, em substituição do Capitão, evacuado para a Metrópole. Após nos ouvir sobre o estado físico e anímico do que restava de uma Companhia, alterou o plano de instrução de modo a que este se adaptasse à situação física e psíquica dos militares da C.CAV 8350.

Todos os dias éramos bombardeados sobre possíveis hipóteses de colocação, que as Chefias Militares destinavam para a Companhia, que ia desde a colocação no local mais próximo de Guileje, considerando uma possível preocupação, até ao desmembramento total da mesma. Esta hipótese não vingou, dizia-se ser perigosa, pelo efeito contagiante que poderia exercer sobre os camaradas de outras companhias. Isto era o que se dizia, desconheço o seu fundo de verdade.

Após o mês de instrução são revelados os resultados dos exames médicos complementados com análises laboratoriais ao sangue, fezes e urina e são conclusivos: 87,5% dos camaradas são declarados inoperacionais. O registo é mental e pode não ser rigoroso. No entanto, tenho-o como tal.

As Chefias são obrigadas a alterar, temporariamente, os planos que projectavam para a C.CAV. 8350.

À Companhia é atribuído o sector de Quinhamel, zona onde a guerra não se fazia sentir. Como este sector ainda se encontrava ocupado por uma Companhia em rotação, fomos colocados num barracão rodeado por charchos. Julgo chamar-se Bisquita, o local da localização do barracão, onde não era possível dormir durante a noite, devido à imensidão dos mosquitos que penetravam, com relativa facilidade, através dos mosquiteiros. Andava-se de noite e dormia-se de dia.

Bem, assim ainda nos coçávamos, caso contrário não fazíamos mesmo nada!…

Em Bisquita ocorreu uma situação que não devo omitir pelo respeito e consideração que sempre me mereceram os meus soldados e furriéis. Este acontecimento mostra, ainda, até onde ia o espírito de união do grupo que, ao contrário do que constava em toda a Guiné, era sólido. Tinha sido forjado no sofrimento imposto pela guerra e moldado pelo desprezo a que fomos lançados. Soubemos resistir.

O acontecimento roça a banalidade, mas a atitude destes homens ultrapassa esses limites, é dignificante.

Todos sentíamos necessidade de nos ausentar daquele cenário de guerra, as chagas estavam vivas, mas os míseros pesos que os soldados auferiam, eram insuficientes para se deslocarem até à Metrópole e se libertarem um pouco do stress acumulado.

Seis ou sete soldados, do meu grupo, conseguiram que os familiares lhes angariassem a quantia necessária para a viagem e o dinheiro foi enviado, via postal, para o S.P.M. 2728 (o código postal). As sucessivas alterações de colocação da Companhia terão contribuído para que o dinheiro não aparecesse.

Era necessário confirmar a viagem e não havia dinheiro para o fazer. Sentia-me impotente por um lado e revoltado por outro. A situação parecia inultrapassável e ainda, por cima, eu também vinha de licença, nesse mesmo voo, o que me impedia de libertar as minhas economias.

Após falar com os meus furriéis, no dia de pagamento, descrevi ao grupo a situação, que alguns camaradas estavam a viver, já conhecido da maioria, e sugeri-lhes que emprestassem uma determinada quantia, que eu ficaria responsável pelo empréstimo de cada um.

A adesão foi total. Todos se mostraram disponíveis, com excepção de um soldado, que passadas umas horas veio ao meu encontro manifestar o seu desejo de também colaborar. As férias daqueles camaradas, na Metrópole, só eram possíveis com a colaboração de todos.

A maior ajuda, em termos monetários veio dos furriéis, que sem eles, a ideia não poderia avançar. A sua colaboração foi determinante.

A história termina com a chegada dos vales postais no próprio dia da viagem o que permitiu regularizar a situação antes da partida para férias.


Passados os três meses de permanência em Quinhamel fomos colocados em Cumbijã, onde se encontrava o nosso amigo e Capitão, Vasco da Gama, com a sua Companhia. Fomos acolhidos cordialmente e a ele e à sua gente estamos gratos, para sempre.

Nunca cheguei a saber qual a missão que nos estava destinada em Cumbijã e Colibuia. Recordo-me das operações, tipo bombeiro, a apagar fogos aqui e ali. Reordenamento de Colibuia, protecção à construção da estrada Aldeia Formosa-Buba nas imediações de Nhala, elaboração de 53 processos relativos a mortos e feridos em Guileje e Gadamael, para além dos patrulhamentos de rotina.

Deixo uma palavra de gratidão ao Capitão Reis, Comandante da C.Cav. 8350, em nome dos camaradas feridos em combate e dos familiares dos mortos. Sem a sua determinação e perspicácia, dificilmente conseguiam a pensão que, por direito, lhes assistia.

Aqui, em Cumbijã, terras do Vasco da Gama, nos vai encontrar o 25 de Abril.

A guerra, que vitimara tantos camaradas, transforma-se em PAZ.

As vivências eram outras. O inimigo deixara de o ser. Havia que preparar a entrega do aquartelamento de Cumbijã.

Foi um período complicado, pelo envolvimento a que me obrigava, para que nada sucedesse de anormal e que pudesse manchar todo o processo.

Foram os encontros no mato, desarmados, com os grupos de guerrilha do PAIGC, foram as reuniões de carácter político com os Comissários do PAIGC., foi o desarmamento dos nossos Milícias, sendo esta a situação muito dolorosa.

O aquartelamento de Cumbijã foi entregue no dia 19 de Agosto de 1974, ao PAIGC, com toda a dignidade, na presença do Comandante de Companhia, Capitão Santos Vieira.

Falei no trajecto da C.CAV. 8350 e relatei alguns episódios. Outros episódios, vividos neste trajecto, esperarão a sua vez.

Um grande abraço para todos os camaradas.
Manuel Reis
Alf Mil At Inf da CCAV 8350

Fotos: © Casimiro Carvalho (2010). Direitos reservados.
___________
Notas de M.R.:

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Guiné 63/74 - P5182: Tabanca Grande (183): Luís Paiva, ex-Fur Mil, Pel Art 15, Guileje e Gadamael (1972/73)

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3325 (Jan/Dez 1971) > Pessoal do Pel Art que guarnecia um das peças 11,4 cm ali existentes, no tempo em que a unidade de quadrícula era a CCAÇ 3325, comandada pelo Cap Jorge Parracho, hoje coronel na reforma. A CCAÇ 3325 foi subtituída pela CCAÇ 3477 (Nov 1971 / Dez 1972) > Os Gringos de Guileje, l a que se seguiu a CCAV 8350 (Dez 1972/Mai 1973) > Os Piratas de Guileje. O Pel Art 15, a que pertenceu o Luís Paiva, esteve em Guileje com estas duas unidades de quadrícula.

Foto: © Jorge Parracho / AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau 2007). Direitos reservados.

1. Mail de, de 24 de corrente, do Luís Paiva:

Caro Luís Graça:

Em viagem meramente acidental acabei por deparar com a publicação de uma parte da história da minha passagem entre 1972 e 1974 por terras da Guiné/Bissau, mais concretamente por Guileje, Cacine e Gadamael, no período que decorreu entre 1972 e 1973.

Embora o texto a que alude o link [abaixo] (*), tenha já sido redigido há quase dois anos, a verdade é que nunca mais o revi nem sequer sabia que tinha sido publicado.

Há pelo menos uma imprecisão no referido texto que desejaria corrigir: no ponto "vi" onde está escrito "Quando chegámos a Gadamael", deveria ter sido escrito "Quando chegámos a Cacine".

Saudações cordiais.

Luís Paiva
Lamego
nop45376@sapo.pt

2. Comentário de L.G. (enviado por mail):

Já está feita a correcção. Mas tu, continuas a não fazer parte da nossa Tabanca Grande. A tua história é uma daquelas que, talvez um dia, venha a ser publicada em livro de antologia do nosso blogue. Preciso me mandes as duas fotos da praxe para eu te apresentar ao resto da malta (já somos quase um batalhão).

Vejo que vives em Lamego. Dá notícias. Obrigado pelo teu mail. Luís Graça

3. Resposta do Luís Paiva, a 26 do corrente:

Caro Luís Graça:

Assunto - Histórias de tempo de guerra

Grato pelo feedack, informo que, logo que possível, procurarei seleccionar no meu arquivo fotográfico as fotos que solicitas, ressalvando porém desde já que a qualidade das mesmas possa não ser a que seria desejável e isto porque, obviamente, não se pode esperar que fotos analógicas com mais de 36 anos tenham uma qualidade óptima. Presumo que as fotos pedidas se refiram ao período da guerra colonial, eventualmente com mais uma foto actual, não?!

Após a selecção que desejo fazer, terei que efectuar um scanner das mesmas e remetê-las por email.

Numa análise superficial que fiz ao blogue não consegui detectar em que zona da Guiné estiveste e em que período. Admito a possibilidade de, numa pesquisa mais exaustiva, lograr obter essa informação mas como o blogue possui demasiada informação, desejaria evitar uma busca demasiado longa.

Quanto à publicação da minha história em livro, acho que não tem grande interesse. A verdade é que não faço parte do número discutível de heróis que a guerra colonial parece ter produzido. Admito perfeitamente a existência de heróis porque, como em todas as guerras, também os houve nas nossas ex-colónias. Porém há sempre um conjunto bastante significativo de homens que, jogando com o factor tempo e com o desconhecimento por parte dos leitores do que então se passou, se aproprie indevidamente de um heroísmo que não teve!

A guerra colonial não é assunto tabu e a mim pessoalmente não reconheço, felizmente, ter deixado traumas e sequelas que tenham perturbado o resto dos meus dias. Infelizmente nem todos tiveram essa sorte e é sabido que houve camaradas nossos que perderam a vida, outros que herdaram deficiências físicas mais ou menos profundas e outros ainda que são hoje vítimas de problemas psicológicos graves.

Sou por natureza um pacifista e um grande crítico dos conflitos mundiais, entendendo que a maioria deles só servem interesses obscuros, sejam eles comércio de armas, sejam outros. Normalmente quem provoca as guerras não é quem mais com elas sofre! Eu diria que o que acontece é que quem as desencadeia ou está na sua origem ou é usualmente quem com elas mais usufrui.

Quando há mais de 36 anos me preparava para ir para a Guiné, um amigo que recentemente foi Director de uma conhecidíssima Instituição do Estado, inquiria-me sobre as razões que me levavam a não me furtar a essa mobilização. Ele era já um forte crítico da guerra colonial e na altura, com os meus 21 anos, eu não tinha qualquer formação política. Esta iniciou-se, quase sem eu dar por isso, já na Guiné, quando numa patrulha ouvi um milícia guineense reprovar a nossa deslocação para aquela ex-colónia, inquirindo-nos sobre as razões da nossa permanência ali.

Foi a partir desse momento que iniciei a minha consciencialização política. E, embora nunca tivesse sido um activista, a verdade é que com o desenrolar do conflito, sobretudo na parte do mesmo em que eu, por força das circunstâncias, acabei por estar envolvido, fui desenvolvendo uma tomada de posição bastante crítica em relação àquela guerra.

A minha posição foi-se aliás definindo nos longos aerogramas e cartas que quase diariamente fui escrevendo à mulher com quem estou casado há 34 anos e que quase religiosamente guardou toda essa correspondência que estou para reler, aínda que parcialmente, relativamente ao período mais conturbado que passei na Guiné. Funcionam quase como peças jornalísticas!

A memória é algo que nos vai traíndo com a idade mas quando existem documentos de suporte torna-se mais fácil reconstituír certos factos, aínda que com a distância a que o tempo e idade necessariamente nos obrigam.

A guerra dos ecrãs de cinema, por muito que procure a reconstituição verídica e genuína dos factos, vale pelo que vale! As guerras nas quais nós somos protagonistas têm menos a ver com estereótipos do que muitos, que não passaram por elas, imaginam.

De uma leitura parcial do teu blogue, pude para já concluír por uma diferença de opiniões e relatos que só vêm provar quanto este assunto é controverso. Parece-me ser notória a polémica que envolve algumas das histórias de guerra e a divisão de pontos de vista muitas vezes antagónicos e dificilmente conciliáveis. Tenho sérias dúvidas que muitos dos relatos feitos tenham efeitos benéficos pois longe de funcionarem como um exorcismo poderão antes reabrir algumas feridas.

Todos nós temos as nossas histórias, umas mais conturbadas do que outras. Cada um foi protagonista à sua maneira de um conflito colonial cujo desencadeamento e prolongamento teve subjacentes razões muito discutíveis. A discussão política levar-nos-ía certamente muito longe e aqui e agora não acho ser o momento oportuno para entrar por essa via.

A terminar esta longa exposição que já te tomou certamente tempo em demasia, desejaria afirmar que é minha convicção, face aos dados disponíveis e ao que me lembro, que a tomada de posição do Major Coutinho Lima (**) me pareceu ter sido a mais adequada e correcta e que foi até, graças a ela, que o número de baixas não foi maior.

Estive um período longo em Guileje com duas Companhias, uma açoreana [CCAç 3477] e a de Cavalaria que se lhe seguiu [CCAV 8350]. Com a Companhia açoreana os ataques ao aquartelamento aconteciam a uma cadência de um por mês, mas após a rendição pela Companhia de Cavalaria os acontecimentos sofreram uma alteração drástica e dramática.

O pelotão de artilharia a que eu estava afecto em rendição individual em Guileje, era comandado - se a memória não me trai - por um alferes que se chamava Luís mas cujo apelido não me recordo. Não eras tu, não? Sabes quem era?! Depois ele foi substituído por outro alferes que, salvo erro, também era Luís! E estavam comigo mais dois furriéis, o Queirós e o Araújo (este de Braga, salvo erro).

O Araújo foi entretanto substituído pelo Santos, de São João da Madeira. Quanto aos Cabos, tenho a impressão que um deles morreu lá em Gadamael e o outro (Oliveira) encontrei-o algumas vezes salvo erro na Café Convívio, junto do Hotel Tuela onde trabalhou alguns anos. Também já não o vejo há algums anos, pois deixou de ali trabalhar, salvo erro. Nunca mais soube nada dos camaradas furriéis e deixei mesmo de ter contactos com o Queirós desde que a Lusalite fechou na Baixa em Lisboa.

Aínda me lembro vagamente, salvo erro dos furriéis, Ramos (o fotocine?!) e o Monteiro que posteriormente viria a trabalhar na Papelaria Fernandes, em Lisboa mas há mais de 30 anos que nada sei deles nem dos restantes.

Um abraço.
Luís Paiva
Lamego

4. Comentário de L.G.:


Meu caro Luís, como vês o mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande. Ao fim de mais de ano e meio, voltas a tropeçar a connosco, na blogosfera. Em boa hora, camarada!...

Começo por satisfazer a tua curiosidade a meu respeito: estive na Zona Leste (Contuboel e Bambadinca), entre Junho de 1969 e Março de 1971, e fui Fur Mil Ap Armas Pesadas de Infantaria (que tive de trocar pela G3...), numa companhia independente de intervenção, a CCAÇ 12, com praças do recrutamento local, que fui ajudar a formar em Contuboel, a norte de Bafatá... Pelo que vês, nunca poderia ter sido o meu homónimo Luís, teu alferes, comandante do Pelotão de Artilharia que retirou de Guileje, juntamente com a CCAV 8350... Esse pelotão, o teu pelotão, era o nº 15 e, na altura, era comandado pelo Alf Mil Mil Pinto dos Santos (**).

As companhias com que estiveste em Guileje foi a CCAÇ 3477 - Gringos de Guileje- e CCAV 8350 - Piratas de Guileje. Temos aqui diversos camaradas do teu tempo, destas duas companhias, e que poderás contactar, por e-mail.

Quanto à publicação do teu depoimento num livro de antologia dos nossos postes, porque não ? É apenas uma hipótese, um cenário que eu ponderei... E não era por seres herói ou deixares de o ser... Não é isso que está em causa...No nosso blogue, não pomos santificamos nem diabolizamos ninguém mas também não impedimos ninguém de escrever histórias de heroísmo...

O risco de alguém se autopromover-se a herói de opereta, é mínima... Ninguém foi herói sozinho, todos os textos aqui publicados são sujeitos a escrutínio, análise crítica, triangulação... Tarde ou cedo, apanham-se os mentirosos, os falsificadores... Há centenas de olhos atentos a eventuais mentiras ou falsificações dos relatos... E, de resto, há um grande pudor, por parte dos nossos camaradas em falar dos seus eventuais feitos valorosos... Cabe sempre aos outros validar a informação que cada um presta no nosso blogue.

Seria uma pena, por outro lado, que não quisesses (ou não pudesses) partilhar alguns dos aerogramas que escreveste à tua futura esposa, e que tu próprio chamas peças jornalísticas, relatando o quotidiano da guerra... Podes ver o tratamento que fizemos de algumas cartas e aerogramas que o ex-Fur Mil J. Casimiro Carvalho, da CCAV 8350, nos confiou (*****).

Quanto às diferenças de leitura e de interpretação dos acontecimentos da guerra, não me parece que seja esse o pecado original do blogue... Bem, pelo contrário, essas diferenças são reveladores do nosso pluralismo, tolerância, liberdade de pensamento e de expressão. Ninguém quer impor a ninguém a sua verdade, todos e cada um têm o direito de contar a sua história, a sua versão... Um dia, a História (com H grande), os historiadores, os vindouros, os nossos filhos, netos e bisnetos nos julgarão... Entre camaradas que estiveram na mesma guerra, evitamo-lo fazer.

Relativamente a eventuais malefícios ou benefícios da nossa blogoterapia... Respeito a tua opinião, mas até data nenhum dos nossos camaradas se queixou de que blogar faz mal à saúde. Humor à parte, és bem-vindo à nossa Tabanca Grande. Manda, quando puderes, uma foto do teu tempo de artilheiro e outra actual. Ficaremos em contacto. Até um dia destes algures por aí, em Lamego, em Lisboa, em Guileje ou... no nosso blogue.

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2483: Estórias de Guileje (3): Devo a vida a um milícia que me salvou no Rio Cacine, quando fugia de Gadamael (ex-Fur Mil Art Paiva)

(...) Só sabemos que se chama Paiva, e foi furriel de artilharia, no pelotão de artilharia que estava em Guileje, quando esta unidade foi abandonada por decisão do comandante do COP 5, Major Coutinho e Lima... É um testemunho dramático, de um homem, de fuga em fuga, que atravessou a nada o Rio Cacine, já na fuga de Gadamael, e foi salvo por um milícia de que não se lembra o nome...

Peço ao Paiva que nos contacte de novo e nos dê as suas coordenadas (pelo menos o endereço de –email e eventualmente o número de telemóvel ou telefone), sobretudo para o ajudar a reencontrar os seus antigos camaradas de Guileje e de Gadamael (e a reorganizar as suas memórias, doridas, daquele tempo)... Seria uma pena que este pungente testemunho ficasse escondido sob a forma de comentário a um dos nossos postes ...


Alguns excertos:

(...) desempenhava funções de furriel miliciano afecto à Unidade de Artilharia localizada inicialmente em Guileje, e posteriormente retirada para Gadamael (após o abandono do primeiro daqueles aquartelamentos, [em 22 de Maio de 1973])(...)

Em Guileje, parece-me que o pelotão de artilharia era constituído por 3 secções, cada uma delas sob a chefia directa de um furriel (recordo o furriel Araújo, de Braga, e o furriel Queirós, meus contemporâneos, sendo que o Araújo foi posteriormente rendido, salvo erro pelo furriel Santos, de S. João da Madeira) e comandadas por um alferes, posteriormente substituído por outro. Tenho ainda na minha mente a foto mental de ambos, embora lamentavelmente me não recorde já dos seus nomes. (...)

Este pelotão de artilharia retirou na totalidade para Gadamael quando foi dada ordem de abandono do aquartelamento de Guileje. Para além dos graduados e oficial acima referidos, retiraram ainda os cabos e praças (estes últimos naturais da Guiné).

Em Gadamael, a artilharia passou efectivamente muito maus bocados mas não ficou totalmente inoperacional, tanto quanto me recordo. O seu alferes teve aliás um comportamento de bravura pois foi ferido e continuou a desempenhar as sua funções, embora numa situação bastante precária. (...)

Alguns oficiais, sargentos e praças (acompanhados de parte da população) - nos quais me incluía eu -, iniciaram uma retirada para Cacine que foi efectuada debaixo de fogo e que se processou em botes dos fuzileiros. Já agora poderei acrescentar que a evacuação não foi totalmente conseguida nesse dia porque entretanto as operações de resgate foram suspensas por ter começado a anoitecer.

Curiosamente não ficou junto da população nenhum oficial, mas apenas dois furriéis, eu e outro camarada de armas, que, com a população, lográmos atravessar para o outro lado do rio (após a maré ter baixado) e ali tivemos, com muito custo, que conter a população em silêncio para não sermos detectados pelo PAIGC. Esta tarefa foi dramática já que connosco estavam muitas crianças que pela sua natureza são habitualmente ruidosas. Passámos ali a noite até conseguirmos ser evacuados no dia seguinte.

Essa experiência foi traumatizante porquanto assistimos a cenas dramáticas, com muita gente a precipitar-se para o rio e para o tentar atravessar a nado, antes que a maré permitisse o seu atravessamento quase total, a pé. Dessa precipitação resultaram mortes por afogamento, pois a corrente ainda forte arrastou alguns. (...)

Eu próprio iniciei a travessia antes de se ter completado o vazamento da maré e, porque não era um nadador exímio, e por outro lado com o peso das botas e da G3 e a força da corrente, tive que a meio da travessia me desembaraçar da minha arma (foi para o fundo do rio) para não morrer afogado. E fiquei a dever a minha vida a um milícia guineense que na outra margem do rio - e a partir do lodo onde se encontrava e para onde eu pretendia arrastar-me - me estendeu a coronha da sua arma a que eu, num esforço titânico, consegui agarrar-me. Fiquei a dever-lhe a minha vida e, no meio da confusão e do caos, sem saber a quem concretamente (ainda hoje...).

Por a minha substituição (comummente designada por rendição) se ter processado em regime de rotação individual, não consegui localizar nunca antigos camaradas de armas (quer afectos ao pelotão de artilharia quer às Companhias - duas- com quem estive: à dos Gringos [ CCAÇ 3477, ] (***) e à que se lhe seguiu [ CCAV 8350,] (****) com a última das quais partilhei estes dramáticos acontecimentos que tantas vidas custaram. (...) Gostaria de reencontrar todos esses Camaradas. (...)

(**) Vd. postes de:

18 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3910: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (22): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte I)

24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3932: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (23): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte II)

(***) Vd. poste de:

13 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4333: Convívios (126): 3º Encontro da CAÇ 3477 “Os Gringos do Guileje”, dia 6 de Junho, em Mirandela (Amaro Samúdio)

6 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2815: Tabanca Grande (67): Os Gringos de Guileje: Abílio Delgado, Zé Carioca e Sérgio Sousa (CCAÇ 3477, Nov 1971/ Dez 1972)

(****) Vd. poste de 9 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4489: Convívios (142): Convívio anual da CCAV 8350 “Piratas de Guileje” (1972/74), na Covilhã (Casimiro Carvalho/Magalhães Ribeiro)

(*****)Vd. postes de:

25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1699: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (1): Abatido o primeiro Fiat G 91

13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1727: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): Abril de 1973: Sinais de isolamento

14 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira

24 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1784: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (4): Queridos pais, é difícil de acreditar, mas Guileje foi abandonada !!!

18 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1856: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (5): Gadamael, Junho de 1973: 'Now we have peace'

25 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3354: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (6): O nosso querido patacão

domingo, 26 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4251: FAP (26): Em louvor dos sargentos pára-quedistas do BCP 12 (Manuel Peredo, ex-Fur Mil CCP 122, 1972/74)

Guiné > Forças da CCP 122 / BCP 12 > Algures,s /d > Da esquerda, para a direita, o Fur Mil Fernandes, caboverdiano; ao centro, o Sargento Carmo Vicente ; à direita, o Manuel Peredo, Sargento... Os três sargentos do 4º Pelotão do CCP 122 estão equipados com armamento do PIAGC...O Manuel Peredo ostenta o RPG2, o temível LGFog usado pelos guerrilheiros do PAIGC.

Foto: © Manuel Peredo (2008). Direitos reservados


Manuel Peredo, ex-Fur Mil Pára-quedista (CCP 122 / BCP 12, Brá, Bissalanca, 1972/74) (*) deixou o seguinte comentário ao poste P4239, de 23 de Abril (**):

Se eu tivesse um décimo do talento literário de alguns bloguistas,teria uma participação mais activa.Desde que descobri o blogue,não consigo deixar passar um dia sem o consultar,o que não é muito do agrado da minha mulher e devem imaginar porquê.

Tudo o que aqui se diz sobre Gadamael me toca profundamente porque também eu vivi esses dias terríveis,mas aqueles que vieram de Guileje para Gadamael deviam ter ficado afectados psicologicamente para toda a vida.

O que o João Seabra, José Casimiro Carvalho,Manuel Reis e outros dizem sobre os pára-quedistas deixa-me imensamente orgulhoso de ter pertencido a essa tropa especial. O João Seabra diz que não compreende porque é que nenhum pára foi condecorado pelos serviços prestados em Gadamael.Se calhar ninguém se destacou em especial. Se o José Casimiro Carvalho não teve direito a nada, eu e outros também não merecíamos ser louvados ou condecorados.

O João Seabra faz bem em enaltecer o trabalho dos sargentos pára-quedistas que pertenciam ao quadro. Todos eles já tinham uma ou duas comissões no ultramar. Mesmo os oficiais e furrieis milicianos aprendiam muito com eles.

Faço aqui um reparo. Eles não eram promovidos por mérito, salvo talvez em raras excepções. Todos eles começaram como simples soldados e os melhores eram convidados a seguir a carreira militar. Os que aceitavam, tiravam o curso de sargentos, findo o qual passavam a cabos aprovados e depois iam subindo de posto em função dos anos de serviço,o mesmo acontecendo com os milicianos.

O Carmo Vicente (***) foi meu colega no quarto pelotão da CCP 122 e acho que chegou a ser comandante do mesmo pelotão durante algum tempo. Quando havia falta de alferes milicianos, os pelotões eram comandados pelos sargentos mais antigos,mas apenas por um tempo limitado. Raramente um sargento era operacional 24 meses.

Acalento a esperança de um dia poder participar num encontro nacional para poder trocar opiniões, em especial com o João Seabra, José Casimiro Carvalho, Manuel Rebocho, Victor Tavares e outros (****).

Por hoje tenho dito e aqui deixo um abraço para todos.

_____

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3095: Tabanca Grande (81): Manuel Peredo, Fur Mil Pára-quedista, CCP122/BCP 12 (Guiné, 1972/74)

(**) Vd. poste de 23 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4239: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (9): Eu, a FAP, o BCP 12 e a emboscada de 18 de Maio (João Seabra)

(***) Vd. postes de:

4 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2915: Com os páras da CCP 122/ BCP 12, no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (1): Aquilo parecia um filme do Vietname

5 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2917: Com os páras da CCP 122/BCP 12 no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (2): Quase meia centena de mortos... Para quê e porquê ?

12 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2933: Com os páras da CCP 122/BCP 12 no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (3): Manuel Peredo, ex-Fur Mil Pára, hoje emigrante

16 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2950: Com os páras da CCP 122 / BCP 12, no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (4): Opiniões (Carlos Silva / Nuno Almeida)

17 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2953: Com os páras da CCP 122/ BCP 12, no inferno de Gadamael (Carmo Vicente) (5): Fomos capazes do melhor e do pior (Virgínio Briote)

(****) Sobre a batalha de Gadamael, vd. entre outros os seguintes postes:

27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

14 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3623: Recortes de imprensa (11): A guerra do J. Casimiro Carvalho, pirata de Guileje e herói de Gadamael (Correio da Manhã)

16 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2949: Convívios (67): Pessoal da CCAV 8350, no dia 7 de Junho de 2008, na Trofa (J.Casimiro Carvalho/E.Magalhães Ribeiro)

7 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2729: Estórias de Guileje (10): os trânsfugas de Guileje, humilhados e ofendidos (Victor Tavares, CCP 121/BCP 12, 1972/74)

27 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2483: Estórias de Guileje (3): Devo a vida a um milícia que me salvou no Rio Cacine, quando fugia de Gadamael (ex-Fur Mil Art Paiva)

18 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1856: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (5): Gadamael, Junho de 1973: 'Now we have peace'

24 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1784: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (4): Queridos pais, é difícil de acreditar, mas Guileje foi abandonada !!!

19 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1613: Com as CCP 121, 122 e 123 em Gadamael, em Junho/Julho de 1973: o outro inferno a sul (Victor Tavares, ex-1º cabo paraquedista)

25 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1625: José Casimiro Carvalho, dos Piratas de Guileje (CCAV 8350) aos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11)

2 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - XCI: Antologia (6): A batalha de Guileje e Gadamael (Afonso M.F. Sousa / Serafim Lobato)

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte)

2 Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVIII: No corredor da morte (CCAV 8350, Guileje e Gadamael, 1972/73)(Magalhães Ribeiro)

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4160: Parabéns a você (4): No dia 9 de Abril de 2009, ao camarada Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref (Editores)

Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje Coronel Reformado.

Hoje, 9 de Abril de 2009, está de parabéns o nosso camarada Miguel Pessoa.

Ao nosso tertuliano Miguel Pessoa desejamos muitos anos de vida, na companhia de sua esposa, Giselda Pessoa, filhos, netos e demais familiares e amigos.

O Miguel faz parte da nossa Tabanca Grande há relativamente pouco tempo, mas a sua colaboração no Blogue tem sido intensa, e como elemento da Força Aérea, tem trazido até nós outras histórias e outra forma de ver e viver a guerra da Guiné (*).

Tem a particularidade de ser uma das poucas pessoas no mundo sobreviventes após impacto directo de um míssel terra-ar SAM-7 Strella na sua aeronave.

Foi uma sorte excepcional o míssil não ter atingido o avião de modo a impossibilitar tempo a sua ejecção. O de ter sido encontrado e recuperado no solo, são e salvo, antes do aparecimento do IN, após uma noite passada em vigília ao relento, em que os minutos terão parecido horas foi um facto invulgar.
Uma perna fracturada na chegada ao chão, obrigou-o a uma imobilidade forçada e a uma espera de evacuação assistida pelo Serviço de Saúde das Forças Armadas. Quis o destino que uma das pessoas intervenientes na sua recuperação fosse a que hoje, e desde há décadas, é a sua companheira de vida. Dizem os crentes que Deus escreve direito por linhas tortas. Ao Miguel e à Giselda desejamos as maiores felicidades.

Casal Giselda e Miguel Pessoa. Muito nos honra tê-los como camaradas e tertulianos no nosso Blogue.

Nunca é demais falar do trabalho destes nobres e valentes camaradas da FA que abnegadamente voaram nos céus da Guiné em prol da nossa segurança. Aos Pilotos, Especialistas no ar e em terra e às nossas queridas Enfermeiras Pára-quedistas, a nossa eterna gratidão.

Atentemos agora às suas palavras, quando pela primeira vez se nos dirigiu:

Para começar, apresento as minhas credenciais: Miguel Pessoa, à data Tenente-Piloto-Aviador do Quadro Permanente da Força Aérea. Cumpri a comissão na Guiné no período de 18NOV72 a 14AGO74, com um intervalo passado em Lisboa (entre 7ABR73 e início de AGO73) para recuperar das mazelas sofridas quando da minha ejecção de Fiat G91, depois de atingido por um SAM-7 Strella durante um apoio de fogo ao aquartelamento do Guileje.

À chegada ao Teatro de Operações estava apenas qualificado para voar o Fiat G-91 mas rapidamente o saudoso Ten Cor Almeida Brito ministrou-me um curso intensivo de DO-27 que me habilitou a operar este avião por todas as pistas ali existentes (64, se bem me lembro, que as contei na minha carta de voo). Assim, até Abril de 1973 dividi a minha actividade de voo entre o Fiat G-91 (1/3 das horas) e o Do-27 (os restantes 2/3).

