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sábado, 18 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14895: Filhos do vento (41): Uma história com final feliz? Fatinha, filha da Maria Mandinga, de Cuntima, encontrou a família do pai e o pai, que está em França (António Bastos, ex-1.º cabo, Pel Caç 953)


Membros fundadores da Associação Fidju di Tuga
com sede em Bissau; cortesia da sua página na Net
1. Mensagem do António Bastos

Data: 17 de julho de 2015 às 22:22

Assunto: Filhos do vento: história com final feliz.

Camarada Luís e Tabanca Grande,  boa tarde.

Luís, tenho uma história muito feliz a contar é um pouco longa, mas se não for possível! Não há problema, também podes reduzir o texto.

Vamos à história; No dia 2/5/2015, foi o almoço anual do BArt 733 em Santiago do Cacém,  não foi organizado por mim mas estou sempre presente.

Passados uns dias, em 18/5/2015, às  20h00 horas toca-me o telefone, era o colega que organizou o almoço (António José, que era da CCS):
- Ó Bastos, ligou-me  um africano de Cuntima a perguntar se eu tinha a direcção do F... das transmissões,  eu disse que não tinha e não conhecia esse nome, mas que ia ligar para outro colega e depois dizia qualquer coisa.

O António José liga para mim, conta-me o caso e pergunta se pode dar o meu contacto.

Bom, eu sem ser do Batalhão, lá vou tentar resolver este caso, fui à história do BArt 733, não constava ninguém com aquele nome.

Eram 22h00, horas liga-me o Fernando Candé (, o africano de Cuntima,  como ele diz):
- Bastos, eu e minha esposa andamos à  procura do F... que era de transmissões do 733. 

Eu digo-lhe  que com esse nome,  F..., não havia ninguém no 733, então ele começa a contar-me que não quer saber dos bens que o F... possa ter, mas a esposa só queria dar um beijo no pai e apertá-lo contra o seu coração.

Bom, eu começo a pensar, vou-me meter nalguma, mas ao mesmo tempo com pena da Fatinha (é o nome da esposa do Fernando) e começo por pedir elementos para seguir com o caso.
- Em que ano nasceu a Fatinha? -
Resposta:
- Quarenta chuvas.
- Como se chama a mãe da Fatinha? 
-  Maria Mandinga, já faleceu. 
- Em que tabanca morava ela? 
- Em Cuntima.

Eram poucos elementos para eu poder avançar, mas liguei ao Carlos Silva, a perguntar se havia algum colega dele com esse nome, o Carlos diz-me logo que no Batalhão  dele não havia ninguém, fui à nossa tabanca e localizei um colega da CArt 3331, não me sabia dizer, deu-me outro contacto de um colega da Marinha Grande, esse já me ajudou alguma coisa, disse que conheceu a Maria Mandinga e a filha que era pequena, ia sempre às costas da mãe e que talvez tivesse um ano... Isto no ano de 1971. Ela, Fatinha, devia  ter 44 ou 45 chuvas, devia ser filha de alguém das  unidades que passaram por lá entre 1968 e 1970.

Vou tentar encontrar na nossa tabanca alguém da CCaç 1789, encontro uns quantos, todos do Norte, o Sousa esse conheceu a Maria Mandinga e sabia que tinha tido uma filha de um militar, não me quis dizer mais nada (e eu concordo, maluco sou eu). Deu-me outros contactos, ao ligar ao terceiro contacto, apareceu um colega que me disse que conheceu a Maria Mandinga e a filha, e que o pai era da unidade dele, o F..., 

Bom, batia certo com o que o Fernando dizia e, mais, depois de eu falar com o colega que é do Porto, o Teixeira, este logo se prontificou em me ajudar.

Dou o contacto do Teixeira ao africano de Cuntima, e eles encontram-se no dia 6/6/15 em Vila Nova de Gaia que é onde mora o Fernando, foi uma alegria para ambos, o Teixeira convida o Fernando e a Fatinha para almoçar em casa dele no Porto, no almoço o Fernando diz que o nome dele lá na Guiné, é Cherno e não Fernando, e que quando era pequeno (7 anos) estava sempre na oficina a ajudar os mecânicos. 

Depois, no dia do almoço anual da companhia, leva o Fernando e a Fatinha, bom, foi uma alegria para aquele pessoal todo mas uma tristeza para a Fatinha, pois o pai não apareceu porque está emigrado em França, mas o Teixeira consegui-o o contacto e a direcção da família do F... e até do próprio.

Então, o Teixeira mete pernas a caminho e vai sozinho a Vila Nova de Famalicão, encontra a irmã do F..., conta-lhe o que se está a passar e logo resposta da tia da Fatinha:
- Quero conhecer a minha sobrinha já.

Já se falaram pelo telefone, já lhe mandou uma foto do pai que está em França e, agora depois de passar o Ramadão, o Fernando, a Fatinha e o casal Teixeira vão-se encontrar com a família de Famalicão para almoçar.

O Teixeira já falou ao telefone com o F..., mas ele não levou a coisa a sério. A família está convencida que ele venha agora de férias. Então vão aguardar.

Eu também vou aguardar, e até pelas fotografias que eles prometeram mandar da família Teixeira, família Baldé, família da tia e até do próprio F... (se ele concordar em dar a cara).

Não me alongo mais um abraço e até breve.

António Paulo S. Bastos,
ex-1º Cabo do Pelotão Caçadores 953,
Cacheu, Bissau, Farim, Canjambari e Jumbembem, 1964/66
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Nota do editor:

Últomo poste da série > 5 de julho de  2015 > Guiné 63/74 - P14838: Filhos do vento (40): abaixo-assinado dos "Fidju di Tuga" à Assembleia da República Portuguesa: "Somos atualmente cerca de meia centena de membros, apenas em Bissau, estimamos que existam pelo menos meio milhar de 'filhos de tuga' espalhados pelo país... Vimos pedir o reconhecimento do legítimo direito à nacionalidade portuguesa"... Entretanto, o 1º ministro Passos Coelho faz amanhã, 2ª feira, a sua primeira visita oficial à Guiné-Bissau.

domingo, 5 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14838: Filhos do vento (40): abaixo-assinado dos "Fidju di Tuga" à Assembleia da República Portuguesa: "Somos atualmente cerca de meia centena de membros, apenas em Bissau, estimamos que existam pelo menos meio milhar de 'filhos de tuga' espalhados pelo país... Vimos pedir o reconhecimento do legítimo direito à nacionalidade portuguesa"... Entretanto, o 1º ministro Passos Coelho faz amanhã, 2ª feira, a sua primeira visita oficial à Guiné-Bissau.

1. Mensagem de Catarina Gomes, jornalista do Público,  autora (texto) da reportagem sobre os "Filhos do Vento" e "O Meu Filho Ficou lá";  filha de ex-combatente da guerra colonial (em Angola), escreveu o livro "Pai, tiveste medo ?" (Lisboa, Matéria Prima Edições, 2014):

[foto à esquerda: membros fundadores da Associação Fidju di Tuga, com sede em Bissau; cortesia da sua página na Net]
Data: 3 de julho de 2015 às 14:35
Assunto: abaixo-assinado

 Professor,

Aqui lhe envio o texto do abaixo-assinado da associação de que lhe tinha falado :

A Associação Fidju di Tuga/Filho de Tuga-Associação da Solidariedade dos Filhos e Amigos dos Ex-Combatentes na Guiné-Bissau foi criada em 2013 para representar os chamados Fidju di Tuga, expressão que traduzida do crioulo significa Filho de Tuga, e que durante todas as nossas vidas foi usada para nos designar/ insultar na Guiné-Bissau.

Somos filhos de ex-combatentes portugueses que estiveram na Guiné-Bissau durante a guerra colonial/guerra da libertação e que tiveram filhos com mulheres guineenses e os deixaram para trás. Muitos de nós até hoje apenas sabem os apelidos e patentes dos nossos pais, dados incompletos que não nos permitiram saber quem é nosso pai português e tentar entrar em contacto com ele.

Criámos esta associação para representar todos estes filhos que ficaram. Somos actualmente cerca de meia centena de membros, apenas em Bissau. Estimamos que existam pelo menos meio milhar de "filhos de tuga" espalhados pelo país, todos nascidos durante os anos da guerra ou no ano imediatamente a seguir ao regresso definitivo das tropas portuguesas.

Os nossos pais estiveram na Guiné-Bissau ao serviço do Estado Português. Os abaixo-assinados vêm por este meio pedir o reconhecimento do seu legítimo direito à nacionalidade portuguesa como filhos de pais portugueses, solicitando que a sua causa seja debatida no Parlamento português.

Entretanto, soube que o 1º ministro Passos Coelho vai à Guiné dia 6 de Julho.

