Mostrar mensagens com a etiqueta português. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta português. Mostrar todas as mensagens

domingo, 19 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8449: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (14): 16 de Dezembro de 2009, o Gabu, onde se fala mais francês do que português... (Parte I)




















Guiné-Bissau > Região do Gabu > Gabu > 16 de Dezembro de 2009 > A nova capital do leste, que veio destronar a decadente mas encantadora Bafatá, colonial... "Cidade comercial", diz o João... Onde se fala mais francês do que português, e correm muitos CFA... Das fotos, ressalta a ideia de dinamismo económico, de consumo, de vida, de direito à "felicidade", enfim, a ideia de uma nova África com futuro, que parace contrastar com quase todo o interior da Guiné... Pura ilusão ? O João foi, mais uma vez, "superlacónico" no seu diário, deixando a sua Nikon falar... (LG).


Fotos: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservado.


1. Continuação da publicação das notas do diário de viagem à Guiné, do João Graça, acompanhadas de um selecção de algumas das centenas fotos que ele fez, nas duas semanas que lá passou (*)...


16/12/2009, 3ª feira, 12º dia, visita a Gabu [, antiga Nova Lamego]

12.13. Gabu. Dei um passeio com Ali. Cidade Comercial.

(Continua)


[ Revisão / fixação de texto / título / selecção, edição e legendagem de fotos: L.G ]

___________

quarta-feira, 31 de março de 2010

Guiné 63/74 - P6080: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (12): Guileje, Faro Sadjuma, S. Domingos... Ecoturismo e empreendedorismo no feminino





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje >  Núcleo Museológico "Memória de Guiledje" > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 28 de Março de 2010 > "Mais um elemento reconstruído no antigo quartel de Guiledje".  Foto tirada em 6 de Janeiro de 2010.


"A criação e funcionamento do Museu de Guiledje, assim como a reconstrução da Capela e da Almadjadja, foram momentos importantes para se iniciar a concepção do Núcleo “Memória de Guiledje”.

"A eles, junta-se agora a reconstrução de parte da vedação de arame farpado e a colocação do sistema de alerta que os militares portugueses implantaram, baseado em garrafas vazias penduradas e que tilintavam ao menor abanão.

"Está-se agora na fase de tentar ordenar a parte de oficina e serviços, através das fotografias cedidas pelos militares de várias companhias que por aqui passaram, de modo a reconstruir-se uma das infraestruturas que dará lugar à construção da sede da futura Área Protegida Transfronteiriça de Guiledje".






Guiné > Região de Cacheu > S. Domingos >   AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 14 de Março de 2010 >  "Aprender a escrever para tomar conta do seu negócio" >  Foto tirada em 8 de Fevereiro de 2010.


"Hoje, Alima Fati, sob o olhar atendo e satisfeito das suas colegas vendedoras, Quinta Lima e Angélica Mango, regista directamente no seu bloco de notas, as receitas da venda dos seus produtos hortícolas no Mercado Comunitário de S.Domingos.


"Hoje, depois de aprender a ler e a escrever num dos círculos de alfabetização promovidos pela AD em todo o sector geográfico, ela gere melhor o seu negócio, registando as despesas e receitas que vai fazendo, podendo assim melhor utilizar os lucros obtidos com a sua actividade de 'bideira'.


"Hoje, tal como ela, centenas de outras mulheres frequentam cursos de alfabetização em português apoiados pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional, com a supervisão de especialistas cubanos, que introduziram a metodologia de alfabetização via televisão, designada por AlfaTv."




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Faro Sadjunma >  AD - Acção para o Desenvolvimento >   Foto da semana > 21 de Fevereiro de 2010 > Turismo rural: "dormir com o aroma do ananás" > Foto tirada em 26 de Junho de 2009.


"A tabanca de Faro Sadjuma, a 15 km de Guiledje, dispõe de um complexo de turismo rural que oferece alojamento e alimentação aos cada vez mais numerosos turistas que vêm conhecer esta parte do país.

"Situada no meio de uma exploração agrícola onde se pode comer abacates, mandarinas, ananases, bananas, mangas e cajus colhidos no momento, dispõe de 3 bungalows para duas pessoas cada, água corrente e luz eléctrica através de energia solar durante todo o dia e o fornecimento de bebidas frescas.

"Esta unidade é propriedade de Fatú Coulibali, horticultora de uma simpatia transbordante e um dinamismo de fazer inveja nos seus 60 anos de idade, marcado por um sorriso cativante a que se junta uma mão de ouro no preparo de cozinhados locais".

Fotos: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2010) (Reproduzidas com a devida vénia...)

domingo, 7 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4476: Agenda cultural (15): Lançamento em Macau, em 27 de Maio último, da antologia de poemas de Han Shan, trad. de A. Graça de Abreu

S/l > S/d > O nosso camarada António Graça de Abreu com a esposa, médica, de nacionalidade chinesa. O casal vive em Portugal. Em 17 de Maio último, ele tinha-nos dito: "Vou para Macau 6º. feira, dia 22 de Maio. Regresso de Macau dia 5 de Junho. Lá vai ser lançado o meu último livro, Poemas de Han Shan. Han Shan é um homem fabuloso, meio budismo zen, meio quase tudo. Claro que estarei no nosso encontro na Ortigosa, dia 20. Dia 3 de Julho parto para Xangai com os meus filhos (a minha mulher já lá estará) e só regresso de Xangai no dia 3 de Setembro. Não viajo para a China há quatro anos, vou-me reciclar".

Foto: © António Graça de Abreu (2009). Direitos reservados.

Sítio do diário, em língua portuguesa, Hoje Macau, edição de 5 de Junho último. Carlos Morais José é o director do jornal cuja propriedade é da empresa Fábrica de Notícias Lda. Sede e redação: Macau (China).

Na edição de 27 de Maio último, o nosso camarada e amigo António Graça de Abreu deu uma importante entrevista, a propósito do seu último livro, lançado nesse dia, uma antologia de poemas de
Han Shan (Séc. VIII), traduzidos para português. É um acontecimento que saudamos, que honra a cultura portuguesa, que reforça o papel da língua portuguesa no mundo e que contribui para o aprofundamento das relações entre Portugal, a China e a comunidade dos países de língua portuguesa... Naturalmente, é também um motivo de alegria e de orgulho termos um dos nossos camaradas com uma estrelinha a brilhar no céu do antigo Império do Meio...

Reproduzimos aqui, com a devida vénia, essa entrevista, conduzida por Paulo Barbosa (LG)


Sinólogo António Graça de Abreu apresenta hoje antologia de Han Shan > “A poesia é intraduzível”

por Paulo Barbosa

Hoje Macau, 27 de Maio de 2009


"Poemas de Han Shan” é o nome da antologia que hoje, pelas 18h30, é lançada na galeria da Livraria Portuguesa [ em Macau]. A colectânea foi traduzida para português por António Graça de Abreu, que nesta entrevista fala na importância do clássico poeta budista e nas dificuldades do trabalho de tradução do texto chinês.

Licenciado em Filologia Germânica e mestre em História, António da Graça Abreu foi docente de língua e cultura portuguesa em Pequim e Xangai (*). Para além de tradutor, é autor de diversos livros de poesia e de um livro de memórias sobre a sua participação na Guerra Colonial, entre 1972 e 1974.

HM – Quem foi Han Shan?

AGA – Ninguém sabe quem foi, não se sabe se existiu realmente, em que ano nasceu ou morreu. Mas há uma antologia de poesia da dinastia Tang que tem trinta mil poemas de dois mil poetas e que foi publicada em 1705. Aí aparecem 311 poemas deste homem [dos quais a antologia editada pela COD publica cerca de metade].

No entanto, a sua fama ultrapassa fronteiras. Era um poeta muito querido dos Itálicobeatnicks, graças às traduções para inglês de Gary Snider, o protagonista do livro “Vagabundos do Dharma”, de Kerouac.

Sim, ele é um clássico da literatura chinesa, embora tenha passado um bocado despercebido na China, onde estou convencido que vai ser recuperado. Mas é muito conhecido no Japão, por ser um poeta do budismo chan (zen, em japonês), que ali foi introduzido no século XII.

Nas décadas de 1950 e 1960, a beat generation descobriu-o. Aliás, o Jack Kerouac, que é um nome importante na literatura norte-americana moderna, dedicou o livro “Vagabundos do Dharma” a Han Shan. Este homem é tão importante que, no Japão, o Matsuo Basho [1644-1694], um dos grandes poetas do país, utilizava epígrafes dos seus poemas nos haiku [forma de poesia tradicional japonesa] que escrevia.

Quais são os temas recorrentes na poesia de Han Shan?

É um homem muito curioso, porque se retira para a montanha como eremita, mas depois, de vez em quando, escreve uns poemas com saudades do mundo cá de baixo: sente falta das meninas bonitas, da boa comida... Os temas são os normais na poesia deste período. Por exemplo, a brevidade da vida.

Ontem, apenas com 16 anos
eram jovens, fortes e apaixonados.
Hoje têm mais de setenta, extingue-se o vigor, vão perecer.
São flores num dia de Primavera, abrem de manhã, murcham ao entardecer.


A ligação com a Natureza é outro tema muito vulgar da poesia chinesa. O homem retira-se da confusão e da selvajaria e vai meditar para a montanha, o que significa, para os budistas, deixar de pensar, esvaziar a mente e procurar ficar com a cabeça livre de qualquer tipo de pensamento pesado.

Há também uma crítica ao mau governo permanente do império, assim como aos avarentos e aos ricos, ou à gente que enriquece rapidamente, mas a quem “só as moscas apresentam condolências” quando morre.

Embora seja budista, não acredita na imortalidade. O poeta critica os monges, por terem um comportamento pouco conforme com a doutrina – as pessoas entravam para os mosteiros para sobreviver, não era por terem muito amor ao Buda.


Já havia traduções em português de Han Shan antes desta antologia?

Estas traduções já deviam ter sido feitas há muito tempo. Mas penso que fui a primeira pessoa a traduzi-lo em Portugal, em 1996, quando fiz uma pequena folha para os cadernos do Pen Club. A Ana Hatherly fez depois uma tradução de 25 poemas, a partir do francês, publicada pela Cavalo de Ferro.

A sua tradução é feita directamente a partir do chinês?

Sim, mas também utilizo o francês e o inglês. Isto porque quase ninguém consegue saber os caracteres todos. Uso dicionários de chinês-inglês e chinês-francês e consigo descobrir praticamente tudo. A minha mulher, que é chinesa, também me ajuda.

Ouvi-o dizer que as todas as traduções são impossíveis. Traduzir um texto deste género é reescrevê-lo? Não será preciso ser poeta, como o Graça Abreu também é?

O poema, quando aparece em português, já não é o poema em chinês. É por isso que a poesia é intraduzível. Quando chego à fase final do poema, já estou a fazer uma outra coisa, sobretudo se for um poema mais rebuscado. Vou dar um exemplo de um poema fácil de traduzir. Em tradução literal: “Eu habitar montanha/ausência pessoa conhecer/branco nuvem meio/sempre silêncio silêncio.”

Na minha tradução, ficou assim: “Habito a montanha/ninguém me conhece/no meio das nuvens brancas/O silêncio, sempre o silêncio.”

Isto tem que soar bem em português, essa é sempre a minha preocupação. Se o poema não tiver qualidade na língua de chegada, estamos a assassinar o poema. Quanto ao significado, é o mais próximo possível do que está em chinês, mas, em certos casos, é impossível. Por vezes, os caracteres podem ter vinte ou trinta significados; depois, o texto foi escrito em 700, há caracteres que passaram de um modo e outros que tinham um significado e hoje têm outro.


Portanto, nunca teremos uma tradução definitiva?


Há um poeta de Hong Kong que diz que cada poema é como um quadro: cada pessoa o interpreta como bem entender. O que tem que estar lá é o olhar. Se o quadro é sobre um rio, não podemos estar a ver a montanha.

Que outras traduções pretende fazer de poetas chineses?


O meu plano é traduzir todos os maiores poetas da China. Já traduzi quatro, nomeadamente Han Shan, Li Bai, Wang Wei e Bay Juyi. O problema é ter os apoios necessários para fazer este trabalho. Os livros vendem-se pouco e as pessoas estão cada vez menos motivadas para ler poesia. Mas julgo que estes livros, embora agora possam ter poucos leitores, vão ficando. A poesia de Camões, de Dante ou de Shakespeare nunca se desactualiza. O “D. Quixote” será lido daqui a duzentos anos. Embora em Portugal não se tenha essa ideia, alguns destes poetas que traduzo têm a dimensão de um Camões ou de um Dante.

Estes textos são do século oitavo. Em que condições chegaram até nós?

Na China antiga, as pessoas entretinham-se a copiar poemas, escrevendo com tinta da China sobre papel de arroz. Estavam habituados a copiar – ainda hoje é assim que se aprende chinês, copiando caracteres. Escreviam, por vezes, várias cópias e os poemas foram-se transmitindo de geração em geração através de novas cópias. Isto até à invenção chinesa da imprensa em caracteres móveis, que é anterior a Gutenberg.

Mas em todo esse processo há uma adulteração...


Há e há muitos poemas que se perderam. As antologias poéticas que foram sendo feitas ajudaram a preservar o legado.

Para além de tradutor, é também poeta com obra publicada. Está a trabalhar em algum novo livro de originais?

No ano passado, publiquei o livro “Cálice de neblinas e silêncios”, que tem uma forte influência chinesa e tenho outro já escrito, chamado “A cor das cerejeiras”. São uma espécie de haiku, onde surgem as inspirações japonesa e chinesa, assim como poemas de viagens, alguns deles retratando os cinco mil quilómetros que fiz de automóvel ao longo dos Estados Unidos. Agora, que estou reformado e tenho tempo livre, quero privilegiar a minha poesia e sobretudo a poesia chinesa, que é muito mais importante do que a minha.

[Revisão / fixação de texto: L.G.]

__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:

21 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3921: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (8): Um poema chinês do Séc. VIII com dedicatória à malta de Matosinhos (A. Graça de Abreu)

segunda-feira, 9 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4002: Nino: Vídeos (2): O amigo de Cuba... e de Portugal, que em Março de 2008 pedia mais professores de português (Luís Graça)




Guiné-Bissau > Bissau > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > Excerto da audiência que o Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira (1939-2009) deu, por volta das 12 horas, a cerca de duas dezenas de participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008).

O grupo incluía 3 cubanos, Oscar Oramas e Ulises Estrada (acompanhados do respectivo embaixador na Guiné-Bissau) e três ou quatro guineenses.

Uma boa parte eram ex-combatentes da guerra colonial, portugueses... Estiveram também presentes o Dr. Alfredo Caldeira, da Fundação Mário Soares, a Diana Andringa, jornalista e cineasta, e o José Carlos Marques, jornalista do Correio da Manhã. Creio que o Prof Doutor Patrick Chabal, o melhor biógrafo de Amílcar Cabral, também estaria presente. Há outros camaradas que fizeram parte da delegação, e que poderei mencionar mais tarde: por exemplo, o Coutinho e Lima e o Carlos Silva. Ao todo, não estariam na sala mais do que vinte pessoas (, número máximo imposto pela segurança presidencial).

A audiência foi decidida à última hora, ao que parece por vontade expressa do 'Nino' Vieira. Não estava prevista no programa do Simpósio, se bem que uma hora antes, fomos também recebidos pelo então 1.º Ministro, Martinho N'Dafa Cabi. Não estava prevista, de resto, qualquer intervenção do Presidente da República, que fazia apenas parte da comissão de honra (**).

Escusado será dizer que, nesta audiência, cada de um de nós se representava a si próprio. À entrada do edifício da Presidência fomos todos cumprimentados pelo Gen Tagme Na Waie que, se bem me lembro, não assistiu à audiência: julgo que ele não falava português, apenas crioulo... A sua presença não era, porém, de todo acidental: o Simpósio agitou as águas mornas de Bissau, e nomeadamente remexeu as memórias dos velhos combatentes... A essa hora, no Hotel Palace, havia comunicações em crioulo de gente que combatera em Guileje, do lado do PAIGC...

Como em todos os rituais de poder, o Presidente fez-se esperar, enquanto os seguranças e o homem do protocolo nos distribuíam pelos lugares disponíveis da sala, à volta da mesa em U. 'Nino' chegou e pôs-nos logo à vontade, tendo cumprimentado, um a um, todos os presentes à volta da mesa. E ao mesmo tempo ia metendo conversa com este e com aquele. Em resultado disso, eu não tive direito a um bacalhau... Enfim, o senhor passou à frente... Mas era visível a sua satisfação pessoal por estar ali, numa certa cumplicidade e furando o protocolo de Estado, a conversar com os antigos 'tugas' (a expressão é minha, ele nunca a usaria naquela circunstância)... 

Curioso: "circunstância da vida" é uma expressão que ele vai usar duas ou três vezes, e uma delas para comentar a decisão de Coutinho e Lima de retirar de Guileje... e lamentar a sua sorte... "Morto por circunstância da vida" poderia ser também o epitáfio a pôr, amanhã, no mausoléu onde será sepultado...

Ao lado de 'Nino', à sua esquerda estava um coronel, seu assessor e homem de confiança (João Monteiro, se não me engano). Dos portugueses, falaram a Diana Andringa e o Cor Art Ref Coutinho e Lima. Creio que também houve uma pequena intervenção do Carlos Silva, um homem que vai regularmente à Guiné e já tinha sido em tempos recebido pelo 'Nino'. (É advogado e tem clientes guineenses. Por brincadeira, chamo-lhe o régulo de Farim). Falou também o cubano Oscar Oramas e a guineense na diáspora Fernanda de Barros, intervenções de que não fiz registo.

Neste excerto de vídeo, de menos de 9 minutos, 'Nino' Vieira aborda três ou quatros temas:

(i) saudação aos representantes cubanos, cuja participação na luta foi evocada com apreço e reconhecimento, com destaque para apoio a nível dos serviços de saúde militares (o PAIGC nem sequer tinha enfermeiros e muitos feridos em combate morriam de infecções e falta de assistência (até 1' 45'');

(ii) a Op Amílcar Cabral, contra Guileje (18 a 25 de Maio de 1973), a evocação do famigerado 'Corredor da Morte' onde o PAIGC tinha frequentes baixas, a manifestação de apreço e admiração pelo comportamento do então major Coutinho e Lima que poupou vidas de um lado e de outro, e que ia ao encontro do pensamento de Amílcar Cabral que não queria a guerra (de 1' 45'' a 5'00);

(iii) a importância do ensino do português e da cooperação com Portugal e a CPLP; a confissão de ele, 'Nino', ter sido obrigado a emigrar para Conacri, para poder singrar na vida, antes de aderir ao PAIGC, pedido do presidente em exercício da CPLP para Portugal mandar mais professores de português para a Guiné-Bissau (de 5' 01'' até ao fim).

Desta audiência há ainda mais três pequenos vídeos que iremos aqui apresentar, sendo este o segundo. Embora de fraca qualidade, os vídeos poderão ter algum interesse documental, agora que morreu e vai a enterrar o último dos grandes combatentes da luta de libertação levada a cabo pelo PAIGC, o partido do Amílcar Cabral (1924-1973). O malogrado Tagme Na Waie, embora também um histórico da guerrilha, no sul, não tinha a mesma dimensão e estatura.

Uma nota final: Os vídeos não foram editados, alindados, cortados/censurados... Foram apenas divididos em partes inferiores a 10 minutos, o tamanho suportado pelo You Tube. Amigos e camaradas: façam com eles o que bem entenderem... Às vezes uma imagem vale mais do que mil palavras...

Vídeo (8' 43''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

Alojado em You Tube > Nhabijoes


Guiné-Bissau > Bissau > Palácio Presidencial > 6 de Março de 2008 > Audiência do Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira a um delegação dos participantes estrangeiros do Simpósio Internacional de Guiledje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008) > Um aspecto da sala de audiências, em forma de U. Ao fundo da sala, um segurança; no lado direito da foto, identifico dois camaradas nossos, do nosso blogue, o José António Carioca, ex-Fur Mil de Transmissões e Cripto, e Abílio Delgado, ex-Capitão Mil, ambos da CCAÇ 3477, Gringos de Guileje (Guileje, 1971/72). No lado esquerdo, a Professora Doutora Fernanda de Barros, uma feminista guineense na diáspora (vive no  Brasil, em São Paulo), e mais um ex-combatente português que não consigo agora identificar.

´
Da esquerda para a direita: Sérgio Manuel Silvestre de Sousa, ex-Fur Mil At, CCAÇ 3477 (Gringos de Guileje, 1971/72), Diana Andringa (RTP), Alfredo Caldeira (Fundação Mário Soares), Oscar Oramas (antigo Embaixador de Cuba na Guiné-Conacri, em 1973), Ulises Estrada (antigo combatente cubano, nas fileiras do PAIGC, 1966) e o embaixador de Cuba em Bissau.


Da esquerda para a direita: José Rocha, ex-Alf Mil, CART 2410, Os Dráculas, e Alexandre Coutinho e Lima, antigo Comandante do COP 5 (1973).

À saída do edifício da Presidência da República, a então Ministra dos Antigos Combatentes da Liberdade da Pátria, Isabel Buscardin, de costas; e um elemento da comissão organizadora do Simpósio, presidente da Assembleia Geral da AD - Acção para o Desenvolvimento, Roberto Quessangue.

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guileje > 3 de Março de 2008 > Os participantes cubanos Oscar Oramas, antigo embaixador de Cuba na Guiné-Conacri em 1973, e Ulisses Estrada, antigo 'combatente internacionalista' que integrou, como voluntário, as fileiras do PAIGC.

Ambos manifestaram o seu regozijo por voltar a encontrar antigos camaradas de armas (guineenses e cabo-verdianos) mas também também portugueses que estavam do outro lado da barricada... No final do Simpósio, Ulises Estrada fez um belíssimo improviso sobre o "momento histórico" que se estava a viver, ao juntar-se antigos inimigos, hoje reconciliados, num seminário "científico mas também político" que honrava e premiava "a qualidade do ser humano" (sic) (***)...

Fotos: © Luís Graça (008). Todos os direitos reservados
___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série > 8 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3996: Nino: Vídeos (1): Ouvindo a versão do Coutinho e Lima sobre a retirada de Guileje (Luís Graça)

(**) Recorde-se a composição do Comissão de Honra do Simpósio [A página já não está disponível. LG, 3/11/2014]

Presidente da República da Guiné-Bissau, General João Bernardo Vieira
Dr. Francisco Benante, Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau
Dr. Martinho N’Dafa Cabi, Primeiro-Ministro da Guiné-Bissau
Doutor Nuno Severiano Teixeira, Ministro da Defesa de Portugal
Doutor João Cravinho, Secretário de Estado da Cooperação Internacional de Portugal
Professor Doutor Patrick Chabal, docente da King’s College, Londres, Grã-Bretanha
Professor Doutor Luís Moita, Vice-Reitor da Universidade Autónoma de Lisboa, Portugal
Doutor Óscar Oramas, Ex-Embaixador de Cuba na Republica da Guiné-Conakry.
Professor Doutor João Medina, Professor Catedrático da Universidade de Lisboa, Portugal
Flora Gomes, Cineasta guineense
Professor Doutor Peter Mendy, docente no Rhoad Islands College, Boston, USA.

(***) Vd. poste de 24 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3090: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação do cubano Ulises Estrada

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3510: Blogoterapia (76): Só nós aguentávamos 2 anos a beber água podre e a comer arroz com estilhaços de chouriço (Paulo Raposo)

1. Mensagem do Paulo Raposo, com data de 18 de Novembro de 2008, comentando o poste de P3463 (*):


Meu caro Luís.

Obrigado, és da corda.

O soldado é uma pessoa singular, quando estou em Paris, entro nos Museus, com desconto devido ao meu cartão da Liga, como sócio combatente. Vétérant de Guerre.

O soldado tem de ser Honrado, tal como ele é, quer pelos seus, quer pelos inimigos.

Batemo-nos em África e na Índia uma luta que não era nossa. Foi a parte quente da guerra fria entre Rússia e América.

Nós mais uma vez é que levámos nas orelhas. Quem é que hoje aguentava 2 anos sem fins de semana, a beber água podre e comer arroz com estilhaços de chouriço?

Toda a gente se pergunta hoje, como é que nós, um punhado de rapazes, aguentámos uma luta de desgaste em tantas frentes.

É triste ver os dirigentes politicos desde o 25 de Abril a ter vergonha do grande Soldado Português que somos nós.

Não percebo. Uma coisa é o fim e o triste fim, outra é Honrar os nossos. Aquando da 1ª guerra foi o mesmo. As tropas expedicionárias foram entegues de bandeja aos ingleses sem critério enquanto os senhores em Lisboa discutiam política. Tratantes. Com remorsos levantaram monumentos aos mortos por todo o país. Mas não se limparam.

Assim estamos hoje.

Isto tudo para dizer, que aparecem no Blogue muitos testemunhos em que parece que nós eramos o mau da fita e os outros os bons.

Nós somos os bons e a geração de OURO. Se não fosse a porcaria da política, as nossas relações com as populações de África eram das melhores.

Dizem-me que hoje ainda, em Goa, a população vive com ar mais digno do que no resto da Índia.

O que será, talvez, é propaganda, para esconder a incompetência dessa malta.

Vai um abraço forte de um dos muitos soldados portugueses.

Paulo
________

Nota de L.G.:

(*) 17 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3463: Os nossos regressos (17): Estavam lá todos, a família, os amigos, mas não o meu pai... (Paulo Raposo)

(...)"2. Comentário de L.G.:

"O Paulo Enes Lage Raposo, que hoje vive em Montemor-o-Novo, onde criou, desenvolveu e dirigiu um belíssimo empreendimento hoteleiro (o Hotel da Ameira), foi Alferes Miliciano de Infantaria, com a especialidade de Minas e Armadilhas, na CCAÇ 2405, pertencente ao BCAÇ 2852 (Guiné, Zona Leste, Sector L1, Bambadinca, 1968/70).(Escrevo "dirigiu", no passado, por que acho que já passou a gestão para um dos filhos...).

"Durante a sua comissão, o Paulo esteve em Mansoa e sobretudo na zona leste (Galomaro e Dulombi), a sul de Bafatá. Uma nota trágica da sua comissão é a perda de 17 dos seus camaradas na travessia do Rio Corubal, em Cheche, na sequência da retirada de Madina do Boé, em 6 de Fevereiro de 1969 (Op Mabecos Bravios).

"Desde Abril até Setembro de 2006, o nosso blogue publicou o testemunho escrito que o Paulo elaborara em 1997 e que só era conhecido de alguns amigos e camaradas da sua companhia e do seu batalhão. É um documento policopiado, de 65 páginas, com o seu "testemunho e visão da Guerra de África", mais concretamente sobre a história da sua vida militar, desde a sua incorporação, como soldado cadete, em Abril de 1967, na Escola Prática de Infantaria, em Mafra, até à sua mobilização para a Guiné, como Alferes Miliciano da CCAÇ 2405, onde teve como camaradas os membros da nossa tertúlia Rui Felício, Victor David e Jorge Rijo (este último reformou-se dos seguros, e não temos sabido nada dele uma vez que o endereço de email não é mesmo" (...).

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P2976: Fórum Guileje (16): Como está a lusofonia em Bissau ? (António Rosinha / Luís Graça)


1. Mensagem do António Rosinha, com data de 15 de Abril de 2008. Recorde-se que o Rosinha foi Furriel Miliciano em Angola (1961) e, como civil, trabalhou na Guiné-Bissau, entre 1979/84, como topógrafo da TECNIL (1):



Assunto - O SIMPÓSIO DE GUILEJE E O QUASE DESAPARECIMENTO DO PORTUGUÊS E DO CRIOULO, DE UM PAÍS LUSÓFONO (2)


Luís, co-editores e co-tertulianos,

Penso que, ao lermos e vermos as reportagens sobre a referida viagem à Guiné [,por ocasião do Simpósio Internacional de Guileje, Bissau, 1 a 7 de Março de 2008,], uma das coisas que mais chama à nossa atenção é o facto de quase não ouvirmos guineenses a falar a nossa língua.

E, eu digo, até o próprio crioulo está muitíssimo rarefeito.

Escreveu o Luís Graça, que o Presidente Nino falou em professores que Portugal podia enviar...

Agora não vai ser o politicamente correto que vai-me limitar a relatar aquilo que eu assisti, durante vários anos, que levou ao lento desaparecimento da língua portuguesa, da terra onde havia imensos guineenses, lusoguineenses, suecos, soviéticos, etc. que falavam a nossa língua tão corretamente como qualquer um de nós.

A primeira razão foi aparecer o que o IN resolveu chamar as "zonas libertadas". Na realidade não eram libertadas, mas sim pura e simplesmente abandonadas, não só pelo exército português, como pelo PAIGC, isto ao ponto de passados 20 anos após a independência em Madina do Boé, reconhecida na ONU, para dar um exemplo, toda aquela região nunca mais teve escolas, médicos... E as visitas dos governantes eram muito raras, isto entre a jangada de Ché-Ché, Boé e toda aquela região fronteiriça.

A segunda razão foi a fuga de imensos falantes de um português correcto, entre eles, professores, funcionários, comerciantes, etc., logo após o 25 de Abril. Muitos vieram para Portugal, outros para Caboverde, outros para a França, e até para os países vizinhos. Com receio a qual IN? Pergunto, mas não respondo.

A terceira razão foi a fuga de imensos falantes de um português correcto, entre eles, professores, funcionários, comerciantes, etc., logo após o 14 de Novembro de 1980. Muitos vieram para Portugal, por exemplo Luís, o irmão de Amílcar, outros para Caboverde, França, e até para países vizinhos. Com receio a qual IN? Pergunto, mas não dou resposta.

A quarta razão foi a fuga de imensos falantes de um português correcto, entre eles, professores, funcionários, comerciantes, treinadores de futebol e jogadores, militares, em 1998, em que Bissau esteve ocupado pelo exército senegalês, e a nossa Marinha acompanhou de perto e nós em Portugal tivemos ocasião de assistir pela TV ao desembarque de muita daquela gente em Lisboa. Fugiram a qual IN?

Existem outras razões para o desaparecimento do português/crioulo, por exemplo, imensos doutores que foram, alguns ainda durante a luta com 10 anos de idade, subtraídos aos pais, enviados para a então URSS, e vieram com 24/25 anos, sem domínio do portugês nem crioulo. E mesmo, dos muitos guineenses formados que nos países do leste, os desprotegidos, como os que se formaram no ocidente, os protegidos, nem sempre regressam à Guiné. Porquê?

E as fábulas de donativos de ONG e de vários países que, quer durante a luta como durante muitos anos seguintes, continuaram a dar quer para a educação como para a saúde, mas que por azar não se notou nada no desenvolvimento daquele país. Porquê?

Termino por aqui, apenas para dizer algo que se deu comigo directamente: Foi-me exigido, no meu currículo para um determinado trabalho na Guiné, falar francês.

Penso que ao abordar este assunto não é intrometer-me nos assuntos da Guiné, mas apenas dar uma ajuda para compreender um ponto de vista da nossa guerra.

Um abraço
António Rosinha

2. Comentário de L.G.:

António:

Regressaste, da Guiné-Bissau, há 24 anos... É muito tempo. Não sei se lá voltaste. De qualquer modo a situação da lusofonia não terá piorado, como tu afirmas. Os guineenses, com quem eu lido em Portugal (nomeadamente, profissionais de saúde, médicos, etc.), mesmo quando estudaram na China, em Cuba, ou nos ex-países comunistas da Europa Leste, dominam o português, escrito e falado, e muitas vezes muito melhor que a generalidade da população portuguesa. Dirás que têm essa obrigação, já que pertencem a uma elite escolarizada, com formação universitária, etc. Organizações não-governamentais como a AD - Acção para o Desenvolvimento e que empregam dezenas de quadros e colaboradores (alguns dos melhores quadros da Guiné-Bissau) têm o português e o crioulo como línguas de trabalho. Os seus relatórios são em português, e de bom português. No contacto diário com as populações interiores utilizam, naturalmente, o crioulo. Durante o Simpósio contactei com um parte deles, e sempre falámos em português, em bom português.

Em Bissau, na semana do Simpósio Internacionald e Guileje, tivémos duas audiências, uma com o primeiro ministro e outra com o Presidente da República: a única língua que se falou foi o português. O próprio Simpósio Internacional de Guileje foi em português, embora tenha havido algumas intervenções em crioulo por parte de antigos guerrilheiros.

Há excelente gente, na Guiné-Bissau, a escrever excelente português... a fazer teatro, a fazer música, a fazer cinema, a fazer jornalismo... Em português e em crioulo (este mais falado do que escrito). E aqui, justiça seja feita, cabe também um papel de relevo ao Centro Cultural Português (CCP), que é dirigido pelo Frederico Silva, o diplomata português que nos acompanhou na visita ao sul da Guiné-Bissau, em 1, 2 e 3 de Março de 2008, no âmbito do Simpósio Internacional de Guileje.

Por exemplo, recentemente realizou-se, em Abril passado, o Encontro do Teatro da Guiné-Bissau 2008, com o apoio do CCP (mas também dos nossos amigos e parceiros da AD - Acção para o Desenvolvimento). E sobre esta iniciativa, pode-se ler-se no sítio Oficinas em Movimento - Oficinas em Língua Portuguesa do PASEG (Programa de Apoio ao Sistema Educativo da Guiné-Bissau)

(...) "O Encontro de Teatro da Guiné-Bissau 2008 contou com a participação de 13 grupos de teatro guineenses (dois deles do interior da Guiné-Bissau), com a realização de três ateliers na área do teatro (cada um com uma média de 25 formandos), dirigidos aos actores dos 13 grupos participantes, e com um debate final, no dia do encerramento, sobre o Teatro na Guiné-Bissau. Durante a semana do Encontro esteve ainda patente no Centro Cultural Português uma exposição permanente de fotografias, textos dramáticos, cartazes e históricos dos 13 grupos de teatro participantes.

(...) "O público foi incansável e, a cada dia, ia enchendo mais o Centro Cultural Português, onde cada grupo foi apresentando as suas peças de teatro. Nos dois últimos dias as actuações contaram com lotação esgotada! As apresentações do último dia, resultantes dos ateliers, foram de tal maneira enérgicas que o público permaneceu de pé a aplaudir actores e formadores. Foi difícil concentrar novamente os participantes na realização do debate sobre o Teatro na Guiné-Bissau, mas passada a euforia, os representantes dos grupos de teatro e o público trocaram ideias interessantes e capazes de inicar uma movimentação enriquecedora do teatro na Guiné-Bissau. No final, o PASEG ofereceu um Buffet a todos os presentes" (...).

Eu sei que a Guiné-Bissau não é o campeão da lusofonia, e está cercada por francófonos de todos os lados. Eu sei que a Guiné é uma frágil economia e está à beira de um garvce crise, devido à escalada e à escassez de bens essenciais, como o gasóleo e o arroz. Eu sei que os melhores fiulhos da Guiné-Bissau são hoje obrigados a emigrar. Eu sei que os sucessivos governos portugueses, depois do 25 de Abril, se calhar não têm feito, como é(era) esperado que o façam, o trabalho de casa, como deve ser, em matéria de cooperação com os países africanos de expressão oficial portuguesa... De qualquer modo, a escolha do português como língua oficial não foi imposta por nós, é uma opção livre e consciente dos guineenses! E isso é um motivo de orgulho para todos nós, lusófonos, e uma oportunidade de enriquecimento cultural mútuo. Implica também, naturalmente, direitos e deveres, de um lado e de outro.

Meu caro Rosinha, não podemos fazer da língua uma arma de arremesso, nem muito menos um instrumento de políticas neocolonilistas, ou um factor de divisão nas relações entre os nossos dois povos... Pelo contrário, deve ser um traço de união, uma ponte, entre nós... Por outro lado, nós, portugueses, não somos donos da língua portuguesa.... Às vezes comportamo-nos como se o fôssemos. Se não tivéssemos sido conquistados e colonizados pelos romanos, nunca Camões teria escrito os Lusíadas, nem Amílcar Cabral teria escrito em português: Mamãi Velha, venha ouvir comigo / o bater da chuva lá no seu portão... A chuva amiga já falou mantenha / e bate dentro do meu coração. Nem o Manuel Lopes ou o Pepetela ou o Mia Couto ou o Hondjaki ou a Paulina Chiziane teriam existido como escritores lusófonos.

Tudo isto parta te lembrar que os guineenses são também nossos parceiros na aventura da língua... Parceiros, pares, de igual estatuto, é bom não esquecê-lo!

E a propósito da lusofonia, vejam-se algumas citações constantes do sítio Portugal em Linha:

"A Lusofonia é o meu Bilhete de Identidade. Exibo-o (com orgulho, pois claro!) em Angola, Brasil, Cabo Verde, Galiza, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. A Lusofonia é, enfim, o ar puro que respiro onde quer que vá. A Lusofonia é a música com a qual exprimo os meus sentimentos. Canto-a alto e bom. A Lusofonia é a minha mátria, não largo os seus panos. O amor que nutro por ela é puro, verdadeiro. Por isso recuso-me a cultivar outra fonia que não a lusa" (Jorge Eurico).

"Por esse Mundo fora, literalmente, há mais de 200 milhões que se expressam através da Língua Portuguesa. Portugal em Linha consegue manter os cinco continentes unidos há 12 anos e o contributo desse esforço continuado é, muito provavelmente, mais relevante do que o trabalho desenvolvido por algumas instituições de designação sonora" (Paulo Silva).

"Porque partilhamos os mesmos valores, porque somos África e somos Europa, somos Mundo, é importante comunicar com Portugal…em linha" (Liliana Castro).

"A língua portuguesa é o principal veículo de comunicação de cerca de 200 milhões de falantes oficiais matizada pelas características impares de cada um dos 8 países e 1 região que a conjugam. E para isso conta com a ajuda inestimável do Portugal em Linha!" (Eugénio Almeida).

Não estou por dentro da situação do ensino do português na Guiné-Bissau, nem sequer acompanho com a atenção que devia, a actualidade política, social, económica e cultural da Guiné-Bissau. De vez em quando espreito os portais, as notícias, oiço a rádio e a televisão.... Mas tenho ideia que há hoje um maior empenhamento, por parte de Portugal, do Brasil, de Angola e de outros países lusófonos, em reforçar a lusofonia na Guiné-Bissau. Senti que o próprio Nino Vieira é hoje um dos paladinos da lusofonia, por razões estratégicas tanto internas como externas. O apelo que ele nos fez, pareceu-me sincero e sem complexos: mandem-nos professores de português, vocês que têm gente desempregada, e que aqui [, na Guiné-Bissau,] seriam preciosos!

Sei que a situação, à partida, é má. Já era muito má, no final dos anos 50, no início da guerra: vejam-se as conhecidas denúncias do fundador e líder histórico do PAIGC, um lusófono de grande nível intelectual, e que se orgulhava do português como língua, que escrevia em (e falava) um excelente português, e que impôs o português como língua (estrangeira) aos povos da Guiné que ele queria libertar...

Era o português que era ensinado nas escolas das tais regiões libertadas ou nas bases da rectaguarda, na Guiné-Bissau e no Senegal. Os manuais escolares do PAIGC, impressos na Suécia, eram escritos em português (e o primeiro foi em 1964)... O Amílcar Cabral podia ter escolhido o francês, para se libertar, mental, psicológica e culturalmente, pelo menos, da opressão dos colonizadores portugueses: porque não o fez ? ... Por que era um homem extremamente inteligente e culto, porque era uma estratego clarividente, porque era amigo do povo português, e porque o português foi a sua língua materna ou paterna (o pai, pelo menos, era professor pimário...). Este e outros factos não podem ser ignorados, escamoteados ou branqueados...

Sendo historicamente escassa a nossa presença humana no território da Guiné-Bissau, a situação da língua portuguesa também não melhorou excepcionalmente com a presença de algumas dezenas de milhares de soldados metropolitanos durante a guerra do ultramar / guerra colonial(1963/74). Houve alguns progressos, mas tardios. Recordo que, na altura em que eu estive na Guiné (1969/71), já sob o consulado de Spínola, os homens que faziam parte da minha companhia, a CCAÇ 12 (que nós fomos formar em Contuboel), não falavam nem escreviam português. Eram fulas, eram analfabetos (embora alguns soubessem algum árabe e algum francês), e por isso mesmo classificados e tratados como soldados de 2ª classe!!! Aprenderam a falar português comigo e com os outros camaradas, oriundos da metrópole... E alguns chegaram a graduados, depois de terem, com êxito, frequentado as nossas escolas militares e feito o exame da então 4ª classe, com manuais feitos em Lisboa, para as crianças portuguesas da Metrópole...

Rosinha: Há outras questões que levantas, e que eu agradeço, mas que não têm uma resposta fácil. De qualquer modo, nesta como noutras matérias, de natureza cultural, não me interessa tanto o passado, como sobretudo o que podemos fazer juntos, hoje e no futuro. Por que queremos justamente continuar a comunicar, mais e melhor, com os nossos amigos guineeenses, em português, em bom português. É por essa razão que eu não partilho, inteiramente, do teu pessimismo, mesmo sabendo que tens um grande carinho pelas gentes da Guiné, e que queres o melhor para elas.

Um grande abraço. Mantenhas. Luís Graça.
__________

Notas de L.G.

(1) Vd. postes de:

29 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1327: Blogoterapia (7): Furriel Miliciano em Angola, em 1961; topógrafo da TECNIL, em Bissau, em 1979 (António Rosinha)

11 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1358: Nostalgias (1): No cais do Xime, dois velhos Unimog pedindo boleia a algum barco (António Rosinha, ex-topógrafo da TECNIL)

14 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2178: Efemérides (6): 24 de Setembro de 1973... Quo Vadis, querida Guiné ? (António Rosinha / Leopoldo Amado)

22 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2201: RTP: A Guerra, série documental de Joaquim Furtado (2): Eu estava lá em 1961 e lá fiquei até 1975 (António Rosinha)

17 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2274: RTP: A Guerra, série documental de Joaquim Furtado (6): Luís Cabral, os assimilados e os indígenas (António Rosinha)

8 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2420: Notas de leitura (6): Amílcar Cabral, um lusófono fazedor de utopias (António Rosinha)

(2) 13 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2754: Fórum Guileje (15): Há ainda muita gente do PAIGC calada... Por medo ? Por falta de domínio da língua de Camões ? (Mário Fitas)

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2903: Não venho falar de mim... nem do meu umbigo (Alberto Branquinho) (1): Palavras e expressões do crioulo


1. Mensagem do Alberto Branquinho, que foi alferes miliciano na CART 1689 (1967/69), tendo passado por Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá (1).

Com este gesto e esta colaboração, que há que saudar, o nosso camarada Alberto Branquinho, jurista de formação, irmão de um outro Branquinho, o António (que foi Fur Mil, no Pel Caç Nat 63, ao tempo do Jorge Cabral, 1969/71) (2),fica automaticamente ligado à nossa Tabanca Grande. Camarada: não querendo falares de ti (nem do teu umbigo), ficas com a liberdade de nos mandar umas fotos tuas para o nosso álbum...E esperaremos conhecer-te pessoalmente num próximo encontro. Até lá, obrigado, pelas tuas eruditas e interessantes reflexões sobre algumas palavras e expressões do crioulo guineense que nós utilizávamos/utilizamos, nem sempre com a devida propriedade e rigor... Espero que alguns dos nossos camaradas e amigos (o Mário Dias, o Pepito, o Leopoldo Amado...), que conhecem e falam bem o crioulo da Guiné-Bissau (mas também os que o arranham, como o Zé Teixeira...), também possam dar o seu contributo... (LG).

Caro Luis Graça:

Proponho-me escrever (sob o título que vai no anexo a este mail) àcerca de assuntos e acontecimentos relacionados com a minha experiência na Guiné, mas nunca sendo eu o centro ou o tema.

Para o primeiro tinha coligido um conjunto de palavras do crioulo guineense. Depois vi que constavam já do léxico que está no blogue, à esquerda. De qualquer modo, é esse o tema que vai junto.

Um abraço
Alberto Branquinho


1. Nova série: Não quero falar de mim... nem do meu umbigo (1) > Palavras e expressões do crioulo da Guiné

por Alberto Branquinho


Decidi respigar da minha memória palavras e expressões do crioulo da Guiné, procurando encontrar a origem ou explicação para elas. Se quanto a algumas a sua origem é óbvia, por ser fácil detectar a palavra de onde provêm, quanto a outras é um mistério, o que as torna interessantes.

O crioulo cabo-verdeano, embora semelhante, é substancialmente diferente e, além disso, difere, também, entre os grupos de ilhas.

Ao confrontar essa lista de palavras e expressões com as do léxico da coluna da esquerda no blogue, verifiquei que, afinal, estavam lá todas. Tenho, no entanto, comentários quanto a algumas delas.

Haverá obra(s) de linguística sobre o crioulo guineense ? Se alguém souber ou desejar, comente e acrescente p.f., porque a mim cá sibe ( como disse Diana Andringa, em jeito de despedida, nas vésperas do último 25 de Abril, depois da projecção de As duas faces da guerra no Malaposta, ao Senhor Roubado).
_________

ASSIM:


a) Abo – você, tu

Tal como quando o próprio se refere a si mesmo diz A mim (eu), também, quando se dirige ao seu interloctor deveria escrever-se A bô, isto é, não só separando o “a” de “bô” como acentuando, com acento circunflexo, o “bô”, visto que o som do “o” é fechado.

E, já agora, uma questão: a palavra não será a adaptação crioula do francês “vous” ?


b) Bianda – comida, arroz...

Qual será a origem desta palavra ?

Temos, do francês, “viande” – carne, mas ao balaio de arroz cozido não era habitual juntar carne, mas sim peixe, peixe seco. As refeições eram tomadas no grupo familiar, sentados nas esteiras, em círculo, fazendo uma mistura em bolinhas, tendo como base o arroz, comidas à mão.

Tenho para mim que, observando a maneira de comer e de apresentar os alimentos, observação acompanhada de um sentimento pejorativo (ia dizer racista ). Os primeiros portugueses terão desighado “tudo aquilo” por vianda – comida para porcos. Ao verem que o “branco” assim a nomeava, terão concluido que “comida” seria designada por “vianda”.


c) Cibe– palmeira...

Sempre ouvi chamar-lhe "cibo” e não “cibe”.

Atenda-se a que o tronco das palmeiras era partido em pedaços e assim utilizados. Em Trás-os-Montes existe a palavra cibo, que vem da palavra latina “cibus,i “, que significa pedaço. Exemplos: “Um cibo de pão”, “um cibo de presunto”.

Será esta a origem ?


d) - não

Exemplos; “ Galinha cá tem”, “ A mim cá sibe”.

Avento uma hipótese – aqui entre nós, em Portugal, quando alguém quer afastar alguém que o importuna com perguntas e mais perguntas, enfadado responde; “ Eu sei cá !“

Quero aproveitar, ao falar da palavra crioula “cá”, falar de outra palavra – “na”- que os periquitos entendiam como ”não”. Pode traduzir-se por “mesmo”. Ex., “A mim na bai”, que, em contraposição “A mim bai”, enfatiza a decisão de “ir”, mesmo contra todas as dificuldades.

Assim, tomou a decisão de ir: “A mim bai.”

Tomou a decisão de ir, mesmo apesar das dificuldades: “A mim na bai”.


e) Djubi – olha !

É minha opinião que a palavra “djubi”, como vocativo, poderá ser traduzida por "Olha!", mas só quando dirigida a um rapaz, pois sempre entendi que é a palavra do crioulo correspondente a "jovem".

f) Goss-goss - depressa

Tenho pensado muitas vezes sobre a origem desta expressão. Será a assimilação pelo crioulo do som que se faz, entre dentes, ao atiçar os cães, incentivando-os a correr – guesse, guesse, guesse... ?

Um exemplo engraçado que ouvi da utilização da expressão: “ Alfero, a mim bai na goss-goss, corpo todo stá mojado, bala num entra “.


g) Macaréu – vaga impetuosa...

Não é, propriamente, uma palavra crioula. Em Portugal não há macaréu com aquela força. Na Guiné tem aquela impetuosidade devido, também, à ausência de relevo e é a
causa da salinidade dos rios até ao interior do País.

Havia, nos princípios do século XX, um fenómeno inverso no Rio Douro, quando não tinha barragens (movimentos brutais de água de montante para juzante em épocas de chuva e degelo) – a rebofa. Seria um movimento de águas fundamental para provocar o final de um outro macar...éu que nunca mais acaba.

No Brasil chamam-lhe pororoca.

h) Manga de ronco – sucesso militar

Traduzir Misti – querer ou manga di ronco por sucesso militar é muito redutivo. Ronco é todo o acontecimento, atitude, postura, efeito, que, pela sua grandeza e excepcionalidade, se torna grandemente apreciado e aplaudido. Exemplos: as mulheres vestem os seus trajes mais coloridos e garridos, uma festa de estrondo, a chegada ou a passagem de um conjunto de peças de artilharia, a marcha de uma grande quantidade de tropas acompanhadas de fanfarra, etc..

A propósito – Qual será a razão da expressão "manga de" , transmitindo a ideia de grande quantidade de qualquer coisa ou seja muito/a ? Exemplos: ”manga di patacão”, “manga di pessoal”, “manga di porada”. Será que a ideia de muito, traduzida em “manga de”, vem da associação ao número de colheitas que os mangueiros (- mangas) têm em cada por ano ? Assim, “manga de” seria tal como... a quantidade de mangas que nós temos.

i) Misti - querer...

“Misti” ou “misst” ? Parece-me, pelo som que recordo, que a segunda grafia será mais correcta.

Gostaria saber qual a proveniência desta simpática palavra.


j) Partir – dar

A sabedoria é grande. Habitualmente quem dá não dá tudo, dá parte e, muitas vezes, o acto de dar é precedido do acto de partir, arrancar áquilo que temos o pedaço que vamos dar.


l) Sancu – macaco

Peço desculpa por corrigir. Da minha experiência, a grafia da palavra deve ser “sanjiu”, em que o “j” é pronunciado como em “bajuda” (em crioulo). E não tenho dúvidas, neste caso, porque a associei imediatamente a “singe”, macaco em francês.

m) Suma – como, igual

“Suma” – semelhante.

Ser a corruptela/contracção de semelhante é difícl de imaginar e muito menos de aceitar. Suma em Português nada tem a ver com a ideia que a palavra transmite em crioulo guineense.

_________


Termino como já atrás escrevi – comentem e acrescentem p.f., porque esta é uma matéria muito interessante.

Alberto Branquinho

ex-Alf Mil Op Esp
(sem fita e, como então, sem pena da dita).

_________

Notas dos editores:

(1) Vd. postes de:

28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2692: Construtores de Gandembel / Balana (3): Nunca falei em protagonismo pessoal, mas sim da CART 1689 (Alberto Branquinho)

26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2688: Construtores de Gandembel/Balana (1): Op Bola de Bogo, em que participou a CART 1689, a engenharia e outros (Alberto Branquinho)

19 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1535: Subsídios para a história da CART 1689, a que pertencia o Belmiro dos Santos João (Vitor Condeço)



(2) Vd. poste de 6 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2033: In Memoriam (2): O saudoso Amaral da horta e dos presuntos de Missirá (Jorge Cabral / António Branquinho)

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1899: Documentos (1): PAIGC - O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (1): O português...na luta de libertação


Guiné > PAIGC > Departamento Secretariado, Informação, Cultura e Formação de Quadros do Comité Central do PAIGC > 1966 > Capa e contracapa de O Nosso Primeiro Livro.

Fotos: © A. Marques Lopes (2007). Direitos reservados.


A. Marques Lopes, ex- Alf Mil At Inf(Hoje Cor DFA, reformado), CART 1690 (Geba) / CCAÇ 3 (Barro) . Vive em Matosinhos.







1. Mensagem de A. Marques Lopes:

Caros camaradas:

Este era o livro de leitura dos primeiros anos das escolas do PAIGC durante a luta de libertação. É uma edição de 1966 do Departamento Secretariado, Informação, Cultura e Formação de Quadros do Comité Central do PAIGC. Apanhei vários destes em Samba Culo (1), mas alguém ficou com eles, depois de eu ter sido evacuado, só com a farda...Este foi-me cedido pelo nosso camarada tertuliano [António] Pimentel. Já o li. Dou-vos alguns textos a ler. Podem aprender o B-A-BA, o LHA-LHE-LHI... e ler outros textos.




Alfabetização, formação moral, cultura e... formação política, naturalmente. De acordo, aliás, com o Programa das Escolas do PAIGC. Mas este, que consegui de outra fonte, hei-de dar-vos a conhecer depois das minhas férias, que vão começar brevemente na Nazaré. Quem por lá passar dê uma apitadela (938013725).

Abraços e... adeus e até ao meu regresso!
A. Marques Lopes

2. Comentário de L.G.:

Obrigado aos dois Antónios. São pessoas com grande sensibilidade cultural e humana. Estes documentos são preciosos. Vamos reproduzir aqui, ao longo de vários posts, algumas das páginas do livrinho das escolas do PAIGC: a batalha do Komo (sic), Katungo, o Corpo Humano, a Verdade...


António Pimentel, ex- Alf Mil Rec Info, CCS BCAÇ 2851, Mansabá em Galomaro (1968/70). Vive no Porto.
Para muitos amigos e camaradas da Guiné, o livro não é novidade. Era frequente encontrá-lo noas assaltos a bases e acamapamentos... Para outros sim, até para os mais novos, os nossos filhos e netos... O livro era usado para alfabetizar tanto as crianças como os guerrilheiros. Nas matas, nas bases, acampamentos e tabancas controladas pelo PAIGG, também-se aprendia aler... em português., a pensar, a conhecer, a lutar e a amar em português.

Amílcar Cabral, inimigo não do Povo Português mas do regime político de Oliveira Salazar/Marcelo Caetano, fez mais pela língua portuguesa do que muitos portugueses que por lá passaram, com responsabilidades políticas e militares, ao longo de 500 anos de relações dos portugueses com os guineenses. Amílcar Cabral sabia que o português (para além do crioulo) era um das bases indispensáveis para a criação de uma identidade nacional...
Pessoalmente fiquei chocado, quando ao chegar a Contuboel em Junho de 1969 para fazer o IAO com os meus futuros soldados africanos da CCAÇ 2590/CCAÇ 12 - fulas, velhos aliados dos portugueses... -, constatei que eles não falavam (nem muito menos escreviam) português...
______

Nota de L.G.:

(1) Vd. posts de:

29 Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXX: A professora de Samba Culo (A. Marques Lopes)

(...) "Tenho de partir, de voltar a Portugal. Gostei muito de falar contigo, tinha mesmo necessidade de o fazer, já que, naquele dia em que nos encontrámos pela primeira vez, só eu te disse “firma lá!” e tu não me disseste nada. Percebo que nem me quizesses ouvir... E nunca mais dormi descansado até agora. (...)

"Quero pedir-te uma última coisa, que desculpes aquele meu soldado que tentou violar-te quando estavas agonizante. Conseguiste ver ainda que não o deixei fazer isso. Perdoa-lhe, era bom rapaz, um camponês minhoto que para aqui foi lançado e, sabes, é fácil perder a cabeça numa guerra de inimigos fabricados. Talvez o encontres por aí, o teu camarada Gazela matou-o em Jobel e o corpo dele por cá ficou. Deve andar, como tu, no meio desta floresta do Oio. Fala com ele agora". (...)

7 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - XLIX: Samba Culo II (A. Marques Lopes)

" (...) o que mais me impressionou nesta operação foi o seguinte: Samba Culo tinha uma escola; quando lá chegámos, vi escrito no quadro preto, em perfeito português: "Um vaso de flores". Tinha desenhado, a giz, por baixo, um vaso de flores.

"E o que nunca mais esquecerei na minha vida: quando atacámos a base, uma jovem dos seus 18 anos ficou com a barriga aberta por uma rajada de G3. E mais (coisas terríveis desta guerra!): o Bigodes, o Armindo F. Paulino (que foi, depois, feito prisioneiro pelo PAIGC e que acabou por morrer em Conakri), quis saltar para cima dela. Tive que lhe bater. Esta é uma situação que nunca me sai do pensamento... e da minha consciência.

"Tinham muitos livros em português, que era o que estavam a ensinar aos alunos (miúdos ou graúdos?). Trouxemos também (imaginem!) uns paramentos completos de um padre católico! Lembranças que se me pegaram para toda a vida" (...).

domingo, 14 de janeiro de 2007

Guiné 63/74 - P1429: Lusofonia: este cá fala próprio heróis do mar... (Amaro Samúdio)

1. Há tempos (1 de Dezembro de 2006) recebi uma mensagem do Brasil que rezava assim:

Caro Luís Graça (e seus camaradas):

Estava procurando na internet algum lugar que me pudesse informar a respeito das características peculiares do português que é utilizado na Guiné-Bissau e encontrei seu maravilhoso blog.

Dou meus parabéns a você pelo estupendo trabalho e solicito que me ajude a conseguir informações a respeito do tema de minha pesquisa [Características do português da Guiné-Bissau] Desde já agradeço.

Amilton de Sousa Júnior

Salvador/Bahia/Brasil.



2. O Amaro Samúdio, de Matosinhos, nosso camarada de tertúlia, veio dar uma ajudinha, dizendo-me:

Caro Luís Graça

Não conheço nenhum sítio que possa ajudar o Amilton. Não resisto,no entanto, a transmitir-te o hino nacional em crioulo que me cantava um balanta.

Este cá fala próprio heróis do mar.......

Que é nobre povo.........

Que está fugí........

Que está morrí........

Em Conacrí .......



Um abraço

Amaro Munhoz Samúdio

Ex-1º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 3477 (1971/73)
Os Gringos de Guileje