A partir daí e até ao fim da comissão a minha actividade de voo foi essencialmente feita no Fiat G-91.
[...]

A melhor maneira de conhecermos e reconhecermos o trabalho meritório do Miguel como Piloto da FA, na Guerra da Guiné, é reler os seus postes abaixo identificados.

Deixamos também algumas das suas fotos e respectivas legendas que representarão alguns dos momentos mais importantes e mais dramáticos da sua passagem pelos céus e pistas de aviação de toda a Guiné.









Sequência fotográfica, mostrando a recuperação do Pilav Ten Miguel Pessoa, ejectado sob os céus de Guileje, depois do seu Fiat G-91 ter sido abatido por um Strela

Lisboa > AFAP - Associação da Força Aérea Portuguesa > 18 de Dezembro de 1995 > O reencontro de dois Mata: Marcelino da Mata (hoje, Ten Cor Ref) e Kurika da Mata (nome de guerra por que também era conhecido o Miguel Pessoa, na BA 12, Bissalanca, Guiné, 1972/74)

Guiné > Bissalanca > BA12 > O Ten Pilav Miguel Pessoa (1972/74). O Miguel foi o primeiro piloto de Fiat G-91 a ser abatido por um Strela (em 25 de Março de 1973, sob os céus de Guileje) (1). Efectuou mais de 400 missões no TO da Guiné. Esteve 4 meses em Lisboa, hospitalizado, a seguir à queda do seu Fiat.

Guiné > Bissalanca > BA12 > 1974 > O então Ten Pilav Miguel Pessoa... Uns meses antes, em 25 de Março de 1973, num domingo e em pleno dia, o aquartelamento de Guileje fora duramente atacado durante cerca de hora e meia. Foram usados foguetões 122 mm. A parelha de Fiat G-91 que estava de alerta em Bissalanca, nesse dia e hora, veio em apoio de fogo. A aeronave do Miguel Pessoa, que vinha à frente, foi atingida por um Strella, sob os céus de Guileje... Foi o primeiro Fiat G-91, na história da guerra da Guiné, a ser abatido pela nova arma, fornecida pelos soviéticos ao PAIGC, o míssil terra-ar SAM-7 Strella (de resto, já usada e testada na guerra do Vietname)... O Ten Pil Miguel Pessoa conseguiu, felizmente, ejectar-se. Vinte quatro horas depois, era resgatado, são e salvo, pelo grupo de operações especiais do Marcelino da Mata, conforme se pode ler numa das cartas do nosso amigo e camarada J. Casimiro Carvalho, já aqui publicadas na série Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) ... (1)
__________

Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

29 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3816: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (5): Strellado nos céus de Guileje, em 25 de Março de 1973 (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav)

4 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3839: FAP (4): Drama, humor e... propaganda sob os céus de Tombali (Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref)

9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3859: FAP (6): A introdução do míssil russo SAM-7 Strela no CTIG ( J. Pinto Ferreira / Miguel Pessoa)

14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3892: FAP (12): O Fur Mil Pil Mota, e as Enf páras Giselda e Natália, caídos no Como em 1973 e salvos pelos fuzos (Miguel Pessoa)

18 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3911: Dossiê Madina do Boé e o 24 de Setembro (1): Em 1995, confirmaram-me que o local da cerimónia foi mais a sul (Miguel Pessoa)

27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3948: FAP (14): Um dia rotineiro na Base Aérea nº 12, em Bissalanca (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, 1972/74)

8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3999: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-quedistas (5): Justamente recordadas no Dia Internacional da Mulher (Miguel Pessoa)

13 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4024: FAP (16): O reencontro, 22 anos depois, de Kurika da Mata com o Marcelino da Mata (Miguel Pessoa)

19 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4051: FAP (18): Kurika da Mata (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4065: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (7): Os tomates do Capelão da BA 12, Bissalanca... e outras frutas (Miguel Pessoa)

28 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4088: FAP (20): Efemérides: 36 anos após a morte do Ten Cor Pilav Almeida Brito, abatido por um Strela em Madina do Boé (Miguel Pessoa)

1 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4119: FAP (21): Os meus sentimentos contraditórios no 'verão quente' de 1973 ... (Miguel Pessoa)


Vd. último poste da série de 6 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4146: Parabéns a você (3): No dia 6 de Abril de 2009, ao camarigo Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp, Guiné 1971/73 (Editores)

quarta-feira, 4 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3982: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (7): Ferreira da Silva, ex-Capitão Comando, novo comandante do COP 5 a partir de 31/5/1973

Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Uma Lancha de Desembarque Média (LDM) com militares e populares no Rio Cacine, fugindo do inferno... Há pontos (polémicos) que o antigo Cap Comando Ferreira da Silva poderia ajudar-nos a esclarecer como: (i) a debandada de Gadamael; (ii) a alegada ordem de Spínola para 'metralhar' os desertores...

Foto: © Delgadinho Rodrigues /
Manuel Rebocho (2006). Direitos reservados.


1. Mensagem de Ferreira da Silva, Cor Cmd Ref, que passa a ser um novo membro da nossa Tabanca Grande (Aguardamos que nos mande as fotografias da praxe, e que nos conte algo mais sobre os meses que passou em Gadamael entre 31 de Maio de 1973 e princípios de 1974)


Caro Luís Graça, amigos e combatentes (*)

Antes de mais os meus parabéns ao vosso blogue, e as minhas desculpas por ainda não ter participado, mas encontro-me a frequentar um curso de informática face às minhas dificuldades nestas novas tecnologias.

Em segundo lugar, quero salientar que tenho muita honra em ter sido combatente, como centenas de milhar de portugueses, que fizeram a guerra nas condições difíceis que todos conhecemos, a quem a Pátria ainda não prestou o devido reconhecimento.

Considero ainda a batalha de Gadamael, como uma das mais decisivas da nossa Guerra em África, e como estive aí colocado como comandante e adjunto durante vários meses tenho muito gosto em dar a minha opinião.

Todos os intervenientes tiveram uma actuação importante face à difícil situação verificada.

Relativamente a um artigo do jornalista Eduardo Dâmaso (**), publicado no jornal “Público”, de 26/6/2005, em que refere que no dia crítico de 1 de Junho de 2003 fiquei sem oficiais, informo que lhe enviei na altura um texto escrito, em que digo que fiquei sem capitães, o que foi verdade pois ficaram feridos e foram evacuados, o que ele confirma no desenvolvimento do artigo.

Para os mais interessados neste tema informo que o livro “Guerra Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros”, de Manuel Amaro Bernardo, contêm a minha opinião sobre Gadamael e que a intervenção dos paraquedistas consta do livro “A Geração do Fim”. (***)

Para terminar, para avivar a minha memória, gostaria de contactar com combatentes que estiveram em Gadamael em 1 de Junho de 2003. O meu contacto, para além do mail, é o 965772007.

Queria reiterar ao Luís Graça os meus parabéns e agradecimentos, e aos combatentes a minha solidariedade, respeito e admiração.

Ferreira da Silva
____________

Notas de L.G.:

(*) 1 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P3954: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (6): A posição, mais difícil do que a minha, do Cap Cmd Ferreira da Silva (João Seabra)

(...) O [então capitão, hoje Coronel, ] Ferreira da Silva foi inicialmente colocado no Batalhão de Comandos da Guiné, numa operação no Morés, a sua viatura (um Unimogue) rebentou uma mina que matou os demais ocupantes, tendo ele sofrido fracturas nos dois braços e mais ferimentos, e sido obrigado a pedir a sua própria evacuação.

Evacuado para Portugal, pediu para terminar a sua comissão na Guiné, sendo colocado no CIM [Centro de Instrução Militar] de Bolama.

No dia 31 de Maio de 1973, foi recolhido de helicóptero e depositado em Cacine, seguindo-se uma viagem de sintex para Gadamael onde foi despejado ao fim da manhã, para substituir o Sr. Coronel (hoje Major General) Durão, com quem teve uma brevíssima conversa, onde lhe foi sugerido que o Sector estava calmo e controlado.

Este último oficial, seguiu imediatamente para Cufar, via Cacine, no mesmo sintex.

O Cap Ferreira da Silva nem teve tempo para reconhecer o aquartelamento, e mal conheceu os capitães das duas Companhias [ ali estacionadas ].

Ao princípio da tarde desse mesmo dia começaram as flagelações a Gadamael, e no dia seguinte de manhã os dois capitães foram evacuados.

O Cap Ferreira da Silva não conhecia os demais oficiais e, naquela confusão, não sabia onde os encontrar.

Dito isto, o proverbial “tratamento jornalístico” encontra logo um grande motivo de interesse: “ficou sem oficiais”.

(...) O então Capitão Comando Ferreira da Silva ficou em Gadamael até 1974, e pode contar-nos coisas muito interessantes sobre aquele sector, no pós JUL 73.(...)


(**) O trabalho de investigação do jornalista Eduardo Dâmaso foi publicado em dois postes:

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P878: Antologia (42): Os heróis desconhecidos de Gadamael (Parte I)

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte)

Vd. também igual trabalho sobre Guileje (com erros factuais já corrigidos) > 27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)


(***) Sobre a batalha de Gadamael, vd. entre outros os seguintes postes:

27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

14 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3623: Recortes de imprensa (11): A guerra do J. Casimiro Carvalho, pirata de Guileje e herói de Gadamael (Correio da Manhã)

16 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2949: Convívios (67): Pessoal da CCAV 8350, no dia 7 de Junho de 2008, na Trofa (J.Casimiro Carvalho/E.Magalhães Ribeiro)

7 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2729: Estórias de Guileje (10): os trânsfugas de Guileje, humilhados e ofendidos (Victor Tavares, CCP 121/BCP 12, 1972/74)

27 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2483: Estórias de Guileje (3): Devo a vida a um milícia que me salvou no Rio Cacine, quando fugia de Gadamael (ex-Fur Mil Art Paiva)

18 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1856: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (5): Gadamael, Junho de 1973: 'Now we have peace'

24 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1784: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (4): Queridos pais, é difícil de acreditar, mas Guileje foi abandonada !!!

19 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1613: Com as CCP 121, 122 e 123 em Gadamael, em Junho/Julho de 1973: o outro inferno a sul (Victor Tavares, ex-1º cabo paraquedista)

25 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1625: José Casimiro Carvalho, dos Piratas de Guileje (CCAV 8350) aos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11)

2 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - XCI: Antologia (6): A batalha de Guileje e Gadamael (Afonso M.F. Sousa / Serafim Lobato)

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte)

2 Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVIII: No corredor da morte (CCAV 8350, Guileje e Gadamael, 1972/73)(Magalhães Ribeiro)