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segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23644: Voltamos a recuperar as antigas cartas da província portuguesa da Guiné, um dos recursos mais preciosos do nosso blogue - Parte I: De Aldeia Formosa a Buruntuma

1. Certos recursos do blogue, tais como as cartas ou mapas da Guiné, alojadas desde finais de 2005 na página pessoal do editor Luís Graça, cujo servidor era o da ENSP/NOVA, ficaram  temporariamente, indisponíveis, há alguns meses atrás. 

A página "Saúde e Trabalho" tinha já 23 anos, remontando a 1999... Chegou agora ao fim, por razões técnicas, que são alheias ao seu autor. (A "webpage" da ENSP/NOVA foi complemente redesenhada e reformulada ) 

Pedimos, na altura,  desculpa, aos nossos leitores, pelo incómodo, uma vez que ficaram privados da consulta "on line" das cartas da Guiné e outros recursos. Mas felizmente, já recuperámos todos esses ficheiros (através do gabinete de informática da ENSP/NOVA), e  começamos hoje a pôr as cartas de novo "on line", mas no nosso blogue, a partir do Arquivo.pt. 

Para já podem ser consultados no Arquivo.pt (https://arquivo.pt):  podem usar descritores  como por exemplo "mapa de Bedanda", "mapa de Bissau", "mapa de Bolama".

Repomos já aqui algumas das cartas, é só carregar no link:


Cartas na escala de 1/50 mil - Parte I

Aldeia Formosa (hoje Quebo) (vd. Xitole)

Bafatá (1955)
 
Bambadinca (1955) 
(inclui rio Geba Estreito, Nhabijões, Finete, Missirá, Fá Mandinga, Geba...)

Banjara (1956)

Bedanda (1956) (inclui Cufar, rio Cumbijã...)

Beli (1959) (inclui Rio Corubal...)

Bigene (1953) (inclui Barro, Ganturé, rio Cacheu, fronteira com o Senegal...)

Binta (1954) (inclui Olossato...)

Bissau (1949) (inclui Brá, Bissalanca, Nhacra, Safim, Cumeré, estuário do Rio Geba...)

Bissorã (vd. Mansoa)

Bolama (1952) (inclui Ilha das Galinhas)

Buba (vd. Xitole)

Bula (1953) (inclui João Landim, rio Mansoa, Binar, Encheia, Biambe...)

Buruntuma (1957) (inclui fronteira com a Guiné-Conacri)

Madina do Boé (1958) (inclui fronteira com a Guiné-Conacri...)

Mansoa (1954) (inclui Bissorã, Emcheia, Jugudul, rio Mansoa...)

(inclui Buba, Mampatá, Chamarra, rio Corubal, rápidos de Cusselinta, Aldeia Formosa...)

 (Continua)

2. Recorde-se a história destas cartas ou mapas:


Quando voltou à Guiné-Bissau, em 1996, em viagem de negócios (mas também em romagem de saudade), o Engenheiro Técnico Humberto Reis (ex-furriel miliciano da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) já tinha adquirido as 72 cartas da antiga província portuguesa, à escala de 1/50.000. 

"Em Dezembro de 94 já me custaram 450$00 cada uma". O mapa geral custou 600$00." (A valores de hoje, correspondem a  3,8 euros e 5,07 euros, respectivamente).

Para os eventuais interessados, essas cartas podem (ou podiam em fevereiro de 2006...) ser adquiridas no Centro de Documentação e Informação do Instituto de Investigação Científica e Tropical, em Lisboa. 

Alertava-se para o facto de algumas cartas poderem já estar esgotadas. Na altura fora exigida ao Humberto Reis uma declaração da embaixada da República da Guiné-Bissau, a qual se transcreve, como simples curiosidade, com data de 29 de Dezembro de 1994:

"A Embaixada da República da Guiné-Bissau em Portugal declara, para os devidos efeitos que está o sr. Eng. Humberto Simões dos Reis autorizado a adquirir cartas geográficas da Guiné-Bissau.

"Para que não haja nenhum impedimento a tal objectivo, se passou a presente declaração que vai ser assinada e autenticada com o carimbo a óleo em uso nesta Missão Diplomática".


Presumimos que esta exigência de autorização da embaixada da Guiné-Bissau, em Lisboa,  para um turista levar consigo cartas geográficas do país, fosse ditada, na época, por razões de "segurança de Estado".

Na altura declarámos expressamente que a divulgação destas cartas, no nosso blogue.  de modo algum pretendia pôr em risco a independência e a soberania do país irmão. Nem muito menos podia ser interpretada como uma provocação. 

Também não tinha quaisquer propósitos comerciais ou outros, de índole lucrativa. Pretendia-se apenas prestar um serviço útil a todos os antigos combatentes da guerra da Guine (1961/74), independentemente do lado em que combateram, e nomeadamente aos membros da nossa tertúlia. Julgamos que podia (e pode)  ser útil também a todos os demais amigos do povo guineense e aos próprios guineenses.

Além de serem um documento de interesse historiográfico (e sentimental), e apesar de algumas lacunas (tem já mais de meio século, são muitas delas dos anos 50/60), estas cartas são sobretudo importantes  para a reconstituição da memória dos lugares e a reorganização da memória (individual e colectiva) dos antigos combatentes portugueses (sem esquecer os do PAIGC) que estiveram aquartelados e/ou envolvidos em operações na antiga província portuguesa da Guiné, hoje Guiné-Bissau. Para já dão-nos um retrato muito fiel da geografia da Guiné antes da guerra (incluindo a dimensão aproximda das diversas povoações, muitas delas desaparecidas com o início da guerra: houve regulados inteiros que ficaram sem gente, sem tabancas...).

Fica também aqui a nossa homenagem aos nossos valorosos cartógrafos militares portugueses. A cartografia portuguesa deu cartas (no duplo sentido do termo) ao mundo, é bom é dizê-lo. Às vezes (muitas vezes, quase sempre) tenho orgulho de ser (por)tuga. 

Estas cartas da Guiné são pequenas obras-primas, resultantes do levantamento efectuado aos longo dos anos 50 pela missão geo-hidrográfica da Guiné – Comandante e oficiais do N.H. Mandovi e do N.H. Pedro Nunes. A fotografia aérea é da Aviação Naval. O trabalho de restituição foi feita pelos Serviços Cartográficos do Exército. As fotolitografias e a impressão foram feitas em várias casas, de Lisboa, Porto, V.N. Gaia. 

A imagem em geral é  de boa qualidade, graças também à fotolitografia de casas como a  Papelaria Fernandes e a Arnaldo F. Silva (em geral, são os melhores trabalhos, os destas casas)… e à posterior digitalização feita na Rank Xerox. 

A imagem original tem 10 MB. Como habitualmente, a imagem que está disponível on line foi reduzida a um 1/3 da dimensão original…

A edição é da antiga Junta das Missões Geográficas e Investigações do Ultramar, do antigo Ministério do Ultramar.  

Convirá recordar que a sua paciente digitalização foi efectuada pelo Humberto Reis na Rank Xerox, em 2006. (Ele não nos disse quanto pagou, mas não deve ter sido barato...). Eu passei cada um destes pesadíssimos ficheiros (10 ou mais Mb) para outros mais leves (da ordem dos 2 Mb), procurando manter a qualidade da imagem (que tem alta resolução)...

Ao Humberto Reis, nosso mecenas,  mais uma vez a nossa gratidão pela sua generosidade (todo este trabalho foi pago do seu bolso) e a nossa homenagem ao seu carinho pela Guiné-Bissau e pelos guineenses. Não é por acaso que ele é o nosso "cartógrafo-mor" e colaborador permanente, desde então. (*)
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 19 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12476: Blogoterapia (245): Homenagem ao nosso 'cartógrafo-mor', Humberto Reis, para o quem o nosso blogue tem uma dívida de gratidão... Que o bom irã do nosso poilão lhe dê amor, saúde, patacão, longa vida... e bons augúrios para 2014!...

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19173: Historiografia da presença portuguesa em África (136): Dois mapas da Guiné, 1948, 1951: quantas dúvidas, quantas interrogações (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
Nunca debatemos aqui a fundo as cartas geográficas da Guiné, antes e durante a guerra e após a independência. As cartas concebidas com a ajuda soviética nos anos posteriores à independência foram um desastre eloquente, estão postas de parte, tal o volume de erros, com distâncias inconcebíveis.
As cartas com que combatemos andavam próximo da realidade, com a natural exceção de que com a passagem dos anos as antigas localidades iam desaparecendo, tomadas pela natureza.
O exemplo de que hoje me socorro são duas cartas, uma com a data de 1948 e outra publicada em 1951, não têm nada uma a ver com a outra, a não ser o nome das principais localidades e o rigor das linhas fronteiriças. O resto é um acervo de dúvidas, hoje irresolúveis, o que levou aqueles geógrafos a referirem povoações inexistentes e posicionamento de etnias totalmente fora da realidade? Isto só para dizer que os historiadores não podem na sua atividade excluir mais este escolho: quem ali vivia e efetivamente ali vivia.

Um abraço do
Mário


Dois mapas da Guiné, 1948, 1951: quantas dúvidas, quantas interrogações

Beja Santos


 (Clicar nos mapas para ampliar)

Quando consultamos as cartas geográficas anteriores àquelas que utilizámos na nossa atividade operacional, elaboradas pelos Serviços Cartográficos do Exército e que contaram com os trabalhos da Missão Geoidrográfica da Guiné, encontramos disparidades de monta. Sugiro, como exercício, que tomemos como referência estas duas cartas geográficas. A primeira foi impressa no Instituto Geográfico e Cadastral, em 1948. Encontramos nela bastante precisão. No trabalho que levo em curso sobre a história do BNU na Guiné, encontrei inúmera informação sobre o início da luta armada. O gerente do BNU em Bissau possuía muito boa informação confidencial e tinha acesso à documentação produzida pela gerência da Sociedade Comercial Ultramarina. Ficamos a saber, por essa documentação, como iam evoluindo as infiltrações do PAIGC, veja-se a região Sul, em meses Xugué, Salancaur, Caboxanque, Cadique, Cafine, Cacoca e Campeame foram sistematicamente sujeitos à pressão do PAIGC, as populações do Sul, ao longo de 1963 foram-se concentrando em Cacine, Cabedu, Catió, Bedanda e Empada. Podemos olhar para a carta e perceber a quase ausência populacional na chamada região do Gabu, as povoações contam-se pelos dedos.

Tive acesso a este esboço da colónia da Guiné através de uma carta adquirida na Feira da Ladra. A segunda carta vem publicada num livro em que muitos de nós estudámos, intitulado “Novo Atlas Escolar Português”, por João Soares, Sá da Costa, 1951. A carta, teoricamente mais recente que a anterior, exclui a generalidade dos nomes que vêm referidos na de 1948, e que se traduziram nos ataques do PAIGC na região Sul e que levaram à concentração populacional em lugares como Gadamael, Cacine, Catió, Cufar, Bedanda e Empada. Refere populações predominantes que não tinham nada a ver com a realidade: nem a região Leste e Centro era esmagadoramente constituída por Fulas, nem a região Sul por Beafadas, não há uma só referência a Mandingas ou mesmo Felupes, destacam-se os Nalus, que já naquele tempo eram uma perfeita minoria. Igualmente o nome das povoações deixa muito a desejar: falando de um território que palmilhei, do outro lado de Bambadinca, refere-se Sambel Nhanta, que há muito não existia, nem mesmo Caranque Cunda e muito menos Checibá de que nunca encontrei qualquer referência. Nunca encontrei qualquer estudo, tirando o trabalho sobre a antroponímia de Teixeira da Mota, que permita pôr luz sobre a verdadeira posição das localidades, em diferentes períodos temporais, e um efetivo posicionamento de etnias, pelo menos no período correspondente à chamada ocupação efetiva, depois de 1915.

Tudo isto para dizer que esta complexidade de fixação de etnias e de designação de povoações dificulta qualquer trabalho historiográfico, subtraindo-lhe rigor e autenticidade. É este um dos empecilhos quase irresolúveis, dado o progressivo desaparecimento dos mais velhos, que poderiam contribuir para dar uma certa ordem e clarificação aos nomes do passado e a sua relação com os nomes do presente.
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Nota do editor

Último poste da série de 31 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19152: Historiografia da presença portuguesa em África (134): Relatório anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1932 (Mário Beja Santos)