segunda-feira, 9 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10136: Cartas do meu avô (12): Décima carta: a casa das Quintãs, Aveiro (J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil, CCAÇ 728, Bissau, Cachil e Catió, 1964/66)



Região de Tombali > Catió > 2009 > Meninos de Catió... Muitos anos depois de lá estado o J. LMendes Gomes,  há uma jovem portugesa, cooperante e membro da nossa Tabanca Grande,  Marta Ceitil, que escreve o seguinte sobre a sua estadia  a Catió, em mail de 3 de setembro de 2009:


(...) "Segunda-feira viemos para Catió. A viagem foi tranquila, tinham-nos dito que ia ser horrível que as estradas estavam más... nada disso foi mesmo 'Shanti Shanti'. Catió fica no Sul da Guiné e é lindo, lindo. Aqui sim, sinto e vejo a Guiné que idealizei: paisagem verde, que contraste com o castanho das tabankas. Aqui as pessoas são bem mais calmas, parecem alentejanos. Estamos muito bem instaladas, na Missão Católica. O Padre Maurício (italiano) é uma personagem, muito bem disposto, tem 60 anos, e tirando o meu pai, é dos homens mais charmosos que alguma vez vi na vida (...). , Para além do seu aspecto físico faz umas massas óptimas. Está na Guine desde 1973 e é um espectáculo ouvir as suas histórias. A missa também é qualquer coisa…, primeiro é dada em crioulo e depois a música é tocada com djambés. Segunda-feira começamos a dar a formação aos professores. Este vai ser o nosso maior desafio, mas acredito que vamos dar conta do recado" (...)


Foto: Marta Ceitil (2009)




A. Continuação da publicação da série Cartas do meu avô, da autoria de J.L. Mendes Gomes,  membro do nosso blogue, jurista, reformado da Caixa Geral de Depósitos, ex-Alf Mil da CART 728, que esteve na região de Tombali (Cachil e Catió) e em Bissau, nos anos de 1964/66. [, Foto à direita, com os netos].

As cartas, num total de 13, foram escritas em Berlim, onde vivem os netos, entre 5 de março e 5 de abril de 2012. (*)



B. DÉCIMA CARTA > A casa das Quintãs


>O apartamento de Azurva, embora razoável, era reduzido para a família. Tínhamos três filhos e queríamos ter outro. Sem perder tempo.


Naquele tempo, o custo das casas subia a olhos vistos. Se pensávamos em mudar de casa deveria ser depressa.Punha-se então, um problema. A casa de Azurva continuava sujeita às condições fixadas pela CGA, no primeiro empréstimo. Por mais dois anos, não poderíamos aliená-la livremente.


Comecei a lutar com a tentação de descobrir a forma como poderia dar-lhe a volta, sem ter problemas. Não tinha muitas pessoas com quem me pudesse abrir. Até que ponto a letra daquele contrato,  forjado nos míopes e opressivos tempos salazarentos, sem qualquer justificação actual, consistente e razoável, ainda era tida em conta pela CGA?


À letra, estaria a violar o contrato, se vendesse secretamente e ficasse com o lucro. Obrigar-me a aplicar o lucro na compra de outra habitação, necessária, ainda se justificaria. Perdê-lo em favor da CGA, isso não. Ora eu, como jurista responsável, não podia recalcitrar. Poderia pôr em jogo o meu posto de trabalho, se o fizesse.


Um dia, enchi-me de coragem e liguei para a única pessoa que conheci na CGA, com olhos arejados e que me pareceu homem de confiança. Era um segundo director, que tinha vindo do Banco de Angola,  como retornado.Estava na direcção já havia uns anos. Sabia bem como as coisas funcionavam.




Expus-lhe a questão claramente. Eu não pretendia fazer negócio com o caso. Queria apenas mudar depressa para uma moradia, a nosso gosto. Que desse para a família toda, actual e vindoura. Ele foi claro.
- Ó Mendes Gomes, esteja à vontade. Ninguém vai sobre si. Garanto. Não será o primeiro.


Mesmo assim, tive dúvidas. Era muito arriscado. Pensei noutra saída. Um novo filho vinha já a caminho. Um rapaz. Nasceria em Dezembro de 1980.

Entretanto, calhou que o irmão da nossa mulher a dias , acabava de regressar, de vez, do Brasil, devido à grande insegurança que lá se sentia. Estava farto de ser assaltado, de dia e às claras. Precisava de arranjar uma casa. A irmã, porque sabia, falou-lhe que talvez nós a vendêssemos. Que havia uns problemas mas tudo se poderia resolver.

Ele veio falar-me. Estava disposto a comprá-la , pagando tudo a pronto, se eu quisesse.
- Mas, podemos escrever um papel, o sr. É advogado- sabe bem como. O que eu quero é seriedade. Que não me falhe…Também lhe digo já: seria capaz de lhe dar um tiro na cabeça se faltasse à sua palavra…disse-mo ele naquele jeito próprio dum brasileiro que vinha lá do Rio de Janeiro, onde era pior que viver na selva.

Fiquei a pensar. Com um contrato promessa de compra e venda, poderia satisfazer as condições básicas, sem ofender o contrato. A venda real só se efectuaria daí a dois anos. Até lá, pagar-me-ia por mês uma importância igual à que eu tinha de pagar à CGA e esta importância abateria ao preço fixado.

Todo eu tremia de pavor quando, um dia, assinamos o contrato. Terei envelhecido uns bons anos naqueles dois que se seguiram, apareceram-me os primeiros e imensos cabelos brancos nas barbas e na cabeça, passei muitas horas da noite, em claro, sempre à espera de ser chamado à responsabilidade. Sempre à espera do pior. Que houvesse uma denúncia. Principalmente, quando a Filial era visitada pela inspecção.

Ainda hoje estou para saber se a CGA na sede, teve conhecimento. Penso que sim. Haveria gente na filial bem capaz de me denunciar…e se ufanar com a minha demissão.

Fosse pelo que fosse, nunca ninguém pediu contas. A situação objectiva justificava-a bem. E, não havia ninguém que fosse capaz de me acusar de corrupção, por um único centavo ou minúsculo favor remunerado. Enquanto toda a gente sabia de muitos que o faziam… às claras.

Dum momento para o outro, apareceram carros de luxo, pagos a pronto, não se como…em quem, notoriamente, não ganhava para tanto.
A casa das Quintãs era uma moradia nova, geminada, com quatro quartos, garagem e um bom quintal.  Ficava no meio rural. Rua do Sol  [,Vd. Google > Maps]  era o nome da rua onde ficava.

Certo, na escolha. Ali, os miúdos puderam conviver com outro mundo. Seguiram, sem dar conta às sucessivas tarefas de quem tem de tirar da terra o pão para comer. Desde o lavrar dos campos com tractor, ao pestilento adubar da terra à moda antiga, ao esverdear das searas de milho e ao seu amadurecimento. As carradas de bois, a esbordar de erva ou feno para o gado, o gado a pastar, o leite quentinho a sair das tetas das vacas da vizinha, ao pequeno almoço e a manteiga que dele se tirava... O corropio nas bicicletas à solta pelas veredas, os papagaios multicores, em plástico a voar ao vento...

Enfim um sem número de novas vivências que nunca mais esqueceram. Nela podia receber a visita dos avós, sempre que o quisessem, com muita felicidade para todos nós e p’ra eles.

Ali abri o meu escritório de advogado. Fui procurado por muitas pessoas.Alarguei assim e pus em prática outras vertentes do meu curso. Com proveito material e
imaterial. Os filhos cresceram. Entraram nas universidades e foram à sua vida. J.L.

J. L. Mendes Gomes
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Ponte de Lima > 8º Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima > Jardins de Comer 7 de junho de 2012 > Algumas fotos... para se repensar os conceitos de cidade, campo, jardim... e um convite para visitar. Até outubro de 2012. "Há quem veja a árvore / e nunca descortine a floresta; há quem veja a flor / e nunca descubra o jardim" (LG)...

Fotos: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados.

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Guiné 63/74 - P10135: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (3): A cobra cuspideira

1. Terceira e última história enviada pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), em mensagem no dia 30 de Junho de 2012.


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL (3)

A COBRA CUSPIDEIRA

Embora o maioria do pessoal da minha Companhia fosse constituída por Soldados do norte do país, nomeadamente de Trás-os-Montes, portanto por pessoas habituadas a trabalhar no campo e a lidar com os mais variados animais, ou seja, sem qualquer medo de bichos, sempre havia um outro que, pelos mais diversos motivos, não podia ouvir falar em cobras.

Foi uma dessas situações que levou a que se inventasse que já se havia visto perto do quartel cobras cuspideiras, bicho terrível que poderia cegar uma pessoa, ao cuspir o seu veneno para os olhos. Era uma realidade, no entanto ainda hoje desconheço se existem ou não cobras cuspideiras na Guiné, não tendo isto na altura passado de uma mera invenção para assustar um dos Soldados, que tinha um terrível pavor que tal lhe viesse a acontecer.

Mal ouvia o rastejar de um rato ou de um lagarto em cima da chapa que cobria o abrigo, aí estava ele em alerta total. Lembro-me que a esses lagartos chamávamos de “paga dez”, por estarem sempre a fazer o que pareciam flexões. Para em definitivo (ou não) se tentar acabar com aquela fobia, alguém um dia se colocou no lado de fora numa das vigias do abrigo imitando o rastejar e o silvo de uma cobra, para atrair o coitado do Soldado, que estava na sua hora de descanso.
Para completar a situação, outro entrou no abrigo a gritar que lá fora estava uma enorme cobra. Tendo aquele espreitado pela vigia para ver se via algo, é-lhe despejado um valente bocheco de água nos olhos.

Escusado será dizer que o infeliz deitou a correr para o meio da parada, com alguns trambolhões pelo meio, pois tentava tapar os olhos com as mãos, gritando:
- Estou cego, estou cego, estou cego.

Destas coisas sim, tenho saudades.

Augusto Silva Santos

Jolmete, Agosto de 1972 > Estrada velha de Bula

Jolmete, Agosto de 1972 > Regresso da segurança à água

Jolmete, Outubro de 1972 > Convívio

Jolmete, Novembro de 1972 > Bolanha de Ponta de S. Vicente
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10127: Estórias dos Fidalgos de Jol (2) (Augusto S. Santos): A noite da hiena

Guiné 63/74 - P10134: Notas de leitura (378): O Meu Diário, Guiné - 1964/1966, CCAÇ 674, de Inácio Maria Góis (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 21 de Maio de 2012:

Queridos amigos,
Foi graças ao confrade Carlos Pedreño Ferreira que tive acesso a este documento singularíssimo a vários títulos.
O soldado Inácio Maria Góis, da CCAÇ 674 ultrapassa, de longe, tudo quanto até agora conhecemos como diários: desvela a intimidade, temos acesso aos seus pensamentos, há momentos em que parece que ele está a escrever para a História, reiteradamente comunica ao leitor que tudo quanto escreve é com base em factos reais e verídicos, regista os seus amigos, fala permanentemente da péssima comida e ficamos com uma ideia de como evoluía a guerra naquela região onde ele passou grande parte da comissão, Fajonquito. É impressionante como desvela a alma e como se determinou a publicar na íntegra tudo o que escreveu.

Um abraço do
Mário


O diário do soldado Inácio Maria Góis (1)

Beja Santos

É um documento impressionante, pela indiscutível sinceridade e singeleza. Arranca assim: “Eu, Inácio Maria Góis, filho de Luís Justo Pereira de Góis e de Bárbara Antónia, natural dos Gasparões, concelho de Ferreira do Alentejo. No dia 2 de Agosto de 1962, fui alistado com toda a prontidão para cumprir o serviço militar obrigatório. Em pleno mês de Setembro de 1963, encontrava-me eu trabalhar na vila da Batalha, onde exercia a profissão de operador de máquinas de terraplanagens”. Tinha que se apresentar no RI 3, em Beja, em 20 de Outubro. Despediu-se dos colegas de trabalho e embarcou para Porto Covo para se despedir do pai e da namorada. Vão seguir-se 400 páginas do relato mais minucioso que até hoje me foi dado ler quer como diário ou relato memorialístico. “O Meu Diário, Guiné – 1964/1966 - CCAÇ 674”, por Inácio Maria Góis (edição de autor, 2006) foi-me amavelmente emprestado pelo nosso confrade Carlos Pedreño Ferreira. O autor agradece o apoio da Junta de Freguesia de Porto Covo, onde três funcionários dedicadamente transcreveram na íntegra os textos escritos.

Inácio Góis entra no quartel de Beja, descreve os pormenores da instrução e da preparação e depois regressa a Porto Covo para visitar quem ama. Revela-se em toda a sua intimidade: “Desci do autocarro, peguei na minha mala e caminhei em direção à casa do meu pai, bati à porta, veio a minha madrasta, que me lançou um olhar de arrepiar, ela não gosta de mim, nunca gostou. Eu nunca lhe faltei ao respeito, apenas lhe disse que venho visitar os meus irmãos e o meu pai, é ela que manda, põe e dispõe à sua maneira, é mais nova que o meu pai 10 anos. Tudo quanto ganhei até entrar para o serviço militar o meu pai se aproveitou da minha inocência e eu acreditei na boa-fé do meu pai, que afinal traiu o próprio filho e praticamente o abandonou, dizem que há Deus e eu tenho que acreditar. Vim também para ver a minha namorada, de quem gosto muito e me dá carinho e algum alento”.

Descreve a faxina à cozinha e deixa-nos o estômago revoltado: “O feijão é retirado de dentro dos sacos, não é lavado nem limpo, leva alguns quilos de sódio para ser cozido mais rápido. As couves são cortadas ao meio e não são lavadas, atiram-nas assim para dentro das panelas, apenas as batatas são lavadas. É por isso que aparecem nos nossos pratos lesmas e lagartas”. Olhando para os seus próximos, comenta em Novembro: “Aqui nos encontramos aproximadamente mil jovens a tirar a recruta. As suas idades variam entre os 21 e os 22 anos. Na sua maioria são do Alentejo e Algarve e os restantes vêm do Ribatejo, Norte e Lisboa”. Conta detalhadamente toda a instrução, incluindo as idas ao campo. Em meados de Dezembro vai visitar em Gasparães a mãe e as irmãs. Segue-se o juramento de bandeira e o fim da recruta. Passa o Natal em Porto Covo. Nesse dia escreve: “Eu e a as minhas duas irmãs e a minha mãe não convivemos junto há já alguns anos, o destino assim o quis. Durante o meu percurso de criança não soube o que foi o verdadeiro carinho e amor de mãe. O Natal para os mais pobres é apenas um dia ao qual se chama Natal”.

E de Beja segue para Évora. É aqui que se está a formar a CCAÇ 674. Conhece o comandante da companhia, “tem 27 anos de idade, é baixo, usa óculos graduados e escuros, é natural da Mexilhoeira Grande”, apresenta todos os aspirantes e cabos milicianos. Segue-se a instrução militar e em 27 de Fevereiro de 1964 veio-lhe à memória um encontro com uma madre superior. Trabalhava ali na companhia do pai, em terraplanagem para o novo colégio das irmãs Doroteias. A madre superior fez questão de colocar uma imagem de Nossa Senhora de Fátima na capota da máquina e veio dizer a pai e filho que deviam ir à missa, Inácio Góis nunca esqueceu este episódio. A CCAÇ 674 segue para Faro, seguem-se exercícios militares de diferente índole, recebem fardamentos novos e no dia 1 de Maio ficam a saber que estão mobilizados para a Guiné. Volta a Porto Covo para se despedir de quem mais gosta, com detalhes inenarráveis, por vezes especiosos e miudinhos, ficamos a saber como vai e volta, com quem conversa, onde toma refeições, etc. E de Faro viajam para o embarque no Uíge, há muita tristeza e lágrimas nas estações por onde passa o comboio, Inácio Góis regista que nem o pai se veio despedir: “O navio apitou por três vezes e eu estremeci e não consegui deter as lágrimas. Os gritos, os lenços que nos acenavam eram aos milhares”. Tiradas as amarras, dois rebocadores levam o Uíge para a foz do Tejo. Viaja intranquilo, interroga-se sobre o que está a fazer ali, ninguém lhe explicou até agora em que guerra é que vai participar. Desembarcam em 13 de Maio.

