sexta-feira, 5 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11805: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (8): Um casamento fula no Xitole... Ou a tradição que já não é o que era no nosso tempo...


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula > O felizardo pai da noiva, o nosso amigo Mamadu Aliu


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: Mulheres festejando ao som do batuque (1)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: Mulheres festejando ao som do batuque (2)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: Almoço. O Francisco Silva, à direita.


O Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: o pai da noiva com sua mulher e um irmão com sua esposa.


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: Uma foto para mais tarde recordar


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Casamento fula: Agradecimentos e despedida dos convidados tugas, de partida para Bissau.


Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem
complementar: LG]



1. Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau (30 de Abril - 12 de maio de 2013) - Parte VIII

por José Teixeira


O José Teixeira é membro sénior da Tabanca Grande e ativista solidário da Tabanca Pequena, ONGD, de Matosinhos; partiu de Casablanca, de avião, e chegou a Bissau, já na madrugada do dia 30 de abril de 2013; companheiros de viagem: a esposa Armanda; o Francisco Silva, e esposa, Elisabete; no dia seguinte, 1 de maio, o grupo seguiu bem cedo para o sul, com pernoita no Saltinho e tendo Iemberém como destino final, aonde chegaram no dia 2, 5ª feira; na 1ª parte da viagem passaram por Jugudul, Xitole, Saltinho, Contabane Buba e Quebo; no dia 3 de maio, 6ª feira, visitam Iemberém, a mata di Cantanhez e Farim do Cantanhez; no dia 4, sábado, estão em Cabedú, Cauntchinqué e Catesse; 5, domingo, vão de Iemberém, onde estavam hospedados, visitar o Núcleo Museológico de Guileje, e partem depois para o Xitole, convidados para um casamento ] (*)... 

É desse evento que trata a 8ª crónica:  os nossos viajantes regressam a Bissau, depois de uma tarde passada no Xitole para participar na festa de casamento de uma filha de um fula que,  em jovem,  era empregado na messe de sargentos e que tinha reconhecido o Silva, no seu regresso ao Xitole.  A crónica anterior  foi justamente dedicada ao emocionante reencontro [, em 1 de maio, ]  com o passado, por parte do ex-alf mil Franscisco Silva, que esteve no Xitole, ao tempo da CART 3942 / BART 3873 (1971/73), antes de ir comandar oPel Caç Nat 51, Jumbembem, em meados de 1973


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Cusselinta em tempo de seca (1)



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Xitole > 5 de maio de 2013 > Cusselinta em tempo de seca (2)



Vídeo (43''):. Alojado no You Tube > José Teixeira    Não há casamento  sem alegria, sem música, sen festa...


Crónicas de uma viagem à Guiné (8) > Um Casamento na etnia Fula no século XXI.

Mudam-se os tempos, muda a forma de estar em sociedade, para melhor, como é o caso na perspetiva de um europeu. A sociedade guineense está a mudar. Creio que todos quantos passaram pelo teatro de guerra da Guiné, tomaram conhecimento da forma como se “arranjavam” os casamentos, com pequenas variações conforme a etnia.

Foi-me dada a oportunidade de participar num casamento em 1968 numa família de etnia Fula. Sei que o pai da noiva recebeu duas vacas e três carneiros como prémio por ter autorizado a sua filha a casar. Confesso que não cheguei a ver o noivo. Chegou ao fim da tarde embrulhado num pano branco às costas de um homem, talvez o pai ou o irmão mais velho. Parece que ainda estou a vê-lo, passados quarenta e cinco anos, depois de um dia cheio de festas e batucadas que acompanhei com curiosidade. Não faltou arroz para toda a gente salteado com carneiro, se bem me lembro, com molho de chabéu. Com a chegada do noivo,  a prometida, que estivera durante todo o dia rodeada das suas amigas, desapareceu como por encanto e nunca mais lhe pus o olho em cima, até hoje.

Em 2008, no Saltinho, conversava com um casal amigo dos tempos de Mampatá, quando ouço uma algazarra de jovens mulheres com um pano branco, com resíduos de sangue, pendurado num pau. Estranhei tal festa e tentei saber das razões. Pude,  assim, confirmar quarenta anos depois,  o que se dizia na altura, ou seja em 1968, sobre a forma de se detetar se a noiva estava ou não virgem na noite de núpcias. Dizia-se então que na manhã seguinte algumas mulheres grandes iam confirmar através dos eventuais sinais de sangue no lençol, o qual era posto em local que pudesse ser visionado para se confirmar a virgindade da noiva.

Na verdade, cada terra tem seu uso, o qual deve ser respeitado por todos, os autóctones e quem é de fora da terra. Eu, sendo estranho na terra, ouvi e respeitei, embora a curiosidade me tivesse tentado a que na manhã seguinte fosse rondar a porta da morança da noiva na expetativa de poder confirmar tal facto.

Mas os tempos vão mudando. Se é verdade que tenho conhecimento que há pouco tempo um guineense na diáspora, já sexagenário, voltou à sua terra e “comprou” uma bajuda para sua terceira mulher, também é verdade porque pude comprovar na Tabanca do Xitole que há casamentos por amor em que os interesses familiares (do pai da noiva) são dispensados e os eventuais valores a pagar pelo pai do noivo é revertido a favor do jovem casal.

Assim aconteceu de facto com a filha do nosso amigo Mamadu Aliu.

Mas comecemos pelo princípio. Há dias quando passámos pelo Xitole [em 1 de maio], tivemos como cicerone o Mamadu. Excelente cicerone que ajudou,  e de que maneira,  o Francisco Silva a aterrar de novo naquela linda tabanca.

Na despedida, depois de umas horas de animada cavaqueira enquanto visitávamos religiosamente todos os lugares que de algum modo estavam retidos na memória do Francisco, o Mamadu lembrou-se de nos convidar para o casamento da sua filha que estava marcado para o dia quatro, ou seja,  a data prevista para o nosso regresso a Bissau.

Há que aproveitar tão honroso convite. Programámos o nosso tempo para chegar pelo meio-dia, mas esta coisa de tempo e horários não se coaduna com gente que está ávida de (re)viver a Guiné. Os convites são tentadores, as picadas são más e o tempo voa. Chegamos pelas duas da tarde depois de uma paragem no Saltinho para dar um último abraço a gente amiga e uma visita “rapidinha” aos rápidos de Cussilinta, pois quem vai à Guiné, e não vai ao Saltinho e a Cusselinta, perde a uma grande oportunidade de apreciar o paraíso.

A nossa chegada coincidiu com o climax da festa, ou seja a hora do almoço. Simples almoço de bianda com uns restos de peixe muito bem temperado que “soube demais”. Três amplos alguidares bem cheios e uma mão cheia de comilões, os homens, pois as mulheres resguardadas dentro da morança saboreavam possivelmente um petisco mais saboroso.

Foi tempo para eu e o Francisco Silva regressarmos rapidamente aos tempos de juventude e fazer bolinhas de arroz na palma da mão e meter à boca, depois de ter o cuidado de lavar bem as manápulas. Que prazer o nosso, ali aninhados lado a lado com aquela gente que educadamente nos cedeu espaço para partilharmos tão gostoso momento, numa algazarra própria de um dia feliz, não fora estarmos no terreiro do pai da noiva. As nossas companheiras de vida e de viagem contentaram-se em arranjar uma colher e aproveitar a ocasião única, para se sentirem “fulas” de verdade.

Seguiu-se uma tarde de arromba. O som do batuque bem alimentado por três incansáveis batucadores estendeu-se por toda a tabanca, fazendo convergir ao local as mulheres mais lindas e vistosas, com os seus trajes de festa, vontade de dançar e pilhas bem carregadas. Espetáculo digno de se ver, a dança a um ritmo diabólico acompanhado com palmas e a algazarra que faziam entrando e saindo da arena. Com a chegada da família do noivo cresceu ainda mais este frenesim esfuziante, que só com o cair da noite se apagou.

O pai da noiva era um homem feliz. Quando se apercebeu que a “miúda” estava a ser cotejada pelo mancebo, teve o cuidado de lhe perguntar se efetivamente gostava do rapaz e obteve um risonho SIM. Então foi ter com o candidato à mão de sua filha e fez-lhe idêntica pergunta, obtendo um vigoroso SIM. Esperou pacientemente que crescessem um pouco e foi acertar contas com os pais do felizardo e fez negócio. Para ele, desprezando os direitos de tradição étnica, não queria nada, mas para o jovem casal, sim. O mais possível, para montarem o seu lar lá na cidade, onde a jovem ia continuar os estudos em informática. Com o genro a trabalhar e uma filha casada por amor, quem não se sentiria feliz naquele dia?!

A noiva estava a conviver ali perto em casa da mãe, a outra mulher do Mamadu, com as bajudas companheiras da sua infância e juventude. O noivo algures noutra tabanca,  possivelmente engalanada, esperava pacientemente que a noiva chegasse ao cair da noite embrulhada num pano branco para se cumprir a tradição. Foi-nos dada a permissão para irmos visitar e felicitar a jovem noiva que em traje casamenteiro se divertia numa animada festa ao som de uma música apropriada que um leitor de CD debitava em alto som.

Belo! As fotos da praxe para mais tarde recordar, uns beijinhos com votos de felicidade e há que deixar a juventude viver a sua juventude. Regressámos a casa do pai da noiva e, porque o tempo não perdoa, e pensando nos quilómetros que ainda tínhamos pela frente para chegarmos a Bissau, iniciámos as despedidas.

Abraços e beijos, sorrisos e mais sorrisos. “Quando bó na volta?” Pergunta repetida muitas vezes para a qual tiveram como resposta um sorriso que refletia apenas uma vontade de voltar, mas não sei quando.

Chegamos a Bissau a tempo de jantar.
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Nota do editor:

Últuimo poste da série > 28 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11772: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (7): O Xitole e o "alfero" Francisco Silva (CART 3492, 1971/73), a emoção de um regresso

Guiné 63/74 - P11804: Notas de leitura (497): Guineidade e Africanidade, por Leopoldo Amado (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Março de 2013:

Queridos amigos,
O nosso confrade Leopoldo Amado fez bem em coligir sob a forma de livro cerca de cinco dezenas de textos que vão desde a historiografia a intervenções públicas enquanto cidadão guineense.
O livro inclui alguns dos seus textos obrigatórios como “A literatura colonial guineense”, “Da embriologia nacionalista à guerra de libertação na Guiné-Bissau” ou “Guiné-Bissau: 30 anos de independência”.
Deve-se também a Leopoldo Amado a análise da literatura da guerra colonial, no caso da Guiné foi pioneiro.
É um acervo enorme, razão pela qual desdobro a recensão acerca de um livro cuja leitura é de grande importância para entender a luta de libertação e as disfunções do Estado, ao longo destas décadas.

Um abraço do
Mário


Guineidade e Africanidade, por Leopoldo Amado

Beja Santos

Como escreve Inocência Mata no prefácio, “São 51 textos de proveniência vária, desde ensaios e recensão de livros a artigos de opinião, crónicas e apontamentos reflexivos (…) Esses textos focalizam assuntos vários (da história à literatura, da sociologia à antropologia, da ciência política à sociologia da cultura), tratados com uma transversalidade disciplinar e revelando uma abordagem muito atualizada das problemáticas do seu país e do seu continente. A intensidade com que vive, perceciona e reflete sobre a realidade guineense revela, se alguém ainda sobre essa matéria tivesse dúvidas, que não se estar geograficamente no país não significa não contribuir para o desenvolvimento do país através de uma participação ativa e construtiva”.

O historiador Leopoldo Amado, nosso confrade, na coletânea recentemente dada à estampa, edições Vieira da Silva, 2013, recupera alguns dos seus ensaios mais emblemáticos, de leitura obrigatória no contexto dos eventos da luta armada, da literatura colonial e da guerra colonial, do balanço sobre décadas de independência, a saber: a literatura colonial guineense; da embriologia nacionalista à guerra de libertação na Guiné Bissau; Guiné-Bissau: 30 anos de independência; simbólica de Pindjiguiti na ótica libertária da Guiné-Bissau; diapasão e persistências na novíssima literatura da guerra colonial: o caso da Guiné-Bissau.

O seu trabalho sobre a literatura colonial guineense foi pioneiro, pela primeira vez se procedeu a um arco histórico sobre eventos do último quartel do século XIX até ao início da luta armada que permitiram medir o pulso à vida intelectual em Bolama, às mudanças operadas pela República no conceito de autonomia, ao aparecimento de Fernanda de Castro na produção literária-colonial com destaque para o seu best-seller “Mariazinha em África”; e também a importância de “O Comércio da Guiné”, onde escreveram Fausto Duarte, Juvenal Cabral e Alberto Gomes Pimentel, entre outros. O aparecimento de Afonso Correia e o seu livro Bacomé Sambú, a história de um nalú assimilado pelos brancos, definido por conceitos ocidentais de miséria e felicidade e inserido num ambiente de cores guineenses sempre com as marcas de água da fauna selvagem, do exotismo, do mistério e do tédio. Segue-se Fausto Duarte e o seu livro Auá, um livro importante de alguém a quem a Guiné muito deve, ele foi o responsável por dois livros de leitura obrigatória, Os Anuários da Guiné de 1946 e 1948. A chegada de Sarmento Rodrigues traz uma viragem que deu pelo nome do “Boletim Cultural da Guiné Portuguesa”. Impuseram-se títulos de grande significado como os “Contos Fulas”, por Pereira Gomes, os “Contos Mandingas”, por Manuel Belchior e os "Contos de Caramó”, por Viriato Augusto Tadeu. “Terra Ardente”, de Norberto Lopes, e “Guinéus”, de Alexandre Barbosa, são outros títulos importantes a registar.

Já virado para a literatura da guerra colonial, Leopoldo Amado chama a atenção para “O Lugar de Massacre”, de José Martins Garcia, “Tarrafo” de Armor Pires Mota, e queda-se por aqui. O estudo sobre o nacionalismo guineense é de primordial importância, faz parte aliás da investigação que Leopoldo Amado desenvolveu para a sua tese de doutoramento que o IPADE publicou em 2011 sob o título “Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional 1950-1974”. Recria o ambiente dos anos 1950, em Bissau, regista o nome dos intervenientes dos nacionalistas de vária índole, a criação do PAI, o MLG, a atividade política de Cabral na Guiné e depois na clandestinidade, a absorção de parte do MLG pelo PAI, os primeiros anos de Amílcar Cabral em Conacri, a criação de campos de treino, os primeiros atos de subversão, a prisão dos nacionalistas pela PIDE, o papel desempenhado por François Mendy, a fundação da FLING, as rivalidades entre o PAIGC e o MLG, etc. A única omissão de relevo que se pode encontrar neste laborioso trabalho diz respeito às ações subversivas que foram desencadeadas em 1962, no segundo semestre, se é verdade que o primeiro ataque a um quartel data de 20 de Janeiro de 1963, as sabotagens, destruições, emboscadas e confrontos já tiveram lugar em 1962, há registos espúrios como é o caso do fuzileiro Manuel Pires da Silva no “Homem Ferro”, de que aqui já se fez menção. Este foi o início bem-sucedido do PAIGC no Sul, daqui se espraiou por toda a Guiné, onde foi evoluindo de feição favorável.

“Guiné-Bissau: 30 anos de independência”, é uma das mais longas incursões que o historiador faz à volta dos eventos da República da Guiné-Bissau. Estuda os antecedentes que levaram à independência e detalha-os. Enumera fraquezas, como a incapacidade do PAIGC em não ter sabido gerir o aparelho estatal colonial, dizendo que “ao caráter excessivamente centralizador do Estado colonial juntou-se no período pós-independência a feição não menos centralizadora com que o PAIGC administrava a estrutura político-militar e civil nas áreas libertadas através do centralismo democrático. Consequentemente, a macrocefalia dos principais centros urbanos e sobretudo de Bissau, a capital, foi um elemento desmobilizador de consideráveis franjas das regiões rurais”. Mesmo recusando o rótulo de marxista-leninista, os princípios fundamentais do PAIGC na criação do Estado assentavam na direção coletiva, no centralismo democrático e na democracia revolucionário. A crise de 14 de Novembro de 1980 deixou claro que existia uma tensão racial, insanável, a par do reconhecimento de uma deriva de natureza económica e do agravamento das condições de vida, isto para já não falar das promessas que nunca se concretizaram, como a questão dos combatentes da liberdade da Pátria. No final da década de 1980, anunciou-se uma abertura quando Nino Vieira em discurso proferido na Assembleia Nacional Popular se referiu à necessidade premente de se edificar na Guiné-Bissau um Estado de Direito. Iniciara-se um período que conduziu às primeiras eleições multipartidárias, o PAIGC manteve-se no poder mas cedo se detetaram graves enviesamentos do sistema democrático, o aparecimento do PRS (Partido da Renovação Social, que parecia trazer um largo equilíbrio étnico, veio a revelar-se um partido dominado pela etnia balanta que com a eleição de Kumba Yala fez ocupar toda a esfera do poder por balantas, o que gerou novas tensões sociais. Pelo meio, fica o conflito político-militar, depois o enfraquecimento do Estado e os permanentes ciclos de instabilidade política. No termo deste seu trabalho, datado de 2005, Amado chama a atenção para a crise política profunda, a crise económica sem precedentes e a crise de liderança que tinha transformado a Guiné-Bissau numa nova Somália, apelando à necessidade urgentíssima de se proceder a uma profunda moralização da vida pública e a modernização do aparelho de Estado caso se quisesse conferir credibilidade interna e externa ao Estado. Escusado é dizer que este seu apelo não foi ouvido, pelo menos por enquanto.

Toda a obra está polvilhada pequenos textos e anotações, algumas delas cheias de ternura, caso do que escreveu sobre José Carlos Schwarz, a sua música patriótica, pontilhada pelo amor, a evocação da mulher, das crianças e do sofrimento. Schwarz, como é do conhecimento de todos, morreu apenas com 27 anos, na sequência de um acidente de viação. E Amado escreve: “Com o seu desaparecimento físico, transformou-se rápida e indistintamente num misto de herói e de mártir, não apenas porque a ele se deveu a modelação da música moderna guineense, em que revelou os rasgos do seu génio criador; não apenas porque lhe coube a proeza de ter desafiado como poucos as autoridades coloniais, mas porque a longevidade das suas “verdades” no imaginário coletivo guineense chocavam e ainda chocam com a mundividência hipócrita dos que, agindo em sentido contrário, apresentam as suas “virtudes” como únicas, absolutas e inquestionáveis”.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11785: Notas de leitura (496): O Império Africano 1890-1930, coordenação do Prof. Oliveira Marques (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11803: Meu pai, meu velho meu camarada (39): Amadeu Simões Picado, ilhavense, 1º cabo quarteleiro, da arma de engenharia, integrou o corpo expedicionário português, em França, na I Guerra Mundial (1917/18), e emigrou depois para os EUA onde trabalhou quase sempre como pescador... Só o conheci aos 9 anos, em 1946... (Jorge Picado)


França > I Guerra Mundial > Corpo expedicionário português > c. 1917/18 > Um grupo de militares camaradas de meu Pai, que é o 1.º da esquerda sentado.


França > I Guerra Mundial > Corpo expedicionário português > 1918 >  Outro grupo de camaradas, estariam alguns na foto de cima  (?). Foi enviada em IX/X/18. Três são de Ílhavo: o meu Pai, é o da extrema direita e os outros conterrâneos chamavam-se, João Pinto e Manuel Silva. O civil era um "Monsieur" Francês ("muito meu amigo", nas palavras de meu Pai) e o 4.º militar era do Porto.

 Fotos (e legendas): © Jorge Picado (2010). Todos os direitos reservados

1. Texto e fotos enviados pelo Jorge Picado, em 28 de Fevereiro de 2010.  Certamente por lapso, o poste foi editado  mas não chegou a ser publicado. As nossas desculpas ao autor e aos leitores.

Recorde-se que o nosso amigo e camarada Jorge Picado [, foto à esauerda,] foi cap mil na CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, na CART 2732, Mansabá e no CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72 [... aos 32 anos, pai de 4 filhos, engenheiro agrónomo, filho de Ílhavo, com muita honra, acrescenta ele].

Assunto: I Guerra Mundial

Amigo Luís Graça:


No P5899 (*) de ontem, sobre a Exposição Portugal nas Trincheiras – A I Guerra da República, que publicaste, terminas referindo-te a antepassados de camaradas da Tabanca Grande que possam ter participado dizendo: "Mas haverá mais casos…que poderão chegar ao conhecimento do blogue"...

O camarada José Marcelino Martins no seu comentário dá nota de 2 dos seus antepassados que tinham o posto de 2.º Sargento e que também participaram naquela guerra.

Ia para dar também finalmente, já que quando este assunto foi anteriormente abordado tinha escrito algo, dar conhecimento do meu caso, mas como queria enviar umas fotos já muito velhinhas que não sei se terão qualidade para serem reproduzidas, remeto-te o texto e as fotos para tua apreciação.

Um abraço e se não for antes até ao almoço na Ortigosa.

Jorge Picado


2. O meu Pai também fez parte do Corpo Expedicionário Português na I Guerra Mundial em França (**)

por Jorge Picado 


Tendo nascido no final do séc. XIX, mais precisamente em 22 de Junho de 1895, e tomado o nome de Amadeu Simões Picado, mas já sem o apelido de "Bravo", que afinal sempre mostrou ser, ficou apto para todo o serviço militar quando foi às sortes, já que era um rapagão e pescador saudável e a sua incorporação no Exército deu-se em plena Guerra.

Sendo ele pescador, naqueles tempos, nas chamadas "Artes de Pesca" de Sesimbra, não se esqueçam que os Ílhavos foram rumando para Sul, pelas costas de Portugal, e não só, já que no Tejo embrenharam-se até por ele dentro, mas como ia dizendo pelo litoral fora até aos Algarves, formando diversas "colónias piscatórias", sempre que assentavam arraiais naquelas em que a pesca se mostrava pródiga, como pescador, portanto, mas talvez por não ser embarcadiço, isto é, não andar nos navios de pesca do "alto mar" ou mercantes, não foi cumprir o serviço militar na Marinha, mas sim no Exército.

Não era um iletrado, pois tendo frequentado a escola primária até quinze dias antes dos exames da 4.ª classe, só não concluiu a escolaridade nessa data, face a um castigo injusto que um professor, que não era o da sua turma, lhe aplicou.

Com a sua rebeldia, ou ele não fosse herdeiro de antepassados com apelido "Bravo" que muitas vezes se sobrepunha ao próprio nome, saiu repentinamente da sala, tendo de atravessar a sala do professor da sua turma que como Director da Escola tentava preparar melhor os alunos do tal professor para os exames finais e abandonou o edifício, apesar dos protestos do "seu" professor que veio atrás dele, mas não o conseguiu deter.

Por este motivo já não voltou mais à escola, nem a casa dos seus Pais, pois sabia que a severidade da sua Mãe, contrastando com a bondade do Pai, como contava, se faria sentir no seu corpo e o obrigaria a voltar à escola e humilhar perante todos, coisa que ele não admitia, passando a viver desde aí com uns tios e acabando por não fazer o exame da 4.ª classe.

Com aquela idade já o seu voluntarismo e o seu forte sentimento de não se submeter nem pactuar com injustiças, traçaram o seu caminho.

Em lugar de seguir as pisadas do seu irmão mais velho que, completando a instrução, se tinha tornado Oficial Náutico, ele que era dos melhores alunos da turma, iniciou-se como auxiliar nas "Companhas de Pesca" da Costa Nova, ou para aqueles que não conhecem esta maravilhosa e antiga região, na chamada "Arte Grande" ou "Arte de Xávega", prosseguindo como pescador, para depois seguir com outros familiares para as tais "Artes" de Sesimbra, até ser incorporado na Arma de Engenharia, na especialidade, como ele dizia com muito orgulho, de "Pontoneiro", construtor de pontes militares, feitas naqueles tempos com barcaças amarradas de braço dado, sobre as quais se colocavam os estrados que serviam de passadiços.

Desculpem-me este alongamento na descrição e, já agora, um pouco mais da sua iniciação na vida militar, não só para dar a conhecer um pouco mais a têmpera de que ele era feito, mas também como uma pequena homenagem que lhe quero prestar.

Todos que me lêem, com excepção daqueles que por fatalidade se viram órfãos de Pai muito cedo, foram durante a sua infância educados por Pai e Mãe. Ora eu, não sendo órfão, fui apenas educado por minha Mãe, já que só conheci o meu progenitor quando tinha 9 anos, em 1946. Podem crer que invejava muito os meus colegas de brincadeira que tinham diariamente ou pelo menos ao fim duns meses, aqueles que andavam ao mar, os seus Pais em casa e eu tinha um Pai de fotografia em cima dum móvel da casa…

Emigrante nos USA, desde o início da década de 20 do séc. XX, já depois de ter regressado de França casado e com a primeira filha, em consequência da II Guerra Mundial, a estadia naquele País depois de me ter concebido e ver-me nascer, como quinto descendente, mas quarto filho vivo, prolongou-se por quase 9 anos, em lugar dos habituais 4.

Por esse motivo, só quando regressou definitivamente da sua diáspora, já então eu andava no ISA [, Instituto Superior de Agronomia, ] em Lisboa, é que comecei a saber mais da sua vida, já que ele possuía uma "memória de elefante" e recordava todos os pormenores desde a sua infância, o que para mim era um espanto.

Assim, sobre a parte militar, contava ele todo ufano:

Ao chegarmos ao quartel, estava um militar sentado a uma mesa e outro em pé por trás. Sabes, eu ainda não conhecia as patentes, pois só depois é que vim a saber quem eram, e nós,  os tais mancebos, em fila, íamos entrando um a um e esse sentado perguntava o nome, a terra e a data de nascimento… Só depois se entrava e o tal que estava em pé dizia a um ou outro, para este lado ou para aquele.

Ao chegar a minha vez, disse o nome, a terra e, já por malandrice como fazia sempre, a data verdadeira em que nasci, 22 de Junho de 1895.

Responde-me o tal militar sentado, que depois vim a saber ser sargento:
─ Seu burro, que nem a data de nascimento sabe.

Quase nem chegou a terminar a frase porque levou logo como resposta e com o meu vozeirão:
─ Seu burro é você. Sei muito bem a data do meu nascimento, só não tenho é culpa que o burro do individuo que escreveu o registo, por burrice ou estar bêbado tenha escrito um 2 em vez de dois 2.

Abro aqui um parênteses para explicar que o tal funcionário que naquela época fazia os registos em Ílhavo, gostava muito dos copos e escrevia muitas vezes o que queria e não o que as pessoas lhe ditavam, valendo-se do analfabetismo quase geral da população. Por esse motivo muitos houve que só na adolescência, quando precisaram de documentos, para irem por exemplo para o mar, é que vieram a saber que não eram detentores do nome que julgavam ter e pelo qual sempre foram tratados, mas sim de outro pelo qual nunca foram conhecidos.

Mas voltando à incorporação do mancebo Amadeu Picado:

O militar ficou muito vermelho e o outro que estava em pé e que depois soube que era Capitão, não o deixou falar e disse-me muito calmamente.
─ Ainda que haja erro no registo, a verdade é que oficialmente a sua data de nascimento é a 2 e não 22, pelo que deve responder e escrever sempre como tendo nascido a 2. Passe para este lado, que era o grupo onde estavam muito poucos, já que quase todos iam para o outro lado.

Sabes, o Capitão estava a separar aqueles que iriam ficar com ele, escolhendo os que tinham mais estudos e se mostravam mais espertalhaços.

Passou a ser "o meu Capitão", obrigou-me a ir a exame da 4.ª, mesmo sem frequentar as aulas, pois eu mesmo assim sabia mais do que os outros, passei depois a ser o seu impedido, tendo sempre o seu cavalo todo bem tratado, indo buscar o seu almoço a casa, o que me valeu namoriscar a criada e antes da mobilização, deu-me uma caderneta militar nova e limpa de todos os castigos, já que eu não era muito domável àquela disciplina militar.

Para tristeza dele só não conseguiu que, depois de me fazer cabo, eu me inscrevesse para a Escola de Sargentos, como ele queria. Mas eu sempre lhe disse que era como as gaivotas e preferia os perigos do mar do que ficar preso em terra.

Portanto,  o meu Pai embarcou para França como cabo e não sofreu propriamente as agruras da frente das batalhas, já que ficou como quarteleiro junto do Comando do "Corpo" (?) de Engenharia, logo sempre na linha da retaguarda, quase sempre aquartelados num daqueles Chateaux, sede duma enorme propriedade agrícola.

O proprietário, que aí vivia com a família, convivia e dava-se muito bem com as tropas Portuguesas e, como o meu Pai dizia, até nisso tinha tido sorte pois era tratado pelo francês com muita deferência, se bem que só mais tarde viesse a desconfiar qual o motivo para tal.

É que os donos daquelas propriedades tinham apenas uma filha, por sinal também em idade de casar e,  apercebendo-se das qualidades do portuguesito, como ele dizia, começaram a pôr o olho nele para tomar conta da empresa agrícola. Só que havia ficado cá,  nesta vila maruja, uma costureirinha que lhe tinha já "costurado" o coração e, com muita pena do francês, nada feito.

Como já disse, depois de regressar da França passados dois ou três anos casou-se e,  após o nascimento da primeira filha, emigrou legalmente para os USA, onde mourejou muito quase sempre como pescador, com excepção dos tempos da "Depressão", em que teve de apanhar todos os diversos tipos de trabalho em terra que conseguia.

Envio então as duas fotos

1 – Um grupo de militares camaradas de meu Pai, que é o 1.º da esquerda sentado, em França.

2 – Outro grupo de camaradas, estariam alguns na foto 1 (?), e enviada em IX/X/18.

Três são de Ílhavo: o meu Pai, é o da extrema direita e os outros conterrâneos chamavam-se, João Pinto e Manuel Silva. O civil era (um "Monsieur Francês muito meu amigo", nas palavras de meu Pai) e o 4.º militar era do Porto.

Recordando as histórias que o meu Pai contava, seria este Francês que ele escreveu Monsieur, o tal grande agricultor cuja quinta tinha um palacete e que queria casar a filha com o meu Pai?

Abraços

Jorge Picado
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Guiné 63/74 - P11802: VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (20): Monte Real, 8 de junho de 2013 (Parte VII): Uma foto histórica, a do reencontro dos 'velhinhos' José Augusto Ribeiro e Carlos Paulo (CART 566, Olossato, 1964/65) com o Rui Silva (CCAÇ 816, Bissorã e Olossato, 1965/67)


Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > 8 de junho de 2013 > VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande > Três  "velhinhos" da guerra da Guiné: José Augusto Ribeiro (Condeixa), Rui Silva ( Santa Maria da Feira) e Carlos Paulo (Coimbra). (*)

O Paulo e o Ribeiro eram, naquele sítio e momento, se não me engano, os "velhinhos" dos mais "velhinhos", em termos de antiguidade na tropa... Pertenceram à CART  566 (que veio de Cabo Verde, 1963/64. para reforçar o TO da Guiné, no início da guerra, 1964/65)... Por seu turno, o Rui Silva pertenceu à CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67). Conversa puxa conversa. andaram nos mesmos sítios e na mesma guerra. Daí esta "foto histórica"...

Foto: © José Augusto Ribeiro (2013). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do nosso camarada José Augusto Ribeiro que eu tive o gosto de pessoalmente conhecer e abraçar em Monte Real, no passado dia 8 de junho, e que se comprometeu em trazer, para a nossa Tabanca Grande, o seu camarada de armas Carlos Paulo:

Data: 9 de Junho de 2013 às 23:44
Assunto: Uma fotografia histórica.;

Camarada Luís Graça, essa fotografia histórica está aqui, afinal o fotógrafo estava lá.

 É verdade que se fizeram várias operações em conjunto, a CART 566 e a CCAÇ 816. Não é possível me lembrar da "cara" do Rui Silva (**), pois já passaram quase 50 anos sem nos termos encontrado, mas lembro-me do dia 1 de Agosto de 1965, a que eu chamei O DIA MAIS LONGO, em carta que escrevi à minha jovem Madrinha de Guerra, hoje minha mulher, casados há 47 anos. O Rui também lhe chamou O DIA MAIS LONGO..

Os relatos do Rui eram também iguais aos nossos. Outras operações também foram recordadas. O Olossato, o nosso guia "Vacar" que ficou cego, o quintal do caboverdiano, etc..

Estes encontros são salutares. Eu gostei de participar, por isso quero dar os parabéns à organização que fez um bom trabalho. Parabéns para todos e em especial para o Carlos Vinhal que está de serviço quase 25 horas por dia. 

Um abraço para todos, deste que em idade seria o mais velho presente naquele dia.

José Augusto Miranda Ribeiro
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Notas do editor:

(*) Últim poste da série > 22 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11746: VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (19): Monte Real, 8 de junho de 2013 (Parte VI): Dando de comer ao corpo e à alma: seleção de fotos do Jorge Canhão

(**) Vd. poste de 9 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11685: VIII Encontro Nacional da Tabanca Grande (12): Monte Real, 8 de junho de 2013 (Parte I): as primeiras imagens da nossa festa anual

(...) Comentário de Rui Silva

Coisas da Tabanca Grande:

Não é que andei com estes 2 camaradas, o José Ribeiro e o Carlos Paulo, juntinhos, mais à frente ou mais atrás, em operações no mato e que de uma forma extraordinária e inconcebível (até), nos viríamos a encontrar praticamente 50 anos (meio século) depois?!!

Que grande prazer e satisfação!

De facto o mundo é pequeno e esta tabanca é mesmo muito GRANDE.

Rui Silva, sem deixar de enviar um grande abraço para estes amigos e também para ti Luís, principal "causador" destes encontros quase, quase improváveis. (...)
 

Guiné 63/74 - P11801: Bom ou mau tempo na bolanha (17): O 4 de Julho nos Estados Unidos (Tony Borié)

Décimo sétimo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.




Olá camaradas combatentes
Tal como nós festejamos, ou devíamos festejar, algumas datas importantes da nossa história, do nosso Portugal resistente, do nosso Portugal combatente, que lutou em algumas guerras, desde o reinado de D. Afonso Henriques, que a algumas centenas de anos, se lembrou de dizer à sua mãe:
- És minha mãe, mas não gosto do Rei de Castela, vou ser independente,
nos Estados Unidos festejam o dia 4 de Julho, como o Dia da Independência, é um feriado nacional que celebra a Declaração de Independência de 1776, ano em que as treze Colónias declararam a separação formal do Império Britânico.


Este dia, o “Dia da Independência”, é o feriado mais importante dos Estados Unidos e tem forte influência sobre a cultura americana em geral, tendo sido retratado nos mais diversos meios de informação.

Usualmente, comemora-se com muitas actividades ao ar livre, existem algumas celebrações de reconhecimento aos antigos combatentes, as famílias juntam-se em “picnics”, jogos de basebol e espectáculos de fogos de artifício, que chegam a ser deslumbrantes.


Não vamos historiar, mas vamos explicar só um pouquinho do que significa este dia para nós, que aqui vivemos e fizemos deste país uma segunda Pátria.


Durante a Revolução Americana, a separação legal das treze Colónias da Grã-Bretanha, ocorreu em 2 de Julho de 1776, quando o segundo Congresso Continental votou para aprovar uma resolução de independência que havia sido proposto em Junho, por Richard Henry Lee, de Virginia, declarando os Estados Unidos independente da Grã-Bretanha.
Depois de votar pela independência, um comunicado explicando esta decisão, que havia sido preparado por um comité de cinco, com Thomas Jefferson como seu autor principal, o Congresso debateu e revisou o texto da Declaração, e finalmente aprovou-o em 4 de Julho. Portanto o “4 de Julho”, é o dia que marca a separação da Grã-Bretanha e prepara o início de uma nova nação, que hoje são os USA.

Um abraço do
Tony Borie
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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11788: Bom ou mau tempo na bolanha (16): Afro-americanos (Tony Borié)

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11800: Estórias avulsas (64): A bananeira armadilhada e o frango desvitaminado (João Rebola)

1. Mensagem do nosso camarada João Rebola (ex-Fur Mil da CCAÇ 2444, CacheuBissorã e Binar, 1968/70), com data de 28 de Fevereiro de 2013:

Olá, amigo Carlos
Seguem duas "estorinhas" passadas em Bissorã.
No fundo, de entre muitas, foram situações vivenciadas em terras da Guiné, onde um pouco da nossa juventude foi severamente delapidada.

Um abraço
JRebola


A bananeira armadilhada e o frango desvitaminado

Estávamos em princípio de Abril de 1969. Os quartos dos furriéis da CÇac 2444, ficavam um pouco mais acima do tasco do “ Labinas”. Eu tive a sorte de conseguir um pequeno espaço, onde já se encontrava uma cama, uma mesinha de cabeceira e uma estante em madeira, ao fundo do quarto, pregada à parede. Mais, era impensável. E aqui assentei armas e bagagem, durante 14 meses.

Na “suite”, nada faltava: havia luz, rádio gira-discos, whisky, a foto da amada

Antes de iniciar estas pequenas “estórias”, pergunto-vos se ainda se lembram do” Labinas”?! Dele falarei um pouco mais à frente.

Então vamos lá às “estórias”.

Em frente dos quartos, encontrava-se um quintal com algumas árvores, arbustos e uma atrevida bananeira, que suspendia, para o vulgo apreciar, um grande cacho de bananas. Pelo mesmo, vagueava um belo frango. Dava gosto olhá-los. Mas era necessário tê-los debaixo de olho, não fosse o diabo tecê-las… Ora como o local era muito movimentado, devido à presença dos vários furriéis, que ali dormiam, não era fácil, durante o dia, serem surripiados. O leitor amigo, pergunta-me: - E de noite? Bom, responderei que a noite era boa conselheira, já que ninguém ousava entrar no quintal, sabendo que estava sujeito a arrepender-se!

Mas era eu que mostrava mais interesse pelos mesmos.

Ora, um dia, o pobre galináceo, talvez por só comer arroz ou por qualquer outro motivo, não conseguia levantar-se. Estava sem forças. E se lhe desse, as vitaminas que tomávamos na messe? Se bem pensei, bem o fiz! E deu resultado, pois ao fim de algum tempo, sem grande dificuldade, já se erguia, percorrendo-o e depenicando ali e acolá.

Acontece que tinha férias marcadas e pensei numa maneira de tentar que o cacho lá permanecesse até ao meu regresso: armadilhá-lo! Depois de dar conhecimento aos meus colegas do que me propunha fazer, assim procedi e com efeitos muito práticos. Passei vários fios pelas ditas – só para assustar - e dependurei uma granada de bazooka e algumas de mão – sem detonador, claro - e pronto, já está!

Que melhor guarda de honra poderia ter aquele cacho de bananas?!

Entretanto, nada aconteceu durante a minha ausência, em relação às bananas, mas algo tinha desaparecido do quintal: o frango, que me fora oferecido e que preso por uma pata o explorava, alimentando-se de arroz, dado pelos meus colegas e daquilo que as suas unhas iam descobrindo nos buracos que abriam.


Ah! Vamos ao “Labinas”.

Manuel Lavinas Soares, de seu nome, era um destemido soldado, condecorado com a Cruz de Guerra, pertencente a uma companhia sediada em Bissorã, em meados dos anos 60, terminando aqui a sua comissão. Talvez “ferido” pelas setas do Cupido, regressou para junto da companheira e filhos até a guerra terminar.

Paralelamente, ao ramo da restauração, tinha outro negócio, ou seja, dedicava-se também à compra de mancarra e caju, principalmente, dando, em troca, depois de pesados, o produto base da alimentação da população: arroz.

A pesagem (vi algumas) era feita num anexo contíguo ao tasco, afastada de qualquer olhar! Em Bissorã, no meu tempo, a messe dos sargentos funcionava numa casa particular, a do sr. Maximiano, marido da D. Maria, ambos cabo-verdianos. Era da responsabilidade desta última a confecção das refeições.

Ora, muitas das vezes, a comida não nos agradava e como tal, íamos ao “restaurante” do “Labinas”, que nos servia, entre outras coisas, frango assado com bastante “gindungo” e batatas fritas. Bebidas também não faltavam.

Foto de 1970 – petiscando (2º. à esquerda) com elementos do meu pelotão, no tasco do Labinas

Voltemos à “estória”.

Desaparecido o galináceo, que acabou por sucumbir, possivelmente, às mãos de (des)conhecidos para seu repasto - restaram as bananas. Bom, fosse quem fosse, o segredo ainda perdura!

O cacho das bananas foi cortado e dependurado no meu quarto, aí amadureceram e foram desaparecendo consoante a minha vontade.

E assim, vinguei o desaparecimento do meu frango.

Fotos de 2011 

O que resta da messe dos sargentos

Posando à porta onde era o tasco do Labinas

E acabaram assim estas simpáticas “estórias” que foram recordadas, passo a passo, quando me desloquei à Guiné-Bissau, com um grupo de ex-combatentes, numa viagem de saudade, em 2011. Ao fim de 41 anos, o sonho de um dia regressar àquelas terras, tornou-se realidade.

Espero ainda poder voltar, e se for o caso, direi: “Até ao meu regresso”
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11296: Estórias avulsas (63): O menino que não sabia ler (António Eduardo Ferreira)

Guiné 63/74 – P11799: Memórias de Gabú (José Saúde) (29): Apresentação do meu livro "As minhas memórias de Gabu" em Beja, dia 4 de Julho


1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.


GUINÉ-BISSAU AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU 1973/74

Apresentação em Beja

Camaradas,



Na Biblioteca Municipal de Beja, José Saramago, terá lugar no dia 4 de julho, pelas 21h30, a apresentação da minha 5ª obra cuja temática se situa sobre a minha, nossa, obviamente, comissão militar na Guiné.

São histórias reais, contadas na primeira pessoa, admitindo que a temática relatada é, sobretudo, transversal a gerações que cruzaram o espaço territorial guineense. Foram, no fundo, 11 anos de guerrilha, onde se constata a infeliz realidade de milhares de mortos, outros estropiados e de gentes que vivem hoje sobre a patologia pós-traumática de uma guerra que não deu tréguas, entre outros que paulatinamente ainda vão contando as suas hilariantes narrações da guerrilha na Guiné.

Sou um dos muitos milhares de antigos combatentes que cruzaram a guerra com a paz e que se predispôs a compilar num livro uma vivência real num palanque onde conflito armado não dava sinais de apaziguamento.

A oportunidade será, também, um repto para os camaradas reviverem tempos passados, lançando, em simultâneo um grito de alerta, e de revolta, pelo esquecimento de antigos combatentes numa guerra, recente, que estilhaçou, em parte, a nossa juventude.

“Não é de jogos de guerra aquilo que aqui se fala, mas de simples memórias”, como diz Luís Graça no prefácio, neste contexto o conteúdo da narrativa é fértil em sentimentos comuns e de imagens que nos fazem reviver lugares partilhados.

Conto com a presença de ex-combatentes da guerrilha da Guiné.

Junto, claro, um panfleto do respectivo convite. 


Um abraço, camaradas 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

Guiné 63/74 - P11798: História da CCAÇ 2679 (62): Invasão em Bajocunda (José Manuel Matos Dinis)

Vista aérea de Bajocunda
Foto: © Amílcar Ventura, com a devida vénia

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 27 de Junho de 2013:

Olá Carlos!
Já há algum tempinho que não dava notícias sobre a minha "guerra".
Hoje, subitamente, aflorou-me uma estória que passo a descrever.

Para ti, e para o tabancal, vai aquele abraço
JD


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679

63 - INVASÃO EM BAJOCUNDA

Ainda hoje eu durmo profundamente, e passo entre 8 a 10 horas a dormir. É conforme. Também aguento menos, quando é preciso, mas por norma tenho um grande apego à cama. Naqueles tempos da juventude galdéria, se o corpinho era generoso a despender energias, também não abdicava das condições de recuperação, entre elas a de dormir profundamente, fosse debaixo do firmamento diamantino das noites guineenses, fossa no colchão de espuma da Manutenção Militar. Durmo, mas é raro roncar. Sou como um menino.

Tinha mudado para o quarto das traseiras, onde os ruídos da manhã levavam mais tempo a chegar, e eu permanecia sem dificuldades no limbo de sonhos quentes.

Uma ocasião, imprevistamente a meio da noite, senti uns abanões e abri os olhos sem força para reagir. Mas o que vi? Nosso Senhor! À minha frente, empunhando a espingarda-automática G-3, com o cinturão a pender da cintura, mas sem tapar o órgão genital, apresentava-se um contra-guerrilheiro, que identifiquei logo pela voz que, apesar de contida e assustada, permitia-me reconhecer um bravo combatente oriundo do Minho remoto, de Perre, mais propriamente, que adiantava: "eles estão cá dentro!".

Nem pensei no terrível significado daquela informação de alerta a exigir uma valente reacção, ou teria respondido para os mandar sair imediatamente, e que se pusessem na alheta para prosseguir a justa soneca. A minha displicência valeu-me um novo empurrão, e aí o Morais falou-me sério: "eles já estão cá dentro, mexe-te!". E dirigia-se à minha pessoa, não restavam dúvidas.

Soergui a cabeça e vi um autêntico homem-de-guerra, com uns chinelitos chineses enfiados nos dedos dos pés, fardado à pai Adão, feições rígidas, e equipado para matar. Pulei da cama, procurei a "canhota" e o cinto dos carregadores de municiação. Ainda procurei a boina, mas não era necessária. Nos quartos havia um bulício surdo. Estaríamos ali meia-dúzia de valentes furriéis à rasca com a situação. "Se eles já entraram, sabem que nós estamos aqui", disse um. "Foda-se!" respondeu outro. Com jeitinho cauteloso, alguém tentou abrir a porta para tentarmos constatar a situação no exterior, mas aquela merda velha e colonial, rangia com a deslocação e dava conta da nossa presença na casa.

Para que uma cabeça pudesse alcançar o exterior e perscrutar no escuro, foi preciso insistir no ranger da porta descaída, e logo soou um aviso sensato e acagaçado: "Não façam barulho com a porta, carago!". O Tito, que já usava uns óculos de lentes grossas, e estava dispensado das saídas noturnas porque se atirava paro o chão espampanantemente de cada vez que tropeçava numa ervinha, era, obviamente, o mais habilitado para proceder à observação.

Talvez por incapacidade para conter o nervosismo, ou para assustar o IN naturalmente surpreendido com a insólita decisão, começa a correr na direcção do pau-de-bandeira, na parada à nossa frente. Estupidamente solidário, atirei-me em correria atrás dele para lhe contar os balázios no caso do IN responder com artilharia. A meio caminho, já ultrapassados uns 20 metros de território beligerante, parámos surpreendidos pela total ausência de tiros.

"Foda-se! onde é que os gajos estão?" - interrogava-se um intrépido furriel miliciano, desejoso de aplicar uma valente lição nos irritantes perturbadores do sono alheio. Reorganizada a tropa como força de combate, dirigimo-nos para junto do Posto de Rádio de onde vinham vozes.

Estava lá o capitão Trapinhos, já antes alertado para a guerra e à procura de um lugar seguro, como seria o abrigo das transmissões, e mais alguma tropa de "especialistas". Ficámos então a saber, que o sargento David, movido pela insónia, ou pelos efeitos de alguns vapores etílicos, estava junto da porta da secretaria a contar carneiros que não acabavam, e viu umas silhuetas ao longe, a deslocarem-se com cargas destruidoras às costas em direcção aos obuses.

Ainda havia tempo para lançar o alarme, pois ainda nada tinha ido pelos ares. E foi o que fez. Dirigiu-se às Transmissões onde foi muito bem acolhido, e de onde, diligentemente, saíram os alertas para o capitão e oficiais. Ainda hoje não faço ideia como é que os furriéis foram alertados para a ameaça destruidora, mas lá que há bruxas, há!

Mais uma vez dei prova de uma estupidez descontrolada, e perguntei a s.exa. o capitão Trapinhos, se já tinha providenciado uma batida na aldeia, no sentido de evitar o pior. Não, não tinha. E logo me incumbiu de ali recrutar uma força para o efeito.

Lá fui com uma dúzia de bravos cozinheiros, mecânicos de viaturas e armamento, o escrita, o corneteiro, o básico, e mais alguns que não posso identificar. Dei uma instrução simples e fundamental, sobre a acção surpresa que íamos desencadear, sobretudo que não dessem tiros, ou teria que foder os cornos a algum gajo, para mais dos nossos.

Logo à segunda morança, talvez, entrei numa tabanca, pus a mão num cesto com milho, remexi, mas não achei nada além dos grãos. Na esteira, os olhinhos surpreendidos dos moradores, miravam-me estupefactos. Ainda havia um pequeno ajuntamento de panos, que segurei, mas nada de grave aconteceu. Entretanto, entrara atrás de mim, sem que disso me tivesse dado conta, um sacana que batisava as bajudas todas, e ao pousar os olhos sobre um gajo que ali estava encostado à parede de adobe, referiu que aquele não era dali. Confiado pelo absoluto conhecimento e identificação dos moradores, por parte daquele militar, aquela informação indiciava que ali havia coisa.

Disse ao desconhecido para sair comigo, o que o senhor fez sem protestos. Depois, já no exterior, chamei dois homens da força, e encarreguei-os de conduzirem o prisioneiro. "Para onde?" queriam saber. Caraças, em Bajocunda nem havia prisão! Mas, espertinho como sou, logo me lembrei de um local adequado, e mandei-o para o abrigo dos "auto-rodas", com a recomendação de que informassem o Pedro, que o cavalheiro ia ali passar a noite.

Depois, lembrei-me de como tudo tinha começado, e, conforme a informação, teria partido de uma constatação do sargento David, homem experiente de muitas guerras. "Pronto, malta! Vão mas é dormir, que já chega desta merda!"

E o pessoal destroçou. Eu regressei à cama onde me preparava para recomeçar a divagação de sonhos, quando começo a ouvir rajadas, que rasgavam chagas nas trevas da noite. Mas era do outro lado de Bajocunda, lá para o portão de acesso a Pirada. E os tiros continuavam numa cadência de uma arma solitária, com ligeiros intervalos, e dava-me conta que iam mudando de posição, e já pareciam vir do lado do portão de Amedalai.

Com frequência regular, percebia-se que a carga passaria em breve pelo arame do lado norte, e cheguei a pensar ir às traseiras da nossa casa, armar uma emboscada ao atirador, ou atiradores, que perturbavam o direito dos cidadãos ao merecido descanso.

Acabei por adormecer. No dia seguinte, fui acordado por um elemento da mecânica, que me transmitiu a pergunta do furriel Pedro sobre o destino a dar ao preso. "Ele que o meta num orificio", foi mais ou menos o que respondi. Depois levantei-me e fui tomar o valente "breakfast". Estavam lá dois ou três "gentlemen" mais madrugadores e muito bem informados, que comentavam os acontecimentos da noite.

Segundo eles, o bezanado quadro do exército português estava estacionado na varanda do edifício do comando, que também era sede da secretaria, e, nas traseiras, acolhia Jesus, o dedicado gerente do bar. Por entre desconformes raios visuais deve ter reparado em algum movimento de pessoal, provavelmente de militares do pelotão de artilharia que, oriundos da tasca em frente ao Silva, se deslocavam para junto dos obuses. Daí à operação mortífera sobre as NT foi só uma questão de extrapolação. Depois de desfeito o equívoco, o dito militar, não satisfeito, ainda decidiu lançar uma campanha de intimidação sobre o IN, pelo que convocou um condutor, e sobre um "unimog" circulante decidiu-se à perigosa tarefa de despejar carregadores atrás de carregadores, enquanto davam a volta à localidade, numa prática de despesismo em material de guerra, que deve ter ficado plasmado numa informação a letras de ouro, sobre a acção de rechassamento de uma qualquer suposta força inimiga.

Quanto à minha intervenção heróica, fiquei a saber que tinha capturado um parente de uma família residente, em passagem para um qualquer destino, mas de quem não se tinha conseguido a mínima informação de relação com o IN. Por fim, ainda decorrente da heroicidade do meu acto, o furriel Pedro tinha passado a noite de olhos arregalados, com a arma apontada para o inimigo capturado, que mecânicos e condutores lhe puseram à frente, em sinal de respeito e reconhecimento pela liderança na Secção. Andava a propalar que havia de dar-me um tiro nos cornos. Felizmente que ainda não os tinha, e acabou por esquecer o incidente.

Com homens desta fibra, defendeu-se, no meu tempo, a teoria do "direito real" no que respeitava à preservação histórica dos direitos lusitanos, sobre o exercício da posse e manutenção e desenvolvimento da integridade dos territórios pátrios.

JD
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11186: História da CCAÇ 2679 (62): Um caso com o Vieira (José Manuel Matos Dinis / Cândido Morais)

Guiné 63/74 - P11797: In Memoriam (154): Roberto Quessangue, cofundador e presidente da assembleia geral da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, especialista em questões agrícolas e ambientais, morre hoje no Hospital Nacional Simão Mendes, em Bissau


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Simpósio Internacional de Guiledje > 1 de Março de 2008 > Cerimónia de boas vindas aos convidados estrangeiros e nacionais > Roberto Quessangue, cofundador e presidente da Assembleia Geral da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, desempenhou nesta cerimónia o papel de interface entre a comissão organizadora do Simpósio e a comunidade local de Guiledje. Ei-lo aqui atento, ouvindo a voz dos homens grandes. O êxito do Simpósio deve-se também, em grande parte, à sua capacidade de trabalho em equipa.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 de março de 2008) > 1 de Março de 2008 > Visita ao antigo quartel de Guileje e cerimónia de boas vindas aos convidados estrangeiros e nacionais > Roberto Quessangue, de perfil.



Guiné-Bissau >  Bissau > Hotel Azalai >  Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 de março de 2008) >  29 de Fevereiro de 2008 >  Receção de boas vindas aos convidados estrangeiros e nacionais. O casal Quessangue, Roberto e Francisca, com a Maria Alice Carneiro e a Diana Andringa. A  Francisca era antiga enfermeira do PAIGC, e, na data, enfermeira no Hospital Regional do Gabu. O Roberto Quessange tinha muitos amigos em Portugal, país de que gostava muito. Foram ambos uma presença constante, amiga e afetuosa, ao longo da semana, ele e a esposa.


Guiné-Bissau >  Bissau >  Simpósio Internacional de Guiledje > Convívio num restaurante da capital > 6 de março de 2008 > O casal Quessangue.


Guiné-Bissau > Bissau > Simpósio Internacionald e Guiledje (1-7 março de 2008) > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > À saída do edifício da Presidência da República, a então Ministra dos Antigos Combatentes da Liberdade da Pátria, Isabel Buscardin, de costas; e um elemento da comissão organizadora do Simpósio, cofundador e presidente da Assembleia Geral da ONGD AD - Acção para o Desenvolvimento, Roberto Quessangue, e antigo secretário de estado dos recursos naturais e do ambiente, no governo deposto pelo golpe de estado de 1998.




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Simpósio Internacionald e Guiledje (1-7 março de 2008) > Florestas do Cantanhez > Visita ao acampamento (reconstituído) Osvaldo Vieira, a sul de Iemberém > 2 de março de 2008 >  Em primeiro palno, a Francisca Quessangue, esposa do Roberto, presidente da Assembleia Geral da AD, que eu descrevi, na altura, como "uma doçura de pessoa"

(...). "E, no entanto, tinha todas as razões para ter ódio no seu coração: o pai foi morto, com três tiros, friamente, por tropas africanas, por se recusar a denunciar os camaradas da guerrilha do PAIGC... Uma tia dela que estava grávida e que assistiu, aterrorizada, a esta cena, escondida por detrás de uma árvore, teve um aborto espontâneo. O pai da Francisca era papel, da região de Bissau. Viveu no mato, onde ela cresceu. Tinha responsabiliddaes políticas, não era combatente. A Francisca estudou enfermagem na ex-União Soviética. Estava num hospital de retaguarda, na fronteira, aquando do ataque a Guileje. Hoje é enfermeira no Hospital Regional do Gabu. É uma das oradoras do Simpósio. Vai fazer uma comunicação sobre "os aspectos sanitário-logísticos do PAIGC no assalto ao quartel de Guiledje", dia 6 de Março. Ostenta uma T-shirt com uma campanha da Unicef Semana Nacional de Amamentação. Hoje na Guiné-Bissau as jovens mães já não querem dar de mamar aos seus filhos, por razões estéticas". (...)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 março de 2008) > Aldeia piscatória de Cananima, na margem direita do Rio Cacine, frente à povoação de Cacine > Almoço da comitiva >  2 de março de 2008 > A Francisca com a Isabel Buscardini, na altura ministra dos Antigos Combatentes da Liberdade da Pátria.


Guiné- Bissau > Bissau > Um último adeus da AD ao seu cofundador e líder da assembleia geral, especialista em questões agrícolas e ambientais. Acaba de morrer hoje, em Bissau. Julgo que não teria 60 anos (LG).

Palavras que o Roberto Quessangue escreveu, aquando da criação da página da AD na Net, à laia de boas vindas:

"O elevado espírito de equipa e dinâmica de trabalho dos seus quadros e técnicos e, fundamentalmente, dos nossos parceiros comunitários, permitiu à AD demonstrar ao longo dos últimos 14 anos que é possível combater a pobreza, preservar a natureza e criar dinâmicas de progresso e desenvolvimento.

"Estamos igualmente muito reconhecidos aos nossos parceiros do Norte e numerosas pessoas singulares anónimas que se solidarizam e apoiam iniciativas das comunidades rurais e urbanas da Guiné-Bissau e que, graças à sua dedicação e interesse tornaram possível a implementação de diversas acções de desenvolvimento com resultados muito positivos.

"Se é verdade que muita coisa foi feita, porém, ainda muito mais está por fazer…

"Caros Amigos, a nossa ONG olha para futuro com optimismo.

"Como 'a amizade é o único combustível que aumenta à medida que é utilizado', aceitem o nosso abraço amigo".



Fotos (e legendas): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.


 1. Mensagem que nos chega, hoje, de manhâ, às 11h56, dos amigos da AD - Bissau, 


Luís

Hoje é um dia muito triste para nós. Faleceu, no Hospital Simão Mendes, o nosso amigo, camarada e líder da Assembleia Geral da AD, Roberto Quessangue.

A AD presta-lhe hoje uma simples homenagem no seu site:
www.adbissau.org

Sei que o conheceste.

pepito

2. Reprodução do texto, coletivo, inserido hoje, no sítio da AD:

 Até sempre, Roberto

Jul 03, 2013

Como gostosamente sempre recordavas, foi debaixo daquela palmeira,  junto ao porto de Caboxanque, que convocaste um grupo de camaradas [, Pepito, Isabel Levy Ribeiro, José Filipe Fonseca, Nelson Dias, Isabel Miranda, Rui Miranda...] e os desafiaste: e se criássemos uma ONG?

Nascia aí, nessa manhã, no intervalo de uma reunião do DEPA [, Departamento de Experimentação e Produção de Arroz, ]

Lideraste durante 21 anos, como Presidente da nossa Assembleia Geral, os destinos da AD, usando sempre aquela simplicidade, ironia, inteligência e sentido de unidade, para marcares de forma definitiva a cultura da nossa organização, todos fortemente à volta de um ideal de sociedade e de desenvolvimento.

Com sabedoria, foste relegando para fora aqueles problemas existentes em todas as organizações de todas as longitudes e que conduzem à desunião e ao fracasso.

Lideraste a AD nos contatos internacionais, onde ninguém podia resistir ao encanto das tuas palavras e das tuas estórias e todos se rendiam à tua capacidade técnica e de argumentação.

Perdemos-te nós e perdeu o país, que nunca foi capaz de reconhecer o trabalho impar que fizeste sozinho em Boé. Outros tentaram, mas foram ficando pelo caminho.

A população de Boé, essa, guarda de ti a lembrança de ter trazido consigo,  durante os anos que lá estiveste,  a esperança de que tinha valido a pena a luta pela independência.

Serviste o país sem nada pedir em troca, mas recebeste da vida o reconhecimento daqueles que nunca esquecem: a família, os amigos e as populações.

Contaste sempre com a Francisca, tua mulher e companheira de sofrimento e alegrias.

A tua última grande preocupação foi a de criares os teus filhos e assegurares-lhes um futuro em que eles possam sentir o orgulho do pai que tiveram.

Esta madrugada, quando a noite partia e começava um novo dia, deixaste-nos, órfãos de um amigo, de um camarada, de um líder.

Estaremos contigo sempre, SEMPRE!

Os colegas da AD

3. Mensagem de L.G. enviada ao Pepito e demais amigos da AD:

Pepito: Tenho uma grata e terna memória desses dias em que convivemos, eu e a Alice, mais estreitamente com a Francisca e o Roberto!... É duro para todos, a começar para a Francisca e filhos, a perda de um marido, pai, cidadão, camarada e amigo como foi o Roberto... (Recordo-me dele me ter falado dos filhos, com ternura, estando eles na época a estudar no estrangeiro; bem como das saudades de Portugal e dos amigos portugueses).

Dá um abraço muito afetuoso e apertado à nossa querida Francisca (cuja anónima mas heróica história de vida tive o privilégio de ouvir, da sua própria boca, nessa "semana inolvidável" de convívio e de conhecimento mútuo que foi o Simpósio Internacional de Guiledje, de 28 de fevereiro a 7 de março de 2008). 

E, claro, para ti e para a AD, vai toda a minha solidariedade na dor pela perda de um elemento fundamental da equipa, e um grande amigo. Tenho várias fotos do Roberto, tiradas nesses dias, incluindo uma à porta da Presidência da República. 

Vou já fazer, na hora do almoço, um poste em sua memória. Diz-me mais ou menos em que ano nasceu e onde (Bissau? Ou Oio? Tenho ideia que ele era da região do Oio, e que também militou, como tu, na JAAC - Juventude Africana Amílcar Cabral ...Sei que ele tinha sido secretário de estado dos recursos naturais e do ambiente, no mesmo governo em que tu participaste antes do golpe de Estado de 1998. 

Se puderes, manda-me uma curta nota biográfica. Vou também reproduzir o teu texto, admirável, publicado na página da AD. Como é difícil falar dos nossos sentimentos de perda, num evento funesto como este. Mas soubeste fazê.lo com grande dignidade, sabedoria, razão e coração.
Um xicoração do Luis.
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Nota do editor:

Último poste da série > 28 de junho de 2013> Guiné 63/74 - P11771: In Memoriam (153): Américo Justino do Carmo Martins, ex-sold cond auto, CCAÇ 557 (Cachil, Bissau, Bafatá, 1963/65): mais um homem bom que se despede da terra da alegria (José Colaço)

Guiné 63/74 - P11796: Os nossos médicos (57): A CART 3493 nunca teve médico - diz António Eduardo Ferreira; resposta ao inquérito por Jorge Picado

1. Ainda a propósito do tema Os nossos médicos, o nosso camarada António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto da CART 3493/BART 3873, MansamboFá Mandinga e Bissau, 1972/74) mandou-nos esta mensagem com data de 27 de Junho de 2013:

Amigo Carlos Vinhal
Antes de mais recebe um abraço e votos de boa saúde.

Ultimamente, tem-se falado no blogue de médicos que integravam os batalhões. Quantos iam naquele a que eu pertenci, o 3873, não sei, fui uns dias mais tarde, apenas conheci a companhia já em Mansambo, mas a Cart 3493 nunca teve médico, recordo-me, de quando estávamos em Cobumba lá ter ido o médico duas ou três vezes, penso que estava sediado em Bedanda, não tenho a certeza.

Aquilo que ele me disse a única vez que falei com ele, talvez seja exagerado dizer que foi uma consulta, eu estava tão fragilizado que tinha dificuldade em movimentar-me, a alimentação era péssima, e o que ele me disse foi: sei que estás doente mas não te posso mandar para Bissau, e a “consulta” terminou assim.
Eu não lhe tinha pedido para me mandar para Bissau, talvez por descargo de consciência me tenha dito aquilo.

No dia que viemos embora de Cobumba, só tínhamos uma viatura, para complicar mais as coisas, naquela manhã avariou, tudo o que tínhamos para trazer foi transportado às costas, ironia do destino, a pessoa a quem paguei para me levar as minhas coisas ao rio, tinha sido carregador do PAIGC, de nome Miranda.
Eu que até ao rio, cerca de um quilómetro, levei apenas a G3, as cartucheiras e uma mala com cerca de três quilos de peso, quando cheguei ao cais, mesmo sabendo que a LDG estava à nossa espera, ia de rastos.

Antes de terminar este reduzido texto, permitam-me que envie um abraço ao Cherno Baldé, o mundo necessita de homens que digam as verdades, não enviei nenhum comentário, mas li com atenção o trabalho por ele enviado.
Passados tantos anos, continuo achar que a guerra tinha que terminar, nem sequer devia de ter começado, mas a forma como foram abandonados aqueles que estavam connosco, foi cruel, pouco importa agora de quem foi a culpa… mas há coisas que não devemos esquecer.
António Eduardo Ferreira

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2. Sobre o mesmo tema recebemos esta mensagem do nosso camarada Jorge Picado (ex-Cap Mil na CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, na CART 2732, Mansabá e no CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72), com data de 28 de Junho de 2013 respondendo ao inquérito:

Amigo Carlos
Aproveitando um momento livre de acesso à NET, aqui da Costa Nova do Prado, onde o vento forte persiste em refrescar estes dias que dizem ser de calor (!), envio-te o que sei da "minha" Unidade "mãe", BCaç 2885 sobre os Serviços de saúde, de acordo com a ordem das propostas apresentadas.

Assim:

(i) Quantos médicos seguiram com o vosso batalhão, no barco?
R - Da HU constam 3 Alf Mil Méd que embarcaram com o BCaç.

(ii) Quantos médicos é que o vosso batalhão teve e por quanto tempo?
R - Só me recordo de dois deles, que permaneceram, um até final FEV71 e o outro foi transferido em 20NOV70 para o BCaç 2884, sendo substituído por um dos médicos dessa mesma Unidade que chegou a Mansoa em JAN71.

(iii) Lembram-se dos nomes de alguns? Idades? Especiallidades?
R - Os seus nomes eram: Drs José Maria Gomes Brandão, José Rego Sampaio (o transferido), Adelino Carlos F. G. Correia de quem não tenho qualquer recordação. Admito que pudesse estar em Porto Gole com a CCaç que aí estava colocada, mas isso só pode ser comprovado pelos camaradas que pertenceram à Unidade desde o seu início. O nome do que veio do BCaç 2884 por troca do transferido era António H. Bigotte D. Loureiro. Como eram Alf Mil foram com certeza no início da carreira.

(iv) Precisaram de alguma consulta médica?
R - Fui consultado mais do que uma vez, quer em Mansoa, quer no CAOP 1 em Teixeira Pinto. Em Mansabá não fui ao médico, mas fui ao HM de Bissau na sequência das consultas do Dentista, mas então para tratar da prótese.

(v) Estiveram alguma vez internados na enfermeria do aquartelamento (se é que existia)?
R - Havia Enfermaria no Quartel de Mansoa. Não estive internado na Enfermaria.

(vi) Foram a alguma consulta de especialidade no HM 241?
R - Fui ao HM de Bissau várias vezes, para consulta de Dentista de que acabei com a colocação da minha 1.ª prótese e depois, já no CAOP 1 acabei por baixar a este Hospital em 23NOV71 onde permaneci 3 ou 4 dias, ficando mais 2 em consulta externa, após uma grave intoxicação com sardinhas de conserva.

(vii) Foram evacuados para a metrópole, para o HMP?
R - Não.

(viii) Tiveram alguma problema de saúde que o vosso médico ou o enfermeiro conseguiu resolver sem evacuação?
R - Não.

(ix) O vosso posto sanitário também atendia a população local?
R - As POPs eram atendidas nos Serviços de Saúde em Mansoa pelos Médicos militares e também nas Unidades (e Destacamentos pelos Enfermeiros).

(x) (E se sim, o que é mais que provável:) Há alguma estimativa da população que recorria aos serviços de saúde da tropa?
R - Talvez muitas dezenas, se não mesmo centenas por mês.

Abraços para todos
JPicado

PS - Se o César Dias ou o Nabais quiserem ser mais precisos, agradecia.
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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11784: Os nossos médicos (56): respostas ao questionário: José Manuel Matos Dinis [,CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71]; José Santos [CCAÇ 3326, Mampatá e Quinhamel, 1971/73]; Rui Santos [4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65]; Mário Serra de Oliveira [, BA12, Bissalanca, 1967/68]; e João Martins [, BAC1, Bissum, Piche, Bedanda, Gadamael e Guileje, 1967/69]