Abraço e boas férias, se for caso disso.

Catarina
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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14792: Filhos do vento (39): Será que tudo o que por aí se vai dizendo, da nossa vida sexual em zona de guerra, não será também, em alguns casos, uma grande mentira? (Tony Borié)

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14792: Filhos do vento (39): Será que tudo o que por aí se vai dizendo, da nossa vida sexual em zona de guerra, não será também, em alguns casos, uma grande mentira? (Tony Borié)

1. Mensagem do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66) com data de hoje, 24 de Junho de 2015:

Olá Carlos.
Oxalá te encontres bem.
Eu sou um "chato".
Olha, se te fosse possível, e ainda fosse a tempo na tua organização, seria possível publicar este texto em qualquer altura que achasses oportuno, pois se passar algum tempo, passa de moda, como se costuma dizer.
O Luís avivou os companheiros para este tema da sexualidade em tempo de guerra e, creio até que saiu na televisão aí em Portugal um programa com um combatente que foi ver o filho a Angola e, eu rabisquei isto.
Ajeita ao teu gosto, por favor.

Um abraço, Carlos,
Tony Borie.


Um dia, vamos todos, “bater a bota”!



Já lá vai algum tempo em que o nosso comandante Luís nos mandou uma mensagem, em que entre outras palavras dizia: “Que ninguém nos acuse de ter "esqueletos" escondidos no armário... Um dia vamos todos "bater a bota", mas temos a consciência de que falamos de tudo ou quase tudo o que tínhamos a falar, entre nós, e para as gerações que nos sucedem, as dos nossos filhos e netos... não sei se há muitos blogues de antigos combatentes, em Portugal e noutras partes do mundo que tenham abordado "temas sensíveis" como, por exemplo, este, o da nossa sexualidade”.

Esta nossa simples contribuição, para conhecimento em especial, dos tais nossos filhos e netos, espera a compreensão dos nossos companheiros combatentes, tanto africanos como europeus, é um relato de coisas que não se dirige a ninguém, nem tão pouco quer ferir nenhuma sensibilidade em particular, pois este é um tema muito sério, há muito de verdade nestas simples palavras, já lá vão mais de cinquenta anos, naquele tempo, quase todos nós, única e simplesmente não sabíamos, não tínhamos qualquer informação a respeito deste tema, da sexualidade em zona de guerra, hoje, as novas gerações têm uma mentalidade muito mais aberta, falam, discutem, vêm para os jornais, televisão e outros meios de comunicação, exporem as suas vivências, explicarem que a avó, a mãe, a irmã, a prima ou a tia, foram entre outras coisas, abusadas, maltratadas, talvez violadas, como dissemos a princípio, este é um tema sério demais para ser falado, assim de ânimo tão leve.

Repito, há muito de verdade nestas palavras, hoje, depois de tantos anos, infelizmente, todavia ninguém sabe, ninguém pode afirmar, torno a repetir, não temos conhecimento de qualquer estudo que o possa afirmar, com verdade, mas, existem muitas pessoas africanas com feições europeias, muitas pessoas asiáticas com feições europeias, muitas pessoas europeias e asiáticas com feições africanas, que não sabem quem foi o seu pai ou mãe, no nosso caso de antigos e briosos combatentes que fomos, sabemos também que algumas tropas recrutadas lá na Guiné, assim como alguma população civil, tinham particulares preconceitos sobre os militares vindos de Portugal.


Por exemplo, para o nosso amigo Iafane, conhecido como o “barqueiro”, que fazia o transporte fluvial, durante a maré cheia, para a vila de Mansoa, de pessoas e bens, das aldeias ribeirinhas, viajando sobre a água lamacenta do rio, completamente nu, só colocava um farrapo a cobrir-lhe o sexo, quando chegava a terra, depois de ancorar a canoa, passava grande parte do dia, quando nós estávamos de folga das nossas tarefas, junto da ponte do rio Mansoa, na sua casota coberta de colmo, às vezes construindo uma nova canoa, fumávamos um cigarro feito à mão, ele ia falando, falando, naquele português acrioulado que todos nós conhecemos, contando-nos, entre outras coisas, as “encomendas” que tinha de pedidos de novas raparigas, para alguns “homens grandes”, ficando muito admirado, quando lhe explicávamos, que lá em Portugal, o homem casava com uma só mulher.

A sua Guiné era um refúgio seguro, onde podia ter relações legalmente, quase como se fosse um casamento, com três, quatro ou cinco mulheres, longe da velha Europa, do resto do mundo, na altura, em algumas zonas, profundamente racista. No entanto, o mesmo nosso amigo Iafane era subestimado, a sua acção era ignorada, fazia parte da história colonial, daquele braço português de opressão racial e subjugação dos civis guinéus, especialmente nas áreas rurais, para projectar, entre outras coisas, o poder do homem e, claro, o medo e, volto a dizer, a subjugação entre a população feminina, onde as mulheres, por norma, tinham por obrigação trabalhar de sol a sol e repartir o seu marido por três, quatro ou cinco companheiras, tudo isto enquanto estivessem na idade de dar alguns filhos, porque depois, eram única e simplesmente colocadas de lado, para trabalhos menores, como cozinhar, tomar conta dos animais ou dos filhos das novas esposas do senhor seu marido.

Companheiros, isto não é dos livros, nós todos, pelos menos os que andaram pelo interior, pelas aldeias rurais, vimos, os nossos olhos viram, era uma verdade daquele tempo, que felizmente deve de estar ultrapassada, oxalá que sim.

Depois destes anos todos, muita água correu debaixo da ponte do rio Mansoa, quase tudo é, ou foi, pretexto para culpar o "militar europeu", que era para lá mandado pelo então governo de Portugal, alimentar uma guerra, que hoje sabemos que era injusta, mas onde alguns irmãos combatentes, soldados africanos, faziam parte, que ajudavam a criar caminhos para atitudes raciais, compartilhando preconceitos profundamente desonestos, pois muitas vezes ofereciam as tais irmãs ou primas, ao tal “militar europeu”, a preço de pequenos privilégios, como por exemplo serem candidatos a vestir a farda camuflada, com uma boina militar na cabeça, pois num país em guerra e sem qualquer futuro, eles ainda jovens, viam nessa atitude, uma necessidade para uma oportunidade, enfim, pensando assim, teriam algum modo de sobrevivência.

Já estamos a ir longe demais na nossa conversa, mas também temos a consciência, de que, naquele tempo, se o “homem africano”, neste caso o nosso amigo Iafane, tentasse alguma vez convidar a “mulher europeia” para uma aventura na cama, se essa mulher não gostasse do convite, seria imediatamente considerado um “estuprador”, sujeito a levar dois tiros em qualquer parte do seu corpo, mas se o “Lifebuoy”, cujo nome de guerra lhe foi colocado porque vendia entre outras coisas, sabonetes lá no aquartelamento e, às vezes andava de namoro com uma das filhas do Libanês, que era um soldado europeu, muito popular no aquartelamento de Mansoa, convidasse a filha do “homem grande” da tabanca de Luanda, que tinha sómente treze anos, para a mesma aventura sexual, e ela não acedesse, fazendo queixa ao pai, o crime do soldado europeu “Lifebuoy”, era culpado única e simplesmente de uma aventura sexual, considerada uma pequena diversão!.


Infelizmente, era o sistema implantado naquele tempo, que ajudou a fazer a história colonial, que motivou as populações africanas a pegarem em armas, revoltando-se, como aconteceu em outras partes do mundo, mas voltando ao sexo em zona de guerra, alguns de nós, pelo menos os que estiveram estacionados por algum tempo no interior, sabemos que as raparigas africanas tinham algum fascínio pelo homem europeu, porquê, não sabemos, todavia elas podiam não saber ler ou escrever, tinham pouco contacto com o exterior mais civilizado, mas sabiam as “luas”, tinham a sua medicina à base de ervas e outros ingredientes, algumas afrodisíacas, conheciam o seu corpo, tinham conhecimentos sobre o sexo, sobre a procriação, sabiam os segredos do prazer e do amor, estava-lhes no sangue, tudo isto fazia parte da sua educação nas aldeias rurais, que lhe eram ministrados pelas mães, irmãs ou avós, conhecimentos esses que o resto do mundo talvez nunca chegará a saber, sabiam quando procurar a companhia do homem, ou quando deviam fugir dele, estamos em crer até, que quando havia descendentes, era por mútuo acordo, no entanto, nunca se pode excluir a ideia de poder haver alguns casos. Vamos lá ver, na nossa opinião, na tal zona de guerra, se qualquer de nós nunca matou, maltratou ou forçou a sua companheira para qualquer acto sexual, se nunca soube, ou sabe, que existiram indícios de deixar descendentes, deve continuar a viver o resto dos seus dias com a sua consciência limpa, pois o acto sexual teve o acordo e talvez uma atração mútua, portanto o homem europeu, violou ou abusou da mulher africana, assim como a mulher africana, violou ou abusou do homem europeu, embora sabendo que o produto desse acto fica na posse da mulher, o que traz muitas responsabilidades para o homem, claro, como dissemos antes, sabendo ele que o acto produziu descendentes.

Já vamos um pouco longe, mas para finalizar, existe um ditado não muito antigo, mas por aqui bastante popular que diz: “what happens in Vegas, stays in Vegas”, que quer dizer mais ou menos, “o que passa em Las Vegas fica em Las Vegas” e, no nosso caso, de antigos combatentes, assenta perfeitamente, ou seja, “o que passou na zona de guerra em África, ficou em África”.

Há, já me esquecia, falando agora numa linguagem reles, tipo “Curvas alto e refilão”, o “Estarreja”, que era um soldado condutor da CCS do Batalhão de Artilharia 645, os Águias Negras, que sempre esteve estacionado em Mansoa, fazia o trajecto de Mansoa a Bissau, quase todos os dias, que também fazia “contrabando de pessoas e bens” de Mansoa para a capital, sem os superiores saberem, era “boca cheia”, lá no aquartelamento, que andava a “comer” a Binta, que também era a sua lavadeira, pois já os tinham visto a “cavalo um no outro”, nas escadas de cimento do campo de jogos dos Balantas, dizia-se mesmo que ela só lavava a roupa dele, o que era uma grande mentira.

Tony Borie, Julho de 2015
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14774: Filhos do vento (38): O caso do António da Graça Bento que foi a Angola, 40 anos depois, conhecer o seu filho. Reporatgem "on line" e em papel, no jornal Público: texto de Catarina Gomes e imagem e som de Ricardo Rezende

sábado, 20 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14774: Filhos do vento (38): O caso do António da Graça Bento que foi a Angola, 40 anos depois, conhecer o seu filho. Reporatgem "on line" e em papel, no jornal Público: texto de Catarina Gomes e imagem e som de Ricardo Rezende



Dois fotogramas do vídeo (31' 17'') publicado pelo Público "on line": "Quero que ele sabe que tem um pai".  Ricardo Rezende (imagem e som). Reproduzidos com a devida vénia.



O encontro do pai (António Graça Bento, 63 anos) e do filho (Jorge Paulo Bento, conhecido por o "Pula", na Unidade de Intervenção Rápida, de Luena, a que pertence; tem agora 40 anos e 4 filhos; a mãe, Esperança, já morreu em 2005). (*)

Foto de Manuel Roberto, fotojornalista do Público, reproduzida com a devida vénia.

O António Bento, natural de Nisa, que trabalha em Montemor-o-Novo e vive em Vendas Novas, foi fur mil da 1ª C/ BART  6321/73 (1973/75), mobilizada pelo RAL 3 (Évora). Este batalhão esteve no leste de Angola (Lucusse, Luvuei, Cassamba e Lutembo). A 1ª companhia esteve no Luvuei. Eis aqui a sua história. 

A reportagem "Quem é o filho que António deixou na guerra?" é uma magnífica peça jornalística de Catarina Gomes (texto), Manuel Roberto (fotografia) e Ricardo Resende  (vídeo em Luanda e Luena).

"Esta é a história de um furriel português que foi viver para a sanzala e que foi feliz na guerra. E de um filho angolano que sempre viveu incompleto. Afinal, o pai de Jorge existe e foi ao seu encontro."

Vd. na edição em papel, domingo, dia 21, a reportagem completa (Público | Revista) (**)

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14772: Filhos do vento (37): Nos trilhos de crianças nos tempos da guerra colonial (José Saúde)


1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem. 

Nos trilhos de crianças nos tempos da guerra colonial
“Filhos do Vento” 

Obrigado Catarina Gomes! 

Falamos a mesma linguagem. A linguagem jornalista, aquela que nos foi e é peculiar nos tempos que ocorrem e no preciso momento de informar. O contexto, o nosso, é uníssono. Sabemos de como tratar o assunto. Sabemos, também, o impacto da informação junto a um público que anseia a justeza de comunicação. 

Vi reportagem na SIC sobre o encontro de um pai, passados 40 anos, com um filho que deixou em Angola. Revi, simultaneamente, a minha ousadia quando um belo, repito, belo dia, desmitifiquei preconceitos sociais e “histórias da carochinha” contadas entretanto por caminhos ínvios de antigos camaradas que sempre mantiveram tabu sobre as nossas presenças num palco de guerra que nos foi substancialmente cruel. 

“Filhos do Vento” foi uma temática que tentei passar para a opinião pública sabendo de antemão o desconforto que a narrativa pudesse eventualmente trazer no conceito social. Porém, avancei despido de preconceitos que o tema tinha, com certeza, motivos adjacentes que poderiam guindar-se a níveis superiores e elevar bem alto o absolutismo de realidades que nós, antigos combatentes, deixámos em pleno palco de guerra. 

Confortam-me os depoimentos de homens que assumem essas realidades. Constatei a última sondagem feita no nosso blogue sobre uma temática que tem levantado celeumas. Claro que acredito fielmente nas convicções dos antigos camaradas. Todavia, nem todos foram santos. Houve, também, pequenos “diabos à solta” cujas diabruras sexuais foram motivos evidentes que em momentos de eufóricos êxtases carnais fecundaram seres que viveram angustia de jamais conhecerem os verdadeiros progenitores. O pai que se perdeu numa devastada penumbra. 

E foi justamente na base deste pressuposto em saber separar as águas que antiga guerra colonial nos impôs, que desafiei desbravar o “cabo das tormentas” e colocar na ribalta os “Filhos do Vento”, cujo atrevimentos me confere aureolas de lisonjeiras verticalidades que o tempo acabaria por confirmar. 

O desígnio ocorreu-me, talvez levianamente, admito, reconhecendo, por outro lado, a influência que o nosso blogue – Luís Graça & Camaradas da Guiné - confere no contexto nacional e internacional. Aliás, é líquido que revejamos o excelente trabalho feito pela jornalista de “O PÚBLICO”, Catarina Gomes, que tem trazido até nós excelentes momentos de reportagem sobre crianças, hoje homens e mulheres, que por lá ficaram e que sempre ansiaram conhecer o homens que esteve na origem da sua vinda ao mundo dos mortais. 

Creio que abri um caminho, outrora quiçá impensável, para um reencontro de afetos familiares que pareciam perdidos no tempo. 

Com o dever cumprido este antigo combatente na Guiné, alentejano assumido e nascido em Aldeia Nova São Bento, tendo na cidade de Beja a sua terra de adoção, partirá um dia para a tal viagem sem regresso transportando consigo uma mala de eternas recordações onde à superfície emerge o profícuo reconhecimento de uma história que não fora a minha ousadia morreria, quiçá, no limbo do esquecimento. 

E é neste desafiar de memórias que remeto os camaradas para esporádicas revisões que, a espaços, contemplam lembranças de um passado que jamais deveremos olvidar. 

O palco do conflito armado nas antigas colónias – Angola, Moçambique e Guiné – trouxe inequívocos resquícios de um passado que outrora mexeu com a nossa sensibilidade humana, mormente quando as nossas idades joviais traçavam planos onde o sexo emergia à tona das nossas mentes. 

Conheço há muito o mundo do jornalismo e aproveito, uma vez mais, para enaltecer o trabalho desenvolvido pela Catarina Gomes no que concerne ao seu trabalho sobre o desígnio “Filhos do Vento”, em concreto, uma temática que eu em boa hora trouxe a público. 

O meu agradecimento é, obviamente, extensivo ao nosso camarada e amigo Luís Graça pela oportunidade dada.