Não esquece as indelicadezas, estavam a montar um aquartelamento improvisado num armazém junto ao Geba, encontrava-se ali a CCAÇ 675, ele dirigiu-se à cozinha desta companhia e o cozinheiro Vilhena recusou a dar-lhe comida e ele disse: “Eu sou da tua terra, negas-me uma marmita de comida, obrigado". Registou o número mecanográfico e o seu nome completo. Procura amigos em Bissau, visita o destacamento de fuzileiros e depois parte em rumo a Bambadinca e daqui para Fá. Há momentos em que o leitor tem a nítida sensação de que este relato é sonido como uma crónica: “A CCAÇ 674, à qual eu pertenço, tem no ativo 195 militares, o que inclui 2 sargentos, 17 furriéis, 4 alferes milicianos, um alferes miliciano que é médico, um furriel enfermeiro e um capitão que é do quadro”. Passam a noite de 30 de Junho em Bambadinca e no dia seguinte vão para Fá: “Verifiquei que havia apenas 3 casas e um pequeno fontanário com água potável e um gerador elétrico. Junto às habitações há um pequeno vale onde corre alguma água, e se encontra cultivado desde bananeiras, ananases, tomates, pimentos, feijão-verde e outros. Notei que este lugar é silencioso, apenas se ouvem as aves cantar”.

A 4 de Julho põem-se ao caminho, vão para Fajonquito. Descreve a povoação e dá as suas impressões: “As casas que existem nesta povoação são muito poucas, apenas seis e uma escola que se encontra fechada. As casas que se encontram vazias foram ocupadas pelos militares, os seus proprietários saíram devido à guerra”. Começam os patrulhamentos e as idas a Bafatá, ele descreve ao mínimo detalhe o funcionamento do aquartelamento, o seu primeiro ataque de paludismo, a primeira emboscada ocorre em 21 de Julho, tinham ido num patrulhamento até uma serração abandonada. Num queixume que jamais abrandará queixa-se da qualidade da comida e observa que os sargentos e os oficiais têm uma alimentação muito superior, começam as queixas do comandante de companhia pela sua brutalidade, ele escreve que o capitão esbofeteia e humilha sem dó nem piedade. E o diário começa a registar uma expressão que nunca mais se apagará: “Vivo numa terra de ninguém”. Ele faz parte do primeiro pelotão, os patrulhamentos dilatam-se, em Agosto vão até Cambáju, estão nas proximidades de Sitató, emboscam com resultados: “Por volta das 11.30 da manhã, passou pela minha frente um homem numa bicicleta, foi feito prisioneiro e depois mandando embora”. Mais à frente emboscam, também sem resultado. Fala do capelão, das milícias, das abatises que é preciso remover das estradas e depois descreve o primeiro ataque a Fajonquito.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10125: Notas de leitura (377): Massacres em África, de Felícia Cabrita (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10133: (De) caras (12): Foi com um arrepio que voltei ao Xime e a Mansambo, ao ver o vídeo sobre o quotidiano da Cart 2339 (António Vaz, ex-cap mil, CART 1746, Bissorã e Xime, 1967/69)

1. Mensagem do nosso camarada e amigo António Vaz, ex- cap mil da CART 1746 (Bissorã e Xime, 1967/69), com data de ontem, com um comentário sobre o vídeo, excecional, de 50 minutos (, editado em duas partes), que publicámos sobre a vida e a obra dos Viriatos, o pessoal da CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo), vídeo esse  que terá passado despercebido a muitos dos nossos camaradas que conheceram a região, e/ou que foram contemporâneos dos acontecimentos:


Data: 8 de Julho de 2012 17:59

Assunto: Imagens da Cart 2339

Camaradas da Cart 2339:

Foi com um arrepio que vi as imagens do vosso e nosso quotidiano no sector L1 da Guiné onde andei com a CArt 1746 do Xime. Operações de desmatação fizemos duas ou três,  sendo uma delas a Cabeça Rapada; fui a Mansambo mais que uma vez, comandei a 2339,  se não me engano 2 vezes,  por impedimento do vosso Capitão (Soares ?) e recordo que vocês eram Malta Porreira.

Revi e revivi as picadas, a intensa chuva, os tornadinhos, as bajudas, tudo.

Um grande agradecimento e um enorme elogio pelo que me foi dado ver e pelo cuidado posto na edição das imagens que não foi de certeza tarefa fácil.

Não há nada como a TROPA MACACA que nós fomos.

Abração do António Vaz
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Guiné 63/74 - P10132: Parabéns a você (447): Adriano Moreira, ex-Fur Mil Enf.º da CART 2412; Arménio Estorninho, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAÇ 2381 e Joaquim Peixoto, ex-Fur Mil da CCAÇ 3414

Para aceder aos postes dos nossos camaradas Adriano Moreira, Arménio Estorninho e Joaquim Peixoto, clicar nos seus nomes.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P10129: Parabéns a você (443): José Zeferino, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

domingo, 8 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10131: O Nosso Livro de Visitas (142): Rodrigo Moura, de Leça do Balio, Matosinhos, ex-sold radiotelegrafista, CART 2440 / BART 2857, Piche, 1968/70... Já voltou a Bissau, desde 2000, cerca de 20 vezes...

1. Telefonou-me há dias o Rodrigo Moura. Telefonou-me do Porto. Mas mora em Leça do Balio, Matosinhos. Está, profissionalmente, ligado ao comércio automóvel. Pelo que eu percebi, a empresa representa entre outras a marca BMW. Por esse motivo tem alguns clientes em Bissau, onde vai com frequência. Desde 2000,  já lá terá ido umas 20 vezes. Costuma ficar na Residencial Coimbra. Ou no hotel onde dantes era o nosso QG, Quartel General. Conhece o Xico Allen e o António Camilo. Mas não conhece o Patrício Ribeiro nem o Pepito. 


Foi nosso camarada de armas. Era soldado radiotelegarfista da CART 2440 / BART 2857 (Piche, 1968/70). Já visitou Piche, mais do que uma vez.

Falei-lhe na Tabanca de Matosinhos e no almoço-convívio das 4ªs feiras. Ficou com curiosidade em passar por lá um dia destes. Já alguém lhe tinha falado. Também o convidei a integrar a nossa Tabanca Grande, sugestão bem acolhida.

2. Nota do nosso camarada e colaborador permanente José Martins sobre a CART 2440

(...) "Seguiu em 22 de Novembro de 1968 para Piche, a fim de render a Companhia de Caçadores nº 2403, assumindo, em 1 de Dezembro de 1968, a responsabilidade do respectivo subsector, ficando integrada no dispositivo de manobra do seu batalhão [, o BART 2857]

"A partir de 6 de Julho de 1969, destacou um pelotão para a ponte do rio Caium e desde finais de Janeiro de 1970, outro pelotão para segurança e protecção dos trabalhos de construção e reordenamento de Cambor. 


"Em 12 de Agosto de 1970, foi rendida no subsector pela Companhia de Cavalaria nº 2749 e enquanto dois pelotões seguiram desde logo para Bissau e Bolama, deslocou-se para Nova Lamego a fim de reforçar temporariamente o Batalhão de Caçadores 2893, até 20 de Setembro de 1970, e após o que recolheu igualmente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

"Observações – Tem história da unidade, que pode ser consultada, no Arquivo Histórico Militar (caixa nº 119- 2ª Divisão – 4ª Secção).

"Texto retirado do 7º Volume – Fichas das Unidades – Tomo II - GUINÉ - da Resenha Histórico Militar das Campanhas de África, edição do Estado Maior do Exército." (...).



Sobre o BART 2857, vd. também o respetivo blogue


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Guiné 63/74 – P10130: Convívios (458): VIII Encontro da CART 1742, realizado no dia 26 de Maio de 2012 em Fafe (Abel Santos)




1. O nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742, Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69) fez chegar ao nosso blogue a reportagem do VIII Encontro da sua Unidade, ocorrido no passado dia 26 de Maio na bonita cidade minhota de Fafe.


 VIII ENCONTRO DO PESSOAL DA CART 1742

FAFE - DIA 26 DE MAIO DE 2012

Conforme o estabelecido no programa, os camaradas concentraram-se às 10 horas da manhã na Praça 25 de Abril, junto ao Monumento aos Mortos da Grande Guerra
 
Os primeiros reencontros

As nossas mulheres sempre presentes

Miranda - o Polícia, Abel e Soares

Abel, Mendes e Alves

Lopes - o Pastilhas, Abel e "Pintinho"

Pelas 11 horas foi celebrada Missa na Igreja Matriz de Fafe em sufrágio de todos os camaradas falecidos

Pelas 12 horas procedeu-se à deposição de uma coroa de flores no Monumento aos Mortos do Ultramar

Pelas 13 horas segui-se o Almoço/Convívio na Quinta do Penedo em Arões - S. Romão

Bolo comemorativo do VII Encontro

A difícil tarefa de partir o bolo para ser distribuído pelos presentes

A foto de família para memória futura

No final do Encontro foram distribuídos aos ex-combatentes os certificados de presença no VIII Encontro da CART 1742. 
A cada uma das senhoras foi oferecida uma rosa.
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Junho de 2012 > Guiné 63/74 – P10081: Convívios (457): 5º Encontro da 1ª CART da BART 6520, Penafiel, 21 de Abril de 2012 (Manuel Sousa)

Guiné 63/74 - P10129: Parabéns a você (446): José Zeferino, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10106: Parabéns a você (442): António Nobre, ex-Fur Mil da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861 (Guiné, 1969/70)

sábado, 7 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10128: Vídeos da guerra (10): Vida e obra dos Viriatos - CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69) (Parte II) (Henrique Cardoso)


Vídeo (15' 03''): Henrique Cardoso. Alojado no You Tube > Nhabijoes


II parte do vídeo do ex-Alf Mil Henrique J.F. Cardoso sobre a história da CART 2339 (Fá Mandinga e Massambo, 1968/69) (*).

Cópia gentilmente cedida pelo seu/nosso camarada ex-Alf Mil Torcato Mendonça ou Carlos Marques dos Santos (um deles, já não posso precisar), para ser divulgado através do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. No total (partes I e II), o vídeo sobre a CART 2339 (1968/69) tem cerca de 50 m. Realização, digitalização e insonorização do Henrique J. F. Cardoso (Senhora da Hora, Matosinhos).

Esta subunidade esteve na zona leste da Guiné, setor L1 (Bambadinca), ao tempo do BCAÇ 2852 (1968/70) e da CCAÇ 12 (1969/71), subunidade de intervenção ao serviço daquele batalhão. Os Viriatos, nome de guerra desta subnidade de quadrícula, construiram de raíz o aquartelamento de Mansambo, entre Bambadinca e o Xitole. Participaram em grandes operações como a Lança Afiada (Março de 1969):

Sinopse da parte II:

(i) patrulhamento ofensivo e regresso ao quartel,

(ii) o Gr Comb do alf mil Cardoso vai reforçar Candamã, um das últimas tabanca fulas do regulado do Corubal, juntamente com Afiá [, possivelmente em junho de 1969];

(iii) construção do sistema de autodefesa da tabanca (arame farpado, abrigos, treino da população...)

(iv) a vida quotidiana da tropa em Candamã;

(v) uma chuva tropical (estamos em plena época das chuvas, em 1969);

(vi) coluna a Bambadinca,  com picagem do itinerário dentro do subsetor de Mansambo; (vi) regresso a casa, por avião, do alf mil Cardoso;

(vii) regresso do restante pessoal da CART 2339, por barco, no T/T Uíge.




Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor de Mansambo > Mansambo (sede da CART 2339, 1968/69) e Candamã, tabanca fula em autodefesa do regulado do Corubal > Carta do Xime (1961) > Escala 1/50 mil. Pormenor > A distância em linha reta entre Mansambo e Candamã era de 10 km... pela picada seria 15 km.

Sabemos, pela história do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), que em junho de 1969, a CART 2339 (Mansambo) tem, um Gr Com destacado na Ponte do Rio Udunduma, e outro Gr Comb em Candamã (com uma secção em Afiã); em julho, continua a ter um Gr Comb em Candamã, e outro em Galomaro (reforço do COP 7) (, neste caso, sabemos que é o ; em agosto, idem... Não sei exatamente em que data é o Torcato Mendonça deve ter ido para Candamã. Pode ter sido em junho, agosto ou até setembro...(Vd. aqui as fotos falantes de Candamã, aliás as melhores que temos, em toda a Web, sobre Candamã... faça-se o teste: Pesquisar > Google > Images > Candamã...).

Na história da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71), e relativamente à atividade do mês de agosto de 1969, pode ler-se:

(...) Candamã, tabanca fula em autodefesa do regulado do Corubal, é atacada durante mais de duas horas até ao amanhecer do 30 de Julho. Esse brutal ataque (o PAIGC utilizou um bigrupo e armamento pesado) surgiu na sequência do recrudescimento da actividade IN no tradicional triângulo Xime-Bambadinca-Xitole, após a Op Lança Afiada. (...)

Foi um mês "quente", o de julho de 1969, no setor L1, o mês em que a CCAÇ 12 teve o seu batismo de fogo... Confirmei na história do BCAÇ 2852 (1968/70), Cap. II, pag. 90, bem como na História da Minha Unidade, a CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71).

As coisas andavam bravas lá para aqueles lados (vd. carta de Duas Fontes ou Bangácia, nome do sede do posto administrativo que, com a guerra, terá perdido importância, em detrimento de Galomaro):

Na madrugada de 30 de Julho de 1969, eu estava em , ainda as armas dos defensores da tabanca fumegavam... (só registo a actividade da guerrilha que, haveríamos de saber mais tarde, era comandada pelo Mamadu Indjai, na zona de acção da tua CART 2339, Mansambo):

(i) No dia 1 de Julho, às 20h00, um Grupo IN , estimado em 30 elementos, flagelou à distância o destacamento de Dulombi [, a sudeste de Galomaro / Duas Fontes]... durante duas horas (!). Os camaradas do PAIGC utilizaram Mort 60, LGFog , Metralhadoras Ligeiras e armas automáticas. Causaram 1 morto e 7 feridos, todos civis. Retiraram na direcção Norte...

(2) Em 10, um outro grupo IN (não se sabe quantos) emboscaram um grupo de 4 civis de Dulombi, a partir de uma árvore, em Paiai Numba [, a sul de Padada, vd. carta da Padada]. Só dois dos civis consequiram regressar a Dulombi, para contar o sucedido...

(3) Quatro dias depois, a 14, por volta das 16h05, um bigrupo (cerca de 60 elementos) - que presumivelmente se dirigia a Dulombi - reagiu a uma emboscada nossa em (PADADA 2E4), com Mort 60, LGFog e armas automáticas durante cerca de 35 minutos... Antes de retirar para Sudoeste, o IN causa às NT 1 morto, 2 feridos graves (1 civil), 3 feridos ligeiros, além de danos materiais num rádio CHP (de mal o menos)...

(4) No dia seguinte, às 20h00, um grupo IN (estimado em cerca de 40 elementos) atacou as tabancas de Cansamba e Madina Alage, durante 60 minutos, com Mort 60, LFog e armas automáticas mas, desta vez, felizmente, sem consequências... O IN retirou na direcção da tabanca de Samba Arabe, levando consigo um elemento da população...

(5) A 20, pelas 20h00, tocou de novo a vez a Cansamba, flagelada por um grupo de 30 guerrilheiros, durante 20 minutos, sem consequências... Retirou na mesma direcção (Samba Arabe)...

(6) A 24, às 00h45, é atacado o destacamento de Dulombi, da direcção SSW. O IN, estimado, em 60 elementos, utiliza LGFog e armas automáticas.

(7) Nesse mesmo dia, às 17h20, o aquartelamento de Mansambo é flagelado, a grande distância, com Mort 82, a partir da direcção sudoeste. Sem consequências. Na outra ponta do Sector L1, o Xime é flagelado, às 19h45 por canhão s/r.

(8) Meia hora depois, a sul de Madina Xaquili, a cerca de 1 Km, um grupo IN não estimado reagiu a forças da CCAÇ 2445, causando 6 feridos ligeiros, entre os quais 2 milícias. Simultaneamente, este destacamento é flagelado à distância, com Mort 60 e LGFog. Há apenas danos numa viatura GMC. O IN retira na direcção de Padada. Três Grupos de Combate da CCAÇ 12 (na altura, ainda CCAÇ 2590) tiveram aqui, nesse dia, o seu baptismo de fogo... em farda nº 3 (!).

(9) No dia seguinte, à 1h20, é atacado o destacamento de Quirafo, durante 3 horas (!), por um grupo estimado em mais de 100 elementos, que utilizam 3 Canhões s/r, 3 Mort 82, vários Mort 60, RPG 2 e 7, Metr Lig e outras armas automáticas... Felizmente, há apenas 1 ferido, mas as instalações do destacamento ficam praticamente destruídas, bem como os rádios DHS e AN/RC-9 e quatro G-3... O arame farpado fora cortado em vários pontos...

(10) A 26, há uma nova flagelação do Xime, às 17h45, da direcção Sul. Com Canhão s/r e Mort 82. Durante 10 minutos. No Xime está a CART 2520, com menos dois pelotões (um destacado em Galomaro e outro - duas secçõas - na Ponte do Rio Udunduma).

(11) No dia seguinte, 27, às 16h50, Mansambo volta a ser flagelado, à distância, durante 10 minutos, com Mort 82. Sem consequências.

(12) Em 28, por volta das 22h30, o dcstacamento de Madina Xaquili vai conhecer o inferno: durante 1 hora e meia, é atacado de todas as direcções, por um grupo de cerca de 60 elementos, com Mort 82, Mort 60, LGFog e armas automáticas. Há dois feridos.

(13) A 29, às 10 da manhã, um grupo IN reagiu, durante 10 minutos, a um patrulha nossa, a 200 metros a SW de Dulombi, que acabava de sair na sequência do rebentamento de uma mina A/C. O IN, que utilizou Mort 60, LGFog e armas automáticas, causou 2 feridos civis.

(14) A 30, às 18h00, Mansambo sofre nova flagelação à distância, da direcção SW. Durante 20 minutos. Com Canhão s/r e Mort 82. Sem consequências.

(15) A fechar o mês (quente) de Setembro, é a vez da tabanca em audodefesa de Candamã [, já no limite leste da ZA da unidade de quadrícula de Mansambo, ] conhecer o inferno: a 30, às 3h40, um numeroso grupo IN (80 a 100 elementos) ataca a tabanca, até de madrugada, durante 2 horas e 20 minutos, utilizando 2 Canhões s/r, Mort 82, 3 Mort 60, LGFog, Metralhadora Pesada, Pistolas-Metralhadoras e Granadas de Mão Defensivas, causando um 1 ferido grave e 4 feridos feridos às NT e 2 mortos, 3 feridos graves e vários ligeiros à população civil... Valeu o comportamento heróico dos homens de Mansambo - menos de um pelotão (uma secção estava em Afiá)!... Homens que eu conheci e abracei, nessa mesma madrugada, quando a aldeia ainda fumegava, na sequência de incêndio de várias tabancas!
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Nota do editor:

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Guiné 63/74 - P10127: Estórias dos Fidalgos de Jol (2) (Augusto S. Santos): A noite da hiena

1. Segunda história enviada pelo nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), em mensagem no dia 30 de Junho de 2012.


ESTÓRIAS DOS FIDALGOS DE JOL (2)

A NOITE DA HIENA

Havia rumores (através da população) de que poderia estar para breve um possível ataque ao nosso quartel, daí que se acentuasse a nossa vigilância nocturna e se redobrassem alguns cuidados.

Foi numa dessas noites longas que, após ter saído da messe, e me ter dirigido para o meu abrigo, ainda com as calças na mão e já de chinelos prontinho para me deitar, somos todos surpreendidos por uma curta rajada, com todo o pessoal de G3 em punho, em trajos menores e com algumas quedas pelo meio, a correr para a vala.

Rápida foi notícia de que alguém que tentava ultrapassar o arame farpado, havia sido abatido.

Passaram no entanto alguns minutos (que mais pareceram uma eternidade à espera de um possível ripostar por parte do inimigo) sem que felizmente nada se registasse. Organizado todo o esquema para se verificar o que efectivamente tinha dado origem aos tiros, lá se chegou à conclusão que o inimigo não era mais do que uma hiena que, por motivos óbvios, se havia aproximado em demasia do curral das vacas, e que tinha sido abatida por uma das sentinelas.

Não passou de um valente susto, aquela que ficou conhecida como a noite da hiena.

Augusto Silva Santos


Foto 6 > Jolmete, Junho de 1972 > Chegada de mais uma operação

Foto 7 > Jolmete, Junho de 1972 > Entrada da Messe

Foto 8 > Jolmete, Junho de 1972 > Entrada do Quartel

Foto 9> Jolmete, Agosto de 1972 > Convívio


Foto 10 > Jolmete, Agosto de 1972 > Estrada de Gel
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10113: Estórias dos Fidalgos de Jol (Augusto S. Santos) (1): Mandem a Marinha

Guiné 63/74 - P10126: Patronos e Padroeiros (José Martins) (33): S. Cristóvão - Patrono dos Condutores




1. Em mensagem do dia 30 de Junho de 2012, o nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), enviou-nos mais um trabalho para a série Patronos e Padroeiros.






Patronos e Padroeiros XXXIII

 Patrono dos Condutores

São Cristóvão – Baixo-relevo existente nas escadinhas com o nome do santo, em Lisboa
© Foto José Martins (29/11/2012)


São Cristóvão

Sendo um santo venerado pela Igreja Católica, Igreja Ortodoxa Oriental e Ocidental, e das Igrejas Anglicana e Luterana, nada ou pouco se sabe acerca da sua vida. Além de santo muito popular, está ligado a quem viaja, nomeadamente a quem desenvolve a sua actividade profissional na estrada. Mesmo os que não são “crentes”, profissionais ou amadores, dedicam-lhe na sua viatura um local, mesmo que recôndito, para transportar uma medalha, invocando a sua protecção.

O seu culto foi reconhecido tardiamente, cerca de 1550, e o seu dia é celebrado a 9 de Março nas igrejas orientais e a 25 de Julho nas igrejas ocidentais, em conjunto com outros Santos Mártires.

Conta a história, ou lenda, que a um rei pagão, cujo reino se situava na zona arábica e cuja esposa devido a sua devoção e oração à Virgem Maria, os abençoou com o nascimento de um filho, a quem baptizaram com o nome de Offerus e o consagraram ao Deus Apolo.

A criança foi crescendo em tamanho e em força e, resolveu que só serviria os que fossem fortes e poderosos. E assim tentou proceder.

Procurou quem quisesse o seu trabalho e passou a servir, não só um poderoso rei, mas também um outro individuo que afirmava ser o próprio demónio. Porém, em pouco tempo descobriu que o rei temia o nome do diabo, enquanto o demónio tremia com medo de encontrar uma cruz na estrada.

É por esta altura que um frade eremita encontra Offerus. Toma-o por amigo, baptiza-o e dá-lhe a conhecer a fé cristã, mas o catecúmeno não aceita jejuar e a rezar a Cristo, como lhe aconselhava o seu amigo frade.

Os antigos amos, o rei e Satanás, já não lhe inspiravam confiança, pelo que deixou de os servir e, devido a sua estatura e força, aceitou uma tarefa: ajudar as pessoas a atravessar um rio, perigoso pela impetuosidade das águas, que já tinha originado a morte de muitos que tiveram necessidade de o atravessar sem ajuda.

Certo dia, apresentou-se-lhe uma criança pedindo-lhe que o transportasse para a outra margem. Tomou a criança sobre os ombros e, à medida que avançava para a outra margem, a criança parecia aumentar de peso, como se carregasse o mundo sobre os seus ombros. Quando disse à criança a sensação que tinha tido, ao transportá-la da outra margem, esta respondeu-lhe: Eu sou o Criador e Redentor do Mundo. E mais. Disse-lhe para fixar o seu bastão em terra.

Offerus assim fez e, no dia seguinte e naquele local, estava uma exuberante palmeira, e o povo passou a chamar-lhe Christophorus, que significa “aquele que carrega Cristo”, ajudando à conversão de muitos, para desespero do rei da região.

Cristovão, a mando do governador de Antioquia, foi preso e martirizado, vindo a falecer no ano de 521 dC, tendo sido canonizado por volta do ano de 1550.

Oração do Motorista:

“Ó Senhor, por intercessão de São Cristóvão, padroeiro dos motoristas, dai-nos firmeza e vigilância nos muitos caminhos da vida em busca de trabalho, lazer, felicidade e realização.

José Marcelino Martins
30 de Junho de 2012
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10114: Patronos e Padroeiros (José Martins) (32): Jozé Maria das Neves Castro - Patrono do Instituto Geográfico do Exército

Guiné 63/74 - P10125: Notas de leitura (377): Massacres em África, de Felícia Cabrita (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 16 de Maio de 2012:

Queridos amigos,
O objetivo destas recensões é juntar o maior número de possível de materiais para quem quiser conhecer ou estudar aquela guerra que vivemos.
Tive que ler duas vezes com muito cuidado a reportagem da Felícia Cabrita sobre a operação Tridente. Creio que a jornalista brincou com coisas sérias, vinha na predisposição de registar uma epopeia, sonegou dados e transformou os cerca de 70 dias que durou a batalha num cerco de Leninegrado, um épico de onde certamente esperava que a convidassem a fazer uma série televisiva para mostrar como os militares portugueses se revelaram incapazes de conquistar posições onde pontificavam mulheres heroínas.
É uma reportagem inqualificável, convém deixar escrito.

Um abraço do
Mário


Massacres em África

Beja Santos

A jornalista e escritora Felícia Cabrita conheceu a notoriedade em reportagens sensacionais denunciando, por exemplo, o caso Casa Pia. É autora de séries televisivas como “O Ouro Negro”, “Capitão Roby”, “Ballet Rose” e a “Joia de África”. O seu livro “Amores de Salazar” tem tido reedições sucessivas e estes “Massacres em África” vão já em terceira edição (A Esfera dos Livros, 2011). A jornalista investigou um conjunto de situações que vão desde o massacre em S. Tomé, no tempo do governador Carlos Gorgulho, em 1953, as atividades terroristas em Luanda, em 1961, até à execução de Sita Valles e o drama de uma mãe que pretende tudo saber sobre a morte de um filho em Angola, numa ação de comandos do Galo Negro. Quando se esperava encontrar referências ao massacre do Pidjiquiti vamos encontrar a operação Tridente e mais adiante a morte de vários oficiais, em 20 de Abril de 1970, em pleno chão manjaco.

Depois de lida a reportagem que Felícia Cabrita efetuou na Ilha do Como, de colaboração com Nino Vieira, fica-se com sérias dúvidas se alguma vez consultou a documentação existente em Portugal sobre esta operação. Em estilo bombástico, a jornalista usa sem artifícios o enredo de uma telenovela, com arremedos de caráter épico: “Mal pisei terra, tinha à espera alguns dos combatentes que enxovalharam a tropa portuguesa. Começámos por fazer o reconhecimento do terreno. Parecia ter caído no Vietname. Fora em Como, a sul da Guiné, que, em 1963, fora hasteada a bandeira de independência. Para pôr fim à afronta, mil e tal homens dos três ramos das Forças Armadas, crentes de que ali estava instalado o santuário da guerrilha apetrechada à soviética com abrigos antiaéreos, hospitais construídos abaixo do chão e centenas de guerrilheiros com armamento sofisticado, partiram para o ocupar. Por lá andaram por dois meses e meio à sede e à fome sem conseguirem penetrar na mata que, afinal, era defendida por mulheres e um punhado de homens”. De premeio, temos peripécias mirabolantes e os picantes da superstição e da macumba: “Numa tabanca perto da praia, vive Sona Camará, uma balobeira, mulher de visões capaz de influenciar os mortos para o combate. Sempre estive do lado das minhas fontes sem sobranceria. Os homens são conduzidos a maior parte das vezes pela sua fé ou pela ausência dela”. Confessa que depois de publicada esta reportagem no Expresso Alpoim Calvão a chamou de doida. Sona Camará aparece na reportagem como uma padeira de Aljubarrota, no Como estariam 20 guerrilheiros, 8 armas e 4 granadas. Nino Vieira, escreve, pedira reforços a Como para atacar um quartel (historicamente improvável, Nino fora para Cassacá, para uma reunião convocada por Amílcar Cabral que acabou por se transformar em congresso). E temos aqui um relato de batalha, os homens dividem-se em grupos de 5 e vão travar as tropas portuguesas no tarrafo. Se passou a haver a lenda de Sona Camará também nasceu a do Kabi, o Leão. Felícia Cabrita viaja com Nino Vieira até ao Como. Temos mais espetáculo: “Aterrámos em Como, onde jipes militares nos aguardam. O chefe da segurança trepa para os estribos de todo-o-terreno que leva o presidente. As mulheres dos bijagós, nas saias de palha de arroz multicolores dançam ao ritmo da batucada. Ao almoço fala-se daquilo que os une, não do que os separa. Da pobreza. Sona Camará, a mulher que batizou Nino de Leão, leva-o à sua baloba, onde abundam as garrafas de aguardente de cana com que alimenta os espíritos”. Nino Vieira fala da sua juventude e da instrução militar que recebeu na China.

Chegou a hora da reportagem entrar na operação. A vivacidade da repórter não tem freio: a aviação larga panfletos nas ilhas, as mulheres e os poucos guerrilheiros põem-se em movimento. Se tudo já faz prever o épico temos agora cinema a três dimensões: Muk Na Pono era um jovem que nada assustava, pegou na Mauser e foi à luta, N’Dine Na Barne entrincheirou-se na mata com a única metralhadora pesada que havia; do lado português, Júlio Santos sente-se protagonista de O Dia Mais Longo, filme do desembarque da Normandia; começam as baixas e o suplício de remover os feridos para um improvisado posto de socorros; do lado português, acentua a repórter, há medo e desespero, há quem invente doenças e há gente enlouquecida e segue-se uma descrição para fazer chorar as pedras da calçada: “Joaquim Ganhão negou-se a olhar para Henrique, porque coreu entre os soldados mil e uma coisa. Que o corpo estava decepado, os olhos furados, ele acreditou e chorava como uma criança”. A epopeia, a fazer fé no que escreve a jornalista, andou sempre do lado guerrilheiro: enquanto as forças portuguesas disparavam fogo, os guerrilheiros levavam os seus feridos no fundo das canoas, esgueiravam-se entre fragatas e regressavam atafulhados de armas. A força portuguesa queria progredir mas não podia: “Na mata de Como vivia-se ao ritmo das bombas. As copas dos poilões e das palmeiras formavam uma carapaça que abrigava a guerrilha. A tropa portuguesa experimentou tudo para perfurar a selva que se fechada como uma ostra para os expulsar. O napalm apagava-se num segundo, mal encontrava a folhagem densa e verde, e as bombas lançadas pelos velhos Dakotas rebentavam assim que tocavam o topo dar árvores. Tentaram bombas de profundidade com 250 kg de trotil que só tinha poder de sopro, rebentavam os tímpanos da tropa e faziam pouco estragos. Nas primeiras três semanas, explodiram 262 bombas, foram lançados 347 foguetes e dispararam 31 846 balas”. Maior heroísmo não podia haver: “As mulheres faziam sabão, continuavam a parir, e à noite subiam para cima das árvores, espiavam a floresta enquanto os guerrilheiros descansavam”.

Do lado português aumentavam as neuroses, militares que se motivavam, até o médico Francisco do Nascimento tomava Librium 10 para se manter de pé. Até há cenas de um Apocalypse Now: “Ao domingo, no fim da tarde, na imensa praia de Caiar, onde o comando estava instalado, o médico assistia à missa do padre Gama, foi das mais lindas que ouviu, e por uns momentos sossegava. Ao fundo, na areia molhada, Alpoim Calvão cantava ópera ou descarregava a arma nas garrafas de cerveja”. Os dias arrastavam-se, havia um alferes conhecido por Shelltox que se vangloriava de matar até se fartar, talvez fosse um gabarola, do dia em que foram rodeados pelo inimigo recuou sem dar ordem de retirada. Fernando Cavaleiro, o comandante da operação Tridente garantia o sucesso da operação mas ninguém acreditava, escreve a jornalista que sintetiza: as derrotas são osso duro de roer. Terá entretanto ouvido Alpoim Calvão que tinha outra leitura: “Não há vitórias absolutas, mas também não foi uma derrota. Já não havia gente suficiente na ilha que justificasse a nossa presença. Mas Como foi uma grande escola, encontrámos o inimigo muito aguerrido e manobrador”. As mulheres guerreiras personificaram as gesta sublime, a tal ponto que Amílcar Cabral, quando soube das baixas, ordenou que abandonassem a ilha, mas Cadi Camará, a única mulher que usava pistola que conhecia as profecias, gritou aos homens: “Se estão com medo, dispam as vossas calças e vistam as nossas saias que nós vamos combater”.

Não tivesse lido o que outros camaradas aqui têm escrito sobre a operação Tridente e teria de cismar como é que mil e tal portugueses tinham sido travados por um punhado de homens e mulheres extraordinárias, tudo previsto por uma balobeira que previa um milagre. São estes despautérios que levam a perguntar como é possível ser tão leviano na descrição da operação Tridente.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 2 de Julho de 2012 > Guiné 63/74 - P10101: Notas de leitura (376): "Aviltados e Traídos - Resposta a Costa Gomes", por Mello Machado (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P10124: Vídeos da guerra (9): Vida e obra dos Viriatos - CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69) (Parte I) (Henrique Cardoso)



Vídeo do ex-Alf Mil Henrique J.F. Cardoso. Cópia gentilmente cedida pelo seu/nosso camarada ex-Alf Mil Torcato Mendonça, para ser divulgado através do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


Esta subunidade, a CART 2339 (que tem c. 135 referências no nosso blogue) esteve na zona leste da Guiné, setor L1 (Bambadinca), ao tempo do BCAÇ 2852 (1968/70) e da CCAÇ 12 (1969/71), subunidade de intervenção ao serviço daquele batalhão (e depois do seguinte, o BART 2917, 1970/72).


Os Viriatos, nome de guerra da valorosa CART 2339, unidade de quadrícula, construiram de raíz  um aquartelamento em Mansambo (c. 180 referências), entre Bambadinca e o Xitole [, vd. carta do Xime]. Participaram em grandes operações como a Lança Afiada (Março de 1969). 

O Alf Mil Cardoso foi também comandante (interino) da CART 2339. Estamos-lhe gratos pela cedência do vídeo (originalmente, uma sequência de pequenos filmes em super 8 mm, que ele depois montou, digitalizou e sonorizou). 


O vídeo, no total, tem uma duração de 50 m. O camarada Torcato Mendonça (ou o Carlos Marques dos Santos ?, já não posso garantir com toda a certeza..) fez-me chegar às mãos, há uns atrás, uma cópia com autorização do autor para a sua divulgação pública. Por razões técnicas (incompatibilidades de formato, duração, etc.), só agora (em maio de 2012) nos  foi possível carregar o vídeo (em duas partes) na nossa conta no You Tube (nome da conta: Nhabijoes).

O mínimo que se pode dizer é que é um documento,  excecional e raro,  que vai enriquecer o nosso blogue e sobretudo vai emocionar alguns de nós, pela reconstituição detalhada da vida quotidiana de uma heróica unidade de quadrícula no leste da Guiné, colocada no sector L1, a que correspondia, grosso modo, o temível triângulo Bambadinca - Xime - Xitole. 


A câmara de filmar (em super 8 mm, julgo eu: tinha sido lançadas no mercado por volta de 1965) acompanha o autor desde o dia da partida da companhia (em 14 de janeiro de 1968) até ao regresso à metrópole (em finais de 1969).  Além de disciplinado, o nosso camarada Cardoso é uma pessoa com "olhar treinado", e "mão firme", além de grande sensibilidade e gosto estético,  o que lhe permitiu captar aspetos surpreendentes da nossa vida quotidiana de combatentes, bem como da dos guineenses.


Através do Torcato Mendonça (Fundão) ou do Carlos Marques dos Santos (Coimbra), ou de ambos, eu vou convidar o nosso camarada Henrique Cardoso a integrar a nossa Tabanca Grande. Seria uma honra para nós e uma forma, singela, de lhe dizermos quão gratos estamos pela existência e a disponibilização deste documento precioso, pro aí esquecido (mas não perdido). Sabemos que ele: (i) vive na Senhora da Hora, Matosinhos; (ii) é amigo do Jaime Machado (nosso grã-tabanqueiro); (iii) tinha um plano de filmagens,  e usava de facto uma câmara super 8. (Informação dada ao telefone pelo TM, a quem desejamos um fim de semana descansado, heart friendly & healthy week-end (o mesmo é dizer, um fim de semana de sopinhas e descanso)...

Aqui fica uma sinopse da Parte I do vídeo. A II Parte será inserida, em breve, no nosso blogue (Já está também disponível no You Tube > Nhabijoes, inclui o regresso dos Viriatos a casa).


Parte I: Vida e obra dos Viriatos (nome de guerra do pessoal da CART 2339) 


(i) Embarque para o TO da Guiné (em 14 de janeiro de 1968), 
(ii) viagem no T/T Ana Mafalda, navio da marinha mercante, da Sociedade Geral (SG), 
(iii) partida e despedida no Cais da Rocha Conde Óbidos [, quem é o valente - Viriato ? - que aparece a emborcar uma garrafa de uisque para matar a saudade ?] 
(iv) as dificeis (e nada seguras) condições da vida e de trabalho a bordo, 
(v) passagem por Cabo Verde (Ilha do Sal, em 19 de janeiro), c/ escolta de navio da Marinha de Guerra, 
(vi) chegada a Bissau (em 21 de janeiro), 
(vii) visita (demorada à cidade, monumentos, sítios emblemáticos), 
(viii) desfile militar defronte do palácio do Governador (gen Schulz), a célebre charanga militar,
(ix) viagem de LDG pelo rio Geba acima (em 25 de janeiro), 
(x) aproximação à temível Ponta Varela, antes do Xime, e o habitual reconhecimento por fogo de morteirete, pelos marinheiros da lancha (momento sempre de alguma tensão para os 'piras'), 
(xi) chegada ao porto fluvial de Bambadinca (, sem dúvida, a LDG não ficou no Xime), 
(xii) apresentação e estadia em Fá Mandinga, 
(xiii) a vida quotidiana no aquartelamento (higiene, limpeza, lazer, futebol, correio, convívio...), 
(xiv) a alimentação, as refeições. 
(xv) a partilha das 'sobras' com os putos da tabanca, 
(xvi)  a descoberta da África "exótica" (fauna e flora), 
(xvii) visita a uma tabanca dos arredores (regulado de Badora, 
(xviii) as bajudas, a fonte, 
(xix) a primeira visita a Bafatá, a bela "capital" da zona leste, 
(xx) o rio Geba, as canoas,
(xxi) o regresso em coluna, a Fá Mandinga, na estrada alcatroada Bafatá-Bambadinca,
(xxii) a transferência da CART 2339 para Mansambo,
 (xxiii) a heróica construção, de raiz, do aquartelamento de Mansambo (documentada com muito detalhe), 
(xxiv) a (despreocupada) ida à famigerada fonte (, poucos tempo depois, a 11 de julho de 1968, o bigrupo da zona apanhou à unha um Viriato mais descuidado...), 
(xxv) a morte e o esquartejamento da vaca, 
(xxvi) o fabrico do pão, 
(xxvii) as queimadas, 
(xxviii) a visita a uma tabanca em autodefesa, e  entrega da bandeira verde-rubra ao chefe da tabanca, 
(xxix) as Trms desejam aos Viriatos uma Páscoa feliz (em 1968 ?, em 1969 ?,  o domingo de Páscoa em 1968 foi a 14 de abril; em 1969, foi a 6 de abril), 
(xxx) uma partida de futebol, 
(xxxi) a equipa da  "televisão Mansambo",  o bom humor dos Viriatos,
(xxxii) a população na fonte, as crianças, as bajudas,
(xxxiii) o início (violento, tropical, precoce) da época das chuvas (talvez em maio de 1969, com o quartel já construído ao longo de 1968), 
(xxxiv) chegada de pessoal em viatura, 
(xxxv) uma banho de chuveiro,   já dentro do quartel (o que pressupunha a abertura de um poço dentro do perímetro no quartel, dispensando a perigosa ida à fonte, exterior),   
(xvi) instalação e teste dos obuses 10.5,
(xxxvii) operação Cabeça Rapada (grande mobilização da população civil para capinagem da estrada Bambadinca-Xitole) [, 
 desenrolou-se de finais de Março a meados de Maio de 1969, talvez por seis fases ou seis operações, diz o Torcato Mendonça],  
(xxxviii) instalação da força de segurança, 
(xxxix) os trabalhos de capinagem, 
(xl) o regresso de militares e civis... 

Fim da I Parte. (**)

Vídeo (35' 33''): Henrique Cardoso. Alojado em You Tube > Nhabijoes




Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 > Abril de 1968 > Fase de construção do aquartelamento (que o PAIGC, através da rádio Libertação, em Conacri, chamava "campo fortificado de Mansambo")...Os Alferes Milicianos Cardoso e Rodrigues apanham banhos de luar...


Legenda do Carlos Marques dos Santos, o primeiro dos Viriatos  a chegar ao nosso blogue, tendo depois trazido com ele o Torcato Mendonça:


A propósito!... Sabem onde foi tirada esta foto? Em Mansambo, a céu aberto. Camas de ferro nos fossos que iriam ser o aquartelamento fortificado de Mansambo. Data: Abril de 1968. A foto é do Henrique Cardoso, alferes da CART 2339 e seu comandante. Os 3 Capitães, que comandaram a Companhia anteriormente estiveram sempre doentes !!! Ele assumiu o comando. Era miliciano e responsável. Podes publicar, se quiseres. O Cardoso autorizará. Tenho o seu aval. CMSantos".



Foto: © Henrique Cardoso / Carlos Marques Santos (2005)
_________________

Notas do editor:

(*) 23 de novembro de 2006 >

(**) Último poste da série > 12 de março de 2008 >

Guiné 63/74 - P10123: Os nossos seres, saberes e lazeres (48): Festa do pão do moinho, 1 de julho de 2012, Atalaia, Lourinhã (Parte II): A banda da Associação Musical da Atalaia... é uma festa! ... (E onde se fala também dos antigos prisioneiros portugueses na ìndia, 1961/62) (Luís Graça)




Lourinhã, Atalaia, 1 de julho de 2012. Festa do pão do moínho. Atuação da banda da Associação Musical da Atalaia.


Vídeo (4' 16''): Luís Graça (2012). Alojado em You Tube > Nhabijoes 




1. A 2º edição da Festa do Pão do Moinho (a 1ª edição realizou-se o ano passado) foi organizada pela Associação Musiscal da Atalaia (AMA) e abrilhantada pela sua banda (*)...

A AMA tem uma escola de música e uma banda de música, composta essencialmente por gente jovem. Lê-se no sítio desta associação:

(...) "A Escola de Música, iniciou a sua primeira aula no dia 1 de Dezembro de 1985 com 18 alunos e teve a sua primeira actuação no dia 6 de Setembro de 1986 com a designação de Escola de Música da Atalaia, criada por Joaquim Isidoro dos Santos e Luís Fernando dos Santos, tendo sido na altura, inserida na Associação Desportiva e Recreativa Marítimo de Atalaia.

(...) "Mais tarde, por imperativos legais e legítimos, verificou-se a necessidade de ser separada da Associação Desportiva e Recreativa Marítimo de Atalaia.


(...) "[Em finais de ] 2007, foi legalmente criada a AMA – Associação Musical da Atalaia, no Cartório Notarial da Lourinhã por um grupo de outorgantes que quiseram dar à Banda a existência legal como é seu direito e melhorar as suas condições de vida como Órgão Cultural (...).

"Como Sede, foi-lhes cedida pela Câmara Municipal da Lourinhã a antiga e desactivada E.B.1 [, antiga escola do ensino primário,] da Cabaceira,  em Atalaia, local onde são dadas as aulas de instrução musical e realizados os ensaios gerais. A actual direcção  [está a construir de raiz uma sede, a qual vai permitir] oferecer melhores condições aos jovens músicos.

"A finalidade desta Associação destina-se ao cultivo das artes, visando a formação Humana através da Educação Cultural e Recreativa e encontrando-se aberta a pessoas de ambos os sexos para o ensino da música. Neste local ensaia, para além da Banda, uma Orquestra Ligeira e poderá surgir a formação de outros grupos, nomeadamente um Grupo Coral e/ou um Rancho Folclórico.

"Actualmente a Banda é composta por 45 elementos maioritariamente jovens com idades compreendidas entre os 12 e os 66 anos, com uma média de idades de 16 anos. São na sua maioria adolescentes, estudantes do Ensino Secundário, sendo que, existem alunos do Conservatório e estudantes em Escolas Profissionais de Música. (...).





 Lourinhã > Atalaia > 1 de julho de 2012 > Festa do pão do moinho > Uma terra de gente trabalhadora, mas que gosta e sabe divertir-se e conviver: terra de agricultores, pescadores, mariscadores, "viveiristas de frutos do mar", comerciantes, improtadores e exportadores de marisco, músicos, padeiras, moleiros e... moleirinhas! Foto de L.G.

2. Sobre os dois fundadores da Escola de Música da Atalaia convirá dizer o seguinte:

(i) Luís Santos é o atual maestro da banda da AMA. Nasceu na Atalaia, em 1941;Começou a aprender música aos 10 anos.  Em 1959, ingressou como voluntário na Banda de Música da Escola Prática de Infantaria, em Mafra. Em 1967, através de concurso público, entra para a  Banda de Música do Comando Geral da Guarda Nacional Republicana (GNR).

Em 1982, é sargento ajudante, e fica a desempenhar as funções de Subchefe da Banda de Música do Comando Geral da GNR.

Em 1984, é promovido ao posto de sargento chefe e em 1989 ao posto de sargento mor, desempenhando as funções de chefe adjunto da referida Banda de Música.

Desde 1975 dirige a Banda do então Batalhão de Sapadores Bombeiros, hoje Regimento. Reformado da GNR, dirige igualmente a banda da AMA.

(ii) O Joaquim Isidoro Santos, o outro dos fundadores da primitiva Escola de Música da Atalaia, em 1985, é irnão do maestro da banda da AMA. Foi taxista, é também nascido na Atalaia. Tinha 21 anos quando foi para Índia, em cumprimento do serviço militar. Pertencia à CCAÇ 8 do RI 5, Caldas da Rainha. Em Goa, foi nomeado encarregado da messe de sargentos, tarefa que cumpriu desde Março de 1961 até à invasão do território pelas tropas da União Indiana, em 18/19 de Dezembro de 1961. Foi então feito prisioneiro.



Caldas Rainha, RI 5... S/d... Convívio de antigos prisioneiros na India (1961/62). Pertenciam às Companhias de Cacadores 6, 7 e 8 , do RI 5.



O estandarte da CCAÇ 8, do RI 5, Caldas da Rainha.


Fotos da página do Joaquim Isidoro no Facebook (Reproduzidas com a devida vénia...)





Já aqui, no nosso blogue, tínhamos falado deste meu conterrâneo e camarada lourinhanense, um homem voluntarioso e decidido, e da sua  iniciativa, inédita, em 2008, de homenagear publicamente o seu antigo comandante, o gen Vassalo e Silva, prisioneiro como ele das tropas indianas, conforme

(…) “Manuel António Vassalo e Silva, último governador português de
Goa, Damão e Diu, foi homenageado no passado dia 22 de Junho [de 2008] na Atalaia, naquela que foi a primeira cerimónia pública do género no país. Para prestar a homenagem, foi descerrada uma lápide em sua memória junto à praceta que passou a designar-se Praceta General Vassalo e Silva, localizada a cerca de 600 metros a norte da Igreja de Nª Srª da Guia”. (...)

O Joaquimn Isidoro também é um dos co-fundadores, em 2000, [, originalmente, Associação dos Ex-Prisioneiros de Guerra da Índia e de Timor]. Tal como no passado, fui de novo encontrá-lo na Festa do Pão do Moinho. Falámos, naturalmente, como camaradas, das coisas da guerra e da paz, e das dificuldades que os antigos combatentes enfrentam, a começar pelas da sua representação e organização... Até um dia destes, Joaquim!

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 5 de julho de 2012 > Guné 63/74 - P1020: Os nossos seres, saberes e lazeres (47): Festa do pão do moinho, 1 de julho de 2012, Atalaia, Lourinhã (Parte I): O som inconfundível do vento a soprar nas velas, nos mastros, nas cordas e nos búzios dos moinhos da minha terra, acompanhou-me desde sempre, desde a minha infância até Bambadinca..., tal como o cheiro, o sabor, a cor e a textura do pão, feito com a farinha do moleiro... Desculpem-me a fra(n)queza!... (Luís Graça)