segunda-feira, 15 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5996: José Corceiro na CCAÇ 5 (6): Pânico no abrigo norte, crocodilo à vista

1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos -, Canjadude, 1969/71), com data de 5 de Março de 2010:

Caros camaradas Luís Graça, Carlos Vinhal, J. Magalhães
Boa tarde e bom fim-de-semana. É com gosto, que envio esta história, não apócrifa, onde exponho alguns dos meus pulsares e acontecimentos, do dia-a-dia em Canjadude, Guiné. Quanto à publicação da mesma, assim como à inclusão das fotos (embora referencie) coloquem no local que entendam, deixo ao vosso critério.
Um Abraço
José Corceiro


José Corceiro na CCAÇ 5 (6)

Canjadude, PÂNICO NO ABRIGO NORTE


Estarei certo se afirmar que,  nos dois anos e tal que passei na Guiné, na CCAÇ 5, em Canjadude, em situações normais, (excluindo doença ou descanso por trabalho nocturno) não me deitei na cama meia dúzia de vezes no período entre as 12.00h e as 15.00h, o chamado “almoço e dormir a sesta”, é um hábito que nunca consegui adquirir e nunca senti falta dele.

Nesse período do dia, (considerado de descanso) eu, se o tempo o permitisse, após o almoço era frequente ir até às rochas de Canjadude, que me ajudava a suavizar o desconforto da tensão do passar dos dias, alentando-me a escrever uns aerogramas, cartas, ou outras escritas que para mim eram essenciais. Era neste local de inspiração, expansão e tranquilidade, que eu amenizava a minha paz interior.

Foto n.º 1 > Corceiro numa das rochas do Aquartelamento de Canjadude.

Foto n.º 2 > Corceiro rocha do Aquartelamento de Canjadude. Posto de sentinela.

Foto n.º 3 > Rocha de Canjadude com posto de sentinela Norte/Nascente

Também, neste intervalo de tempo, apreciava sentar-me a ler um livro em cima do abrigo dos graduados, à sombra do embondeiro grande, onde se sentia o fluir duma brisa suave acariciadora e tonificante, que me reconfortava a animosidade para suportar a luta desta “puta” de vida, que aqui levava; por vezes, sentia um sopro denso, abafado e húmido, sufocante; outras vezes uma atmosfera carregada exalando um bafo áspero e cálido, que era peganhoso e melaço, grudava-se ao meu corpo e teimava em não se deixar limpar, mas a obrigação impunha-se e o meu dever era continuar e avançar.

Foto n.º 4 > Corceiro a ler livro em cima do abrigo de graduados

Encontrava amenidade ao ir até à Tabanca, ilusão de porta aberta que me deixava partir para a descoberta da terra da fantasia que eu sonhava, onde alguém por mim esperava. Envolvia-me com o seu povo, a tentar compreender e analisar os seus costumes, vivências e necessidades, que despertavam no meu íntimo, sentimentos consistentes de amizade e solidariedade. Compadecia-me ver aquelas criancinhas desnutridas, calmas e afectuosas, muito “barrigudinhas”, consequência do insuficiente e desapropriado padrão alimentar, associado à escassez de alimentos e à muita fome que por ali abundava, dava bem para compreender a luta pela sobrevivência destes meninos tão ”ventrudozinhos”.

Foto n.º 5 > Corceiro na Tabanca

Foto n.º 6 > Criança “Ventrudozinha” de Canjadude

Apresava-me, se o tempo estivesse nublado, logo de feição, para tirar alguma foto, porque nesta hora com o Sol a incidir na perpendicular e os raios UV na sua maior convergência, não era propício a fotos. (Atender, que estava equipado para auto-foto, pois tinha tripé, máquinas com disparador automático, o enquadramento e focagem fazia por estimativa).

Deleitava-me, nesta hora, ir até à bolanha para ter contacto de proximidade com as lavadeiras, apreciar a destreza e desembaraço com que amanhavam a roupa. Neste local, podia dar rédeas ao impulso de atracção e fascínio, que despertavam em mim aquelas humildes criaturas, com a sua postura e conduta despudorada, livre, sem preconceitos ou inquietude, face à indumentária usada, por vezes completamente nuas, sem manifestar grande inibição, estranheza ou retracção, provocados pela presença de estranhos. (A bolanha ficava a Nascente do Aquartelamento, fora do arame farpado, aí a uns 200m a 300m de distância.)


Foto n.º 7 > Azáfama na Bolanha de Canjadude

Na Bolanha, soltava e dava asas à minha imaginação e sentia-me como ave livre a esboçar, observando o pulsar da natureza a metamorfosear o milagre do seu ciclo de renovação de vida, cujo rejuvenescimento é consequência da concomitância dos factores, luz, calor, ar e enxurradas de água, que jorram de todas as nascentes a fertilizar e inundar os solos, que outrora estiveram ressequidos e encarquilhados, tornando-se agora manancial e fonte de criação, excitando o explodir e desabrochar espectacular, de tudo o que seja Biodiversidade (todos seres vivos e suas características genéticas).

É, a matização natural do equilíbrio da essência dinâmica, em transformação na Natureza!

Eu sentia-me escudado, rodeado de toda esta substância (formas de vida) que testemunhava o esplendor da vida, com toda a sua pujança e imperturbabilidade sinfónica, onde tudo se entrelaçava para criar e recitar uma ode à Mãe Natureza, e, tudo em conjugação, louvar a harmonia do Universo. Neste ambiente eu encontrava forças para me alicerçar e continuar na minha senda, para não me deixar arrastar para a trilha do desalento e do desânimo. Foi, escorando-me nestas observações, que o meu pensamento, depois de muito analisar pode vir a confirmar, que a incógnita que permanecia em mim, sobre os peixes da bolanha, não era um caso contra natura nem capricho de Deus Mitológico mas sim a consonância perfeita neste ecossistema (interacções entre seres vivos e o meio que habitam). Começou por ser para mim, um enigma, à luz dos conhecimentos que possuía, porque não conseguia encontrar justificação plausível que elucidasse esta minha cisma. Assim, a minha indagação persistia:

Como era possível o ciclo de vida do peixe da bolanha ter continuidade, neste nicho ecológico? (condições de habitat alimentação e comportamento)

Foto n.º 8 >Corceiro em Assimilação ao ver que na Bolanha resta um “charcozinho” de água.

Se ao chegar a época das secas, a água extingue-se na totalidade, na bolanha, deixando os leitos todos gretados e sôfregos de sede, coexistente, assiste-se ao definhar e desaparecimento de todo e qualquer peixe. Como entender, que ao chegar o ciclo das chuvas, que inundam de água o leito desidratado na Bolanha, a fogosidade volta e o peixe às molhadas aparece?! Até esclarecer, o que para mim foi mistério, e, deslindar tão natural questão, pois o âmago de toda a elucidação, estava na simplicidade de descobrir e perceber, que os ovos dos peixes, já fecundados, ficavam enterrados na terra, que servia de ventre na época da seca! Quando vinham as chuvas, a água era como o veículo do suporte fertilizante, que desencadeava a eclosão e desabrochar dos peixes na Bolanha no seu ecossistema, e ei-los a progredir para novo ciclo!

Foto n.º 9 > Corceiro em cima do abrigo de transmissões à volta com os seus enigmas.

O dia 8 de Novembro de 1969, vá lá o diabo saber porquê, o meu relógio biológico, neste dia, não me despertou para após o almoço ir para as rochas, Tabanca, ou Bolanha e fiquei no abrigo Norte, o meu hotel de 5 estrelas, todo refastelado no 1.º andar do beliche, esparramado na minha cama, descontraído e absorto a ler o livro – A Selva, do Ferreira de Castro -. Era perto das 13.30h, os alojados do abrigo estavam quase todos nas suas camas deitados, cada um a ruminar o seu abrolho, uns a cabecear, a sonhar, a ninar, a ressonar, a rosnar, outros a sonhar acordados, praticamente silêncio nocturno!

Eis senão, quando no meio deste sossego, agitando toda a tranquilidade, ouve-se uma voz aflita e horrorizada, dar um grito de alerta e perigo:
- Éi!!!!!… malta… um Crooocoodiiiloooo!!!!!…..

Tudo alarmado olha e fica apavorado, pois toda a minha gente vê um crocodilo dentro do abrigo!!!!!.. Entra tudo em pânico, cria-se ali colossal agitação e sobressalto, com a inesperada visão do arrojado e assustador visitante, ouvem-se gritos de alvoroço por todo o lado. Num abrir e fechar de olhos transforma-se o abrigo em abrupta balbúrdia, que mais parece uma capoeira, cujos galináceos se excitam e aterrorizam com a entrada duma raposa matreira, no poleiro. Os aquartelados das camas do rés-do-chão, do beliche, quais macacos trapezistas começam a trepar emaranhados, para as camas do andar de cima, para encontrar protecção e afastar-se do perigo de tão ameaçador intruso. Outros, pegam na G3, posição em riste, dedo no gatilho, enquanto outros, de granada numa das mãos e a outra orientada para argola da cavilha, preparam-se para o assalto final ao temível e tímido bicho. Este, por sua vez, tentava descobrir refúgio e ocultação, procurando alguma toca debaixo das camas onde se pudesse abrigar e aninhar. Eu, curioso e incrédulo, observo com olhar mais atento e vejo parte do bicho, pois era descomunal, certifico-me que já em tempos tivera, nas rochas, contacto com um irmão deste, em tudo igual, ainda que de tamanho inferior. Daí, o meu grito sedativo:
- Eih!!!… rapaziada, tenham calma, que o réptil é da família das Iguanas, é um lagarto,  não faz mal a ninguém…!

