quinta-feira, 12 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1947: O Coronel Paulo Malu, ex-comandante do PAIGC, fala-nos da terrível emboscada do Quirafo (Pepito / Paulo Santiago)

 
Guiné- Bissau > Instalações da AD - Acção para o Desenvolvimento > Julho de 2007 > O Paulo Malu, antigo comandante do PAIGC, hoje coronel, e quadro superior da Direcção-Geral de Alfândegas. Foi ele que comandou, em 17 de Abril de 1972, o bigrupo (?) que montou e executou a terrível emboscada contra os militares da CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74) que escoltavam um grupo de civis afectos à construção de uma estrada (Quirafo-Foz do Cantoro).






 
Guiné- Bissau > Instalações da AD - Acção para o Desenvolvimento > Julho de 2007 > O Sado, quadro superior da Direcção-Geral de Alfândegas, amigo do Paulo Santiago.

Fotos: ©
Pepito/ AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007)




Guiné-Bissau > Região de Bafatá >
Contabane > Quirafo > Feverereiro de 2005 > Mais de trinta anos depois, os restos calcinados da fatídica GMC que serviu de caixão ao Alf Mil Armandino e aos seus camaradas da CCAÇ 3490 (Saltinho, 1972/74), no trágico dia 17 de Abril de 1972, na picada de Quirafo (entre o Saltinho, Contabane e Dulombi).

Recorde-se que nesta emboscada foram utilizados LGFog e 1 canhão s/r. Do nosso lado, houve, pelo menos, 10 militares mortos, 1 desaparecido, todos da CART 3490 (Saltinho, 1972/74)... Houve ainda 5 milícias mortos mais um número indeterminado de baixas, entre os civis, afectos à construção da picada Quirafo-Foz do Cantoro (1). A brutal violência da emboscada ainda hoje é visível, mais de três décadas depois, nas imagens dramáticas obtidas pelo Paulo Santiago e seu filho João, na viagem de todas as emoções que eles fizeram em Fevereiro de 2005 (2).


Foto: ©
João Santiago (2006). Direitos reservados.


1. Finalmente conseguimos, ao fim de muitos meses de contactos e diligências, chegar à fala com o homem que, no dia 17 de Abril de 1972, comanandou a emboscada do Quirafo. Eis a resposta que o Pepito mandou ontem ao Paulo, com conhecimento a mim, e que passo a reproduzir abaixo.

É uma grande emoção para o Paulo Santiago (que se apressou a telefonar-me, a dar-me a notícia da chegada do email do Pepito), mas também para nós, todos, que temos acompanhado este dossiê. O meu/nosso muito obrigado a todos aqueles que, de uma maneira ou de outra nos ajudaram (ou mostraram interesse em ajudar), de modo a conseguirmos o depoimento do Paulo Malu. Obrigado ao Pepito, ao Paulo Malu, ao Saldo Baldé, ao Jorge Rosmaninho, naturalmente ao Paulo Santiago, que nos emocionou com a reconstituição deste episódio, um dos mais negros da história da guerra colonial.

Esperemos que o Pepito consiga obter informação mais detalhada. Mas este momemto, este encontro, tem uma enorme carga de simbolismo, para ambas as partes, reforçada pelo desejo do Paulo Malu de querer encontrar-se com o Paulo Santiago, talvez já em Março de 2008.



A reconciliação e a paz são  um longo caminho que se contrói pedra a pedra, lágrima a lágrima, recordação a recordação. (LG)

Caro Paulo:

Acabo de me encontrar aqui no meu gabinete de trabalho com o Sado (contrariamente ao que eu havia dito, trata-se de Sado e não Saido) e com o Coronel Paulo Malu. A minha surpresa foi enorme pois trata-se de um velho amigo meu que já não via há alguns anos.

Está debilitado fisicamente mas com muita lucidez. Contou-me que a emboscada de Quirafo foi comandada por ele porque se supunha que o exercito português estava a pretender abrir uma estrada para facilitar a deslocação para o Boé. Daí eles terem decidido fazer a emboscada.

Quanto ao prisioneiro [,António da Silva Batista], foi descoberto emboscado, fingindo-se de morto, mas a respiração traiu-o. Foi levado até à fronteira com a Guiné-Conakry nesse mesmo dia e, à noite, um camião vindo de Boké levou-o para Conakry onde chegaram (o prisioneiro e ele, Malu) de manhã cedo.

Ele não sabe o que lhe aconteceu depois, pois por vezes os presos eram mandados para Argel. Está interessadíssimo em encontrar-se contigo, aquando da próxima vinda a Bissau.

Mando 2 fotos, uma do Sado e outra do Malu.
abraços
pepito


2. Mensagem enviada dia 6 de Julho pelo Paulo Santiago ao Pepito:

Camarada Pepito:


Parece-me que temos um amigo comum, o Domingos Pereira, director de produção da Cicer,actualmente em Portugal, e que,estava previsto vir passar este fim de semana aminha casa. Já não vem, porque a Zinha teve problemas de saúde, nestes últimos dias, tendo mesmo assim embarcado, bem medicada, esta manhã para Bissau, onde chegou bem, segundo informação dada pelo Domingos que ficou em Portugal, regressando a Bissau na próxima 6ª feira.

Falei com ele há minutos e,possivelmente só nos encontraremos,quando vier a Lisboa,daqui a umas 3 semanas,juntamente com os patrões,numa prospeção ao mercado de garrafas e cápsulas.

O motivo deste mail é outro.Ontem em telefonema ao Luís,falámos sobre o Paulo Malu. Segundo o meu amigo,Sado Baldé, Major ou já Ten-Cor,na Direcção Geral das Alfandegas,foi o Paulo Malu que comandou a emboscada no Quirafo,evocada por mim no blogue,há um ano atrás: "A Tragédia do Quirafo" (1) .

Em Fevereiro de 2005, quando estive na Guiné (2), cheguei a ter um encontro previsto com o Malu, para a manhã do dia de embarque,que infelizmente não se realizou, devido ao Sado,que vinha nesse dia para Portugal,ter passado a manhã a resolver problemas relacionados com a passagem.

Naquela data eu ainda não conhecia o nosso blogue. A seguir aos postes sobre aquele assunto,falei com o Sado sobre a possibilidade de o Paulo falar com um jornalista.
Informou-me que tinha falado com o Malu e que ele estaria disponível.Mandei um mail ao Jorge Rosmaninho, pedindo-lhe para se dirigir à Guarda Fiscal, dizendo ao Sado ao que ía, e o levaria à presença do Comandante Malu.

O Jorge informou-me que andava com muito trabalho, teria de ficar para mais tarde.Passado tempo, recebi um telefonema do Sado que, entre outras coisas, me informou ainda não ter sido procurado por nenhum jornalista. Voltei a insistir com o Jorge, que me deu uma resposta parecida à primeira.

Ontem o Luís lembrou: Será que o Pepito conseguirá falar com o Paulo Malu ? Daí a razão deste mail. Será que podes ir à Direcção Geral das Alfândegas falar com o Sado e, posteriormente, com o Malu ? Seria importante a opinião dele sobre a emboscada e do prisioneiro que levaram para Conacri,dado como morto pelas NT.

Um abraço
Paulo Santiago

PS - Espero poder estar em Guileje em Março de 2008


3. Neste espaço de tempo, eu próprio tinha mandado um toque ao Pepito que está para vir de férias, a Portugal, em meados deste mês, como de costume:

Pepito:

O Paulo Santiago falou comigo, dizendo-me que te prontificaste a falar com o Paulo Malu sobre a emboscada do Quirafo, um dos maiores massacres/carnificinas que aconteceram durante a guerra colonial/guerra de libertação.

Acredito que não seja fácil, ainda hoje, aos homens do PAIGC falar sobre isto...Mas para nós era importante a versão dele... Morreram 11 militares portugueses, incluindo um alferes, meia dúzia de milícias e um número indeterminado de civis... A violência do ataque ainda hoje pode ser testemunhada pelos restos da GMC que lá ficou à beira picada Saltinho - Quirafo - Dulombi, se não me engano... Tens no nosso blogue já muitos textos sobre esta tragédia...

Não temos a versão de ninguém que sofreu a emboscada... Muitos morreram, um foi apanhado vivo... O Paulo, comandante do bigrupo, pode completar o puzzle... É um trabalho delicado, para ti... Mas, de certo, que farás o teu melhor. Obrigado. Luís

_________

Nota de L.G.:

(1) Vd. posts do Paulo Santiago:

23 de Julho de 2006 >
Guiné 63/74 - P980: A tragédia do Quirafo (Parte I): o capitão-proveta Lourenço (Paulo Santiago)

25 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P986: A tragédia do Quirafo (Parte II): a ida premonitória à foz do Rio Cantoro (Paulo Santiago)

26 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P990: A tragédia do Quirafo (parte III): a fatídica segunda-feira, 17 de Abril de 1972 (Paulo Santiago)

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1000: A tragédia do Quirafo (Parte IV): Spínola no Saltinho (Paulo Santiago)

15 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1077: A tragédia do Quirafo (Parte V): eles comem tudo! (Paulo Santiago)

Vd. ainda os seguintes posts, de diversos autores:

20 de Abril de 2007 >
Guiné 63/74 - P1681: Efemérides (4): Lista dos mortos no Quirafo (José Martins)

18 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1674: Efemérides (3): A tragédia do Quirafo: rezar pelos mortos e perdoar aos vivos (Joaquim Mexia Alves)

17 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1669: Efemérides (1): A tragédia do Quirafo, há 35 anos (Paulo Santiago / Vitor Junqueira / Luís Graça)


22 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1104: Homenagem ao Alf Mil Op Especiais Armandino, da CCAÇ 3490, morto na emboscada de Quirafo (Joaquim Mexia Alves)

24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)


21 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P976: A morte do Alf Armandino e a estupidez do capitão-proveta (Joaquim Mexia Alves)

(2) Vd. posts de:

26 de Junho de 2006 >
Guiné 63/74 - P914: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (1): Bissau

29 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P923: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (2): Bambadinca

30 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P926: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (3): Saltinho e Contabane

5 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P938: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (4): branco com coração negro no Rio Corubal

12 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P955: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (5): O pesadelo da terrível emboscada de 17 de Abril de 1972

13 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P957: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (6): De volta ao Saltinho, Bambadinca e Bissau

20 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P975: As emoções de um regresso (Paulo Santiago, Pel Caç Nat 53) (7): ainda as trágicas recordações do dia 17 de Abril de 1972

Guiné 63/74 - P1946: Estórias de Mansoa (2): um capelão (o padre Mário da Lixa) em apuros na estrada de Cutia (Aires Ferreira)




Guiné > Região do Óio > Mansoa > Cutia > Destacamento de Cutia > c. 1970 > Foto enviada, salvo erro, pelo César Vieira Dias, Ex Furriel Miliciano Sapador, CCS / BCAÇ 2885, um batalhão que esteve em Mansoa e Mansabá desde Maio de 1969 a Março de 1971 (se for outro o dono da foto, que reclame).


Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.


Texto do Aires Ferreira, ex-Alf Mil, CCAÇ 1686 / BCAÇ 1912, Mansoa, 1967/69)(1):

Missa em Cutia, por Aires Ferreira

Cutia era um destacamento que tinha um grupo de combate e ficava entre Mansoa e Mansabá e entre o Morés e o Sara - Sarauol [vd. carta de Mambonco].


O Batalhão tinha um Capelão que, um certo Domingo, lá para o fim de 67, resolveu ir celebrar missa a Cutia. Para isso, arranjou uma escolta de voluntários que, comandados pelo furriel S. S., lá foram, com 2 Unimogs e o jipe do capelão.

A missa foi celebrada e, no regresso, um dos Unimogs despistou-se e uma grande parte do pessoal da escolta ficou com ferimentos muito graves, tendo os restantes seguido até Mansoa para pedir auxílio.

Nesse Domingo, eu estava de Oficial de Dia ao quartel de Mansoa e desconhecia totalmente este assunto. Cerca da hora de almoço, passava junto à porta de armas, encontrei o Tenente-Coronel, o Comandante do Batalhão, que me disse:

- Alferes Ferreira, o seu grupo está todo destroçado na estrada de Cutia, o que está aqui a fazer? Vá já para lá.

- Não posso, estou de serviço - disse eu e apontei a braçadeira.

- Dê cá, eu fico com ela. O piquete vai já atrás de si com a ambulância.

Assim foi. Lá fui, munido da pistola Walther, com um condutor que por ali apareceu e chegámos depressa. A cena era trágica. Havia 5 ou 6 militares gravemente feridos e deitados na berma. O único militar que ali estava capaz de dar uns tiros para defender o local, se o IN por ali aparecesse, era … o Capelão, que, de joelhos, na estrada, junto ao jipe, fazia as suas orações, de G3 ao lado.

Logo de seguida chegou o necessário auxílio e todos os feridos foram evacuados e tratados.O Alferes Capelão que faz parte desta história era… o Padre Mário Pais de Oliveira (2), bem conhecido desta Tertúlia e a quem envio um grande abraço.

Aires Ferreira

2. Comentário do editor do blogue:

Esta cena, trágico-cómica, repetiu-se infelizmente muitas vezes na Guiné, devido à frequência de acidentes, graves, com viaturas. A estória tem algo de heróico, insólito e ao mesmo tempo delicioso: estou a imaginar a angústia do capelão, o único homem do grupo em condições de se defender de um eventual da guerrilha, fazendo lembrar os nossos primeiros missionários, a cruz numa mão e a espada noutra, prontos para o martírio (ou o massacre).

Trata-se de um estória que eu recuperei de um poste do Aires Ferreira (1). Quis dar-lhe mais visibilidade e mas ao mesmo tempo fazer também uma singela homenagem aso nossos capelães militares. Muitos camaradas nossos devem-lhes uma palavra de gratidão pelo conforto espiritual e moral que, na missa, na confissão ou na simples conversa de caserna, na dor e na alegria, receberam destes homens, em terras da Guiné.

É uma homenagem a todos eles, independentemente das posições político-ideológicas que tomaram(ou não) perante a guerra, na altura ou mais tarde... A sua tarefa não era fácil, estando o seu múnus espiritual fortemente condicionado pelo seu enquadramento institucional (nem mais nem menos dois pesos pesados, a Igreja Católica e as Forças Armadas, com a PIDE/DGS sempre perto, a vigiar e a zelar pelo "bem da Nação")...

De dois desses homens já aqui falámos, com mais afecto e carinho: o Mário de Oliveira e o Arsénio Puim (3)... Mas a nossa Tabanca Grande está aberta e pronta a acolher o testemunho de outros capelães que queiram aparecer... e até dos sacristães (que os havia em cada CCS de cada batalhão). Ao que parece, só os cangalheiros que vinham expressamente de Bissau para fazer o seu trabalho.

O Rui Felício, (ex-Alf Mil, CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852, 1968/70), é o autor da primeira Estória de Mansoa, série que gostaríamos que tivésse continuidade (4). (LG).

_____________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1002: Um novo recruta, Aires Ferreira (BCAÇ 1912, CCAÇ 1686, Mansoa, 1967/69)

(2) Até à entrada do Aires Ferreira, o Padre Mário de Oliveira era, ironicamente, o único representante do Batalhão de Caçadores 1912 que, de resto, o expulsou do seu seio.... Conheci o Mário de Oliveira, em Candoz, Paredes de Viadores, Marco de Canaveses, onde em tempos tinha sido pároco (creio que depois de vir da Guiné, donde fui expulso de capelão militar). Conheci-o no dia do meu casamento, civil, em casa dos meus sogros, em Agosto de 1976. Ele era e é amigo da minha mulher. Passou a ser também meu amigo.

Curiosamente o Nuno Rubim - segundo me confidenciou - encontrou-o há tempos, na Feira do Livro de Lisboa, no stand da sua editora, Campo das Letras (Porto) a a atender os seus leitores e a autografar o seu último livro (Salmos V ersão Século XXI). O Nuno (que se considera, ele próprio, agnóstico) apresentiu-se e ficou a falar com ele pela tarde dentro. Ficou fascinado pela sua personalidade e inclusive foi jantar com ele. No fibnal pediu-lhe para escrever, para o nosso blogue, um texto sobre a organização da assistência religiosa às NT, na Guiné. O Mário prometeu-lhe que sim... Ficamos aguardar com muito interesse e expectativa.

Vd. posts de:

27 de Junho de 2005 > Guiné 60/71 - LXXXV: Antologia (5): Capelão Militar em Mansoa (Padre Mário da Lixa)

14 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCL: Capelão militar por quatro meses em Mansoa (Padre Mário da Lixa)

17 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXV: Foi em plena guerra colonial que nasci de novo (Padre Mário de Oliveira )

8 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1825: Mário de Oliveira, na Feira do Livro de Lisboa, dia 9 de Junho de 2007

(3) Sobre o ex-Alf Mil Capelão Puim, da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), vd. posts:

5 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1925: O meu reencontro com o Arsénio Puim, ex-capelão do BART 2917 (David Guimarães)

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1763: Quando a PIDE/DGS levou o Padre Puim, por causa da homília da paz (Bambadinca, 1 de Janeiro de 1971) (Abílio Machado)

(4) Vd. post de 31 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1006: Estórias de Mansoa (1): 'Alfero, água num stá bom' (Rui Felício, CCAÇ 2405)

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1945: Blogue-fora-nada: O melhor de ... (1): Nunca contei uma estória de guerra aos meus filhos (Virgínio Briote)

Guiné > Brá > 1965 > Mulheres africanas trabalhando no campo.Imediações do quartel de Brá, onde funcionou o centro de instrução e formação da primeira companhia de comandos da Guiné (criada em 1964 e extinta em 1966). Os velhos comandos (Mário Dias, Virgínio Briote, João Parreira...) , como ainda hoje eles gostam de ser conhecidos. Do Virgínio Briote, nosso novo co-editor, pode dizer-se que, em menos de um ano de coma ndo, hão houve mata na Guiné que ele não tivesse pisado uma ou mais vezes, incluindo Satecuta/Galo Corubal, na minha/nossa tão conhecida região do Xime/Xitole, por onde andou 19 dias, na época das chuvas (!).

Entre outros soldados africanos, o Alf Mil Comando Briote - que foi em rendição individual, nos finais de 1964, para a CCAV 489 (Cuntima, região do Cacheu) e que seis meses depois estava em Brá a fazer o curso de comandos - teve no seu grupo de combate o Marcelino da Mata e o Jamanta (este último viria mais tarde a integrar a 1ª Companhia de Comandos Africanos que eu vi crescer em Fá Madinga).

Foto: © Virgínio Briote (2005). Direitos reservados.

1. Amigos e camaradas: De Abril 2005 a Maio de 2006, publicaram-se 825 (!!!) posts no antigo Blogue-fora-nada, rebaptizado Luís Graça & Camararadas da Guiné > Blogue-fora-nada. Alguns desses posts são de antologia, são escrita de primeira água, são depoimentos, testemunhos e até documentos, inéditos...

Muitos dos nossos amigos e camaradas que chegaram mais recentemente à nossa Tabanca Grande, nunca os leram e têm alguma dificuldade em localizá-los. Até pro que, na época, eu não punha o nome do autor do post a seguir ao título. E a numeração dos posts era em... romano!!!

Em suma, a versão anterior do nosso blogue era menos amigável do que a actual, com menos funcionalidades. Daí eu ter decidido recuperar alguns desses textos, republicando-os no actual blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (que entrou em vigor a partir de Junho de 2006, e até hoje já publicou mais 1100 posts).

O Virgínio Briote, por exemplo, entrou para a nossa tertúlia, ainda em Outubro de 2005 (1). É praticamente do primeiro núcleo de camaradas que apareceu depois do Sousa de Castro, do David Guimarães, do A. Marques Lopes e mais uns tantos. Entrou e soltou a memória, desatou a escrever. Depois retirou-se para um canto da nossa tabanca e criou o seu próprio blogue: foram os filhos que lho ofereceram, confessou-me. Chamou-lhe Tantas Vidas, rebaptizado depois como Guiné, Ir e Voltar - Tantas Vidas.

De Fevereiro de 2006 a Fevereiro de 2007, o Virgínio deu menos notícias. Mas de Outubro de 2005 a Janeiro de 2006, escreveu, para ele e para nós, coisas notáveis. É justo republicar, em parte ou no todo, algum desse algum desse material. Até para os periquitos da tertúlia conhecerem um pouco melhor o nosso novo co-editor (2). E para os velhinhos matarem saudades... (LG).

2. O melhor de... (1): Nunca contei uma estória de guerra aos meus filhos (Virgínio Briote) (3)


Pois, a Guiné! A Guiné faz parte de mim. Entrou-me no sangue aos 21 anos, tenho 62, vive comigo. Percorrem-me sentimentos contraditórios, não devia ser, mas é o que sinto às vezes. Assaltos, pé ante pé, ao nascer do dia, ou ainda de noite, de heli a qualquer hora do dia. Descargas de adrenalina e de tiros, estardalhaço de rockets, granadas, 10 minutos no máximo, retirar a seguir no goss-goss. Depois, o regresso a Bissau, o banho e o sono, o almoço farto no Fonseca. E o desassossego e a dor tantas vezes levados àquelas gentes, um peso que trago comigo, que me curva. Passou-se comigo, não ouvi contar.

Tenho respeito pelas tropas especiais, que fizeram aquilo que lhes pediram. E muito mais pelos soldados, furriéis, sargentos e alferes milicianos que, sem lhes perguntarem nada, os arrancaram ao trabalho e ao estudo. Espalhados pelas Mafras do País, encaixotados nos comboios, nas camaratas, nos beliches ou nos porões sujos e escuros dos Uíges, de G3 na mão pelas matas, savanas, tarrrafos e bolanhas, corações aos saltos, T6 e Fiats G-91 no ar, helis à procura de locais para pousarem, macas com feridos e mortos, os regressos aos abarracamentos, partir para outra, sempre assim, até ao fim dos dois anos. Viram derreter-se 2 anos da vida deles, a fazerem contas aos dias, dentro do arame farpado, entre abrigos, à luz do petromax, sem frescos, à mercê de tudo, da Dornier, das colunas de reabastecimentos, do valente IN.

Alguns nem chegaram a ir ao Cupilom, saíram dos Niassas, meteram-nos em GMCs, Mercedes, Unimogs e, ala que se faz tarde, estrada fora, a caminho de Nhacra, Mansoa, ou Geba abaixo, Buba a aparecer ao longe. Dois ou três dias depois, parecia que estavam em Bissorã, Mansabá, Cacine, há que meses.

Muito tempo, manga de chatice passada, o caminho do regresso, directos para as lanchas, quando deram por eles, nem acreditavam, era o velho Niassa ou Uíge, outra vez. E, quando chegavam a Lisboa, à terra deles, encontravam gente que lhes fazia perguntas:
- Mataste muitos turras, juntaste algum?

Tempos difíceis que a nossa geração viveu e, valha a verdade, tudo tem sido feito para fazer de conta que nada se passou. E, se calhar é melhor assim, foi só um sonho de uma noite, uma noite que durou 13 anos.
E os que viveram aqueles tempos, quando se encontram agora, recordam episódios, pequenas histórias, quase nunca factos da guerra. Devem ter motivos bem fortes para recordarem os episódios marginais e esquecerem histórias que muitos de nós preferia não ter vivido.

Desculpa lá esta lavagem, Luís. Muito raramente abordo estes assuntos, nunca contei um episódio de guerra que fosse aos meus filhos. Quando desembarquei em Lisboa, jurei a mim próprio nunca mais pegar numa arma, nem na Feira Popular. Quase quarenta anos ao arrumar um sótão de uma casa na aldeia, bem lá para o Norte, vi duas malas cheias de pó. Cartas, roupas, facturas, e uma pistola dentro de um estojo. Quebrei a promessa. Peguei-lhe, meti-me a caminho das margens de um rio e lancei-a para o sítio mais fundo.

E pronto, Luís, a minha prosa bélica acaba aqui, por hoje (...).

__________

Notas de L.G.:

(1) Vd, post de Guiné 63/74 - CCLV: Virgínio Briote, ex-comando da 1ª geração (1965/66)

(2) Vd. post de 11 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1943: Virgínio Briote, novo co-editor do blogue

(3) Vd. post de 23 Outubro 2005 > Guiné 63/74 - CCLVI: As estórias que não contamos aos nossos filhos (Virgínio Briote).

Guiné 63/74 - P1944: Composição inicial da CART 3492/BART 3873 (Xitole, 1972/74) (Artur Soares)


1. Mensagem do camarada Artur Soares, de 10 de Julho:
Amigos Comandantes, Luís Graça e Carlos Vinhal:

Aqui vai a composição inicial da CART 3492, sediada no Xitole , nos anos de 1972 a 74.
Se quiserem colocar no Blogue, agradeço.
Por hoje é tudo.

Forte abraço para toda a TERTÚLIA
Artur Soares
Ex-Furriel Mil Mecânico
CART 3492/BART 3873


Composição inicial da CART 3492

-Cap. Mil Nº Mecanográfico 11835857 - António Victor R. Mendes Godinho
-Alf. Mil NM 01028270 - Joaquim Manuel M. Mexia Alves
-Alf. Mil NM 08932566 - José Maria Gambôa Gonçalves Dias
-Alf. Mil NM 17889869 - Manuel Laurindo de Oliveira
-Alf. Mil NM 10305670 - António Carvalhão V. B. Barroso
-1.º Sarg NM 52055011 - Abílio Pereira Dias
-1.º Sarg Art NM 52129911 - João de Alegria Dias Ceia
-Fur. Mil NM 00005170 - Artur Manuel Soares
-Fur. Mil NM 01525771 - António Augusto Borges de Pinho
-Fur. Mil NM 01650171 - José Manuel dos Reis Vilela
-Fur. Mil´NM 05657171 - Abílio Pereira de Brito
-Fur. Mil NM 06032471 - Mário Nunes dos Santos
-Fur. Mil NM 06071271 - Acácio Marcelo Alves Duarte
-Fur. Mil NM 07198071 - Daniel dos Anjos Faceira
-Fur. Mil NM 07861171 - Fernando dos Santos Pires
-Fur. Mil NM 09219171 - Carlos Ernesto Corunha Magalhães
-Fur. Mil NM 13217971 - Manuel Joaquim Novais Maçães
-Fur. Mil NM 16101271 - Carlos Alberto Duarte Nunes
-Fur. Mil NM 17398773 - António José da Silva Costa
-Fur. Mil NM 18951070 - Álvaro Manuel Oliveira Basto
-Fur. Mil NM 13335571 - Carlos Alberto Simões Andrade
-1.º Cabo NM 00395271 - Joaquim Santos Silva
-1.º Cabo NM 01106871 - João Manuel Pires de Arruda
-1.º Cabo NM 01376171 - Manuel Martins Lourenço
-1.º Cabo NM 01976571 - Sezinando Pereira Fernandes
-1.º Cabo NM 02445171 - Artur Ascenção Pereira
-1.º Cabo NM 04982571 - José Estêvão Vasques Agostinho
-1.º Cabo NM 06301973 - Agostinho Antunes Correia
-1.º Cabo NM 07147571 - António dos Santos Costa
-1.º Cabo NM 10484471 - José da Encarnação Silva
-1.º Cabo NM 11158371 - Júlio Augusto Rolo Bicho
-1.º Cabo NM 12451871 - Manuel Fernando dos Santos Moreira
-1.º Cabo NM 12748771 - Carlos Alberto Festas Fernandes
-1.º Cabo NM 13263071 - António Simões Ribeiro
-1.º Cabo NM 13266971 - Abílio Vidal dos Santos
-1.º Cabo NM 13290271 - António Pinto Ferreira
-1.º Cabo NM 13292371 - António Alves Leite
-1.º Cabo NM 13300471 - Armindo Carneiro Simões
-1.º Cabo NM 13311871 - Manuel da Costa Nogueira
-1.º Cabo NM 13320171 - Abel Pereira de Matos
-1.º Cabo NM 13320271 - João Nogueira Mesquita Machado
-1.º Cabo NM 13350471 - Mário Manuel Casimiro Barata
-1.º Cabo NM 13378971 - Albano Tavares Quental
-1.º Cabo NM 13379671 - Amândio José Neves dos Santos
-1.º Cabo NM 13391471 - António Manuel Pereira Moreira
-1.º Cabo NM 13422971 - Orlando Luís Almeida de Oliveira
-1.º Cabo NM 13442871 - António Veloso de Sousa
-1.º Cabo NM 13444471 - Justino Monteiro de Araújo Gonçalves
-1.º Cabo NM 13519171 - Fernando Rodrigues Vasques
-1.º Cabo NM 13528771 - Adriano da Silva Marques
-1.º Cabo NM 13549871 - Horácio Nascimento Fresta
-1.º Cabo NM 14947571 - Adérito dos Santos Possacos
-1.º Cabo NM 15157471 - Jorge Manuel Oliveira Barbosa
-1.º Cabo NM 15801671 - António dos Santos Ferreira
-1.º Cabo NM 18874171 - Jaime Leonardo Pereira Soares
-1.º Cabo NM 19596169 - António Carlos Silva
-Soldado NM 01650971 - Joaquim da Fonseca Ferraz
-Soldado NM 04387971 - Armando Gonçalves Freixo
-Soldado NM 07086471 - Manuel da Cunha Pereira
-Soldado NM 07449071 - Belmiro Fernando Pinto Azevedo e Sousa
-Soldado NM 07687671 - António Arantes Carvalho
-Soldado NM 07865171 - Henrique Casimiro Gomes dos Santos
-Soldado NM 08041871 - Licínio José de Oliveira
-Soldado NM 08224271 - Felismini Marques Cortês
-Soldado NM 08275071 - Evangelista da Conceição Martins
-Soldado NM 09054671 - Eduardo Ribeiro de Oliveira (Morto em Dez/1972, em acidente)
-Soldado NM 09736671 - Agostinho da Silva Machado
-Soldado NM 09768871 - Bernardo Fernandes Lopes
-Soldado NM 09831271 - José Gregório Casal Mendonça
-Soldado NM 10203471 - Salvador António Conceição Soares
-Soldado NM 10709671 - Fernando Augusto Lopes
-Soldado NM 11439971 - Acácio Pereira Medeiros
-Soldado NM 13252671 - António Maria de Almeida e Silva
-Soldado NM 13268971 - Álvaro Manuel Rodrigues Pereira
-Soldado NM 13275971 - Jorge Nelson Borges Loureiro
-Soldado NM 13278071 - Manuel Maria Alves de Oliveira
-Soldado NM 13280271 - Benjamim Soares da Silva Morais
-Soldado NM 13280471 - Agostinho da Silva Amador
-Soldado NM 13282271 - Eduardo Pinto
-Soldado NM 13284771 - Alexandrino José Macedo da Fonseca
-Soldado NM 13307171 - Manuel Ilídio de Oliveira Simões
-Soldado NM 13309671 - Luís Ferreira Coelho
-Soldado NM 13311471 - José Gregório de Oliveira Bernardo
-Soldado NM 13313871 - Manuel Marques da Silveira
-Soldado NM 13332371 - Ramiro de Almeida Braga
-Soldado NM 13332571 - Fernando de Oliveira Soares
-Soldado NM 13335871 - Manuel Carlos Magalhães da Silva Neto
-Soldado NM 13340671 - Carlos dos Santos Miguel
-Soldado NM 13347971 - Jorge da Cunha Pinto
-Soldado NM 13349771 - João dos Santos Zeferino
-Soldado NM 13368271 - Joaquim Moreira Soares
-Soldado NM 13374671 - Manuel Fernando de Sousa Pereira
-Soldado NM 13374871 - Adelino Cordeiro Paraíso
-Soldado NM 13385871 - Eduardo Ramos Leite
-Soldado NM 13391071 - António Maria da Costa
-Soldado NM 13392971 - António Lopes dos Santos
-Soldado NM 13394071 - Agostinho do Carmo Lopes
-Soldado NM 13395571 - Manuel da Silva Queirós
-Soldado NM 13398371 - José Alves de Queirós
-Soldado NM 13405671 - Arcanjo Silva de Oliveira
-Soldado NM 13411071 - Mário Rodrigues de Oliveira
-Soldado NM 13411971 - Eduardo Castro Alves de Pinho
-Soldado NM 13423271 - Fernando Nunes Martins
-Soldado NM 13424271 - António Brochado Mendes
-Soldado NM 13426471 - Joaquim Lopes Cardoso
-Soldado NM 13428271 - Alberto Lincho
-Soldado NM 13428871 - Manuel Moreira de Carvalho
-Soldado NM 13436571 - Alfredo Manuel Gonçalves Quelhas
-Soldado NM 13440471 - Carlos Alberto de Sousa Vieira
-Soldado NM 13444171 - Alcides Tavares Simões
-Soldado NM 13445071 - Antero da Silva Caetano
-Soldado NM 13452271 - Júlio Girão dos Santos Rosas
-Soldado NM 13460171 - António de Sá Alves Fardilha
-Soldado NM 13464771 - César Manuel da Graça
-Soldado NM 13468471 - Horácio Fernandes Pais
-Soldado NM 13470071 - Fernando Ferreira Tavares
-Soldado NM 13477871 - Manuel Francisco Lopes Rocha
-Soldado NM 13479571 - Jorge Manuel Correia da Silva
-Soldado NM 13480471 - António Gonçalves Marques
-Soldado NM 13484771 - Manuel Mendonça Correia
-Soldado NM 13494071 - Abílio Moreira Rosas
-Soldado NM 13499671 - Eduardo dos Santos Pereira
-Soldado NM 13500671 - Américo Ramos Fonseca
-Soldado NM 13502271 - Victor Manuel Soares Ferreira
-Soldado NM 13507971 - Carlos Adelino Nunes de Sousa Mendes
-Soldado NM 13511771 - José Caldeira Salvador
-Soldado NM 13516371 - Domingos Pereira Alves
-Soldado NM 13516671 - Luís da Silva Santos
-Soldado NM 13519771 - António Vieira da Rocha
-Soldado NM 13520471 - Albino de Azevedo Oliveira
-Soldado NM 13521271 - Arcindo dos Santos Perpétuo
-Soldado NM 13521671 - António Marto Lopes
-Soldado NM 13522771 - António da Silva Gomes
-Soldado NM 13567671 - Emídio de Carvalho Gonçalves
-Soldado NM 13570271 - António de Jesus Moreira
-Soldado NM 13575271 - António Costa
-Soldado NM 14905971 - António dos Santos Paroleiro
-Soldado NM 14908871 - José Júlio Costa
-Soldado NM 14926571 - José Ribeiro Barbosa Pinto
-Soldado NM 14935871 - João Carlos Dourado dos Santos
-Soldado NM 14949871 - Américo Duarte Pinho
-Soldado NM 14955371 - António Ribeiro dos Santos
-Soldado NM 14961671 - Joaquim José Baião Bravo
-Soldado NM 15143371 - Serafim Nunes de Sousa
-Soldado NM 15153871 - Toni Carvalho dos Santos Barreira
-Soldado NM 15156571 - Casimiro de Almeida Carvalho
-Soldado NM 15158071 - Serafim Taveira Carvalho
-Soldado NM 15195271 - José Araújo da Costa
-Soldado NM 15201971 - Manuel José Soares de Oliveira
-Soldado NM 15224471 - Manuel José de Almeida Rocha
-Soldado NM 15239271 - António Augusto Rego
-Soldado NM 15252671 - Guilherme Guerreiro Lima
-Soldado NM 15260271 - José António de Jesus Loureiro
-Soldado NM 15261771 - Fernando Amílcar das Neves Ferreira
-Soldado NM 15315771 - David Rodrigues de Oliveira Peixoto
-Soldado NM 16571970 - Augusto Fernando Rodrigues Neiva

2. Comentários do co-editor Carlos Vinhal:

São moradores na nossa Tabanca Grande os seguintes:
ex-FurMil Álvaro Basto
ex-Alf Mil António Barroso
ex-Fur Mil Artur Soares
e ex-Alf Mil Joaquim Mexia Alves .
Quem mais da CART 3492 quer fazer parte desta grande família?

Guiné 63/74 - P1943: Virgínio Briote, novo co-editor do blogue

1. Há dias (6 de Julho corrente) escrevi a seguinte mensagem ao nosso Virgínio Briote:

Virgínio: Ando seriamente a pensar em arranjar mais um co-editor para o blogue… Que me dizes sobre uma eventual colaboração tua ? Serias sempre a minha primeira escolha, pelo teu CV (humano, operacional, profissional…), pela maturidade da tua escrita, o teu talento, a tua sensibilidade, a tua serenidade (!), a tua capacidade de análise critica e… a tua experiência bloguística. É apenas um contacto exploratório… Isto está a crescer em demasia… Não precisas de responder logo, logo… Luís

2. O V.B. respondeu-me no dia seguinte:

Caro Luís,

Pois, que é que eu devo dizer? Que a obra é tua e, como Comandante, tens todo o direito de nomear quem penses que ajude a destapar esta enorme cortina de anos e anos de silêncio e vergonha que envolveu a nossa geração, por terem remado contra os ventos da história, como diziam os nossos antigos governantes.

Hoje, o foranada ultrapassou há muito as fronteiras da guerra da Guiné. Acontecimentos ocorridos em Angola e Moçambique, amores, perdas, buscas de paradeiros desconhecidos, de tudo tem passado pelo foranada. De coisas que nos unem. E que eu não posso dar ás-de-vila-Diogo. É um dever, uma obrigação que me honra e que espero cumprir.

Para o que for necessário, e que esteja dentro das minhas possibilidades, conta comigo.
Um abraço,
vb

3. O que é que eu poderia dizer-lhe na resposta ? Foi só isto, laconicamente:

Virgínio: Fico encantado, desvanecido, mil vezes obrigado...Assim poderemos cumprir a missão, com homens como tu! ... Depois receberás instruções, incluindo a password para entrares na nossa conta do Google... Por hoje, poupo-te... Para já preciso de um curto CV (e de uma foto mais recente) para pôr na montra... Como queres ser apresentado, em meia dúzia de linhas, na coluna do lado esquerdo do blogue, no sítio reservado aos editores ?

4. Aqui temos o CV abreviado do novo co-editor:

(i) Virgínio António Briote, 63 anos, nascido em Cascais.

(ii) Asp mil em Set de 1964, no BII17, Angra do Heroísmo, Terceira.

(iii) Mobilizado para Cabo Verde, dois dias depois para a Guiné. Engano, disse-lhe o Comandante do BII17.

(iv) Em rendição individual, foi para Cuntima, onde permaneceu de Janeiro até Maio de 1965 na CCAV 489, do BCAV 490.

(v) No final da comissão do Batalhão, esteve nos Comandos, onde fez o 2º curso de Instrução.

(vi) Comandante do Grupo Diabólicos, de Setembro de 1965 até Junho de 1966.

(vii) Extinta a CCmds da Guiné nessa data, foi destacado com o remanescente dos grupos para reforço do sector de Mansoa, onde se manteve até Set do mesmo ano.

(viii) Até à data de embarque em finais de Janeiro de 1967, prestou serviço na CCS do QG em Bissau.

(ix) Na vida civil, ingressou na Indústria Farmacêutica, tendo trabalhado em várias multinacionais, como responsável pelos departamentos comerciais.

(x) Motivos de saúde obrigaram-no a reformar-se aos 60 anos. Dá colaboração a empresas farmacêuticas, em colaboração com empresas de recursos humanos.

5. Blogue do Virgínio Briote > Guiné, Ir e Voltar - Tantas Vidas> Guiné. Ir e voltar. 1965 e 1967. Histórias baseadas em factos reais, mas vistas por um certo olhar. Outras vistas por esse olhar e que mais ninguém viu . (Fevereiro de 2006 / Fevereiro de 2007).

Alguns excertos dos posts (que merecima a publicação em livro) (selecção de L.G.):

(...) 2. Cuntima: A festa não era para ele, aquela gente toda na pista de aterragem festejava era a chegada da avioneta. Nem demorou muito tempo a perceber aquele ar de agitação e da romaria em volta do piloto e da meia dúzia de caixas com uísque, cerveja e tabaco espalhados pelo chão. E os sacos do correio, todos à volta, a pressa de um daqueles militares, a fúria em tirar para fora dos sacos maços e maços de cartas, algumas pelo chão, outros a apanhá-las. Carlos Correia, Manuel Revés, ó Tomé, as mãos estendidas, pronto, meu furriel! (...)

(...) Brá, SPM 0418
´
11. Já que tem que ser: Mais um dia infernal na mata em frente a Brá. O sol queimava ainda não eram 9 da manhã. Quicos à legionário pelo pescoço abaixo, 30 e tal tipos a desaparecerem pelo chão. A cento e tal metros, Manilha, Mirandela, Moita, Rosa Dias e outros, estrategicamente colocados, vigiam-lhes os movimentos. (...).

(...) 24. Neuras: Estou fodido, pá, perdi o tesão, assim, de chofre! Não sei o que tenho, pá!Ia-lhe sair uma asneira mas ao olhar para o Vidraças, ficou sério, à espera. Arrumou o Lartéguy de lado, e sem saber o que dizer, espreguiçou-se na cama, e ficou à espera, olhos no tecto, mãos debaixo da nuca. É o que te digo, porra! A Mariana, pá, fez tudo, mas tudo ouviste, para a levantar, qual caralho, nada! Essa coisa de vez em quando hiberna, isso passa, Vidraças. Esquece! Andas a metê-la em todo o lado, faz dieta uns tempos, ficas rijo que nem um pêro, vais ver! (...).

(...) 33. Só Guerra: 6 de Março, domingo. Manhã quente.Carregador fora da G3, balas extraídas, um pano macio nelas. Uma a uma dentro outra vez. Os outros três carregadores cheios em cima da cama, para o cinturão. 100 cartuchos ao todo, como de costume. Encostou a arma aos pés da cama. Granadas de mão, duas ofensivas, uma defensiva e uma incendiária para o cinturão, mais uma, de fumos laranja para o bolso de cima do casaco. Em cima da cama o camuflado e as meias. Botas de borracha junto à mesa da cabeceira. Tudo conferido outra vez. Duche. À civil, meteu-se no 14-04, com o Alegre ao volante, em direcção a Bissau (...).

(...) 35. Cuntima, outrz vez. Aeroporto Militar de Bissalanca, Bissau, 05h45, céu limpo, 21 graus. 30 comandos, 15 do Duque e 15 do Gil, recebem ordem de embarque nos 6 Allouettes 3, motores a trabalhar, formados em linha. Ganham altura, rumam a Norte, fumos aqui e além a subirem das matas, água por todo o lado. À 06h30 desviam-se para Leste, baixam a altitude e, alguns minutos depois, rapam as copas das árvores. Frente a uma larga bolanha abrandam e aproximam-se em linha da orla da mata. Pelos auscultadores a informação de preparar para saltar. Aos pares, um por cada porta, saem rapidamente. Com água pela cintura internam-se na mata, enquanto os helis, graciosos, viram à esquerda, recuperam altitude, de regresso a Bissau (...)
(...) 36. Conversas em Brá: A razão desta guerra é que a façamos bem, que os matemos e que nós não nos deixemos matar, só isso, esta é a única razão que importa! O resto, fica por conta da política, não é da nossa lavra, reafirmava, convicto, o capitão do serviço de informações. Um dos alferes é que parecia ter outras ideias. Que o meu capitão não está a falar da razão desta guerra, que foi o princípio desta nossa conversa. O que o senhor está a falar é de desejos, não de razões. (...).

(...) 58. Ponto final ? Estás mesmo tramado, todo enrodilhado, e agora, como é que te vais livrar deste sarilho? Não tem outro nome, sarilho só, com letras grandes. Se tivesses procedido com ela como tens feito com outros conhecimentos, não estavas agora aqui a matutar, a cabeça ainda por cima a doer-te. Tens pouca corda na mão, é o que é, deste-lhe demais e a ti também. Problema chamado Teresa, não? Como te vais sair dele, quando te resolves?

(...) A Teresa já não é só Teresa como se apresentou da primeira vez, agora tem um nome mais comprido, Teresa Problema, proporções com que nunca sonhaste. Os olhos, o sorriso, a figura, o andar dela, só isso? Ou terão a ver mais com outras coisas de que não estavas à espera e muito menos aqui? O gosto pela leitura, de assuntos em que nem tu próprio estavas sensibilizado, nem ainda estás, a solidariedade, o interesse pelo povo guineense. A cultura geral, invulgar para a idade dela. E a disposição para te afrontar, para lutar contra ti, contigo, puxar por ti, lutar pelos ideais dela, do povo dela! Para te dizer na cara, com aqueles olhos magníficos, aquilo que ela achava no seu direito de dizer. Os teus olhos a fugirem, os ouvidos que não queriam ouvir, tu a disfarçares, com a mão nela, como quem diz, vamos mas é ao que interessa! Um merdas, um Rasas, nem sempre com cheiro a uísque azedo, mas um Rasas na mesma! A aproveitares-te da sensibilidade dela, a fazeres-te caro, de um momento para o outro, a invadi-la com as tuas mãos, ela a acreditar em ti! Miserável, Rasas de merda! (...).

(...)
Anexos IV. Do Diário. Alguns apontamentos do diário:

“O que tiver de ser, vai ser! E se chegar a tua hora, podes estar seguro que vais lerpar”. Conversas de Brá”.

“Odeio a guerra, esta ou qualquer outra. Aliás, não há dia nenhum que não combata contra a minha própria guerra. E não quero morrer, nem quero que os outros morram. Mas, por mim, não vamos perdê-la”.

“Por mais anos que viva, estes dois anos passados aqui chegaram-me. Dou a vida por cumprida. O que vier a mais não passará de um anexo”.

Guiné 63/74 - P1942: Susana, chão Felupe (Luís Fonseca, CCAV 3366, 71/73)

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Varela > Iale > 2004 > Festa da saída da Cerimónia de Circuncisão (fanado, em crioulo) da etnia Felupe em Iale.


Foto: © Guiné-Bissau, portal da AD - Acção para o Desenvolvimento (2007)(Com a devida vénia...).

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > "Uma coisa é verdade, pelas fotos (1) se verifica que, embora abandonadas, as instalações não foram destruídas, incluindo a espada felupe estilizada, onde se encontrava o mastro da bandeira" (LF).

Foto: © Pepito/ AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007)


1. Mensagem do Luis Fonseca


As minhas melhores saudações:

Uma vez mais, como quase todos os dias, visitei o sítio e verifiquei que algo me tocava.

Pertenci à penúltima Companhia sediada em Susana (CCAV 3366, Maio de 1971 / Maio de 1973) e foi com um misto de tristeza e melancolia que olhei para aquelas fotografias do Pepito (1).

Embora as notícias do noroeste da Guiné Bissau sejam escassas, tenho tentado
acompanhar com interesse o que por ali se passa e verifico que passados quase três dezenas e meia de anos se mantêm algumas (muitas) reservas para com os Felupes. Eu aprendi com eles uma série de conceitos que o passar dos anos levou a recortar e a confirmar.

Uma coisa é verdade, pelas fotos se verifica que, embora abandonadas as instalações não foram destruídas, incluindo a espada felupe estilizada, onde se encontrava o mastro da bandeira.

Pode ser que seja desta [vez] que me reuna ao pessoal da Tabanca Grande.

Luis Fonseca
ex-Fur Mil Trms
CCAV 3366
(Susana, 1971/73)

2. Meu caro Luís Fonseca:

Estás à vontade, a Tabanca é Grande, logo, plural: nela cabemos todos (ou quase todos), dos felupes aos fulas, dos balantas aos mandingas, dos cavaleiros aos artilheiros, da tropa-macaca à elite da tropa, dos novos velhos inimigos aos novos amigos... Portanto, entra e põe-te à vontade.

Infelizmente, temos falado pouco ou quase nada sobre o chão felupe, que tanto quanto me recordo é (era) uma região que engloba(va) Susana, São Domingos e Varela (Podes consultar qualquer um das respectivas cartas no nosso blogue). E que veio mais recentemente à baila por más razões, por causa da interferência do governo da Guiné-Bissau no conflito entre os rebeldes de Casamança e as autoridades do Senegal (2).

Vejo que conviveste com (e ganhaste respeito por) os felupes de Susana. Em contrapartida, a maior de nós que andou pelo sul ou pelo leste da Guiné, só tem na cabeça estereótipos, preconceitos e ideias erradas sobre os misterioros felupes (tipo, caçadores de caçadores, necrófagos, resistentes tanto às NT como ao PAIGC, etc.). O único felupe que eu conheci, em Fá Mandinga, sede da 1ª Companhia de Comanbdos Africanos, foi o Furriel Uloma, de triste memória (3).

Portanto, ficas incumbido de salvar a honra dos felupes e partilhares, connosco, o teu conhecimento (e paixão) pelo chão felupe.


Quem tem escritos sobre os felupes é o nosso camarada Carlos Fortunato, da CCAÇ 13 (1969/71)(4).
_______________

Notas de L.G.

(1) Vd. post de 10 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1939: Susana, região de Cacheu: fantasmas do passado (Pepito)

(2) Vd. post de 24 Março 2006
Guiné 63/74 - DCL: Preocupação com a situação humanitária em Susana e Varela (região do Cacheu) (Luís Graça)

(3) Vd. post de 11 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIII: Comandos africanos: do Pilão a Conacri (Luís Graça)

(4) Vd. a excelente página do Carlos Fortunato, que lidou com balantas e felupes > Guiné - Os Leões Negros > CCAÇ 13 > Bolama > Felupes

(...) "Adversários temíveis, os felupes possuem elevada estatura e grande robustez física. São referidos como praticantes do canibalismo no passado, são coleccionadores de cabeças dos seus inimigos que guardam ou entregam ao feiticeiro, e usam com extraordinária perícia arcos com setas envenenadas.

"Embora se assegure que o canibalismo pertence ao passado, não era essa a opinião das restantes etnias, as quais referem igualmente que estes fazem os seus funerais à meia noite, pendurando caveiras nas copas das arvores, e dançando debaixo delas. O felupe é conhecido como pouco hospitaleiro para com as restantes etnias, pelo que existe da parte destas um misto de animosidade e desconhecimento.

"Os felupes são igualmente grandes lutadores, fazendo da luta a sua paixão. Este desporto tão vulgarizado nesta etnia, prende-o, empolga-o, constituindo o mais desejado espectáculo" (...).

terça-feira, 10 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1941: Estórias (nem sempre) vistas do ar (Nuno Almeida, ex-1º Cabo Mecânico de Heli, FAP)


1. Mensagem do nosso camarada Nuno Almeida, ex-1.º Cabo Especialista MMA, com data de 2 de Julho

Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal:

Um forte abraço e um sincero obrigado pelo excelente blogue do qual só recentemente tomei conhecimento.

Embarquei para a Guiné (BA12 - Bissalanca) em 27-01-1972 e fui ferido na mata de Choquemone - Bula , ao proceder a uma evacuação de dois feridos, debaixo de intenso fogo de metralhadoras e morteiros, em 25-11-1972.

Fui evacuado para o Hospital Militar de Bissau, onde fui sujeito a 5 intervenções cirúrgicas, no espaço de 25 dias, e evacuado para Lisboa em 27-01-1973 (para vir morrer ao pé da família!!!).

Li algumas estórias de camaradas que viveram a guerra no terreno (no sentido lato da palavra) e pensei que, como elemento dos helicópteros (Alouette III) e tendo realizado inúmeras missões, no ano de 1972, de resgate de tropas aquando de ataques do IN, ou no transporte para locais de iminente conflito bélico, poderia dar algum contributo para a História, relatando alguns episódios passados nessas operações e vistas nessa perspectiva aérea.

Mais tarde, quando fui ferido e estive internado no Hospital de Bissau, melhor me apercebi das privações e sobressaltos que, a todo o momento, uma geração de jovens, na casa dos 20 anos, foi obrigada a suportar, adquirindo mazelas físicas e, principalmente, psicológicas, que ainda hoje perduram, e que muitos teimam em não aceitar que existem e estão latentes no nosso dia-a-dia.

Junto uma foto de parte da grande equipa que mantinha os helis a voar, para dar apoio aos que no chão, por vezes, necessitavam da nossa presença.

Guine > Bissalanca > 10 de Junho de 1972 > Pessoal da linha da frente da Esquadra 122 > Os Canibais

Um até breve com mais uns relatos lá de cima
Nuno Almeida (O Poeta)


2. Mensagem do co-editor Carlos Vinhal, enviada em 7 de Julho, para o Camarada Nuno Almeida

Caro Nuno Almeida:

Acho que és o elo que faltava no nosso Blogue. A nossa Caserna (também Tabanca Grande) já é composta por elementos do Exército, Força Aérea e Marinha. Mas faltava alguém que, andando normalmente no ar, tivesse da nossa guerra uma visão mais abrangente.

Assim teríamos muito gosto em que fizesses parte da nossa Caserna Virtual, se para tal quisesses manifestar a tua vontade. Basta que nos envies uma foto tua dos teus gloriosos tempos das Máquinas Voadoras e uma actual.

Diz-nos onde moras, o que fazes e o que achares conveniente para que te possamos ficar a conhecer melhor.

Já cá temos uma estória tua, publicada no Post P1912 (1), que esperamos seja a primeira de muitas que tenhas para nos contar.

Por agora recebe um abraço meu e do Luís Graça

O camarada
Carlos Vinhal
___________

Nota do C.V.:

(1) Vd. post de 2 de Julho de 2007> Guiné 63/74 - P1912: Um buraco chamado Mato Cão (Nuno Almeida, ex-mecânico de heli/Joaquim Mexia Alves, ex-Alf.Mil. Pel Caç Nat 52)

Guiné 63/74 - P1940: O dia de S. Martinho que jamais esquecerei... (Júlio César, CCAÇ 2659, 1970/71)


1. Mensagem do nosso camarada Júlio César, ex-1.º Cabo da CCAÇ 2659/BCAÇ 2905, Cacheu, 1970/71, de 4 de Julho, ao editor do blogue:

Escrevi este artigo, relatando uma situação vivida na Guiné, no dia 11 de Novembro de 1970 e que foi publicada em tempos (não sei a data) no Notícias Magazine e que postei no meu blog http://www.cacheu.blogspot.com/

Não sei se serve para alguma coisa.
Deixo isso ao critério meu amigo e permita-me que lhe enderece os meus parabéns pelo excelente trabalho que está a fazer ao escrever a história da Guerra Colonial, na Guiné.

Os meus dados:

Júlio César da Cunha Ferreira
Rua João Pereira Magalhães, 1077
4815-400 Vizela

Ex-1º Cabo 112175/69
Cacheu - Guiné

CCAÇ 2659 - BCAÇ 2905

2. Comentário do co-editor Carlos Vinhal:

No Blogue do nosso camarada Júlio César pode-se tomar conhecimento da história do BCAÇ 2905 com as suas Companhias CCAÇ 2658, 2659, 2660 e CCS.

A CCAÇ 2658 passou por Teixeira Pinto, Bachile, Binar, Paiama, Paúnca e Pirada;
A CCAÇ 2659 por sua vez esteve colocada no Cacheu;
A CCAÇ 2660, assim como a CCS, estiveram sediadas em Teixeira Pinto.

No Blogue há ainda a notícia da deslocação de um grupo de ex-militares deste Batalhão à Guiné-Bissau em Maio de 1996.
Podemos ainda encontrar notícias sobre os convívios das Companhias e dos aniversários de companheiros de luta que o tempo não separou.

Como diz o Júlio, alguns já partiram e outros não dão notícias. Quem se encontra periodicamente, fá-lo com alegria.



Guiné-Bissau > Caheu > Maio de 1996 - Regresso ao passado: Todos juntinhos para a fotografia (Em 1996, um grupo de ex-combatentes do BCAÇ 2905, visitaram a Guiné: Júlio, Costa e Silva e Magalhães, da CCAÇ 2659; Virgílio, Mourão e Barbosa, da CCAÇ 2660; Aristoteles, Albuquerque e Acácio, da CCS).


Convívio do pesoal do BCAÇ 2905 > Corte do tradicional e indispensável bolo comemorativo de um dos encontros

De entre as publicações que se podem encontrar no Blogue do nosso camarada, salientamos uma que tem o título No dia de S.Martinho que o nosso Blogue dá a conhecer à Tabanca Grande, com a devida vénia ao seu autor.
CV


3. No dia de S. Martinho, por Júlio César

A Operação

Saíram já depois da meia-noite. Na tentativa de ludibriar o IN que, sabíamos, espiava os nossos movimentos, o Primeiro e Terceiro Grupos de Combate da Companhia de Caçadores 2659, que estava sediada em Cacheu (Guiné) - pertencente ao BCAÇ 2905, este com a sua sede em Teixeira Pinto, hoje Canchungo - saíram em direcção a Mata e Bianga, duas tabancas normalmente inofensivas e amigas, inflectindo, já no meio da bolanha, para Pjangali, principal objectivo da Operação.

Conhecia perfeitamente a zona para onde iam e sabia também o perigo que corriam. Já tinha passado por lá muitas vezes e... sabia que ali havia sempre porrada. A marcha tinha de ser lenta e silenciosa pelo meio do capim a ficar seco, cobrindo as nossas cabeças, com as formigas enormes como baratas a entrarem pelo tronco, pescoço e pernas, por todo o lado por onde pudessem penetrar, dando ferroadas de morte, de modo que, muitas vezes, quando sacudidas de forma enérgica, puxando por elas, ficava a cabeça cravada nos nossos braços e pernas.

A bolanha, ainda não muito seca, era outro obstáculo a ultrapassar. A cada passo as pernas enterravam-se no lodo negro e malcheiroso, com a arma e munições numa rodilha à cabeça, preservando a sua funcionalidade. A ração de combate, único alimento para aquele dia, já tinha ficado nos primeiros metros da bolanha, perdida no lodo por entre milhares de minúsculos caranguejos e outros pequenos bichinhos, repugnantes e viscosos, que subiam por todo o corpo.

A manhã despontava, naquele dia 11 de Novembro de 1970, dia de S. Martinho. Era hora de descansar um pouco, retemperar forças antes de seguir para o objectivo.

Pouco passaria do meio-dia, quando chegaram à clareira que defendia as tabancas de Pjangali.
Rastejando como cobras por entre pequenos tufos de erva, os rapazes do Primeiro e Terceiro Grupos de Combate aproximaram-se lentamente das tabancas. De uma delas, bem no centro da aldeia, saía fumo e umas quantas galinhas debicavam aqui e ali, certeza que ali se encontrava alguém. As ordens tinham sido muito claras e cada um sabia o que tinha a fazer.
Completaram o envolvimento e entraram na aldeia sem que se ouvisse um único tiro. Cautelosamente, abrigados, com um grupo de homens protegendo a rectaguarda, avançaram até à primeira tabanca e entraram de rompante. Lá dentro, com um ar um tanto surpreendido, um homem grande olhava-os com o medo estampado no olhar.

Vendo que não havia perigo, os homens da Companhia avançaram. A princípio, cautelosamente, para logo depois descomprimirem. O alvoroço de galinhas e porcos obrigou a aparecer crianças, homens e mulheres, estes já velhos, sinal inequívoco que os mais jovens andariam em sortidas com os guerrilheiros.
Apareciam de todos os lados, garantia que, apesar de todas as cautelas tomadas, tinham sido previamente detectados. Foram interrogados pelo Comandante da Operação e, valendo-se de um dos guias, numa mistura de crioulo, manjaco e balanta, foram sabendo que já há vários dias que ali não aparecia ninguém e que eram só aqueles os habitantes da tabanca. Abivacaram mesmo ali e as rações de combate que alguns deles, felizmente, ainda traziam, foram repartidas pelos nativos, enquanto o cabo enfermeiro curava algumas feridas e distribuía mezinha entre eles.

O regresso

Eram horas de regressar e após contacto com a base receberam instruções para seguirem por Mata e Bianga.

Seriam cerca das seis horas da tarde quando os camaradas que ficaram no aquartelamento, os viram a atravessar a pista de aterragem. Pouco depois entravam pela porta que dava para o cemitério da povoação nativa por entre gritos de júbilo e de boas vindas dos que ficaram e que queriam saber como decorrera a Operação. Vinham todos... cansados, mas sorridentes. E, não era para menos. Não era a primeira vez que se ia para aquela zona e todos sabiam que ali era costume embrulhar. Além disso, era dia de S. Martinho e tudo estava preparado para uma grande festa, como era da praxe, em dias marcantes do nosso calendário!

A tragédia

Fiquei por ali um pouco, trocando impressões com o comandante da operação, sabendo como decorrera, quando uma forte explosão nos atirou por terra.
Pensámos que era um ataque ao aquartelamento que, afinal era costume, ao final da tarde, quando gritos lancinantes e uma núvem de poeira e estilhaços varreram toda a parada. Apercebi-me logo que algo de muito grave tinha acontecido e corri para o abrigo do Primeiro Grupo de Combate.
Por entre a poeira, correrias em pânico e muitos gritos (que ainda oiço muitas vezes) vi muitos dos nossos camaradas contorcendo-se por entre gritos de dor, tentando estancar o sangue que lhes saía de várias feridas espalhadas pelo corpo. Num rápido olhar avaliei a situação e vi um deles – o cabo Malheiro – que era o que estava mais perto da entrada, muito ferido. Peguei nele e vi, horrorizado, que as duas pernas, do joelho para baixo, tinham desaparecido. O sangue saía aos borbotões daqueles cotos, com a pele em fiapos, com músculos, veias e artérias como se tivessem sido cortados com uma serra velha. Sangue e mais sangue!!!

Tentei manter a serenidade e, com outros camaradas, corremos, gritando para afugentar o pânico, transportando-o, em cadeirinha até à enfermaria, onde os enfermeiros se afadigavam, tentando por todos os meios estancar o sangue que se esvaía das feridas abertas. As compressas e ligaduras depressa ficaram ensopadas em sangue, até que se esgotaram.

Peguei nele e vi, horrorizado, que as duas pernas, do joelho para baixo, tinham desaparecido
Pouco depois descobrimos outro ferido grave. Estava num local mais afastado do abrigo. Segurava a barriga com um esgar de medo e dor. Um buraco enorme, onde cabiam dois punhos cerrados, deixava ver parte das suas entranhas. Era horrível!

Entretanto caía a noite no Cacheu (na Guiné, depois das 18 horas é já noite). Os homens do Posto de Rádio afadigavam-se pedindo por socorro e o Capitão gritava para Bissau chamando a evacuação de dois feridos graves.
Às desculpas de que, de noite, não podia levantar qualquer avião ou helicóptero, por falta de visibilidade, o nosso Capitão respondia que iluminava a pista com todas as viaturas do quartel e, assim se fez, mesmo sem se ter a certeza da chegada de socorros.

Naquela guerra era proibido morrer ou ser ferido durante a noite... Cerca das oito horas da noite, o Primeiro-Cabo Malheiro morria, esvaído em sangue por falta de assistência (porque os aviões de socorro não podem voar de noite...) não obstante todos os esforços para o manter vivo.
Uma onda de raiva e impotência varreu toda a CCAÇ 2659. Chorava-se pelos cantos e vociferava-se contra os senhores de Bissau que, no conforto do ar condicionado, se estavam marimbando para os camaradas que morriam no mato. O Capitão, no Posto de Rádio, desalentado, horrorizado pela falta de socorro, gritava com Bissau, dizendo para trazerem, não um, mas vários caixões.

Eram 10 horas da noite quando as viaturas que estavam na pista, com todos os faróis acesos, pondo a pista como se fosse dia, receberam ordens para regressar.

Tinha falecido o outro ferido grave – o soldado Marques – que, por malvadez do destino, se encontrava no local errado. Ele que, embora pertencesse ao Primeiro Grupo de Combate, tinha sido dispensado daquela operação. Ele que deveria regressar à Metrópole dentro de dias. A doença que lhe fora detectada, tinha-o dispensado do serviço. Ele, que já tinha escrito à família, dizendo que se ia embora... Ele, que até já tinha feito o espólio e trajava já à civil!!!
Ninguém dormiu nessa noite. A dor e a raiva eram demasiadas.

Naquela guerra era proibido morrer ou ser ferido durante a noite...

De manhã cedo, a DO começou a sobrevoar o aquartelamento e o Valente, de Vilar de Mouros, com os olhos ainda cheios de lágrimas de raiva, correu para a Breda e disparou vários tiros de desespero contra a avioneta. Eram balas de dor, de raiva, de impotência, de desespero. Chamado à razão, corremos para a pista e, quando a DO aterrou, foi difícil conter a ira de muitos de nós e o piloto foi cuspido, insultado e pontapeado. Felizmente, alguns mais serenos, conseguiram ouvir a voz do nosso Capitão, chamando-os à razão. O piloto de nada sabia. Tinha entrado de serviço naquela manhã.

Mais tarde, já durante o dia, enquanto deambulávamos por ali, soubemos o que se tinha passado.
O Cabo Malheiro – o primeiro a morrer – que era portador da Bazooka, ao entrar no abrigo, colocou-a de encontro à parede com a saída para baixo. A mola que, normalmente, segura a granada estava avariada (como quase tudo naquela guerra...) e a granada caiu no chão, explodindo de seguida. Dos outros feridos graves, só o Mendes, de Riba d’ Ave, é que teve de ser evacuado.

Encontramo-nos uma ou duas vezes por ano. Não tem problemas de maior, depois de andar vários anos à espera que os estilhaços (não sei se já lhe saíram???) lhe saíssem todos. Nunca falamos do que aconteceu. É duro demais para relembrar...

PS - Alterei os nomes dos dois camaradas mortos. O respeito pelo sofrimento das famílias assim o impõe.

(Publicado no Notícias Magazine n.º 331 de 27 de Setembro de 1998> "Experiências de Guerra”)

Júlio César
Observ - Subtítulos da responsabilidade do co-editor CV.

Guiné 63/74 - P1939: Susana, região de Cacheu: fantasmas do passado (Pepito)

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Marco e pau da bandeira (?).

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Antigo celeiro ou armazém.

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Antiga central eléctrica

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Caserna em ruínas.

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Outro aspecto da mesma caserna.


Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Susana > 8 de Julho de 2007 > Antigo aquartelamento das NT > Outra casernba em ruínas

Fotos e legendas: © Pepito/ AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007)


1. Imagens de Susana que o nosso querido amigo Pepito nos mandou, de propósito. Não são as imagens que gostaríamos de ver porque nos deixam tristes: são os fantasmas de um aquartelamento das NT, são os nossos próprios fantasmas que por ali andam; ali parece que a vida parou, que a história parou... Mas são também a imagem da incúria e do abandtono, são também o espelho de uma Guiné-Bissau, independente há trinta e tantos anos, que ainda não soube preservar e valorizar algum do pouco património colonial que lá ficou, podendo alimentar com isso uma fileira de turismo com algum impacto económico e social... sobretudo para as populações do interior que teimam em não fugir para a capital...

Esperemos, ao menos, que elas sirvam de algum consolo para os irmãos do malogrado Cap Cav Rei Vilar, comandante da CCAV 2538, que aqui esteve, entre 1969/70 (1). Segundo nos confidenciou o irmão Manuel, ele conta visitar a Guiné-Bissau em 2008 e com os os outros irmãos "fazer uma romagem a Susana". Obrigado, Pepito, pela tua sensibilidade e amizade.


Luís: De facto, como tu dizes, pouco se fala de Suzana. Apenas recentemente foi levantada a questão da morte do Capitão de Cavalaria Luis Filipe Rei Vilar (1).

Porque estou a chegar de lá hoje [8 de Junho], envio-te umas fotos do que resta do antigo quartel, para matar saudades aos que por lá passaram

abraços
pepito

__________

Nota dos editores:

(1) Vd. posts de:


30 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1902: Manuel Rei Vilar, França: Quem conheceu o meu irmão, Cap Cav Luís Filipe Rei Vilar, morto em Susana, em Fevereiro de 1970 ?


30 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1903: Cap Cav Luís Filipe Rei Vilar, comandante da CCAV 2538, morto numa emboscada (Afonso M.F. Sousa)


1 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1908: Capitão de Cavalaria Rei Vilar, comandante da CCAV 2538, morto no campo da honra, em incursão no Senegal (Afonso M.F. Sousa)

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1938: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (4): Catunco



Guiné > PAIGC > Catunco. In: O Nosso Primeiro Livro de Leitura, p. 51. Departamento Secretariado, Informação, Cultura e Formação de Quadros do Comité Central do PAIGC > 1966

Foto: © A. Marques Lopes / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.


Katungo ou Catunco ? Parece evidentemente tratar-se de grosseira gralha tipográfica: o que não admira, o livro terá sido impresso na Suécia (1). A sul da Catió, temos as Ilhas de Catunco, Como e Caiar.

Na ilha de Catunco (vd. carta da Ilha de Caiar) há pelo menos duas povoações, Catunco Papel e Catunco Balanta, que ficam na margem esquerda do Rio Catunco. A Ilha de Catunco fica, por sua vez, na margem direita do Rio Cumbijã. OU melhor, e como diz o Mário Dias, a chamada Ilha do Como é, na realidade, constituída por 3 ilhas: Caiar, Como e Catunco (" na prática formam na prática um todo, já que a separação entre elas é feita por canais relativamente estreitos e apenas na maré-cheia essa separação é notória").

No nosso blogue, há duas ou três várias referências a Catunco, embora numa delas apareça, também certamente por gralha, Catungo (também é possível que o João Parreira tenha sido atraiçoado pela memória) (2).

Confronte-se entretanto o texto do manual escolar do PAIGC, acima inserido, com a descrição que o nosso camarada Mário Dias fez da actuação das NT durante a Op Tridente (Ilha do Como, Jan-Mar. 1964). Tudo indica que o manual escolar do PAIGC faça referência ao que se passou nessa operação de grande envergadura, cujo desfecho não teve a mesma leitura, quer da parte dos portugueses, quer da parte do PAIGC. O Como tornou-se, para Amílcar Cabral e o seu movimento, um ícone da luta de libertação.


(...) As vacas e o arroz

Um agrupamento constituído pelo grupo de comandos, 8º Dest Fuz, e um grupo de combate da CCAV 489, iniciaram, por volta das 8 da manhã de 12 de Março [de 1964], uma acção sobre Catunco Papel e Catunco Balanta a fim de cercar e bater todas a zona destruindo tudo quanto possa constituir abrigo ou abastecimento para o IN e que não seja possível recuperar pelas NT.

Cercada a tabanca de Catunco Papel e de seguida Catunco Balanta, foram as casas revistadas e destruídas, tarefa que demorou quase 5 horas. Foram recuperadas 5 toneladas de arroz; capturado um elemento IN e apreendidas 2 granadas de mão, livros escolares em português, cadernos, fotografias, facturas, recibos de imposto indígena, e um envelope endereçado a BIAQUE DEHETHÉ, sendo remetente MUSSA SAMBU de Conakry.

Terminamos este dia com a acção que mais me custou durante toda a permanência no Como. Têm que ser abatidas cerca de uma centena de vacas que por ali andavam na bolanha bucolicamente pastando. Não havia forma de podermos transportá-las connosco. Começado o tiro ao alvo, iam caindo sem remédio. Pobres bichos. E que desperdício. Enquanto fazia pontaria ia ironicamente pensando naquela carne que por ali ia ficar para os jagudis enquanto nós tínhamos andado 23 dias a ração de combate.

- Que desperdício!... - E pensava:
- Olha aquele lombo como ficava bom num espeto a rodar, bem temperado com sal, limão e malagueta!...(pum) e aquela, que belo fígado deve ter para uma saborosas iscas !...pum… e pum… e mais pum até chorar de raiva.

Coisas da guerra... sempre impiedosa.

Concluída a mortandade, ainda alguns esquartejaram pernas e extraíram lombos para uma refeição extra. Deve ter sido fruto desta acção, a oferta pelos fuzileiros de carne de vaca à CCAV 489 a que se refere o Joaquim Ganhão na sua ”Cónica do soldado 328”. (...)
(3)
___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. posts anteriores:

29 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1899: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (1): O português...na luta de libertação

1 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1907: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (2): A libertação da Ilha do Como (A. Marques Lopes / António Pimentel)

4 de Julho de 2007Guiné 63/74 - P1920: PAIGC: O Nosso Primeiro Livro de Leitura (A. Marques Lopes / António Pimentel) (3): O mítico Morés

(2) Vd. posts de:

15 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P961: No dia em que fui ferido pelos homens de Pansau Na Ina (João Parreira, Gr Cmds Fantasmas, Catungo, Maio de 1965)

13 de Dezembro 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXV: Brá, SPM 0418 (3): memórias de um comando (Virgínio Briote)


15 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXII: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias)

23 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLV: Virgínio Briote, ex-comando da 1ª geração (1965/66)

(3) Vd. post de 17 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXX: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): III Parte (Mário Dias)

Guiné 63/74 - P1937: Homenagem aos Comandos fuzilados a seguir à independência (José Martins / João Parreira)

1. Comunicação do nosso camarada José Martins, de 29 de Junho:

Caros Generais:

Estive hoje na Amadora, no Regimento de Comandos, onde foram homenageados os Comandos que tombaram na Guiné, após a independência.

Junto fotos do local onde estão inscritos os comandos tombados durante a guerra, assim como da placa alusiva. As placas que foram descerradas ainda estavam cobertas com a bandeira dos Comandos.

Um abraço. José Martins



Amadora > Regimento de Comandos > 29 de Junho de 2007 > Placa de homenagem das Forças Armadas Portuguesas, com data de 29 de Junho de 1978.

Amadora > Regimento de Comandos > 29 de Junho de 2007 > Vista geral das placas com os nomes dos comandos mortos



Fotos: © José Martins (2007). Direitos reservados.

3. Quem também lá esteve, da malta da nossa tertúlia, também foi o João Parreira, ex-comando:

Caros Luís Graça e Carlos Vinhal,

Foi esta manhã, 29 de Junho de 2007 finalmente prestada homenagam na Amadora ao Comandos Africanos fuzilados na Guiné pelo PAIGC. Cinquenta e três no total, conforme ouvi mencionar. Na lápide constavam os nomes de alguns que acompanhei nos anos de 1965/66 (2).

Um abraço para ambos.

João Parreira

_________

Notas do co-editor C.V.:

(1) A 29 de Junho comemora-se o Dia do Comando. Houve cerimónias em Mafra, e na Amadora onde se procedeu à homenagem a que os nossos camaradas fazem referência.

(2) Vd. Reportagem fotográfica da cerimónia na Página da Associação de Comandos

(3) Nomes de comandos e outros militares africanos fuzilados a seguir à independência, vd. posts de:

11 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLV: Ex-graduados da CCAÇ 12 também foram fuzilados (António Duarte)

12 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLIX: O fuzilamento do Abibo Jau e do Jamanca em Madina Colhido (J.C. Bussá Biai)

18 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXII: Dos comandos de Brá ao pelotão de fuzilamento (Virgínio Briote)

23 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXXIV: Lista dos comandos africanos (1ª, 2ª e 3ª CCmds) executados pelo PAIGC (João Parreira)

27 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCVI: O colaboracionismo sempre teve uma paga (6) (João Parreira)

31 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXXII: Mais ex-combatentes fuzilados a seguir à independência (João Parreira)

19 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P886: Terceiro e último grupo de ex-combatentes fuzilados (João Parreira)

Guiné 63/74 - P1936: PAIGC: Cartaz de propaganda (Nuno Rubim)


Lisboa > Arquivo Histórico Militar > Panfleto do PAIGC.

Foto: © Nuno Rubim (2007). Direitos reservados.



1. Mensagem de 11 de Junho de 2007, enviada pelo nosso amigo e camarada Nuno Rubim:

Por hoje envio-te um panfleto do PAIGC, que encontrei no AHM que, se assim o achares, podes reproduzir no blogue.

Irá para o núcleo museológico de Guiledje.


Um abraço


Nuno Rubim