Um abraço camaradas, 
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

18 DE JUNHO DE 2015 > Guiné 63/74 - P14764: Filhos do vento (36): SIC, Jornal da Noite, hoje, 4ª feira, 18, 20h00-21h30; e revista do jornal "Público", domingo, 21: "Tivemos a felicidade de acompanhar o António Bento, que esteve em Angola entre 1973 e 1975, e era furriel, e ir com ele ao encontro do filho que ele nunca conheceu, deixou a mulher com quem viveu durante um ano grávida" (Catarina Gomes, jornalista)  

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14764: Filhos do vento (36): SIC, Jornal da Noite, hoje, 4ª feira, 18, 20h00-21h30; e revista do jornal "Público", domingo, 21: "Tivemos a felicidade de acompanhar o António Bento, que esteve em Angola entre 1973 e 1975, e era furriel, e ir com ele ao encontro do filho que ele nunca conheceu, deixou a mulher com quem viveu durante um ano grávida" (Catarina Gomes, jornalista)

1. Mensagem da nossa amiga Catarina Gomes,  jornalista do "Público", coautora da reportagem sobre os "Filhos do Vento" e "O Meu Filho Ficou lá"; filha de ex-combatente da guerra colonial (em Angola), escreveu o livro "Pai, tiveste medo ?" (Lisboa, Matéria Prima Edições, 2014):

Data: 16 de junho de 2015 às 10:19
Assunto: Reportagem Angola

Caro professor,

Tal como lhe tinha dito, desde a ida à Guiné a a reportagem dos "filhos do vento",  fiquei com vontade de contar uma história ao contrário, pelo lado de um pai de um "filho do vento". Tivemos a felicidade de acompanhar o António Bento, que esteve em Angola entre 1973 e 1975,  e era furriel, e ir com ele ao encontro do filho que ele nunca conheceu, deixou a mulher com quem viveu durante um ano grávida.

É dessa aventura que dá conta a reportagem que sairá publicada na revista do "Público", no domingo dia 21 de Junho, e no Jornal da Noite da SIC,  esta quinta-feira dia 18 de Junho.

Espero que a reportagem possa inspirar muitos pais a olharem para o passado e talvez a lembrarem-se que deixaram um filho para trás.

Aqui lhe deixo  os dados da conta  bancária da:

Associação da Solidariedade dos Filhos e Amigos dos Ex-Combatentes Portugueses na Guiné-Bissau (Fidju di Tuga)
Banco da África Ocidental em ligação à conta do Montepio em Lisboa.


114011010114

Um abraço
Catarina


2. Quinta-feira, dia 18 de junho, no 'Jornal da Noite', SIC [20h00-21h30], 

Grande Reportagem SIC: "O meu filho ficou lá" 


Sinopse:

A Guerra Colonial levou milhares de soldados portugueses para África e deixou por lá muitas crianças sem pai, filhos de militares portugueses que acabaram as suas comissões de serviço e regressaram a Portugal. Há quem desconheça que por lá deixou um filho, há quem o esconda porque construiu uma nova família após o regresso e há quem nunca esqueça o que se passou.

Já na parte final do conflito, António Bento foi enviado, por dois anos, para Angola onde prestou serviço militar entre 1973 e 1975. Foi colocado no interior de Angola, na província de Luena, perto da fronteira com a Zambia.

Durante a comissão de serviço, António Bento apaixonou-se pela angolana Esperança. O soldado chegou mesmo a mudar-se e a ir viver para casa de Esperança, numa aldeia perto do quartel. Mas no início de 1975, a comissão de serviço termina e António Bento regressa a Lisboa pouco antes do filho de ambos nascer. O ex-combatente nunca esqueceu que se tinha despedido de uma mulher grávida.

A longa guerra civil em Angola e as dificuldades de comunicação com o interior do país foram algumas das barreiras que impediram António Bento de descobrir o paradeiro do filho. Mas nunca desistiu.

Hoje "Zito", o filho de António e de Esperança, tem 40 anos, a mesma idade de Angola independente. E só ao fim de 4 décadas pai e filho encararam-se, pela primeira vez, olhos nos olhos.

"O Meu Filho Ficou Lá " é a história de uma viagem ao interior de Angola e à emoção do primeiro encontro entre um pai e um filho. Uma 'Grande Reportagem' em parceria jornal Público /SIC.

Reportagem : Catarina Gomes
Ricardo Rezende (imagem e som)
Montagem: Ricardo Rezende | Rui Berton
Uma parceria jornal Público / SIC
Coordenação: Cândida Pinto
Direcção: Alcides Vieira | Rodrigo Guedes de Carvalho

Fonte: Cortesia de:

SIC | Ana Margarida Morais
Assistente Gabinete de Comunicação e Relações Externas

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terça-feira, 16 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14752: Inquérito online: Resultados finais (n=194): 45% do pessoal que passou pelo CTIG admite que não teve relações sexuais com nenhuma mulher guineense... Se a nossa amostra fosse representativa dos 200 mil militares metropolitanos que passaram pelo CTIG, a proporção deveria ser bem maior (talvez c. 75%)




Quadro - Resultados da sondagem  "on line" que decorreu no nosso blogue entre 8 e 14 de junho de 2015. Total de respostas: n=194


Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2015)


1. Resumindo, podemos dizer que;

(i) Cerca de 45% dos votantes, admite nunca ter tido relações sexuais com mulheres guineenses, ao tempo da guerra colonial (1961/74);

(ii) Um total de 68 (cerca de 35%)  diz que teve relações pelo menos uma vez (12%) ou mais do que uma vez (23%);

(iii) Há uma minoria (n=38) (menos de 20%) que tinha relações sexuais com mulheres guineenses "bastantes vezes" (10%) ou com "muita frequência" (9%).

(iv) Apenas um respondente votou na hipótese "não sei/não me recordo".


2.  Estamos longe da célebre estimativa do Jorge Cabral que apontava para um total de 80% a 90% de militares,  metropolitanos, que nunca terão tido relações sexuais com mulheres guineenses (*)... 

O "alfero Cabral" não se baseia em quaisquer estudos, de resto inexistentes, sobre esta matéria (que não terá merecido qualquer especial atenção por parte da hierarquia das nossas Forças Armada). Baseia-se, isso sim, na sua perceção e na sua experiência "no terreno". 

É o conhecimento de causa que lhe permito, inclusive, desenvolver a curiosa "teoria da alferofilia", ou seja, a particular atração sexual de que eram objeto (e não apenas sujeito) os oficiais milicianos, em especial os que tinham funções de comando... Espero que ele se ponha fino e bom para explicar e exemplificar melhor a sua "teoria do caneco" (**), de resto, verosímil, já que, como é sabido, o poder é afrodisíaco...






Um caneco que ainda vai fazer furor entre as bajudas da Guiné-Bissau, na próxima incarnação dos guerreiros do Império: "Kiss me, I'm an Alfero" [Beija-me, sou um Alfero] (**)...

Foto: © Jorge Cabral (2009). Todos os direitos reservados.



Para se ler corretamente os resultados da sondagem, é preciso ter em conta, em todo o caso, que nesta amostra de 194  ex-combatentes, é muito provável que haja uma sobrerrepresentação dos milicianos (alferes e furrieis) em detrimento do pessoal do recrutamento geral (1ºs  cabos e soldados), reflectindo a estrutura populacional da Tabanca Grande (onde tendem a predominar  os antigos milicianos).

As contas são fáceis de fazer: passaram pelo TO da Guiné, ao longo dsa guerra (1961/74) cerca de mil unidades e subunidades (batalhões, conpanhias, pelotões)... A nossa Tabanca Grande tem menos de 700 elementos formalmente registados, entre "amigos" e "camaradas" ( mais exatamente, 691)... A grande maioria são ex-combatentes. Em todo o casoo, cerca de 6% de grã-tabanqueiros já morreram. Portanto, nem todas as unidades e subunidades têm um representante no blogue.  Algunas têm meia dúzia. E naquelas que têm pelo menos um representante,  é mais provável esse camarada seja um miliciano (alferes ou furriel)....

A explicação é intuitiva: os ex-milicianos, muitos deles continuaram a estudar, depois de passarem à peluda, tendo portanto um maior nível de literacia (funcional e informática) do que a generalidade do pessoal do recrutamnento geral...

De qualquer modo, se esta sondagem fosse representativa do contingente militar que passou pela Guiné (cerca de 200 mil homens), a proporção  de respondentes que adnitiram nunca ter tido relações sexuais com nenhum mulher local deveria ser da ordem dos 3 para 4 (75%).


A mãe da "menina do Gabu" que viveu em "união de facto" com um furriel
miliciano em  Nova Lamego, em meados dos anos 60
(Foto de José Saúde, 2011)
3. Não menos interessante é a existência de um minoria de camaradas nossos (9%) que tinham "relações sexuais com muita frequência", o que só pode ser explicado pelo facto de terem vivido maritalmente com uma mulher (guineense) no TO da Guiné...

Temos conhecimento de alguns (poucos)  casos de "bajuda com morança posta" por militar metropolitano, em geral não operacional (pessoal de apoio: saúde, manutenção, transmissões, secretariado, alimentação, transportes, etc.), vivendo fora do quartel,  e em aglomerados populacionais de maior dimensão (como era o caso de Bissau, Bafatá, Bambadinca, Nova Lamego)... Estas "uniões de facto" eram mais propícias à "geração" de "filhos do vento" ou "filhos da guerra"...

Achamos, todavia, que essa proporação (9%) peca por excesso... Quando muito, poderia haver um caso ou outro por companhia (que era constituída por 150/160 homens, incluindo 1 capitão, 4 alferes, 20 sargentos e furrieis)...

Atenção, que nos nossos aquartelamentos não havia qualquer privacidade: na melhor das hipóteses, quem tinha um quarto privativo era o capitão ou o comandante (alferes, no caso dos destacamentos), para além dos oficiais superiores (nas sedes de batalhão)...

Por outro lado, todos sabemos que, em tempo de guerra,  a "procura" (de favores sexuais) era muito superior à "oferta", nomeadamente no interior do território... E que casos (pontuais) de violação eram punidos disciplinar e/ou criminalmente,,, (É bom que isso se diga e se escreva!)...

Aguardemos os comentários e as demais achegas dos nossos leitores, que serão muito bem vindos (***)... LG

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Notas do editor:


(...) Comentário do editor LG:

A propósito da conferência “Filhos da guerra”, no âmbito do Festival Rotas & Rituais (Lisboa, Cinema São Jorge, 22 de maio de 2015), tomei nota no meu canhenho:

“Temos dificuldade em abordar em público este problema, o das nossas relações com as mulheres guineenses no tempo da guerra colonial. Pior ainda, num público feminino ( e senão mesmo feminista), português e africano, ou de origem africana… Somos, os homens, facilmente “suspeitos de cumplicidade” uns com os outros… Os homens são todos iguais, em toda a parte, defendem-se uns aos outros, dizem elas…

"A intervenção, longa e incisiva, do Jorge Cabral, em tempo de debate, acabou por provocar algum sururu na sala. Disse ele, em síntese:

- Defenderei até à morte a honra do soldiado português na Guiné. Nós não eramos nenhum emprenhadores compulsivos. Mais: atrevo-me a dizer que 80% a 90% dos soldados portugueses na Guiné não tiveram quaisquer relações sexuais com mulheres africanos… E se querem falar de prostituição organizada (que no meu tempo praticamente se restringia a Bissau e, em pequena escala, a Bafatá), pois tenho a dizer que é muito maior hoje, só na capital da Guiné-Bissau, do que no meu tempo" (...)

(**) Vd. poste de 28 de outubro de  2009 > Guiné 53/74 - P5172: Estórias cabralianas (56): Cum caneco, alfero apanhado à unha! (Jorge Cabral)

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14733: Ser solidário (185): Regressei de Bissau e trago um abaixo-assinado de 12 filhos, com as respetivas cópias do BI. A Associação "Fidju di Tuga" quer sensibilizar os deputados portugueses que passaram pelo TO da Guiné (Catarina Gomes, jornalista)

1. Mensagem da jonalista do "Público", Catarina Gomes, autora da reportagem "Filhos do Vento"e do livro "Pai, tiveste medo ?" (Lisboa, Matéria Prima Edições, 2014):


Data: 9 de junho de 2015 às 10:33

Assunto: Filhos

Bom dia,  professor Luís Graça,

Estou de regresso. Como descrever o que senti durante estes dias? Presenciei a uma reunião da associação "Fidju di Tuga", ofereci-lhes o gravador do Tiago Teixeira e a máquina fotográfica de João Sacôto, que os vai ajudar a registar as suas histórias.

O Pepito tinha-lhes prometido tempo de antena nas rádios comunitárias da AD e uma motorizada para que fizessem o levantamento dos filhos pelo país, mas infelizmente a nova AD não deu continuidade à promessa.

Constato que os filhos que eu conheci há dois anos não são os mesmos da associação, que outros novos se lhe juntaram, que há cada vez mais. Acompanhei o presidente, Fernando Hedgar da Silva [. foto à esquerda,] , e constato que a associação vai sendo cada vez mais conhecida na Guiné, e que reforçou laços entre pessoas que tiveram o mesmo destino e que agora já não estão sós, estão a forjar uma identidade em conjunto. As reuniões são tristes e alegres ao mesmo tempo.

Fiquei muito feliz com a sondagem do blogue, sobre o aparente consenso em torno da questão da nacionalidade. Acho que tem de haver mais a fazer por estas pessoas. Espero que a reportagem de dia 18 de Junho, do pai que voltou a Angola para conhecer o filho, ajude a despertar consciências adormecidas!

Não havendo possibilidade de reencontros entre pais e filhos, acho que chega a altura de o Estado português fazer alguma coisa por estas pessoas que vivem em condições muito parecidas com as que os ex-combatentes conheceram há 40 anos.

Será que me pode mandar o mail dos dois deputados que foram passaram pelo TO da Guiné ?  Falei neles ao Fernando e será ele a mandar o mail.

Penso que seria importante que os ex-combatentes se mobilizassem nesta causa, o professor tem feito por isso. Eu trouxe um pequeno abaixo-assinado, com as respectivas cópias dos bilhetes de identidade de 12 filhos.

Assim que descarregar as fotos do meu telemóvel mando-lhas. (**)

Até breve

Catarina Gomes
Jornalista
Jornal PÚBLICO
(+351) 21 0111179 (Directo)
cgomes@publico.pt
www.publico.pt

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Notas do editor:


domingo, 7 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14708: (Ex)citações (276): Sexo em tempo de guerra... De Ganturé ao Pilão (Mário Gaspar, ex-fur mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)



Guiné > Região de Tombali > Canturé > CART 1659 (166/68) > Foto nº 1  > A bajuda mais linda de Ganturé



Foto nº 2


Foto nº 3



Foto nº 4


Foto nº 5


Foto nº 6  > A primeira, do lado esquerdo, foi minha lavadeira


Foto nº 7


Guiné > Região de Tombali > Canturé > CART 1659 (1967/68) > Beldades de Canturé.


Fotos (e legendagem): © Mário Gaspar (2015). Todos os direitos reservados Edição: LG]



1. Texto enviado ontem pelo Mário Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68; e, como ele gosta de lembrar, Lapidador Principal de Primeira de Diamantes):



Assunto: Filhos da guerra



Caros Camaradas

Já enviei um texto sobre o tema, oara publicação … Nós nunca poderíamos ser "santinhos", nem ponho a hipótese de violações. A verdade é que o Soldado português era Homem.

Exibicionismo? Nunca assisti! No mínimo dos mínimos o que se fazia era pela calada da noite, naquilo que conheço.


Cumprimentos

Mário Vitorino Gaspar


2. Sexo em tempo de guerra: de Ganturé ao Pilão

por Mário Gaspar



O nosso Camarada Jorge Cabral disse,  no Cinema São Jorge no dia 22 de Maio último sobre o tema “Filhos da Guerra”: (i) que defendia a honra do soldado português na Guiné; (ii) que " não éramos emprenhadores compulsivos”; (iii) que 80 a 90% dos soldados portugueses na Guiné não tiveram relações sexuais…”;  e (iv) que "a prostituição organizada se restringia a Bissau…”. (*)

Por aqui fico. Estou totalmente de acordo com o Camarada, acrescento novamente:  aqueles que “não estavam virados do avesso” – não gosto dessa gente – tinham necessidades normais para a idade. Os soldados portugueses eram,  na grande maioria,   virgens e alguns perderam a virgindade na véspera da despedida da namorada ou noiva. Existem estudos sobre o tema e participei nos debates. É mesmo verdade. E estive lá, na Guiné, e fico pasmado com os camaradas que percorreram aquelas paragens e que contestam.

No meu Livro “0 Corredor da Morte”, no Capítulo 9 (“O Rebentamento Durante o Batuque”), pode-se ler:
Estamos em Ganturé, 4 de Julho de 1967 (…). Do outro lado,  uma das mulheres do régulo – a mais nova – dono e senhor da população e colaborador da nossa tropa, com o posto de tenente de 2.ª linha Abibo Injasso, dirigia-se para a habitação fronteiriça, com um aspecto bem diferente das outras, como se fosse a rainha. (…). A mulher mais nova daquele rei,  de olhos escuros e seios grandes e firmes, que se soltavam do corpo gracioso quando caminhava. Era esbelta. Vestia um pano com cores berrantes, enrolado da cintura até aos joelhos. Sorri-me, notando­‑lhe os lábios carnudos rompendo-lhe o rosto. Atraía-me aquela mulher, que há bem pouco pilava, como se de uma dança se tratasse. 

(…). Ouvia-se o batuque. Aquele som, era diferente, bem diferente dos bailes em Alhandra, normal­mente aos sábados. A música vinha com eles do ventre. Eram sons vivos e ritmados que convidavam à dança. A mulher mais nova do régulo avançava, seguramente em direcção do batuque. O enrolar da saia, aquele acto de enrolar, assemelhava-se decerto ao ritual do toureiro, quando veste o seu traje de luzes, enrolada da cintura para baixo, deixando ver um palmo acima do joelho, e antevendo-se o nu do corpo escuro e brilhante. Uma volta, e outra, que com o andar, deixavam ver as pernas bem torneadas, não no torno das oficinas da Fábrica Grande, mas no do nascimento. As ancas carnosas sentiam-se roçando, num movimento ligeiro e cadenciado, o tecido multicolor. Seguiam-se uns seios harmoniosos, espetados, com os bicos tenros ainda, de rosas. Era aquilo que nós chamávamos naquelas terras: - de “mama firme”. 

As relações sexuais eram impensáveis. Se o Abibo soubesse! Toda a que fosse apanhada com o branco, era severamente castigada, depois de sujeita a um “julgamento”, em que participavam “os homens grandes”. Funcionava o chicote, tal e qual como nos filmes de histórias da escravatura dos americanos. As madeiras das traves que sustentavam o alpendre daquela tabanca luxuosa, que não era luxo, serviam para amarrar as “pecadoras” que cometessem adultério. Depois funcionava o chicote. Eram os usos e costumes daquele povo onde o Abibo era rei e senhor. (…). 

Mesmo em frente lá estava o centro das atenções daquela festa, o famigerado batuque. Os ouvidos ficaram repentinamente presos ao corpo. Mulheres e crianças em círculo, rodeavam os músicos munidos de tambores artesanais. As mulheres grandes e as bajudas dançavam, quase todas, com os seios descobertos – existindo excepções – a alegria transmitida por aquele ritmo trepidante fazia lembrar ciganos nas danças dos seus acampamentos e até em feiras. Os seios, ora rijos da juventude, flácidos outros e grandes movimentavam-se acompanhando as notas musicais, não existindo parte alguma daqueles corpos que não trepidasse. 

Os movimentos dos corpos faziam-me vibrar. Eram escuros, com um brilho envernizado. Luz quase inexistente, quase somente a claridade do luar batia meigamente nos corpos de miúdas de palmo e meio, que enfeitavam o quadro. Avançavam como que desafiando as mais velhas que sorriam. Uma fotografia para recordar aqueles momentos? Talvez não fosse necessário porque jamais esqueceria aqueles momen­tos. Os homens do centro batiam com força nos tambores molhados do suor que escorria das suas faces. Não haviam frequentado qualquer escola de música mas fabricavam o som que fazia tremer o meu corpo. Aprenderam decerto com os pais, os avós e, recuando gerações, de escravos quem sabe, transportados para longínquas paragens em naus para os cinco cantos do mundo. No futuro seriam eles os professores dos filhos. Poucos eram os militares presentes. Pretendiam envolver-se na dança, notei-lhes nos olhos quando o círculo se alargou e o 1.º cabo, olhando-me com um sorriso gaiato, afirmou com convicção.
– Tão boas...Que mamas,  minha mãe!... E as bundas?
– Daqui não levas nada, só com os cinco dedos da mão! Podes apro­veitar o balanço e faz-me uma, pode ser com a canhota ou com a irmã dela! – Ouvi da boca do soldado.
– Olha-me esta merda?! Dou-te uma tampona, que estás uns tempos que não vês o que tens entre as pernas... Vai mas é mijar que isso passa. É tesão de mijo. Podes agarrar-te àquelas de tetas grandes, deixa as bajudas para mim!

Logo de seguida afastaram-se ambos sorrindo, quando avistei a filha do régulo. Magra e bem esculpida, de seios pequenos. Os olhos escuros brilhavam no escuro do rosto onde sobressaía um nariz também pequeno. O pai vendia-a, segundo diziam os militares pretos, por três mil patacões (três mil escudos).

Ela olhou-me e riu-se.
– Meu furriel...

Imaginei estar encostado à sua bunda arredondada que trepidava com a música e colocar-lhe os braços em redor da cintura estreita, subindo as mãos até aos seios rijos de 20 anos. Afastou-se de mim. Embora não dan­çasse, balanceava com os pés presos ao chão, ao sabor dos tambores. Não entendia o que se estava a passar comigo. Sonhava que lhe tocava em todo o corpo. Parece que adivinhava o que eu pensava:
– Mim, cá nega!

Ao mesmo tempo que soltou dos seus lábios carnudos a pequena frase, bateu com o interior do cotovelo na sua cintura e lançou o braço para a frente, repetindo e voltando a repetir.
– Mim, cá nega!... Mim, cá nega! Furriel!

Depois de a escutar só me restava uma solução: - Sair daquele local. (…).


Pois este é um exemplo daquilo que sucedia. Todos jovens e ávidos de sexo. Não o faço por acaso. No Livro naturalmente não existem personagens com rosto, os diálogos que passo são resumos de factos que assisti.

Aquilo que descrevo era a realidade. No final de comissão, em Bissau andava com um camarada Furriel Miliciano e vimos duas cabo-verdianas muito bonitas, e decidimos averiguá-las, responderam “que eram mulheres para Oficiais, e não para Furriéis”. Considerámos que não era assim e procurámos encontrá-las, o que veio a suceder. Batemos à porta indicada e vem atender-nos um homem grande e bem grande, a quem elas tratavam de “paizinho”. A sala grande quase sem mobília: um frigorífico no meio da parede do fundo; a cadeira onde se sentou o “paizinho”, a mesa e mais duas cadeiras.

O “paizinho” tratava as lindas moças por “filhinhas”, e nós incrédulos. O “paizinho” vendia e a bom dinheiro as “filhinhas”.  Depois do “paizinho” dar uma cerveja a cada um de nós, resolvemos deixá-los em paz.

Esta é uma entre muitas – até algumas no Pilão – há que não ter receio de contar: “O nudismo em Gadamael Porto” e “Nudismo em Mejo”; As “Meninas do Movimento Nacional Feminino”; “Meninas dos Correios de Bissau”, e que tal o apetite sexual de uma mulher branca por um Furriel Miliciano? São temas.

São algumas bajudas de Ganturé. Tenho mais fotos. Aquilo que relato no livro sobre as “bajudas” é o exemplo que dou e foi escrito em 1996. Não escondo de ninguém. Se como disse “não virei”, sou sempre um potencial candidato a um coração, só que em Ganturé e Gadamael Porto não existiam possibilidades, decerto um ou outro caso surgiu. Em Mejo, Guileje, Sangonhá, Cacoca, Cameconde e Cacine com certeza eram locais onde existiam outras liberdades.

Recordo que em Bissau quando vim de licença, fui com camaradas ao Pilão, e à noite.

E os filhos desses encontros e desencontros:

a) Existe uma criança e o pai desconhece;
b) Existe uma criança e o pai sabe mas não assume;
c) Existe uma criança e a mãe diz ser “x” o pai, mas este nega, por saber que ela andava com outros;
d) Existe uma criança e o pai assume pretender tomar conta dela, mas a mãe não autoriza e
e) Outros

Defendo um mundo de Amor.

Cumprimentos

Mário Vitorino Gaspar

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quinta-feira, 4 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14697: Inquérito online: "Os 'nosso filhos da guerra' deveriam poder ter acesso à nacionalidade portuguesa"... A grande maioria (84%) dos respondentes (num total de 94) está de acordo


Foto de Júlio Tavares (1945-1986), publicado no blogue da sua filha Marisa Tavares, Are  you my brother ? (http://omadragoa.blogspot.com/ ) (*).

 O Júlio Tavares, mais conhecido por "O Madragoa",  foi sold cond auto, CCS / BART 1913 (Catió, 1967/69), a mesma unidade a que pertenceu o nosso saudoso Victor Condeço (1943-2010).

O blogue foi criado em 2010, com o objectivo de encontrar um irmão  guineense, um filho que o seu pai terá tido em Catió, conforme confissão feita por ele na hora da sua morte, em 1986. Qualquer informação sobre o paradeiro do seu meio-irmão guineense (,hoje com 46/47 anos, se  ainda estiver vivo,) pode ser enviada para o email da Marisa Tavares, hoje canadiana,  e de quem também já não temos notícias há muito:  mt_iphone@rogers.com



I. SONDAGEM: OS "NOSSOS FILHOS DA GUERRA" DEVERIAM PODER TER ACESSO À NACIONALIDADE PORTUGUESA


Resultados finais (n=94):


1. Discordo totalmente  (n=1) / 2. Discordo  (n=1)  (2%)

3. Não discordo nem concordo / Não sei  (n=13) (14%)

4. Concordo (n=38) (40%)


5. Concordo totalmente  (n=41) (44%)


A sondagem fechou às 22h do dia 30 de maio p.p.


II. Comentários,  para quê ? 

A grande maioria dos amigos e camaradas da Guiné, leitores deste blogue, estão de acordo quanto á possibilidade de atribuição da nacionalidade portuguesa àqueles/as dos/as filhos/as, concebidos/as durante a guerra colonial (grosso modo, entre 1961 e 1974), filhos de pais, militares portugueses,  e de mães guineenses.

A nossa sondagem parece ser conclusiva: 84% dos respondentes (numa amostra não aleatória de 94 votantes) está de acordo com a proposição, segundo a qual "os 'nossos filhos da guerra' deveriam poder ter acesso à nacionalidade portuguesa", se assim o desejarem ou requererem.

Os também conhecidos como filhos do vento poderão ter hoje entre 40 e 50 anos e, no caso da Guiné-Bissau, não deverão ultrapassar os 500 indivíduos de ambos os sexos, a viver em Portugal e a Guiné-Bissau, segundo estimativas da Conservatória de Registo Civil de Bissau que recebe os pedidos de nacionalidade com base na paternidade portuguesa (Fonte: Catarina Gomes, "Embusca do pai tuga", Público, 14/7/2013).

 A Associação "Fidju di Tuga", com sede em Bissau, que luta pela defesa dos direitos destes homens e mulheres, achava a estimativa conservadora. O mesmo pensam outros observadores (e atores) da realidade guineense como o nosso amigo Cherno Baldé.

A jornalista Catarina Gomes, que é uma profunda conhecedora deste dossiê, recorda a situação, algo similar, dos filhos dos soldados americanos no Vietname:

(...) "A história de guerras em que os combatentes que vão lutar fora do seu país deixam filhos não é uma realidade nova. No século XX, há, por exemplo, casos de alemães que, na Segunda Guerra Mundial, deixaram filhos de francesas que depois foram ostracizadas.

"Nos Estados Unidos, os filhos dos soldados americanos com mulheres vietnamitas até têm nome, chamam-lhes amerasians (fusão das palavras americanos com asiáticos). De tal forma o assunto se tornou público, que estes 'filhos do pó', como eram conhecidos no Vietname - cresceram muitos deles em orfanatos ou tornaram-se sem-abrigo - ganharam direito ao estatuto de imigrante americano de forma automática. Em 1987, o Amerasian Homecoming Act deu-lhes esse direito, sem necessidade de haver provas de paternidade, bastava terem a mínima presença de traços físicos ocidentais. 

"Ao abrigo da lei, emigraram para os Estados Unidos 26 mil filhos e mais 75 mil dos seus familiares.
Um estudo publicado no Journal of Multicultural Counseling and Development sobre este universo concluiu que 76% desejavam conhecer os seus pais, mas só 33% sabiam os seus nomes. Outros 22% tinham tentado estabelecer contacto, mas só 3% tinham tido a oportunidade de conhecer os seus pais biológicos" (...) (Fonte: Catarina Gomes, "Embusca do pai tuga", Público, 14/7/2013).

Pode perguntar-se: amigos e camaradas, o que é que o nosso blogue pode fazer, mais e melhor, por estes "nossos filhos da guerra" ? Para já vai dando visibilidade a um problema que era também, até há alguns anos atrás, mais um dos "esqueletos guardados no armário" da história da guerra colonial.

A Catarina Gomes tem um endereço de email expressamente destinado ao envio de informações julgadas relevantes para "a busca destes filhos de ex-militares portugueses":
filhosdovento@publico.pt.

O seu trabalho de investigação jornalístico já se estendeu entretanto também a Angola. No dia 29 de maio último, ela voltou á Guiné-Bissau, "por sua conta e risco". Ou seja, ele já não é apenas uma jornalista, é uma também  ativista na luta pela defesa dos direitos destes homens e mulheres, "nossos filhos da guerra",  que carregam às costas um passado de humilhação. discriminação e sofrimento. Na realidade, é esperado que os governos de Portugal e da Guiné-Bissau possam fazer algo mais por estas vítimas, colaterais, da guerra.

Apraz-nos registar, por outro lado, que a reportagem Filhos do Vento, de Catarina Gomes (texto), Ricardo Rezende (vídeo) e Manuel Roberto (fotografia), foi distinguida, em 2014, com o Prémio Gazeta na categoria Multimédia, atribuído pelo Clube de Jornalistas.

E, por fim, recorde-se que não são apenas os filhos (guineenses) a procurar o "pai. tuga".. São também os irmãos (portugueses) a procurar os irmãos guineenses... Recorde-se aqui o caso, comovente,  da Marisa Tavares, que vive no Canadá (*). O seu blogue ainda continua ativo; Are you my brother ? [Em português, és meu irmão ?], sinal de que ainda não encontrou o irmão de Catió, que a estar vivo deverá ter 46/47 anos...  O pai, ex-sold cond auto, esteve em Catió e Ganjola, entre 1967/69 (vd. foto acima).

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quarta-feira, 27 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14671: Inquérito online: Os "nossos filhos da guerra" deveriam ter acesso à nacionalidade portuguesa... A maioria dos nossos leitores (4 em cada 5 dos votantes) acha que sim... Resultados preliminares (n=62)


Lisboa > Cinema São Jorge > Festival Rotas & Rituais 2015 > "Filhos do vento" > Exposição fotográfica de Manuel Roberto > "Inês Miriam Henrique é filha de um ex-combatente português de quem conhece apenas o apelido". Foto de Manuel Roberto (cortesia do autor e do jornal Público)

Ver aqui a sua história resumida:

 "Nasceu em 1967, sabe apenas que o pai português trabalhava no Hospital Militar de Bissau. A mãe, Lígia Vaz Martins, teve mais dois filhos de militares portugueses, um deles é José Carlos Martins, o outro rumou a Portugal à procura do pai, mas não teve sucesso e foi para a Alemanha. Miriam vende sacos de carvão à porta da sua casa. Tem oito filhos. Nos seus sonhos, o seu pai aparece-lhe a dizer que a quer conhecer. Ela só sabe o que julga ser o seu apelido". 

(Fonte: cortesia de Catarina Gomes e Manuel Roberto, Público > Os filhos do vento)


I.  Resultados preliminares (n=62) da sondagem em curso no nosso blogue (vd. coluna do lado esquerdo, ao alto):

SONDAGEM: OS "NOSSOS FILHOS DA GUERRA" DEVERIAM PODER TER ACESSO À NACIONALIDADE PORTUGUESA


1. Discordo totalmente  > 1 (1%)


2. Discordo  > 1 (1%)

3. Não discordo nem concordo / Não sei  > 9 (14%)

4. Concorrdo  > 23 (37%)

5. Concordo totalmente  > 28 (45%)


Total de votos  apurados = 62 (até às 13h de hoje)

Faltam 3 dias para fechar a sondagem


II. CAMARADA, NÃO DEIXES QUE SEJAM OS "OUTROS" A MANDAR "BITAITES" SOBRE OS ASSUNTOS QUE TE DIZEM RESPEITO...

Camarada:

Não é fácil falar, com serenidade, objetividade e rigor, deste tema: os "nossos filhos da guerra" (pessoalmente, prefiro esta expressão)...

Estamos a falar de filhos de portugueses que passaram pela antiga província ultramarina (ou colónia) da Guiné, entre 1961 e 1974, em geral no âmbito do cumprimento de uma missão de serviço militar... Haverá, por certo, também filhos de pessoal civil (por exemplo, comerciantes, administradores, missionários, etc.)...

Independemtente do direito à procura e conhecimento do progenitor (pai biológico) e até do reconhecimento da paternidade, há uma questão sobre a qual se começa a fazer um consenso: estes homens e mulheres, hoje na casa dos 40/50 anos, são filhos de portugueses e, como tal, deveriam poder ter "acesso à nacionalidade portuguesa"...

Se há um reparação (material e/ou simbólica) que, na maior parte dos casos, ainda se pode fazer ao fim destes 40/50 anos, é o reconhecimento pelo Estado português da origem portuguesa destes "nossos filhos da guerra"... Como isso se faz, é já um problema técnico, jurídico e político, que nos ultrapassa...(Esperemos que a embaixada portuguesa na Guiné-Bissau possa fazer qualquer coisa neste sentido.)

De qualquer modo, como simples membro (entre 700) desta Tabanca Grande, também defendo que "mais do que apontar o dedo, é preciso estender a mão para a ajudar"... A exposição fotográfico do Manuel Roberto, no "foyer" do cinema São Jorge, em Lisboa, no âmbito do Festival Rotas & Rituais 2015 (dedicado aos 40 anos da descolonização portuguesa)  interpela-nos a todos, sendo no mínimo "obrigatório" ir vê-la por estes dias... (É só tomar o metro e sair na estação da Avenida.)

 Camarada, sobre este tema (como sobre muitos outros temas que temos aqui abordado)  é importante que dês a tua opinião, sincera, qualificada, serena, sem preconceitos...  E a questão desta vez é simples, é a da possibilidade (legal) de atribuição da nacionalidade portuguesa àqueles dos "nossos filhos da guerra" que eventualmente ainda a (re)queiram... No caso da Guiné-Bissau, não sabemos ao certo quantos são os elegíveis, podem ser umas (escassas) centenas. Infelizmente nunca foi feito nenhum recenseamento destes filhos de portugueses, nascidos entre 1961 e 1975 (*).

Podemos tomar como exemplo os norte-americanos em relação aos seus "mestiços vietnamitas" (e também aprender com os sucessos e insucessos deste processo levado a cabo pelos EUA em relação aos "filhos do pó", deixados pelos seus soldados no Vietname)... 

Este assunto, os "nossos filhos da guerra", nunca sequer chegou ao parlamento português, tanto quanto sabemos... Ora precisamos sensibilizar os nossos deputados que fizeram a guerra colonial... Ainda há alguns, felizmente,  que não têm vergonha de dar a cara, isto é, de pôr no currículo a sua participação na guerra colonial... Temos pelo menos um,  na nossa Tabanca Grande, o Arménio Santos, do grupo parlamentar do PSD, nascido em 1945, sindicalista, aluno do prof Jorge Cabral na Lusófona (**)... Esteve no TO da Guiné como  fur mil reec Inf (Aldeia Formosa, 1968/70). (*)

Por sua vez, Jerónimo de Sousa, deputado e secretário geral do PCP, ainda recentemente, em entrevista ao jornal on line "Observador", de 22/5/2015,  fez referência ao seu passado militar, no TO da Guiné 1969/71. No seu breve CV, no sítio do PCP, diz apenas que "entre 1969 e 1971 cumpriu serviço militar no Regimento de Lanceiros 2 e na Guiné". Como já aqui o temos referido, no nosso blogue, ele foi 1ºcabo PM (polícia militar), da CPM 2537, que participou para a Guiné no T/T Niassa em 24/5/1969.

São seguramente dois homens (e camaradas) com sensibilidade política e social para este problema dos "nossos filhos da guerra".

Mais uma vez queremos chamar a atenção para o facto de esta "sondagem" ter uma finalidade apenas didática e pedagógica: qualquer que seja o seu resultado final, não dá aos editores do blogue qualquer legitimidade (a não ser moral) para falar em nome dos ex-combatentes da guerra colonial na Guiné: este tipo de sondagem (ou inquérito de opinião "on line") é apenas uma forma de auscultar e revelar sensibilidades e opiniões dos amigos e camaradas da Guiné que se reunem à volta do simbólico poilão da Tabanca Grande...Ótimo, se ela puder contribuir para algo mais... e nomeadamente ser útil à causa da associação Fidju di Tuga e dos que, em Angola, Guiné e Moçambique,os 3 teatros de operações da guerra colonial, por onde passaram mais de um milhão de militares,  querem dar uma ajuda concreta a estes homens e mulheres que, muitos deles, apenas querem ver reconhecida a sua ligação (biológica e sentimental) a Portugal.

Camarada, se ainda não votaste ou se queres mudar o teu voto, restam-te 3 (dias) para o fazer... 

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Notas do editor:

Guiné 63/74 - P14670: Filhos do vento (35): "Não nego a existência de 'filhos da guerra', mas defenderei sempre a dignidade dos combatentes portugueses" (Jorge Cabral) / "Sempre considerei e tratei os/as guineenses como sendo tão portugueses/as como eu" (João Martins) / "Sou claramente pela concessão da nacionalidade, o Estado que assuma as suas obrigações" (José Manuel Matos Dinis)

1. Comentário de Jorge Cabral (*) [, foto à esquerda, alguns anos atrás: ao lado da sua aluna da licenciatura de serviço social,  Beni Barbosa Ferreira, guineense, nascida em Bissau em 1980; jurista, especialista em direito penal, professor universitário reformado da Universidade Lusófona]:


Defenderei até à morte a honra e a dignidade dos Combatentes Portugueses na Guiné. Filhos de Portugueses e de Mulheres Guineenses,claro que existiram. Seria interessante averiguar quanto filhos de pai incógnito,nasceram no mesmo período em Portugal.

Concordo que os todos os Filhos sem nome de Pai devem ter o direito de conhecer a identidade do respectivo Progenitor. Claro que ser Progenitor e ser Pai constituem realidades diferentes. 

Abraço! Jorge Cabral


2. Comentário do João Martins (*) [, foto à direita, em 1978, em 

São Martinho do Porto; ex-alf mil art, do BAC 1 (Bissum, Piche, Bedanda e Guileje, 1967/70)]


Amigo e camarada Luís Graça:

Bem sei que não é políticamente correto, mas, como não sou mentiroso e sempre defendi a verdade, embora, durante a minha vida tenha mentido, mas espero que tenham sido mentiras sem consequências de maior, não posso deixar de pensar que estivemos na Província Ultramarina da Guiné, território tão português como o Algarve, a Madeira, os Açores, e muitos outros territórios ultramarinos, pelo que, considero, os seus naturais e seus descendentes tão portugueses como eu, e é dessa maneira que os trato quando os tenho pela frente.

Lamento é que, com a tal descolonização, tenhamos ficado, e refiro-me à grande maioria, mais pobres, mais endividados, e mais "colonizados" pelos grandes interesses internacionais contra os quais combatíamos e continuamos a combater e que nos derrotaram. 

Face a esta perda de direitos e de poder de compra que nos afeta, considero que a "solidariedade" não deve ser um sentimento para "meter na gaveta", e devemos assumir as nossas responsabilidades para com todos estes nossos concidadãos com um passado histórico comum, devendo votar em partidos que os defendam, se é que existem..., e muito particularmente, que defendam esses nossos descendentes a que te referes, que têm sangue bem lusitano correndo em suas veias.

Grande abraço de alguém que teve a sorte de conhecer a Guiné como poucos... e apaixonar-se por aquelas gentes, francas, sinceras, gentis e amigas...

João Martins

PS - Lutemos por um espaço lusófono de entreajuda entre povos com origens diferentes mas que se expressam na mesma língua e acabam por ter a possibilidade de uma comunicação, de um diálogo, de uma sintonia, que nos afasta de outros povos com passados históricos e experiências bem diferentes.
Haverá no caminho muitos espinhos, mas a beleza e o perfume das rosas sairão vitoriosos, e o bom senso virá ao de cima e apagará todos os mal-entendidos.


3. Comentário de José Manuel Matos Diniz (*) [ex-fur mil, CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), "amanuense da Magnífica Tabanca da Linha, em efectividade de serviço"; ex-quadro técnico da Diamang, Angola, 1972/74; membro de longa data da Tabanca Grande, mãe de todas as tabancas]


Camaradas,

A questão é muito delicada e, presumo, deve ser tratada sem que se criem falsas expectativas e graves perturbações.

Na presunção de que ainda haverá muitos combatentes vivos com descendência na Guiné, também não me parece razoável que se façam denúncias de casos supostamente conhecidos. Passados 40 a 50 anos, só os filhos nunca se sentiram com vida estruturada, mas colocá-los perante a amargura de não serem reconhecidos, será o maior trauma que pode vitimar um ser humano.

O Blogue, e outras pessoas de boa intenção, já deram indicações de filhos do vento", às vezes com identificação dos pais. Assim, aqueles que tomaram conhecimento e sentiram necessidade de se apaziguarem, já terão dado os passos necessários com vista ao reencontro.

Quanto à questão da nacionalidade, já é outra coisa, muito mais fácil de decidir, quanto a mim, mas muito mais dificil quanto ao Estado. Sou também da opinião que devia ser concedida a nacionalidade a todos os que comprovadamente a solicitassem. 

Diz o João José que são todos filhos de Portugal. Alguém tem dúvidas? Só que estão tão deslocados do "jardim", e dependentes de raízes que entretanto desenvolveram, que na ausência dos pais, pouco proveito poderão receber.

Mas sou claramente pela concessão da nacionalidade. O Estado deve assumir as suas obrigações. (**)

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Notas  do editor:

(*) Último poste da série > 25 de maio de  2015 > Guiné 63774 - P14659: Filhos do vento (32): Festival Rotas e Rituais, 2015: 22 de maio > Conferência "Filhos da Guerra": apontar o dedo ou dar a mão para ajudar ? (Hélder Sousa / João Sacôto)

(**) Último poste da série > 27 de maio de  2015 > Guiné 63/74 - P14667: Filhos do vento (34): Festival Rotas e Rituais, 2015: 22 de maio > Conferência "Filhos da Guerra": vídeo com a intervenção da jornalista Catarina Gomes