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quarta-feira, 10 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5966: Ser solidário (61): Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, 6 de Fevereiro de 2010 (Luís Graça)

1. A propósito da prática, actual e no passado, da  Mutilação Genital Feminina (MGF), na Guiné-Bissau (*)



O dia  6 de Fevereiro passa  a ser consagrado como o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina (MGF).  A prática da MGF existe ainda em cerca de 28 países Africanos  e do Médio Oriente, mas também na Ásia e em comunidades emigrantes na Europa, América do Norte e Austrália.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),  estima-se em cerca de 130 a 140 milhões o número de mulheres, de todas as idades,  submetidas à MGF. Todos os anos há cerca de dois a três milhões de novos casos, ou seja, de crianças e adolescentes em risco de vir a sofrer desta prática milenar, profundamente misógina, intolerável, violadora dos direitos humanos, profundamente lesiva da saúde física, sexual, reprodutiva, mental e psicossocial da mulher,  inaceitável mesmo à luz do tradicional conceito do relativismo cultural.

Na Guiné-Bissau, estima-se que a prevalência de MFG nas meninas e mulheres, entre os 15 e os 49 anos de idade seja da ordem dos 45% (Vd. a brochura, em formato.pdf, Eliminação da Mutilação Genital Femina: Declaração Conjunta (...), 2009, 45 pp).

De acordo com a OMS (2000), citada pela página do Alto Comissariado da Saúde (ACS), "Portugal é um país de risco, tendo por base a assumpção de que as comunidades migrantes provenientes de países onde a MGF é praticada, o continuam a fazer, quer no país residente, quer deslocando-se ao país de origem".

E acrescenta o sítio do ACS:

Neste contexto, o I Programa de Acção para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina, inserido no III Plano Nacional – Cidadania e Igualdade de Género (2007-2010), coordenado pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, tem como objectivo reforçar a coerência das acções desenvolvidas e das políticas para a igualdade de género.


No âmbito do Programa, foi produzido um folheto informativo sobre MGF, que aborda, entre outros temas, os riscos imediatos e a longo prazo para a saúde, as consequências médico-legais e os serviços e instituições que podem responder e encaminhar pedidos de apoio médico e psicossocial.


O folheto destina-se em particular a mulheres e famílias que se encontrem em risco, ou que já tenham sido sujeitas às práticas de MGF, mas também à população em geral.

O folheto, em formato.pdf, pode ser aqui consultado: Mutilação Genital Feminina.

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 9 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5962: Antropologia (17): A Condição da Mulher em Cacine, em 1972 (Juvenal Candeias)

(**) Vd. mais postes sobre a MGF publicados no nosso blogue

Vd. também uma pequena apresentação, em português, no You Tube,  sobre a Mutilação Genital Feminina, nomeadamente no Quénia, em África, país onde a ADDHU (Associação de Defesa dos Direitos Humanos) luta directamente contra a MGF.

Vd. também, em inglês, no You Tube, o vídeo Female Genital Mutilation: "This video was created in hopes of educating people about FGM's and why they are performed. This video is solely for educational purposes".

terça-feira, 9 de março de 2010

Guiné 63/74 - P5962: Antropologia (17): A Condição da Mulher em Cacine, em 1972 (Juvenal Candeias)

Guiné > Região de Tombali > Cacine > Binta, a bajuda contestatária, recusou  o casamento forçado com um homem grande




Guine > Região de Tombali > Cacine > "Hospital Central de Cacine”: todas as especialidades (incluindo partos)

Foto: © Juvenal Candeias (2010). Direitos reservados.


1. Mensagem, com data de ontem, do Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Estrelas do Sul (Cacine, Cameconde, Guileje, 1971/74):

 Assunto: A Condição da Mulher em Cacine, em 1972


 Camaradas,


Não quero deixar passar o Dia [Internacional] da Mulher sem vos enviar este texto, singela homenagem  à Mulher Nalú, que muito admirei, pela sua força, coragem e importância na comunidade.


Tomara que essa força e coragem tenha entretanto sido devidamente orientada!... Penso que ao texto deveria antes chamar Elementos para o Estudo da Condição [da Mulher]... deixando para os sociólogos - parece que há um aí bem perto - o verdadeiro estudo da Condição  da Mulher em Cacine.


Como diria Filinto Barros, este texto não é "nem sociologia, nem história, nem política, é tão-somente um conjunto de memórias com 38 anos.


Um forte abraço a todos.


Juvenal Candeias


PS. À atenção do Luís Graça: observa a fotografia da enfermaria de Cacine. Do lado direito podes ver como era o bunker cujas ruínas fotografaste há relativamente pouco tempo.


2. A CONDIÇÃO DA MULHER EM CACINE, EM 1972
por Juvenal Candeias


Em Cacine predominava a etnia Nalú, tradicionalmente animista, convertida ao Islamismo por influência dos Sossos, etnia minoritária, mas culturalmente mais evoluída

A islamização dos Nalús transformou completamente a sua cultura, afectando de modo significativo a condição social da mulher. O casamento poligâmico forçado, o trabalho feminino e o fanadu (mutilação genital da mulher) surgiram como novas realidades ou revestiram aspectos totalmente distintos.

- O CASAMENTO

O casamento, que tradicionalmente era feito por troca, passou a ser feito por compensação (pecuniária e/ou em géneros).

Quando as jovens tinham 12 ou 13 anos, apresentavam-lhes um homem dizendo-lhes que era o seu marido. Não havia relações sexuais prévias, não havia namoro, não havia nada que permitisse à mulher conhecer o marido, muito menos decidir se com ele queria viver!

A negociação das bajudas (mulheres jovens) era feita no momento, por proposta efectuada pela família do pretendente à família da jovem, mas o comprometimento de bajudas ainda na infância, também era vulgar. Neste caso, o noivo passava desde então a ajudar a família da noiva, até que esta, alguns anos mais tarde, lhe fosse entregue.

O número de mulheres de cada homem dependia da sua capacidade financeira e determinava mesmo o seu estatuto social na comunidade.  Não eram raros os homens grandes (velhos) com 3 ou 4 mulheres, algumas bastante mais jovens. É que, para além do eventual interesse sexual, as mulheres significavam também mão-de-obra barata.

O casamento imposto, verdadeira violência psicológica exercida sobre as mulheres, raramente tinha contestação, por um lado, porque se efectuava logo a partir dos 12 anos, quando a mulher tinha pouca possibilidade de se opor, por outro lado, devido à pressão social que a própria comunidade exercia sobre as eventuais contestatárias.

Contudo, esporadicamente ocorriam alguns casos, como o de uma bajuda, residente na Tabanca Nova – reordenamento estrategicamente colocado junto à picada, a meio caminho entre Cacine e Cameconde – que perante o iminente casamento negociado pela família com um homem grande, mais interessada num jovem, recusou, acabando por fugir para o mato, onde andou sozinha cerca de uma semana.

De nada lhe serviu! Encontrada e repreendida, o castigo terá sido severo, uma vez que durante bastante tempo ninguém viu a Binta!

O ambiente familiar, com várias esposas de um mesmo homem que entre si se designavam por cumbossas, era, naturalmente, de grande rivalidade, salvo quando a diferença etária entre as cumbossas era significativa, situação em que as mais velhas, a troco de trabalho, podiam mesmo dar alguma protecção às mais jovens.


Apesar de toda esta envolvência, as crianças eram tratadas como filhos por todas as cumbossas, independentemente de quem fosse a verdadeira mãe. Era uma original, mas real situação de crianças com várias mães!

No âmbito do casamento também a herança era um fenómeno original e penalizador da condição da mulher. A viúva não tinha direito a herdar os bens do marido. Os mesmos eram herdados pelos irmãos, fazendo a mulher, ela própria, parte da herança do falecido marido.

Para além de perder o marido e os bens, via-se na contingência de integrar uma nova família a quem era obrigada a servir e ainda a manter relações sexuais com um novo homem que, naturalmente, também não escolhera!

A extrema submissão a que as mulheres estavam sujeitas levava a que questionar uma mulher,  sobre as diferentes situações de violência no seio do casamento, era obter, invariavelmente, a resposta, por estas ou por semelhantes palavras: “sempre foi assim…”, “é Deus que quer…”

- O TRABALHO DA MULHER

O casamento a que nos referimos, determinava que a mulher via a sua posição degradada, fora convertida em servidora, verdadeira escrava da luxúria do homem, que a transformara em simples instrumento de produção e reprodução.

Esta situação acabava por influenciar, ironicamente, a posição preponderante que a mulher desempenhava no seio da família e a importância da sua acção na comunidade. De facto, à mulher estava atribuída a responsabilidade da alimentação, vestuário, manutenção da casa e educação dos filhos, áreas em que os homens não tinham a mínima interferência.

A família não se sustentava só com o que comprava com os parcos rendimentos obtidos pelos homens mas, sobretudo, com o que resultava de a mulher transformar muitas horas de trabalho.

Algum destaque deverá ainda ser dado à educação dos filhos. Era garantida em exclusivo pelas mulheres que, contraditoriamente, acabavam por ser as transmissoras de comportamentos e valores enraizados, ligados a um processo de socialização de que elas próprias eram as principais vítimas.

As crianças do sexo feminino eram preparadas pelas mães para o processo de submissão à vontade do homem e da comunidade e as do sexo masculino para perpetuarem o domínio dos homens.

O analfabetismo era outro problema grave. Atingia valores extremamente elevados nos homens e era total nas mulheres.

O Furriel Miliciano Lopo mantinha uma escola primária a funcionar diariamente, onde nunca conseguiu ter um aluno do sexo feminino!

Estas horas de trabalho invisível desenvolvido pelas mulheres eram fundamentais para garantir a economia doméstica e a evolução da comunidade e da cultura da própria etnia. Para os homens, contudo, este trabalho pouco contava, estava praticamente oculto atrás da fachada da família poligâmica, permanecendo invisível, porque não se traduzia em produtos visíveis.

Muitas horas de rude desgaste diluíam-se magicamente, permanecendo na clandestinidade a forte contribuição da mulher Nalú para a comunidade.

À mulher competia ainda outro trabalho, um pouco mais visível… Apanhar ostras e proceder à sua venda - a cotação da bacia de ostras era de 10 pesos – apanhar mangos, cultivar mandioca e mancarra, semear arroz… enfim, pouco restava para os homens fazerem, para além das rezas e do descanso tranquilo nas suas cadeiras de encosto!

Sempre que a tropa passava pela tabanca em deslocações de trabalho ou de patrulhamento, o cumprimento era um paradigma:
- Eh pessoal! Manga de trabalho!

A resposta, indolente, vinha lá bem do fundo da cadeira:
- Manga deeeele!

- O FANADO

O fanado, ou mutilação genital feminina, dizia-se ser um processo mais amplo, que podia descrever-se como uma cerimónia ou ritual de iniciação que preparava as jovens para a vida adulta, para a sua responsabilidade na comunidade e para a habilidade de continuar a cultura da própria etnia.

O fanado tinha na mutilação genital feminina a sua face mais negra. Ocorria na época das chuvas, altura em que as mulheres padidas (que tinham sido mães recentemente) se ocupavam da construção das barracas do fanadu, integralmente em material vegetal e longe da tabanca.

Tudo o que se relacionava com o fanadu não tinha intervenção do homem, que estava até impedido de se aproximar do local da cerimónia.

Eram as mulheres padidas que “montavam segurança” nas imediações do local e um cusco da nossa Companhia teve mesmo direito a perseguição e caça, no meio de tremenda algazarra, salvando-se apenas com a entrada no aquartelamento, após longa corrida.

Construídas as barracas, apenas as meninas que iam ser sujeitas ao fanadu (com cerca de 10 anos), as fanatecas e algumas mulheres grandes, lá entravam!

O que acontecia no interior das barracas, durante semanas, ninguém sabia com absoluta certeza.

O fanado era um ritual secreto do qual apenas se conhecia a mutilação genital e a transmissão, pelas mulheres grandes, dos valores atrás referidos.

Constava, contudo, que a mutilação era efectuada pela fanateca, que dispunha de uma faca própria para o efeito, que os cortes eram efectuados a frio, sem sombra de anestesia, sucessivamente a todas as bajudas, sem condições sanitárias, sem sequer a faca ser esterilizada após cada utilização.

Esta intervenção provocava problemas imediatos de hemorragias e infecções de que se desconhecia a exacta dimensão, uma vez que, devido ao carácter secreto da cerimónia, o facto não era muito comentado e nenhuma jovem podia recorrer a apoio médico.

As consequências nefastas do fanado projectavam-se sobre o futuro das bajudas e agravavam-se com maternidades precoces. Hemorragias e outros problemas no momento do parto eram comuns e levavam as mulheres a recorrer às enfermarias militar e civil, aqui já sem grandes inibições.

Em casos extremos, mas não raros, verificava-se mesmo a incapacidade para ter filhos.

Apesar de todos estes problemas, a mulher Nalú nem um gemido largava ao parir e levantava-se imediatamente a seguir ao parto, para efectuar a limpeza total do local.  Era uma questão cultural, de honra e prestígio.

O fanado era, portanto, uma cerimónia absolutamente generalizada. Não passar pelo fanado era algo de inconcebível, determinando a exclusão social, a discriminação, a recusa de casamento e de tarefas no seio da família, dado que a jovem não tinha sido purificada. Se as bajudas não fossem ao fanado,  as suas preces não seriam ouvidas, por mais que se lavassem nunca ficariam limpas…

Consequentemente, e em casos extremos, as próprias mães chegavam a fazer o fanado às filhas!

De resto o fanado era uma festa que se prolongava por várias semanas, em que o principal programa era comer, beber (apesar da islamização) e dançar!

Juvenal Candeias

Março 2010

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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

18 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5295: Histórias de Juvenal Candeias (6): Padaria de luxo em Cacine

16 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5113: Histórias de Juvenal Candeias (5): Vicente, o Piu

16 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitáfine

1 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4623: Histórias de Juvenal Candeias (3): Um Manjaco em chão Nalú

12 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4323: Histórias de Juvenal Candeias (2): Incêndio no Rio Cacine

7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4299: Histórias de Juvenal Candeias (1): Pirofobia ou a mina que não rebentou por simpatia

6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4294: Tabanca Grande (136): Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cameconde (1972/74)

(...) Era Alferes Miliciano, Atirador, com recruta e especialidade em Mafra a que se seguiu Tavira durante 3 meses!



Mobilizado para a Guiné, fui formar Companhia no BII 19, no Funchal, donde saí com a Companhia de Caçadores 3520 para Bissau, onde cheguei ao fim da tarde de 24 de Dezembro de 1971 (que rica noite de Natal, no Cumeré!!!)


Após a IAO no Cumeré, fomos parar a Cacine (mais o destacamento de Cameconde), onde permanecemos até final de Outubro de 1973! (...)

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5603: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (10): Recolha de fundos para ajudar a reconstrução (Manuel Reis / Luís Graça)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (Guileje, Junho de 1967/Maio de 1968) > Guileje, terra de fé e de coragem... A capelinha construída no tempo do Zé Neto (2º Srgt) e do António Cunha (1º Cabo Radiotelegrafista)... Uma lápida recordava a efeméride:

"A Ti, Deus Único e Senhor,

Te Oferecemos
As Últimas Gotas de Suor,
Que nos Sobraram
da Luta da Tua Palavra Eterna,
Soldados da CART1613.”


 Foto: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento. (2007). Direitos reservados



 Guiné-Bissau > Região de Tombali  >  Guileje > 2005 > Lápide encontrada sob os escombros do antigo aquartelamento, e que pertencia à capelinha. Sobre este famosa lápide disse-nos o saudoso Zé Neto, Cap Ref  (1929-2007):

"A placa da Capela foi feita em cimento forte e não em cobre. A dedicatória é minha e a inscrição em baixo-relevo foi obra do Furriel Miliciano de Transmissões Maurício Mota de Almeida, natural de Fornos de Algodres, mas radicado há muito nos EUA. Este moço veio de propósito a Portugal para estar presente no Almoço/Convívio da CART 1613 que teve lugar em Braga no passado dia 3 de Junho [de 2005]. Aliás é com muito orgulho que acrescento que dos meus 14 'excepcionais Furriéis' compareceram 12 (um falececeu há pouco), portanto só faltou um".

Em 14 de Dezembro de 2005, escrevi o seguinte na I Série do blogue:

O Pepito diz-me que, se tudo correr bem, estamos todos convidados para ir inauguar o seu projecto de ecoturismo e de museologia daqui a um ano. E se lá formos, todos ou alguns de nós, iremos certamente prestar uma homenagem a todos os combatentes, de um lado e de outro, que em Guileje foram um exemplo de fé e de coragem: fé e confiança nos valores por que lutavam; coragem e valor nas acções em que estiveram empenhados...

Convenhamos que o Pepito foi demasiado optimista. O núcleo museológico de Guileje vai ser inaugurado, em cerimónia oficial, no dia 20 de Janeiro de 2010, quatro anos depois. Pelo meio, realizou-se o Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 de Março de 2008), notável realização de que ainda hoje se fala em Bissau e Cantanhez. O papel no nosso blogue, na preservação, reabilitação e divulgação da memória de Guileje,  acaba de ser reconhecido, formalmente, pela ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, através de diploma, devidamente assinado pela sua presidente, a Sra. Isabel Miranda, e que acaba de nos ser enviado. Esse documentro será aqui oportunamente reproduzido. É um gesto de gratidão e de apreço dos nossos amigos da Guiné-Bissau que  muito nos sensibiliza a todos nós, membros deste blogue, em geral, e aos nossos autores e  editores, em particular.

Muito em especial, quero aqui lembrar o nome do Nuno Rubim, cujo diorama de Guileje é uma peça museológica notável. O Nuno, por razões da sua vida de incansável investigador (mas também de saúde), tem andado arredado das nossas lides bloguísticas. De tempos a tempos telefono-lhe. Para ele e para a Júlia, o meu carinho muito especial. Quero também aqui referir a colaboração que temos dado à Fundação Mário Soares, outro importante parceiro da AD neste projecto.

Foto: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2005) Direitos reservados


1. Mensagem do Manuel Augusto Reis,  ex-Alf Mil da CCAV 8350, (Guileje, 1972/73) (*)

Caro Luís: Para responder à solicitação da equipa que procede à reconstrução da Capelinha de Guileje, envio o NIB da minha conta bancária, onde os camaradas interessados em colaborar na Reconstrução possam depositar a quantia, que bem entenderem.

Lembro que esta obra é um registo da passagem, de todos nós, por terras da Guiné e, como tal, deve ser acarinhada. É esse, aliás, o sentir da população.

Todos os donativos serão posteriormente publicados no Blogue.

Dada a aproximação da data de inauguração (20 de Janeiro), solicito aos camaradas que queiram colaborar que o façam até ao dia 15 de Janeiro.