Mas, o meu alerta de apelação para amainar o rebuliço, não surtiu efeito nenhum, palavras caídas em saco roto, estavam todos tão apavorados que só viam ameaças e perigo de vida, causada pelo indefeso animal.
O espaço no abrigo era acanhadíssimo, pois havia beliches de duas camas dum lado e do outro, um corredor estreitíssimo ao centro. A falta de espaço, aliada ao desalinho e confusão no abrigo, provocaram uma desarrumação caótica, devido às deslocações das camas e ao desorganizar objectos que se apoiavam nestas. O bicho encurralado movimentava-se naquela anarquia sem que ninguém o conseguisse imobilizar.

Eu, ao ver que os meus apelos lenitivos entravam por uma orelha a 5km/h e saiam pela outra a 100km/h e ao constatar que ninguém conseguia infundir um pouco de calma naqueles desgovernados militares, fiquei receoso e inseguro, pois temia que a todo o momento rebenta-se ali uma granada, que estavam distribuídas e colocadas nos locais menos apropriados, ou que algum mais distraído, sentindo-se ameaçado começasse a dar tiro de rajada de G3. Ao ver-me envolvido em tamanha patacoada,  esgueirei-me dali, fui dar uma volta à Tabanca. Regressei passado meia hora, encontro o abrigo numa barafunda assustadora, até havia dificuldade para entrar, e, deparo-me com os meus haveres em displicência total, muitos deles caídos e espalhados pelo chão e o desgraçado do bicho já tinha sido sacrificado.

Logo depois de arrumar os meus objectos, que estavam num desmazelo de inspirar piedade, fui tentar investigar como chegou o “lagartão” ao abrigo. Consegui descobrir os últimos passos do atormentado animal, antes de se enfiar no corredor que o conduziu ao cadafalso.

Foto n.º 10 > Abrigo Norte pequena ideia como estavam as granadas acondicionadas objecto que caísse de cima podia “descavilhá-la”

Foto n.º 11 > Desarrumação de alguns dos meus pertences, na minha cama, devido à agitação com o “lagartão”.

Foto n.º 12 > Foto do lagarto que procurou refúgio no abrigo Norte. Tinha cerca de 2m de comprido a foto devido a ter sido tirada de longe não dá a real corpulência do animal. Lado direito é visível as pegadas do bicho.

Os répteis foram os primeiros vertebrados a libertar-se do meio aquático. São quanto à temperatura do corpo, devido ao seu sistema circulatório, ectotérmicos (calor vem de fora) isto quer dizer o seguinte: são animais que para regular (subir ou baixar) a temperatura do corpo, procuram ambiente adequado para equilibrá-la. Se têm o corpo muito quente, intuitivamente, acção de sensores, procuram sombra, se tem o corpo frio, procuram Sol, fonte de calor. Esta particularidade está definida no seu código genético e têm sensores que determinam o agir comportamental, mediante a temperatura do organismo.

O nosso “lagartão”, da ordem dos sáurios (esquamates), deve ter-se empanturrado de calor em cima de alguma rocha, (as rochas são concentradoras de calor e os répteis procuram-nas para se aquecer) às tantas, porque aqueceu excessivamente, teve necessidade de encontrar sombra para se refrescar, vai daí, deixou-se cair para dentro de uma das valas, (trincheira) que ia desde as rochas à porta do abrigo Norte. Sendo assim, entrou no corredor que o conduziu, sem pedir licença, à porta da forca. Foi uma aventura sem retorno para o nosso animal ectotérmico.

Na foto do lagarto, que tinha quase dois metros de comprido, à frente do lado direito, são visíveis as pegadas do lagarto que confirmam os passos até cair na vala. Depois de cair nesta, não tinha capacidade de sair pelos próprios meios, pois a vala tinha mais dum metro de profundidade e era estreita de paredes na vertical. (Esta foto, não dá a real corpulência do animal porque foi tirada de muito longe, para grande enquadramento e agora teve que ser reduzida)

A todos os tertulianos, um abraço.
José Corceiro
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5978: Mais casos de insubordinação no teatro de guerra: CCAÇ 5, Canjadude, 25 de Novembro de 1969 (José Corceiro)

Vd. último poste da série de > 28 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5906: José Corceiro na CCAÇ 5 (5): Primeiro ataque a Canjadude, o meu baptismo de fogo

Guiné 63/74 - P5995: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (12): Galinhas bem temperadas

1. Mais uma nota solta do nosso camarada Rogério Cardoso (ex-Fur Mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66), enviada em mensagem do dia 8 de Março de 2010.



NOTAS SOLTAS DA CART 643 (12)

GALINHAS BEM LUBRIFICADAS


A Cart 643 tinha pouco mais de um mês de Guiné e como já contei numa nota anterior, os homens estavam "instalados" num armazém junto ao cais em condições mais que precárias. Era sábado de Páscoa e o Comandante de Companhia, Cap Silveira, ordenou-me que com alguns voluntários, fosse para fora de Bissau às tabancas da periferia, desencantar pelo menos 70 galinhas, que seria meia para cada homem para o Domingo de Páscoa.

De manhã bem cedo lá estava eu com os galináceos, bem nos custou essa tarefa porque os nativos não as queriam vender, mas com a ajuda de um guia lá iamos conseguindo, duas ou três de cada sitio.

Para a matança e depenagem foi fácil conseguir mão de obra, o pessoal estava eufórico porque iria haver Rancho Melhorado em substituição da velha cavala, atum com "ciclistas", dobradinha Armur com feijão branco, ou pior.

A cozinha era ao ar livre, equipada com um caldeiro de ferro aquecido a lenha, galinha para dentro, tempero para cima e lá para o meio dia já cheirava, estando o pessoal já em fila de espera.

Começou a distribuição, notando nós que a soldadagem torcia um pouco o nariz. Havia um sabor esquisito que ninguém conseguia decifrar, estava intragável. O Sílvio Pereira, Ajudante de Cozinheiro, perguntou ao Adérito que era o Cabo do Rancho:

- Eh pá, temperaste as galinhas com que garrafão?

- Com este aqui ao lado.

No garrafão estava escrito: ÓLEO DE LIMPEZA N.º 1
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5976: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (11): Pilão, a visita obrigatória

Guiné 63/74 - P5994: Estórias avulsas (28): A minha viagem à Guiné-Bissau (José Casimiro Carvalho, Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAV 8350)

1. O nosso Camarada José Casimiro Carvalho (ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAV 8350 - 1972/74 -, e dos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11) - Gadamael, Guileje, Nhacra, Paúnca, enviou-nos a seguinte mensagem:
A minha viagem à Guiné-Bissau
Camaradas,
Vou regressar…
Àquele lugar místico.
Àquele lugar que de certa forma mudou a minha vida.
Sim! Pois é, foi, e será um tema sempre presente em todos (ou quase) os meus convívios (militares ou não).
Àquela terra que tanto me deu, e tanto me tirou, está enraizada na minha alma e no meu íntimo.
Nunca na minha vida me preparei tanto para uma viagem.
Não quero falhar em nada.
Não pode faltar o "rolo fotográfico".
Não podem faltar as baterias, as máquinas de filmar/fotografar, enfim tudo o que possa registar o meu regresso ao "CTIG" agora noutra perspectiva, numa perspectiva de conhecimento, reconhecimento e abraçar outra vez aquele povo.
Vou regressar…
Àqueles lugares que não me saem da cabeça, no bom e mau sentido, embora dê preferência aos melhores, claro…
Vou regressar…
Aos jubis, ás bajudas, aos homens e mulheres grandes, aos régulos, aos cipaios, aos fulas, futa-fulas, balantas, papéis, mandingas, manjacos, felupes, etc. etc…
Vou regressar…
Às mangas, aos ananases, ao caju, ao camarão, às ostras, às "picadas" (sem picar?), aos macacos (que queridos), aos camaleões, etc. etc…
Vou regressar…
Aos mosquitos, às más recordações, ao calor, ao suor, à sede (talvez), à nostalgia das noites de batuque em Guileje, às jibóias de Colibuia, às recordações do "volei" com o Vasco da Gama e os seus "Tigres", etc. etc…
Vou regressar…
E tentar não pensar em não voltar.
Vou pensar que se aquele povo gostar de mim como eu gosto dele, vão correr lágrimas, muitas lágrimas, talvez parecidas com as que me correm tremidas pela face abaixo e que me molham o teclado do computador, pois eu sou assim, tão guerreiro e tão lamechas.
Vou regressar… Povo da Guiné…
Vou regressar...


Um abraço,
José Carvalho
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAV 8350
(Cumeré, Gadamael, Guileje, Gadamael, Cacine, Prábis, Colibuia, Cumbijã, Nhala e Paúnca)
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

domingo, 14 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5993: Blogues que nos citam (3): Divagando - O Povo Português Vai Morrendo, de José Grave

1. Por sugestão do nosso camarada José Martins, e com a devida autorização de José Grave, Editor do Blogue Divagando, transcrevemos o seu poste de 29 de Janeiro de 2010 com o sugestivo título "O povo português vai morrendo".




O POVO PORTUGUÊS VAI MORRENDO

E já há muito tempo. De um blog muito interessante, dos ex-combatentes na Guiné, que os mais novos deveriam consultar para aprenderem, aqui, tirei a seguinte transcrição:

Não trouxeram o corpo do Viegas para Mansoa, meteram-no na urna e seguiu de barco para Bissau. Tenho sido eu a tratar das coisas dele, fui-lhe mexer na mala e fazer o espólio de todos os seus pertences para enviar à família. Possuía tão pouco, algumas quinquilharias e uma roupita tão pobre! O povo português vai morrendo, o nosso David foi apenas mais um.

Os ex-combatentes não foram bem ouvidos pelo país. E o país está hoje a pagar por isso. Claro que os políticos, jovens e ambiciosos, sem escrúpulos e sem convicções, não gostam dos ex-combatentes nem do que eles dizem. Nem querem saber do que eles sentem. Não percebem que os ex-combatentes sentem Portugal. Os soldados sempre lutaram para dar tempo e espaço à política, a fim de resolver os problemas.

Infelizmente os políticos, ou por incompetência ou por má-fé, ou ainda por estupidez, não resolvem. Sobretudo sempre tem faltado aos políticos, em Portugal e não só, a visão estratégica e geoestratégica para as boas decisões pacíficas e de desenvolvimento. Que tem de ser global. Até lá, até se atingir esse patamar, continuará a haver guerras, má distribuição da riqueza e muito sofrimento para muitas populações. Melhores políticos necessitam-se para este planeta. E novos modelos. Este modelo de democracia que se quer impor e dinamizar por todo o lado já provou que, facilmente, fica nas mãos de corruptos e vigaristas. Que depois manipulam as regras da democracia a seu belo prazer e impunidade. É um bug deste modelo de democracia, que permite a falha da segurança das regras e, como consequência, a minagem a partir do seu âmago.

Do excelente blog dedicado a António Quadros com link aí ao lado, remato com esta citação, de lá extraída, do post de 26/1/2010 :

Só o futuro tem realidade atêntica (sic), porque lhe fazemos face constantemente.


Comentário de CV:

Caros camaradas, imaginem aonde nos leva o link "aqui" do início do texto. Exactamente ao nosso Blogue e ao poste 3826* de António Graça de Abreu. Até a citação é retirada do seu livro "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura" inserta no mesmo poste.
O camarada José Grave desenvolve a partir dali a sua ideia quanto ao tratamento dado aos ex-combatentes da guerra colonial, seguindo-se uns considerandos de ordem política.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 1 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3826: FAP (3): A entrada em acção dos Strella, vista do CAOP1, Mansoa, Março-Maio de 1973 (António Graça de Abreu)

Vd. último poste da série de 28 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1789: Blogues que nos citam (2): Amante da Rosa ou a Geração das Flores da Revolução de Bissau

sábado, 13 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5992: Convívios (203): IV Encontro dos ex-combatentes da Guiné do concelho de Matosinhos, realizado no dia 6 de Março (Carlos Vinhal)

1. No passado Sábado, dia 6 de Março, realizou-se mais um Convívio dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos*.

Mais uma vez, graças à iniciativa de Manuel Ribeiro Agostinho, António da Costa Maria (ambos tertulianos do nosso Blogue), José Francisco Oliveira e Fernando Alves da Silva, o Encontro foi levado a efeito com a participação considerável de ex-combatentes e, pela primeira vez, com a presença de algumas senhoras.

A concentração, a exemplo do ano passado, teve lugar em frente do Edifício da Câmara Municipal, seguida da foto de família e deslocação para o restaurante, onde um delicioso almoço nos esperava.

Na mesa de honra esteve presente o Vice-Presidente da Câmara, Dr. Nuno Oliveira, que apesar de muito jovem, no uso da palavra, lembrou o esforço desta geração de matosinhenses que honrou a pátria e o concelho no cumprimento de uma exigente e perigosa missão de guerra. Fez saber que o Memorial aos mortos em campanha do concelho está em fase de acabamento e que vai ser inaugurado este ano num dos dias mais marcantes do calendário português, 10 de Junho.

Disse ainda, que a nível de concelho está previsto um monumento para lembrar aos vindouros que houve matosinhenses que participaram numa guerra desgastante que durou 13 longos anos, onde cerca de 70 jovens perderam a sua vida.
Que a nível de freguesia se há-de também perpetuar o nosso esforço, quer utilizando a toponímia ou pequenos memoriais em rotundas e/ou jardins.

Durante a tarde houve o habitual momento de fado, desta feita com fadistas convidados, dos quais destacamos a jovem Marisa Pinto, filha do nosso camarada Evaristo Pinto.

Seguem-se algumas fotos.

Foto de família dos participantes do IV Encontro dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos. Em primeiro plano, da esquerda para a direita: António Maria; Carlos Cardoso; Ribeiro Agostinho; Dr. Nuno Oliveira; José Oliveira; Silva e Silvério Lobo, ambos da Tabanca de Matosinhos

Dr. Nuno Oliveira, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos, no uso da palavra

José Oliveira e Ribeiro Agostinho, dois dos impulsionadores destes Encontros anuais

Nesta foto o nosso camarada Rui Rafael, um dos ex-prisioneiros do PAIGC libertados durante a Operação Mar Verde, em conversa com o Fernando Alves da Silva

Nesta foto, o pai de Álvaro Basto, o jovem senhor Rolando que acaba de completar 87 brilhantes anos, Marques Lopes e quatro das senhoras presentes: Eugénia, esposa de Marques Lopes; Fernanda, esposa de Eduardo Ribeiro; não se vê, mas a seguir está a Ana, esposa de Casimiro Carvalho; e de costas, Dina Vinhal

O nosso tertuliano Dr. Mário Bravo que se encontrou com outro dos nossos tertulianos presentes, o Carlos Azevedo, lembrando ambos velhos tempos em Bedanda

Aspecto do bolo comemorativo

Dina Vinhal, voluntária no corte e distribuição do bolo

Momento da actuação de Marisa Pinto, filha do nosso camarada Evaristo Pinto

Galhardete alusivo ao Encontro, concebido e oferecido pelo nosso camarada Fernando Alves da Silva

CV
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 27 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5896: Convívios (108): IV Encontro dos ex-combatentes da Guiné do Concelho de Matosinhos, dia 6 de Março de 2010 (Carlos Vinhal)

Vd. último poste da série de 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5975: Convívios (115): 32.º Convívio Anual da CART 2519 “Os Morcegos de Mampatá”, vai decorrer em 08 Maio 2010 - Odemira (Mário Pinto)

Guiné 63/74 – P5991: Iniciativas da ADFA em Lisboa (4): Vítimas de stress pós-traumático da Guerra do Ultramar - Rede Solidária (Luís Nabais)

1. Promovendo mais uma das iniciativas da ADFA (Associação dos Deficientes da Forças Armadas), recebemos esta mensagem do nosso camarada Luís Nabais, ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CCS/BCAÇ 2885, Mansoa 1969/71, com data de 8 de Março de 2010:
Vítimas de stress pós traumático da Guerra do Ultramar Rede Solidária
Camaradas, Queria tornar público, junto dos ex-Combatentes mais vitimados pelas vicissitudes da Guerra do Ultramar, que aproveitem o que nos resta das "esmolas" que este governo, nos vai dando. Creio que é bem explicativo. O Porto e Coimbra também têm psicóloga e psiquiatra. Li, porque me foi também enviado, que a Liga dos Combatentes também tem apoio, pelo que deve também ser publicitada esta iniciativa. Nós, DFA´s, temos uma possibilidade mais rápida de, para alguns, virem a ser também considerados DFA’s, receber apoio médico gratuito (agora), e, eventualmente, uma reforma, se forem considerados como vítimas de stress de guerra. Consultem o folheto infra-anexo. Como sabem faço parte da Direcção da Delegação de Lisboa.
São muitos, como era de prever, os que agora (mais de 35 anos depois do fim da guerra) nos procuram, apenas para que lhes seja prestado apoio psiquiátrico, da Rede Solidária. A viuvez de alguns, o refúgio na bebida, a vida madrasta, os revezes da vida, etc. têm feito com que muitos se tornem de tal modo marginalizados, solitários e intratáveis, que são as próprias famílias a levá-los lá, quando não os deixam ao puro abandono... A ideia desta divulgação surgiu-me, quando fui almoçar com o pessoal do meu Batalhão, no passado dia 6 de Março, e vi o estado de degradação psíquica e física, em que se encontram alguns dos meus Camaradas. Um abraço, e olhem… aproveitem o que ainda nos resta da Rede Solídária.

Luís Nabais Alf Mil Op Esp/RANGER da CCS/BCAÇ 2885 (Sócio efectivo da ADFA, nº 9724) ___________ 

Notas de M.R.: Vd. último poste da série em: 8 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 – P4478: Iniciativas da ADFA em Lisboa (3): Almoço/Convívio do pessoal da BA 12 (Pilotos, Mecânicos e Enf Pára-quedistas (Luís Nabais)

Guiné 63/74 - P5990: Ser solidário (62): Fur Milº COMANDO António Fernando P.P. Cunha da 5ª Cia, está gravemente doente (Júlio Pinto)

1. O nosso Camarada Tertuliano Júlio Pinto (ex-2.º Sargt Mil da CART 1769/BART 1926 - Angola -, 1967/69, enviou-nos a seguinte mensagem:
COMANDOS
5ª Companhia

Camaradas,

Hoje passei em Vila Verde e estive com o ex-Fur Milº COMANDO António Fernando P.P. Cunha, que se encontra em estado de paraplégico (devido a acidente já depois de regressar da tropa), e está a viver no Lar da Santa Casa da Misericórdia, desta localidade.

Este veterano assentou praça comigo no CSM – R.I.5. nas Caldas da Rainha, em Janeiro de 1966. Depois da recruta apresentamo-nos ambos em Vendas Novas, a fim de frequentarmos a especialidade de Atiradores.

Em Vendas Novas deu-se então um caso curioso, que jamais esqueci, pois durante um incêndio numa habitação, o Cunha entrou corajosamente pelo meio das chamas, que reduziam tudo acinza, e salvou uma senhora idosa que se encontrava lá dentro.

A partir de certa altura da especialidade vieram captar pessoal para os COMANDOS e o Cunha ofereceu-se como voluntário.


A partir daí foi para esta tropa de elite e, finda a instrução, seguiu para a Guiné integrado na 5ª Companhia, penso que entre finais de 1966 e princípios de 1967.

Neste momento o seu estado de saúde agravou-se, pois devido a graves problemas de circulação já lhe foi amputada uma perna e mal conseguia falar, pelo que, foi muito dificilmente que consegui, que ele me dissesse, que pertenceu à 5ª CComandos e que o seu Capitão da Companhia se chama Antunes.

Ainda por cima, tem bastantes carências monetárias, pois penso que a reforma dele é muito pequena.

Como se tudo isto não bastasse, também está divorciado.

Como é óbvio, ele precisa de todo o apoio do pessoal da sua Companhia e de todos os Camaradas que o puderem e quiserem ajudar.

Os meus contactos são:

E-mail: pinto.jvp@gmail.com

Telemóveis: 914812740 ou 922110514.

Estou ao dispor de qualquer camarada que o queira ver, enquanto há tempo para isso.

Um abraço,
Júlio Pinto
2º Sarg Mil da CART 1769/BART 1926 (Angola)

Mini-guião da colecção pessoal: © Carlos Coutinho (2010). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

10 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5966: Ser solidário (61): Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, 6 de Fevereiro de 2010 (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P5989: Agenda Cultural (66): Homenagem aos ex-combatentes da Guerra Colonial do Concelho de Moura, dia 10 de Abril (Francisco Godinho)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Godinho Mil da CCAÇ 2753, Madina Fula, Bironque, K3 e Mansabá, 1970/72, datada de 7 de Março de 2010:

Camaradas Luís Graça e Vinhal!
Conforme o já combinado entre nós via telefone, junto vos remeto, para divulgação e conhecimento do n/Blogue, assim como dos intervenientes directos, já devidamente contactados para o efeito, e eventualmente para todos os que desejarem honrar-nos com a sua presença, repito, aqui vos remeto o formato do referido evento.

Francisco Godinho



Homenagem aos Ex-Combatentes naturais do concelho de Moura, mortos ao serviço da Pátria na Guerra Colonial/Libertação 1961/1974

MOURA - 10 DE ABRIL DE 2010 (SÁBADO)

CINE TEATRO CARIDADE (10H30)


- Colóquio em homenagem aos Ex-Combatentes naturais do Concelho de Moura, mortos ao serviço da Pátria, na Guerra
Colonial/Libertação 1961/1974, nas três frentes (Angola - Guiné - Moçambique).

Temática:

- Implicações/consequências que o conflito despertou na Sociedade Portuguesa e nos protagonistas, que culminou no espírito que provocou Abril.

- Oradores convidados:

1 - Mário Beja Santos


Membro da Direcção Geral de Consumidores; Vice-presidente do Conselho Consultivo dos Consumidores da C.E.

Autor dos Livros "Diário da Guiné 1968-1969 Na Terra dos Soncó e Diário da Guiné 1969-1970 O Tigre Vadio, Edição do Circulo de Leitores/Temas & Debates, e de vários trabalhos já publicados, inclusivé nos ecrans televisivos das nossas principais estações.

(Ex-combatente, Guiné 1968/70).

2 - Luís Graça Henriques

Prof. da Escola Nacional de Saúde Pública(UNL); Sociólogo do Trabalho e da Saúde; Fundador, Administrador e Editor principal do Blogue "Luís Graça&Camaradas da Guiné".

(Ex-combatente, Guiné, Guiné 1969/71).

3 - José Brás

Autor do livro "Vindimas no Capim" (Editora Europa-América), galardoado com o Prémio Revelação de Ficção 1986 da Associação Portuguesa de Escritores e do Instituto Português do Livro e da Leitura.

(Ex-combatente, Guiné 1966/68).

4 - Pedro Lauret

Comandante da Marinha de Guerra Portuguesa-Cap. de Mar e Guerra-(Capitão de Abril), membro da Direcção da Associação 25 de Abril.

(Ex-combatente, Guiné 1971/73).


Convidados

- Presidente da Câmara Municipal de Moura
- Major General Manuel Monge (na qualidade de Ex-combatente)
- Miguel Pessoa (Ex-combatente)
- Giselda Pessoa (Ex-combatente)
- Presidentes das Juntas de Freguesia do Concelho de Moura.


LARGO DE S. FRANCISCO (12H45)

- Deposição de uma coroa de flores junto à lápide evocativa aos Ex-combatentes mortos ao serviço da Pátria, leitura dos respectivos nomes e guarda de um minuto de silêncio em sua memória.


RESTAURANTE "O CELEIRO" (13H00)
(Rua Henrique José Pinto - Ex-combatente morto em combate na Guiné)
(Junto ao Pavilhão de Exposições e Depósito de água)

- Almoço conívio com o seguinte menú:

Entradas, creme de legumes à Celeiro, novilho à Celeiro, sobremesas, vinhos branco e tinto da região de Moura, águas, sumos, café e digestivos.

