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quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16950: O nosso livro de visitas (190): Evaristo Pereira dos Reis, 66 anos de idade, residente em Setúbal... Ex-1º cabo condutor auto, de rendição individual, esteve no QG (1971/73), mas na maior parte da comissão foi mestre de obras da Câmara Municipal de Bissau, ao tempo do maj cav Eduardo Matos Guerra, como presidente



Brasão de armas da cidade de Bissau (1973)


1, Mensagem do nosso leitor e camarada,  Evaristo Pereira dos Reis, que foi 1º cabo condutor auto, de rendição individual (Bissau, QG, 1971/73), com quem já conversámos ao telefone e convidámos para integrar a Tabanca Grande:


Data: 31 de dezembro de 2016 às 16:44
Assunto: Guiné 71/73

Cumprimentos a todos os intervenientes naquela malfadada guerra.

Também participei nela durante 24 meses certos. Embarquei no paquete de então, o "Angra do Heroísmo",  em 24 de Novembro de 1971. Foram cinco dias de viagem que jamais me esquecerei, fui alojado no porão daquele monte de ferrugem e humidade, com colchões de palha com várias
dezenas de anos e dedicatórias com datas mais antigas do que o meu nascimento.

Ao terceiro dia o navio avariou,  ficando á deriva, escusado será dizer que a sensação de náuseas e com o vomitado daquelesestômagos mal fornecidos e mentes abaladas, o cheiro era azedo com a
humidade e calor, fazia um cocktail que qualquer ser humano não
gostava de passar.

Nesse mesmo barco viajava também a 35ª Companhia de Comandos, esses um
pouco mais bem instalados.

Finalmente chegados ao cais Pijdjiguiti, estava-me esperando o 1º sargento Furtado, homem que tinha conhecido no antigo aquartelamento,Trem Auto, onde tive a função de instrutor de condução, localizado na Av. de Berna em Lisboa, hoje e muito bem transformado em Universidade.

Voltando á minha chegada fui colocado na secção do ficheiro, no Quartel General, local aparentemente privilegiado em relação aos meus camaradas, local onde comecei a ter consciência do
que se passava naquela província em gura. Nesse serviço  estavam arquivadas as fichas de todos os intervenientes naquele teatro de guerra que eu considero de tortura física, mental e psicológica,

No arquivo assinalava os mortos, os desaparecidos, os evacuados, os que tiveram a sorte de já ter regressado e os que se encontravam presentes. Claro que a curiosidade principal foi ver a ficha do maestro da banda, Tive oportunidade de estar bem perto dele, diversas vezes, Refiro-me ao
homem da lupa pelo qual nunca tive qualquer simpatia.

Passado um mês tive oportunidade de concorrer a um cargo de Mestre de Obras, para a Cãmara Municipal  de Bissau para o qual estava talhado, Chefiada pelo major [cav Eduardo} Matos Guerra [1931-2016] como Presidente da Câmara, homem duro, aliado e bastante protegido pelo Governador,

A partir desse dia a minha farda foi arquivada no armário atá ao dia do regresso, Foi muito difícil
desempenhar tal cargo, a Câmara não tinha recursos, imaginem que tinha que fazer os remendos das ruas com cimento, porque não tínhamos alcatrão, Mesmo assim consegui fazer obras de algum vulto praticamente sem recursos, recorrendo a máquinas da engenharia militar,  chefiada pelo então Cap. Branquinho e Furriel Guedelha, sobre os quais nunca mais tive noticias.

Também existia uma empresa civil de construção ali sediada com o nome de TECNIL, Esses eram os meus fornecedores gratuitos.

Fiz uma messe para Sargentos e renovei o bar de oficiais dentro do Hospital Militar. Alarguei parte da estrada de Bissalanca, para o aeroporto,  arrancando dezenas de mangueiros. Fiz uma vala de drenagem e alargamento da estrada para o Quartel General, Enfim, fiz várias obras de
beneficiação para melhorar aquela cidade, passando nestas lides diárias os restantes e difíceis 23 meses.



Guiné > Mapa de Bissau (1949) > Escala de 1 /50 mil > Posição relativa de Bissau e Bissalanca (aeroporto)

Infogravura: Blogue Luís Graça & Canaradas da Guiné (2017)


Regressei no avião dos TAM, no dia 29 de Novembro de 1973, Regressei bastante desgastado, tive a sorte de não estar directamente no teatro de guerra, mas estava bastante informado,  sabendo o que os
mais desafortunados sofriam diariamente.

Durante muitos anos não desejei voltar aquele País, mas hoje talvez voltasse.

Não estou ligado a qualquer grupo de convívio de antigos combatentes, talvez por ter poucos conhecimentos da época, visto ter ido em rendição individual.

Hoje tenho 66 anos,  resido em Setúbal, tenho esposa,   filho e dois netos de 5 e 8 anos, tenho algumas dores mas estou vivo.

Desejo a todos o melhor da vida e aproveitem- na no que puderem.
Bem hajam a todos.
Evaristo Pereira dos Reis
Telem (...)

_________________

Nota do editor,

Último poste da série > 25 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16133: O nosso livro de visitas (189): Morreu, em 17/4/2016, o meu pai, Cherno Sanhá, formado em Cuba, em engenharia de telecomunicações, filho do rei de Badora (Luís Causso Sanhá)

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4816: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (12): E se o Algássimo tivesse razão ?

1. Continuação da publicação das memórias do Cherno Baldé, menino e moço em Fajonquito (1970/75), hoje quadro superior da administração pública da República da Guiné-Bissau (*):


Ambientes e ambiguidades > Algássimo, o visionário


Quando finalmente saía do quartel, a noite, encontrava o Algássimo Djaló à minha espera, ele gostava da sopa (entenda-se comida do quartel) que trazia metida em latas de conservas de tomate. Não podia entrar dentro do quartel, por ordens do seu pai, de princípios rígidos e ortodoxos como todos os seus conterraneos de Futa-Djalon que em tudo se comportavam como perpétuos emigrantes e nunca se integravam nas comunidades locais consideradas de nível inferior, religiosamente falando.

O Algássimo queria viver como uma criança normal da sua idade mas vivia quase numa clausura. Nao podia frequentar nem a escola, nem o quartel, nem os locais de festa, de baile, de futebol, nada, nada. Ele podia, sim, procurar lenha seca nos arredores da aldeia para a fogueira da noite onde passavam, ele e mais outros rapazes da mesma comunidade, horas a fio, a repetir alguns sons escritos em árabe arcaico numa tábua de madeira cujos significados nem o próprio mestre sabia. Era esta a faceta da religião que alguns religiosos, sobretudo Futa-fulas, nos queriam ensinar. Tempo perdido (**).

Mais tarde o Algássimo, por iniciativa própria, acabaria por entrar no quartel e também frequentar a escola mas com meios próprios pois o pai, na impossibilidade de o impedir, tinha sido peromptório:
- Queres ir para a escola dos brancos, então, vai!..Mas nãoe peças nada e nãso me contes nada porque não te dou nada e não quero saber de nada pois o seitan será o teu companheiro no inferno.

O Algássimo foi e ficou, do satanás não viu nem os rastos. O pai, este, acabaria mais tarde, por falecer, doidinho da Silva.

Pela idade, experiência e ansiedade que ele tinha acumulado, rapidamente galgou os escalões do ensino e por pouco não me ultrapassava de classe. Foi nessa altura que, também eu, animal livre, resolvi encarar com alguma seriedade a escola, e consegui, finalmente, aguentar-me na sala, sentado, aquelas duas horas que me pareciam uma eternidade.

Mais tarde ele tirava conclusões interessantes das suas observações sobre aquela época, em Fajonquito, a sua entrada no quartel, os soldados portugueses, o ambiente do refeitório geral e a escola onde curiosamente o professor era um Sanhá que queria dizer mandinga ou um beafada islamizado. Disse-me uma vez:
- O melhor e o pior que aprendi com estes brancos, durante a minha permanência entre eles, e que depois continuou em diferentes lugares e circunstâncias, foi o espírito sempre presente da irreverência e da insubmissão, o sentido da busca, da insatisfação permanente, do questionamento sobre o que parece evidente, da insaciável curiosidade e coragem de ultrapassar limites, da revolta, da reviravolta... Com eles nenhuma situação é imutável e a mudança é uma constante. Enquanto continuarem a liderar, o mundo nao terá sossego.

Este espírito irreverente e mutante, este paradigma filosófico de mudança em permanência, se quiserem, é, na opinião do Algássimo, "a maior força e quiçá, também, a maior fraqueza do Homem branco, europeu, que está constantemente a pôr em questão as suas próprias verdades ainda agora conquistadas e reconhecidas mas insuficientemente amadurecidas".

Continuando ainda sobre o mesmo assunto, dizia que, na sua opinião, "o tumulto materialista e a incongruência lógica do mundo em que vivemos hoje nasceram desse posicionamento ambíguo do homem europeu que prolonga a vida mas também a sua agonia nas incertezas que engendra sobre o amanhã que está por vir mas cujo porvir já está hipotecado nas bolsas de valor de Londres e Nova Iorque".

O meu amigo Algássimo, temeroso ou grande visiánario, não conseguiu aguentar o período após independência, nãoo, ainda aguentou uns seis anos, até 1980, altura em que, tendo emigrado para Portugal, com o falecimento do pai, voltou e decidiu mudar-se para o Senegal.

Antes de partir, estando eu nessa altura em Bissau a terminar o liceu, disse-me claramente que não podia continuar na Guiné-Bissau porque, segundo ele, esta seria, durante muito tempo, a terra dos outros. Perguntou-me ele:
- Você não ouviu as cantigas deles ?...

Ele referia-se a uma cantiga em crioulo que dizia assim: Kim ki tem terra? Anós ki tem terra. kim ki na labráá...? kim ki na furtáá...? etc. E a sonoridade da música nao colocava quaisquer margens de duvidas sobre as suas origens étnicas.

Na sua opinião, a Guiné-Bissau tinha poucas probabilidades de sucesso porque em vez do bom pastor o gado tinha sido entreque aos lobos, vestidos com pele de ovelhas. Em vez de pessoas instruídas e com experiência na administração do Estado eram pessoas iletradas, quase analfabetas, que dirigiam e controlavam a vida económica e política do pais.
- Assim não vamos a sítio nenhum - arrematava.

Verdade ou mentira a opinião é dele e no que me concerne, sem capacidade de visionar o futuro, e tendo acreditado e abraçado firmemente a visão e os ideais de Amilcar Cabral sobre a necessidade da luta pela afirmação do homem africano, do terceiro mundo, de um mundo mais justo, de progresso, paz e fraternidade, voltei alegremente dos estudos e estou ainda aqui na esperança de ver se aparece a luz ao fundo do túnel.

Mas a questão é, de algum tempo para cá, recorrente e.... inevitável:
- E se o Algássimo tinha razão?...

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 10 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4806: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (11): Filho da p... de barrote queimado...... Ou as sobras do rancho

(**) Vd. poste de 23 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3089: Antropologia (7): As tabuinhas das escolas corânicas: tradutor de árabe, precisa-se (A. Santos / Luís Graça)

segunda-feira, 12 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24390: O segredo de... (38): António Branquinho (1947-2023): Passei-me dos carretos... Perante a recusa dos helis em levaram os nossos dois mortos, puxei a culatra atrás da G3 e gritei: 'Levais os mortos ou… dou-vos um tiro nos c….!' (Acção Galhito, 22/6/1971, regulado do Cuor, sector L1)

Guiné > Zona Leste > Região de Baftá  Sector L1 (Bambadinca)  > Regulado do Cuor > Missirá > 1969 > Aqui esteve destacado, em 1970/712, o seu Pel Caç Nat 63, com os nossos dois tabanqueiros, que a morte já levou, o alf mil art Jorge Cabral (1944-2021), natural de Lisboa,  e o fur  mil art António Branquinho (1947-2023), nascido em Vila Nova de Foz Coa. 

Entre 1971 e 1974, os Pel Caç Nat 52, 54 e 63 passaram "rotativamente" por vários aquartelamentos e destacamentos do Sector L1: Bambadinca, Fá, Missirá, Mato Cão, ponte do rio Udunduma , Enxalé, etc. O Jorge Cabral foi substituído, no comamdo do Pel Caç Nat 
63, em 1 de julho de 1971, pelo alf mil at Manuel David Coelho (oriundo da  CART 2714 / BART 2917).

O Pel Caç Nat 54, até 18/11/1970, era comandado pelo alf mil Correia. A partir desta data até para além do regresso do BART 2917 à Metrópole, passou a ser comandado pelo alf ml Hélder P. R. Martins.

Por sua vez, o Pel Caç Nat 52, era comandado pelo alf mil Mário Beja Santos, até 24/7/1970, sendo nesta data substituído,  até para além do regresso do BART 2917 à Metrópole, pelo alf mil at Nelson Alberto Wahnon Reis.
 
Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-fur mil op esp, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71)

Foto: © Humberto Reis (2006) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 


Guiné > Região de Bafatá > Carta de Bambadinca (1955) > Escala de 1/50 mil > Detalhes: posição relativa de Bambadinca, Nhabijões, Mato Cão, Missirá, Sancorlá e Salá. O PAIGC só mandava (alguma coisa), a partir de Salá... tendo "barracas", mas a noroeste, na zona de Madina / Belel). Já no Oio havia a "base central" de Sara Sarauol... O destacamento, mais a norte de Bambadinca, no setor L1 era Missirá, guarnecido por um Pel Caç Nat (52 ou 63, em diferentes períodos) e um pelotão de milícias... Vários camaradas nossos, membros da Tabanca Grande, andaram por outros sítios, "pouco recomendáveis"...  A Madina/ Belel (que já não vem neste excerto do mapa) ia-se uma vez por ano, na época seca... para dar e levar porrada.  A história abaixo contada passou-se no trilho Missirá - Sancorlã - Salá, em 22 de junho de 1971, no decorrer da Acção Galhito.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)


1. O Antóno Branquinho deixou-nos no passado dia 27 de maio, aos 76 anos (*)... Natural de Vila Nova de Foz Coa, vivia na Covilhã, era irmão do Alberto Branquinho. Escreveu poucas coisas para o blogue. Tem vinte e tal referências. Mas há um "segredo" que ele não leva para o Olimpo dos antigos combatentes: já aqui o contou, em 2010 (**). De maneira singela, sem fanfarronice, mas também sem alguns detalhes importantes, como o local e a data... (Fomos recuperar, entretanto, essa informação de contexto.) Vale a pena recordar esse poste, agora republicado na série "O segredo de..." (***)


O segedo de... António Branquinho: "Passei-me dos carretos..."

Missirá, pelas 6 da manhã, preparação e início de mais uma operação de rotina. 
O Pelotão tinha sido “convocado” para proceder a uma operação de reconhecimento e patrulhamento, conjuntamente com outros dois grupos de combate. Tínhamos ainda como objectivo, desactivar uma mina anti-pessoal, detectada há já muito tempo.(**=

Durante o percurso íamos passando por locais paradisíacos, com palmeiras, mangueiros, outras árvores exóticas e pequenos cursos de água. Se não houvesse guerra e tivesse dinheiro, não me importava de construir uma vivenda num daqueles locais. Maldita guerra!

Ia eu nestas cogitações, quando me dá uma valente dor de barriga. Desta situação avisei o Jorge Cabral, como comandante do Pel Caç Nat 63, informando-o que iria sair do trilho para fazer uma necessidade fisiológica. 

Estava eu a preparar-me para baixar as calças, quando se ouve um violento estrondo. De imediato, ponho-me a correr em direcção à cabeça da coluna, ainda com as calças em baixo. Sabendo da existência da tal mina, corri de imediato ao encontro do Jorge Cabral, pensando que a mesma tinha sido accionada pelos elementos da frente. Por sua vez o Jorge Cabral pensou que eu,  ao sair do trilho,  teria accionado outra mina. Encontrámo-nos ao meio do percurso, em direcções opostas, ficando ambos estupefactos e felizes por estarmos sãos e salvos.

Como seria de esperar, gerou-se uma certa confusão. Após a acalmia das “tropas” e de se averiguar a situação, constatou-se que tinha rebentado uma mina (reforçada com granada de canhão sem recuo), na retaguarda da coluna. Tendo esta provocando dois mortos e vários feridos, uns graves e outros leves.

Perante esta situação, via rádio, pediu-se a evacuação dos elementos atingidos pelos estilhaços da mina. De imediato procedeu-se à organização da segurança a prestar aos meios aéreos.

Há já cerca de duas horas, que os grupos de combate estavam devidamente instalados, quando se ouviu o som característico dos helicópteros. Eram dois. Voando em círculos, aterraram numa clareira. Do seu interior saíram duas enfermeiras paraquedistas para se inteirarem da situação. Verificaram que além dos feridos havia dois mortos, recusaram de imediato o transporte destes, levariam só os feridos. 

Comunicaram esta decisão aos pilotos, com a qual eles concordaram. Ao aperceber-me daquela decisão, pedi-lhes para que transportassem também os mortos. Mantiveram a sua posição, dizendo:

– Não levamos os mortos!

Perante as suas atitudes drásticas, quanto ao meu pedido “passei-me”. De modo bastante drástico e enervado, empunhei a G3 em riste, puxei a culatra atrás e vociferei:

– Levais os mortos ou… dou-vos um tiro nos c….!

Como seria óbvio, eu não daria nenhum tiro, era só “ronco”. Uma coisa é certa – levaram também os mortos.

Em consequência de todas estas peripécias, não mais me lembrei da dor de barriga. Lembrei-me, sim, ao regressarmos a Missirá de beber não sei quantas “bazucas” para matar a sede.

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Subtítulo / Negritos: LG]


2. Comentário do editor LG:


Dos 8 comentários ao poste P7291 (**), escolhi três, mais pertinentes:

(i) Luís Graça;

(...) Ora aqui está uma boa questão a pôr às nossas queridas camaradas enfermeiras paraquedistas... Por que é que elas se recusavam a levar os mortos? Eram elas ou eram eles, os homens da FAP, os pilotos e os melec?

Seguramente que havia "instruções de cima"... O custo de um heli era equivalente a 15 contos, na época, por HORA!, ou seja o vencimento (mensal) de dois alferes, se não mais, ou o pré (mensal) de 25 soldados de 2ª classe (leia-se: do recrutamento local, sem a 3ª classe da instrução primária)...

De facto, a mão de obra do exército, a tropa-macaca (sem ofensa para ninguém...), era muito mais "barata"...

No mato, para transportar, a pé, um morto, até ao aquartelamento mais próximo ou à estrada mais próxima (onde pudessem chegar as nossas viaturas) era preciso "mobilizar" um grupo de combate (30 homens) que se ia revesando... Era a tarefa mais penosa (física e psicologicamente falando) que nos podia caber, transportar, ao sol ou à chuva, um camaradda morto, em maca improvisada com paus de arbustos, impermeáveis e lianas...

Esse "calvário" está magistralmente descrito no livro do Amor Pires Mota, que eu li de um trago, a "Estranha Noiva de Guerra"...

16 de novembro de 2010 às 13:32

(ii) José Corceiro:

Numa narração que hoje escrevi para o blogue, que oportunamente irei enviar, durante uma emboscada tombaram no mato dois militares, também houve feridos. Pediram-se evacuações de heli, mas os mortos não foram no heli, ainda que não pertencessem à CCAÇ 5, foram em viatura para Canjadude, onde foram amortalhados.

É lógico, neste caso, se fosse só uma questão económica, teria sido mais vantajoso transportá-los no heli, a partir do local onde tombaram. Porque teve que vir meio aéreo, a Canjadude, trazer duas urnas. Posteriormente voltou a vir meio aéreo para levá-los já nos caixões, creio que para o local onde estava sediada a companhia à qual eles pertenciam. Eram duma companhia de “Paras”.

Interpreto a recusa de transportar mortos nos helis, por uma questão de utilidade e eficácia, porque durante o percurso do transporte dos feridos e mortos, poder-se-ia dar a coincidência de na mesma rota, aparecerem mais feridos e neste caso a lotação dum morto poderia impedir a evacuação dum ferido.

16 de novembro de 2010 às 22:20


(iii) Jorge Cabral:

Olá, Branquinho! Foi mesmo assim que aconteceu no dia 22 de Junho de 1971, na área de Salá (****). Eu já passara os 24 meses, mas ainda havia de lá voltar a 14 de Julho, quando o Pelotão já não se encontrava em Missirá. Os mortos foram Cherno Sanhá e Sambaro Embaló, ambos do Pel Caç Nat 54. (...)

17 de novembro de 2010 às 09:48
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24389: In Memoriam (479): António Branquinho (1947-2023), ex-fur mil, Pel Caç Nat 63 (Fá e Missirá, set/69 - out/71)... Nosso tabanqueiro desde 24/9/2010, era irmão do advogado e escritor Alberto Branquinho, também ele membro da nossa Tabanca Grande

(**) Vd. poste 16 de novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7291: Estórias avulsas (100): A mina, que seriam duas (António Branquinho)

(***) Último poste da série > 21 de fevereiro de  2022 > Guiné 61/74 - P23012: O segredo de... (37): Demburri Seidi: demorou mais de dois anos para sair da sua boca o testemunho sobre os trágicos acontecimentos de Cuntima, em novembro de 1976, devido em parte ao medo que sentia e a manifesta dificuldade em falar sobre a "justiça revolucionária" praticada pelos vencedores contra os vencidos (Cherno Baldé)

(****) Segundo a História do BART 2917 (pág. 78) 

22 de junho de 1971: 

No decorrer da Acção “Galhito”, realizada por forças dos Pel Caç Nat 54 e 63,  na área de Sancorlã – Salá – Paté Gidé, as NT accionaram uma mina anti-pessoal reforçada em (BAMBADINCA 2F4-76) sofrendo dois mortos e dois feridos.

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1948: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (54): Em Bissau, no julgamento do Ieró Djaló

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Missirá > 1968 > Pel Caç Nat 52 > O Iedró Djaló, milícia, a partir lenha... "Nunca conheci um gago como Ieró. Antes de falar, o rosto contraía-se todo e explodia num trovão as primeiras palavras. Tinha seguramente problemas psicológicos, pois partia sozinho para Finete, alegando saudades da família. Era-lhe indiferente os castigos, duros ou brandos. Irei entregar-lhe à guarda um prisioneiro feito em Quebá Jilã, em Fevereiro de 69, e durante a Opeão Anda Cá apareceu-me durante a madrugada, a escassos quilómetro de Madina a informar-me que o prisioneiro tinha fugido"...

Foto e legenda: © Beja Santos (2007). (Com a devida vénia ao Luís Casanova, que foi o fotógrafo, e que era furriel miliciano no Pel Caç Nat 52). Direitos reservados.

Mensagem do Beja Santos, enviada a 6 de Junho de 2007: Caro Luís, aqui vai o episódio da semana. Encontrarás a fotografia do Ieró Djaló no pequeno lote cedido pelo Luís Casanova. Recordo que tens ainda dois bilhetes postais de Bissau da primeira leva que te mandei e que mostram exactamente os locais onde se situava o Comando Naval da Guiné. mas certamente que elementos sobre Bissau não te faltam. Até ao nosso encontro entre 12 e 15 de Junho, e recebe um grande abraço do Mário.

52ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado a 6 de Junho de 2007. Comentário do editor: Por lapso nosso, este episódio não foi publicado na altura. As nossas desculpas ao autor e aos leitores do nosso blogue. Vd. os posts posteriores (53 e 54) e anterior (51)(1)

Em Bissau, no julgamento de Ieró Djaló

por Beja Santos


Os preparativos da ida a Bissau


Parto amanhã, dia 1 de Julho, para Bissau, onde serei testemunha no julgamento de Ieró Djaló, o cabo das milícias de Missirá que, na madrugada de 22 de Fevereiro, no decurso da Operação Anda Cá (2), tendo a seu cargo a custódia do prisioneiro de Quebá Jilã, o deixou fugir enquanto dormia.

Reuno ao fim da tarde com os três furriéis (Casanova, Pires e Pina) e o Comandante da milícia, Albino, o gentil príncipe Samba. Comunico, em primeiro lugar, algumas decisões: Casanova vai descansar uma semana em Bambadinca, consultará o médico, o Dr. Domingos, e repousará pois é notório que tem os nervos em franja, tornou-se agreste, perde peso e tem períodos de abulia; vai amanhã comigo, fica isento de qualquer actividade operacional; em segundo lugar, as férias dos soldados ficam novamente suspensas, só haverá dispensas a título excepcional, temos gente cada vez mais doente e na semana passada houve dois dias em que repetimos Mato de Cão em 24 horas, o que me levou a abolir as emboscadas nocturnas; o plano de actividades ficará subordinado à construção de um novo abrigo de morteiro 81, em local mais estratégico do que o actual; como, entretanto, o Capitão Rui Gamito me escreveu a comunicar que vai ser disponibilizado o gerador eléctrico para Missirá, deixo ao critério dos meus colaboradores a construção do respectivo abrigo;o professor primário, de nome Benício, terá o seu contrato renovado por provas de desvelo com a cartilha maternal e tabuada, e ser-lhe-á solicitado que passe uma semana em cada mês no aquartelamento de Finete, até se encontrar uma solução para recrutar um professor permanente; relatei a conversa havida com o régulo Malã após o incêndio da cubata da sua tia, Fatumana, a anciã só aceita a reconstrução desde que seja uma cubata circular, seremos responsáveis pela cobertura e cimentação do interior, mas serão os civis a reconstruí-la logo que termine a época das chuvas; por último, peço ao príncipe Samba que se entenda com Bacari Soncó para que haja a deslocação de 7 a 10 homens de Finete para Missirá, para apoiar os patrulhamentos a Mato de Cão, nos próximos dias.