Pagamento por multibanco:

NIB: 003503720000835570006

Pagamento por transferência Bancária:

Conta nº: 0372008355700 da Caixa Geral de Depósitos de Ílhavo,
em nome de Manuel Augusto Ferreira  Reis

Um abraço para todos.

Manuel Reis

2. Comentário de L.G.:

O Manuel Reis foi o primeiro - e o único do Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (**) -  que respondeu, de pronto, ao meu pedido de abertura de uma conta bancária para recolha de fundos. Passadas as festas natalícias foi tratar do assunto, na Caixa Geral de Depósitos,  na agência de Ílhavo, onde vive (segundo creio, e não em Aveiro, como erradamente indiquei em postes anteriores). 

O Reis foi alertado, na agência,  para duas coisas: (i) o  inconveniente de ser o único titular de uma conta que se destina à recolha de fundos; (ii) a vantagem de haver dois ou mais titulares que, para além do mais, poderiam ser os primeiros depositantes: o montante mínimo, para a abertura deste tipo de conta, são 150€.

Pelo facto de estar geograficamente isolado (da generalidade dos amigos e camaradas do nosso blogue), acabou por recorrer, como solução imediata e prática, à sua conta bancária. O dinheiro recolhido será canalizado oportunamente para a ONG, com sede em Bissau, AD - Acção para o Desenvolvimento, de que é co-fundador e director executivo o Eng Agr  Carlos Schwarz Silva (Pepito), membro da nossa Tabanca Grande desde finais de 2005.

Agradeço ao Manuel Reis a sua disponibilidade, solidariedade e generosidade, ao quebrar um  dos princípios-tabu com que fomos formatados pela cultura castrense: na tropa, voluntário só para comer... 

Aproveito para relembrar, aos mais novos, aos periquitos da Tabanca Grande, a história e o significado da capela de Guileje, erigida no tempo da CART 1613 (do Cap Art Corvalho e do 2º Srgt Zé Neto, 1967/68) (***)... Infelizmente, o Zé Neto (com o posto de Cap Ref) foi o primeiro a deixar-nos... A morte levou-o aos 78 anos... Morreu em 2007. Tinha nascido, em Leiria,  em 1927.

Em homenagem a este nosso querido camarada, a AD - Acção para o Desenvolvimento convidou a viúva, Júlia Neto, a estar presente na cerimónia oficial da inauguração, a 20 do corrente, do Museu de Guileje (incluindo a Capela, que será consagrada e aberta ao culto).  Já falei com ela ao telefone, está muito orgulhosa pelo convite e aceitou representar-nos, a todos nós, blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné.... Parte para Bissau no dia 17...

Eu, infelizmente,  por razões de agenda, não poderei estar. Mas, quem sabe, talvez para o ano possamos - uma luzidia delegação do nosso blogue- revisitar a Guiné-Bissau, em viagem (colectiva) de turismo de saudade... É uma ideia que já está no ar e que ficará a amadurecer... A concretizar-se, alguns de nós concerteza irão querer rezar à capelinha de Guileje.

A Júlia Neto., por sua vez, confidenciou-me que gostava de lá voltar com as suas filhas. O Zé Neto foi cremado, por sua vontade expressa. As filhas entendem que as suas cinzas deveriam ser espalhadas em Guileje, a terra da sua paixão, a par de M;acau, onde serviu 10 anos. A viúva disse-me que ainda não está preparada, psicologicamente,  para cumprir esse desejo. Vai conhecer Guileje. Para ver as condições locais. Esteve com o marido em Macau, mas não na Guíné. Tomará uma decisão no regresso da visita a Guileje. Achei magnífico e nobre este gesto da família do nosso querido e saudoso Zé Neto.

Os amigos e camaradas da Guiné que quiserem contribuir para esta recolha de fundos,  passarão a figurar na lista do Grupo dos Amigos da Capela de Guileje, que por sua vez será publicitada no nosso blogue. (LG)
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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

12 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4175: Os Bu... rakos em que vivemos (5): Guileje bem se podia considerar um hotel de 5***** (Manuel Reis)

15 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4035: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (8): Amigo Paiva, confirmas que fomos vítimas de ameaças e pressões (Manuel Reis)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3788: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (1): Depoimento de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3789: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (2): Esclarecimento adicional de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

(*) Vd. último e primeiro poste da série:

30 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5567: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (9): Reconstrução, quase pronta, da capelinha de Guileje, terra de fé e de coragem, nas palavras do saudoso Zé Neto (CART 1613, 1967/68)

6 de Junho de 2009 > Guiné 64/74 - P4469: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (1): Já temos três: Patrício Ribeiro, António Cunha e Manuel Reis

(...) Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCAV 8350, Guileje, 1972/73, professor, Aveiro, membro da nossa Tabanca Grande)



Amigo Luís: É com muito agrado que me disponibilizo para ajudar em tudo o que respeita a Guileje. Aceito fazer parte do 'Grupo dos Amigos da Capela de Guileje' com muito prazer e colaborar no que puder para a melhoria do local. Como em breve teremos uma Biblioteca/ Museu, eu tenho imensos livros de Matemática (7º ao 12º Anos) e posso oferecê-los, caso vejam neles alguma utilidade. De Portugês também posso arranjar, basta para isso mobilizar a minha mulher.


Um abraço. Manuel Reis



(*** ) Vd. poste de 3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado

(...) Uma das boas características do meu pessoal era a de que não gostavam de estar parados nos intervalos das operações. Cada um, nas suas profissões ou aptidões, ia bulindo e foi assim que se reconstruíram e melhoraram abrigos, se implantou uma horta que aproveitava a água, depois de decantada, dos chuveiros das praças e se construiu a obra mais emblemática que deixámos em Guileje: a Capela.


Por sugestão do capelão, Padre João Batista Alves de Magalhães, que apenas pediu um coberto para oficiar a missa quando ia a Guileje, pois dava a volta a toda a área da responsabilidade do batalhão, os Furriéis Maurício (Transmissões) e Arclides Mateus (Atirador), ambos com conhecimentos de desenho de construção civil, planearam e dirigiram a construção do pequeno templo.

Vinte ou trinta anos depois muito se falou em ecumenismo e outras ideias do mesmo sentido, mas nas profundezas da Guiné isso já se praticava.

Na pequena festa de inauguração da Capela e a convite do Capitão Corvacho, o Régulo Suleimane compareceu com toda a sua família e vestido a rigor, embora fosse muçulmano.


As portas da Capela nunca se fecharam. Os europeus iam lá fazer as suas orações e nunca constou que alguém tivesse mexido fosse no que fosse.

Do mesmo modo, quando da celebração do fim do Ramadão, com rituais próprios, mas completamente desconhecidos para a quase totalidade dos rapazes, estes comportaram-se com respeito, a que não faltou uma ponta de curiosidade, é certo.

Saliento o facto ocorrido durante a festa do fanado em que as meninas foram preparadas para a, para nós bárbara, ablação de parte dos seus órgãos genitais.



Atraídos pela música, os militares metropolitanos acercaram-se do local onde decorria o ritual – as meninas postadas à volta do enorme almofariz enquanto as mulheres, com o pilão, moíam cereais cuja farinha se derramava sobre as cabeças das ainda crianças – e sem quaisquer constrangimentos dançaram e cantaram como se fossem parte da cerimónia.


Houve nesta festa uma excepção que me apraz referir: Eu fui o único fotógrafo autorizado a registar as cenas preliminares. Na palhota onde se procedeu à cirurgia [, MGF - Mutilação Genital Feminina,] (****) nem pensar.

Tal deferência nada tinha a ver com o meu cargo ou posição na companhia, mas sim porque quando o correio me trazia os slides revelados, eu montava o cenário e mostrava à população as suas caras e os seus lugares que provocavam grandes ovações e expressões de alegria dos visados. Era o que chamavam de cenima do nosso sargenti [aqui, no foto à direita].

Fotos: © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2005) Direitos reservados

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3208: Pensamento do dia (16): E não se pode exterminá-la ?... A epidemia de cólera em Bissau (Sofia Branco, "Público")

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Barro > Abril de 2006 > As crianças são sempre as principais vítimas de doenças transmissíveis como a coléra que corre o risco de se tornar endémica na Guiné-Bissau e em especial na cidade de Bissau onde, em muitas zonas residenciais, faltam alguns dos principais requisitos de saúde: água potável, electricidade, saneamento básico, recolha do lixo, desinfectantes como o cloro, higiene pessoal e ambiental, cuidados médicos, etc. Guiné-Bissau > Região de Bafátá > Mansambo > Fonte de Mansambo > Abril de 2006 > Água corrente, potável, e sabão: a saúde começa aqui ou por aqui... Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Mansambo > Fonte de Mansambo > Abril de 2006 > Lavadeiras... Fotos: © Hugo Costa / Albano Costa (2006). Direitos reservados 1. Chama-se atenção para a publicação, na edição de ontem do jornal Público, de uma notável crónica de Sofia Branco, com fotos de Daniel Rocha, sobre a actual epidemia de cólera em Bissau: A doença das mãos sujas continua a matar todos os anos na Guiné-Bissau, Público, P2, 14.09.2008, Sofia Branco (texto) e Daniel Rocha (fotos), em Bissau. Eis aqui, com a devida vénia e o nosso apreço pelo trabalho da jornalista do Público, alguns excertos, devendo esta longa citação (*) ser entendida como sugestão para uma leitura integral da peça jornalistística e como manifestação da nossa preocupação e solidariedade em relação a mais esta crise sanitária que afecta os nossos amigos da Guiné-Bissau. (A Sofia Branco tem-se destacado, nos últimos anos, como jornalista, competente, corajosa, lúcida e empenhada, na investigação e divulgação do problema da Mutilação Genital Feminina na Guiné-Bissau). Aproveito para chamar a atenção para o paradoxo da situação actual da Guiné-Bissau, que exporta médicos e enfermeiros nacionais (!) e que vê-se na contingência de pedir ajuda internacional para combater o actual surto de cólera que lavra em Bissau... São os médicos estrangeiros (neste caso, da associação Médicos Sem Fronteira) quem está na linha da frente da luta contra a cólera em Bissau, no Hospital Nacional Simão Mendes... O terrível paradoxo é que a Guiné-Bissau, que não tem (a par de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe) uma Faculdade de Medicina, depende da ajuda de terceiros (Portugal, China, Cuba...) para formar os seus médicos, os quais, acabada a sua formação, não voltam a casa onde as conidições de trabalho e de vida estão longe de ser atractivas, ou no mínimo decentes e aceitáveis... Ainda há dias dei os meus parabéns a um aluno meu, médico, guineense, que veio para Portugal, com uma bolsa (portuguesa!) , para fazer um mestrado em gestão da saúde, e que entretanto conseguiu ver reconhecidas, pela nossa Ordem dos Médicos, as suas competências profissionais (tirou o curso de medicina na ex-União Soviética ou já na actual Rússia). Dei-lhes os meus parabéns, a ele, como pessoa, como médico, como meu aluno e como meu amigo... E os meus pêsamos à Guiné-Bissau por que vai perder, por vários anos, o contributo qualificado de um dos seus filhos, para mais numa área, a saúde, onde as carências de pessoal são brutais... "Agora vou ganhar algum dinheiro, aqui, em Portugal... mas um dia hei-de voltar à minha terra"... É humano, humaníssimo, vistas as coisas no plano individual... Mas é uma terrível sangria, uma tragédia, para países tão pobres como a Guiné-Bissau, que tem os seus melhores quadros na diáspora, na emigração... (Atenção: há gente extraordinária, guineense, a viver e a trabalhar, em condições dificilíssimas, na Guiné-Bissau, e que merecem o nosso reconhecimento, apoio e aplauso... Portanto, nada de estigmatizar ninguém, e muito menos fazer a distinção entre bons e maus filhos; até por que também nós, portugueses, temos mais de cinco milhões espalhados pelo mundo fora, e que nunca mais voltarão, na maior parte dos casos...). A questão não é saber se um dia os filhos da Guiné-Bissau na diáspora (portuguesa, comunitária, mundial...) os mais qualificados, voltam, mas como conseguir criar condições - de parte a parte, Portugal, a União Europeia e a Guiné-Bissau... - para que eles voltem, os médicos, os enfermeiros, os técnicos de diagnóstico e terapêutica e outros técnicos de saúde, os engenheiros, os professores, os gestores, os informáticos, os operários qualificados e os empresários, guineenses, que tanta faltam fazem no seu país. (...) "Estão vivos, mas o seu olhar parece já ter desistido. Os doentes de cólera que se aglomeram no Hospital Simão Mendes, principal unidade de saúde da Guiné-Bissau, esperam em macas de lona pela sua sorte - que pode ser a morte. Conhecida como a doença das mãos sujas, este ano a cólera já matou mais de cem pessoas e infectou cerca de 5500. "São homens e mulheres, algumas crianças também. Os doentes mais graves têm o luxo de poder dormir dentro da ala reservada para a cólera, os outros espalham-se ao ar livre pelo alpendre que abraça o edifício, embrulhando-se num lençol branco, que é trocado pelos enfermeiros quando muda de cor - a cólera, infecção intestinal aguda causada por uma bactéria, normalmente contraída por ingestão de alimentos ou de água contaminada, manifesta-se em diarreias, vómitos e até sangramentos. Outros doentes já estão instalados na tenda de campanha em frente, montada pela Unicef. Os Médicos Sem Fronteiras (MSF), há um mês em Bissau, vão instalar outras tendas nos próximos dias. (...)" Combater a cólera não custa muito dinheiro, as soluções de cloro têm preços acessíveis. Mas a Guiné-Bissau não tem cloro suficiente em armazém e precisa de o importar. Quando a equipa de emergência dos MSF chegou ao país, o stock do hospital central era 'insuficiente e irregular' e não havia cloro nos centros de saúde espalhados pela capital - 'ainda não há', disse ao [Público] o coordenador da equipa dos MSF, Daniel Remartínez. ...) "A cólera não é propriamente uma surpresa na Guiné, um dos países mais pobres do mundo. Espera-se que ela aconteça todos os anos, por alturas das chuvas - a Organização Mundial de Saúde diz que a doença é endémica no país. Como é endémica em todos os países subdesenvolvidos que carecem de saneamento básico, aterros sanitários, sistema de distribuição de água potável. Menos de dez por cento da população guineense tem acesso a água potável e mais de 80 por cento dos poços estão contaminados. "O próprio Presidente, Nino Vieira, reconheceu que o surto de cólera no país é 'preocupante'. (...) (...)"A área mais afectada pelo surto de cólera deste ano é a de Bissau. A sobrepopulação, a degradação ambiental e o lixo a céu aberto atacado diariamente por djugudés (abutres) ajudam a explicar por que é que é na capital que se concentram o maior número de casos e o maior número de mortes. Só no Hospital Simão Mendes, onde têm dado entrada 60 doentes por dia, já morreram 35 pessoas. "No mercado de Bandim, o maior da cidade, é fácil perceber o que faz deste bairro da capital o mais afectado de todos. É um labirinto de ruelas estreitas, com centenas de comerciantes, à semelhança de um qualquer suq marroquino, onde o cheiro fétido chega a ser insuportável. O chão está invariavelmente enlameado, poças de água aqui e ali. Na zona onde se vendem os alimentos é difícil permanecer. Há quem durma no chão sujo. Em bancas de madeira estende-se o peixe fumado muito consumido pelos guineenses. 'O mercado está muito cheio, devia ser uma feira bem organizada para que as pessoas possam vender e haja mais condições e mais limpeza', reclama Aneximandro Ribeiro, 33 anos e comerciante no Bandim. (...) "A cólera tem um período de incubação 'muito rápido' - entre as 12 e as 48 horas, 'na maioria nas primeiras 24' - e, portanto, é crucial que as pessoas que tenham 'diarreias e vómitos rápidos parecidos com água de arroz' se dirijam de imediato para o hospital, explicou ao [Público] a enfermeira dos MSF Llanos Montero" (...). ___________ Nota de L.G.: (*) Vd. último poste desta série > 7 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3184: Pensamento do dia (15) : Paz à Nossa Alma (Anónimo)

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P2989: Recortes de imprensa (7): Combate à mutilação genital feminina na Guiné-Bissau

1. O nosso camarada Marques Lopes, Cor DFA, na situação de reforma, enviou-nos uma mensagem com esta notícia, veículada pela Lusa, Agência de Notícias de Portugal, em 9 de Junho de 2008.

Mansabá, 1971> Bajuda mandinga> Milhares de jovens como esta foram e ainda são sujeitas a tradições selváticas que violam os mais elementares direitos da mulher.

Foto: © Carlos Vinhal (2008). Direitos reservados


Internacional
Guiné-Bissau: Governo e UNICEF lançam programa combate à mutilação genital feminina

Bissau, 09 Jun (Lusa) - O Governo da Guiné-Bissau e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) lançaram hoje uma iniciativa para o combate à prática da mutilação genital feminina, um dos mais graves problemas sociais do país
.

A iniciativa, "Acelerar a mudança para o abandono da mutilação", vai durante os próximos três anos promover acções de sensibilização nas regiões de Bafatá, Gabu, Oio e Quinará, principais zonas onde o fenómeno da excisão é ainda bastante acentuado junto das raparigas.

A iniciativa hoje lançada também conta com a participação do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP) e será executada pela TOSTAN , uma organização não governamental internacional com mais de 15 anos de experiência na mudança de mentalidade das comunidades afectadas por práticas tradicionais que trazem sofrimento.

De acordo com um comunicado conjunto distribuído à imprensa pelo FNUAP e UNICEF, o trabalho da TOSTAN na luta contra a excisão produziu "resultados positivos" em vários países africanos como são os casos do Senegal e da Guiné-Coancri pelo que se pretende aproveitar a experiência na Guiné-Bissau.

Dados das agências das Nações Unidas, baseados nos inquéritos aos indicadores múltiplos de 2006 (Mics III), apontam que 44,5% das mulheres guineenses entre os 15 e os 49 anos de idade sofreram mutilação genital, o que prova que as estratégias utilizadas até aqui para o combate ao fenómeno não produziram os efeitos esperados.

De acordo com as duas agências da ONU, a situação requer a "adopção de uma estratégia mais apropriada" que passará pela sensibilização directa e formação das comunidades.

Toda a estratégia será supervisionada pelo Governo guineense através do Ministério da Solidariedade, Família e Luta contra a Pobreza

MB.

