terça-feira, 15 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9905: Blogpoesia (187): Descansa em paz, Iero Jaló... Poema de Luís Graça, com dedicatória ao Zé Carlos Suleimane Baldé, nosso novo grã-tabanqueiro



Guiné > Zona Leste > Contuboel > Junho de 1969 > CCAÇ 2590/ CCAÇ 12 > O 2º Grupo de Combate da CCAÇ 2590 (futura CCCAÇ 12), ainda em período de instrução da especialidade.

O 2º Gr Comb era comandado pelo Alferes Miliciano Carlão (co-optado do Curso de Oficiais Milicianos=, se bem me lembro...) que aparece na fotografia, na primeira fila, ajoelhado, olhando no sentido oposto ao do fotógrafo (rectângulo a amarelo). Vive hoje em Fão, Esposende. É casado com a Helena, a única "mulher branca" da CCaç 12 que viveu connosco em Bambadinca. O Carlão é transmontano, não sei se de Mirandela ou Miranda do Douro...

Atrás dele o soldado Arménio, hoje conhecido taxista no Portp (era cabo, antes de embarcar mas foi despromovido, por ter apanhado uma porrada de não sei quem). Um reguila do Porto...

De pé, na terceira fila, os furriéis milicianos António (Tony) Levezinho e Humberto Reis . Na segunda fila, meio agachados, os 1ºs cabos Branco e Alves (de alcunha o Alfredo)

Um grupo de combate da CCAÇ 2590 (mais tarde, CCAÇ 12) era constituído por 30 homens. Havia 4 Gr Comb. Cada grupo de combate, comandado por um alferes, tinha três secções (1 furriel e 1 cabo e oito soldados, estes africanos).

Casa secção era especializada. Havia a secção dos lança-granadas, com o respectivo apontador e municiador (1 LGFog 8.9, 1 LGFog 3.7). Havia a secção do Morteiro 60 (apontador e municiador ). E havia ainda a secção da Metralhadora Ligeira HK 21 (apontador e municiador). Cada combatente estava equipado com a espingarda automática G-3 e granadas defensivas. Em geral havia ainda dois apontadores de dilagrama (neste caso, 1ª e 3ª secção). O Iero Jaló, que não consigo identificar na imagem, pertencia à 3ª secção, comandada pelo Tony Levezinho.

Foto: © António Levezinho (2005). Todo os direitos reservados

1. Poema que dedico ao Zé Carlos Suleimane Baldé [, aqui na foto comigo, ao centro, e com o Umaru, em Finete, 1969], o primeiro e o último  preto da Guiné, da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, que irá figurar na lista alfabética dos membros da Tabanca Grande... 



Publicado originalmente na I Série do nosso blogue, no  poste de 10 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLII: A galeria dos meus heróis (2): Iero Jau









Descansa em paz, Iero Jaló


A guerra.
Essa coisa tão primordial que é a guerra.
Que estaria inscrita no teu ADN,
segundo dizem os sociobiólogos.
A guerra é a continuação da evolução
por outros meios,
dirão os entomólogos,
especialistas em insetos sociais,
para quem a morte de um
ou de um milhão
de formigas ou de seres humanos,
é-lhes totalmente indiferente.
Desde que triunfe o ADN,
um projeto de ADN
musculado.

Para mim, a guerra é
a aprendizagem da morte.
Aos vinte e dois anos.
É a inocência que se perde
para sempre
ao ver morrer pela primeira vez
um homem, a teu lado.
É o impossível luto.
É a descoberta do mal absoluto.

Fight or flight.
Não precisei de fugir nem de lutar.
Recusei o egoísmo genético.
Recusei a lógica absurda
de matar ou morrer.
Recusei o cinismo.
Recusei a fria e calculista resignação
com que se juntam e amortalham
os cadáveres seguintes.
E se contam nas paredes da caserna
os dias que faltam para a peluda.

Trinta e tal anos depois,
venho dizer-te
as palavras que ninguém te disse
no teu grotesco enterro:
- Descansa em paz, Iero Jaló,
meu herói,

meu camarada,
soldado atirador
do 2º grupo de combate,

3ª secção.
nº 82117869,
da CCAÇ 2590
que virá mais tarde a chamar-se
CCAÇ 12,
companhia de tropa-macaca,
A minha companhia,
os meus camaradas,
o meu bando de primatas sociais,
territoriais, 

predadores.
Fazíamos parte da nova força africana
de Herr Spínola, o prussiano,
como eu lhe chamava,
ao nosso Comandante-Chefe.
Não, não ligues,
são outros contos, 

outras histórias,
outros ajustes de contas
com as nossas doridas memórias.

Dscansa em paz,
Iero Jaló,
debaixo do poilão secular
na tua tabanca,
no chão fula,
belíssimo poilão de uma triste tabanca fula,
cercada de arame farpado,
trincheiras,
valas de abrigo.
e cavalos de frisa.
Julgo que eras do regulado de Badora.
Ou seria Cossé,
lá para os lados de Galomaro ?

Desculpa-me ter esquecido
o nome da tua tabanca.
E a cara dos teus filhos
e o rosto das tuas mulheres,
agora órfãos e viúvas,
sozinhos neste mundo.
Os teus campos estão tristes e inférteis,
já não dão o milho painço nem o fundo,
nem a mancarra,
a semente do diabo,
nem a noz de cola.
Os homens partiram para guerra,
voltam agora numa caixão de pinho.
Restam os macabros jagudis,
poisados no alto da tua morança,
cheirando a morte,
pressagiando a desgraça

Sete de Setembro de 1969.
Região do Xime.
Operação Pato Rufia.
Morreste em linha,
aprumado como o teu poilão.
No assalto a um aquartelamento temporário do IN,
uma baraca, como eles diziam,
próximo da Ponta do Inglês.

IN ? Que estranho termo ou expressão…
Uso-o por força do hábito,
por comodidade,
por lassidão,
por economia de análise.

Curioso, nunca soube a tua idade.
Não tinhas bilhete de identidade
de cidadão português.
Eras um bravo futa-fula

e eu levei-te a enterrar na tua aldeia,
mais os teus camaradas,
que foram dizer-te o último adeus.
Com honras militares, 
tiros de salva,
hino nacional,
e a bandeira verde-rubra dos tugas
por cima do teu caixão.
De pinho,
do verde pinho de Portugal.
Nem isto te deixaram fazer
à maneira dos teus.
Só faltou o corneteiro
para o toque a finados.

Portugal ? 
Ainda te lembras,
os senhores que vieram do norte
e do lado do mar ?
Não, já não tens que saber de geografia.
Nem de história. 
Nem de geopolítica.
Nem de guerra fria.
No sítio onde moras, 

debaixo do teu poilão,
já não tens que saber de nada.
Mas eu, mesmo ao fim destes anos todos,
eu deveria saber o nome da tua aldeia,
no chão fula.
O teu nome, esse não esqueci,
Iéro Jaló.
Esqueci foi o lugar onde nasceste,
talvez Sinchã,
ou Madina, 
ou Sare qualquer coisa...
Que importa agora ?
Serás mais um dos milhares de soldados desconhecidos daquela guerra.

O que interessa é que chorei por ti,
confesso que chorei por ti,
que morreste a meu lado,
e que levavas um prisioneiro,
teu irmão,
pela mão.
Chorei por ti,
e não tenho vergonha de o dizer,
mesmo se um homem não chora,
muito menos um tuga ou umn fula.
Chorei por ti,
que nem sequer eras meu irmão.
Nem grande nem pequeno.
Nem tinhas a mesma cor de pele.
Nem a mesma religião.
Nem a mesma língua.
Nem a mesma pátria.
Nem o mesmo continente.
Não comias carne de porco
Nem bebias água de Lisboa.
Eras apenas um guinéu,
Um nharro,
soldado-atirador
de 2ª classe.
Ganhavas 600 pesos de pré.
Um saco de arroz por mês
para alimentar a tua família.
Mas, para mim, eras apenas um homem,
da espécie Homo Sapiens Sapiens.
A única que chegou até aos nossos dias.
A única que conheço.
Foste o primeiro homem que eu vi morrer a meu lado.
Nunca mais chorei por ninguém,
chorei por ti, Iero Jaló.
Chorei de raiva.
Chorei de imensa raiva.

Nascemos meninos,
mas fizeram-nos soldados.
Azar o meu e o teu,
por termos nascido
no sítio errado,
no tempo errado.
Imagino-te djubi,
à volta da fogueira,
na morança do marabu ou do cherno
da tua tabanca,
decorando o Corão.
Uma das cenas mais lindas
que eu trouxe da tua terra,
e que eu guardo no fundo da  minha memória,
são os djubis à volta da fogueira,
soletrando tabuínhas em árabe,
ou pseudo árabe, não interessa.
Lembro-me de quereres aprender
as letras dos tugas
para poderes ser soldado arvorado
e um dia chegares a cabo,
e quem sabe sargento,
e quem sabe oficial,
e quem sabe general.

E de repente, o capim.
O capim alto.
O sangue.
O capim pisado e empapado de sangue.
Pobre Iero,
morto por um dilagrama dos nossos.
Alguém branqueou a tua morte.
Alguém salvou a honra da companhia.
Um dilagrama rebentou no ar,
na tua cara.
Acidente de serviço
no auge da batalha,
quando avançavas em linha,
no assalto ao acampamento
do IN, do turra,
Levando pela corda
o teu turra, o teu guia, o teu prisioneiro,
ainda mais djubi do que tu.
Malan Mané, mandinga,
tão crente como tu,
tão observador dos preceitos corânicos
como tu, 
meu querido nharro
Iero Jaló.

E agora, meu camarada,
morto e enterrado,
que foste poupado
à humilhação da derrota
e não viste o teu país
sentar-se de pleno direito
à mesa do mundo,

dos senhores do mundo...
Nem tiveste que fugir para o Senegal...
Que farias tu com esta independência
contra a qual lutaste
sem querer,
sem saber,
sem poder ?

Onde estarão hoje os teus filhos, 
e as tuas mulheres ?
E os teus netos ?
E os homens grandes da tua tabanca de Badora ?
E os líderes do teu povo
que te obrigaram a combater ao lado dos tugas ?
Herr Spínola, o homem grande de Bissau,
esse já morreu há uns anos atrás.
Não lês os jornais,
não chegaste a aprender o alfabeto latino
e a juntar as letrinhas 
e ler,
com a torre de Belém ao fundo:
- Esta é a minha pátria amada…
Pois é, o homem grande de Bissau morreu,
não de morte matada, como a tua,
mas de acordo com a lei natural das coisas.
Quanto ao teu régulo,
foi miseravelmente fuzilado
na parada de Bambadinca,
o poderoso régulo de Badora,
tenente de milícias,
que havia trocado o cavalo branco
da gesta heróica do Futa Djalon,
por uma prosaica motorizada japonesa
de 50 centímetros cúbicos,
oferta do Homem Grande Bissau...
Era dono de centenas cabeças de gado
e de uma harém de cinquenta mulheres,
uma em cada aldeia de Badora…
Dizia-se que o puto Umaru
era filho dele,
o Umaru e mais djubis da CCAÇ 12.

Hoje os heróis do passado sucumbem
sob o peso das cruzes de guerra.
Ou pedem esmola nas ruas de Bissau,
tal como os teus filhos e netos.
Ou morrem de desespero e inanição
às portas do templo da deusa Europa,
em Ceuta e em Melilla,
em Lisboa ou em Paris.
Que voltas o mundo deu, meu soldado,
desde esse dia já distante
em que a tecnologia da guerra
ou a lotaria do ADN
te ceifou a vida.
Porquê tu, meu herói,
três meses depois de jurares bandeira
e te comprometeres, por tua honra,
a defenderes uma pátria 
que te disseram ser a  tua,
até à última gota do teu sangue ?

E do Malan Mané não tenho notícias,
se é isso que queres saber,
mas duvido que ele tenha sobrevivido
aos graves ferimentos do dilagrama dos tugas.
E agora deixa-me dizer-te, amigo,
à laia de despedida:
não sei se um dia
ainda terei coragem de voltar
à tua terra, 
ao teu chão.
Mas se porventura o fizer,
gostaria de perguntar pela tua aldeia,
e de procurar-te
e de ter tempo para conversar contigo,
só tu e eu,
debaixo do teu poilão.
Descansa em paz, Iero Jaló.

Luís Graça,

[revisto nesta data]


2. Originalmente este poema foi escrito tendo por tema a morte do sold at inf nº 82117869, Iero Jaló, de etnia futa-fula, do 2º Gr Comb, 3ª secção, da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, ocorrida em 8 de setembro de 1969, no decurso da operação Pato Rufia, na região do Xime... Este meu camarada morreu ao meu lado, no meu próprio batismo de fogo.

Mais tarde emendei o nome, e substitui-o pelo nome do Iero Jau, apontador de dilagrama, do 3º Gr Comb, 1º secção, nº mecanográfico,82109569, este sim, fula. Na realidade fui induzido em erro pela história da unidade (a CCAÇ 12), escrita por mim próprio: no relato da Op Pato Rufia, vem o nome do Iero Jau... Mas quem morreu de facto foi o Jaló, futa-fula: aliás, é o Iero Jaló, nº mecanográfico 82117869, que vem no fim na lista dos mortos da companhia... Foi a nossa primeira vítima mortal. E aliás é este nome que consta da lista oficiosa dos nossos mortos no Ultramar.

Corrigi, nesta data, o título e o corpo do poema... Espero que, no Olimpo dos guerreiros, o Iero Jaló me perdoe. O mesmo peço ao Iero Jau, que muito provavelmente já não estará entre nós. Estima-se que mais de 80% dos soldados do recrutamento local que tiraram a recruta e a especialidade em Contuboel, em 1969, e vieram depois integrar a CCAÇ 2590 (futura CCAÇ12), já tenham morrido.
______________

Nota do editor:

Último poste da série > 15 de abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9749: Blogpoesia (186): Registo (Felismina Costa)

Guiné 63/74 - P9904: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (22): Havia mais "PALOP" (entendimentos) antes das independências

1. Mensagem do nosso camarada António Rosinha, (ex-Fur Mil em Anagola) topógrafo na TECNIL na Guiné-Bissau, depois da sua independência, com data de 11 de Maio de 2012:

Havia mais "PALOP" (entendimentos) antes das independências

Guerra colonial portuguesa, Guerra do Ultramar, Luta de Libertação Nacional de Angola, Guerra de Independência da Guiné-Bissau, Luta de libertação de Moçambique, sem falarmos nos casos de São Tomé e Cabo Verde, são tantos os nomes da guerra da geração dos que nasceram nas décadas de 40 e 50 do século passado, que todos os nomes se podem ajustar a cada circunstância.

Mas se quisermos balizar a guerra entre as datas que provocam a frase “para Angola e em força” de Salazar, até à entrada de Marcelo Caetano no Chaimite de Salgueiro Maia, então se quisermos ser realistas com a história, foi como “Guerra do Ultramar”, nome com que no continente e ilhas era alcunhada a guerra pelos soldados que embarcavam no continente e ilhas, a caminho das colónias.

Mas para os movimentos que lutaram contra os que iam do continente e ilhas e imensos que eram naturais das colónias, essas datas dizem muito pouco, pois eles próprios, que são vários movimentos, cada qual tem as suas datas, ignorando mesmo as datas importantes dos outros movimentos irmãos.

E exigem para cada um, o seu próprio protagonismo, e hoje, até fazem por ignorar os feitos dos “irmãos” e assumiram as suas próprias datas comemorativas, exclusivas e isoladas uns dos outros, quando na realidade foi em conjunto que trabalharam.

Esta é uma realidade que se quer varrer para debaixo do tapete pelos 5 PALOP, que estiveram sempre associados na luta contra o colonialismo português, e hoje quase se ignoram.

Claro que podem ser encontradas razões para esse afastamento entre os governos MPLA/FRELIMO/PAIGC/PAICV
(Não incluo aqui São Tomé nem a UNITA nem FNLA nem RENAMO porque estes foram secundarizados por aqueles).

É que o protagonismo dos dirigentes desses movimentos “vitoriosos” que se relacionavam entre si a nível internacional, era tão excessivo que apagaram o sacrifício que os povos sofreram, tanto dos que acreditaram nesses movimentos como aqueles que ainda hoje não acreditam.

E como esses dirigentes, que se conheciam todos uns aos outros e se entendiam bem, eram tão poucos que rapidamente foram sendo apagados e excluídos politicamente e até eliminados fisicamente alguns, e hoje “desconhecem-se” mutuamente, após as independências e as vicissitudes que se seguiram, porque os dirigentes que “sobraram” eram desconhecidos uns dos outros.

Ao contrário do que se passava no tempo colonial, que havia uma união entre os principais protagonistas da luta anti-colonial, e mesmo entre eles e a oposição política portuguesa metropolitana, e agora não há CPLP nem PALOP “que lhe valha”, e é uma pena que a tal elite tradicional que existia se tenha apagado tanto, embora fosse previsível que tal acontecesse.

Era uma mais valia enorme para todos os 5 PALOP, pois havia muito entendimento entre eles e é a união que faz a força, pode ser que um dia reapareça essa união que existiu, o que parece difícil.

A conjugação de esforços e entendimento entre os dirigentes dos referidos movimentos era tal que no caso de Amílcar Cabral é considerado nos relatos históricos como co-fundador de MPLA, angolano, e do PAIGC.

E após as independências, no caso da Guiné é bem conhecida a colaboração de guineenses e cabo-verdianos do PAIGC que se prolongou durante bastantes anos, e acabou essa colaboração com maus resultados para o futuro da Guiné.

Mas sabemos que não era a colaboração que estava errada, mas as políticas “importadas” e completamente erradas e contrárias ao espírito dos povos e que não diziam nada às pessoas, e que acabaram num virar de costas, mau para todos.
(Absurdos como ideologias guevaristas em balantas, Ganguelas e macuas ou beirões e algarvios, nem em Cuba foi bom)

Ainda no caso da Guiné, conhecemos no tempo de Luís Cabral, um angolano como ministro do governo guineense, Mário Pinto de Andrade, que foi, durante a luta anti-colonial um dos presidentes do MPLA.

Mas como todos os casos semelhantes a Mário Pinto de Andrade, que já era um “exilado” de Angola, tornou-se exilado também da Guiné, foi péssimo a fuga dos mais informados.

E foram milhares de angolanos, guineenses, e de todos os PALOP, que se “exilaram” em Portugal, no Brasil e por todo o lado. Por cá, ainda há quem chame a alguns de retornados. Mas periodicamente, durante estes 38 anos de independências, os mais informados vão-se afastando dos seus países.

Embora muitos países em África descolonizada tenham problemas semelhantes, no caso das ex-colónias portuguesas têm uns problemas específicos, à vista de todos.

Menciono dois:

Um desses problemas mencionava-o Samora Machel numa visita a Portugal num discurso com Ramalho Eanes, presidente, dizia Samora que: “…todos têm pai, só nós (moçambicanos) não temos pai", referia-se à colaboração dos vizinhos com a Inglaterra. (neocolonialismo???), chame-se o que se queira, mas da parte de Portugal era impossível impor-se à “bola de neve” que esses movimentos criaram, que até os próprios dirigentes esmagou.

O outro enorme problema específico é o êxodo quase total da tal elite que Amílcar falava como a “burguesia “ que corria o risco de se suicidar, mas que tanta falta fazia viva, mas bem viva, porque eram patriotas, bem formados e formavam uma sociedade sã e adaptada aos vários ambientes étnicos, religiosos e culturais e já não se consideravam nem eram vistos pelas etnias, como simples colonos, embora a maioria fossem brancos ou mestiços e muitos eram negros já desintegrados da respectiva etnia.

Não se suicidou, mas exilou-se contra a vontade da maioria deles que não viram maneira de contrariar as forças internacionais, tremendamente malignas para todas as etnias africanas, que a “demagogia das independências” atraiu naquele momento errado.

Claro que esta gente que (conheci e fui colega de centenas) teve que se “exilar”, também deita muitas culpas para cima da tropa e dos políticos tugas, por certas coisas correrem tão mal.

Mas para a “morte ter desculpa”, quando vemos as revoluções e os massacres por motivos étnicos, religiosos, fronteiriços ou políticos em África, se for nas ex-colónias portuguesas pode-se dizer que a culpa foi do atraso em que Portugal deixou aqueles territórios, noutros casos fica à responsabilidade da ONU, essa abstracção.

Quando digo que havia mais PALOP (entendimento) entre aqueles cidadãos desses futuros países, havia mesmo uma irmandade tão saudável e até com alguma rivalidade competitiva e orgulho na própria terra que era entusiasmante e saboroso conviver e assistir ao entusiasmo daquela gente, antes do terrorismo do Norte de Angola e mesmo depois.

Mas há certos motivos para explicar a diminuição de um sentimento “PALOP”, mas deixo para momento mais propício,

Claro que a Europa colonialista cansada da guerra da Índia, da guerra da Indochina, da 2.ª Grande Guerra, optou por ver os outros em guerra, sozinhos.

Alguns de nós portugueses, assim como em tudo, seguimos sempre a Europa um pouco mais atrasados, tinha que ser.

Um abraço e coragem para os editores “editarem sempre”
António Rosinha
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9655: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (211): TECNIL, importante empresa de obras públicas, que desaparece do mapa (Parte III)

Guiné 63/74 - P9903: Tabanca Grande (338): José Carlos Suleimane Baldé, ex-1º cabo at inf, CCAÇ 12 (Contuboel, Bambadinca e Xime, 1969/74)

Sonhei com Portugal
[poema de José Carlos Suleimane Baldé]

Era uma noite,
calma,
serena!
Um ambiente bem silencioso!
Vejo os céus de Portugal.
Alguém disse:
- Levanta a cabeça!
Nos céus sem nuvens
vi variadíssimas estrelas
que nunca vira antes!
De repente soou um grito,
dizendo:
- Não tenhas medo,
que aqui é Portugal!




1. José Carlos Suleimane Baldé, simplesmente Zé Carlos (*)... O "morto-vivo" da CCAÇ 12!...  Já te deram por morto e ressuscitado, não sei quantas vezes!... Parafraseando Mark Twain, podemos pois dizer que a tua notícia da tua morte, logo em 1974, foi manifestamente exagerada. 


De qualquer modo, não tenho tido notícias tuas desde o ano passado, na altura em que  realizaste o teu grande sonho de vir conhecer Portugal, terra que tu tanto amas (ou amavas) mas que  te tratou com ingratidão.  A ti e a outros milhares de combatentes guineenses que estiveram sob a bandeira portuguesa.  Essa viagem foi possível graças à generosidade de muitos camaradas, e sobretudo da Odete Cardoso e do Jaime Pereira. (Abrindo um parênteses, não confundamos Portugal e a sua gente, com o Estado e a elite dirigente; eu também não confundo a tua terra e a tua gente, com os que mandam e falam abusivamente em seu nome).

Quando chegámos a Contuboel, em 2 de junho de 1969, depois de desembarcarmos em LDG no Xime, e de seguirmos em coluna auto por Bambadinca e Bafatá, descobrimos que dos 100 soldados do recrutamento local que se juntaram aos 50 quadros e especialistas da CCAÇ 2590 para vir a formar a futura CCAÇ 12, nenhum deles falava português... A única exceção eras tu, Zé Carlos!... Serias aliás o único soldado arvorado que chegaria  a 1º Cabo,  no meu tempo (Foste promovido logo a seguir, em setembro de 1969., lembras-te ?). 


José Carlos Suleimane Baldé, o dedicadíssimo, delicadíssimo, educadíssimo Zé Carlos, uma joia de rapaz!.. 

Terias na altura 18 anos, não ? A gente não sabia a vossa idade, vocês fintavam os tugas, só para ir para a tropa!... Tínhamos de tudo, djubis e homens grandes, alguns já mesmo velhotes... Lidei, convivi bastante contigo, no 4º Grupo de Combate (por onde passei mais tempo), considerei-te, desde logo, como "secretário particular, intérprete, cozinheiro, guarda-costas, e sobretudo amigo e camarada".  Emprestei-te livros, dei-te cadernos, ajudei-te a melhorar o domínio do português. Falei-te da minha terra.

Pertencias à 2ª secção, comandada pelo Fur Mil At Inf António Marques, até àquele fatídico dia, 13 de Janeiro de 1971 -lembras-te ? -,  em que caímos todos juntos, uma GMC inteira, numa potente mina A/C às portas de Nhabijões. 

Estive contigo  em muitas operações. E em várias tabancas fulas em autodefesa. Tu ajudaste-me a perceber melhor a tua gente, a tua história, a tua língua, a tua cultura e até a tua religião. 

Até há um ano e meio atrás, eu não sabia nada de ti nem do curso da tua vida, depois da independência. Sempre receei pela tua segurança. Hoje sei, sabemos, que vives perto do Xime, com a tua família. Voltei a rever-te e a abraçar-te, com grande emoção, em Coimbra, no dia 21 de maio de 2011. 

Zé Carlos: abandonados por nós, ostracizados pelo teu Governo, os nossos antigos camaradas guineenses vão desaparecendo rapidamente, vítimas da perseguição, da doença, da miséria, da discriminação, do abandono, do esquecimento, e até da falsificação da história... Recordá-los, recordar os seus nomes, publicar as poucas fotos que temos deles, é o mínimo dos mínimos que podemos fazer no nosso blogue!... 

Da nossa CCAÇ 12, dos meus antigos 100 camaradas, do meu tempo de Contuboel e de Bambadinca (junho de 1969/março de 1971), restarão muito poucos, menos de duas dezenas. Entre eles, felizmente, estás tu, Zé Carlos.

 Em 29 de maio de 2011, tu vieste à minha escola para te despedires de mim, depois de umas férias fantásticas no teu querido Portugal.  Vinhas acompanhado pelo António Marques e a Gina. Dessa vez achei-te  abatido, apreensivo, na véspera de partires.   Não te mostraste tão expansivo, como em Coimbra. Pedi-te para fazer uma saudação para os teus antigos camaradas da CCAÇ 12, que eu gravaria em vídeo, mas tu recusaste polida e delicadamente. Acredito que o teu estado de espírito estivesse associado à ansiedade e tristeza da partida, além da  convição  de que na tua terra continuarias a ter  muitas poucas ou nenhumas perspectivas de futuro. 

Por outro lado, voltavas amargurado: em Portugal, os teus papeis da tropa (portuguesa) de nada te valeram. Devem ter-te explicado, um burocrata qualquer: o sr. Suleimane Baldé nunca fizera descontos  para  a Caixa Geral de Aposentações; além disso, não era cidadão português... 

Esta era talvez  a maior decepção que tu levavas da tua primeira (e provavelmente última) viagem a Portugal... Os cinco anos e duzentos e tal dias que estiveras ao serviço do exército português  não te davam quaisquer benefícios nem constituíam quaisquer direitos... 

E, no entanto, tu guardas (ou guardavas) religiosamente a bandeira verde-rubra na tua morança!... Por essa bandeira, pela tua aliança com os tugas,  estiveste em risco de ser condenado e executado nos tempos de brasa, possivelmente por volta do 11 de março de 1975 (altura em que terão sido  executados o Jamanca e o Abibo Jau, da CCAÇ 21,  em Madina Colhido )... "Valeram-me os anciãos de Bambadinca que, em pleno tribunal popular, me defenderam, a mim,  Suleimane Baldé, como um bom homem, um bom professor, um bom fula,  e um bom guineense" - confidenciaste-me tu, o ano passado...

Disseste-me com  alegria  que irias, dentro em breve, casar a tua filha com o filho de um antigo camarada e amigo da 2ª secção do 4º Gr Comb da CCAÇ 12, o Sori Baldé...

Constatei, com amargura, que tu já não pertencias ao meu mundo, pertencias a um outro mundo, o teu mundo, para o qual regressavas, definitivamente... Ainda pensei, num impulso de generosidade e de camaradagem,  em convidar-te  a integrar o nosso blogue... Mas percebi a tempo, numa fração de segundo de lucidez,  quão atrozmente ridícula era a minha proposta!... 

Na tua tabanca tu não tens nada, para além de um telemóvel e de uns óculos, para ler,  que te deu a Odete Cardoso, esposa do Jaime Pereira, casal que são padrinhos da tua filha mais nova, e que te acolheram em Portugal...

Aliás, o que é que tu tens, no ocaso da vida ? Uma família para sustentar,  uma morança, alguma terra para lavrar, uma saúde precária, uma velhice incerta... Antigo professor ou monito escolar (tarefa que te terá sida atribuída, depois de ferido em combate), não tens computador nem email nem internet nem sabes o que é isso... Não tens nada. Tens medo, continuas a ter medo, medo da palavra "política" e dos grandes inquisidores que te levaram a "tribunal popular" em Bambadinca... 

Na altura, em 29 de maio de 2011, eu escrevi ou pensei: "Confesso que fiquei deprimido por sentir que há homens que podem ter medo do medo... E  que podem ainda, hoje, quarenta anos depois do fim da guerra colonial, sentir medo... E eu tenho medo de escrever mais e complicar a vida de antigos camaradas meus, que foram meus camaradas de armas"...

Afinal, um blogue, para quê ?,  perguntarias tu...  O que é isso, de blogue ?... E que resposta te poderia eu dar, meu velho Zé Carlos  ? Não saberia dar-te nenhuma, naquele momento... Em suma, desisti da ideia de te "atabancar" numa Tabanca Grande que não te diria nada, e que tu nunca reconhecerias... porque é uma coisa virtual, uma ideia abstrata, com um suporte digital, que nem tem cor, nem cheiro, nem sabor...

Mas hoje, passado quase um ano, e depois de voltar a ver  o teu nome numa lista de fuzilados da CCAÇ 12, deu-me ganas de voltar a pegar na ideia e de concretizá-la. Não tenho poder, não tenho nenhuma varinha mágica para te poder trazer para Portugal (como tu sempre sonhaste, e confessavas ao António Marques, com quem te correspondeste regularmente entre os anos de 2000 e 2004... e o Marques tem essas cartas!)... Nem sei se  tu aqui serias mais feliz do que na tua tabanca... Tenho todas as dúvidas, hoje mais do que nunca.... 

Mas há uma coisa que eu posso fazer por ti,  Zé Carlos, para além de prometer visitar-te (quando,  e se,  um dia voltar à Guiné-Bissau, e nessa altura conhecer a sua família, e se possível rever mais alguns camaradas da CCAÇ 12, os poucos que restarem vivos)... Ora o que eu posso fazer por ti, é da mais elementar justiça: é admitir-te  na nossa Tabanca Grande e sentar-te  à sombra do nosso simbólico, mágico, secular, portentoso, protetor,  fraterno poilão!...  

Para que o teu nome e o teu arreigado amor a Portugal não sejam esquecidos, para que a nossa velha amizade e camaradagem  continuem a ser celebradas, apesar da distância, apesar das nossas diferenças, apesar das nossas tristezas, qpesar das nossas desilusões. apesar das nossas memórias doridas!...  Faço-o à tua revelia, mas na convicção de que um dia destes  tu vais aceitar e compreender o meu gesto.  Se alguém, guineense, da CCAÇ 12 merece estar aqui, és seguramente tu. E serás o primeiro e muito possivelmente o último.

Sê bem vindo, Zé Carlos, à Tabanca Grande. És o grã-tabanqueiro nº 557. Peço à dr. Odete Cardoso que te vá dando  notícias nossas, por telefone e carta.  Devo dizer-te que não és o único "morto-vivo", o nosso António Batista também o é; além disso,  também não tem e-mail, mas foi acolhido, com todo carinho, neste espaço vritual onde se reúnem os velhos combatentes da Guiné, portugueses e guineenses, independentemente do seu passado, do seu presente, das suas crenças, e das suas perspetivas de futuro...  


Que Alá te proteja, meu bom amigo e camarada Zé Carlos! És e foste sempre um grande homem e combatente!


Luis Graça, ex-fur mil at armas pesadas inf, CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, Maio de 1969/Março de 1971)


PS - Não combinei nada com ele,  mas peço ao António Marques  [, foto à esquerda,  ladeado por ti e pela Gina, Lisboa, no parque da minha escola, em 29 de maio de 2011,] que seja o teu "padrinho" na Tabanca Grande, e que te "empreste" o email dele...  Espero poder encontrá-lo mais logo, aqui ao pé de casa, em Alfragide, na missa do 1º aniversário da morte da nossa amiga Teresa Reis (1947-2011), esposa do Humberto Reis.
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Notas do editor:

(*) Vd. postes referentes (ou com referências) ao Zé Carlos:

4 de junho e 2011 > Guiné 63/74 - P8372: Os nossos camaradas guineenses (33): O Zé Carlos regressou ao seu mundo, à sua tabanca, à sua morança... (Luís Graça)

22 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8311: Os nossos camaradas guineenses (32): José Carlos Suleimane Baldé... Pensando na CCAÇ 12, em Coimbra, em Amedalai, em Bambadinca... Andando pelo Planaltod as Cesaredas, à procura de amonites e orquídeas-abelhas... Celebrando a biodiversidade, a etnodiversidade, a camarigagem, os nossos encontros e desencontros... (Luís Graça)




Guiné 63/74 - P9902: Parabéns a você (419): António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CART 3493 (Guiné, 1972/74)

Para aceder aos postes do nosso camarada António Eduardo Ferreira, clicar aqui
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 10 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9877: Parabéns a você (418): Daniel Agostinho Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2861 (Armando Pires)

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9901: Em busca de... (188): Pessoal da CCAÇ 417 (Empada, 1963/65) (Jorge Soares Branco)

1. Mensagem do nosso leitor e camarada José Soares Branco (que esteve em Empada,  e noutros sítios da Guiné, 1963/65) [, Foto á esquerda, Empada, vista aérea, 1974; foto de António Graça de Abreu]:


De: José Soares Branco [mailto:soares.branco@laborial.com.pt]
Data: domingo, 13 de Maio de 2012 23:32
Assunto: Guiné (1963/1965)


Caro Amigo Luís Graça,


Estive na Guine, incluído na Companhia de Caçadores 417. como Furriel
Miliciano. 


Salvo raras exceçoes, não tenho contacto com colegas de então.


Pode ajudar-me ?


Estivemos no aquartelamento de Empada mas, enquanto companhia de
intervenção, actuámos em vérios pontos da Guine, tambem mais a norte.


Chegámos à Guine em Fev de 1963.


Um abraço amigo,


José Soares Branco


2. Comentário de L.G.:


Sê bem vindo ao nosso blogue, camarada do caqui amarelo!... Perante tanta velhice, nós, piras, temos que piar três vezes. As nossas saudações para ti e restante rapaziada, hoje septuagenária, da CCAÇ 417,  de quem infelizmente não temos ninguém inscrito na Tabanca Grande. Tu podes ser o primeiro se nos mandares as duas fotos da praxe e nos contares uma história... Diz-nos também onde vives e o que fazes nos tempos livres...


Pois é, Jorge, vejo que apanhaste os anos de chumbo da guerra. Daí haver por  certo coisas (boas e más) que guardas na tua memória... Uma das poucas  referências que temos à tua companhia vem num poste do ex-cap George Freire, hoje a viver na América.



(...) 15/3/63: 


Chegou um pelotão da CCaç 417 que seguirá para Caboxanque. Enviei uma grande coluna de 10 viaturas para Emberem [Jemberém]  para trazer o resto dos víveres pertencentes aos Fulas.


16/3/63: 


O pelotão da CCaç 417 seguiu para Caboxanque para render o Pelotão 859. (...)


Consulta também este poste do pira  Arménio Estorninho (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381, que esteve em Ingoré, Aldeia Formosa, BubaEmpada, entre 1968 e 70): 

(...) Conjugando os testemunhos já dados, com as acções havidas no Subsector de Empada, pela CCaç 153 – Fulacunda 1961/63 sob o Comando, ao tempo, do Cap Inf José dos Santos C. Curto, e, também,  da CCaç 417 - 1963/64, esta por ter sido colocada na sede deste Subsector sob o Comando ao tempo do Cap Inf Carlos F Delfino:

“Por elementos da população também fora-me dito, que ao tempo as Autoridades Militares e Administrativas, condicionaram a população residente a ficarem controladas por nós ou a refugiar-se em Tabancas no mato, Sic.”
Entre outros fora o guerrilheiro Nino que escolhera refugiar-se no mato, ouvia-se dizer por ele ser de Empada e que ali tinha familiares não se lhe oferecia a flagelações. (...).

Há notícias de um camarada teu, António Ferreira, de Gindomar no blogue do nosso camarada Carlos Silvca. Consulta aqui (vd. foto de 2009).

Mas o pessoal da Tabanca Grande, teus camaradas da Guiné, de 1961 a 1974, vão-te dar uma ajuda a localziar mais malta da tua CCAÇ 417. Até uma próxima. LG


PS - A CCAÇ 417 foi mobilizada pelo RI 15, partiu para a Guiné em 6/2/63 e regressou a 18/7/65 (?)... Esteve em Empada e Bissau. Comandante: Cap Inf Carlos Figueiredo Delfino.

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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9893: Em busca de ... (187): Maria Luísa procura ex-combatentes da CCAV 1693 e do BCAV 1915, camaradas de seu marido, falecido recentemente

Guiné 63/74 - P9900: Agenda cultural (200): Apresentação do livro de Mário Beja Santos, "Adeus Até ao Meu Regresso" na Biblioteca Municipal de Pedrógão Grande, dia 18 de Maio de 2012, pelas 21h30

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 2 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9841: Agenda cultural (199): Intervenção de Mário Beja Santos na Tertúlia sobre o livro de sua autoria "Adeus até ao meu regresso", realizada no passado dia 26 de Abril em Lisboa

Guiné 63/74 – P9899: Convívios (434): Almoço comemorativo do 40.º aniversário do regresso do BCAV 2922, dia 16 de Junho de 2012 no RC 3 em Estremoz (Francisco Palma)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Palma (ex-Condutor Auto Rodas da CCAV 2748/BCAV 2922, Canquelifá, 1970/72), com data de 11 de Maio de 2012:

Estimados Camaradas e Amigos, Luís e Carlos
Venho por esta solicitar a vossa melhor colaboração no sentido de divulgarem no Blog Luís Graça & Camaradas da Guiné o programa anexo que tem para além do habitual reencontro e convívio, um incentivo especial, ou seja a celebração dos 40 anos do regresso do nosso Batalhão e que se realiza dentro das instalações do Regimento de Cavalaria 3 em Estremoz, local onde se formou o mesmo antes da partida para a Campanha na Guiné.

Um muito obrigado
Saudações de Amizade e Camaradagem
Francisco Palma


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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 – P9884: Convívios (251): 7º Encontro da CCAÇ 1426, 7 de Julho de 2012, em Vila Amélia (Fernando Chapouto)

Guiné 63/74 - P9898: Excertos do Diário de António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (16): Guidaje foi há 39 anos...

1. Sobre Guidaje, há uma referência apenas do Diário da Guiné (1972/74) (*), da autoria do nosso camarada e amigo António Graça de Abreu. Vem na entrada "Mansoa, 26 de Maio de 1973"... 

Colocado com alf mil de secretaria num CAOP1 (Mansoa), o António Graça de Abreu  estava relativamente bem colocado para ir sabendo das novas da guerra... Muito  melhor colocado do que qualquer um de nós, que fomos operacionais mas atuámos sobretudo a nível de setor ou subsetor, com uma visão necessariamente fragmentada e parcelar da situação operacional e político-militar...

Este documento diarístico vale também, para a historiografia da guerra colonial na Guiné,  por nos dar uma outra visão, e aliás bastante interessante, a  do estado de espírito ou do moral das nossas NT... Neste caso há referência explícita a tropas especiais, uma companhia do BCP 12 que regressa de Guidaje, e a 38ª CCmds (adida ao CAOP1) que parte para Guidaje...

Amigos e camaradas, leitores do nosso blogue: O "inferno de Guidaje" começou justamente a 8 de maio de 1973, faz agora 39 anos... Dizem os historiógrafos militares Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes que a operação de auxílio a Guidaje, reabastecimento e contra-ofensiva durou um mês (de 8 de maio a 8 de junho de 1973), e envolveu mais de mil homens das NT (na sua maioria, tropas especiais, comandos, fuzileiros e paraquedistas). Nunca é de mais evocarmos, nestas efemérides, o pesado sacrifício que foi pago pelos combatentes, de um lado e de outro, envolvidos nesta e noutras batalhas sangrentas da Guiné, ligadas a topónimos estranhamente começados por G (Guidaje, Guileje, Gadamael, Gandembel)...

 Recorde-se, mais uma vez,  para os eventuais leitores interessados,  que há uma edição comercial do livro do AGA. Referência completa: António Graça de Abreu - Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura. Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp. (*) (LG) 


Mansoa, 26 de Maio de 1973

[, Na foto, o AGA, na estrada Mansoa- Porto Gole, em 1973, a G3 numa mão e a máquina fotográfica na outra]

A Guiné ferve, até de boatos. Tenho a vantagem de estar razoavelmente bem informado sobre o que vai acontecendo. 

O PAIGC, confiante e moralizado, passou à ofensiva. Começaram há quinze dias atrás por se concentrar em Guidaje (**), na fronteira norte e agora sobre Guileje, na fronteira sul, as duas povoações trissilábicas, ambas começadas por “Gui”, sinónimo de desespero e morte. 

Um alferes pára-quedista meu amigo que passou agora por aqui com os seus homens vindos de Guidaje a caminho de Bissau, rotos, sujos, barbas de dias, os olhos afundados no nada, disse-me: “Lá para cima é só ferro, não se pode ir.” 

Guidaje, embora flagelada continuamente há mais de duas semanas, tem-se aguentado. Não se pode ir para lá, mas ontem quase toda a 38ª. Companhia de Comandos partiu para Guidaje. Os quarenta homens que lá haviam estado, com o nosso David Viegas que aí morreu, permaneceram em Mansoa. Já tinham tido um morto e o soldado Tavares sem um pé. Foi triste ver partir os restantes. Formaram a Companhia, saudaram toda a gente.

Antes houve bebedeiras, risadas secas a tentar afugentar o medo, a incerteza de voltarem vivos. A zona de Guidaje está cheia de guerrilheiros, a terra fica a quinhentos metros do Senegal – dizem-me que a pista de aviação entra por dentro do território do Senegal, – e, do outro lado, em Cumbamori no país do Senghor, os combatentes do PAIGC têm uma grande base militar. 

A partir de Bissau, lançou-se uma operação com o batalhão dos Comandos Africanos, cerca de 500 homens, sobre Cumbamori. Saiu um comunicado especial das Forças Armadas onde se refere a destruição do quartel de Cumbamori, só não se diz que este quartel fica no Senegal, tudo mais está mais ou menos correcto. O número de elementos IN abatidos, cento e sessenta e sete no total, é que pode criar algumas confusões porque engloba civis, às vezes mulheres e crianças, tudo o que aparece à frente e é suspeito de estar com os guerrilheiros, é frequentemente abatido. Na retirada, os Comandos Africanos foram atacados por blindados senegaleses e sofreram vinte e tal mortos.

O pessoal anda amedrontado. Ontem na messe, ao jantar, quase todos saltaram das cadeiras, ouviu-se um rebentamento. Afinal era a porta do frigorífico.

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Nota do editor:


(**) Sobre Guidaje temos mais de 140 referências no nosso blogue. Sobre a intervenção da CCP 12/BCP 12 bem como da 38ª CCmds ver aqui os seguintes postes de camaradas nossos:

Victor Tavares (CCP 121/BCP 12) [, foto à direita]:

25 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1212: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (1): A morte do Lourenço, do Victoriano e do Peixoto

9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1260: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (2): o dia mais triste da minha vida

26 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1316: A participação dos paraquedistas na Operação Ametista Real: assalto à base de Kumbamory, Senegal (Victor Tavares, CCP 121) 


Amílcar Mendes (38ª CCmds) [, foto à esquerda]

27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1123: Um espectáculo macabro na bolanha de Cufeu, em 1973 (A. Mendes, 38ª Companhia de Comandos)

22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1201: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (3): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (I parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1203: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (4): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (II Parte)


23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1203: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (4): De Farim a Guidaje: a picada do inferno (II Parte)

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1205: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (5): uma noite, nas valas de Guidaje
 

24 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1210: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (6): Guidaje ? Nunca mais!...

Aniceto Afonso  [, foto à esquerda,] e Carlos Matos Gomes, [, foto à direita,] historiógrafos militares [, tendo o segundo participado na Op Amestista Real, como oficial do BCA]


21 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1198: Antologia (53): Guidaje, Maio de 1973: o inferno (Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes)

(...) "Para cercar Guidaje, o PAIGC começou por cortar o itinerário de Binta e instalar sistemas antiaéreos com mísseis Strela. O isolamento aéreo de Guidaje iniciou-se com o abate de um avião T-6 e de dois DO-27 e o terrestre acentuou-se em 8 de Maio, quando uma coluna que partira de Farim, escoltada por forças do Batalhão de Caçadores 4512, accionou uma mina anticarro e foi emboscada, sofrendo 12 feridos. 


"Em 9 de Maio, a mesma força foi de novo emboscada, mantendo-se o contacto durante quatro horas.

"A coluna portuguesa sofreu mais quatro mortos, oito feridos graves, dez feridos ligeiros e quatro viaturas destruídas, deslocando-se então para Binta, em vez de subir para Guidaje" (...).

(...) "Em 23 de Maio, saiu uma coluna de Binta para Guidaje protegida por uma companhia de pára-quedistas [, a CCP121]. A coluna regressou ao ponto de partida, porque a picada estava minada em profundidade, e a companhia de pára-quedistas, apesar de ter sofrido violenta emboscada feita por um grupo de cerca de 70 elementos, que lhe causou quatro mortos, chegou a Guidaje " (...). 

(...) "Em 29 de Maio, foi organizada uma grande operação para reabastecer Guidaje. Constituíram-se quatro agrupamentos com efectivos de companhia em Binta e dois agrupamentos em Guidaje, estes para apoiar a progressão na parte final do itinerário. A coluna alcançou Guidaje nesse dia, tendo sofrido dois mortos e vários feridos" (...).

(...) "Em 12 de Junho, considerou-se terminada a operação de cerco a Guidaje. Uma coluna partiu desta guarnição para Binta, trazendo o tenente-coronel Correia de Campos, que comandara o COP3 durante este difícil período.

"Baixas das colunas de e para Guidaje, entre 8 de Maio e 8 de Junho de 1973: Mortos: 22; Feridos: 70; Viaturas destruídas: 6.

"Em suma, o primeiro objectivo do PAIGC foi isolar Guidaje, o segundo foi flagelar a posição e destruir o espírito de resistência das forças portuguesas e o último seria conquistar a povoação. 

"Guidaje sofreu, entre o dia 8 e o dia 29 de Junho, 43 flagelações com artilharia, foguetões e morteiros. Logo no dia 8 esteve debaixo de fogo por cinco vezes, num total de duas horas, em 9 sofreu quatro ataques, em 10 três, e até ao final todos os dias foi atacada. No total dos 43 ataques, a guarnição de Guidaje sofreu sete mortos, 30 feridos militares e 15 entre a população civil. Foram causados estragos em todos os edifícios do quartel" (...).

Sobre Op Ametista Real, ver ainda:

16 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXV: Antologia (16): Op Ametista Real (Senegal, 1973) (João Almeida Bruno)

Ainda sobre Guidaje, vd aqui tambémo depoimento de José Afonso, que pertenceu à CCAV 3420:

Guiné 63/74 - P9897: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (52): Encontro o Leopoldo Amado na Feira do Livro de Lisboa, 4 anos depois de Bissau: está agora no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, como investigador no programa de pós-doutoramento (Luís Graça)



Lisboa > Parque Eduardo VII > 82ª Feira do Livro de Lisboa, 2012 > 12 de maio de 2012 > O nosso amigo Leopoldo Amado, ladeado pela Alice, Luís, João e Joana... Mais uma prova de que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... Tanto o Leopoldo como a família Graça (com exceção da Joana) têm morança na Tabanca Grande.





1. Imaginava-o em Cabo Verde, na cidade da Praia, transmitindo aos seus alunos caboverdianos o seu largo e profundo saber de guineense, português, cidadão do mundo, em matéria de história contemporânea, e mais exatamente da história recente da nossa amada e sofrida Guiné-Bissau... Mas, não, o Leopoldo está, no ano letivo em curso, a trabalhar na Universidade de Coimbra, no prestigiado Centro de Estudos Sociais, onde é investigador no programa de pós-doutoramento.


Andava eu, mais o João, acabado de chegar de umas férias na Índia, a visitar a feira do livro, mais a Alice e a Joana (enfim, não é todos os dias que se reúne a família toda!), quando dou de caras com o nosso grã-tabanqueiro Leopoldo Amado, amabilíssimo, como sempre, e que de imediato nos reconheceu a todos. Já não o via pelo menos desde Março de 2008,  na altura em que estivemos junto no Simpósio Internacionald e Guiledje (Bissau, 1-7 de março de 2008).


No sábado passado, dia 12 de maio, às 18h30, tinha-se realizado, no auditório da APEL - Associação Portuguesa dos Editores e Livreiros, na 82ª Feira do Livro de Lisboa, no Parque Eduardo VII,   uma "Mesa Redonda sob o tema: História e Literaturas em Língua Portuguesa: Expressões da Diversidade" (que eu lamentavelmente perdi)... O nosso Leopoldo Amado era um dos oradores, a representar a sua terra natal... Já agora tome-se boa nota dos restantes escritores lusófonos que participaram nesta iniciativa inserida no âmbito da Semana Cultural da  CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa,

Oradores: 


Pires Laranjeira (moderador) – Portugal; 
Luís Kandjimbo - Angola; 
Luís Carlos Patraquim – Moçambique; 
Luis Costa – Timor; 
José Luís Hopffer Almada – Cabo Verde; 
Maria Esther Maciel – Brasil. 


 E já agora, que estamos em maré de lusofonia, acrescente-se que a CPLP também marcou presença marcada no último dia da Feira do Livro de Lisboa, domingo, 13,  com uma sessão de lançamento de livros de autores lusófonos residentes em Portugal, entre outros originários dos Estados-membros da CPLP, sessão que decorreu no Pavilhão da Câmara Municipal de Lisboa,   na 82ª Feira do Livro de Lisboa. Obras apresentadas com respectiva sessão de autógrafos:

“Marcas da guerra” e “Lexical Doutrina” de Lopito Feijó  [n. 1963, poeta e ensaísta angolano]
"Paraíso Apagado por um Trovão" de José Luís Tavares [n. 1967, poeta caboverdiano, a residir em Portugal]
“O Processo dos Cinquentas - Tempo e Memória (1940-1962) - Considerações Históricas” e “Américo Boavida – Tempo e Memória” de Fernando Correia, pseudónimo literário de do angolano Fernando Edviges Chasse
“Antologias de Poesia da Casa dos Estudantes do Império – 1951-1963 – Angola, S. Tomé e Príncipe e Moçambique I e II Volume” de Aida Freudenthal [, investigadora reformada do IICT - Instituto de Investigação Científica Tropical], edição da Associação Casa dos Estudantes do Império.






2. Recorde-se que o Leopoldo Amado é, historicamente,  o segundo guinense, depois do  Pepito, a integrar o nosso blogue. É um dos nossos mais antigos grã-tabanqueiros. Está neste neste momento como investigador no programa de pós-doutoramento da UC.  Achei-o bem, de boa saúde, e otimista q.b., em relação à atual crise guineense. "Há uma nesga de oportunidade de que esta seja a última crise de reime, levando de facto à reforma das forças armadas e, se não mesmo, à sua abolição e refundação".


Como estamos "proibidos" de falar, no blogue,. da atualiddae política (entenda-se: político-partidária) dos nossos dois países, a nossa conserva fica só por aqui.


Da página da CES/UC recolhemos, entretanto,  os seguintes elementos biográficos a seu respeito:

 Universidade de Coimbra > CES > Leopoldo Amado

 (i) Nasceu em 1960 no Sul da Guiné-Bissau. 

(ii) Licenciou-se em História em 1985 pela Faculdade Letras de Lisboa - Universidade Clássica de Lisboa. 

(iii) Antes de voltar à Guiné-Bissau em 1989, concluiu em 1987 o Curso de pós-graduação em Relações Internacionais (Estudos Islâmicos) pela extinta Universidade Internacional de Lisboa e frequenta entre os anos de 1987-1989 o curso de mestrado em Estudos Africanos no Institituto de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa. 

(iv) Na Guiné-Bissau, tornou-se investigador do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas).

(v) Nesse país, desempenhou, sucessivamente, as funções de: Director do mensário "Baguera"; Director Comercial do Geta-Bissau (empresa privada);Vice-Presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos; Director do "Tcholoná", única Revista Cultural então existe no país. 

(vi) Trabalhou ainda na Guiné-Bissau como consultor nacional e internacional, destacando-se, entre outros, os trabalhos em matéria de gestão de projectos e planificação estratégica, desenvolvidos com a UNICEF, PLAN INTERNATIONAL, PNUD, FNUAP, RADDA BARNEN e AMNISTIA INTERNACIONAL, para além das funções de correspondente e de comentador político da BCC, Rádio France International, Voz de América, RDP África e RTP África. 

(vii) No além-fronteiras, com sede em Cabo Verde, e cobrindo outros países como Senegal, Guiné-Bissau, Gana, Guiné-Conacri e Gâmbia, trabalhou ainda como Director do SPHAC - Projecto da UNESCO para a Salvaguarda do Património Histórico da África Contemporânea, entre os anos 1995 à 2001. 

(viii) Posteriormente, em Portugal, antes de concluir um Doutoramento em História Contemporânea pela Universidade de Lisboa (2007), trabalhou como Secretário Executivo da “Guineáspora” (Fórum Mundial dos guineenses na Diáspora);

(ix) Tendo posteriormente regressado a Cabo Verde, onde, desta feita, trabalha junto da Uni-CV (Universidade Pública local), desde 2008 à esta parte, desempenhando aí, designadamente, as funções de docência em cursos de graduação (licenciaturas em História e Ciências Sociais) e em cursos de pós-graduação(mestrado em Ciências Sociais), para além de outras funções que assumiu, concomitante e alternadamente, como sejam as de Coordenador de Curso de História (Chefe de Departamento) e de Presidente do Departamento (Faculdade) de Ciências Sociais e Humanas. 

Guiné 63/74 - P9896: Notas de leitura (360): Marcello Caetano, Silva Cunha e a Guiné (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 10 de Abril de 2012:

Queridos amigos,
Às vezes faz bem retornar sem pressas às fontes escritas e rever o que os dirigentes políticos propuseram para a questão guineense. É curioso verificar que todos aqueles que se pronunciam sobre o assassinato de Cabral não cuidem de atender às súplicas de Spínola a Caetano para ter um encontro com Cabral, documento político da época, o que nos leva a perguntar se era imaginável que alguém que implorava conversações com um dirigente político tivesse alguma responsabilidade com a sua morte. E Silva Cunha, como veremos, também nos reserva surpresas.

Um abraço do
Mário


Marcello Caetano, Silva Cunha e a Guiné  (1)

Beja Santos 

É fundamental carrear para o blogue elementos doutrinais e informativos provenientes dos ideólogos políticos do regime deposto em 25 de Abril de 1974 e dos seus críticos.
A descolonização da Guiné possui ainda meandros de interpretação confusa e que requer o cruzamento de leituras, de olhares. Nesta aceção, é indispensável cruzar o que se disse antes do 25 de Abril com o que se escreveu depois. Por exemplo, no seu “Depoimento”, a primeira obra que Caetano escreveu no Brasil, ele refere uma reunião do Conselho Superior da Defesa Nacional em que questionou se a Guiné era defensável, tendo escrito que o marechal Costa Gomes respondera afirmativamente. Na longa entrevista que este oficial deu à historiadora Manuela Cruzeiro, afirmou perentoriamente que a Guiné era defensável nos termos da nova manobra do dispositivo que iria ser recuado até os aquartelamentos das nossas tropas não ficarem ao alcance dos morteiros 120. E mais afirmou que teria dito que a Guiné era defensável desde que não entrasse em ação a aviação que iria ser posta à disposição do PAIGC. Ficámos igualmente a saber que as atas deste Conselho Superior de Defesa Nacional desapareceram misteriosamente.

Enfim, é da maior utilidade pôr em cima de mesa os argumentos e deixar os historiadores falar. Na sequência do “Depoimento”, Marcello Caetano concedeu entrevistas que apareceram sobre o título “O 25 de Abril e o Ultramar”, sobre os quais é muito raro os estudiosos pronunciarem-se. Ora este texto é, a vários títulos, da maior importância. Logo a páginas 12, Caetano admite que a política que estava a executar “deveria conduzir à independência dos grandes territórios, criando condições para se tornarem Estados”. Os documentos que anexa incluem uma carta ao General Spínola, datada de 26 de Fevereiro de 1973, que é uma peça de filigrana da epistolografia política, onde quer que seja. As relações mútuas arrefeceram, Caetano justifica-se pelo facto de ter proibido uma entrevista de Spínola a um periódico nacional, bem como o litígio decorrente do estatuto da Guiné. Spínola responde em 6 de Março e justifica o seu desapontamento por sentir que a “autonomia progressiva” é alvo de calúnias e que o próprio presidente do governo dela se está a afastar. E há um trecho que pode ser uma mais-valia para perceber como os dois entraram em rota de colisão: “Afirmou-me Vossa Excelência que tendo os africanos optado pela intolerância face à presença do branco, qualquer solução política corresponderia a apressar a nossa saída de África; ouvi também a Vossa Excelência a opinião de que mais facilmente aceitaria uma derrota militar do que uma solução política que implicasse quaisquer concessões; e, anteriormente, já Vossa Excelência, perante a perspetiva de um cessar-fogo, me tinha expressado opinião de que considerava inconveniente o termo da guerra da Guiné por tal facto originar a deslocação da luta para o arquipélago de Cabo Verde”.

E Spínola brande um argumento que irá funcionar nas justificações que levarão ao 25 de Abril: “Uma tal hipótese, a meu ver, só nos oferece como alternativa o prolongamento da atual situação de desgaste até que a Nação se esgote ou, a exemplo da Índia, sobrevenha uma derrota militar, pois não vejo, no quadro da análise ponderada da situação militar, que outras alternativas se nos oferecem na hipótese de rejeição das outras soluções políticas. Não ignoro que uma derrota militar possa ser encarada em certos sectores como fatalidade solucionadora; mas se a derrota militar pode oferecer à expiação os seus responsáveis imediatos, a história não deixará de julgar quantos a não souberam evitar”. E depois espraia-se sobre o federalismo, as negociações que deviam ter continuado com o presidente Senghor, reafirma a fórmula de autonomia progressiva e o esforço desenvolvido na Guiné quanto à africanização das instituições, conservando no seu seio os germe de portugalidade.

Caetano responde a 22 de Março, volta a justificar porque não aceitou a proposta do encontro de Spínola com Amílcar Cabral, seria um precedente de consequências incalculáveis: “E era quanto a esse precedente que eu dizia preferir perder a Guiné por derrota militar, mas combatendo pelo nosso direito, do que entregá-la em negociação mais ou menos feliz”. E desloca o teor da conversa para o facto de o PAIGC ser liderado por cabo-verdianos e que a independência da Guiné levaria a deslocação da guerra para Cabo Verde. Para Caetano, “É na África austral que se joga verdadeiramente o nosso destino ultramarino. Se fosse só a Guiné, tudo seria para nós muito mais fácil”.


Silva Cunha escreve o seu livro “O Ultramar, a Nação e o 25 de Abril” em 1977, publica-o na Atlântida Editora. Temos aqui outro documento de incalculável valor. O último ministro da Defesa Nacional de Caetano e que esteve no governo no Ministério do Ultramar durante 12 anos tece justificações sobre a grande opção ultramarina, dando uma panorâmica do ambiente internacional do pós-guerra, como se processou a subversão da África portuguesa e as diretrizes para a defesa militar. Aí a páginas 40, refere abundantemente a Guiné: as preocupações de Senghor, quer com a Guiné Conacri quer com a passagem de material do PAIGC pelo seu território. Fala também de preocupações da Nigéria, da incógnita da atitude dos EUA e da tentativa de Senghor contribuir para o cessar da luta na Guiné, isto logo em 1963 e afirma explicitamente: “O Doutor Salazar deu abertura à solução que infelizmente, porém, não chegou a concretizar-se”.

Mesmo depois do corte de relações diplomáticas entre Portugal e o Senegal não pararam as diligências para o fim da Guerra. Foi a Dakar o Dr. Alexandre Ribeiro da Cunha acompanhado pelo inspetor da DGS em Bissau, Matos Rodrigues. Senghor pedia a suspensão das operações militares para poder ter contactos com os chefes do PAIGC e encontrar uma forma aceitável para ambas as partes. “Foi decidido transmitir instruções ao Governador e Comandante-Chefe da Guiné para que evitasse lançar operações ofensivas, limitando-se à defesa contra eventuais ataques dos guerrilheiros”. Factos subsequentes levaram a crer que as diligências do Senegal não interessavam ao PAIGC. Houve ainda encontros entre autoridades senegalesas e portuguesas em Paris, com carácter altamente secreto. Sugeriu-se a escolha de uma personalidade imparcial que pudesse vir a fazer um juízo objetivo sobre a ação do PAIGC e das forças portuguesas com o objetivo último de evitar novos incidentes transfronteiriços. Os contactos seguintes fizeram-se por intermédio do General Spínola. O resultado da reunião foi transmitido em Lisboa: Senghor oferecia-se como medianeiro para obter uma suspensão nas hostilidades, primeiro passo para entabular conversações com o PAIGC. Discutiu-se politicamente o que seriam as consequências desse cessar-fogo. E veio a avaliação feita por Silva Cunha: “Embora se começasse a fazer sentir no país, mas especialmente nas forças Armadas, um certo cansaço da luta, a verdade é que a opinião pública não estava preparada para aceitar uma mudança radical na orientação da política ultramarina”. Realizou-se uma reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional presidida por Américo Tomás para tratar da questão da Guiné. Todos os presentes concluíram não haver razão para seguir as sugestões de Senghor e que eram defendidas acerrimamente por Spínola.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9886: Notas de leitura (359): As grandes Operações da Guerra Colonial (3), edição do "Correio da Manhã" (Mário Beja Santos)