- Animação musical com:

- GRUPO CORAL E ETNOGRÁFICO DO ATENEU MOURENSE
- GRUPO "VÁ DE MODAS".


Moura, 3 de Março de 2010

A Comissão Organizadora:

Francisco Diogo Candeias Godinho (Telem. 93 343 47 24)
José Mira Borralho Infante
José Manuel Ramos Lérias
António Fernando Canudo Capa
José Joaquim das Estevas


NOTA:
Data limite para incrições para o almoço: 5 de Abril (20,00€ p/ pessoa)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 10 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5967: Agenda Cultural (65): O Abílio Machado (ex-Alf Mil, CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72) a Toque de Caixa, na FNAC Colombo, Lisboa, 5ª feira, 11, às 18h00

Guiné 63/74 - P5988: Histórias de José Marques Ferreira (16): O parto nos Bijagós


1. O nosso Camarada José Marques Ferreira, ex-Sold. Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 462, Ingoré - 1963/65 -, enviou-nos em 9 de março de 2010, a seguinte mensagem:

Camaradas,

Como diz o Torcato, que tive oportunidade de ler: «Há tanto tempo que não envio nada, que já nem sei… ».

Mas é uma questão de compromisso e, comigo, os compromissos assumidos cumprem-se. A menos que deixem de existir possibilidades. Enfim, penso que ainda tenho os «cinco» bem aferidos.

Então, como costumo dizer, aqui vai uma «estória inocentinha» apenas para relembrar coisas de longe e de saudade.

É que, vocês são capazes de pensar, e talvez tenham razão, que nem a copiar o que outros fizeram sou mais «trabalhador».

Assim, brevemente, irei enviar alguma coisa da minha autoria, para constituir o «livro das minhas recordações», que o é na totalidade este grande blogue (ou blogue grande?!).


Hospital Militar em Bissau. Aqui não se faziam partos, porque todos os que, infelizmente, lá davam entrada eram militares. Só muitos anos depois é que passaram a existir mulheres nas Forças Armadas da Guiné, especialmente na Força Aérea. Dois dos Camaradas que estão na foto, são da freguesia de Valongo e o terceiro é da freguesia de Espinhel, no concelho de Águeda. Um deles é natural de Arrancada e o outro do lugar do Casaínho (eram ambos “funcionários” do Hospital).

A inocente estória que segue é sobre os Bijagós, de quem andei bastante longe…
O PARTO NOS BIJAGÓS
Como sabemos, existem diversas raças de indígenas na Guiné. Cada qual tem os seus costumes próprios e também alguns que sendo comuns a várias outras raças, não deixam por isso de ter certas características que lhe dão individualidade. Muito resumidamente, vamos ver algumas noções curiosas acerca do parto na raça Bijagó.

A parturiente tanto pode ser uma rapariga solteira (campune) como uma mulher casada (ocanto), como é óbvio.

Tratando-se da primeira, quando está nas proximidades do parto recolhe a casa e manda chamar algumas "mulheres grandes" que possam servir de parteiras.

Uma dessas mulheres, e enquanto a parturiente vai enumerando o nome dos indivíduos com quem manteve relações sexuais até à altura do parto, conserva-se ao lado da cama, tendo na mão um molho de palha a arder, na ânsia de afastar os maus espíritos.

Se a parturiente é uma mulher casada, tal enumeração não se dá, pois se parte do princípio que a mulher é fiel ao marido (?!).

A seguir ao parto o recém-nascido é lavado com água do mar, limpo de todas as sujidades e esfregado com óleo de palma. Cerca de três dias depois a mãe é levada a uma praia e lavada com água do mar.

No entanto, o mais vulgar entre as raparigas solteiras (campunes) é a provocação do aborto. Como o nascimento dum filho a coloca numa posição social diferente, embora continue campune, ela prefere resolver o problema da forma mais simples: elimina-o.

Esta resolução, ao mesmo tempo que tira a preocupação à rapariga, evita também problemas ao rapaz se acaso ainda não foi ao fanado.

É que está decidido que os rapazes antes de irem ao fanado não podem ter relações sexuais e admitir a existência de um filho antes da época própria, é admitir uma fraude àquele princípio.
Além disso, todo o filho que nasça antes do fanado deixa de pertencer ao pai, e até à mãe, e passa a pertencer aos pais desta.

Cremos que é apenas nos Bijagós que este costume se segue como o descrevemos.

DOC
(Dr. Ramiro Fernandes de Figueiredo)
(Ex.alf.mil. médico da CCaç. 462-Guiné 1963/1965)

Nota: Esta curiosidade foi extraída do «Jornal da Caserna», periódico da CCaç. 462, com data de Outubro de 1964.

Um abraço,
J.M. Ferreira
Sold Ap Armas Pes
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Nota de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:

16 de Fevereiro de 2010 >
Guiné 63/74 - P5822: Estórias avulsas (75): Do Cumeré a Canquelifá (João Adelino Aves Miranda, ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4610/73)