Com a ajuda de Cherno preparo a mala e vejo o estado da farda nº2. Emagreci 10 quilos, danço dentro dos calções, calças e camisas, meticulosamente passadas pela Binta Camará, a mulher de Sabidi. Separo alguma roupa, artigos de higiene, livros e aerogramas. Espero voltar o mais tardar em três dias, mas estou sempre condicionado pelos voos, muitos deles cancelados, pelas situações de emergência.

Escrevo um aerograma à Cristina que amanhã espero meter nos correios em Bissau. Falo-lhe na carta de José Jamanca que eu ainda não sei que será um amigo para toda a vida, está agora em Bolama, tem saudades nossas; Fodé escreveu, está contente com as suas sessões de ginásio, parte em breve para a Alemanha Federal; digo que o Cherno nos surpreendeu, pois foi à caça com Cibo Indjai e apanhou um pato bravo, vitualha que se revelou deliciosa depois de bem esfregada em pimento e alho e frita no forno, parecia cabrito; e que amanhã de manhã, vou assistir às cerimónias religiosas da defunta do almani de Finete; e, relato a satisfação de todos aqui em Missirá com a nova casa de banho, e prometo por último que espero telefonar amanhã ao fim da tarde para Lisboa. Será que não tenho consciência que canso a Cristina com este número infindável de vulgaridades?

Saímos ao amanhecer, como sempre vamos sem cuidado até à zona de Caranquecunda, depois pica-se a preceito a estrada até Flaque Dulo, vamos mais rápidos até Canturé onde os pomares florescem e depois embrenhamo-nos no mato denso até Finete, sempre a picar. Assisto à cerimónia religiosa, converso com Bacari sobre a compra da catanas e machados, deixo aqui Mamadu Camará e Tomani Sanhá que vão trabalhar com a motosserra para limpar a vegetação hermética logo acima de Malandim e prossigo viagem.

Não disse à Cristina que estou com infecções nas pernas e um ouvido a zunir. Em Bambadinca, bato à porta do Dr. Domingos que me deu Di-Adresson, qualquer coisa que tem uma acção muito superior à da cortisona e mandou pôr-me álcool iodado no ouvido. Findo o tratamento vou despedir-me do Pimbas. Estou longe de imaginar que esta é a última vez que nos veremos em Bambadinca, quando eu regressar, ele, o Major Pires da Silva e o Capitão Baptista Neves já terão partido com punições, por esta ou aquela razão.

O Dakota partirá pela 1h da tarde, de Bafatá, chegou a hora de subir para o Unimog e lçançar-me na estrada alcatroada na companhia dos meus fiéis amigos. Cherno toma para si o encargo de me levar a mala. A atmosfera no aeroporto é de muita tensão; terá sido ontem ou anteontem que um helicóptero-canhão explodiu de encontro a uma antena no aeródromo, morreu um capitão e um cabo. O Dakota parte à hora , prometo a todos trazer o que me pedem dos mercados do Bissau Velho e de Bandim. Do ar, quase que procuro Missirá, mas o voo segue mais à direita perto de Mansoa.

Aproveito para rever os meus papéis onde registei tudo o que quero tratar e quem quero visitar: a Engenharia em Brá, falar com Manuel de Lucena acerca do meu recurso e do que devo dizer amanhã em julgamento, jantar com a Maria Luísa e o Pedro Abranches, antes procurar telefonar nos correios de Bissau à Cristina e à minha mãe, não me preocupar com a dormida, posso entrar em qualquer hora no Quartel General, a camarata está sempre disponível e o julgamento está marcado para as 11horas.


Uma intensa agenda social em Bissau


De Bissalanca consigo uma boleia para Brá e entro nos pré-fabricados do Batalhão de Engenharia. O Rui Gamito recebe-me com visível satisfação e apresenta-me ao Emílio Rosa, que em Abril próximo será meu padrinho de casamento. As notícias que têm para mim são entusiásticas: Missirá e Finete foram contempladas com 21 toneladas de material de construção; o gerador está confirmado e garantido, dentro em breve será colocado no cais do Pidjiquiti e eu terei que cuidar de alguém que o acompanhe até Bambadinca, no bojo de um batelão.

Logo simpatizei com a afabilidade do Emílio Rosa, que prometeu novas ajudas, sobretudo quando lhe falei em dois abrigos que carecem de renovação absoluta. Sigo para o Quartel General e falo com o jurista. Confirmo tudo aquilo que eu ouvi do Valentim, em Bambadinca: o juiz irá interrogar-me sobre os antecedentes de Ieró Djaló, depois pedir-me-á toda a informação sobre a ocorrência e como é que eu tomei conhecimento da fuga e qual o comportamento seguinte do réu; seguir-se-á um interrogatório sobre o que eu penso do futuro do réu, isto é, se penso existirem condições para o seu regresso ao serviço militar. A informação que tenho sobre o meu recurso é enigmática: haverá alterações, nada mais se poderá dizer por ora.

Parto para o centro de Bissau e reencontro à porta de um café o Almeida, do Pel Caç Nat 63, que já foi colocado em Bolama. Aproveito para lhe reiterar que lhe devo muitíssima estima pela camaradagem que estabelecemos ao longo deste ano, pela bondade que ele teve em levar coisas para Lisboa, pela tragédia recente do suicídio do Benvindo, que imprevistamente se desfechou em si um tiro, quando estavam no Xime. O Almeida ficou abalado, não sabia reagir, confuso e magoado, é assim que ficamos e todas estas perdas são súbitas, como inexplicáveis e igualmente irreparáveis.

Volto a ter sorte com o telefone, oiço a Cristina, minto-lhe dizendo que estou fisicamente bem, que não se alarme pois vim só como testemunha abonatória, pergunto-lhe pelos estudos, reforço a minha confiança no futuro, não excluo, e digo tudo com voz firme, ir a Lisboa em breve. Descanso-a com a promessa de novo telefonema amanhã pela mesma hora. O telefonema para a minha mãe faz-se aos gritos, cada vez mais surda, não percebe exactamente porque estou em Bissau, pergunta-me se venho para Lisboa nos próximos dias e queixa-se do seu sofrimento físico. Anoitece, vou rezar à catedral, fico para a missa e depois sigo para casa dos Abranches que me recebem com a ternura do costume, repito a sopa de ostras e depois o assado e depois a fruta. Eles olham-me com enlevo, supondo que levo um quilo a mais no combate a este corpo esquálido, quase a definhar.

O Pedro deixa-me à porta do QG e entro no assombroso Vaticano III. Para quem já esqueceu, é uma camarata que só falta estar a céu aberto, parece uma ampla sala de espectáculos, onde uns vociferam, outros cozem a bebedeira, outros roncam e até há quem gema no interior dos seus pesadelos. O Vaticano III é um eloquente bastidor desta guerra, para aqui convergem os jovens oficiais dos três teatros de guerra de todo o exército. Recebo os lençóis e adormeço rapidamente neste universo concentracionário. Adormeço na certeza que hoje não haverá flagelação...


No Tribunal Militar com Ieró Djaló


Nunca mais esqueci os amanheceres ruidosos e o caminhar na laterite de Santa Luzia até ao centro de Bissau: o restolhar das mulheres ruidosas, as sabadoras alvas, puríssimas onde se penduram os andares majestosos, sobretudo dos mandingas e dos futa-fulas, cor de cobre. Sigo até ao tribunal militar, uma outra casa em cimento, fresca e sombria por dentro e onde se acotovelam aqueles que vão ser os julgados por terem morto, desobedecido, insultado, quebrado as regras que a lei militar não consente.

Estão lá os réus, as testemunhas, fazem-se perguntas, explica-se pela décima milionésima vez o que aconteceu, interpela-se quem chega, tenta-se reduzir a ansiedade, pedem-se explicações a quem chega para saber se as nossas acusaçõers são menores que a dos outros. Junto-me a Ieró Djaló, peço-lhe serenidade e comento o que vou dizer em função do crime que lhe foi imputado. A expectativa cresce, não podemos entrar na sala até que um meirinho nos chama a todos, salvo erro três julgamentos à uma.

Sinto-me industriado e confiante em que Djaló tenha todas as atenuantes possíveis. Interrogado pelo juiz, ele a tudo responde quase monossilabicamente. Identificou-se, corrige o nome do pai e a data de nascimento. Confirma que lhe entreguei à sua guarda o prisioneiro. Confessa o seu cansaço e que não se lembra de nada até acordar, espantado com as cordas vazias e que logo me foi avisar, já passava da uma da manhã. Declara que não conhecia o prisioneiro, e disse-o com tal naturalidade que nem havia revolta ou indignação pelo que de horrível pudesse haver em tal pergunta. E, sem que lhe tivessem feito qualquer comentário, empertigou-se, olhou de frente o juiz e disse: "Tenho muita vergonha do que se passou, juro que não volta a acontecer".

O Ieró Djaló que eu apresentei naquela sala numa semi-obscuridade nada tinha a ver com o jovem que de repente desaparecia de Missirá e ia sozinho para Finete, que me dava dores de cabeça quando ia à fonte de Cancumba e fazia propostas menos transparentes às mulheres dos seus camaradas. Nem muito menos me passou pela cabeça alegar que ele era muito bom rapaz mas que tinha inegavelmente um qualquer atraso. O Ieró Djaló sobre o qual eu estava a informar o tribunal era um militar disciplinado, sempre disponível e com múltiplas provas dadas no terreno de operações.

Quanto aos acontecimentos da Anda Cá, resolvi descrever um cenário quase dantesco de calor e pesadelo físico, isto para comentar que estávamos completamente exaustos quando acampámos a escassos quilómetros de Madina. E depois, deu-me para fazer ficção, dizendo que Ieró Djaló queria partir sozinho em perseguição do prisioneiro, e que o contive a custo. Quando fui interpelado sobre o seu futuro, disse sem hesitar que gostaria de o levar ainda hoje para Missirá, caso o meritíssimo juiz assim o entendesse.

Fim do julgamento, foi a marcada a leitura da sentença para o dia seguinte à mesma hora. Surpreendi o Ieró Djaló convidando-o para irmos comer galinha frita no Solar dos 10 e ele aceitou com satisfação. Parece que conheço o Ieró Djaló desde a infância.

À tarde, dirigi-me ao Comando Naval onde encontrei o Comandante Teixeira da Mota. Estava atarefado, sugeriu que jantássemos juntos e logo aceitei. Tinha horas à minha frente, atirei-me às compras, especiarias, peixe seco, folhas de tabaco, tecidos e depois andei a rebuscar nas estantes das poucas livrarias de Bissau. Com as despesas contidas, nem me atrevi a olhar para os discos.

O cais de Bissau foi sempre uma atracção para mim, sentei-me num banco a ver o movimento do porto, o pontilhado dos ilhéus, o vozear dos marinheiros e estivadores. Li os últimos contos de Aldeia Nova, do Manuel da Fonseca, voltei aos correios, dei notícias à Cristina do julgamento, agradeci-lhe o desvelo com que ela tratava o Paulo e o Fodé, pedi-lhe desculpa pelas minhas cartas às vezes tão desencontradas devido ao cansaço, voltámos a falar do futuro e dei-lhe a saber que esperava amanhã à tarde ter um avião de regresso. Então, sem sabermos porquê, começámos a chorar de mansinho e a dizermos aquelas banalidades seguramente próprias de quem não se vê há praticamente 1 ano. Prometi escrever com mais regularidade, quando saí dos correios ainda havia aquela luz crua que ofusca e nos faz olhar defensivamente para o chão. É com alguns sacos que regresso ao QG, deposito a carga e aproveito a boleia de um jipe para voltar ao bulício da cidade.

É aqui que me aguardam várias surpresas. Primeiro encontro o Saiegh. Sabia pelo Serifo Candé que eu viria a Bissau em breve, sentados à mesa do café revela-me que quer voltar para o exército e diz-me num frase hiperbólica: "Dentro em breve, estarei a formar uma companhia perto de Missirá." Eu não sabia, demorei muito tempo a saber, que em Fá se irá formar a primeira companhia de comandos africana. Quando me estou a levantar e a despedir-me do Saiegh, surge-me o Vargas Cardoso, em tratamento em Bissau, felizmente fomos parcimoniosos, não queríamos ambos falar da guerra, embora eu estivesse devorado por saber como estavam os meus antigos soldados.

Um jantar num vaso de guerra, antes dos fuzileiros partirem


O Comandante Teixeira da Mota veste irrepreensivelmente de branco e vamos jantar a bordo de uma embarcação donde, na madrugada seguinte, partirão fuzileiros para uma operação. É um espectáculo estranho, de um lado a amenidade à volta de uma mesa de jantar enquanto que lá fora se carrega armamento e os combatentes limpam as armas. O Comandante Teixeira da Mota tem livros para me oferecer, voltou a falar de Bucol, tive a decência de não lhe dizer que lá estivera, num gesto irresponsável. Sinto que este meu amigo está desconfortado com o que faz, ele é um intelectual que dificilmente convive com esta urgência de operações, embarques e desembarques com auxílio da força aérea, dos comandos e dos pára-quedistas. É um jantar muito agradável mas onde, em dado momento, prefiro calar-me, não quero falar da guerra e já respondi a tudo o que aqueles gentis oficiais queriam saber sobre a navegação do Geba e a singularidade do meu viver em Missirá. Apercebendo-se que estou exausto, o Comandante Teixeira da Mota conduz-me até ao Vaticano III. Não o voltarei a ver mais na Guiné.

À hora aprazada, entramos na sala e o juiz profere a sentença que o nosso cabo Ieró Djaló recebe sem pestanejar: 15 dias de prisão, está livre pois aguardou mais do que este tempo nos calabouços. Cá fora abraço-me a esta fonte de preocupações, temos os olhos humedecidos. Peço-lhe para embarcar amanhã cedo para Bambadinca e parto com os meus haveres para Bissalanca, à espera do primeiro avião.

Nessa tarde só tenho voo para Nova Lamego e aceito sem hesitar. Chegado a esta povoação, que é uma Bafatá em ponto pequeno, vou perguntar ao quartel se há transporte para Bafatá. Sim, não hoje mas amanhã ao amanhecer. Dessa curta estadia recordo um serão passado com um oficial muito cordato, tanto quanto me lembro era o Major Guimarães que me falou do agravamento da situação militar, recordou os primeiros ataques com os mísseis, equipamento que iria mexer com a moral das tropas, contou-me a dureza do ataque a Piche no mês anterior.

No dia seguinte, aproveitei a coluna que viera de Bambadinca buscar o correio a Bafatá, já pude almoçar neste meu círculo de boa camaradagem. Estou contente com tudo o que se passou com o Ieró Djaló, triste por ver a mesa do comando vazia, todos se interrogam sobre quem virá substituí-los. Ao princípio da tarde, já com o camuflado vestido e cheio de boas notícias para as gentes do Cuor, Mufali Iafai deposita-me na bolanha de Finete que atravesso na companhia dos soldados milícias, que me pedem vezes sem conta que descreva um julgamento militar.

Foi um período agitado, li pouco mas comecei leituras estimulantes. Para as idas e vindas de avião, fez-me companhia O Santo e os diamantes roubados, de Leslie Charteris. É um policial de acção, inclui uma louca correria de uma equipa de de bandidos a soldo do Príncipe Rodolfo, parente do Imperador Francisco José, através da Áustria e da Alemanha, para roubar as jóias que o Santo por sua vez roubara a outro ladrão. É um furto valiosissimo de rubis, pérolas, safis e diamantes, de que faz parte o diamante azul Ullsteindach, prenda de casamento do Imperador ao Arquiduqe Miguel. Simon Templar vencerá todos os obstáculos na companhia de Patrícia e do seu inseparável amigo Monty Howard. Nunca me desfiz do livro por causa da bela capa de Lima de Freitas.

Manuel da Fonseca deixou-nos belos contos sobre o Alentejo. Belos e trágicos, ao nível da epopeia, relatos de fome, de castigo, memórias de infância, registos de injustiças, homenagem à beleza telúrica. A Aldeia Nova é uma colectânea de contos onde se cruzam memórias poéticas e o sofrimento do campesinato. Como numa sinfonia gloriosa, os primeiros acordes são vigorosos na vibração e na tragédia. Um exemplo logo no primeiro conto, Campaniça: "Valgato é terra ruim. Fica no fundo de um córrego, cercada de carrascais e sobreiros descarnados. O mais é terra amarela, nua até perder de vista. Não há searas em volta. Há a charneca sem fim que se alarga para todo o resto do mundo. E, no meio do descampado, no fundo do vale tolhido de solidão, fica a aldeia de Valgato debaixo de um céu parado". Sim, Manuel da Fonseca é um dos maiores contistas e soube superar os rudimentos e as limitações do neo-realismo. É bom lê-lo lá no fundo do Cuor.