Lusa/Fim
© 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.
2008-06-09 16:35:01
_______________

Nota de CV:

Vd. postes sobre a mutilação genital feminina publicados no nosso Blogue em:

17 de Março de 200> Guiné 63/74 - P2654: A Mutilação Genital Feminina na Voz da América, por Nelson Herbert (Virgínio Briote)

23 de Fevereiro de 2008> Guiné 63/74 - P2575: Estórias do Juvenal Amado (4): A pequena e adorável Mariama que eu conheci no reordenamento de Bengacia (Juvenal Amado)

30 de Novembro de 2007> Guiné 63/74 - P2316: E as Nossas Palmas Vão Para... (2): Os que lutam, na Guiné-Bissau, contra a Mutilação Genital Feminina (MGF)

25 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2131: Mutilação Genital Feminina: É crime, diz explicitamente o novo Código Penal (A. Marques Lopes / Luís Graça)

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1580: Fanado ou Mutilação Genital Feminina: Mulher e direitos humanos: ontem e hoje (Luís Graça / Jorge Cabral)

15 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVI: Conferência sobre a Mutilação Genital Feminina (Luís Graça)

14 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVII: A festa do fanado ou a cruel Mutilação Genital Feminina (Jorge Cabral)

3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado

4 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XII: O silêncio dos tugas face à MGF (Mutilação Genital Feminina)

segunda-feira, 17 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2654: As nossas mulheres (3): A Mutilação Genital Feminina na Voz da América, por Nelson Herbert (Virgínio Briote)

1. Reportagem de Nelson Herbert, da Voz da América - Serviço Português, que esteve recentemente, na Guiné-Bissau, a cobrir o Simpósio Internacional de Guileje (1 a 7 de Março de 2008) e que acaba de entrar para a nossa Tabanca Grande (1):

Guiné- Bissau: Prática Ancestral Reacende Debate
Por Nelson Herbert 06/03/2008

Lucínia Silva - Download (MP3) (11' 52'')

Lucínia Silva - Ouvir (MP3) (11' 52")




Uma bajuda guineense do nosso tempo... São as populações islamizadas (fulas, mandingas, beafadas...) do interior da Guiné-Bissau, mas também da cidade, que ainda estão fortemente arreigadas à prática ancestral, anterior ao Islão, do fanado da mulher... Invocar a autoridade do Profeta para justificar a MGF é uma falácia teológica, além de um anacronismo...
Foto: © Foto Brigadeiro de Farim (adquirida por Carlos Silva). Direitos reservados.


Sinopse:

A prática da Mutilação Genital Feminina (MGF) - - circuncisão feminina ou simplesmente fanado da mulher - está aumentar, na Guiné-Bissau, e atingiu, no ano passado, cerca de quatro mil mulheres, só na região periférica à cidade capital. A revelação foi recentemente feita pela presidente do Instituto da Mulher e da Criança, Lucínia Silva.

Enraízada, sobretudo, entre as etnias islamizadas em África, estima-se que a MGF afecte entre um a dois milhões de mulheres e crianças em, pelo menos, 28 países do continente africano, incluindo a Guiné- Bissau, país onde um activismo em prol da criminalização dessa prática cultural ancestral entre os muçulmanos, nas áreas rurais, tem animado um debate nacional (2).

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Notas de vb:
(1) Vd. poste de 16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2652: Guineenses da diáspora (3): Nelson Herbert, o nosso Correspondente nos EUA (Virgínio Briote)
(2) Vd. postes sobre a MGF - Mutilação Genital Feminina publicados no nosso Blogue:

23 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2575: Estórias do Juvenal Amado (4): A pequena e adorável Mariama que eu conheci no reordenamento de Bengacia (Juvenal Amado)

30 de Novembro de 2007>
Guiné 63/74 - P2316: E as Nossas Palmas Vão Para... (2): Os que lutam, na Guiné-Bissau, contra a Mutilação Genital Feminina (MGF)

25 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2131: Mutilação Genital Feminina: É crime, diz explicitamente o novo Código Penal (A. Marques Lopes / Luís Graça)

10 de Março de 2007 >
Guiné 63/74 - P1580: Fanado ou Mutilação Genital Feminina: Mulher e direitos humanos: ontem e hoje (Luís Graça / Jorge Cabral)

15 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCLVI: Conferência sobre a Mutilação Genital Feminina (Luís Graça)

14 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCLVII: A festa do fanado ou a cruel Mutilação Genital Feminina (Jorge Cabral)

3 de Fevereiro de 2006 >
Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado

4 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XII: O silêncio dos tugas face à MGF (Mutilação Genital Feminina)

Vd. também o dossiê do Público sobre a MGF... A jornalista Sofia Branco tem feito uma excelente trabalho de investigação e divulgação sobre a MGF na Guiné-Bissau.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Guiné 63/74 - P2575: Estórias do Juvenal Amado (4): A pequena e adorável Mariama que eu conheci no reordenamento de Bengacia (Juvenal Amado)

Juvenal Amado
Ex-1.º Cabo Condutor
CCS/BCAÇ 3872
Galomaro
1972/74

1. MARIAMA

Abriu os olhos de espanto e de medo ao ver a minha Berliet, que entrava pela aldeia levantando nuvens de pó. Virou costas e correu no sentido contrário, abrigando-se nas pernas da mãe que, com alguma curiosidade, nos observava junto da sua cabana destruída.

Mariama era uma bajuda de palmo e meio. Tinha um tom de pele café com leite escuro, os olhos grandes e castanhos. O cabelo todo entrançado com amuletos nas pontas. Vestia uma blusa sem mangas e um pano fula enrolado à cintura. Um ronco, num dos tornozelos dos seus pés descalços, completava a vestimenta.


Foto 1> Juvenal Amado junto a um monte de tijolos já fabricados para utilizar na reconstrução de Bangacia

Parei a viatura, saltei dela com a minha arma e disse-lhe adeus, ao que ela respondeu escondendo-se, ainda mais, na roupa da mãe.

Íamos começar a reconstrução de Bangacia, que tinha sido destruída pelos guerrilheiros algum tempo atrás. Sempre achei que aquilo tinha sido um ataque por encomenda.

Assim, quando reconstruímos, fizemos algumas bem feitorias, entre as quais, casas mais espaçosas e telhados de zinco, em vez dos de capim, que tinham que ser mudados de vez em quando, posto médico e escola.

Foto 2> Bangacia depois do ataque


As alterações eram nitidamente do agrado da população. Fizeram-se vários grupos de construção. Sapadores, alguns elementos do Pel Rec que tinham conhecimentos de pedreiro e carpinteiro. Também vieram camaradas das Companhias Operacionais, onde pontuava o Saltinho como grupo mais numeroso.

Cada chefe de família tinha que produzir blocos de barro para utilizar na construção da nova casa, para a sua família. Assim amassavam o barro de cor cinzenta com palha misturada, enchiam um molde e os blocos dai resultantes iam sucessivamente ficando ao sol, até se tornarem duros.

Eu e os outros condutores de Berliet acarretávamos os blocos para o local escolhido pelos seus donos. Escusado será dizer que era preciso pôr ordem nos carregamentos, pois todos queriam ser os primeiros. Assim sempre que não tinha coluna para qualquer lado, lá estava eu logo de manhã a transportar os tijolos de barro, hora para uns, hora para outros.


Foto 3> Bangacia depois do ataque

Fotos: © Juvenal Amado (2008). Direitos reservados.



A Mariama espreitava sempre de longe. Eu acenava-lhe e, à hora do lanche, que fazíamos às 10 horas da manhã, oferecia-lhe com um gesto um pouco de pão. Acabava alguém por vir buscar para ela, mas ela nunca.

Como tinha sempre doce da ração de combate, passei a levar-lhe. Mas pouco e pouco as outras crianças, que andavam sempre à nossa volta, foram-na trazendo mais para perto.

Passado algum tempo, mal eu chegava, vinha a correr dar-me mão. Levava-me ao pé da mãe, mulher de talvez vinte e poucos anos, com dois filhos e a nossa heroína.

A idade dela era difícil de descobrir, tendo em conta os filhos e a vida dura das mulheres da Guiné que rapidamente perdiam a sua juventude.

O pai era mais velho e tinha outras mulheres, como era costume. A riqueza de um Homem Grande, media-se pelo números de mulheres e cabeças de gado.
O nome por que eu era conhecido, fazia-lhes confusão uma vez que Amado era muito parecido com Amadu ou Mamadu. Quando eu o mencionava, os Homens Grandes faziam uma expressão de gozo, metiam a mão à frente da cara Heeeeeiiiiiiiiiiiiii nosso cabo é manga de calabanta (1). Pensavam que eu estava a gozar com eles.

Mas a Mariana, mal eu chegava, ouvia logo a vozita dela a chamar, Almadu…. Almadu, ainda complicou mais o nome. Vinha à procura das guloseimas que no fundo se resumiam a pão, latas de cavala e sardinha. Todo o dia andava comigo para cima e para baixo, em cima da viatura mandando nos outros garotos. Era a mais pequenita de todos.

A reconstrução seguia em bom ritmo. Faziam-se as paredes exteriores dividia-se por dentro em quatro salas iguais, punha-se o vigamento e por último o telhado.

Sempre que se atingia uma fase, assistia-se a estranhas negociações. Os Homens Grandes ofereciam galinhas para serem os primeiros a terem as casas prontas, mas à medida que viam a mesma a ficar concluída, começavam a esquecerem-se das promessas.

Os Islamitas são bons negociadores. Então os camaradas diziam que não lhes acabavam a casa e mais, furavam-lhe os tectos todos. Com gestos simulavam um chuveiro, onde eles passariam a tomar banho. Com grande alarido as negociações começavam em cinco galinhas, mas por fim o Homem Grande só dava uma. E levava tempo a negociar.

Nós riamos pois para nós, naquele caso, era tudo uma brincadeira. Entretanto passei a ser recebido na casa da Mariama. Ela pedia-me tudo o que lhe diziam para pedir: Almadu parte (2) peso, Almadu parte lata etc, etc... Eu na medida do possível, lá lhe comprei uns chinelos coloridos, que ela nem para dormir os tirava.

A mãe torrava-me mancarra (3) numa panela de ferro e foi ali que provei a bianda (4) com molho da polpa que envolve a amêndoa da palmeira.

Um dia a mãe disse-me, mais por gestos de por fala, se eu queria levar a Mariama no Lisboa. Eu ri-me, fiquei embaraçado e disse-lhe que não era possível.

A idade, para além das dores nas pernas e nas costas, traz também por vezes alguma sabedoria e hoje, quando penso neste episódio, vejo com clareza a mensagem daquela mãe.

Trazer a pequenita comigo era livrá-la da mutilação (5), da miséria, do analfabetismo e de uma esperança de vida que não ultrapassa os quarenta anos. A Mariama terá, se chegou à pré-adolescência, passado por essa prova cruel do Fanado, terá sido vendida por dois sacos de mancarra e um de cola, para ser a 2ª ou 3ª mulher de um homem bem mais velho.

A mãe não terá tido consciência do alcance total do seu pedido. Mas estava no seu instinto de mulher tentar um futuro diferente para a filha.

A reconstrução de Bangacia ficou pronta. Foi um prazer ver aquelas casas alinhadas, com arruamentos largos os telhados brilhando a sol.

Passei a ir menos vezes à povoação, embora lá fosse sempre que ia às Duas Fontes. Levava latas de conservas e pão, que trocava por laranjas e mangas, com os garotos. Guardava sempre o melhor para a pequenina Mariama.

Um dia também me apareceu no quartel...

No momento que escrevo estas linhas, peço para que o destino lhe tenha reservado um futuro diferente das milhões de Mariamas que na Guiné sofrem com a pobreza e possivelmente não acreditam que possa haver cura para os seus males.

Juvenal Amado (*)

Notas do autor:

(1) Malandro.
(2) Dá-me um escudo.
(3) Amendoim.
(4) Arroz.
(5) “Fanado”: trata-se de uma prática horrível, onde se mutilam a meninas nos órgãos genitais. Por todo o Mundo Islâmico é praticado. Há no entanto algumas vozes de mulheres africanas, que fazem uma campanha muito corajosa contra esta prática, que as limita como mulheres inteiras, no pleno direito e uso, de todas as suas capacidades.

____________

2. Comentário de Luís Graça

A Mutilação Genital Feminina (MGF) pratica-se tradicionalmente em 28 países (da África subsariana onde se inclui a Guiné-Bissau, e nalguns países do Próximo Oriente). Não se pratica em todos os países muçulmanos. É bom que se diga que não é imposta pela religião muçulmana. Atinge também mulheres cristãs (coptas, no Egipto) e não tem nada a ver directamente com o Corão ou os preceitos islâmicos... Hoje em dia a MGF tende a ser criminalizada pelo Código Penal da maior parte dos países (incluindo o nosso).

De facto, o Corão não a impõe... Seria, de resto, anterior ao profeta Maomé, remontando ao tempo dos faraós do Egipto... Nos países bérberes,do norte de África (Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia...) não se pratica... Nem na Indonésia, por exempo, que é o maior país muçulmamo do mundo (ou pratica-se apenas em pequenas comunidades)... Esta prática é ferozmente combatida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como um grave problema de saúde pública, afectando todos os anos cerca de 3 milhões de meninas e de adolescentes...

Portugal também é hoje um país de risco, devido à existência de uma importante comunidade guineense, donde se destacam os fulas...

É bom que se diga e que saiba que a MGF ("circuncisão feminina" ou "fanado das mulheres") era tolerada no nosso tempo, em nome do relativismno cultural, do sucesso da política spinolista Por uma Guiné Melhor e dos superiores interesses da Nação... Duvido que Spínola e o seu Estado-Maior alguma vez se tivesse preocupado seriamente com a sorte das meninas da Guiné (fulas, mandingas, beafadas - os três principais grupos islamizados, onde se praticava e ainda pratica a MGF).

Há já vários postes sobre a MGF (a cerimónia do fanado não se resume à circuncisão femimina nem masculina, é um ritual de passagem, importante em certas sociedades tradicionais, e sem a submissão ao qual uma rapariga ou um rapaz não são socialmente aceites) (**).

L.G.
__________
Notas dos editores:
(*) Vd. último trabalho da série Estórias do Juvenal Amado, de 18 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2551: Estórias do Juvenal Amado (3): Como hóspede do Xime (Juvenal Amado)

(**) Leiam o dossiê do Público sobre a MGF... A jornalista Sofia Branco tem feito uma excelente trabalho de investigação e divulgação sobre a MGF na Guiné-Bissau.

Vd. postes sobre a mutilação genital feminina publicados no nosso Blogue:

30 de Novembro de 2007> Guiné 63/74 - P2316: E as Nossas Palmas Vão Para... (2): Os que lutam, na Guiné-Bissau, contra a Mutilação Genital Feminina (MGF)

25 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2131: Mutilação Genital Feminina: É crime, diz explicitamente o novo Código Penal (A. Marques Lopes / Luís Graça)

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1580: Fanado ou Mutilação Genital Feminina: Mulher e direitos humanos: ontem e hoje (Luís Graça / Jorge Cabral)

15 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVI: Conferência sobre a Mutilação Genital Feminina (Luís Graça)

14 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVII: A festa do fanado ou a cruel Mutilação Genital Feminina (Jorge Cabral)

3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado

4 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XII: O silêncio dos tugas face à MGF (Mutilação Genital Feminina)

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2316: E as Nossas Palmas Vão Para... (2): Os que lutam, na Guiné-Bissau, contra a Mutilação Genital Feminina (MGF)

Guiné > Zona Leste > Cidade de Bafatá > Finais de 1969 > Vista aérea da mesquita de Bafatá. A Zona Leste da Guiné (região de Bafatá e Gabu) é aquela onde se pratica mais a Mutilação Genital Feminina (MGF)... As populações islamizadas representam quase metade dos guineenses.


Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados


1. Mensagem, de 20 de Novembro, que nos chegou de Matosinhos, enviada pelo A. Marques Lopes, um tertuliano sempre atento ao que se passa na nossa Guiné-Bissau... Aproveitamos para daqui saudar aqueles e aquelas que na Guiné-Bissau lutam contra a MGF que é uma prática indefensável, mesmo à luz do relativismo cultural... (LG).


(i) Assunto: Presidente do parlamento da Guiné-Bissau quer aprovação de legislação contra a Mutilação Genital Feminina (MGF) (1)


Bissau, 19/11

O presidente da Assembleia Nacional da Guiné-Bissau, Francisco Benante, disse hoje que quer ver aprovada pelos deputados a legislação que combate a MGF, prática que tem vindo a aumentar no país.

"É uma prática retrógrada que é preciso banir da nossa sociedade, por ser
atentatória à dignidade das nossas crianças e raparigas" - declarou Francisco
Benante, na abertura da primeira sessão parlamentar do ano legislativo de
2007/08.

Para a segunda figura do Estado Guineense, a MGF "é uma prática que não tem nada com os imperativos religiosos". Francisco Benante prometeu provocar o debate sobre a questão na sessão parlamentar do próximo mês de Fevereiro.

A prática da MGF na Guiné-Bissau tem vindo a aumentar, segundo um estudo realizado por uma organização não-governamental (ONG), a Plan, que é guineense. Esse estudo abrangeu várias tabancas do país e as conclusões referem que as motivações e as razões que têm levado ao aumento da prática da MGF teriam a ver com uma falsa interpretação do Islão... Para alguns dignatários religiosos, a MGF seria um "passo necessário para [a rapariga] se tornar muçulmano".

"As raparigas muçulmanas têm ser mutiladas antes dos seis anos de idade, caso contrário não podem praticar a religião e a família será responsável pelo pecado", refere o estudo da Plan. A verdade é que a MGF não está mencionada no Corão, e não é portanto uma obrigação religiosa para os crentes.

Ainda segundo o estudo supracitado, a MGF não só está a aumentar como é praticada em crianças com cada vez menos idade...

O Unicef estima que 2.000 jovens são fanadas, anualmente, no país, e que entre 250 a 500 mil mulheres sofrem as consequências médicas e psicológicas da MGF. De entre os problemas que preocupam as autoridades e os profissionais de saúde, umd eles é o risco da transmissão do vírus do HIV/Sida, quando as fanatecas usam a mesma faca em várias cerimónias do fanado... Por outro lado, as lesões provocadas nos órgãos genitais da mulher facilitam a transmissão do vírus do HIV/Sida no futuro.

O governo quer criminalizar a prática da MGF, ressuscitando um projeto de lei que proíbia o fanado com multas e pena de prisão, elaborado, em 2001, pelo Instituto da Mulher e da Criança (IMC), de parceria com organizações de direitos humanos.

"Sem querer ofender a religião ou a cultura de uma ou outra etnia, temos de envolver todos os atores sociais e políticos" disse recentemente Adelina Na Tamba, ministra da Solidariedade Social, Família e Luta contra a Pobreza.

(ii) O fanado alternativo

Na Guiné-Bissau, as férias escolares - que vão de Julho a Setembro - são a época alta das fanatecas, as mulheres grandes que vivem e dependem do fanado. É nesse período do ano que as famílias guineenses enviam as filhas para ser iniciadas pelas fanatecas.

A organização não-governamental Sinim Mira Nassiquê (em língua mandinga, Nós Pensamos no Futuro) , convocou na primeira semana de Agosto de 2007, na capital, Bissau, um encontro com fanatecas e activistas para reflexão sobre os perigos do fanado sobre a saúde feminina, incluindo o risco de contrair o HIV/Sida.

Entre 2000 e 2004, a Sinim Mira Nassiquê notabilizou-se por ter tentado ensaiar, no país, a experiência do fanado alternativo, em que as raparigas eram levadas para o mato para conhecer a tradição e ser submetidas aos ritos de iniciação ou de passagem (da infância para a puberdade), sendo todavia poupadas à cruel e perigosa MGF. O fanado alternativo não se cosneguiu impor, face às pressões corporativas das fanatecas, ao lóbi religioso islâmico e ao peso dos líderes tradicionais

A MGF é praticada especialmente na Zona Leste, nas regiões de Gabu e Bafatá, por algumas das três dezenas de etnias da Guiné-Bissau, e nomadamente por todas as etnias islamizadas (fulas, mandingas, beafadas, saracolés, cassangas e mansoncas), que representa cerca de 46% da população. Entre os fulas, que representam 23 por cento da população, o procedimento consiste na excisão do clítoris e dos lábios da vagina. Os beafadas e os mandingas limitam-se à excisão clitoriana. Entre os bijagós, que são animistas, faz-se uma iniciação ritual, com tatuagens, mas sem MGF.

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Fonte: Adapt. por L.G., de:

Angola Press - 19 de Novembro de 2007

Agência de Notícias da Aids - 19 de Novembro de 2007

PlusNews - Notícias e análises sobre HIV-SIDA em África Bissau, 10 de Agosto de 2007 > GUINÉ-BISSAU: Alunas em férias, fanatecas ao trabalho

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Nota de L.G.:

(1) Vd. posts de:

25 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2131: Mutilação Genital Feminina: É crime, diz explicitamente o novo Código Penal (A. Marques Lopes / Luís Graça)

10 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1580: Fanado ou Mutilação Genital Feminina: Mulher e direitos humanos: ontem e hoje (Luís Graça / Jorge Cabral)

15 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVI: Conferência sobre a Mutilação Genital Feminina (Luís Graça)

14 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLVII: A festa do fanado ou a cruel Mutilação Genital Feminina (Jorge Cabral)

3 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXCVII: Memórias de Guileje (1967/68) (Zé Neto)(5): ecumenismo e festa do fanado

4 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - XII: O silêncio dos tugas face à MGF (Mutilação Genital Feminina)

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Guiné 63/74 - P2293: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (1): Os bastidores de um romance (Luís Graça / Mário Fitas)

1. Conheci o Mário Vicente, ou melhor, Mário Fitas (1), na estreia do filme de Diana Andringa e Flora Gomes (2). Ele teve a gentileza de me oferecer um exemplar de cada um dos seus dois livros, autografados.

Li-os, com prazer e entusiasmo, e passado algum tempo pedi-lhe para publicar, por partes, o seu romance Pami Na Dondo, a Guerrilheira. Embora alguns dos nossos amigos e camaradas já tenha tido o privilégio de ler a obra, a maior do pessoal da nossa Tabanca Grande e os demais internautas desconheçam-na por completa.

É uma edição de autor, com uma tiragem limitada (500 exemplares), e que não tem propósitos comerciais. O Mário não teve dúvidas em, de imediato, satisfazer o nosso pedido. Vamos começar a publicar a estória da nossa guerrilheira, a Pami Na Dondo, balanta, que um dia vai cair nas mãos dos Lassas, os tugas de Cufar...

Antes do 1º epísódio, vamos levantar um pouco o véu sobre o autor, a sua obra e os bastidores... através da troca de e-mails entre ele e o editor do blogue.


2. Mensagens de Luís Graça e de Mário Fitas:


21 de Outubro de 2007

Caro Luís,

Foi um prazer estar pessoalmente e falar contigo, principalmente pela coincidência de ser na estreia de As duas faces da Guerra. Filme que desde já te informo, gostei de ver, mas que terei de ver mais vezes (2).

Agradeço as tuas palavras sobre a minha pessoa, e pena é não haver mais tempo para podermos falar dos problemas dessa Guiné maravilhosa.

Já enviei uma mensagem sobre o filme, mas como referi, quero-o dissecar melhor.

Quanto à publicação, no Blogue, de Pami na Dondo, a Guerrilheira, não vejo inconviniente absolutamente nenhum, acho que a Guerrilheira já faz parte da Tabanca Grande. Aliás agora tenho a convicção que valeu a pena todo o esforço feito, pois estou a sentir o pulsar de quem continua a amar Àfrica e a gostar - apesar de todas as vicissitudes - daquela linda Guiné.

Só que há uns problemas: É que eu não sou grande coisa em termos de informática, e também estou limitado em termos de software e hardware. Se houver na Tertúlia algum expert em informática que se voluntarie para pôr o livro no Blogue, tudo bem, não há problemas nenhuns, o Chefe da Tabanca manda.

Luís, o livro foi escrito precisamente para divulgar a estupidez daquela e de todas as Guerras. Se achas que de facto a introdução do livro no Blogue tem interesse, vamos embora, liberdade total. Quem fica a ganhar com isso somos todos nós que fazemos parte dos Povos de Portugal e da Guiné-Bissau.

Sempre ao dispor!

Um Abraço

24 de Outubro de 2007

Caro Luis,

Quanto ao livro, acho que encontrei qualquer coisa nos meus documentos, só que faltam as fotos, que vou tentar resolver, e até a hipótese de incluir outras também sugestivas.

Quanto ao Brandão, era conhecido em Catió, só que no livro é apenas mencionada a casa Brandoa e a União Fabricante, para defesa do escritor... Sabes que é muito complicado incluir nomes verdadeiros que por vezes nos trazem problemas.

Já escrevi no Blogue sobre o conhecimento de um rapaz de nome Brandão em Cufar. À Gilda Brás (3), enviei o meu livro a seu pedido, mas até hoje não recebi qualquer informação.

Quanto à nossa Pami, há de facto Balantas que faziam a excisão ou clitoridectomia. Os Balantas têm ou tinham vários grupos e até por vezes falando o seu dialecto distinto, e até os que sofreram a infuência islâmica, designados por Balantas Manés. Quase todas as raças na Guiné a praticava, assim como a circuncisão [masculina].

Um Abraço


27 de Outubro de 2007:
Caro Luís,

Tenho tido o meu computador sem Internet, e com problemas pelo que só hoje posso entrar em contacto eficiente (julgo eu) à Tabanca Grande. Tinha no Word uma versão de Pami que julgo ser a última versão que foi para a tipografia. Não enviei as fotos dos aviões e do Niassa, porque queria a tua opinião, sobre se se poderão incluir mais fotos, que poderão enriquecer o livro. Pelo que aguardo uma opinião sobre o assunto.

Um abraço do tamanho do Cumbijã!

27 de Outubro de 2007:

Caros amigos envio A GUERRILHEIRA.

Um forte abraço.

Mário Fitas


27 de Outubro de 2007:

Mário:

Não queres dar uma pequena explicação aos nossos camaradas sobre o livro ? Como te surgiu a ideia ? Onde foste buscar a Pami ? ... A tua estória, que eu estou ainda a ler, levanta algumas questões interessantes mas também perturbantes, como os interrogatórios aos prisioneiros, feitos por milicianos...

Talvez valha a pena contextualizar a estória: já havia psico, nesse tempo ? Em 1965 ? Por outro lado, ainda não respondestes à questão que te levantei há dias: entre os balantas havia a festa do fanado, mas eles não praticavam (nem praticam) a circuncisão feminina (ou MGF - Mutilação Genital Feminina)... Mas eu só conheci os balantas da região de Bambadinca... Posso estar equivocado...

Luís

28 de Outubro de 2007:

Caro Luís,

Nada me impede, de dar todas as explicações sobre Pami na Dondo, a Guerrilheira. Só que por motivos vários não gostaria que determinados pormenores passassem dos editores do Blogue, pois para além de existirem ainda muitos intervenientes vivos, existe uma memória colectiva, com respeito pelos que já partiram.

Estou a tentar contactos directos com (personagens e familiares) e verificar até onde posso chegar. Para mim não há problemas, pois tenho a consciência que fiz uma guerra, independentemente do nome que se lhe queira dar. Para mim foi guerra! Não
tomo partido por nenhuma definição além desta. Tendo-a feito estudado e analisado, assumo as minhas responsabilidades, pelo que resolvi mostrar aquilo que vivi, senti e vi.

É nesse contexto que nasce a Guerrilheira, uma autenticidade ficcionada. Senti que deveria falar e contar a guerra, não como narração de actos e feitos, mas através de um romance, narrar a realidade da guerra.

Plenamente confiante em ti, e sem problemas para mim, ponho esta questão: Estivemos ou não estivemos em guerra? Ela é na realidade uma estupidez! Mas que pode fazer um (puto) de vinte e um anos, perante este drama, tendo sido preparado e estruturado para essa própria Guerra? Foi muito complexo! Só acordei, quando me encontrei chafurdando nas bolanhas, respirando vapor de água nas matas, e gatinhando sobre a lama dos rios de maré ou matando a secura no velho copo de bambu.

Já era muito tarde!...Tinha amigos tombado a meu lado,e outros, estropiados, tinham lançado aquele olhar de adeus... "Até Quando"? Morrer? Seria solução? Outros caminhos e opções eramos obrigados a ter. E aí, meu amigo, o homem torna-se animal!
Transforma-se em monstro. As minhas histórias fui contando. Geralmente a
resposta era a mesma:
- O gajo está a pintar!

Não queria ir embora, dar de comer aos bichinhos da minha querida planície, e egoisticamente levar estas verdades, e o meu ódio e repuúdio pela guerra, sem deixar algo que tentasse sensibilizar a condição humana.

Respondendo às tuas dúvidas:

(i) É certo que os balantas não praticavam a excisão, os politeístas, mas os que já estavam ligados ao islamismo, esses, faziam-no. Como tenho referido, há momentos de ficção no livro, esse pode ser um deles.

(ii) Da Miriam, podia dizer-te tudo! Da Pami, nesse aspecto felizmente não!( Agora estou a rir) já deste uma olhadela pelos Putos Gandulos e Guerra. Concerteza. Pois é, Chefe da Tabanca Grande, não foi fácil, não!

(iii) Quanto aos interrogatórios, não era feito pelos milícias, mas sim por graduados, eles serviam apenas de intérpretes, pois as únicas pessoas de etnia balanta que ouvi falar crioulo e português, foi a personagem Pami, e o ex-guerrilheiro Alfa nam Cabo.

(iv) De facto havia psico sobre as quatro tabancas a sul de Cufar, dávamos aulas e pequeno almoço a mais de cem miúdos, e tentava-se que os prisioneiros por nós efectuados, rejeitassem o PAIGC é verdade, nós também recebíamos correspondência do Alfero de Mato, colocada no cruzamento do Cabaceira.

(v) Também tinhamos agentes duplos! Olha um deles, o Bia, chefe da tabanca de Impunguedada, levava e trazia. Um dia soubemos que tinha sido morto no Cafal (Cantanhez), por tentativa de fuga (?). Nunca o soubemos. O Codufu, chefe da tabanca de Cantone, foi comprar caqui com dinheiro nosso, como sendo para o PAIGC.

(vi) A guerra era porca! A emboscada em que morreu o Gonçalo, foi montada pelo PAIGC, por informações fornecidas pelo Admnistrador de Posto de Catió, com quem o Comandante de Batalhão se tinha aberto. Por estas e por outras, levou a trancada na cabeça, e que já alguém contou no nosso Blogue.

(vii) Luís, fala-se do que as nossas tropas faziam. É verdade! Nós tinhamos problemas com isso, principalmente com os Heróis do arame farpado, que se borravam todos nas operações. Mas também havia problemas do outro lado [, do lado do PAIGC,] e talvez piores. Já alguma vez ouviste falar na limpeza étnica em que foram executados guerrilheiros de etnia balanta? O próprio Amilcar Cabral! Porquê? Foi tudo muito sujo e feio. O mal foi ter começado. Depois era de esperar: Porcaria!


Estou cansado e triste, ao recordar tudo isto, mas há que criar forças, pois há tanto para contar!

Aqui para nós, a nossa Menina existiu e viu muita coisa!

Um abraço do tamanho do Cumbijã.
Mário Fitas


29 de Outubro de 2007:

Mário:

O teu testemunho é desassombrado, lúcido e corajoso... Autorizas-me que o publique, antes, durante ou depois da publicação da Pami Na Dondo (em folhetim, em partes) ?

Devo dizer-te que adorei a estória da Miriam, do furriel Mamadu e do Homem Grande. Vou ter que a publicar, com retrato e tudo... Não me vais dizer que não! Até porque está em livro... E se ela, a tua Miriam, está viva e alguém lhe contar/ler a estória (o que é de todo improvável), ela vai ter de novo orgulho em ti, saudades de
ti...

É uma belíssima história de amor (por que não ? de ternura, de paixão, de atracção, de solidarieddae humana...) em tempo de guerra. A malta tem imenso pudor em falar disto, dos amores e desamores em tempo de guerra, da sexualidade, da descoberta dos outros/as.

Os meus parabéns, Mário.

29 de Outubro de 2007:
Luís,

Obrigado pelas tuas palavras. Do que está escrito nos meus livros, estás à vontade, podes publicares no Blogue tudo o que quiseres. Não são obras-primas de literatura, mas sei a força que têm.

Quanto à Pami, acho que não devo tocar, o livro foi escrito assim! Deve assim ficar, só com a inclusão de algumas fotos que são referência do que está escrito. Nesse aspecto, o Briote ofereceu-se, para me dar uma ajuda para tratar das fotos em termos informáticos, o que para mim é um grande favor. Agradecia também a inclusão do prefácio do Coronel Costa Campos, pois é um depoimento de grande valor (4).

Quanto ao que ontem escrevi, és livre de publicares o que quiseres. Não há problemas absolutamente nenhuns, eu o que não quero é que haja quem fique machucado, com o que eu escrevo.

Quanto a mim sou um homem livre e assumo os meus actos, tive a felicidade de ter dois homens extraordinários perto de mim. Meu avô materno João Fitas, monárquico e católico, que me tratava por companheiro, e meu pai António Vicente que me contou a chacina de Badajós - ainda eu era puto - à qual ele assistiu, e muita fome matou aos desgraçados que fugiam da morte.

Um Abraço do tamanho da minha Planície.

Mário Fitas

___________

Notas de L.G.:

(1) Mário Fitas foi Fur Mil Op Esp, da CCAÇ 763 (Cufar 1965/66); é autor dos dois romances sobre a guerra da Guiné

Vd. posts de:

12 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2043: Bibliografia de uma guerra (22): Putos, Gandulos e Guerra, de Mário Vicente, aliás Mário Fitas (CCAÇ 763, Cufar)

5 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1926: Bibliografia de uma guerra (21): Pami Na Dondo ajuda-nos à reconciliação com a guerrilha (Virgínio Briote / Carlos Vinhal)

2 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1911: Bibliografia de uma guerra (19): Pami Na Dondo, guerrilheira do PAIGC, o último livro de Mário Vicente (A. Marques Lopes)

27 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1893: Notícias de Cadique (Mário Fitas, CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)

26 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1884: Tabanca Grande (16): Mário Fitas, ex-Fur Mil da CCAÇ 763 (Cufar, 1965/66)

(2) Vd. pots de:

20 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2197: A nossa Tabanca Grande e As Duas Faces da Guerra (4): Encontro tertuliano no hall da Culturgest na estreia do filme (Luís Graça)

(...) "(xvii) O Mário Fitas, que não conhecia pessoalmente e que a teve a gentileza de me oferecer um exemplar dos seus dois livros; no mais recente (Pami Na Doindo, a guerrilheira) escreveu a seguinte dedicatória:

"Silêncios parados, ressoar de passos do passado! Para o Dr. Luís Graça, agradecendo toda a disponibilidade para com todos os que fizeram o 'Vietname Português'. Um abraço sincero do Mário Vicente.

"Obrigado, Mário, o Doutor é que está mais, camarada! Fica o pedido de autorização para publicares no nosso blogue a belíssima narrativa da tua guerrilheira". (...)

22 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2202: A nossa Tabanca Grande e As Duas Faces da Guerra (8): Voltei a Cufar e a chafurdar nas bolanhas e rios de maré (Mário Fitas)

(3) Vd post de 4 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1919 - Tabanca Grande (22): Gilda Pinho Brandão, uma nova amiga

(4) Já foi aqui publicado: Vd. post de 2 de de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1911: Bibliografia de uma guerra (19): Pami Na Dondo, guerrilheira do PAIGC, o último livro de Mário Vicente (A. Marques Lopes)

(...) "É uma edição do autor, de Julho de 2005, patrocinada pela Junta de Freguesia do Estoril. O Prefácio é da autoria do Coronel Carlos da Costa Campos, e diz assim (Subtítulos da responsabilidade do editor do blogue)" (...)



(5) Episódio sangrento da guerra civil de Espanha, que foi presenciada pelo jornalista português Mário Neves, do Diário de Lisboa:


Sitografia (sumária):


Blogue de José Viale Moutinho > 19 de Março de 2006 > 129 livros sobre a guerra civil de Espanha (e depois)

Fundação Mário Soares > O repórter Mário Neves na Guerra Civil de Espanha > A chacina de Badajoz





Cópia da página da edição do Diário de Lisboa, de 15 de Agosto de 1936, 2ª tiragem, com a famosa reportagem de Mário Neves sobre a reconquista da cidade de Badajoz pelos franquistas e a chacina dos vencidos.

Fonte: Fundação Mário Soares (2007) (com a devida vénia...)

(...) "Quando Mário Neves, com apenas 24 anos, e ainda estudante de Direito, foi incumbido da sua primeira e derradeira prova como repórter do Diário de Lisboa, nunca iria imaginar as repercussões internacionais que iria ter o seu testemunho da tomada violenta de Badajoz por parte das tropas nacionalistas.

"A 'Matança de Badajoz' foi presenciada em primeira mão por três jornalistas: Reynolds Packard, da United Press, Jacques Berthet, do Temps, acompanhados por Mário Neves. Estes jornalistas, e mais tarde Jay Allen, correspondente do Chicago Tribune, foram os primeiros a denunciar a violência e a 'inflexível justiça militar' realizada pelo Exército de África, comandado pelo tenente-coronel Yagüe.

"Estes testemunhos directos e oculares iriam ter um impacto muito forte na imagem que os rebeldes nacionalistas queriam dar ao mundo, de libertadores da barbárie e da anarquia.
Para Mário Neves significou a última oportunidade de apresentar a verdade, já que depois do seu artigo de 16 de Agosto de 1936, a crónica do dia seguinte foi integralmente censurada e ele próprio envolvido numa polémica internacional sobre a veracidade dos relatos, que se arrasta até aos nossos dias.

"Se em Portugal a faceta violenta do Exército de África foi facilmente neutralizado pela censura, no estrangeiro as repercussões foram enormes, e o Governo Português foi associado e condenado pela colaboração com a facção nacionalista, num período em que ainda estava a ser delineada a política de 'neutralidade' assumida oficialmente por Salazar" (...)