domingo, 26 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1318: Xime: uma descida aos infernos (2): Op Abencerragem Candente (Luís Graça, CCAÇ 12)

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Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xime > 1972 > Obus 10,5 (ou 105 mm). No aquartelamento do Xime, existiam três obuses deste calibre e um morteiro 81 m/m. Eram estas as armas pesadas que existiam em 1972. As mesmas que existiam em 26 de Novembro de 1970.

Foto: © Sousa de Castro (2005). Direitos reservados.


Extractos da História da CCAÇ 12: Guiné 69/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores nº 12. 1971. Cap. II, pp. 41 a 43 (Vd. abreviaturas em anexo).

Texto revisto e anotado por L.G. (1):


(17) Novembro/70: Violenta reacção do IN à penetração das NT em Ponta do Inglês durante a Op Abencerragem Candente

Embora se admitisse que o seu dispositivo no Sector L1 [correspondente ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole] tivesse sofrido importantes alterações, uma vez que se havia manifestado fracamente nos últimos meses, em especial no subsector do Xime, o IN não deixaria, no entanto, de reagir violentamente à penetração das NT em Ponta do Inglês no decurso da Op Abencerragem Candente, causando 6 mortos e 9 feridos [O aquartelemento da Ponta do Inglês, controlando a entrada no Rio Corubal, tinha sido abandonada por decisão do brigadeiro Spínola, logo no início do seu consulado, no último trimestre 1968].

Participaram nesta operação as seguintes forças, constituindo 3 Agrupamentos [num total estimado em cerca de 250 homens]:

(i) a CCAÇ 12 (sedeada em Bambadinca, ao serviço do BART 2917), a 3 Gr Comb (2° e 4º);

(ii) a CART 2715 (aquartelada no Xime), também a 3 Gr Comb;

e (iii) a CART 2714 (aquartelada em Mansambo), a 2 Gr Comb.

A missão era patrulhar a área definida pelo RGeba-Corubal-Buruntoni-Canhala a fim de:

(i) explorar eventuais vestígios IN;

(ii) deixar vestígios da passagem das NT e panfletos de acção psicológica;

e ainda (iii) contactar com a população desarmada, convidando-a a apresentar-se.

Os 3 Agrupamentos actuariam independentemente e por itinerários diferentes mas de modo a apoiar-se em caso de necessidade: Agr A (CART 2714), Agr B (CCAÇ 12) e Agr C (CART 2715).

No planeamento da operação, o Agr B faria a nomadização da região compreendida entre o RGundagué e a estrada (interdita) Xime-Ponta do Inglês, montando emboscadas durante a noite na área de Darsalame Baio e reunindo-se ao Agr C no nosso antigo aquartelamento da Ponta do Inglês, enquanto este bateria a região compreendida entre a referida estrada e o RCorubal, emboscando-se na área do Poindon.

Notícias de elevada classificação admitiam que o IN tivesse retirado do Sector 2 [também conhecido por região do Xitole e já na altura integrado na Frente Xitole / Bafatá ] dois bigrupos (Poindon e Baio) e um grupo de artilharia (Mangai).

De qualquer modo, depois da Op Boinas Destemidas [levada a efeito em Outubro de 1970 pela CCAÇ PARAS 123 na região de Ponta Varela, e da qual resultara a morte de sete guerrilheiros e a captura do respectivo armamento], o IN revelara-se apenas uma única vez (um grupo de 5 elementos tinha flagelado o Xime com armas ligeiras no mês anterior).

Desenrolar da acção:

A 25 [de Novembro de 1970], pelas 7h00, os Agr B e C saíram do Xime, no momento em que Mansambo era atacado com mort 82, LRockets e armas ligeiras por um grupo IN não estimado, atrasando a saída do Agr A.

Em Madina Colhido experimentaram-se os rádios, verificando-se que o do Agr B só ligava com Bambadinca e o do Agr C com o Xime, não havendo ligação entre eles [imprevidência, impreparação, incompetência, acrescednto eu] . Por outro lado, tentando-se também entrar em ligação com o PCV [posto de comando volante], esta não foi conseguida, uma vez que a frequência terra-ar que fora atribuída à operação não estava dentro das gamas de frequência da FA (!).

Em virtude disso, os 2 Agr foram obrigados a seguir juntos [grave erro!, direi hoje, pensando no comprimento de centenas de metros da coluna, em marcha, qual cobra sulcando o alto capim da savana arbustiva da região].

Depois de atingirem a Ponta Varela, contornaram a bolanha em direcção da antiga tabanca de Poindon, não tendo detectado entretanto vestígios recentes de presença IN nem de população. Ao escurecer, e quando as NT se preparavam para montar emboscadas, verificar-se-iam porém dois casos de intoxicação devido às conservas da ração de combate [!], pelo que tiveram de regressar ao Xime, aonde chegaram pelas 21h.

Entrando-se em contacto rádio com o comando de Bambadinca, a comunicar-se o sucedido e a pedir-se instruções, foram dadas ordens para os Agr B e C seguirem para a Ponta do Inglês pela respectiva estrada, ao raiar da madrugada do doutro dia [26 de Novembro], e aonde deveriam aguardar novas instruções [segundo erro, e este o mais grave!].

A 26, pelas 5.45 h da madrugada, iniciou-se de novo a marcha, tendo a progressão decorrido normalmente, e sem se notarem sinais de recente passagem nos trilhos do Baio e nas imediações do acampamento destruído durante a Op Boinas Destemidas em Xime 3C1-29.

Três horas depois, pelas 8.50h, já perto da Ponta do Inglês, o IN desencadearia uma violenta emboscada em L sobre a direita, precedida por um tiro isolado que foi confundido com um sinal de aviso duma eventual sentinela avançada, e que apanhou na zona de morte os 3 Gr Comb do Agr C [ CART 2715] e 1 Gr Comb (4º) do Agr B [CCAÇ 12].

Os primeiros tiros do IN, especialmente de LRockets, atingiram mortalmente o picador e guia do Agr B, Seco Camará, que ia na frente, e os quatro homens que o seguiam, incluindo um graduado [furriel miliciano Cunha], tendo ferido gravemente outro. Com rajadas sucessivas de LRockets e armas automáticas o IN, fixando as NT, lançou-se ao assalto sobre os primeiros homens, mortos ou gravemente feridos, conseguindo apanhar-lhes as armas, e só não os levando devido a pronta reacção das NT.

É de destacar aqui a acção heróica dos soldados Soares (CART 2715), que veio a ser mortalmente ferido, Sajuma (apontador de bazuca do 4º GR Comb/CCAÇ 12) que ficou ferido numa perna, e Ansumane (apontador de dilagrama, também do 4º Gr Comb/CCAÇ 12, ferido ligeiramente nas costas), que se lançaram ao contra-ataque, juntamente com outros camaradas e alguns graduados, a fim de quebrar o ímpeto do IN e de recolher os mortos e feridos.

O ataque durou cerca de 20 minutos, sendo a retirada do IN apoiada com tiros de mort 82 e canhão s/r (!) que incidiram sobre a estrada, e especialmente sobre os 2 últimos Gr Comb (1° e 2º) da CCAÇ 12, assim como rajadas enervantes de pistola-metralhadora, de posições que ainda não se haviam revelado, nomeadamente de cima das árvores.

Pelos elementos da frente foram ouvidos gritos de dor entre as fileiras do IN, tendo o rápido reconhecimento da zona confirmado que este deveria ter tido vários feridos e mortos prováveis [Esta parte do relatório era música, para não desmoralizar ainda mais as NT e sobretudo enganar o comando].

Em consequência da emboscada IN, uma das mais violentas de que há memória na região do Xime, pelo seu impacto sobre as NT, a CART 2715 [Xime] sofreu 5 mortos (l Furriel Mil) e 7 feridos, e a CCAÇ 12 teve 2 feridos (dos quais 1 grave, o Sold Sajuma Jaló), e 1 morto (o picador e guia permanente das NT Seco Camará, na altura ao serviço da CCS do BART 2917, e que do antecedente já tinha dado provas excepcionais de coragem e competência, tendo participado com a CCAC 12 em quase todas as operações a nível de Batalhão no Sector Ll).

Sob a protecçãodo helicanhão (que seguia para Mansambá no momento em que foi pedido o apoio aéreo), os 2 Agr regressaram ao Xime, com 2 Gr Comb do Agr B [1º e 2º da CCAÇ 12] a abrir caminho por entre a mata densa, 1 Gr Comb do Agr C [ 2715] a manter segurança à rectaguarda e os restantes empenhados no transporte dos feridos e mortos, tendo as heli-evacuações sido feitas numa clareira já perto de Madina Colhido e depois de percorridos mais de 5 Km, em condições extremamente penosas [No helicóptero vinha uma ou mais enfermeiras-paraquedistas].

Notícias posteriores [ não se indica a fonte...] admitiam que nesta emboscada o IN tivesse sofrido 6 mortos. Entretanto, desta reacção do IN contra a penetração das NT num dos seus redutos, concluiu-se que aquele foi excepcionalmente bem comandado porque:

(i) escolheu um local que por ser muito fechado dificultava a manobra;

(ii) utilizou pessoal em cima de árvores para ter uma melhor visão e comandamento sobre as NT;

(iii) tinha a retirada preparada com armas colectivas (morteiro, canhão s/r) que só se revelaram na quebra de contacto;

(iv) fez fogo de barragem, especialmente de LRockets, sobre o Gr Comb que seguia na vanguarda, permitindo lançar-se ao assalto.

O que o relatório do comandante da Operação, o segundo comandante do BART 2917, não faz (nem podia fazê-lo!...) era dar a mão à palmatória...


Durante este mês [de Novembro de 1970] a CCAÇ 12 continuou empenhada na segurança aos trabalhos de construção da estrada Bambadinca-Xime [a cargo da empresa TECNIL].

De 1 a 10 [de Novembro de 1970], o 2º Gr Comb esteve de reforço a Missirá juntamente com o Pel Caç 54, patrulhando e montando emboscadas na região de Sancorlã/Salà e margem do RCuio/RGambiel, com a missão de interceptar uma coluna de reabastecimento IN que, segundo notícias que não se vieram a confirmar, seguiria de Madina/Belel para a área de Bafatá.

Realizou-se ainda uma coluna logística até ao Saltinho.

Abreviaturas:

Agr = AgrupamentoBART = Batalhão de Artilharia
CART = Companhia de Artilharia
CCAÇ = Companhia de Caçadores
CCS = Companhia de Comando e Serviços
FA = Força AéreaGr Comb = Grupo de Combate
IN = Inimigo
LRockets = RPG, lança-granadas-foguetes
Mil = Miliciano
Mort = Morteiro
NT = Nossas Tropas
Op = Operação
Pel Caç Nat = Pelotão de Caçadores Nativos
PCV = Posto de comando volante (em geral, de avioneta Dornier)
R = Rio
s/r = (canhão) sem recuo
Sold = Soldado

__________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post anterior, de 26 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1317: Xime: uma descida aos infernos (1): erros de comando pagam-se caros (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P1317: Xime: uma descida aos infernos (1): erros de comando pagam-se caros (Luís Graça)


Portugal > Caldas da Rainha > 1968 > O futuro furriel miliciano Guimarães, de minas e armadilhas, está a tocar viola, rodeado de camaradas que, como ele, estavam a fazer a recruta no RI 5 das Caldas da Rainha. "Lá ao fundo, à direita e em último plano, uma carinha pequenina, é o Cunha".... Viria a morrer em combate, na região do Xime, na Op Abencerragem Candente, em 26 de Novembro de 1970; pertencia à CART 2715, unidade de quadrícula do Xime)

Foto: © David J. Guimarães (2005). Direitos reservados.


1. Na minha outra encarnação, quando eu fui o furriel miliciano Henriques, e estive na Guiné, entre Maio de 1969 e Março de 1971, no final da minha comissão, ainda em Bambadinca, escrevi a história da minha companhia, que era a CCAÇ 2590, ou melhor CCAÇ 12, uma companhia de nharros, que fazia parte da nova força africana com que Spínola sonhava ganhar... tempo (que não a guerra).

Devo dizer que o meu nome foi sugerido pelo meu Capitão - Capitão de Infantaria, do QP, Carlos Alberto Machado de Brito -, tendo como base a minha experiência, na vida civil, como jornalista... Devo acrescentar que tive acesso a todos os arquivos classificados da companhia, o que só foi possível com a cumplicidade de vários camaradas meus, de um dos sargentos (o Piça, o famoso Piça, minha senhora, para a servir! -, como ele, impecável e delicadamente, fazia questão de repetir, quando alguém do sexo oposto não percebia o seu apelido de família, tipicamente alentejano, e voltava a perguntar Como ?)... Com a cumplicidade até do meu próprio comandante, bom homem, que, embora assustado com o resultado final do trabalho que me encomendara, fechou os olhos à minha ousadia e até me deu um louvor...

Hoje eu estou em condições de compreener a sua delicada posição: devia estar já com os seus 37 ou 38 anos, com 3 comissões no ultramar (se não me engano) e à beira de ser promovido a major (em Janeiro de 1971, lembra-me o Humberto Reis).

Trinta e tal anos depois, em 1994, fui encontrá-lo, em Fão, Esposende, na casa de um dos nossos antigos alferes - o Carlão - no posto de coronel e confessei-lhe, candidamente, que tinha tomado a liberdade de distribuir, na época, uns tantos exemplares, clandestinos, aos tugas da companhia... De facto, ainda em Bambadinca, foram tiradas a stencil (recordam-se desta primitiva técnica de reprografia?) umas escassas dezenas de exemplares da história não autorizada da CCAÇ 12, antes de embarcarmos para a metrópole, em rendição individual (os nossos soldados africanos, esses, continuaram a servir a CCAÇ 12, muitos deles até ao final da guerra, aquartelados no Xime, desde 1973).

Tenho para com estes últimos um sentimento de gratidão e de reconhecimento, mesmo sabendo, na época, que eles estavam do lado errado da guerra e da história. Alguns, desgraçadamente, pagaram com a vida ou a liberdade o terem apostado no cavalo errado.

2. Vou republicar hoje, 26 de Novembro de 2006, o relatório da Op Abencerragem Cadente (que raio de nome esotérico!), desdobrando um texto que, de certo modo, dá o pontapé de saída a este blogue (ou mellhor, ao Blogue-Fora-Nada, que antecedeu o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné) (1)...

Fá-lo homenageando os nossos camaradas que tombaram na Ponta do Inglês: o furriel miliciano Cunha, o soldado Soares e os outros camaradas - cujs nomes não recordo - da CART 2715 (aquartelada no Xime) que morreram na Operação Abencerragem Candente, na madrugada de 26 de Novembro de 1970 (dias depois da invasão de Conacri, a 22, por uma força comandada por Alpoim Galvão e na qual participaram os meus vizinhos da 1ª Companhia de Comandos Africanos, estacionados em Fá Mandinga).

Quando publiquei esse texto - em 25 de Abril de 2005 -, eu tinha alguma dificuldade em me curvar perante a memória do Seco Camará, mandinga do Xime, embora reconhecesse que ele fora um valoroso e competente guia e picador das nossas tropas, durante anos e anos a fio.

Como muitos outros pobres diabos, o Seco fora também um mercenário, um colaboracionista, um torcionário, um homem para os trabalhos sujos da guerra: ele próprio me confessou um dia, com aquela autoridade e candura africanas de homem grande, que nos anos da política de terra queimada, da repressão brutal às populações do Xime que simpatizavam com (ou apoiavam) a guerrilha (Samba Silate, Poindon, Nhabijões...) , ele próprio era encarregue pelo capitão tuga do Xime (sic), para matar, à paulada (sic), em pleno mato, os elementos suspeitos, capturados...

Tenho dificuldade em fazer recuar esses tempos, mas é bem possível que sejam anteriores ao tempo do Governador e Comandante-Chefe, General Arnaldo Schultz (1965-1968),o mesmo é dizer, que devem ser do tempo dos seus antecessores: 1959 - 1962 António Augusto Peixoto Correia (1959-1962) e Vasco António Martínez Rodrigues (1962-1965).

No regresso ao quartel, o capitão, manga de bom pessoal (sic), pagava-lhe um sumol (sic)... O coitado do Seco Camarà, peça insignificante da máquina de guerra colonial, foi ao mesmo tempo um tenebroso carrasco e uma pobre vítima, como muitos outros guinéus, e nomeadamente os pertencentes aos grupos étnicos islamizados...

O Seco Camará morreu ingloriamente em 26 de Novembro de 1970, nesta operação que eu aqui evoco e em que participei. Recordo-o, ainda hoje, com o seu inseparável cachimbo e o seu ar de cão rafeiro... Nunca saberei se alguma vez se sentiu (ou poderia sentir) português. Sei apenas que foi um bravo soldado - ou melhor, auxiliar dos militares portugueses - e eu não posso julgá-lo, sumariamente, com base nos meus valores ou princípios éticos. É claro que também não vou absolvê-lo com base no relativismo cultural: o facto de ser mandinga, descendente de um povo de guerreiros e conquistadores, não lhe davam quaisquer direitos, e muito menos o direito de vida ou de morte...

3. Alguém, da população do Xime - que me desculpe o nosso amigo José Carlos Mussá Biai, que nessa altuta teria 7 anos! -, nos terá traído nessa noite fatídica. A nós e ao Seco Camarà. Ou se calhar nem foi preciso isso: 250 homens em armas são uma multidão ruidosa, a entrar e a sair de um quartel... No mato, na antiga estrada Xime-Ponta do Inglês, são uma cobra gigantesca, de quilómetro e meio...

De qualquer modo, onde quer que o Seco Camrá esteja, no céu ou no inferno dos mandingas, paz à sua alma!

4. Pertencente na altura ao 4º Grupo de Combate da CCAÇ 12 (não tinha uma posição fixa, era uma espécie de suplente, já que era um atirador de... armas pesadas de infantaria, numa companhia de intervenção que não tinha... armas pesadas), fui um dos que resgatei o corpo do furriel miliciano Cunha (que era de Braga, se não me engano). Gostava muito dele, éramos amigos. Tinha passado a noite de 25 para 26 na conversa com ele entre dois copos, no Xime, a fazer horas para a trágica saída na madrugada seguinte.

O segundo comandante do BART 2917 (não vale a pena citar o seu nome, já que ainda pertence ao número dos vivos) obrigara-nos a seguir o mesmo trilho da véspera: escassas horas depois, o Cunha estava morto mais quatro tugas e o guia e picador Seco Camará.

O Cunha, o pequeno e valoroso Cunha, ainda com o seu ar de criança tímida, era o único dos seis que não estava desfeito pelos rockets. Tinha apenas um fiozinho de sangue na testa: o primeiro tiro fora, seguramente, para ele que ia à frente da secção, juntamente com o Seco Camarà. A imagem que tenho dele, era que estava a dormir, exausto, no capim, quando cheguei à sua beira. Ainda lhe dei uma bofetada e sacudi-o energicamente:
- Acorda, meu sacana!

Como garante o Guimarães (da CART 2716, do Xitole), o Cunha que fez a recruta com ele e foi mobilizado para a Guiné no mesmo Batalhão (BART 2917), "deve estar no céu porque era um homem bom".

5. Nunca mais consegui esquecer essa maldita operação, em que até mesmo os meus soldados fulas, que eram bravos soldados, tiveram medo… Foi a maior emboscada que eu sofri, e também a mais mortífera que apanhámos na região do Xime. Mas não dei um tiro. Nunca dei um tiro, na Guiné, a não ser a um desgraçado de um jagudi (abutre) a que nem sequer felizmente acertei…

Recordo esta estória, em homenagem também aos que morreram e aos que sobreviveram, em Portugal, na Guiné e noutros teatros de guerra, aos homens e mulheres que contribuiram, de mil e uma maneiras, para que hoje nós possamos - pelo menos aqui - estar a falar de liberdade, a recordar a guerra e a fazer a paz connosco próprios, a praticar a liberdade com a mesma naturalidade com que respiramos...

6. Na elaboração da história da minha companhia (ex-CCAÇ 2590 e, depois, CCAÇ 12) que é também a história militar do Sector L1 / Zona Leste da Guiné entre meados de 1969 e o 1º trimestre de 1971, segui, em muitos casos, o teor dos relatórios de operações que eram feitos pelos alferes milicianos (com destaque para o Moreira) ou pelo capitão, passado pelo crivo da minha própria experiência como operacional ou do relato dos meus camaradas, furriéis milicianos...

Dentro dos constrangimentos do tempo e do lugar, procurei ser objectivo, recusando tanto quanto possível a tentação da hagiografia que era corrente na história de outras companhias independentes ou de companhias integradas em batalhões: "Fomos os melhores, chegámos, vimos e vencemos!"...

Nesta, como noutras operações, há passagens muito discutíveis como aquela em que se sugere que o IN sofrera baixas prováveis... Há aqui um branqueamento da situação, o que era frequente entre nós: depois da violentíssima emboscada de que fomos vítimas, ninguém estava em condições, físicas e psicológicas, de fazer o reconhecimento do local e, muito menos, de ir em perseguição dos guerrilheiros...

Seis mortos e nove feridos exigem, no mínimo, a afectação de dois grupos e combate (60 homens) para o seu transporte... Esta falsificação da realidade ou, no mínimo, o seu branqueamento era frequente entre oficiais milicianos e do quadro: enganavam-se uns aos outros, enganavam Bafatá (onde estava o comando da zona leste, o COP 7, se não me engano), enganavam Bissau (o quartel-general) e enganavam Lisboa (sede do Governo, não democrático, do país), que por sua vez enganava o Zé Portuga!...

Tudo isso acabava por ter consequências pesadas, para o pessoal no terreno, que era obrigado a executar operações mal planeadas e, por vezes, ainda pior executadas e comandadas...

De facto, não se pode ganhar uma guerra, escamoteando ou ignorando informação! Pessoalmente, eu já sabia isso, desde os meus quinze ou dezasseis anos...A verdade, trágica, terrível e humilhante, é que o IN destroçou ou neutralizou seis grupos de combate (2 agrupamentos), matou seis elementos das NT, feriu outros nove e ainda por cima levou-lhes as armas!... E só não levou os corpos porque houve ainda um resto de coragem física, de solidariedade e de determinação (outros chamam-lhe heroísmo).

No relatório da operação ninguém quis dizer o que era óbvio: os erros de planeamento da operação, as imprevidências, a imprepração da nossa tropa fandanga, a total incompetência e a arrogância militarista do major (periquito) que comandou a operação, lá de cima, arrogante, a partir do seu PCV... Que Deus lhe perdoe...Eu, que não sou Deus, não tenho o poder de perdoar; em contrapartida, não consigo esquecer - por muito que me esforce - essa descida aos infernos do Xime.

As duras palavras que lhe disse, a quente, à noite, no regresso da operação, na parada de Bambadinca, não as vou repetir aqui... Como as pedras que são lançadas contra alguém, essas palavras não têm regresso...mas só fazem sentido no contexto, de grande tensão, física e emocional, que era próprio daquela guerra...

Ainda hoje não consigo perceber por que é que fomos obrigados a fazer aquela operação - três dias depois da invasão de Conacri! - e sobretudo por é que cometemos tantos erros infantis... Na guerra, os erros de comando pagam-se carros...

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Notas de L.G.:

(1)Vd. post de 25 Abril 2005 > Guiné 69/71 - VII: Memórias do inferno do Xime (Novembro de 1970)

Guiné 63/74 - P1316: A participação dos paraquedistas na Operação Ametista Real: assalto à base de Cumbamori, Senegal (Victor Tavares, CCP 121)



O ex-1º Cabo paraquedista Victor Tavares (BCP 12, CCP 121, Guiné 1972/74).

Fotos: © Victor Tavares (2006). Direitos reservados.

Texto do Vitor Tavares (1), com data de 15 de Novembro de 2006:


Operação Ametista Real - Assalto à Base de Cumbamori no Senegal

A 17 de Maio de 1973, a Companhia de Caçadores Paraquedistas 121 recebe ordem para se integrar na operação acima referida, tendo-lhe sido atribuída a missão de garantir a segurança de um corredor entre Ujeque e Guidaje, através do qual se processaria a retirada dos Comandos Africanos

Nesse mesmo dia, da parte da tarde, embarcamos em Bissau, em LDG, com destino a Ganturé [, na margem direita do Rio Cacheu, a sul de Bigene], aonde desembarcamos no início da tarde do dia seguinte, partindo de seguida em marcha apeada em direcção a Bigene.

Chegamos aí pelo meio da tarde. Logo de seguida partimos para executar as primeiras acções de patrulhamento e emboscadas, até ao final da tarde do dia 19, sem que o IN se tivesse revelado.

Neste mesmo dia, provenientes de Bissau, chegam as 3 Companhias de Comandos Africanos e o Grupo de Marcelino da Mata (2).

Entretanto as 3 Companhias de Comandos Africanos formam também os agrupamentos seguintes:

-Agrupamento BOMBOX, do Tenente Comando Zacarias Saiegh, comandado pelo Cap Comando Matos Gomes;

-Agrupamento CENTAURO, do Tenente Comando Jamanca, comandado pelo Cap Comando Raul Folques;

-Agrupamento ROMEU, do Tenente Comando Quiseco, comandando Cap Paraquedista António Ramos.

Neste último estavam integrados também o grupo de operações especiais COE, com 25 elementos, comandados pelo Alfero Marcelino da Mata, assim como o Major Comando Almeida Bruno [, hoje general,] que era o comandante desta operação.

Os agrupamentos iniciaram o deslocamento apeado para a operação às 24 horas com intervalo mais ou menos de uma hora entre eles. Pelas quatro da manhã, inicia o seu deslocamento a CCP 121, com destino ao corredor que pretendia manter.

Entretanto ainda com os Paraquedistas dentro da área aonde pernoitámos, as forças do PAIGC atacaram o destacamento de Bigene com uma precisão incrível (não falhavam uma granada), obrigando-nos a sair em marcha acelerada desta zona.

É meu entendimento que foi um erro este ataque ter sido feito pelas forças do PAIGC, uma vez que as nossas tropas já se encontravam na zona, pelo menos o agrupamento que saiu em primeiro lugar deve ter referenciado o local de onde a flagelação estava a ser feita. O dia clareava e a tensão aumentava. Os homens dos agrupamentos estavam já dentro do Senegal, ouvíamos de vez enquanto o roncar de viaturas não muito longe, e o tempo passava sem que se ouvissem tiros ou explosões.

A informação que tínhamos era que esta base de Cumbamori servia de base de apoio aos guerrilheiros que sitiavam Guidaje e que atacavam as colunas que tentavam reabastecer o mesmo, tendo aí concentrados grande quantidades de efectivos das suas melhores forças, assim como de armamento.

Era aqui nesta base que se encontrariam os comandantes deste sector, Chico Té e Manecas, dois dos melhores e mais temidos, a par de Nino Vieira, comandantes do PAIGC.

Pouco passava das 8 horas quando se começam a ouvir o barulho de dois aviões bombardeiros FIAT G-91, acabando estes por bombardear o objectivo, atingindo alguns paóis e provocando varias explosões. Inicia-se então, a partir desta altura, o assalto pelas nossas forças dos Comandos Africanos do agrupamento BOMBOX, e depois pelos restantes agrupamentos.

Estes, pouco depois dos primeiros rebentamentos, entraram ao assalto tendo pouco tempo passado entrado em combate directo com as forças IN que se prolongaram até cerca das 16 horas .

Os comandos, durante os contactos que tiveram e conforme iam avançando, iam destruindo arrecadações de material de guerra de toda a espécie, debaixo de fogo intenso e quase ininterrupto. Foi uma luta encarniçada.

Não quero deixar de referir que, enquanto nos encontravamos emboscados próximos de uma picada, passaram várias viaturas blindadas tipo Panhards.

Por volta das 18 horas regressámos ao destacamento de Bigene, onde nem chegamos a parar, seguindo para Ganturé.
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Notas de L.G.:

(1) Vd. posts anteriores do Victor Tavares:

25 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1212: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (1): A morte do Lourenço, do Victoriano e do Peixoto

9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1260: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (2): o dia mais triste da minha vida


(2) Vd. post de 16 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXV: Antologia (16): Op Ametista Real (Senegal, 1973) (João Almeida Bruno)

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1315: Parabéns a você: Fazer anos no mato: os azares do meu amigo Tony Levezinho (Luís Graça)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Estrada Xime-Bambadinca > 23 de Novembro de 1969 > Na véspera dos seus 22 anos, o Tony Levezinho, furriel miliciano da CCAÇ 12, assiste, impotente, ao atascamento da autogrua Galion, que a Engenharia Militar mandou para Bambadinca... A solução foi passar a noite dos seus anos em plena bolanha ( de Samba Silate / Nhabijões, de má memória) a montar segurança ao monstro... (1)

Guiné > Zona Letse > Sector L1 > Bambadinca > Pelotão de Intendência > 1970 > A autogrua, Galion, a operar no cais de Bambadinca, no rio Geba Estreito. Foto gentilmente cedida pelo Luís Moreira, ex-Alf Mil Sapador da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72).


Foto: © Luís Moreira(2005). Direitos reservados.

Amigos & camaradas da Guiné:

1. Deixem-me hoje usar do privilégio de editor do blogue - do latim, priviligiu(m), de privus (privado, pessoal) + legem, lex (lei) > lei excepcional feita em favor de uma pessoa singular, um privado...

Refiro-me ao privilégio de (i) poder pôr entre parênteses o interesse colectivo da tertúlia, (ii) atrasar os ponteiros do relógio e (iii) abusar do meu tempo de antena - neste caso, de espaço de postagem - para fazer aqui uma homenagem a um amigo que hoje faz anos. O público e o privado não se devem misturar, mas acontece que o meu amigo também é camarada da Guiné e, mais do que isso, membro desta tertúlia. Convenhamos que não é dos mais activos (e, sobretudo, regulares), mas cumpriu as regras da praxe e figura, de pleno direito, na nossa fotogaleria.

Refiro-me ao António Levezinho (Tony, para os amigos). Faz hoje 59 anos (já lhe dei os parabéns pelo telemóvel) e vive, retirado, com a sua encantadora Isabel, na sua casa do Algarve, em Sagres. Ainda não fui lá visitá-lo, com muita pena minha e apesar da insistência dele. Sabem como é: as desculpas, estafadas, e sempre as mesmas, dos nossos desfasamentos de calendário, de agenda, das nossas vidas trocadas (uns que já se reformaram, outros que ainda trabalham).

Não me esqueço (nem eu nem o Humberto Reis) dos anos do nosso amigo Tony, não por que eu tenha a memória de elefante do Humberto, mas porque há 36 anos atrás, em 24 de Novembro de 1970, a folha do calendário dessa semana ficou para sempre impressa na matriz da minha memória...

Abreviando razões: houve uma sucessão de acontecimentos marcantes: (i) a 22 de Novembro de 1970, Conacri é invadida por forças anfíbias onde participam homens que nós conhecíamos há meses, e que eram nossos vizinhos (a 1ª Companhia de Comandos Africanos, com sede em Fá Mandinga, a Fá do Amílcar Cabral e do Jorge Cabral); (ii) nesses dias estivemos em estado de alerta e multiplicaram-se as acções de segurança e imediata, durante o dia e durante a noite; (iii) o Tony e o Humberto estiveram de serviço com o pelotão deles na Missão do Sono, em Bambadincazinha; (iv) os amigos mais próximos (ou os disponíveis) foram cantar-lhe os parabéns à meia noite, transportando com eles uma garrafeira ambulante; (v) a festa sobrou para a manhã seguinte: fomos todos (já não posso precisar quantos) a Bafafá, almoçar à Transmontana - um almoço bem regado, já que estávamos na fase do repouso do guerreiro...

O problema é que no dia seguinte, dia 25, pelas 7h da manhã, nós os três - eu, o Tony e o Humberto - mais outros 250 camaradas, estávamos a sair do Xime, para uma operação na área definida pelo Rio Geba- Rio Corubal-Buruntoni-Canhala... O resto já é sabido, está escrito no nosso blogue (2)...

De facto, foi a descida aos infernos do Xime... Regresso ao quartel, às 21h00, devido a dois casos de intoxicação alimentar, provocadas pelo mau estado das rações de combate (!), nova partida às 5h45 do dia 26, seguindo o mesmo trilho (!)... Cito a História da CCAÇ 12, de que eu próprio fui o relator:

(...) "Três horas depois, pelas 8.50h, já perto da Ponta do Inglês, o IN desencadearia uma violenta emboscada em L sobre a direita, precedida por um tiro isolado que foi confundido com um sinal de aviso duma eventual sentinela avançada, e que apanhou na zona de morte os 3 Gr Comb do Agr C [ CART 2715] e 1 Gr Comb (4º) do Agr B [CCAÇ 12].

"Os primeiros tiros do IN, especialmente de LRockets, atingiram mortalmente o picador e guia do Agr B, Seco Camará, que ia na frente, e os quatro homens que o seguiam, incluindo um graduado [furriel miliciano Cunha], tendo ferido gravemente outro. Com rajadas sucessivas de LRockets e armas automáticas o IN, fixando as NT, lançou-se ao assalto sobre os primeiros homens, mortos ou gravemente feridos, conseguindo apanhar-lhes as armas, e só não os levando devido a pronta reacção das NT.

"É de destacar aqui a acção heróica dos soldados Soares (CART 2715), que veio a ser mortalmente ferido, Sajuma (apontador de bazuca do 4º GR Comb/CCAÇ 12) que ficou ferido numa perna, e Ansumane (apontador de dilagrama, também do 4º Gr Comb/CCAÇ 12, ferido ligeiramente nas costas), que se lançaram ao contra-ataque, juntamente com outros camaradas e alguns graduados, a fim de quebrar o ímpeto do IN e de recolher os mortos e feridos.

"0 ataque durou cerca de 20 minutos, sendo a retirada do IN apoiada com tiros de mort 82 e canhão s/r que incidiram sobre a estrada, e especialmente sobre os 2 últimos Gr Comb (l° e 2º) da CCAÇ 12, assim como rajadas enervantes de pistola metralhadora, de posições que ainda não se haviam revelado, nomeadamente de cima das árvores" (...).

(...) "Em consequência da emboscada IN, uma das mais violentas de que há memória na região do Xime, pelo seu impacto sobre as NT, a CART 2715 [Xime] sofreu 5 mortos (l Furriel Mil) e 7 feridos, e a CCAÇ 12 teve 2 feridos (dos quais 1 grave, o Sold Sajuma Jaló), e 1 morto (o picador e guia permanente das NT Seco Camará, na altura ao serviço da CCS do BART 2917, e que do antecedente já tinha dado provas excepcionais de coragem e competência, tendo participado com a CCAC 12 em quase todas as operações a nível de Batalhão no Sector L1)" (...).

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 > 1970 > Furriéis Levezinho e Henriques, à civil... "Dois amigos para a vida"...


Foto: © António Levezinho (2006). Direitos reservados

2. Como se pode concluir, os aniversários do Tony (Levezinho), na Guiné - o 22º e o 23º - foram sempre celebrados em condições, no mínimo, insólitas. Eu Setembro do ano passado (1), eu tinha prometido reconstituir esses dias loucos (e trágicos) que se seguiram às copiosas celebrações do seu 23º aniversário (24 de Novembro de 1970, dois dias depois da invasão de Conacri e na véspera da Op Abencerragem Candente) ... Ainda não é desta, talvez por pudor, ou por falta de coragem...Mas as promessas são mesmo para se cumprir...

Hoje vou-me limitar a cantar-lhe os parabéns, em público, no nosso blogue, e dar-lhe aquele abraço caloroso de um "amigo para a vida"... As palavras são dele, extraídas de uma mensagem que ele me mandou já há tempos (11 de Maio de 2006) e que eu não publiquei na altura:

"Meu Velho AMIGO,

"Surpreendeste-me com o teu escrito a meu respeito (3), o qual me suscita o breve, mas muito sentido, comentário seguinte.

"Se por um lado tenho dúvidas quanto ao merecimento das palavras que usaste para a mim te referires, tenho, por outro, a GRANDE CERTEZA de nos podermos considerar DUPLAMENTE FELIZES, a saber: desde logo porque regressámos inteiros do pesadelo (isto apesar de, no meu caso, ter partido o polegar da mão esquerda, numa renhida partida de futebol na catedral de Bambadinca, conforme a foto com o Fernandes documentava); mas, sobretudo, por termos tido a oportunidade de trazer na bagagem AMIGOS PARA A VIDA.

"Mais do que qualquer recordação, mesmo daquelas, poucas talvez(?), que não pertencem ao rol das que se encontram arquivadas no cacifo da memória dosdias dramaticos que partilhamos, guardo daqueles tempos já distantes a plena convicção de que a minha (a nossa) guerra foi ganha, pelas amizades conquistadas.

"Por não ter dúvidas de ser este um sentimento comum de todos os tertulianos, aproveito para te FELICITAR e, ao mesmo tempo, AGRADECER (apesar da minha postura ser mais de voyeur) pelo empenho, trabalho, entusiasmo e muita qualidade que ao longo deste primeiro ano emprestaste a este ESPAÇO DE PARTILHA a que todos já nos habituámos, mesmo aqueles menos activos, como eu.

"BEM HAJAS. Tony Levezinho"

____________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 20 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CXCVIII: Recordar é viver ou...a memória de elefante do Humberto Reis (Humberto Reis / Luís Graça / António Levezinho)

(...) "Texto do Humberto Reis:


"(...) A Galion a carregar vacas no cais fez-me lembrar o episódio dela no percurso do Xime para Bambadinca. A Galion veio numa LDG [ Lancha de Desembarque Grande] desde Bissau até ao Xime. E daí para Bambadinca ia pelos seus próprios meios . Passou bem pelo destacamento da Ponte do Rio Undunduma, mas quando chegou a meio da bolanha a estrada não aguentou o peso e cedeu. Resultado, a Galion desequilibrou-se e ficou meio enterrada na bolanha. Julgo que isto se passou em Novembro de 69 (dia 24 ou 25 - aniversário do Tony). Tenho este episódio documentado mas, como era hábito naquele tempo, está em diapositivo" (...).

(...) "Comentário meu (L.G.):

"Humberto: O Tony diz que tu tens memória de elefante e eu rendo-me à evidência… Tu lembras-te de coisas do arco da velho que se passaram no cu de Judas… E se havia um sítio, no mundo, que podia ser o cu de Judas, a Guiné era seguramente esse sítio, esse buraco… Lá tudo se enterrava: na lama, no tarrafo, no rio, nas bolanhas e lalas, nas picadas, nos buracos das minas… E quase a sempre a cabeça... no chão! Até a mastodonte da Galion se enterrou no seu passeio do Xime a Bambadinca! (...).

"Texto do Tony (António Levezinho), também da CCAÇ 12:

"Que ninguém duvide! Na verdade o Humberto tem mesmo memória de elefante. Foi todo o dia 24 de Novembro [de 1969] (4) na tentativa desesperada de desatascar a Galion antes que a noite caísse. Os esforços revelaram-se infrutíferos e assim não tivemos outra alternativa que não a de convidar a mosquitada da bolanha a juntar-se a nós para comemorarmos todos (em silêncio, como a situação de emboscada impunha) o meu 22º aniversário.

"À falta de Champanhe serviram-se rodadas de Repelente que, a julgar pela sua ineficácia, funcionou como uma iguaria de entrada para os mosquitos, antes que estes chegassem à nossa pele, já depois de perfurarem até aquela capa de borracha que, creio, chamávamos ponche" (...).

(2) Vd. post de 25 Abril 2005 > Guiné 69/71 - VII: Memórias do inferno do Xime (Novembro de 1970) (Luís Graça)

(3) (2) Vd. post de 9 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXV: Amigos para sempre (Tony Levezinho, CCAÇ 12)

(4) Tony: eu acho que esse episódio foi na véspera dos teus anos, ou seja, a 23... Passaste a noite (de 23 para 24), emboscado, mas nesse dia, já ao fim da tarde ou à noite, ainda deu para abrir o espumante: vê a foto inserida no post de 20 de Setembro de 2005, referido em (1)...

Mas isso também não é muito importante: não usávamos calendário... Por outro lado, tens suficientes estórias da Guiné - umas mais divertidas,temerárias ou loucas, outras mais tristes e dramáticas - para contar ao teu primeiro neto que há-de nascer em Janeiro de 2007, que é o meu mês, e que há-de ser um gajo porreiro como o avô materno, um grande ser humano como tu... Não me leves a mal estas (in)confidências e esta intromissão na tua vida privada: o problema é que as nossas estórias - quando tínhamos 21, 22 e 23 anos - estão todas irremediavelmente entrelaçadas... Bom regresso à tua de Ponta de Sagres, onde final tudo começou: a aventura dos Descobrimentos, o princípio, o meio e o fim do Império...Irei lá, seguramente, um belo dia destes, beber um copo contigo e com a tua Isabel...

Guiné 63/74 - P1314: Estórias de Bissau (8): Roteiro da noite: NPR Orion, Chez Toi, Pilão (Paulo Santiago)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Saltinho > Sinchã Sambel > Fevereiro de 2005 > A viagem de todas as emoções, começada pelo Paulo Santiago em Fevereiro de 2005, continua no nosso blogue... Hoje, reconstituindo, por exemplo, um raide nocturno ao Pilão... Uma noite de copos em Bissau era um dos poucos luxos que um tuga , a caminho do mato, se podia permitir: não eramos santos nem heróis, também não eramos meninos de coro nem escuteiros... Tínhamos vinte anos, muita adrelina, muita vontade de viver e nenhuma de morrer... Em Bissau, longe do Vietname, como eu costumava escrever...no meu Diário de um Tuga (*).

1. Na minha companhia (a CCAÇ 12) tínhamos uma espécie de acordo tácito, nós, os milicianos e o sargento Piça, que nos arranjava a guia de marcha.

Todos os pretextos era bons, médicos ou não médicos, para se fugir do Vietname: o mais vulgar, era ir a Bissau mudar o óleo (sic), tratar dos dentes, arranjar os óculos, ir a um consulta hospitalar, marcar a tão sonhada viagem de férias à Metrópole, beber uns copos, comer umas ostras e uns camarões, enfim, espairecer as ideias… De quem andava por Bissau, assim sem destino, dizia-se que estava ou era desenfiado... A verdade é que não havia muito mais sítios para um gajo fugir à merda da actividade operacional...

Obrigado ao Paulo por esta estória de copos - que felizmente acabou em bem (afinal, eramos todos bons rapazes e não nos comportávamos como ocupantes...) - e sobretudo por nos reconstituir o roteiro de Bissau by night... Na Orion, nunca pus os pés, mas a chungaria do Chez Toi e a tabanca grande do Pilão tive que as conhecer... Aliás, para além das ostras, dos copos e das verdianas, o que é que havia mais em Bissau ? (1)... Seguramente, que muito mais: nós é que não tivemos tempo (nem imaginação) para o descobrir...

Os protagonistas desta estória são o Paulo e os seus amigos: o comandante Rita, da Orion; um tenente da reserva naval, Alves da Silva; o Martins Julião, nosso tertuliano, alferes da CCAÇ 2701; mais o Cap Tomás, ajudante de campo do Com-Chefe...

 Se quisermos, devemos ainda acrescentar à lista mais três figurantes: o automóvel da D. Helena (Spínola); um alferes em fim de comissão, o Domingos; mais um tenente dos comandos, o Oliveira... Como amigos que são (ou eram) do Paulo, não são (ou não eram) gente de cerimónia... Além disso, são pessoas públicas e o Pilão era o mais público dos sítios públicos de Bissau... Enfim, uma estória que, naquela época, bem se poderia ter passado em Lisboa, entre o Cais do Sodré e o Bairro Alto... Uma estória, em todo o caso, digna de figurar numa antologia (portuguesa) das crónicas dos bons malandros... (LG)


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Campo de futebol > 1971 > "Na foto junta, eu e o Tomás estamos bem direitinhos... era de manhã" (PS)... O Cap Tomás, de pingalim, está atrás de Spínola, a quem o Paulo Santiago bate a pala.

Foto: © Paulo Santiago (2006). Direitos reservados.



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Campo de futebol > 24 de Dezembro de 1971, vésperas de Natal > O Caco - alcunha por que era conhecido o Com-Chefe - passa revista. O Alf Santiago segue atrás com o Cap Tomás, ajudante de campo do general Spínola.

Foto: © Paulo Santiago (2006). Direitos reservados.




Guiné > Região de Tombali > Rio Cacine > 1971 ou 1972 > NRP Orion > O comandante Rita, "um grande homem, um grande comandante", na opinião de Pedro Lauret, oficial imediato da LFG Orion (1971/73). Na foto, vemos os dois na ponta do navio, a navegar no Cacine. O Cmdt Rita está em segundo plano. O Lauret segura os binóculos.

Foto © Pedro Lauret (2006) . Direitos reservados.


2. Continuação da série Estórias de Bissau (**)

Uma ida ao Pilão

por Paulo Santiago


Foi aí por volta de 30 ou 31 de Março de 1972 que os acontecimentos se passaram. Estava eu em Bissau, de passagem, para mais um mês de férias na Metrópole, embarcava no avião da TAP em 2 de Abril.

O NRP Orion (***) foi onde jantei naquela noite, a convite do Comandante Rita, sendo também convidado oTen RN [reserva naval] Alves da Silva, conhecido entre nós pelo petit-nom de Eduardinho. Não me lembro da ementa, mas foi excelentemente acompanhada pelos belíssimos néctares existentes na garrafeira daquele navio.

O Martins Julião estava em Bissau a chefiar a comissão liquidatária da CCAÇ 2701 [, Saltinho, 170/72]: sabendo que me encontrava a bordo da Orion, apareceu no fim de jantar, ainda a tempo de beber uns uísques.

Por volta da meia-noite, ou ainda mais tarde, resolvemos ir ao Chez Toi, um cabaré chungoso, o que se chama agora casa de alterne. Apanhámos um táxi no porto e lá seguímos para a má vida. O Rita, como habitualmente, ainda poderia beber mais uma garrafa nas calmas, eu, o Alves da Silva e o Julião já estávamos um pouco mal tratados. O cabaré estava repleto, já não cabia mais ninguém. Convencemos o empregado a trazer-nos uma Old Parr, mais quatro copos e ali ficámos encostados ao muro a dar conta da garrafa.

Subitamente chega um carro em alta velocidade, Peugeot 404 preto, que faz uma travagem maluca ali em frente, e donde sai o Cap Tomás, ajudante do Caco. Vinha bastante encharcado, mas deitou a mão à nossa garrafa bebendo uma boa golada. A única pessoa que ele conhecia bem era o Rita. Queria ir para as gaijas, não sei fazer o quê, naquele estado. Convenceu o Comandante e lá entrámos os quatro para o 404, era o carro da D. Helena [Spínola], onde o único meio sóbrio era o meu amigo Rita.

Seguimos em direcção ao Pilão, com o Tomás a fazer uma condução à maluca. Falou numa cabo-verdiana que nenhum de nós conhecia, que ficaria perto da casa da Eugénia, essa conhecia eu bem. Corremos imensas ruas e ruelas do Pilão, eram tantos os saltos que o carro dava que o Rita já dizia estar a apanhar mais pancada que numa tempestade no mar. A determinada altura, uma das rodas do carro cai num buraco com grande violência, ouve-se um barulho de latas e ficamos com menos luz. O Tomás pára o Peugeot e símos para verificar o sucedido. Com a pancada, um dos faróis saltara do encaixe, ficando virado para o solo, preso pelos fios de ligação.

Nenhum problema, continuamos às voltas, à procura das gaijas que nenhum conseguia dizer onde ficavam e o farol acabou por cair, ninguém soube onde. Aí pelas três da manhã, chegamos a um local do Pilão onde se encontrava um grande aglomerado de pessoas, em estado de grande exaltação. Paramos, saímos do carro e vemos no meio daquele maralhal o Alf Mil Domingos, de braço engessado ao peito, prestes a levar, na melhor das hipóteses, uma grande carga de pancada.

O Comandante Rita, graças à sua estatura, vai furando, connosco atrás até chegarmos
ao Domingos, também de cabeça perdida. O que se passara?
- O caralho do Oliveira trouxe-me para aqui, bateu à porta daquela gaja, ela diz que está ocupada, o cabrão manda um pontapé na porta, rebenta-a, a tipa grita, começa a juntar-se este maralhal e o gajo deixou-me sózinho.

Foi complicado acalmar aquela gente mas conseguiu-se. Foi mais um passageiro para o maltratado 404. O Tomás ficou no Palácio e, nós os cinco, viemos beber mais um copo ao Orion. O Domingos embarcava nessa manhã para Lisboa, em fim de comissão.

PS - O Oliveira era Tenente dos Comandos. Pertencera à 26ª e estivera em Fá com o Miquelina Simões a formar a 2ª CCA [Companhia de Comandos Africanos]. O Domingos fora Fur Mil na 4ª CCmds em Moçambique e Alf na 26ª, até apanhar uma porrada e ser transferido para Teixeira Pinto onde teve um acidente do qual resultou um braço partido. Tive com ele várias histórias.

Paulo Santiago
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(...) "Decididamente não queria falar-te de mulheres (e, muito menos, das brancas que, aqui, no cu do mundo, povoam os nossos delírios palúdicos)… Mas como não, se elas são o único antídoto contra a angústia da morte ?!... As paredes das nossas casernas no mato estão forradas de posters de gajas nuas, loiras, de olhos azuis, formas esculturais e pele acetinada, que é “para um gajo não se esquecer da carne branca” (sic)…
"Em contrapartida, a pomada antivenéria (e, claro, a penicilina, em doses de milhões) é o que mais se gasta nos nossos postos de caserna. O bordel é talvez a única instituição castrense verdadeiramente respeitável… Mas se os franceses mandavam para a Argélia putas de campanha juntamente com os seus legionários, nós, tugas, não temos esse problema: fornicamos sem preconceitos raciais, ou não fossemos “um país, muitos povos, uma só Nação”! (...).
18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1290: Estórias de Bissau (7): Pilão, os dez quartos (Jorge Cabral)

(***) Sobre a LFG Orion, vd. os seguintes posts:

31 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1267: Estórias de Bissau (2): A minha primeira máquina fotográfica (Humberto Reis); as minhas tainadas (A. Marques Lopes)


22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1202: Ganturé, Rio Cacheu, Maio de 1973 (Pedro Lauret)


5 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1151: Resposta ao Manuel Rebocho: O papel do Orion na batalha de Guileje/Gadamael (Pedro Lauret)


4 de OUtubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1150: Carta a Pedro Lauret: A actuação do NRP Orion na evacuação das NT e da população de Guileje, em 1973 (Manuel Rebocho)


2 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1143: Parabéns, comandante Pedro Lauret, é uma honra tê-lo a bordo (Paulo Santiago)


1 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1137: Do NRP Orion ao MFA: uma curta autobiografia (Pedro Lauret, capitão-de-mar-e-guerra)

Guiné 63/74 - P1313: Estórias cabralianas (14): Missirá: o apanhado do alferes que deitou fogo ao quartel (Jorge Cabral)

Guiné > Zona Leste > Estrada Xime- Bambadinca > 1969 > O Cap Carlos Brito, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71). Era uma um homem afável e civilizado no trato. Com os seus 37 anos, e três comissões no Ultramar, foi tão explorado pelo comando do Sector L1 como os seus milicianos e os seus soldados da CCAÇ 2590/CCAÇ 12. No final da comissão, lá ganhou, com justiça, os galões de major. Em Fevereiro de 1971.

Foi ele - o "bom do major Brito" - que avisou, no Xime, o Alf Mil Jorge Cabral, do Pel Caç Nat 63, da chegada do novo comandante do BART 2917, militarista, aconselhando-o a cortar as suíças farfalhudas que trazia das férias em Lisboa... Carlos Brito é hoje coronel: espero que ele esteja bem de saúde e que um dia destes ainda possa aparecer por aqui na nossa tertúlia... Revi-o apenas em 1994, em Fão, Esposende .(LG)

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.
Mais um short story (1) do nosso amigo e camarada Jorge Cabral (ex-Alferes Miliciano de Artilharia, comandante do Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71.


Calores femininos, fogo em Missirá

por Jorge Cabral

Julgo que aconteceu em Março [de 1971]. O dia decorrera em Alegria. Chegara a Missirá uma arca frigorífica a petróleo, oferta do Movimento Nacional Feminino (2), e cedo começaram as libações.

Seriam três ou quatro da manhã, sou abruptamente despertado. Tiros (?). Rebentamentos (?). Fogo! Saio do abrigo nu, e deparo com meio quartel a arder.

Ataque nunca podia ser! O Tigre já estava na Metrópole, Missirá era agora um oásis de paz, vigorando um tácito pacto de não-agressão (3).

Tinha sido a arca… Incendiando-se, provocara a explosão das latas de conserva e das garrafas, e por simpatia, das munições e das granadas, que se encontravam na arrecadação, contígua à cantina.

Alvoraçou-se Bambadinca. Recebi logo uma mensagem a prometer ajuda. E respondi: "Intensidade dos calores femininos arrasaram sólidos e líquidos. Reforços sim, mas bebíveis”. Não sei o que terá pensado o Polidoro Monteiro (4).

Creio, aliás, que uma empatia mútua se havia estabelecido, quando nos conhecemos, em Fevereiro [de 1971].

Chegara de férias e no Cais do Xime, o bom do Major Brito (5) avisara-me:
- Temos um novo Comandante, muito militarista. Não se apresente assim.- É que eu deixara crescer umas farfalhudas suíças que se uniam ao revirado do bigode. Por precaução fui ao quartel do Xime rapar a cara.

Entretanto a Coluna partiu…Meti-me ao caminho a pé, de farda de passeio e com uma mala na mão. Depois de Amedalai, encontrei um ciclista transportando uma velha e duas galinhas, a quem pedi boleia. E assim, tal como na história do velho, do rapaz e do burro, nos fomos revezando, entrando porém em Bambadinca todos na bicicleta, mais as galinhas, cena que foi presenciada pelo Polidoro, que já havia sido alertado para o meu desaparecimento.

Julgo que o Comandante, naquele momento, terá concluído pela impossibilidade de me recuperar, mas o certo é que o meu bizarro comportamento durante os últimos seis meses, foi por ele sempre tolerado.

... O impacto do ataque e do fogo, ou a estranheza da mensagem, chegou a Nova Lamego, e logo na manhã seguinte poisou em Missirá um helicóptero. O Coronel, Comandante do CAOP 2, vinha inspeccionar. Perguntou-me quanto tempo levava de comissão, na altura vinte e dois meses, se tinha problemas com as cargas, e afiançou-me ser impossível uma arca incendiar-se. Claro que instaurou o competente processo de averiguações e o boato correu: havia um alferes tão apanhado que deitou fogo ao quartel.

A minha inocência era, porém, óbvia!

- Apanhado, sim e sempre, mas nunca irresponsável - concluiu mais uma vez S. Polidoro.

Jorge Cabral

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Nota de L.G.:

(1) Vd. último post da série,28 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1128: Estórias cabralianas (13): A Micá ou o stresse aviário (Jorge Cabral)

(2) Sobre a história do Movimento Nacional Feminino (que era muito gozado pela tropa), vd. depoimento da sua fundadora e líder, a Cecília Supico Pinto.

(3) Tigre [de Missirá]: referência à alcunha do Alf Mil Beja Santos, comandante do Pel Caç Nat 52, que regressou à Metrópole, depois de acabada a su comissão, antes de finais de 1970. O Pel CaçNat 63, comandando pelo Jorge Cabral, esteve em Missirá posteriormente.

(4) O último comandante do BART 2917 , sedeado em Bambadinca (1970/72). Spinolista, era considerado um oficial superior que gozava de respeito e prestígio entre os milicianos e as praças... Infelizmente já não está entre nós, ao que me disseram alguns membros da nossa tertúlia.

(5) O "bom do major Brito", em Fevereiro de 1971, só podia ser o antigo capitão Carlos Brito que comandou a CCAÇ 12 durante a nossa comissão (Maio de 1969/Março de 1971)... Ele foi promovido a major ainda no nosso tempo, - penso que justamente em Fevereiro, na altura da chegada, ao BART 2917, do tenente-coronel Polidoro Monteiro - e provavelmente ficou mais uns tempos em Bambadinca. Nós, milicianos e especialistas, fomos todos rendidos individualmente... De facto, não tenho ideia de o Major Carlos Brito ter embarcado connosco, no Uige, no regresso da casa...

Guiné 63/74 - P1312: Ponte dos Fulas: Estão ali uns gajos que me querem matar (Joaquim Mexia Alves, CART 3492)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xitole > Destacamento da Ponte dos Fulas > CART > 1970 > Uma coluna logística, vinda de Bambadinca, passa pela Ponte dos Fulas, sobre o Rio Pulom, a caminho do Xitole (CART 2716, 1970/72).

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.













Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xitole > Destacamento da Ponte dos Fulas > CART 3492 > Março de 1972 > Aqui viveram o Alf Mil Mexia Alves e os homens do seu Gr Comb durante várias semanas... Este como muitos outros destacamentos e aquartelamentos na Guiné seguiam um plano de construção e manutenção incrementalista: que cada unidade que por lá passava ia acrescentando um bidão, uma vala, uma fiada de arame farpado, um telhado de zinco, uma mesa, um banco... Este destacamento era uma espécie de guarda avançada do posto administrativo, tabanca e aquartelamento do Xitole, bem como da ponte sobre o Rio Pulom, imprescindível para manter operacional a estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho. (LG)

Fotos: © Joaquim Mexia Alves (2006)


Texto enviado em 10 de Outubro de 2006, pelo nosso camarada Joaquim Mexias Alves, ex-alferes miliciano de operações especiais, que no período de Dezembro de 1971 a Dezembro de 1973 foi pertencendo sucessivamente à CART 3492 (Xitole / Ponte dos Fulas), ao Pel Caç Nat 52 (Bambadinca, Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e . por fim, à CCAÇ 15 (Mansoa ).


Caro Luís Graça: Anexo umas fotografias da Ponte dos Fulas (1), destacamento do Xitole.

Numa delas vê-se o torreão, à entrada da ponte, onde ficava sempre uma secção do Pelotão a montar segurança 24 horas.

Fui o primeiro da CART 3492, logicamente com o meu Pelotão, a ocupar este destacamento em Março de 1972.

Ao que sei, foi ali o primeiro ataque que o BART 3873 sofreu na Guiné, precisamente nesse mês de Março.

A coisa não teve muita importância, nem consequências, mas lembro-me de ter tido um pensamento estranho, mas muito realista, qualquer coisa como isto:
- Afinal é verdade! Estão ali uns gajos que me querem matar!!!

As condições de vida eram excelentes, como com certeza atestaram muitos dos nossos camaradas que por lá passaram.

Lembro-me sobretudo da bolanha em frente, com umas árvores, que me davam sempre a insegurança de saber que seria o local óptimo para uma flagelação ao destacamento.

Junto ao destacamento, do lado esquerdo da estrada, no sentido para Bambadinca, e para dentro da mata, tive uma forte emboscada que contarei noutra oportunidade.

Abraço do
Joaquim Mexia Alves

_________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 17 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLVI: De Lisboa para o Xitole, com amor (Humberto Reis)

(...) "Desde Novembro de 1968 a Agosto de 1969, o itinerário Bambadinca-Xitole esteve interdito. Nessa altura, uma coluna logística do BCAÇ 2852, no regresso a Bambadinca, sofrera duas emboscadas (uma das quais, a primeira, com mina comandada), a cerca de 2 km da Ponte dos Fulas, na zona de acção da unidade de quadrícula aquartelada no Xitole (CART 2413). A coluna prosseguiu com apoio aéreo.

"Nove meses depois, a 4 de Agosto de 1969, a CCAÇ 12 participou na reabertura desse itinerário, que era absolutamente vital para as NT (aquarteladas em Mansambo, Xitole, Saltinho...). Na Op Belo Dia, participou o 2º Gr Comb da CCAÇ 12 (o pelotão do Humberto Reis e do Tony Levezinho) com forças da CART 2339 (Mansambo) - a que pertencia o Carlos Marques dos Santos - formando o Destacamento A. Nessa operação, não foram encontradas minas nem abatizes no itinerário mas o IN emboscou 1 Gr Com do Dest B, constituído por forças da CART 2413 do Xitole, na Ponte dos Fulas, quando as NT estavam a reabastecer-se de água (...).

Comentário do David J. Guimarães (ex-furriel miliciano da CART 2716, aquartelada no Xitole (1970/1972), e pertencente ao BART 2917, sediado em Bambadinca, cometado uma das fotos do Humberto Reis:

" (...) Efectivamente lá ao fundo da fotografia vê-se bem o Fortim, junto à ponte, e em cima dela pelo que vejo é a primeira viatura militar que está na foto.

"[Essa] fotografia foi tirada do ponto mais alto do destacamento da Ponte dos Fulas. Quem tirou a fotografia [o Humberto Reis] tinha um abrigo à sua esquerda e mais atrás o local onde comíamos, reuníamos, limpávamos armas, conversávamos, etc. Era um coberto ao ar livre...

"(...) A estrada passava pelo meio deste acampamento onde nós só estávamos para guardar a ponte sobre o rio Pulom (Ponte dos Fulas). Era um local isolado. Tínhamos um bem: não saíamos em patrulhamento.

"Tínhamos montadas duas Metralhadoras Pesadas Bredas .. Uma dentro do Fortim e outra bem cá em cima junto ao coberto acima referido ... Essa estava apontada para a zona do Xitole, que distava 3 Km dali....

"Foi aqui que comecei a minha comissão no mato, pois o 3º Grupo de Combate a que eu pertencia, foi por sorteio o que calhou ir para ali ao 3º mês... De notar que os Morteiros do Xitole também protegiam aquela zona, estando perfeitamente com orientações para aquela direcção - bem mas isso era com os tipos das armas pesadas. Nunca tivémos ali nenhum ataque e ainda bem, senão tenho a sensação de que estaria aqui a contar outra história ou como ex-prisioneiro ou então... estaria com o Cunha, agora, no outro mundo...

"As colunas para nós eram um espectáculo mesmo (2)... Não mais que isso, pois nada fazíamos senão vermos a passar os carros todos para um lado e, depois ao fim da tarde, para o outro ... Até ao próximo mês... E lá ficavamos nós na Ponte dos Fulas... No meio do silêncio da savana. A beber uns copos, claro...

"Diariamente do Xitole deslocava-se lá um Pelotão que nos ia levar géneros ao almoço e ao jantar... Note-se que tinhamos a noção exacta de que a área circundante e a zona entre o Xitole e a cerca deste destacamento - eram terra de ninguém onde o IN andaria mais ou menos à vontade...

"O único civil que lá recebíamos era o Mamadu, um pescador, bom homem, bem alto ... e que já morreu".

(2) Vd. posts de:

20 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XXII: O inferno das colunas logísticas na estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole-Saltinho (Luís Graça)

11 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXX: As heróicas GMC e os malucos dos seus condutores (CCAÇ 12, Septembro de 1969) (Luís Graça)

quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1311: Um hotel de muitas estrelas chamado Mansambo (Carlos Marques dos Santos / Henrique Cardoso, CART 2339 )

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Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 > Abril de 1968 > Fase de construção do aquartelamento (que o PAIGC, através da rádio Conacri, chamava campo fortificado de Mansambo) (1)...Os Alferes Milicianos Cardoso e Rodrigues apanham banhos de luar...
Foto: © Henrique Cardoso / Carlos Marques Santos (2005)

1. Texto de Carlos Marques dos Santos
Citando L.G.:

Não me fales em PCV (Posto de Comando Volante) que eu tenho más recordações desses objectos voadores não-identificados...Tenho sempre a sensação que os turistas que iam lá em cima, no bem-bom da DO27, se riam de nós que nem uns perdidos, da tropa-macaca que andava cá por baixo, aos ziguezagues como baratas tontas... (2)

Luís:

Em relação a esta tua nota, tenho a dizer que, e ainda bem, houve um comandante da minha Companhia, a CART 2339, que ignorava liminarmente tudo o que viesse do ar. Bem bastavam os turras saberem que nós lá estávamos, por causa daqueles PCV (pseudo comandos voadores).

Cá em baixo era outra guerra e tu sabe-lo bem.

Ficção!... A realidade, dura e crua, foi a nossa juventude perdida.

2. Alferes Cardoso e Rodrigues, num hotel de muitas estrelas chamado Mansambo...

A propósito!... Sabem onde foi tirada esta foto?

Em Mansambo, a céu aberto. Camas de ferro nos fossos que iriam ser o aquartelamento fortificado de Mansambo. Data: Abril de 1968.

A foto é do Henrique Cardoso, alferes da CART 2339 e seu comandante.

Os 3 Capitães, que comandaram a Companhia anteriormente estiveram sempre doentes !!! Ele assumiu o comando. Era miliciano e responsável.

Podes publicar, se quiseres. O Cardoso autorizará. Tenho o seu aval.

CMSantos
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Nota de L.G.:

(1) Vd. posts de:
28 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - CCCXCIX: Mansambo, um sítio que não vinha no mapa (1): a água da vida (Carlos Marques dos Santos)

(...) "Temos mais um tertuliano, na recta final do ano de 2005: é o Marques dos Santos, de Coimbra, ex-furriel miliciano da CART 2339 (Mansambo, 1968/70) , afecta ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). Esta unidade foi rendida pela CART 2714 (1970/72)" (...).

29 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - CD: Mansambo, um sítio que não vinha no mapa (2): as CART 2339, 2714, 3493 e 3494 (Manuel Cruz / Carlos Marques dos Santos)

(...) No post anterior, de 28 de Dezembro último, publicámos duas fotos relativas aos trabalhos de construção do aquartelamento de Mansambo, a cargo da CART 2339 (1968/70). Essas duas primeiras fotos são um hino à vida: (i) a abertura de um poço e a instalação da motobomba; (ii) os chuveiros e a alegria da água correndo sobre os corpos sedentos e sujos" (...).

30 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - CDI: Mansambo, um sítio que não vinha no mapa (3): Memórias da CART 2339 (Luís Graça / Carlos Marques dos Santos)

(...) "Excertos do Diário de um Tuga (L.G.): Mansambo, 17 de Setembro de 1969: Uma clareira aberta no mato a golpes de catana e de motosserra, guarnecida de arame farpado, artilharia e abrigos-casernas à prova de canhão sem recuo, eis Mansambo.
"Os guerrilheiros chamam-lhe campo fortificado mas como este aquartelamento de mato há muitos – dizem-me – sobretudo no sul, e que são verdadeiros abcessos de fixação" (...).

(2) Vd. post de 23 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1306: Meia Onça, Meia Operação (Carlos Marques dos Santos, CART 2339)

Guiné 63/74 - P1310: Postais Ilustrados (12): Ponte-Cais de Bissau e estátua de Diogo Gomes (Tino Neves / Carlos Fortunato)

Guiné > Bissau > Ponte-Cais > 1969 > Postal Ilustrado, edição Foto Serra.


Foto: © Tino Neves (2006).

Giné > Bissau > 1969 > Estátua do Navegador Português Diogo Gomes, junto à ponte-cais. Foi através do sítio do Carlos Fortunato - CCAÇ 13, Leões Negros - que descobri de quem era a estátua postada frente ao cais... Pela pose só poderia ser de um navegor português... Neste caso, Diogo Gomes...


Foto: © Carlos Fortunato (2006) (com a devida vénia...)

Continuação da série Postais Ilustrados (1).


Desta vez, foi o Tino Neves (Nova Lamego, 1969/71) (2) quem me mando, entre outras imagens, este postal ilustrado da Ponte-Cais de Bissau (Edição Foto Serra, Bissau, 1969)...

Sobre Diogo Gomes, pode ler-se o seguinte no Portal da Marinha Portuguesa > N. E. Sagres > Na rota de Álvares Cabral:

"Diogo Gomes era moço da câmara do infante D. Henrique e foi também seu navegador. Para além de uma viagem à Madeira, terá participado, com Gil Eanes e Lançarote, na expedição militar à ilha de Tider.

"Numa navegação efectuada em 1456 esteve na embocadura do rio Grande (actual rio Geba, na Guiné) e terá, no regresso, subido o rio Gâmbia até Cantor, onde obteve as primeiras informações sobre as explorações mineiras no Senegal e Alto Níger, bem como acerca das rotas saharianas do ouro e do importante entreposto comercial que era Tombuctu.

"Provavelmente, no regresso desta viagem, acompanhado pelo navegador genovês Antonio da Noli, terá descoberto e desembarcado nas ilhas orientais do arquipélago de Cabo Verde, como ele próprio afirma na sua Relação. Em 1459/60 voltou à Guiné e explorou a região do rio dos Barbacins. No regresso de uma destas viagens poderá ter descoberto as ilhas Selvagens".

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 13 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1273: Postais Ilustrados (11): Um típico e colorido mercado onde as mulheres é quem mais ordenam (Beja Santos)

(2) Vd. post de 3 de Outubro de 2006:Guiné 63/74 - P1146: Constantino Neves, ex-1º Cabo Escriturário da CCS do BCAÇ 2893 (Lamego, 1969/71)

Guiné 63/74 - P1309: Verdi a régulo do Cuor, já! (Torcato Mendonça)

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Guiné-Bissau > Região Leste > Bambadinca > Missirá > 1970 > Pelotão de Caçadores Nativos 54... "Antecipo o que naquela noite, lá pelas duas horas, aconteceu. Um deslumbramento. Ouve-se forte barulho de vozes, de cânticos. Levantam-se os militares. Com olhares extasiados (...)" (TM)


Foto: © Mário Armas de Sousa (2005). Direitos reservados


Escreve-me, o fim da tarde de ontem, o Torcato Mendonça esta nota, com bonomia, sabedoria e humor:

Luís Graça:

Leio certos textos e, apesar de gostar, sinto que... não foi aquela a minha guerra.

Comento com o C. M. dos Santos, por telemóvel ou escrito. Há dias ele pedia-me para eu falar de certos assuntos. Curiosamente respondi-lhe:
- Só falado...

E o Beja Santos escreve aquele e-mail. De facto nem tudo se diz (1). Mas a História tem que ser feita: Em verdade. Os cronistas do reino finaram-se.

Li a visita do Ten-Cor Pimentel Bastos ao Cuor (2). Em Mansambo foi recebido como as imagens documentam. Dissemos-lhe:
- Viver assim é muito duro! - As imagens atestam-o.

Dedilhando a tecla, sem interesse nem intenção de enviar, acabei por escrever esse texto em anexo... Não é crítica a nada nem a ninguém. A vida da [CART ] 2339 foi dura para todos nós...

(i) Foi a intervenção – conhecíamos bem o Mato Cão e Enxalé e a última operação foi a poucos dias do embarque;

(ii) Foi a construção do quartel...

(iii) Foram as autodefesas...Foi... E ponto final.

Leio textos de gente que passou bem pior. Era a guerra!

Depois escrevo.

Um abraço,
Torcato Mendonça

Verdi a Régulo do Cuor

Antecipo o que naquela noite, lá pelas duas horas, aconteceu. Um deslumbramento.
Ouve-se forte barulho de vozes, de cânticos. Levantam-se os militares. Com olhares extasiados, a que assistem?

Vestidos de deslumbrantes fatos, seis escravos - Fulas claro - com os corpos reluzentes pelos finos óleos neles passados. Seguram, apoiando nos fortes ombros, um doirado andor. Escravas fulas, belas nos seus trajes, ladeiam-no, seis de cada lado. Seguram varas de rico pálio, em damasco e debruado a oiro. Verdi, sentado naquele andor, sorri deslumbrado.

O Régulo do Cuor segue á frente de enorme séquito. A ladeá-lo virgens empunhando archotes. Jovens cantores entoam cânticos em honra de Verdi.

A tudo, de cuecas, a maioria, assistiam atónitos os militares.

Pára o séquito. Rebentam cascatas de luz – género S. João do Porto (visto do lado de Gaia).

Acordo e grito:
- Que raio de guerra é esta? Eu nunca lá estive.

Os Deuses devem estar loucos. Nunca! Eles nunca estão loucos. Eu é que estou. O que li não está escrito. Sonhei ou, na minha loucura, não leio lendo. Melhor, junto letras e fantasio textos.

Calmamente sinto que vou adormecer. Lá muito ao fundo, ouço acordes de La Traviatta. À volta do leito, duas de cada lado, quatro escravas empunham enormes leques de plumas de Aves do Paraíso. Uma suave brisa envolve-me.

Eunucos… Paro…

- EU NÃO ESTIVE LÁ !!!

Grito:

- VERDI A RÉGULO DO CUOR JÁ!

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 23 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1308: Doces mentiras, amargas verdades (2): as nossas (in)comunicações (Beja Santos)


(2) Vd. post de 22 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1304: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (21): A viagem triunfal do Pimbas a terras do Cuor

Guiné 63/74 - P1308: Doces mentiras, amargas verdades (2): as nossas (in)comunicações (Beja Santos)

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Guiné-Bissau > Cacheu > Barro > 1968 > Feliz Natal..."Este é mais outro aerograma que descobri. Mandei-o, pelo Natal, em 1968. O que eu quis transmitir é que eram natais de morte e que o que procurava era esquecer, dando de beber à dor".

Aerograma:"Querida irmã e cunhado, um Natal feliz e que o Ano Novo seja sepre melhor que o anterior. António Manuel... Uma ginginha!.. Pois dar de beber à dar é o melhor"...

Foto: © A. Marques Lopes (2005)


Texto do Beja Santos:

Caro Luís, caros tertulianos, só a título excepcional é que contamos uma versão integral, sincera e cabal de acontecimentos, em contexto bélico ou fora dele. Todos nós recebemos instruções para nunca falar da guerra, a quem quer que seja. O aerograma era só para mandar cumprimentos e expressar seráficos estados de alma.

Nunca respeitei esta fórmula e desobedeci através de inúmeros expedientes. À minha namorada contei sempre tudo e quase diariamente. O tudo era a meus olhos aquilo que a podia interessar quanto a uma vida que não se podia acompanhar. Daí falar-lhe de um quartel que ardia e se reconstruía, do estado de saúde dos outros, das vitórias em alcançar bem- estar para a comunidade, etc. Eram um tudo a meus olhos genuíno e que, compreensivelmente, só pedia a contrapartida afectiva.

Este diário é tão importante que sem ele se teriam perdido episódios que hoje me catapultam para escrever a realidade/ficção Operação Macaréu à Vista (1). Reduzi ao limite as doces mentiras e as meias verdades: nunca dilatei a descrição das flagelações, emboscadas, minas, mortos, estropiados e feridos ligeiros. A minha comunicação era a melhor relação possível sem sobressaltar até à dor irrepremível quem me lia, fosse qual fosse a graduação do afecto. Aliás, nós precisávamos do nosso quinhão de doces verdades e doces mentiras, era o embalo para os melhores dias de que todos suspirávamos. Ninguém projecta o dia de amanhã sem algumas ilusões e quimeras.

Obviamente que fui mais cuidadoso com a minha Mãe e outros familiares. Com os amigos, joguei sempre na autenticidade, mas procurando não os consternar com matérias que para eles eram totalmente incompreensíveis. Quando o meu querido amigo Carlos Sampaio foi para o Norte de Moçambique, em 1969, as nossas cartas eram bem verdadeiras, ali não havia nada que eu quisesse esconder, exigia a interlocução frontal. O mesmo procurei fazer com os meus antigos soldados da CCAÇ 2402, a que pertenceu o Raúl Albino (2). Mas conheci sádicos, ou talvez pessoas muitíssimo doentes, que pormenorizavam todas as situações ou, pior ainda, falavam de um mundo que não existia, refugiando-se na banalidade de um quotidiano em algodão de rama.

Considero que a nossa correspondência é fundamental para a história da guerra colonial e porventura mais significativa que a maior parte dos relatórios das operações, onde tantas vezes se mentia deliberadamente ou se atribuia importância ao insignificante . O essencial no nosso correio, como diria o poeta, era dizer: Meu amor estou bem e, acima de tudo, tu estás a receber uma carta de quem precisa do teu carinho.

Cumprimentos do
Mário Beja Santos.
__________

Notas de L.G.:

(1) Vd. último post, de 22 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1304: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (21): A viagem triunfal do Pimbas a terras do Cuor

(2) Vd. post de 15 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1282: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (1): duas baixas de vulto, Beja Santos e Medeiros Ferreira

Guiné 63/74 - P1307: Doces mentiras, amargas verdades (1): Estou bem. Até ao meu regresso (Carlos Vinhal)

Guiné > Bissau > Telegrama, enviado pelo Carlos Vinhal, à sua chegada, e recebido em Matosinhos, pelos seus pais, em 20 de Abril de 1970 (1)

Foto: © Carlos Vinhal (2006). Direitos reservados.

1. Há tempos lancei mais uma prov(oc)ação ao pessoal da nossa tertúlia:

Amigos & camaradas: Quais eram as doces mentiras, as meias-verdades, as falsidades, inocentes, abertas ou veladas, que mandávamos, por aerograma ou carta, aos nossos pais e familiares, às nossas namoradas ou mulheres, aos nossos amigos ? ... Para os tranquilizar, para que eles não tivessem que viver o nosso pesadelo... Alguém quer pegar neste mote ? O Carlos Vinhal deu o pontapé de saída...


2. Mensagem do Carlos Vinhal, com data de 6 de Outubro de 2006:

Caro Luís:

Se quiseres aproveitar para os nossos arquivos, junto envio o telegrama que deu a notícia aos meus pais de que eu tinha chegado bem (!) à Guiné.


Ex-Fur Mil Art Minas e Armadilhas
Nº Mec 19551569
CART 2732
Mansabá, 1970/72
Leça da Palmeira
Matosinhos
__________________

Nota de L.G.:

(1) Vd post de 18 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXI: Breve historial da CART 2732 (Mansabá, 1970/72) (Carlos Vinhal)

(...) "A CART 2732 foi constituída em 23 de Fevereiro de 1970, tendo como Unidade Mobilizadora a BAG 2, sita no Pico de S. Martinho, no Funchal, Ilha da Madeira (...).

"A maior parte do seu pessoal era originário da Ilha da Madeira, com excepção dos Oficiais, Sargentos e Praças Especialistas. Em 7 de Abril de 1970, a CART2732 recebeu o seu Estandarte.
"No dia 13 de Abril realizou-se no Cais do Porto do Funchal a cerimónia de despedida da Companhia. Ao acto estiveram presentes o Governador do Distrito Autónomo do Funchal, Coronel Braancamp Sobral e o Comandante Militar da CTI da Madeira, Brigadeiro Nascimento.

"(...) Sob o comando interino do Alf Mil Art Manuel Casal, embarcou nesse mesmo dia, cerca das 12H00, no navio Ana Mafalda (2), que largou pouco depois com destino à Guiné. No cais ficou uma multidão de populares, familiares e amigos dos militares, que ali se deslocaram para assistirem à cerimónia de despedida, embarque e partida da Companhia.

"A CART2732 desembarcou no cais de Bissau pelas 16H00 do dia 17 de Abril de 1970, ficando alojada em tendas de campanha no Depósito de Adidos" (...).

Guiné 63/74 - P1306: Meia Onça, Meia Operação (Carlos Marques dos Santos, CART 2339)

Guiné > Fá Mandinga > 1968 > Depois do ataque a Bambadinca, a 28 de Maio de 1968, o Gr Comb do Fur Mil Santos - Os Solitários - é destacada para defender a Ponte do Rio Undunduma (que o IN tentara dinamitar); lá viveu duas semanas em tendas de campanha; mais tarde é destacado para reforçar Fá Mandinga. Ei-lo aqui, em diligência...

Foto: © Carlos Marques Santos (2005)


Texto do nosso camarada Carlos Marques dos Santos, coimbrão, que foi furriel miliciano, de artilharia da CART 2339, Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69:

A Operação Meia Onça, que foi referida pelo Beja Santos (1).... Aqui vai o descritivo dessa operação inscrita no Historial da CART 2339


Operação Meia Onça
Iniciada em 13 de Outubro de 1968, às 18h00.
Duração: 2 dias.
Finalidade: atacar e destruir objectivos na região de Buruntoni – Baio.
Efectivos:

CART 1746 (Xime)
CART 2339 (Mansambo)
PEL CAÇ NAT 52 (Missirá)
PEL CAÇ NAT 53
1 Gr Comb CCAÇ 2401
4.º PEL ART

Desenrolar da acção:

A CART 2339 saíra de Mansambo em viaturas em 13 de Outubro de 1968, tendo recebido o PEL CCAÇ NAT 52 e o Gr Comb CCAÇ 2401 em Bambadinca.

AS NT seguiram para Taibatá onde se iniciou o movimento apeado às 23h00.

Os guias, logo de início, mostraram-se receosos, por causa do possível armadilhamento dos trilhos. Conduziram o Destacamento a corta-mato, mostrando-se confundidos e, em 14, às 2h30, o comandante da CART constatou que estava junto a Dembataco.

Instigando os guias, reiniciou-se o movimento constatando-se que às 4h00 se estava junto a Taibatá, ou seja, no ponto de início...

Esperou-se pelo nascer do dia e enviou-se um Grupo de Combate a Taibatá. Com uma mensagem para transmitir através de AN/GRC-9 deste destacamento em que se comunicava o sucedido.

Às 5h00 reiniciou-se o movimento.

Às 9h15 entrou-se em contacto com o PC no Xime, tendo informado do seu atraso. O PCV passou às 10h30, tendo-se ouvido a sua chamada mas não se obtendo resposta.

O PC deu ordem para continuar a marchar em direcção ao objectivo, o que se fez.
Às 13h15 as NT receberam ordem para regressar, chegando a Taibatá às 16h30, depois de terem constatado que não chegaram à nascente do Burontoni., mas sim do Gundagué.

O Destacamento foi recolhido em Taibatá, por viaturas, chegando a Bambadinca às 2015h.

PS - Não participei nesta operação pois tinha saído para férias, na Metrópole, a 4 de Outubro de 1968. Viajei no Boeing 707 – Algarve. Regressei a 10 de Novembro de 1968. A 11 houve uma operação à Ponte dos Fulas com muito, mas muito barulho. Também não estava lá ainda. Regressei a Mansambo a 13.

Comentário de L.G.:

Carlos: Quantas centenas - ou até milhares de quilómetros - não palmilhámos nós, nos penosos 21 meses de comissão ? Quantas dezenas de operações e de acções não fizemos nós, tão ineficazes e frustantes como a Op Meia Onça ? Quantas noitres, quantos dias ?... Infelizmente, operações mal planeadas, mal conduzidas!

Não me fales em PCV (Posto de Comando Volante) que eu tenho más recordações desses objectos voadores não-identificados...Tenho sempre a sensação que os turistas que iam lá em cima, no bem-bom da DO27, se riam de nós que nem uns perdidos, da tropa-macaca que andava cá por baixo, aos ziguezagues como baratas tontas...

Não me fales no Baio-Buruntoni, camarada... Ou melhor: diz-me que tudo isso não passou de um pesadelo, e que nunca aconteceu, e que nomes como Xime, Ponta Varela, Ponta do Inglês, Poindon, Gundagué Beafada, Biro, Galo Corubal, Seco Braima, Satecuta, Fiofioli, Mina, etc., nunca existiram, não existem, a não ser nas velhas cartas dos serviços cartográficos do exército colonial do tempo dos soldadinhos de chumbo e dos generais de opereta...

Obrigado, Carlos, por me teres lembrado que o Baio/Buruntoni fazia parte dos nossos percursos turísticos nos regulados do Xime e de Bissari, os pedaços de terra do Império que nos coube em sorte... (LG)
___________
(1) Vd. post de 14 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1276: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (20): A (má) fama do Tigre de Missirá em Bambadinca

"O Almeida [, cmdt do Pel Caç Nat 63,] respondeu descontraído:- Pá, eu não vou nada para Mato de Cão, eu vou para Missirá e tu vais para o Burontoni.
"Assim era, embora eu nada soubesse. Partimos para Missirá, alojei o pelotão do Almeida depois de lhe apresentar os meios de defesa, preparei 35 homens e nessa tarde apresentei-me em Bambadinca, tendo imediato pedido uma entrevista ao novo Major de operações, de nome Viriato Pires da Silva. Era um oficial extrovertido e com vozeirão:-Ah, quer saber o que vai fazer ao Burontoni, não é? Não se preocupe que daqui a um bocado vou fazer a apresentação da operação, espere um pouco. (...)
"Por volta das 6 e meia da tarde, teve lugar a apresentação da operação. Recordo que o Burontoni foi apresentado como um santuário quase inexpugnável, dotado do melhor armamento, bem posicionado dentro de uma floresta, o Baio, entre vários rios. Sei que ia dentro do destacamento A, seis pelotões, parámos em Amedalai, e em Taibatá partimos a corta-mato acompanhados por dois guias.
"Primeira surpresa: os guias informaram que não sabiam entrar na mata à noite, estavam desorientados. Irrompeu entretanto uma chuva torrencial, lá fomos a passo de caracol, de madrugada fez-se um alto para repouso e ao amanhecer continuámos a progressão. Talvez aí pelas 9 horas chegámos perto de um rio, o nosso guia disse que não podíamos passar não só porque o rio era profundo como tínhamos em frente uma ampla bolanha, havia que a flanquear dentro da mata.
"É precisamente quando estamos a entrar na mata do Baio que toda a floresta é sacudida de explosões. Parecia que uma aviação invisível lançava tapetes de bombas a 10 Km de distância. Pela rádio procurámos saber o que se passava e pouco depois a notícia chegou, estarrecedora: Mansambo estava a ser severamente flagelada. Ora toda a companhia de Mansambo estava nesta operação, o aquartelamento ficara entregue a milícias e à população civil. O estado de espírito da tropa era de cortar à faca. Do comando, por via aérea, chegou a ordem de retirar para Taibatá, o que veio a acontecer, e lá fomos a patinar na lama e depois regressámos a Bambadinca.
"Ainda hoje me interrogo sobre a forma como se preparou esta ida ao Burontoni, independentemente do triste acaso da flagelação a Mansambo, que marcou a corrente do jogo" (...).

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Guiné 63/74 - P1305: Blogoterapia (3): não fugi, não emigrei, ainda cá estou (João Carvalho)


Guiné > Canjadude > 1974 > O furriel miliciano enfermeiro Carvalho, da CCAÇ 5 - Os Gatos Pretos, Canjadude, 1972/74) com um guerrilheiro do PAIGC, equipado a rigor e empunhando um kalash...

Foto: © João Carvalho (2006)

Mensagam do João Carvalho, com data de hoje, que já circulou por e-mail através da tertúlia:

Olá a todos.

Peço desculpa pela a minha ausência na tertúlia. Espero voltar ao convívio.
Tenho cerca de 350 e-mails atrasados, ainda por ler.

Este e-mail destina-se só a avisar que ainda não desapareci.

Abraços para todos.

João Carvalho

Wikipedia - Guerra Colonial Portuguesa

Comentário de L.G.:

O João Carvalho é o nosso grande...wikipedista! Ele é um grande fã da Wekipédia, a enciclopédia livre, a maior enciclopédia do mundo. E está a fazer um trabalho notável, chamando a si a difícil missão de actualizar e enriquecer a entrada sobre a Guerra Colonial. A nossa Guerra Colonial. Em Português (1).

É um trabalho de formiga, de milhões de formiguinhas, em dezenas de línguas, incluindo a nossa. Não posso saber qual é contribuição específica do João, mas encontro nesta entrada sobre a Guerra Colonial algumas das suas marcas, incluindo fotos suas (2).

O João - nascido em Lisboa, a 23 de Junho de 1950, farmacêutico, de profissão - já chegou a administrador da Wiki.pt (que já tem cerca de 200 mil artigos!)... Como se pode ler lá no sítio, Administradores são wikipedistas que têm "direitos de operador de sistema (sysop)."

A Wikipédia atribui esse acesso "liberalmente a qualquer utilizador que tenha sido um contribuidor da Wikipédia durante algum tempo e seja geralmente encarado como um membro da comunidade conhecido e digno de confiança".

Os Sysops não gozam de nenhum privilégio especial, "são iguais a todos os outros em termos de responsabilidade editorial". Na prática são "utilizadores da Wikipédia a quem foram levantadas restrições de segurança e desempenho" relativamente a alguns funções do software, tendo já dado provas de confiança e idoneidade...

A entrada sobre a Guerra Colonial (ou outros temas relevantes da nossa história) espera o contributo de mais tertulianos... Aqui fica o índice do texto que está em permanente construção (mas que já faz parte da lista dos melhores artigos da Wikipédia em português):


1 Contexto político-social
1.1 Oposição
2 Antecipação casual
3 Conflito armado
3.1 Angola
3.2 Guiné-Bissau
3.3 Moçambique
4 A Organização de Unidade Africana
5 O fim da guerra
6 Consequências
6.1 Custos financeiros
6.2 Os veteranos de guerra
6.3 O 10 de Junho
7 Nas artes
7.1 No cinema
7.2 Na literatura
8 Ver também
9 Ligações externas
10 Bibliografia

... As únicas ligações externas (links) que, por enquanto, vêm no final do artigo são:

(i) o sítio do nosso amigo e camarada Jorge Santos (Guerra Colonial);
e (ii) os nossos Subsídios para a história da guerra colonial > Guiné (1963-1974) > Tertúlia

___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 17 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXVII: Pedido do João Carvalho, o nosso wikipedista

(2) Vd. post de 23 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXIV: O nosso fotógrafo em Canjadude (CCAÇ 5, 1973/74)