A rotina vai prosseguir até que no próximo dia 15 Missirá vai ser duramente flagelada mas o revés vai recair sobre a gente de Madina. Serifo Candé virá um dia destes com um gerador que ficará armazenado em Bambadinca, não pode ser transportado por Sintex, é arriscado levá-lo na bolanha. Não será no meu tempo que o verei a funcionar em Missirá. Os patrulhamentos a Mato de Cão não vão abrandar e um dia vamos voltar ao Enxalé, para desgosto de quem vive em Madina. O estado do Casanova é preocupante, o médico fala em depressão. O pior está para vir. Nos fins de Julho, voltarei a adoecer e aguardam-me dolorosos desgostos. Alguém que eu muito estimo me irá chamar "branco assassino". Não serei o mesmo, depois.

___________

Notas de L.G.:


(1) Vd. posts de:

6 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1927: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (54): Ponta Varela e Mato Cão: Terror no Geba

29 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1898: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (53): O ataque a Missirá de 15 de Julho de 1969, visto pelo bravo mas modesto Queta Baldé

22 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1870: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (51): Cartas de um militar de além-mar em África para aquém em Portugal (5)

(2) Vd. post de 23 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1542: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (34): Uma desastrada e desastrosa operação a Madina/Belel

domingo, 6 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5415: Os nossos camaradas guineenses (20): Homenagem aos Comandos africanos, fuzilados no pós-independência (Manuel Amaro Bernardo)


1. Do Cor Inf Manuel Amaro Bernardo, que se encontra na situação de Reforma, recebemos a seguinte mensagem, homenageando os COMANDOS africanos que foram fuzilados clandestinamente,na Guiné-Bissau, após a independência, com pedido de publicação:

Homenagem aos “COMANDOS” africanos fuzilados clandestinamente na Guiné

"(…) Onde estavam os que hoje tão convenientemente pretendem utilizar os fuzilamentos como bandeira política? Hoje, com o passar das décadas, tudo se torna, para alguns, tão nítido, tão simplista. (…)"

José Belo, ex-Alf Mil /Guiné, em 1-12-2009

Apresentando o seu comentário no site de Luís Graça, como reflexões circunstanciais a propósito deste tema, este senhor, imbuído de uma perspectiva de esquerda, típica dos considerados sectores culturalmente mais evoluídos da sociedade portuguesa, acaba por querer desculpar o que é indesculpável…

Já que se pode presumir que o seu texto vem endereçado à minha pessoa, vou tentar explicar que não tem razão. Eu não me oriento por agendas políticas encomendadas, nem utilizei os fuzilamentos como
bandeira política.

Este processo de investigação dos factos ocorridos na Guiné decorreu de um pedido que me fez o camarada do meu Curso de Infantaria (1956-60), Coronel José Clementino Pais, pouco tempo antes de falecer, em 2006, devido às sequelas resultantes do rebentamento de uma mina na zona de Farim, onde, em 1972, comandava a CCaç 14.

Foi assim que, apesar de nunca me ter deslocado à Guiné, avancei com a publicação, em 2007, do referido livro, "
Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros: Guiné 1970-1980". Nele, e dirigindo-me a este oficial, pode ler-se:

(…) Pois é Zé. Agora é a minha vez de te dizer: Paz à tua alma. Podes repousar em paz, com a certeza de que vou tentar cumprir a promessa que te fiz, há cerca de três meses: denunciar o sucedido com os teus soldados da Guiné e muitos 'comandos' africanos (a maior parte dos oficiais e sargentos das três companhias existentes) fuzilados após a independência deste território.

Carnaxide – Março de 2006

As listagens dos fuzilados

Já que voltei de novo a ser acusado de apenas salientar os 'comandos' africanos, posso referir que do meu texto anterior datado de 8-11-2009 e não publicado no
site de Luís Graça (junta-se em anexo, assim como as duas relações abaixo indicadas) já se destacavam os dois anexos constantes do citado livro e onde as listagens dos fuzilados eram referidas:

1. Relação nominal de 86 ex-militares, milícias, régulos e cipaios, que incluía 14 fuzileiros especiais (7 sargentos e 7 marinheiros), com base na informação num livro do Ten-Coronel Queba Sambú, dissidente do PAIGC e na então existente Associação Portuguesa dos Antigos Combatentes da Guiné (apoiada pelo José Pais).

2. Relação nominal dos 53 oficiais, sargentos e praças, 'comandos' africanos da Guiné, fuzilados clandestinamente (à semelhança dos anteriores) homenageados pela Liga dos Combatentes, na cerimónia de 14 de Novembro passado.

Recordando outras circunstâncias…

O ex-combatente José Belo refere no seu texto:

(…) O ajuste de contas surgiu na primeira oportunidade; mas não teria sido possível algo de semelhante se alguns dos fuzilados tivessem, noutras circunstâncias, tido a mesma oportunidade em relação aos guerrilheiros?

É uma pergunta menos conveniente, mas de considerar, tendo em conta que alguns de nós conheceram pessoalmente muitos dos fuzilados. Para nós, os que não pretendem utilizar estes CAMARADAS que ao nosso lado (tantas vezes à nossa frente!) lutaram, carregaram aos ombros os seus/nossos mortos, comungaram literalmente a mesma terra vermelha de sangue... não existem "agendas políticas", como não deverão existir complexos colectivos de culpas.

Sobre o comportamento dos 'comandos' africanos em operações, o Furriel Comando Júlio Jaquité (Ob cit pp´351) afirma:

Quando o Luís Cabral, em certo dia, na TV em Lisboa, afirmou que os comandos africanos eram assassinos, eu telefonei para essa estação de televisão e perguntei como é que se fazia um programa daqueles sem nos convidar.

Os 'comandos' africanos, em relação à população, não matavam ninguém; e, quando prendíamos militares do PAIGC, éramos obrigados a entregá-los no Comando-Chefe para serem ouvidos. Era expressamente proibido matar alguém no mato.

E este graduado esclarecia ainda:


(…) quando alguém era feito prisioneiro ninguém o podia magoar, pois era punido, tanto disciplinarmente, como em Tribunal Militar, que existia em Bissau e funcionava. Estas eram as ordens do General Spínola, que eram cumpridas. A alguns prisioneiros até era dada uma casa e arranjado emprego. (…)

Agora pergunto eu. A existir este tipo de comportamento em operações, alguém acredita que os 'comandos' africanos guineenses viessem a praticar tais fuzilamentos clandestinos em massa?

À semelhança do Doutor Manuel Rebocho, que numa tese de doutoramento (agora em livro) veio questionar o comportamento dos oficiais do quadro permanente (QP) do Exército em operações no Ultramar, também José Belo faz a distinção entre os das "agendas políticas” e os que combatiam e morriam no terreno.


Apenas recordo que a maior parte dos oficiais do QP da minha geração fez quatro comissões por escala no Ultramar; isto é, estiveram no início da guerra em Angola e acabaram por tentar acabar com a guerra, com a sua contestação, que levou ao 25 de Abril de 1974.

Eu, por exemplo, depois dos tempos de subalterno (alferes e tenente), fui sempre nomeado para comandar companhias, até Dezembro de 1973, quando regressei da 4.ª comissão em Moçambique.

E muitos morreram e ficaram feridos, como o José Pais, que num livro publicado (
Histórias de Guerra; Índia, Angola e Guiné, 2002, por mim prefaciado), descreve o que lhe sucedeu, numa conversa havida com o seu enfermeiro africano:

(…) -Tem cuidado, que pode haver mais minas – disse-lhe o capitão ainda consciente.
-Não faz mal, nosso capitão – respondeu o Queta valentemente.
- Pede sangue para Farim O Rh+. Não me dês água. Tenho a barriga furada. Vou ter muita sede. Se me dás água, matas-me.
- Fica descansado nosso capitão. Eu sabe.

Deu-lhe a morfina, fez-lhe o garrote, pôs-lhe um penso na femural arrancada, que esguichava sangue, como uma torneira. (…)

Deste modo, espero ter esclarecido os leitores sobre a maneira como avancei para este trabalho que, à semelhança de outros realizados em relação a Moçambique e Timor, além da investigação feita nos arquivos, são incluídos os depoimentos dos participantes nos acontecimentos para, no futuro, se poder fazer uma mais realista reconstituição histórica.


E termino lembrando a opinião de um investigador americano (J. P. Cann) sobre a nossa Guerra do Ultramar:


(…) Em 1971, o Exército dera credibilidade a Portugal em todos os teatros de operações e encontrava-se preparado para aguentar um compasso de espera, a fim de negociar uma descolonização. (…)

Cor Ref Manuel Amaro Bernardo
3-12-2009


Anexo I

Lista dos africanos (com excepção dos 'comandos') fuzilados na Guiné (Provisória), Abril de 2006
  • Nome * Posto * Colocação * Data/local fuzilamento
- Adelino Sousa (1)
-
Adulai Dabó (2) 2.º Sarg. Fuz Esp DFuz Esp 22
-
Aladje Alansó Camará (2) Cmdt de milícia / Jabadá
-
Alarba Baldé (1) (2) Régulo
-
Alfa Baldé (2) Soldado Inf Pel Caç Nat 53
-
Aliu Baldé (2) Sold de milícia /Mansabá (?)
-
Aliu Baldé (2) Soldado Inf CCaç 18
-
Amadu Baldé (2) (3) Soldado Inf CCaç 18
-
Anastasio Sidi (2) Furriel
-
Ansumane Mané (2) (3) Cmdt de milícia / Gampará
-
Arnaldo Quinde Baldé (2) 2.º Sarg Inf CCS/QG
-
Baba Galé Jaló (2) Sold Inf CCaç 18
-
Bacar Alansó Cassamá (2) Cmdt de milícia / Empada
-
Bacar Baldé (2) Soldado Inf CCaç 18
-
Bacar Seidi (2) Soldado Art GAC 7
-
Bacarzinho (2) Soldado Inf 5.º Curso Cmds
-
Bará Dabó (2) Soldado Inf CCaç 14
-
Bawali Tcham (2) Cmdt de milícia / Empada
- Beleté (2) Cabo de mílicia
-
Boi Baldé (3) Marinheiro Fuz. Esp. (?)
-
Bonco Sanhá (1) (3)
-
Braima Candé (2) Sold de milícia / Farim
-
Braima Jau (2) Soldado Inf CCaç 18
-
Braima Sani (2) (3) 2.º Sarg. Fuz Esp D Fuz Esp 21
-
Braima Sano (3) Marinheiro Fuzileiro Esp. (?)
-
Cabá Santiago (2) Cmdt de milícia / Bissorã
-
Calido Baldé (2) (3) Marinheiro DFuz Esp 22
-
Califa Baldé (2) 2.º Sarg Fuz Esp DFE21
-
Coio Baldé (2) Régulo
-
Constantino Aliu Sani (2) Soldado Inf 4.º Curso Cmds
-
Dadi Baldé (1) 1.º Cabo cipaio
-
Dantil Mendes (2) Cmdt de milícia /Jolmete
-
Demba Ganó (2) Soldado Inf CCaç 11
-
Demba Julde Baldé (1) (2) Régulo de Fajão Quito (Bafatá)
-
Dicó Baldé (2) Soldado Inf CCS/QG
-
Domingos Ensá Djassi (2) 2.º Sarg Fuz Esp DFE 21
-
Gabriel Cherno Baldé (1) (2) 1.º Cabo PSP Cumeré
-
Galilo Dabó (2) Cmdt de milícia / Empada
-
Galo Baldé (1) Régulo de Canadú (Bafatá)
-
Henrique Sello Jaló (2) Soldado Art GAC 7 Pixe
-
Iancuba Camará (1)
-
Irineu (2) Soldado Inf (?)
-
Isaac Dias Ferreira (2) Soldado (?)
-
Jaime Seidi (1)
-
Jaló Seidi (2) Soldado Art GAC 7
-
Jamanca Seidi (1)
-
João Batista (2) 1.º Sarg Enf Dep Adidos Bissau
-
Joaquim Baticã Ferreira (2) Régulo 1976
-
Luntam Indjai (2) (3) 2.º Sarg Fuz Esp DFE 21
-
Malagueta (…) (1) Cabo cipaio
-
Malam Cassapá (2) Civil / Adm de Catió
-
Malam Sani (2) Soldado Inf.ª CCaç 14
-
Malam Turé (2) Furriel Inf CCaç 21
-
Mama Braima Seidi (2) 2.º Cmdt de milícia
-
Mama Djam Jaló (2) Sold de milícia / Mansabá
-
Mama Jabel (2) Ex-deputado
-
Mama Saliu Jaló (2) 1.º Cabo Inf CCaç 5
-
Mama Samba Candé (2) Soldado Inf Pel Caç Nat 53
-
Mamadu Aliu Seidi (2) Marinheiro DFE 21
-
Mamadu Bangura (1)
-
Mamadu Bobó Jaló (2) Soldado Inf Farim (?)
-
Mamadu Bonco Sanhá (1) (2) Régulo Bambadinca
-
Mamadú Embaló (2) Cabo de mílicias
-
Mamadú Jual Baldé (1) Filho de régulo (Bafatá)
-
Mamadú Sanhá (1) Milícia de régulo Bambadinca
-
Mamadu Seidi (2) Cmdt de milícia / Mansabá (?)
-
Mamadu Sissé (1)
-
Manuel Seidi (2) Marinheiro
-
Marçal Sambú (2) 2.º Sarg Fuz Esp DFE 22
-
Mário Adjabá (2) 2.º Sarg Fuz Esp DFE 22
-
Mateia Baldé (1)
-
Miguel Francisco Pires (2) Soldado Inf CCS/QG
-
Mori Baldé (2) Soldado Inf CCaç 18
-
Napoleão Jaló (2) Soldado cond Marinha
-
Obeara Sambú (1) Mulher (Fuzilada c/ o 'Cmd' João Uloma) Canjambare
-
Pedro Lopes (3) Marinheiro Fuzileiro Esp (?)
-
Per Sanhá (2) Soldado 'Cmd' (?) .
-
Quindi Baldé (2) 1.º Sargento / QG Farim
-
Quissima (1)
-
Saco Baldé (2) Sold de milícia / Cuntima
-
Salium Queta (2) Furriel Inf CCaç 5 Bissau
-
Samba Ganha Baldé (2) Régulo
-
Sambaro Candé (1) (2) Cmdt de milícia / Mansabá
-
Sambel Baldé (1) (2) Régulo
-
Sambel Coio Baldé (1) (2) Antigo régulo de Fajão Quito
-
Sancum Baldé (2) Régulo
-
Sandem Dabó (3) Marinheiro Fuz Esp (?)
-
Sello Jaló (1) (2) Soldado Inf Farim
-
Sidi Jaló (2) Soldado Inf CCaç 12
-
Suleimane Dembel Baldé (1) Cipaio
-
Surna Jau (1)
-
Tabê Dabó (1)
-
Tamba Jau (1) Soldado Cumeré
-
Tcherno Djau (1) (3)
-
Uri Baldé (2) Sold. de milícia / Mansabá
-
Uri Jaló (2) Soldado Inf Esquadrão Bafatá (?)

Notas:

(1) Queba Sambu (Tenente Coronel e quadro superior dissidente do PAIGC) “Ordem para Matar (…)”. Lisboa, Ed. Referendo, 1989.
(2) Informação da Associaçãp Portuguesa dos Antigos Combatentes da Guiné.
(3) Consta da lista do PAIGC (
Nô Pintcha, de 29-11-1980)

Anexo II

Lista dos comandos africanos fuzilados na Guiné (Provisória)
  • Nome * Posto * Colocação * Data/local fuzilamento
- Abdulai Queta Jamanca (1) (4) (6) Tenente“Cmd”CmdtCCaç 21MAR1975 * Bambadinca * Inc.12-1-1956, n.5-1-1937/Farim(1.ª CCmdsAf/Príncipe fula)
-
Adriano Sisseco (1) (2) (4 ) (9) Capitão “Cmd” 2.ªCCmds Af./74 18-12-78 * Portogole * Inc. 5-1-1964, n. 10-8-1941/Bolama
-
Alfa Candé (3) Furriel “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * 1975 * Mansoa
-
Alfa Embaló (1) (3) Furriel “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 1975 * Cumeré * (Gr. Vingadores) (7)
-
Aliu Sada Candé (1) (4) (6) Alferes “Cmd” CCaç 21 (2.ª CCmds Af/74) * Bambadinca * Inc. 6-5-1966, n. 8-5-1944/Aldeia Formosa
- Amarante Sadja (3) (4) Furriel “Cmd” 3ª. CCmds Af./74 * Cumeré * Inc18-4-1966, n. 1945/Bissorá
- Américo Lamine Camará (1) (3) Furriel “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * 1975 * Cumeré
-
Anastácio Moreira Ferreira (1) (2) Furriel “Cmd” Bat. Cmds Af/74 MAR1975 * Cantchungo * Inc. 13-9-1964(4), n. 12-6-1942/?
-
António Mendonça (1) (3) Furriel “Cmd” 2.ª CCmdsAf/74 * Portogole * Inc. 2-1-1970, n. 20-2-1947/Cacheu (regressado de Dakar)
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António Samba Juma Djaló (1) (3) Alferes “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 1975 * Bambadinca * Inc. 3-4-1967 (4), n. 5-10-1944/Fulacunda
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António Vasconcelos (1) (3) (4) Alferes “Cmd” 3.ª CCmds Af./74 DEZ 1975 * Bafatá * Inc. 11-1-1956, n. 15-2-1936/S. Domingos
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Armando Carolino Barbosa (1) (2) Tenente.“Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Bambadinca * Inc. 28-6-1964 (4), n. 11-10-1946/Bafatá
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Aruna Candé (1) (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Cuntima * Inc. 2-8-1970, n. 11-6-1946/Farim
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Augusto Filipe (1) (3) (4) 2.º Sarg. “Cmd” 1.ª CCmds Af. * Cumeré * Inc. 2-1-1970, n. 16-8-1948/Mansoa
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Bacar Djassi (1) (4) Tenente “Cmd” 3.ªCmds Af./74 * Cumeré * Inc. 26-5-1962, n. 7-1-1944/Fulacunda
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Bailo Djau (2) (3) (4) Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 1986 * Cumeré * Inc. 3-4-1967, n. 3-4-1946 (fuz. depois de ter sido preso no Senegal)
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Belente Mepe (8) Furriel “Cmd” (preso em 19-11-1974)
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Braíma Baldé (1) (2) (3) (4) Alferes“Cmd”CCaç21(1.ªCCmds MAR75) * Bambadinca * Inc. 2-1-1960, n. 2-8-1939/Bafatá
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Braima Bari (1) (4) Furriel “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Cumeré * Inc. FEV 1965
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Braima Camará (3) Furriel “Cmd” Gr.Vingadores (7) * 1975 * Bissau
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Braima Turé (8) Furriel “Cmd”/ Gr. dos Vingadores 1975(?) * Cumeré(?) * n. 8-8-1948 (preso em 12-12-1974)
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Bubacar Camará (1) (3 ) (4) Furriel “Cmd” 3.ª CCmds Af./74 * Cumeré * Inc. 2-1-1970, n. 26-1-1946/Cacheu (Gr. Vingadores) (7)
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Carlos Bubacar Jau (1) (3) (4) Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Af. * Cumeré * Inc. 7-11-1971, n. 13-3-1946/Bafatá
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Carlos D. Facene Samá (1) (3) (4) 2.º Sarg. “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Portogole * Inc. 2-1-1970, n. 15-8-1949/Farim
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Cicri Marques Vieira (2) (3) (4) Tenente “Cmd” 2.ªCCmds Af./74 18-12-78 * Portogole * Inc. 15-8-1968, n. 27-1-1945
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Col Quessanque (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 3.ª CCmds Af./74 * Mansoa * Inc. 13-1-1958, n. 13-1-1938 (fuzil. púb)
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Cube Jaló (1) (3) (8) Sold. “Cmd” BCmds/3.ª CCmds 1979 * Bissau
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Dabo Baldé (1) (4) Furriel “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Portogole * Inc. 24-10-1966, n. 24-10-1947 (regressado de Dakar) (3)
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Demba Cham Seca (1) (2) (3) (4) (6) (9) Alferes “Cmd” CCaç 21 25-03-75 * Bambadinca * Inc. 2-1-1960, n. 12-1-1939 (1.ª CCmdsAf./74)
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Fodé Baió (4) 1.º Sarg “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * Mansoa * Inc. 24-10-1966, n. 1945/Farim
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Fodé Embaló (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * Bambadinca * Inc. 27-5-1961, n. 1942/ Gabú
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Francisco Alenquer Imbadé (1) (3) Furriel “Cmd” 3.ª CCmds Af./74 * (?) * Inc. 24-1-1971, n. 20-5-1950
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Granque Camará (1) (3) (8) Soldado “Cmd” 3.ª CCmds Af/74 * 1979 * Bissau
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João Uloma (1) (3) (4) Alferes “Cmd”1.ª CCmds Af./74 * Camjambare (Oio) * Inc. 6-1-1953, n. 8-1-1932/Susana-S. Domingos.
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José Aliú Queta (1) (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Mansoa * Inc. 3-4-1967, n. 16-4-1946/Mansoa
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Justo Orlando Nascimento Lopes Tenente “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * Cumeré * Inc. 5-1-1963 (1) (2) (4), n. 12-12-1942/Cacheu
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Luís Assaul (3) Soldado “Cmd” 2.ª CCmds Af. * 1986 * (?)
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Malam Baldé (2) (3) (4) (5) Alferes “Cmd” CCaç 20 (3.ª CCmds Af./74) * Cumeré * Inc. 16-1-1959, n. 10-12-1940/Pirada-Gabú
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Mamadu Jaló (1) (3) 1.º Sarg “Cmd” 2.ª CCmds Af/74 * Bafatá * (Gr. Vingadores) (7)
-
Mamadu Saliú Bari (1) (4) Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 1977 * Cumeré * Inc. 5-1-1964, n. 9-11-1940/Bafatá
-
Manga Mané (1) (2) (3) Furriel “Cmd” 1.ª CCmds/74 DEZ 1975 * Zinguichor * (regressado do Senegal)
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Marcelino Moreira (1) (3) Alferes “Cmd” 2.ª CCmds/74 1975 (?) * Mansoa (?) *
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Marcelino Pereira (1) (3) (4) Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Cumeré * Inc. 5-8-1965, n. 27-6-1946/Mansoa
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Mário Bubacar Jaló (1) (3) Furriel “Cmd” 3.ª CCmds/74 * (Portogole?) * Farim, (regressado de Dakar)
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Mussa Camará (1) (3) (8) Furriel “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * 1975 * (?)
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Quecumba Camará (1) (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 2.ª CCmds Af./74 * Mansoa * Inc. 3-4-1964, n. 1943/Bissorá (fuz. Público)
-
Samba Baldé (1) (4) Furriel “Cmd” 1.ª CCmds Af./74* Cumeré * Inc. 2-8-1970, n. 15-8-1946/Bafatá
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Sijali Embaló (3) (4) Furriel “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * Cumeré * Inc. 24-10-1966, n. 7-5-1946/Bafatá
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Silvério Samba Baldé (4) Furriel “Cmd” 2.ª CCmdsAf/74 * Bambadinca * Inc. 2-1-1969, n. 15-1-1947/Gabú
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Tomás Camará (1) (2) (4) (5) Tenente “Cmd” Cmdt CCaç 20 * 1978 * Cumeré * Inc. 8-1-1961 (25 ABR no HMP) n. 1943/Cacine-Catió (1.ª CCmds Af/74)
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Tumane Queta (1) (3) Soldado “Cmd” BCmds (CCS) 1975 (?) * Cumeré
-
Zacarias Saiegh (1) (2) (4) (9) Capitão“Cmd” 1.ªCCmds Af./74 18-12-78 * Portogole * Inc. 4-5-1966, n. 5-1945/Cacheu
-
Zeca Lopes (3) (4) 1.º Sarg. “Cmd” 1.ª CCmds Af./74 * Biombo * Inc. 1968, n. 28-8-1947/Bissau

Resumo:

Oficiais (20): Sargentos (29): Praças (4 soldados).
1. 2 capitães 1. 8 1.ºs sargentos
2. 6 tenentes 2. 2 2.ºs sargentos
3. 12 alferes 3. 19 furriéis
Totais: 20 oficiais + 29 sargentos + 4 soldados = 53 militares


Notas:


(1) In Queba Sambú (quadro superior/dissidente do PAIGC, em 1987).
Ordem para Matar (…). Lisboa, Ed. Referendo, 1989.
(2) Informação da viúva
(3) Informação da Associação Portuguesa dos Antigos Combatentes da Guiné
(4) Informação da Associação dos Cmds.
(5) Em Junho/73 fora nomeado para a CCaç 20, tendo regressado à CCmds de origem, em AGO/74 (Doc. em arquivo no ex-RCmds)
(6) Em Junho/73 fora nomeado para a CCaç 21, extinta em Agosto de 74, tendo regressado à CCmds onde pertencia (relação de documentos de matrícula em arquivo/ex-RCmds)
(7) O Grupo dos Vingadores era comandado pelo Marcelino da Mata.
(8) Consta da listagem do PAIGC (
Nô Pintcha, de 29-11-1980).
(9) Na sua certidão de óbito (em anexo) consta “ faleceu de fuzilamento”.

Num programa da RTP 1, em 9-5-2006 (
Em Reportagem) foi abordado este tema, com entrevistas de Nino Vieira, Almeida Bruno, Alpoim Calvão, Loureiro Cadete e Caçorino Dias e embaixador Leonardo Matias.
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Nota de M.R.:

Vd. poste do mesmo autor, sobre esta mesma matéria, em:

1 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5380: Os nossos camaradas guineenses (13): Homenagem aos 53 comandos africanos fuzilados no pós-independência (Manuel Bernardo)

Vd. último poste da série em: