Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Lavadeiras... Mas aqui também, se praticava a Mutilação Genital Feminina, coisa que nunca preocupou nem Spínola nem Amílcar Cabral...
Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1/ CAC 7, 1969/71) > Parte VIII
[ Foto à esquerda: Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71; comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda]
Dentro da população, tínhamos o Alferes de 2ª linha, o Malan, que era um homem sensato e que tinha a habilidade de nos contar histórias/lendas do seu povo.
Recordo que alguns desses contos foram reproduzidos no boletim que a Companhia publicava quase mensalmente e que se chamava “O Boina Negra”.
Entre muitos dos que colaboravam, estava na linha da frente o Alferes Barbosa, e eu próprio escrevi alguns artigos. Recordo-me também de reproduzir situações bem conhecidas do “Zé da Fisga”, na contracapa.
Ao fim da tarde, era frequente ver furriéis e soldados passearem pela Tabanca para gáudio dos miúdos que brincavam ao vento.
Conhecíamos alguns hábitos e costumes destas gentes e entrávamos nas suas tabancas com alguma frequência apenas com a curiosidade de poder conhecer o seu “modus vivendi”.
Sabíamos que era frequente terem várias mulheres, de acordo com as suas regras de vivência. O dono da morança dormia numa esteira no quarto que só a ele pertencia e os mais afortunados já tinham uma tarimba no seu quarto. As mulheres, normalmente, dormiam todas em outro quarto e ao chamamento do marido lá eram escolhidas para uma noite de acasalamento.
Quando um homem pretendia casar com terceira mulher, já deveria ter quase sempre em mente o casamento com a quarta mulher, o mais depressa possível. É que ter três mulheres em casa provoca um desequilíbrio grave pois uma delas virava quase sempre vítima das outras duas. Até nesta forma de viver os Africanos tinham as suas regras de vivência pacífica.
Com condições de vida muito precárias, viviam de alguns trabalhos que emanavam do Comando da Companhia. Semeavam mancarra, amendoim, que frequentemente iam vender a Bissau, normalmente à Casa Gouveia, pertencente a (ou contratante de) o Grupo CUF.
Havia, também, outras vivências. Recordo de um ou dois casos de raparigas com os seus oito ou dez anos, terem ido a Bissau fazer a ablação do clitóris. Uma delas não voltou, porque, segundo se constou, não sobreviveu às infeções a que estavam expostas.
Eram rituais da população que ao que sei, à época, as autoridades não dariam muita importância, assim como a circuncisão dos rapazes.
Hoje, sabemos que se está fazendo um esforço de sensibilização para se evitarem tais atos nefastos para a saúde das raparigas, futuras mulheres. Fazem-se leis, mas de difícil cumprimento porque a África é demasiado grande e os meios de comunicação demasiados lentos e escassos. Os costumes milenares levam sempre muito tempo a serem mudados ou erradicados.
Quando havia disponibilidade e sossego para isso, tinha grandes conversas agradáveis com o Comandante [da CCAV 2482].
Era um jovem Capitão, Oficial e Cavalheiro da Arma de cavalaria. Tinha um trato fácil e simpático. Era respeitado pelos seus Homens, por quem estes tinham e demonstravam ter uma estima como se de um protetor se tratasse.
Não me lembro de ordens ríspidas ou despropositadas. Era um “ranger” que também respeitava os seus Homens, embora quase todos a iniciarem a maioridade, que na época se alcançava aos 21 anos, a menos que ingressasse nas Forças Armadas com idade inferior. Hoje a maioridade é reconhecida aos 18 anos, mas de uma imaturidade que brada ao Altíssimo.
(Continua)
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Nota do editor: