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quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23833: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte IV - Guiné


1. Parte IV da publicação de um excerto do livro "Um Olhar Retrospectivo", de Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72), parte que diz respeito à sua vida militar.


IV - guiné…

Dia 31 de Outubro de 1970, outra data marcante, lá estamos, no Cais da Rocha Conde de Óbidos, o
nde o velho Carvalho Araújo nos aguardava para o embarque rumo à Guiné.

O agora capitão Assunção e Silva, promovido nessa altura, pôde confirmar a falta de mais dois graduados, o Cunha e o Rosa, nessa altura, já em França… Mas o Neves e o Cruz estavam presentes…

O capitão Assunção e Silva era conhecido, em Lamego, onde tinha dado instrução, por ‘assassino das falinhas mansas’, pelo baixo tom de voz e porque atingiu dois instruendos, durante a instrução, com bala real de G3.

Eu poderia ter pedido adiamento da ida para a Guiné, pois o meu irmão ainda estava em Moçambique, nesta altura, embora por mais dois ou três meses. No entanto, isso significaria mais tempo de serviço militar, para mim, abandonar a companhia já formada e ser mobilizado, novamente, em rendição individual, logo que o meu irmão chegasse.

Cerca do meio-dia, o Carvalho Araújo apita e começa a arrastar-se pelo Tejo, deixando aqueles lenços brancos a esvoaçar e as lágrimas das gentes a correr pelas tristes faces. A navegar, começámos a sentir uma certa instabilidade no navio, bastante de lado, água e lamas pelos corredores e pelos camarotes que utilizávamos, as portas dos corredores arrancadas para passarem a servir de passadeiras, sobre a água e lamas, uma maravilha. E eu que detestava barcos, não pelos barcos, em si, mas pela água, pois não conseguia ver o que estava lá em baixo…

Tudo indicava que não conseguiríamos comer com sossego e isso veio a verificar-se. Além do enjoo que se instalou, os tabuleiros com a comida deslizavam para todo o lado, ao sabor dos balanços do navio. Nos porões, onde era acondicionado o gado dos Açores, durante anos, os soldados tentavam descansar, com um enorme esforço para se alhearem daqueles odores impregnados, sem alternativa.

Ainda não tínhamos completado um dia de viagem, é-me entregue um telegrama. O sentido apurado de mãe e o facto de ter desconfiado da minha despedida, diferente do habitual, no seu dia de aniversário, levou-a a telefonar para o Campo Militar de Santa Margarida e correr tudo até lhe ser dito que eu tinha partido para a Guiné, já a navegar, no Carvalho Araújo! Aquele telegrama da minha mãe deixou-me um pouco triste mas, ao mesmo tempo, cheio de força para enfrentar a aventura que me esperava.

Um dia de felicidade, quando fizemos a escala em Cabo Verde, ilha de S. Vicente, cidade do Mindelo, onde estivemos cerca de doze horas, para abastecer o navio.

Antes de acostarmos ao cais, os miúdos mergulhavam nas águas transparentes daquele mar livre de poluição, para apanharem as moedas com a boca. Mas a felicidade acabou por ser aparente, durante aquelas horas pois, apesar de termos tido a possibilidade de comer bem e relaxar um pouco, o cenário encontrado deixou-nos infelizes, frustrados, revoltados.

Entrámos na cidade - aquilo era uma cidade?! - E procurámos os correios e um sítio onde houvesse jornais ou qualquer coisa que nos desse notícias. Estou nos correios, a preparar um telegrama para a Metrópole, quando sinto alguém a mexer-me nos pés: era um miúdo dos seus quinze anos a limpar-me os sapatos e com material para engraxar.

Disse-lhe que não precisava, pois havia muito pó e iria sujar-me, logo a seguir. Logo me respondeu que precisava de ajuda, que tinha o quinto ano, mas não havia trabalho. Dei-lhe uns escudos, que trocaria por pesos, a moeda local.

A casa do governador, uma moradia de traça tropical, um liceu novo e um hotel novo, tudo o que sobressaía daquele mundo de casinhas de madeira, algumas transformadas em cafés, com esplanadas, e muito, muito pó castanho avermelhado pelo ar. Ficção, pensava eu, mas as cabras e vacas passeavam pelas ruas e comiam papel de jornal!

O pior deste cenário triste era a prostituição, como é costume dizer-se, porta sim, porta sim, ao longo daquelas ruelas de terra e pó castanho, sinal da necessidade instalada.

Hora do almoço e sou aconselhado a comer no hotel. Lagosta enorme, Pesos 70$00 (Esc 70$00 = € 0,35). Garrafa de Casal Garcia, Pesos 120$00 (Esc 120$00 = € 0,60). Claro que os produtos atingem preços altos, mais por força do custo do transporte.

Cenários que foram mal reconstruídos e continuaram mal tratados, podendo ter tido outro destino, principalmente, no acompanhamento dos mais pequenos, aqueles que mais sofrem, pois têm de ajudar os pais, pobres e sem horizonte. 
Aliás, tivemos esse exemplo por cá, em certas zonas do país, como já falámos.

Viagem retomada, restavam-nos as cartas, lerpa, sete e meio e montinho, principalmente, com muito dinheiro a rolar na nossa frente. Final do dia, já noite, notámos a falta do nosso enfermeiro, o Vítor Coelho. De um lado para o outro, corremos tudo e nada dele. Continuámos, até que, num camarote, um rabo e umas pernas saíam de uma janelinha redonda, constatando que o resto do corpo estava do lado de fora do navio.

Era o Vítor Coelho, debruçado para o lado de fora, com um cabo de vassoura na mão, a que tinha atado uma faca de mato, em ângulo recto, a tentar apanhar um peixe voador. Só o Vítor Coelho poderia lembrar-se disto!…

Algum tempo depois, passámos pela capital, a cidade da Praia, na ilha de Santiago, com pena de não ter sido possível conhecer, pois era a parte mais avançada do arquipélago. Limitámo-nos a apreciar, de longe…

No decorrer da viagem, fomos dando algum conforto moral aos soldados, pois eram os que mais mereciam, dadas as circunstâncias em que viajavam. Comer, uma grande dificuldade, pois tudo andava às voltas…

E a viagem continuava longa, como nos tinham dito. O que não nos disseram foi que o navio andava de lado, com água nos corredores e camarotes pelo meio da perna, lama, probabilidade de incêndio, etc.

E dez dias passaram, até que chegámos ao porto de Bissau. Não nos deixaram desembarcar, claro, pois o anoitecer estava perto e tornava-se perigoso.

Sabe uma coisa, Daniel? Tenho pena de não ter preparado uma garrafa de vidro, com uma mensagem dentro, e atirá-la borda fora, lá no alto mar, só para ver onde iria ter e se teria resposta, como tantos fizeram…

Porto de Bissau, oito da manhã, toca a sair do navio e entrar nas viaturas militares que ali nos aguardavam, rumo ao Depósito de Adidos, em Brá, perto do aeroporto de Bissau.
Não poderia imaginar que já éramos conhecidos ou falados, mas logo nos disseram:
- Ah, são a 2796, a que vai para a colónia penal da Guiné?!

Como acabávamos de chegar, logo, designados ‘periquitos’, eu pensei logo que poderia ser uma espécie de praxe, para nos amedrontar. Organizámos o ‘acampamento’, ajudando os nossos homens na distribuição dos espaços e das tendas de campanha, após o que nos deram uma refeição rápida, na cantina do Depósito de Adidos.

Para os graduados, tendas individuais, um colchão pneumático, já com um ou outro gomo rasgado, mas era melhor do que nada. Silêncio, luzes de presença e segurança, ali estávamos a tentar descansar, já sentindo um certo cheiro a pó africano.

De repente, sinto qualquer coisa nas traseiras da tenda, que davam para a vedação de arame farpado, um som que correspondia a corte na lona. Mesmo na penumbra, vejo uma lâmina a entrar e a sair, lentamente, com cuidado, a cortar a lona, junto ao chão de terra castanha com tom avermelhado.

Consigo resvalar para o lado contrário, a saída da tenda, e rastejar de faca de mato na mão, a única coisa de defesa que tinha, pois ainda não tínhamos recebido as armas. Quando chego ao lado de trás, só vejo um vulto, africano, a correr em direcção ao arame farpado, dando um salto de peixe na primeira linha e novo salto na segunda linha, desaparecendo no escuro…

Logo chamei a atenção do sargento Moreira, no sentido de providenciar a distribuição de armas para o dia seguinte, logo de manhã, pois não se sabia que mais nos estava reservado, mesmo dentro do Depósito de Adidos.

Entretanto, tínhamos de aguardar disponibilidade de LDG (lancha de desembarque grande), com transbordo para LDM’s (lancha de desembarque média) e para LDP’s (lancha de desembarque pequena) ou batelões, caso apanhássemos a maré vazia, um grande problema.

O Daniel está a ver que lanchas são estas, as tais utilizadas no desembarque das forças aliadas, EUA, Inglaterra, França Livre e aliados, na Normandia, durante a Segunda Guerra Mundial, em 1944, considerada a maior invasão marítima da história, episódio que quase era dos nossos tempos. Parece que partiram todos de vários portos de Inglaterra, atravessaram o Canal da Mancha e invadiram a França ocupada pelos alemães, a Normandia.

Como eu ia dizendo, enquanto esperávamos pela hora da partida para o Sul, dava para umas visitas ali perto, Engenharia, Força Aérea, Comandos e à cidade, onde podíamos comer e beber umas coisas melhores do que no quartel, enquanto não nos avisavam da hora de partida para Gadamael Porto.

Na Força Aérea, encontrei um amigo da Figueira da Foz, o Flórido, que estava a acabar a comissão, logo, a preparar o regresso à Metrópole. Ficou contente por me ver e, ao mesmo tempo, preocupado comigo, quando lhe respondi que ia para Gadamael Porto, e isso respondeu à minha dúvida sobre o que nos tinham dito quando chegámos, ‘colónia penal…’.

Na cidade, além de tomarmos contacto com alguns locais que nos diziam interessantes e úteis, sinceramente, nada de jeito, tivemos a primeira noção de realidades estranhas, como produtos de consumo corrente com preços distintos, conforme procedentes da Metrópole ou importados, ou produtos inexistentes, sem justificação, para nós. Por exemplo, não havia água de Castelo, sumos e refrigerantes, logo, nacionais.

Havia água Perrier, coca-cola, logo, estrangeiras. Whisky, Gin, Licores de Whisky, por exemplo, imensas marcas, tudo original, importado - mais baratos do que qualquer bebida idêntica na Metrópole. Na esplanada de um café, um cálice balão de Whisky, Pesos 2,50 e uma água pequena Perrier, Pesos 7,50.

Os armazéns e retalho, principalmente, propriedade de portugueses, embora alguns de propriedade libanesa, pela tradição de comércio instalado, que era feito entre os países africanos, passando pela Guiné Conacry, atravessando a Guiné Bissau e seguindo pelo Senegal.

Vasta gama de equipamentos de alta-fidelidade e fotografia, pelo que adquiri um leitor gravador Hitachi, de boa qualidade, e uma máquina fotográfica Olympus.

Ainda me recordo de algumas casas, como a Casa Ultramarina, ligada ao BNU, a Casa Gouveia, ligada ao grupo CUF, a Casa António Pinto, conhecida por Pintosinho.

E fomos sabendo de algumas das etnias indígenas que encontraríamos pela Guiné, como Bailundos, Nalús, Sossos, Manjacos, Futa-Fulas, Fulas, Papeis, Balantas, Mandingas, Beafadas, Bijagós, Mancanhas, Felupes, Banhus, Tandas… Cada etnia tinha a sua própria cultura e estou a lembrar-me dos Manjacos que se distinguiam pelos panos que produziam em teares artesanais, os panos coloridos muito apreciados, as danças e sons muito característicos, só a título de exemplo.

E, apesar da grande confidencialidade, conseguimos um ’cheirinho’ sobre a razão da demora em partirmos para Gadamael Porto: qualquer coisa relacionada com as tais lanchas, ao mesmo tempo que davam a entender qualquer coisa de operações em curso, enfim, coisas que nada nos diziam, mas tinham todo o sentido, pelo que veio, a seguir…


(Continua)
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Nota do editor

Poste anterior de 29 de Novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23827: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte III - Abrantes e Santa Margarida; três dias de detenção e, o Rosa e o Cunha

terça-feira, 29 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23827: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte III - Abrantes e Santa Margarida; três dias de detenção e, o Rosa e o Cunha


1. Continuação da publicação de um excerto do livro "Um Olhar Retrospectivo", de Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72), parte que diz respeito à sua vida militar.


III - abrantes e santa margarida…

Chegado ao RI 2 (regimento de infantaria), Abrantes, apresento-me ao oficial de dia, um tenente, que logo reage:
- Mas…, de onde vem?! Leiria?!... Então, em Leiria anda fardado dessa maneira?!’
- Não, propriamente, mas o calor...
- Olhe, fica registada a sua apresentação, mas eu não o vi! Deixe-me cá ver a que companhia pertence... Pois é, a 2796 formou e já saiu daqui há muitos dias, rumo ao campo militar de Santa Margarida, para o IAO...

Agradeci e parti para Santa Margarida, onde me esperava a Companhia de Caçadores Independente 2796.

Chegado, ainda passei um certo tempo até encontrar o local onde a companhia estava instalada, uma vez que o campo militar é bastante grande e ‘abriga’ muitas companhias, das diversas armas.
Apresentei-me ao comandante, o tenente Assunção e Silva e restantes companheiros de missão, após o que me informaram que ficaria integrado no 4º grupo de combate.

Na altura, o efectivo da companhia ainda não estava completo, pois ainda faltavam alguns elementos, graduados, 1ºs cabos e soldados, segundo informação, que iriam ter connosco à Guiné, em rendição individual.
Na altura, recordo-me dos graduados que já se tinham apresentado, Ponte, comandante do 1º grupo de combate, Manso, comandante do 2º grupo, Campinho, comandante do 3º grupo, e Rodrigues, comandante do 4º grupo, 1º sargento Moreira e 2º sargento Baptista, furriéis Magalhães, Ferreira, Neves, Amaral, Fernandes, Rosa, Cunha, Chaves, Silva, Oliveira, Coelho, Fabrício, Anjos.
Mais tarde, já em missão, na Guiné, para complemento do efectivo, por falhas ao embarque, casos do Rosa e Cunha, ou por baixas, recebemos o Tristão, o Esteves, o Pereira, o Queiroz, o Guimarães, o Vilas Boas e o Matias.

Normalmente, o IAO, instrução de aperfeiçoamento operacional, era feito em mês e meio, mas o nosso levaria três meses, pelas nossas contas.
Tudo foi correndo dentro do estabelecido e normal, com os fins-de-semana na Figueira da Foz ou em Lisboa, com saída do campo militar à quinta-feira, final da tarde, e regresso segunda-feira, às oito da manhã.
Nos intervalos das operações, aproveitei para experimentar vários tipos de viaturas militares, como o Jeep Willys, os Unimog 411 e 404, a Mercedes, a Berliet.
Descubro um amigo de cavalaria, de Coimbra, que me dá a oportunidade de experimentar um M47, o tradicional tanque de guerra, complicado de manobrar, primeiro, pelo reduzido espaço do habitáculo do condutor, depois, pelos instrumentos de manobra que requerem concentração e prática.


três dias de detenção!

E já estava um pouco saturado e cansado daquele cenário, apesar de enorme, em dimensão, mas que se tornava um pouco claustrofóbico!
A vontade irresistível de sair dali, nem que fosse por uns momentos, tomou conta dos meus sentidos e levou-me a pegar num Unimog 411 e partir por aí fora.
Comigo, foi um enfermeiro de uma outra companhia que eu tinha conhecido nas Caldas da Rainha.
Partimos do campo militar cerca das nove da noite e, depois de quilómetros e quilómetros de maluquices, regressámos ao campo militar, pelas seis da manhã.
Antes de lá chegarmos, perdemo-nos um pouco, tendo ido dar a uma herdade, aguardando que alguém aparecesse, pois o ladrar dos cães acordaria qualquer um, num raio alargado.
Acendem-se luzes e aparece um senhor, em roupão, a quem perguntámos como chegar ao campo militar.
Olha para nós, com ar de reprovação, e diz-nos para irmos sempre em frente, até chegarmos às traseiras da capela.
Mais tarde, viemos a saber que se tratava de um coronel de cavalaria do campo militar, já com uns anos a viver ali.

Quando chegámos ao campo militar, só tive tempo de estacionar o Unimog e ir às instalações preparar-me para a formatura, pois tínhamos mais um treino militar.
O sargento Moreira chama-me, a pedido do tenente Fernando Assunção e Silva, nosso comandante de companhia, que me diz terem dado como desviado aquele Unimog, sem outra explicação, e lamenta ter de me punir pelo acto, tanto mais que não tinha carta de condução militar.
Respondi que tinha toda a razão e direito de me punir.
Acrescentou que seria para exemplo da companhia.
E, assim, levei três dias de detenção, correspondendo ao período do fim-de-semana, coisa a que já estava habituado, de certa forma, de experiências anteriores...
Mas esta punição já não podia ser apagada por ninguém, como foram as anteriores, pelo sargento-ajudante de Leiria, como lhe contei.

E confirmei isto, trinta e cinco anos mais tarde, quando tratei do meu processo para o estatuto de pensionista, em que era necessário apresentar a caderneta militar.
Fui aos serviços do exército, na Av de Berna e em Chelas, onde me disseram que não podiam dar-me a caderneta, pois tinha levado o mesmo caminho de algumas outras...
Perguntei o que queriam dizer com aquilo e acabaram por dizer-me que todas as que estavam um pouco ‘sujas’ foram destruídas, para bem dos seus proprietários...
Claro que entendi...
Mas deram-me um papel com o resumo do meu currículo militar, que ainda guardo, e lá constam os tais três dias de detenção, de Santa Margarida, ‘porrada’ que já ninguém pôde ‘limpar’...

Passar o fim de semana, em serviços, dentro do campo militar, era uma tortura.
Depois de todos terem saído, peguei nas minhas coisinhas e ala para a Figueira da Foz, final da tarde de quinta-feira.
Sábado, final da manhã, telefonei para o campo militar e falei com um elemento do meu grupo que logo me diz que as coisas não estavam bem - anda tudo ‘à porrada’ nos refeitórios - o que deu origem a queixas ao responsável pelos refeitórios e messes.
Eu pedi-lhe para falar com os nossos e tentar controlar a coisa, pois só poderia regressar na segunda de manhã.

Na segunda feira, o tenente Assunção e Silva pergunta-me:
- Então, Cruz, correu tudo bem?
- Sim, tudo bem!
- Tem a certeza?...
- Sim, tudo controlado!

Ele já sabia que eu me tinha pirado... Mas, que castigo pior do que ir para a Guiné?...
- Realmente, o Adolfo parece que nasceu para infringir regras...

Pois, uma espécie de instinto a atirar para o lado errado...
Entretanto, recebo um aerograma do meu irmão, ainda em Moçambique, que me fala em qualquer coisa relacionada com uma Guiomar, um conhecimento das suas férias à Metrópole, cerca de um ano antes, pedindo-me que, se ela aparecesse a querer aproximar-se, eu tratasse do assunto, como entendesse.
Mas ninguém apareceu nem ouvi nada que se relacionasse com o assunto, pensando que tudo estaria resolvido, sem que necessitasse da minha intervenção.
Se algo acontecesse, eu não estaria na Figueira da Foz, pois estava de partida para a Guiné.
E achei melhor nem falar em nada aos meus pais e irmã.
No entanto, isto seria o inicio de mais um problema...


o rosa e o cunha...

Dentro deste cenário do Campo Militar de Santa Margarida, alguns graduados eram notados com uma forte cumplicidade: o Rosa, o Cunha, o Neves, o Cruz (nomes de guerra).
Neste contexto, não é difícil imaginar que algo poderia acontecer, com prejuízo para a companhia, claro.
E, quem estivesse bem atento, reparava no temperamento e postura particulares daqueles graduados, além do facto de que o Cruz tinha sido punido pelo tenente Assunção e Silva.
Melhor dizendo, poderiam pensar na eventualidade daqueles graduados faltarem ao embarque para a Guiné, o que piorava a situação da companhia, que estava desfalcada de alguns elementos, esperado aparecerem em rendição individual.
E a suspeição deu sinais, pelas conversas entre o tenente Assunção e Silva e o alferes Ponte, comandante do 1º grupo.

"Pois, Adolfo, era mais um caso a juntar aos muitos que aconteciam, desde o início da guerra do ultramar - dar o salto para o estrangeiro..."

Entretanto, recebo mais uma boa notícia: nasceu a minha primita Filipa, a segunda filha da minha prima Lena, e a alegria aumentou e abraçou a família, restando-me esperar a oportunidade de uma visita para conhecer e dar as boas vindas à Filipa.

Finais de Outubro e dão-nos umas massas para comprarmos algumas roupas específicas, antes do embarque, o que faríamos no Casão Militar, Lisboa, o tal local já muito bem conhecido do Daniel...

Dia vinte e sete, vou à Figueira da Foz e fico para o dia seguinte, dia do aniversário da minha mãe.
Com beijos apertados, dou os parabéns à minha mãe e despeço-me, sem conseguir dizer mais nada...

(Continua)

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Nota do editor

Poste anterior de 27 de Novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23821: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte II - Tavira e Leiria

domingo, 27 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23821: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte II - Tavira e Leiria


1. Continuação da publicação de um excerto do livro "Um Olhar Retrospectivo", de Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72), parte que diz respeito à sua vida militar.


II - tavira…

Depois de uns dias de férias na Figueira da Foz, intervalo da recruta para a especialidade, a sequência natural: Tavira.
Comboio da linha do Oeste, até ao Rossio, passar o Tejo de barco e apanhar outro comboio no Barreiro - aventura!

Cheguei ao Barreiro, final do dia, e disseram-me que só teria comboio para Tavira de manhã cedo.
Como lá estavam mais dois instruendos que também iam para Tavira, fazer a especialidade, trocámos ideias sobre como passar a noite, até à hora do comboio.
Entrámos numa ‘tasca’, jantámos umas coisas e pedimos aos donos que nos deixassem lá dormir, com sucesso, e dormimos apoiados nas mesas.
Isto fez-me lembrar os meus tempos de boleia…

De manhã, bem cedo, acordaram-nos, tomámos o pequeno-almoço e lá fomos apanhar o ‘quim’ para Tavira.
No comboio, cada um procurou o melhor lugar para descansar, até Tavira.
Fui dormitando, dormitando, até que sou acordado por um senhor revisor, dizendo-me que tinha de sair, pois era fim de linha - estava em Vila Real de Santo António!
Ainda perguntei se mais alguém tinha ficado no comboio, mas disse-me que só eu, pelo que concluí que os outros nem repararam que eu tinha ficado dentro do comboio!
Conclusão: espera mais um comboio, para voltar para trás e chegar ao destino, Tavira.

Chegado a Tavira, apresentação no CISMI (centro de instrução de sargentos milicianos de infantaria) e inserção na 1ª Companhia de Atiradores de Infantaria, cujo comandante fiquei a saber que era o célebre ‘muleta negra’, porque andava apoiado numa espécie de pingalim, resultado de ferimentos no ultramar.
Também tive oportunidade de conhecer e conviver com o célebre ex-alferes Robles, agora, capitão, com uma ‘pancada’ de alto nível, fruto de experiências de guerra colonial em Angola e Guiné.
Curioso, termos concluído que tínhamos conhecimentos comuns de Coimbra, de onde era natural.

Entretanto, a minha tia Jú telefona-me a dizer que o primo Jaime Abreu Cardoso estava à minha espera, pois eu fazia parte de uma lista dos instruendos seleccionados nas Caldas da Rainha para seguirem para Lamego.
Claro que eu disse logo à tia Jú que não ia para lá e até já estava em especialidade, em Tavira, e nem sabia que o Jaime era oficial do quadro e estava lá, pensava que tinha feito a tropa normal e mais nada.
Ela, com razão, respondeu-me que era pena, pois teria a protecção do Jaime, já capitão e com medalhas, além de poder ir com ele passar os fins de semana a Vieira do Minho.
Realmente, uma pena, pois poderia ter uma tropa melhor e, quem sabe, até retomar a vida académica, no Norte, com as facilidades, além de considerar-me nos ‘meus domínios’…

Voltando a Tavira, tive a sorte de conseguir autorização de ‘pernoita fora’, pelo que logo arranjei um quarto, do lado de lá do rio, mas bem perto do centro da cidade.
E não esqueci a rua: Dr. Augusto Silva Carvalho, 15. A dona da casa era viúva e tinha uma filha que tocava piano, interessante, naquele tempo, e tinha amigas que se juntavam a nós, nos serões, bem divertidos.

Eu estava habituado a controlar as aplicações e exercícios militares, principalmente, os nocturnos, de forma a safar-me, o mais possível, desta vez, com o sentido no meu quarto, para tirar a farda e vestir a roupa de civil.
Uma das primeiras formaturas, com revista, o capitão ‘muleta negra’ toca-me nas pernas com a bengala, ordenando que passasse pelo gabinete, dentro de uma hora, com o cabelo rapado, para grande aflição do comandante do pelotão, o alferes Soares, um porreiríssimo.
Sim, ninguém acreditava que eu andava na tropa, pelo menos, pelo tamanho do meu cabelinho.
E até evitava pôr bem a boina para não estragar o cabelinho.
E o ‘muleta negra’ ainda hoje está à minha espera para me ver com o cabelo rapado!…

Um dos companheiros de arma que lá conheci, o Pedro, de Santo Tirso, passou a ser o meu parceiro de farras, como Luz de Tavira, Faro, Vila Real de Santo António,…
Em Luz de Tavira, conhecemos umas miúdas bem engraçadas que passaram a ser a nossa companhia, sempre que podíamos, principalmente, alguns finais de dia e fins de semana - uma óptima forma de passarmos o tempo.
No entanto, sempre éramos avisados do risco de termos de casar em plena parada do quartel…
E o Pedro ficou ‘maluquinho’ com uma daquelas miúdas, lamentando-se, pois tinha a namorada em Santo Tirso.
Não posso deixar de lembrar o esquema que montei, sempre que tinha exercício nocturno, normalmente, na serra.
Formávamos na parada do quartel e saíamos pelo portão sul, que dava para a Atalaia, um espaço livre que ficava nas traseiras do quartel, onde fazíamos exercícios, de dia.
Quando chegava ao portão sul, já eu tinha a G3 quase desmanchada e metida dentro da farda, após o que virava à esquerda, enquanto o resto do grupo virava à direita.
Com passo rápido, atravessava a Atalaia e seguia em direcção ao outro lado do rio, onde tinha o quarto!
No dia seguinte, um esquema parecido, com a G3 desmanchada dentro da farda e reentrada no quartel, para mais um dia jeitoso…

Um dia, chegados ao quartel, depois de exercícios no exterior, um cheiro horrível inundava o quartel!
Toca para o almoço e a malta entra no refeitório, onde o ar era irrespirável, tal a intensidade do cheiro, o que nos levou a rejeitar a refeição, logo, levantamento de rancho!
Como era a segunda vez, o quartel seria fechado, pelas informações que nos chegaram.
Acto imediato, a população de Tavira à porta do quartel, suplicando que não avançássemos com o processo.
O oficial de dia, em pânico, pede-nos para ficarmos por ali, sujando os pratos, sinal de que não haveria levantamento de rancho, mas reconhecendo o erro da cozinha.
Afinal, ele também era responsável, pois era obrigado a provar e aprovar a refeição, logo, conivente.
O que tinha acontecido: o almoço era peixe, mas tinha chegado atrasado e sem a quantidade adequada, pelo que foram arranjar dobrada, à pressa, metida nas panelas, sem a operação de lavagem completa - dobrada com feijão branco, com condimento especial…

Tirando este episódio, posso afirmar que foi o meu melhor tempo do serviço militar, sem qualquer dúvida.
Terminada a especialidade, apresento as minhas opções de colocação, para dar instrução, por ordem de preferência, Figueira da Foz, Coimbra, Leiria.

"Pelo menos, Adolfo, aproveitou bem esse tempo no Algarve.
Se tivesse ido para o Norte, mesmo sabendo que lá tinha o seu primo, talvez não tivesse sido tão bom."


Sim, Daniel, aproveitei bem aquele tempinho, no Algarve!
Mas, se eu adivinhasse o que me estava destinado, acredite que nunca teria deixado de fazer a especialidade em Lamego, independente do facto de lá ter o meu primo…


leiria…

Colocado em Leiria, no RI 7 (regimento de infantaria), apresento-me uns dias depois e sou inserido na 1ª companhia de instrução, cujo capitão era um ‘gajo’ aceitável.
Naturalmente, procuro um quarto na cidade, muito importante, para mim, apesar de ficar distante do quartel, sete quilómetros, mas havia muitos táxis…
E os trabalhos militares começaram, já com tudo organizado, sempre atento a todos os momentos que eu pudesse aproveitar fora do quartel, pois o ambiente era propício a aventuras e distrações…
Entretanto, surge o sinal de uma amizade, não só pelas circunstâncias de estarmos no mesmo barco, mas pelo facto de constatar que era uma pessoa educada e digna de confiança, o Vilas Boas Soares, do Porto.
Como mostrou interesse em ter um quarto na cidade, dei-lhe a indicação da minha casa e lá foi, tendo conseguido.
Passámos a parceiros de aventuras, nomeadamente, frequentando a pastelaria Soraya, no centro, junto ao cinema, local de encontro de malta jovem, principalmente, das meninas do lar que ficava junto ao outro quartel, o RAL 4 (regimento de artilharia ligeira).
Sempre que em dias de folga ou que conseguíamos ‘desenfiar-nos’, o ponto de encontro era na Soraya, de onde partíamos para as festinhas particulares.

Eu continuava sem grande jeito para cumprimento de normas e regras militares, o que se traduzia em algumas inconveniências, principalmente, para o comandante da companhia, um capitão do quadro.
Mas os homens a quem eu dava instrução eram tratados como homens que eram, não como bichos, pois os meus princípios e valores reinavam, sempre atento a uma ligação saudável, respeitadora.
O mesmo não se passava com alguns outros instrutores, com necessidade de afirmação, com recalcamentos ou complexos, que usavam as divisas ou galões para satisfazerem as suas necessidades de afirmação.
Por isso, todos aqueles a quem dei instrução me tratavam com carinho e respeito, o que nos enchia o ego, naturalmente.

Além da instrução militar e dos serviços de escala ao quartel, outras tarefas me eram atribuídas, como comandar um pelotão de piquete, para promoção e defesa da ordem militar, fora do quartel, assim como para a protecção do património nacional, nomeadamente, Mosteiro da Batalha.
Claro que viria o dia em que estas tarefas me seriam confiadas, que remédio…
Para aquele segundo caso, chega a minha vez e toca a formar o pelotão e sair do quartel, pelas oito da manhã, com chegada ao Mosteiro da Batalha e organização imediata da operação, com distribuição dos homens pelos pontos estratégicos.
Era um dia inteiro nestas circunstâncias, o que causava algum mal-estar aos homens, pois não tinham possibilidade de se ausentarem do seu posto, por muito tempo.
A meio da tarde, um dos homens, aflito da barriga, resolve fazer uma necessidade num canto do interior do Mosteiro, supondo-se livre de ser descoberto.
Uma denúncia, talvez de alguém em visita ao Mosteiro, acaba por fazer com que eu seja solicitado pelo presidente da câmara, para registo e responsabilização pelo acto.
Depois de algum tempo de conversa e mais conversa, a coisa ficou por ali, entre nós, pessoas bem-intencionadas, tolerantes e compreensivas.
Não deixei de notar a satisfação do presidente da câmara pela forma como lhe apresentei o pedido de desculpas, reacção que me deixou sensibilizado.
O homem em questão, confrontado por mim, não sabia onde se meter, coitado.
Chegados ao quartel, antes de entrarmos, tive uma conversa com ele, sosseguei-o e recomendei-lhe mais atenção e cuidado, a partir daquele momento, quer na vida militar, quer na etapa seguinte, a vida civil.

Mais um dia de rotina se iniciava, as companhias formadas, na parada, o meu grupo sozinho, pois eu tinha-me atrasado, o que obrigou o capitão como que a apresentá-lo a ele mesmo.
Mas a coisa foi notada pelo major de instrução, um militarista em toda a linha, temido por todos, desde a família até aos seus superiores.
Chamou o capitão e perguntou-lhe por que razão o grupo estava sem o graduado e ele próprio formou o grupo, ao que respondeu que o graduado tinha ido à caserna tratar de qualquer coisa…
Vá ao meu gabinete, após o destroçar das companhias.
E o capitão levou uma ‘piçada’, como dizíamos, um raspanete, uma chamada de atenção, nem sei se registada!
Mandou chamar-me e só me disse que eu pagaria caro o que acabara de acontecer.


dez dias de detenção…

Alguns dias passaram e eu sou escalado como comandante de piquete, logo, vinte e quatro horas de serviço, retido no quartel, sempre pronto para qualquer emergência.
Tinha uma festa na cidade e saí do quartel, a seguir ao jantar.
Estava muito bem na Soraya, com a malta, preparados para a festinha, cerca das dez da noite, toca o telefone e chamam pelo meu nome.
Eu nem queria acreditar que havia, por ali, alguém com um nome igual ao meu!
Repetem o meu nome, mas referem o RI 7.
Dei um salto e fui ao telefone: era do quartel, realmente, e logo me dizem que tinha tocado a piquete, que não saiu, pois faltava o comandante…
Desculpei-me e lá tive de ir ao quarto mudar de roupa.
Cheguei ao quartel, por volta da meia-noite e, quando me preparava para entrar, sou recebido pelo oficial de dia, que era, nem mais nem menos, o capitão da minha companhia:
- Eu não lhe disse que iria pagar caro?

Limitei-me a pedir desculpa pela infracção, mas não respondeu, claro.

Entrei e fui direitinho às instalações onde estava a equipa de piquete e logo alguém me disse que tinha havia desordem na cidade e, por isso, o piquete tinha sido requisitado, mas não saiu, pois eu não aparecia…
No dia seguinte, sou chamado ao segundo comandante do quartel que me dá conhecimento dos dez dias de detenção, com manobras militares fora do quartel, mas com um processo que daria despromoção e, até, possibilidade de imediata mobilização para o ultramar.
Falei com um sargento-ajudante da secretaria-geral que me aconselhou a falar com o capelão, pois poderia dar uma palavrinha ao primeiro comandante do quartel, a última palavra no veredicto.
Tudo correu bem, pois o primeiro comandante não permitiu a despromoção, limitando-se a confirmar a detenção.
E lá fui fazer os dez dias de manobras, em que executei diversas tarefas, dentro de algumas especialidades, incluindo saltos livres de helicóptero alouette, carregado de material de campanha, parte dos exercícios, na zona do pinhal de Leiria.
E não podia recusar nada!
Último dia, regresso ao quartel, pelas cinco horas da manhã, saturado e cansado, barba de dez dias, farda número três cheia de lama e pó, com o resto do grupo nas mesmas circunstâncias, sou recebido por um 1.º cabo, que estava de serviço, com um papel na mão:
- Desculpe, mas tenho aqui uma nota para si.
- Não estou com cabeça para notas!
- Pois, mas isto é importante…
Sim, ‘importante’: mobilizado para a província da Guiné!...

Dei instruções para que tratassem do espólio, entregassem as viaturas e recolhessem às casernas.
Não quis saber de mais nada, nem tomei banho e saí do quartel, com destino ao meu quarto, na cidade, após o que zarpei para a Figueira.
Lá fiquei duas semanas, alta recriação, sem nada dizer.
E as duas semanas passaram depressa…

Regresso a Leiria e, quando entro no quartel, logo na porta de armas, disseram-me que andavam à minha procura há muito tempo, com avisos constantes pelos altifalantes.
Dirijo-me à secretaria-geral e logo o sargento-ajudante me vem falar:
- Afinal, o que pretende da vida?! Vai continuar com essa postura pelo resto do seu tempo militar?! Acabou de apanhar um castigo, safou-se da despromoção e desaparece de cena?! A sua companhia está à sua espera, há muito tempo, em Abrantes!
- Tem razão, mas fiquei tão decepcionado com aquela nota que me deram: mobilizado para a Guiné.
- Eu vou tentar limpar as ‘nódoas’ que tem registadas, mas tem de me prometer que guardará só para si. E sabe porque o faço? Porque tenho um filho da sua idade e gostaria que fizessem o mesmo por ele! Veja se encontra o seu caminho certo e não se distraia, durante a comissão, na Guiné, pois aquilo é sério… E, quando voltar, não retome a sua vida civil com este comportamento, pois pode sofrer desgostos…’

Manifestei o meu agradecimento e lá fui direito a Abrantes.

"Realmente, Adolfo, vejo uma mistura de desleixo, de ingenuidade, para não dizer imaturidade! Desculpe a minha franqueza…"
- Sim, reconheço um pouco de tudo isso…

(Continua)

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Nota do editor

Poste anterior de 24 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23814: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte I - "e toma lá com o edital!"

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Guiné 61/74 - P23814: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte I - "e toma lá com o edital!" e Caldas da Rainha

1. Damos hoje início à publicação de um excerto do livro "Um Olhar Retrospectivo", de Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72), parte que diz respeito à sua vida militar.



(extracto do meu livro ‘um olhar retrospectivo’ 2018 - adolfo cruz da pág 407 à 483)

I - "e toma lá com o edital!"

E Daniel, esta foi forte!...
Sábado, dia 4 de Outubro, perto da hora do jantar, o meu pai resolve massacrar-me com a história do resultado negativo da matemática e com a vida que eu continuava a ‘cultivar’, embora eu defendesse que estava feito e não podia voltar atrás - resposta fácil…
E aproveito para lembrar que poderia vir a ser chamado para o serviço militar, em virtude do chumbo que impedia um eventual pedido de adiamento.
O meu pai logo explode dizendo que tinha muito tempo para pensar em serviço militar, que era muito cedo para isso.
Acaba de dizer isto e tocam à campainha.

Vou abrir e vejo o Zé Luís da Deusa, de Arcos de Valdevez, que me diz:
 - Até que enfim encontro a casa! Procurei, procurei, até conseguir que alguém me dissesse onde morava o Dr. Cruz!
- Gosto em vê-lo, Zé Luís, mas o que faz por aqui?!
- Fui colocado aqui no CICA 2, para fazer a especialidade, e trago uma notícia para si, de um edital que colaram numa das montras lá do nosso café.

Passa-me o papel e lá está o meu nome, para me apresentar no RI 5 (regimento de infantaria), nas Caldas da Rainha, no dia 6 de Outubro!
Mostro o papel ao meu pai e continuo a conversa com o Zé Luís, pois tinha curiosidade em saber notícias sobre malta dos Arcos de Valdevez, em geral, sem esquecer o Atlético, claro, onde ambos tínhamos jogado.
Perguntou-me quando tencionava lá ir, pois tinha pessoas a perguntarem por mim, o que era natural, pois tinha lá vivido, embora pouco tempo, mas o suficiente para criar amizades e com algumas histórias.

Depois disto, preparar as coisinhas para uma nova etapa, esta, sem interesse nenhum!
Tinha o dia seguinte, domingo, para tratar de tudo.
Nesse mesmo dia, após o jantar, a esposa de um croupier do casino, em conversa com a minha mãe, sobre o serviço militar e possibilidades de eu ir parar ao ultramar, o que era um susto para as famílias, sugere que eu aproveite uma oportunidade: ir para Londres.
Lá, tinha um primo bem colocado na General Motors e eu tinha lugar garantido, casa, carro da empresa, pagamento de curso superior, com facilidades, era só um telefonema.

A minha mãe ficou como que num beco sem saída, pois achava boa ideia, apesar da dificuldade e risco do ‘salto’, mas dizia que nunca mais me via, dadas as circunstâncias.
Aliás, situação idêntica já tinha sido equacionada, França ou Suécia, mas ficou no tinteiro, pelas mesmas razões.
O amor misturado com o egoísmo, sempre perspectivando a possibilidade de eu ficar na metrópole, o tempo todo.
E eu também não estava muito para aí virado, talvez mais por comodismo e também pensar que o ultramar acabaria por não me tocar, mas o pior aconteceu, um ano depois…
"Adolfo, nessa altura, como sou uns meses mais velho do que o Adolfo, já eu tinha uns meses de tropa e já estava no Casão Militar.
Eu tinha entrado em Abril de 69 e completei três anos em Abril de 72.
Comecei a trabalhar a seguir ao Verão."


caldas da rainha…

Oito da manhã de segunda feira, dia 6 de Outubro de 1969, data marcante: RI 5, aqui estou, meus senhores!
O que encontrei era o que me diziam, mais ou menos, mas não contava com tamanhas e frequentes filas, para isto e para aquilo, durante três dias, alternando com exercícios diversos.
Mas, confesso, nada que me metesse medo.
Como sempre detestei filas, andei à civil durante os três dias, para fugir às filas, embora tivesse de fazer alguns exercícios, vestido daquela maneira, os que não consegui evitar, e não era nada agradável.
Sempre que confrontado com aquela situação:
"Já não há o meu número e disseram-me para esperar.
Os meus colegas conseguiram, tiveram mais sorte do que eu."
"Colegas?! Aqui não há colegas, há camaradas!"

Aquilo mexeu com algumas células mentais e levou-me para cenários ideológicos, políticos, conotados com a esquerda, nada de acordo com os motivos e objectivos que me tinham sido impostos, levando-me para o serviço militar…
Terminados os três dias, já não tinha de andar em filas e acabei por receber as roupas e tudo o mais.
Nunca esquecerei aquela caserna, com frio das janelas que pareciam facas, com camas de ferro em beliche, colchões com recheio em palha, roupa nojenta, casas de banho, ou coisa parecida, com manchas por todo o lado.
Consegui arranjar um soldado que me tratava da cama, me pregava os botões, me engraxava as botas e limpava as instalações, sempre que me calhava em escala.
Tudo o que tinha de fazer, a contar para classificação, tentava que ficasse com nota média, pois pensava que poderia ficar cá, sem ter de ir ao Ultramar, segundo orientações que me tinham dado.

Uma coisa tinha de conseguir: não ficar no quartel um só fim de semana que fosse, e consegui!
Fácil: pagava a quem fizesse o serviço por mim, pois havia malta de longe, que não tinha interesse em ir de fim de semana e podia ganhar umas massas.
Assim foi acontecendo a recruta, com alguns momentos razoáveis, sempre com fins de semana na Figueira da Foz ou Lisboa, nem outra coisa eu poderia aceitar…
Já nos finais da recruta, Dezembro, um frio de rachar, e chegam as célebres patrulhas pela Serra do Bouro.

Nomeiam-me comandante de uma patrulha e lá vamos, estrada fora, até à Serra do Bouro, onde está escuro como breu, sem se conseguir perceber de que lado é a cidade, de que lado é o mar, pois os barquinhos de pesca nocturna, com as luzinhas, confundem-se com as luzes da cidade.
Cada passo, uma espécie de miragem, pois cada vulto parece uma casa, uma árvore, mas nada é o que se pensa ou imagina.
A certa altura, mesmo no cimo da serra, três militares, sem saberem quem são.
Afinal, eram três comandantes de patrulha que tinham perdido as respectivas patrulhas!
Falámos e conseguimos descer a serra até encontrarmos uma casita antiga, com uma luz muito ténue no interior.

Batemos e atende uma senhora idosa que logo nos oferece, além de um sorriso espontâneo e meigo, uma malguinha de café e um pedaço de pão saloio, uma verdadeira delícia!
Continuámos a descer até chegarmos à cidade, onde dispersámos, cada um seguiria um caminho diferente, até ao quartel, de forma a disfarçar o insucesso das nossas missões.
Eu, em vez de ir direito ao quartel, passei por um restaurante que conhecia, já fechado, mas lá estava alguém ainda a tratar de contas, a filha mais nova, que eu já conhecia, e me abriu a porta, mas logo se desfez em pedidos de desculpa por já não ter nada de comida feita, claro.
Consegui convencê-la a arranjar-me qualquer coisita, uns ovos mexidos, a única coisa possível e que muito agradeci.

Eu estava com a barba grande, de farda número três, a designada farda de trabalho, toda suja, de arreios, bornal, cantil, G3 e cartucheiras.
Ali estava eu, a conversar com a miúda, enquanto fazia os ovos, quando alguém bate no vidro da porta de entrada.
A irmã aparece, abre a porta e entra um indivíduo que logo me pergunta o que faço ali, àquela hora e naquele estado.
Respondo, naturalmente, que tinha estado em exercícios nocturnos e que estava de regresso ao quartel, mas tentando comer alguma coisita.
A outra faz-me um sinal, dando-me a entender qualquer coisa desagradável, logo, fiquei de pé atrás.
O indivíduo mandou-me sair, sem me deixar comer os ovos, e fazendo notar que era melhor assim.
Na dúvida, era melhor zarpar, o que fiz, sem pestanejar.

Voltando à nossa tentativa de disfarçar o insucesso da operação, o disfarce não pegou e fomos castigados, pois tínhamos perdido as nossas patrulhas, grave.
Castigo: banhos e massagens na estância balnear e termal da Foz do Arelho!
Ordem de partida do quartel, rumo à Foz do Arelho, a pé, uns bons quilómetros e, depois, várias vezes a percorrermos a praia de um lado para o outro, junto à água, carregados de material, e voltar ao quartel a pé, sem descanso - muito duro!
Só o percurso quartel - Foz do Arelho - quartel, cerca de vinte quilómetros.
Dois dias depois, passei pelo tal restaurante e perguntei à miúda quem era o namorado da irmã: um tenente do quadro do quartel RI 5!...

Terminada a recruta, desfile pela cidade e formatura na parada, de todas as companhias, perante a tribuna de honra, no edifício do comando.
Estamos formados e achamos alguma familiaridade em três dos oficiais que compunham a tribuna, mas era difícil descobrir porquê.
Discursam, discursam, até que se ouve um deles a enunciar uma lista de instruendos destinados a Lamego:
-………………
-………………
-Adolfo (…) Cruz
-………………
-………………

Eu fiquei de boca aberta e ansioso por poder perguntar o que queria dizer aquilo.
Logo que pude falar, mostrei estranheza e desagrado ao comandante do pelotão, o alferes Macedo, um alferes do quadro, rigoroso e duro, que me mandou calar, que era assim, e mais nada!
No final da sessão, falei com ele e perguntei como era possível ter sido seleccionado, dadas as minhas fragilidades e problemas de saúde.
Só me responde que estava tudo registado e eu tinha todos os exercícios com nota muito bom, embora os tivesse feito nos intervalos, para esconder as minhas capacidades, e que alguém esteve a seguir-nos, desde o início da recruta.

Resumindo: aqueles três oficiais que estavam na tribuna e nos pareciam familiares, andaram o tempo todo vestidos de trabalhadores da construção, em fato de macaco, misturados com os verdadeiros que faziam umas obras no quartel!

Não fiz mais nada e fui agarrar-me a um médico do quartel queixando-me de tudo e mais alguma coisa, nomeadamente, problemas de estômago, lesões na coluna e nas pernas, etc.
Afinal, já ninguém me tirava o ser atirador de infantaria e preferia ir para Tavira, fazer a especialidade, o que me daria uns bons momentos de Algarve, nada que se parecesse com o frio gelado do Norte, principalmente, naquela zona de Lamego, e com tempo de inverno.
"Teve razão em evitar a especialidade em Lamego, pois sempre ouvimos falar da violência dos treinos e preparação para o ultramar, além do frio e neve…"

Pois, mas já verá que não foi assim tão boa opção…


(Continua)
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Notas do editor

- Ortografia de acordo com o texto original

Vd. poste de 8 DE ABRIL DE 2017 > Guiné 61/74 - P17222: Tabanca Grande (431): Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael, Vicente da Mata, Ome (Bijemita), Quinhamel, Biombo e Bissau, 1970/72)... Grã-tabanqueiro n.º 740

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23705: Convívios (945): Almoço comemorativo dos 50 anos do regresso da Guiné dos combatentes da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhámel, 1970/72), levado a efeito no passado dia 5 de Outubro em Abrantes (Morais da Silva, Cor Art Ref)


1. Mensagem com data de hoje, 13 de Outubro de 2022, do nosso camarada, Coronel Art Ref, António Carlos Morais da Silva (ex-Instrutor da 1.ª CCmds Africanos em Fá Mandinga; Adjunto do COP 6 em Mansabá e Comandante da CCAÇ 2796 em Gadamael, entre 1970 e 1972):

Caro camarada Vinhal
No passado 5 de Outubro os “Gaviões” de Gadamael e familiares reuniram para comemorar a chegada da Guiné no mesmo dia de 1972.
Volvidos 50 anos, novamente juntos, aportaram à unidade mobilizadora em Abrantes onde, na Eucaristia, rezaram pelos camaradas que já partiram.
Terminada esta, assistiram à cerimónia militar de homenagem aos Militares Mortos ao Serviço da Pátria e, de seguida, recordaram e saudaram os seus Mortos em Combate perpetuados no Memorial da Unidade.



Uma vez mais os homens da CCaçInd 2796 ficaram devedores e agradecidos aos militares que prestam serviço no RAME- Abrantes, na pessoa do seu actual comandante Coronel de Infantaria Joaquim José Estevão da Silva a quem convidaram para o almoço de confraternização onde o reencontro avivou memórias e matou saudades do tempo da juventude.
Terminado o encontro anual, ficou a promessa de tocar a reunir em 2023.
Se entender útil, agradeço que este reencontro seja noticiado no nosso blog.

Abraço e muita saúde
Morais Silva

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Nota do editor

Último poste da série de 11 de Outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23697: Convívios (944): Rescaldo do XXVII almoço/convívio dos Antigos Combatentes da Vila de Guifões, Matosinhos, levado a efeito no passado dia 5 de Outubro em Santa Marinha do Zêzere, Baião (Albano Costa, ex-1.º Cabo At Inf)

domingo, 3 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20936: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXVII: Fernando Assunção Silva, cap inf (Oliveira de Azeméis, 1945 - Tambambofa, Gadamael, 1971)




1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais, oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia). 

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à esquerda], membro da nossa Tabanca Grande [, tendo sido, no CTIG, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972 ]


2. A CCAÇ 2976 (Gaviões) tem cerca de duas dezenas e meia de referências no nosso blogue. 

Recorde-se que  o cap inf op esp Fernando Assunção Silva, morto em combate, em Tambambofa, subsetor de Gadamael, em 24 de janeiro de 1971, foi substituído pelo então cap art António Carlos Morais da Silva. Eram amigos e camaradas de curso. Era natural de Oliveira de Azeméis, está sepultado em Atouguia, Guimarães.


Guiné > Região de Tombali > Mapa de Cacoca / Gadamael (1960) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Bricama, Tambambofa e Caur.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013)
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segunda-feira, 13 de maio de 2019

Guiné 61/74 - P19782: Convívios (893): Almoço/Convívio do pessoal da CCAÇ 2796 (Gaviões de Gadamael) levado a efeito no passado dia 11 de Maio em Pedroso, Vila Nova de Gaia (Adolfo Cruz)



1. Mensagem do nosso camarada de armas Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1970-1972) com o rescaldo do Almoço/Convívio dos Gaviões de Gadamael, levado a efeito no passado dia 11 de Maio:

Caro Amigo Carlos Vinhal,
Votos para que estejas bem.

Gostaria que fizesses o favor de providenciar a publicação destas duas fotos no Blogue.
Grato, antecipadamente.

Abraço
Adolfo Cruz


Almoço/Convívio da CCAÇ 2796 - Gaviões de Gadamael

11 de Maio de 2019

Pedroso - Vila Nova de Gaia

Mais um Encontro/Almoço se realizou, graças ao esforço e dedicação dos habituais organizadores, Joaquim Ferreira, Manuel Fernandes e Manuel Soares, desta vez, com a presença de um ilustre convidado, o ex-CEME, General Rovisco Duarte.

É evidente a vontade manifestada por todos, no sentido da manutenção destes Encontros/Convívio.

Na foto, a partir da esquerda: ex-Alf Mil Alexandre Rodrigues, General Rovisco Duarte, ex-Alf Mil Joaquim Campinho, ex-Fur Mil Orlando Amaral e ex-Fur Mil Adolfo Cruz
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Nota do editor

Último poste da série de7 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19754: Convívios (892): CCAÇ 1585 (Farim e Quinhamel, 1966/68): 19º Convívio, 51º aniversário do regresso à metrópole: Buarcos, Figueira da Foz, 25/5/2019 (Carlos Soares)

quinta-feira, 7 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19558: Tabanca Grande (473): António C. Morais da Silva, cor art ref, ex-cap art, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga e adjunto do COP 6 em Mansabá (em 1970) e cmdt da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1971/72)


Foto nº 1> Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 2796 > 1971 > Chegada da coluna a Guileje > Ao centro, o cap art Morais da Silva, empunhando a sua Kalash; à sua esquerda, que o  o alf mil  Esteves;  à direita, o furriel vaguemestre Oliveira...  Das flagelações e ataques do PAIGC estão  há fortes vestígios nas paredes do edifício do Comando.


Foto nº 1 > > Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 2796 > 1971 > Chegada da coluna a Guileje > À esquerda, o  cap art Morais da Silva, empunhando a sua Kalash; à direita, o alf mil  Esteves.


Foto nº 2 > O cor art ref António C. Morais da Silva, que vive na Amadora, e que foi também professor na Academia Militar, e é especialista em investigação operacional

Fotos (e legendas): © António C. Morais da Silva  (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem do nosso novo grã-tabanqueiro, cor art ref António Carlos Morais da Silva,  que vem na sequência do convite formulado pelo editor Luís Graça (*)

Data: quarta, 6/03/2019 à(s) 16:08

 Meu caro camarada Luís Graça

Já devia ter respondido à mensagem anterior mas deve ter havido uma gatilhada e … lá foi ela. Felizmente surgiu agora nova oportunidade…

Não sei como lhe "pagar" a gentileza, paciência e tempo que tem gasto comigo, que não seja anuir ao seu convite e pedir-lhe a bênção para ser aceite nesse alfobre, que admiro e estimo, dos "amigos e camaradas da Guiné".

Estou umbilicalmente ligado ao TO da Guiné onde nunca voltei por me saber incapaz de "sobreviver fisicamente" ao deslocamento até Gadamael onde ficou uma parte de mim.

Nas 3 linhas curriculares que sugere, gravo o seguinte:

Cadete aluno nº 45/63,
Morais da Silva
(i) Nascido em Lamego,  descendente de centenários lamecenses, cresci no liceu Latino Coelho rodeado de gente a que me ligam laços de grande fraternidade;

(ii) ingressei na Academia Militar em 1963  [, sendo o cadete-aluno nº 45/63,  e]  cumprindo o sonho da infância;

(iii) terminado o curso,  demandei Angola como Alferes, pisei as terras do Leste no Lucusse e posteriormente em Ninda nas CArt 1452 e 1701;

Galhardete da CCAÇ 2796, os "Gaviões"
(Gadamael e Quinhamel, 1970/72).
Cortesia de Adolfo Cruz.
(iv) ainda continuei a comer "o pão que o diabo amassou" no CIC [, Centro de Instrução de Comandos], onde frequentei, com sucesso, o curso de Comandos.

(v) regressado a Lamego, casei, fui bafejado com um filho e por lá andei como instrutor nos cursos de Comandos;

(vi) em Setembro de 1970 fui "escolhido = empurrado" para zarpar para a Guiné onde fui andarilho: Instrutor dos Comandos Africanos do João Bacar Jaló, adjunto do COP 6 em Mansabá e em Janeiro de 1971 "escolhido=empurrado" para voar para Gadamael e assumir o comando da CCaç 2796  [, Gadamael e Quinhamel, 1970-1972],  que tinha perdido em combate o seu comandante, Cap Assunção Silva, meu amigo e camarada de curso;

(vii) uma vez mais repeti a toma do "pão que o diabo amassou" mas logrei conduzir a minha tropa a "terra firme", parafraseando o meu amigo artilheiro Alferes Vasco Pires, que Deus tem;

(viii) de volta ao chão natal, andei cerca de duas dezenas de anos a comandar e ensinar "coisas artilheiras" e da matemática na Academia Militar, onde cabe referir a participação no pronunciamento do 25 de Abril; ainda, deslocamentos para a EPA, GAC/Brigada Mecanizada Independente, RALIS, IAEM e Fort Sill (EUA);

(ix)  como sempre me dei bem com os números e com a racionalidade da matemática, dediquei-me à Investigação Operacional de que sou um dos pioneiros cá do burgo quer na AM [, Academia Militar,] quer na universidade;

(x) um dia "vasculharam" a minha coluna quatro vezes sem sucesso o que coincidiu com o fim do SMO [, Serviço Militar Obrigatório]; alquebrado e incapaz de acompanhar a mudança no Exército, considerei terminado o meu sonho de prosseguir na carreira,  reformando-me com o posto de Coronel.

Afinal, falhei ao prometido das 3 linhas e deslizei para 4 (longas). Como "Papa do blogue",  fará o favor de extrair o que entender conveniente.

António C. Morais da Silva, hoje
A foto [nº 1, acima] que envio foi obtida em Gadamael quando da chegada de mais uma longa coluna a Guilege. Empunhando uma AK, aguardo que o pessoal se apronte para controlo estando à minha esquerda o meu Alferes Esteves, à direita, recostado, o meu vaguemestre Furriel Oliveira e rodeado pelo PAIGC sempre presente nas mazelas das paredes do edifício do Comando.

Na outra foto brindo à nossa saúde [, foto n.º 2, acima].

Com um abraço e o meu obrigado,

Morais Silva
Amadora


2. Comentário do editor Luís Graça:

Temos já mais de quatro  dezenas de referências ao cor Morais da Silva [, ou Morais Silva, como ele assina as suas mensagens].  O nosso camarada de armas (e meu colega do ensino superior universitário] passa a sentar-se  no lugar nº 784, à sombra do poilão da Tabanca Grande. (**)

É uma pessoa que muito prezo, pela sua independência, frontalidade e exigência intelectual e moral. Nas "3 linhas curriculares" que lhe pedi, ele não mencionou, certamente por modéstia, a atribuição que lhe foi feita da Medalha de Prata de Serviços Distintos com Palma, pela sua brilhante e corajosa atuação no TO da Guiné, nomeadamente à frente da CCAÇ 2796, em Gadamael.

Temos vindo a publicar, da sua autoria, a série  "In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva)" (***).

O Morais da Silva acompanha de há muito o blogue e conhece as nossas regras de convívio. Resta-nos agradecer-lhe, em nome de toda a Tabanca Grande, a honra que nos dá, e sobretudo pela partilha do seu labor e do seu saber. 
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19553: Dando a mão à palmatória (30): o cap inf Cirilo de Bismarck Freitas Soares, natural de Matosinhos, morreu em 26/5/1965, quando atingido por fogo inimigo numa emboscada na zona de Piri, norte de Angola (Morais Silva, cor art ref)

(**) Último poste da série >19 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19305: Tabanca Grande (472): Carlos Silvério, natural de Ribamar, Lourinhã, ex-fur mil at cav, CCAV 3378 (Olossato e Brá, 1971/73)... Senta-se finalmente à sombra do nosso poilão no lugar nº 783, o número (azarento) do seu tempo de recruta na EPC, em Santarém...

(***) Vd. último poste da série > 1 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19542: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XVI: Cirilo Bismarck Freitas Soares (Matosinhos, 1918 - Piri, Angola, 1965)

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19011: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte IV




1. Parte IV, e última, da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1970-1972) com as fotos enviadas em mensagem do dia 21 de Julho de 2018, que retratam alguns dos momentos mais significativos da sua passagem por terras da Guiné.





Foto 25

Foto 26

Foto 27

Foto 28

Foto 29

Foto 30

Foto 31

Foto 32

Foto 33

Foto 34

Fotos 25 a 34 - População local, especialmente balantas


Em Setembro de 1972 deixámos os destacamentos, rumo a Bissau – COMBIS, para aguardarmos o prometido voo da TAP, rumo a Lisboa, o que aconteceu, apenas, em 5 de Outubro de 1972.
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Nota do editor

Vd. postes de:

30 DE AGOSTO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18964: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte I

6 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18991: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte II
e
11 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P19005: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte III

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19005: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte III




1. Parte III da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1970-1972) com as fotos enviadas em mensagem do dia 21 de Julho de 2018, que retratam alguns dos momentos mais significativos da sua passagem por terras da Guiné.





Foto 18 - Gadamael

Foto 19 - Gadamael

Foto 20 - Gadamael  
Fotos 18 a 20 - Roupa de cerimónia

Foto 21 - Gadamael

Foto 22 - Gadamael
Fotos 21 e 22 - O meu casamento com Cira


O prémio: deixar Gadamael Porto e passar para o Norte, missão, defesa de Bissau, em quatro destacamentos, um grupo de combate em cada: S. Vicente da Mata, Bijemita (Ome), Quinhamel e Biombo.


Foto 24 - Destacamento de Bijemita - Festa (ronco) de recepção de alguns elementos da população local
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Nota do editor

Poste anterior de 6 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18991: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte II