quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3650: O meu Natal no Mato (16): Os meus Natais na Guiné (Luís Dias)

1. Mensagem de Luís Dias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74, com data de 16 de Dezembro de 2008:

Caros Editores

Incluso um pequeno texto sobre os meus Natais na Guiné, caso o entendam publicar.

E aproveitando a época natalícia quero desejar aos Editores e respectivas famílias um óptimo Natal e um Feliz Ano Novo.

Um abraço
Luís Dias



2. Natais na Guiné

O início da nossa comissão na Guiné não poderia ter data tão manifestamente importante para todos aqueles que sentem a época natalícia. A CCAÇ 3491, integrada no BCAÇ 3872, chegou a Bissau a 24 de Dezembro de 1971, na véspera do primeiro de três Natais que iríamos passar naquele território.

Desembarcámos do navio Angra do Heroísmo, no Cais de Pidjiquiti, fardados de camuflado e com um calor e humidade que o colavam à nossa pele e ouvindo as bocas de periquito vai para o mato, dos estivadores negros e de quem assistia aos primeiros passos daqueles jovens em terras de África, saídos poucos dias antes da Metrópole e roubados ao sossego das suas vidas. Seguimos em viaturas civis para o Cumeré, onde o Batalhão ficaria instalado para o IAO e passaria aquela primeira noite.

Lembro-me de jantarmos bacalhau, de termos estado a ouvir o cantor Marco Paulo ao vivo (também esteve na Guiné) e quando já estava no quarto com os meus camaradas, por volta das 22/23 horas, fomos surpreendidos com disparos de artilharia ou de outras armas pesadas, que do quartel batiam a zona, em virtude de um flagelação inimiga a um destacamento próximo.

A correria para uma espécie de valas que existiam envolta da parada do quartel, ou para debaixo das camas, foi geral, pois todos pensávamos que estávamos a sofrer um ataque do IN. Foi o primeiro de muitos sustos e com alguns feridos ligeiros à mistura, porque nessa espécie de valas, onde alguns procuraram esconder-se, existiam muitas garrafas de cerveja partidas que cortaram muitos incautos.

Ficámos logo a saber que mesmo perto de Bissau, a pressão do IN podia fazer-se sentir – a guerra estava logo ali – e, meses mais tarde, aquando da passagem pela capital da Guiné a caminho de Lisboa para umas merecidas férias, assisti da messe de oficiais a um ataque a Jabadá, que se situava do outro lado do Rio Geba, quase em frente à principal cidade do CTIG.

Foi um Natal estranho, diferente, sem a companhia da família, imaginando que eles estavam todos juntos em casa dos meus pais. Senti bastante os milhares de quilómetros que nos separavam. Foi triste! Sei também que os meus familiares sofreram com a minha partida e com a minha falta à mesa de Natal e que os meus pais tiveram que ter o apoio, felizmente sempre presente, do meu tio Armando e da minha tia Bernardete. Este foi o primeiro Natal na Guiné, mas não seria o último.

Em Dezembro de 1972, depois de ter frequentado o Estágio das Unidades Africanas em Bolama e S. João, sob o Comando do então Major Coutinho e Lima, pessoa que me pareceu um excelente militar e um excelente ser humano, consegui regressar à minha Companhia, a tempo de passar o Natal com o meu pessoal, no nosso Dulombi. O poder contar-lhes as minhas aventuras durante o estágio, onde sofremos um ataque do PAIGC, a 13 de Dezembro (comandado pelo actual presidente da Guiné-Bissau, Nino Vieira, com recurso a canhões sem recuo e morteiros pesados e contando com o apoio de militares cubanos) e como decorrera o restante estágio. Foi a festa possível, com cânticos e algumas lágrimas de saudade. Estávamos também em alerta, dado que no princípio desse mês o IN atacara fortemente a sede do batalhão (Galomaro). Comemos o famoso bacalhau liofilizado, mas com a esperança – por sinal errada – que seria o último que passaríamos na Guiné e que em 1973 estaríamos no seio das nossas famílias.

No ano seguinte o meu Grupo de Combate, depois de ter estado uma temporada em apoio ao Batalhão de Piche, passou a prestar apoio ao Batalhão de Nova Lamego, tendo passado ainda por Pirada. Soubemos, entretanto, que não obstante a comissão ter terminado em Outubro, só seríamos substituídos em 1974. Víamos camaradas que tinham vindo em rendição individual e com menos tempo do que nós partirem e nós nada. Esta situação, aliada ao problema dos mísseis terra-ar que tornavam as evacuações dos feridos em combate no mato bastante difíceis, tinham proporcionado um abaixamento do moral das nossas tropas, implicando um trabalho psicológico acrescido para os graduados, para que a disciplina e as regras de segurança, em especial em operações, se mantivessem em elevado grau de eficiência.

Um Natal nestas condições, com o sonho desfeito de voltarmos a casa no tempo previsto, com 24 meses de Guiné já cumpridos e estando fora da Companhia, foram difíceis de gerir e de digerir e os sentimentos que lavravam entre todos nós, eram um misto de revolta e de raiva. Lembro-me que, após a ceia de Natal em Nova Lamego, o Grupo de Combate, pela meia-noite, foi para o mato, substituir outros camaradas que estavam desde o fim da tarde emboscados, para que eles pudessem também vir comer a ceia. Ali ficámos a fazer segurança até ao alvorecer, cada um a pensar, com certeza, na importância de mais um Natal afastado da sua terra, da sua família, dos entes queridos.

Foi efectivamente o último, mas regressámos vivos e voltámos a comemorar estas datas com as nossas famílias e amigos. Outros, infelizmente, não tiveram a mesma sorte, porque a boa estrela perderam, numa qualquer picada, trilho, vala, ou bolanha, nas terras da Guiné.

Digo-vos caros camaradas que desde esses tempos passei a ver o Natal com outro olhar… com outro sentimento.

Aproveito a oportunidade para desejar a todos aqueles que nos lêem, em especial aos amigos e camaradas da Tabanca Grande e aos elementos da CCAÇ 3491, um Bom Natal e um Ano Novo Próspero, extensivo às respectivas famílias e que a Boa Estrela nos guie.

Luís Dias
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3636: O meu Natal no mato (15): Salsichas com arroz na messe de Sargentos, na Consoada de 1968... (Jorge Teixeira)

Vd. último poste de Luís Dias, de 8 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3037: Os nossos regressos (8): E vieram todos. Luís Dias.

Guiné 63/74 - P3649: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (10): Que o bom Deus vos abençoe (J. Mexia Alves)

(Re)lembrando as noites frias de Dezembro, no Xitole, no Udunduma, no Mato Cão, em Mansoa...
Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem (natalícia) (*) do Joaquim Mexia Alves:


«E o amor de Deus manifestou-se desta forma
no meio de nós:
Deus enviou ao mundo o seu Filho Unigénito,
para que, por Ele, tenhamos a vida.»
1 Jo 4,9

Meus camarigos:

Podemos viver o Natal de muitas maneiras,
mas a verdade é que o Natal existe
porque se comemora, ou melhor, se faz memorial
do Nascimento de Cristo,
Filho de Deus,
no meio dos homens,
como Homem igual a nós em tudo,
excepto no pecado.

Podemos acreditar,
ou até não acreditar,
mas quer queiramos quer não,
todos entendemos o Natal
como uma festa da família
e como festa da família
que é uma festa de amor.

Sem medo das palavras,
hoje em dia tão mal utilizadas,
é isso que agora vos quero deixar
... o amor!

O amor a vós
e a todos os homens de boa vontade,
e até àqueles que não têm boa vontade.

O amor aos que nos combateram
e aos que connosco combateram.

O amor aos que concordam connosco
e o amor aos que de nós discordam.

O amor aos que nos perdoam
e àqueles a quem nós perdoamos,
àqueles a quem pedimos perdão
e até àqueles que não nos conseguem perdoar
e aos que temos dificuldades de perdoar.

O amor a todos sem excepção,
porque só assim se pode entender o Natal.

Neste Natal desejo sobretudo a todos vós,
homens de rija têmpera
que souberam combater,
que souberam abraçar,
que souberam viver a amizade
daqueles que entregam a própria vida pela vida dos outros,
que saibamos dar testemunho
de solidariedade,
de fraternidade,
de entreajuda,
neste mundo egoísta
que se fecha cada vez mais em si próprio.

Que o bom Deus em quem acredito
com toda a força do meu ser,
vos abençoe
na paz,
na alegria,
na abundância de vida.

Abraço muito amigo, muito camarigo, do
Joaquim Mexia Alves,
ex-Alf Mil Op Esp
CART 3492/BART 3873 (Xitole / Ponte dos Fulas),
Pel Caç Nat 52 (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão)e CCAÇ 15 (Mansoa) (1971/73)



Fixação do texto: L.G.



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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 18 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3645: As Boas-Festas da Nossa Tabanca Grande (9): Cartões de Natal de Sousa de Castro, António Santos e Mário Fitas

Guiné 63/74 - P3648: Pensar em Voz Alta (Torcato Mendonça) (18): Guileje ainda é cedo, Saiegh 18/12/78: foi há trinta anos...


MEMÓRIAS ou PENSAR em VOZ ALTA


Torcato Mendonça



1 - Não sei ao certo se “Penso em Voz Alta” ou o faça só para mim.

Pensar só para mim foi um recalcamento de anos. Um esconder, um calar uma parte do meu passado, tão curto e tão intensamente vivido.
Uma Memória, uma velha, cada vez a ficar mais velha recordação da passagem pela guerra da Guiné.
E porquê? Para quê tentar esconder ou recalcar essa memória que, em nada envergonha essa parte, enquanto jovem, do meu passado. Pelo contrário.
Por isso:

Hoje, pela manhã abri o Blogue e li ao rolar do rato. Apareceu Peniche e o “Cerro do Cão”. Parei a pensar um pouco, somente um pouco. Afazeres e compromissos vários, obrigaram-me a sair. Não me impediram de pensar.

Agora, com a noite fria a bater lá fora gelando esta Cova entre serras, recolhi ao lar e reli o texto. Mais calmamente e, curiosamente ou nem por isso, identifico-me com que lá foi escrito.
Senti essa maneira de pensar e recordar o passado, certo passado comum a tantos homens. Não só no apelo á memória e a torná-la presente, mas também o encontro com velhos companheiros ou camaradas, daquela parte comum de vida. Depois conviver novamente em recordação desse passado e, aos poucos, sentir a alegria do encontro, do convívio.
Só que há um custo: Há sempre um custo. A este chama-se despedida, afastamento e até para o ano ou para a próxima, que se quer logo ali.
Mas vale a pena. Não sou muito assíduo destes encontros. A minha vida corrida …! Prefiro contudo justificar, até porque o sinto com a frase ”Dói-nos muito comparar o que somos e o que fazemos com o que fomos e o que fizemos”…

2 – Parece que não, talvez seja pensar pelo absurdo, para mim claro, mas podemos entroncar o que atrás foi dito com a sondagem sobre o abandono de Guileje.


Quando a vi, á esquerda da página do Blogue disse para mim:
- É prematura. Devia esperar-se um pouco mais. Possivelmente não terei razão. Possivelmente há pessoas com ideias já formadas. Possivelmente há…só que a mim ainda me faltam documentos de análise. O livro pode ser uma ajuda.

Quando foi público o telefone do Coronel Coutinho e Lima entrei em contacto com ele. Falei com a esposa e posteriormente o Coronel ligou-me. Depois da apresentação enviava-me o livro. Espero por isso. Preciso de o ler. Necessito conhecer, a versão de quem decidiu abandonar um aquartelamento.

Sempre me questionei sobre tão melindrosa tomada de decisão. Não tenho opinião formada. Fui treinado para vencer. A divisa do Capitão Comando Zacarias Saiegh, assassinado em 18 de Dezembro de 1978, era “Matar ou Morrer”.
Pode haver quem não apoie ou concorde. Pode haver quem concorde. Pode haver…na guerra elimina-se o inimigo, abate-se…e não se mata.
Só que fomos treinados para morrer se necessário, para cumprir e fazer cumprir ordens.
Só que dar ordens não é fácil. Em jogo estão a vida de homens. O erro, a ordem indevida pode provocar a morte de quem comandamos. E o inverso?

Fui um simples oficial subalterno, um soldado, do Senhor Marechal António de Spínola, Brigadeiro e depois General enquanto estive na Guiné. Respeitei-o e respeito a sua memória. Por ora é suficiente.
Conheço o Senhor Coronel Alexandre Coutinho e Lima. Respeito-o. Nada mais adianto. Não tenho o direito, legitimidade e os conhecimentos para opinar. Qualquer juízo será pessoal e só a ele o diria. Vou ler o livro.
Acrescentar algo mais é dispensável. Seria pretensioso de minha parte.

3 – Parei aqui, jantei e passado tempo voltei ao blogue.

Espanto meu Os Guias. Falavam deles, de guias que no meu tempo foram (os que me guiaram) amigos, camaradas. Outros, antigos combatentes do PAIGC, depois das missões eram entregues a quem de direito…agora leio, releio e…foi aqui escrito que eram abatidos alguns…Aguiar (não da Beira – de malvadez)?! Quando, onde e porquê trazer isso á colação?
Porquê?
Lembrei-me do tal “Sítio de Afectos”, do tal lugar, sitio, site ou o que lhe queiram chamar, onde, velhos combatentes, escrevem, desabafam, contam estórias dentro de regras (X dez) definidas. Divergem, convergem – convivem.
De quando em vez um pequeno desvio. Lógico, normal e, até, salutar. Não mais que um desvio, um pequeno desvio…Aguiar, ainda por cima pior que isso…Aguiar só da Beira (vou ver o mapa), fiquei, geograficamente, confuso.

4 – Ainda o Cherno Rachide.

É uma figura incontornável da Guiné.
O Poder dele, talvez, quem sabe, era tal que os 82, os 122 e eteceteras se desviavam de Quebo e quedavam-se por outro lado…quem sabe? Quem sabe…malhas que o Império teceu…

5 – De facto sinto a “velhice”.

Mas o Apocalipse Now, A Dança das Valquírias, a loucura…ficam…marcam-me, dizem-me que o soldado Português, com Viras e Fados, era melhor combatente.
Lá, cá, na solidão, na alegria ou tristeza, gosto de música clássica em alto som. Precisava dela agora. Fico-me pelo “ Oceano Pacifico “ na R.F.M.
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Notas de vb:

1. Torcato Mendonça, ex-Alf Mil, CART 2339, Mansambo, 1968/69

2. Último artigo da série em

Guiné 63/74 - P3647: Banco do Afecto contra a Solidão (3): Regueirão, a Avenida da Desesperança. (Jorge Cabral)

Mensagem do Jorge Cabral

Amigos

Envio apontamento para a nova série, mas principalmente Votos de Bom Natal.
E que a Solidariedade nos ilumine a todos, e nos faça entender que não somos Nós e os Outros, mas somos todos Nós.

Abraços Grandes
Jorge Cabral

Os Meus Amigos do Regueirão dos Anjos

Jorge Cabral


Quase não é uma rua, o Regueirão. Beco comprido à ilharga do Banco, não aparece em nenhum Roteiro Turístico. É porém local de muitos sem-abrigo. Talvez um dia venha a mudar de nome. Por mim proponho – Avenida da Desesperança.

Aí encontro quatro Amigos. Um é grande e moldavo, outro negro de Angola, o terceiro velho e gasto e ainda uma mulher para compor o naipe.

São todos ex, ex-tudo e nunca falam do passado.

Quem foram? Não pergunto, mas descobri que o velho esteve na Guiné. Pela tatuagem, claro. Imagino-o lá. Padeiro em Buba, maqueiro em Piche, atirador no Xitole, o mato, o quartel, o perigo, as bebedeiras, a jogatana, as bajudas...

Como foi o regresso? Quando e porquê se terá ele perdido? Uma mulher? Um crime?
Talvez apenas a chatice da rotina o tenha feito berrar um ipiranga e embarcar sem rota...

Vivem aqui os quatro, entre cartões, cobertores, plásticos. Comem o que lhes trazem as carrinhas benfeitoras. O preto arruma carros. A mulher canta salmos e os outros esperam, sabe-se lá o quê? E bebem, bebem sempre, mas já não se embriagam.
Ontem levei castanhas. Assaram-nas na rua.
- Vai um trago, patrão?
- É do bom, Senhor Engenheiro!

Não bebo há anos, mas emborquei da garrafa, pois então.
- Bela pomada, amigos, sim senhor...
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Notas de vb:

1. Artigos da série em

15 de Dezembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3630: Banco do Afecto contra a Solidão (2): Ajuda ao João Santos, ex-combatente em Moçambique, que vive num contentor (Mário Fitas)

2. Último artigo do Jorge Cabral em:

4 de Dezembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3562: Banco do Afecto contra a Solidão (1): A última comissão do Coronel (Jorge Cabral)

Guiné 63/74 - P3646: Ser solidário (25): E se eu fosse o Pai Natal ? Mensagens de e para os guineenses da diáspora e não só...(Luís Graça)

Guiné-Bissau > Arquipélago dos Bijagós > 2007 > Uma foto, retirada (com a devida vénia...) do blogue Africanidades, do andarilho Jorge Rosmaninho ("jornalista, independentista, alentejano"...), membro da nossa Tabanca Grande (paga as quotas em géneros...).

O poste é de 31 de Janeiro de 2007 e tem por título Sempre Bijagós... Uma aventura pelas estradas e picadas de África que chegou ao fim - com muita pena de quem o seguia ao longe... Sim, chegou ao fim da linha, em 4 de Agosto de 2008... Entretanto, vale a pena transcrever três parágrafos onde o Jorge deixou expressa a sua gratidão à Mãe África, um belíssimo Último obrigado, dedicado simbolicamente à Mãe Ema:

"As plantas dos meus pés são de geografia fácil e as costas pouco exigentes. Vou a qualquer lado e durmo em qualquer cama. Até no chão, a mais espaçosa de todas. No entanto, nesta vida de andarilho há uma coisa que não se dispensa nunca: alguém que trate de nós.

"Quanto vale chegar a um lugar desconhecido, depois de umas valentes horas de estrada, e ter uma cama feita com uma rede mosquiteira branca a protegê-la, um balde de água limpa para tomar banho e uma vela para iluminar os fantasmas da noite? Muito. Se juntarmos a isto uma mamã perguntando-nos se preferimos peixe ou carne para o jantar… Talvez só o céu seja melhor! (...)

"A mãe Emma serve-me de metáfora às mães que têm tratado de mim nestes muitos quilómetros de estradas e picadas africanas. E foram muitas. A todas elas, muito obrigado. Obrigado em especial às minhas três mães de verdade, as de sangue, paixão e coração, que me criaram e criam com beijos e papas de leite, muitas vezes enviados por telefone ou apenas pelas correntes de ar que se passeiam por aí vagabundas – como eu – e me acompanham para onde quer que vá: Ana, Adelaide e Cláudia".


O penúltimo poste que ele publicou, em 3 de Agosto de 2008, no seu blogue (cinco anos, 300 mil visitas...) foi curiosamente um texto do Pepito (A sombra do Pau Torto), retirado do nosso blogue: 31 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3101: História de vida (13): Desistir é perder, recomeçar é vencer (Carlos Schwarz, 'Pepito', para os amigos)


Até à próxima encruzilhada, Jorge!
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Este período das festas de Natal e Ano Novo, não é o melhor para blogar, para comunicar através da blogosfera: há demasiado ruído, há demasiada saturação de um certo tipo de mensagens (por exemplo, pedidos de ajuda, manifestações de solidariedade, exibição da caridade dos ricos...).

Acabei de fazer uma limpeza à minha caixa de correio, profissional, relativamente ao ano de 2008, e fui deparar com meia dúzia de mensagens que li na devida altura mas que não reencaminhei para a caixa de correio do nosso blogue. Seleccionei algumas, vindas sobretudo de guineenses (que vivem na Guiné ou na diáspora, por exemplo no Brasil), e que me pedem coisas, sobretudo informação sobre as mais diversas coisas (desde direito a pensão de sangue a mapas e bibliografias)...

A publicação dessas mensagens seleccionadas, espero que ainda seja útil e vá a tempo. Conto com a boa vontade e o jeito solidário dos amigos e camaradas da Guiné que fazem parte da nossa Tabanca Grande. Mas também de muitos outros que não dão a cara (nem têm que dar) e que nos visitam regularmente. Este é também um blogue de afectos e de gente solidária (*)... Só tenho pena é de não poder ser, por enquanto, o Pai Natal da Guiné...

[ Mas eu fosse o Pai Natal, de verdade ? Se nós fôssemos o Pai Natal, de verdade ? Vá, digam lá, amigos e camaradas da Guiné, o que gostariam de poder fazer para tornar mais felizes os nossos amigos guineenses, homens, mulheres e crianças ? O que deixariam este ano no saco do Pai Natal nas tabancas da Guiné, em Bissau, nos Bijagós, em Catió, em Bafatá, no Cachungo, em Bambadinca, no Gabu ?] ... LG

1. Mensagem de 4 de Dezembro último, enviada por Ecylasaluy Moreira Borges

Assunto - Informações sobre Gabú

Boa noite Dr. Luís Graça,

Sou guineense e socióloga, no momento eu estou no Brasil terminando o mestrado em estudos étnicos e africanos, o meu tema é: será que o casamento precoce tem uma influência na gravidez das jovens islâmicas (fulas e mandingas) em Gabú, mais só que estou com muitas dificuldades em conseguir material, queria saber se o senhor poderia me indicar algumas referências bibliográficas.

Atenciosamente,

1. 1. Comentário de L.G.:

Cara amiga e confrade, era pressuposto o INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa , de Bissau, ter algum acervo documental sobre o problema do casamento precoce e a gravidez na adolescência entre a comunidade islamizada da região do Gabu... Mas nós sabemos o que aconteceu ao INEP e ao seu centro de documentação, na sequência da guerra civil de 1998... (Foi uma tragédia imensa: para além das vidas que se perderam, a Guiné-Bissau fiquei igualmente amputada de um importante património cultural, parte do seu acervo documental que representa a sua memória e a sua identidade)...

Fora da Guiné-Bissau, talvez possa procurar nas bibliotecas de instituições universitárias portuguesas (para além das brasileiras...) onde há cursos de sociologia e antropologia tais como o ISCTE - Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, a FCSH/UNL - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa ou o ISCSP/UTL - Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa... Dê também um salto ao portal Memória de África, uma biblioteca virtual gerida pela Fundação Portugal-África, ligada à Universidade de Aveiro.

É, para já, a ajuda de emergência que lhe posso dar... Com tempo, posso pedir uma pesquisa bibliográfica sobre este temática. Tenha um bom Natal e boa continuação dos seus estudos, aí no Brasil, grande país da lusofonia...

2. Mensagem de 1 de Dezembro último, enviada por Eliude Maria da Silva

Oi Luís Graça:

Sou brasileira e tive conhecimento deste preciossímo site ainda este ano quando pesquisava sobre a vida de Florence Nighitngale na Universidade em que estudo. Seu site [Luís Graça, sociólogo: Saúde e Trabalho] foi-me muito útil e desde aquela ocasião tenho perdido horas a pesquisar por este valiosissímo acervo.

Recentemente conheci dois estudantes guineenses que fazem faculdade aqui em Florianópolis (UFSC) e, por uma questão de curiosidade, sadia, decidi-me a pesquisar sobre sua terra natal, a impressionante Guiné-Bissau. O que encontrei na internet não foi muita coisa, exeção a seu site que enriqueceu-me em conhecimento atravês do acervo fotográfico sobre este país.

Por estar cursando Enfermagem, interessei-me pelo Hospital Simões Lopes ou Simões Mendes, não me recordo agora muito bem o nome. Gostaria então, se possível fosse você enviar-me ou até mesmo indicar-me sites, leituras ou literaturas sobre este hospital e sobre Guiné-Bissau, bem como sua capital Guiné.

Qual a situação de Guiné (capital) hoje? É a mesma que as imagens de 1996,1998 e 2001 mostram em seu site, isto é, devastada, arruinada, abandonada? Como vivem os guineenses?

Pergunto isto porquê percebo que este dois estudantes guineenses quando falam dizem que nós, brasileiros, não conhecemos a realidade do país deles, isto é, não é só pobreza ou muita pobreza mas é um país muito bom para morar-se. É isto mesmo? Eles dizem que somos influenciados pelo negativismo que a grande mídia televisa joga em nossas mentes aqui no Brasil, não permitindo-nos pensar e ver a boa realidade de Guiné-Bissau.

Agradeço muitíssimo se puderes me ajudar e mais uma vez parabenizo-o pelo maravilhoso sítio.

Abraço fraterno
Eliude.

2.1. Comentário de L.G.:

Querida Eliude (mas que nome maravilhoso!):

Para além da minha página pessoal, que você já conhece, tenho também este blogue que se chama Luís Graça & Camaradas da Guiné... É hoje um blogue colectivo com contributos de muitas centenas de homens (e de algumas mulheres) que conheceram a a antiga colónia portuguesa da Guiné, na África Ocidental (hoje, Guiné-Bissau, país independente mas um dos mais pobres do mundo)... E conheceram-na na pior altura para se fazer turismo: quando há guerra...

A guerra da Guiné foi o nosso Vietname e durou cerca de 11 anos (1963/74). Somos, quase todos, veteranos dessa guerra... Claro, temos laços afectivos que nos prendem àquela terra e às suas gentes maravilhosas... Mas o nosso core business não é a Guiné-Bissau actual, os seus problemas de desenvolvimento (político, social, cultural e económico...).

Preferiria que foi um guineense a responder-lhe, a responder à sua pergunta. "Qual a situação de Guiné hoje? É a mesma que as imagens de 1996,1998 e 2001 mostram em seu site, isto é, devastada, arruinada, abandonada? Como vivem os guineenses?"...

Já pedi a uma dos nossos amigos, guineense, para lhe responder. Aguardo que o Prof Doutor Leopoldo Amado, neste momento a trabalhar na Universidade de Cabo Verde, me mande a(s) sua(s) resposta(s) à(s) sua(s) pergunta(s)... Eu poderia responder-lhe, não prefiro não o afzer em público: umas das nossas 10 regras de ouro é justamente a da "não-intromissão, por parte dos portugueses, na vida política interna da actual República da Guiné-Bissau (um jovem país em construção), salvaguardando sempre o direito de opinião de cada um de nós, como seres livres e cidadãos (portugueses, europeus e do mundo)"...

Apareça, será sempre bem vinda...


3. Mensagem de 14 de Outubro último, enviada por José Geraldo Freitas da Silva

Assunto - Quantitativo das FFAA portuguesas durante a guerra do Ultramar.

Prezado Senhor:

Sou brasileiro de Belém do Pará e estudioso de conflitos ocorridos na Africa, em particular a guerra do Ultramar. Assim, gostaria de saber qual o quantitativo das forças portuguesas (Exército, Marinha e Aeronáutica) empenhadas durante o conflito.

att,
José Geraldo Freitas Silva
(silgeraldo@gmail.com)

3.1. Comentário de L.G.:

Meu caro José: Boa pergunta. Não tenho aqui a resposta na ponta dos dedos, mas posso sugerir-lhe que consulte o sítio (como se diz aqui, em Portugal)Guerra Colonial 1961-1974, criado recentemente pela A25A- Associação 25 de Abril. Uma verdadeira enciclopédia sobre a guerra provavelmente mais longa do Séc. XX, travada por um pequeno país europeu, a milhares de quilómetros de distância, em África, em três frentes (Guiné, Angola e Moçambique).

Boas pesquisas, boas leituras.


4. Mensagem de Iaia Djamanca, com data de 9 de Outubro último:
Ao iniciar gostaria de poder agradecer do fundo do meu coração por este magnífico trabalho da Vossa excelência, Senhor Luís Graça, sociólogo do trabalho e da saúde, doutorado em saúde pública, professor na Escola Nacional de Saúde Pública, Universidade Nova de Lisboa, em Lisboa.

Fiquei impressionada com este brilhante trabalho que me facilitou num simples pesquisa que tava fazendo na minha faculdade aqui no Rio de Janeiro (Brasil) com os colegas brasileiros que queriam tanto conhecer algo da minha terra e o nosso crioulo. Finalmente consegui encontrar dentre muitas que eram do crioulo de Cabo-Verde, o seu trabalho.

Gostei muito e peço a Deus que apareça milhares de trabalhos como o seu para a Guiné - Bissau.

Obrigado pelo trabalho...

De: Iaia Djamanca
Estudante de Biblioteconomia na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

4.1. Comentário de L.G.:

Querida Iaia (um nome feminino bem guineense, bem lindo):

Fico encantado com as suas palavras. Mas dispenso o... Excelência. Trate-me apenas por Luís, um amigo da sua terra e do seu povo mas que, infelizmente, não fala fluentemente o crioulo... Espero que volte depressa à sua terra e que tenha ocasião de aplicar as suas novas competências no domínio das ciências da documentação. O seu país precisa de si. Um beijinho.



5. Mensagem de 28 de Setembro de 2008, enviada por Adulai Gomes Rodrigues

Caro amigo Luis Graça!

Sou natural das ilhas Bijagós - ilha de Sogá, estou muito interessado pelas histórias de outrora que escreve relactivamente à guerra colonial na Guiné. Mas o mais relevante para mim é sobre as ilhas Bijagós, de formas que sempre lhe peço apoio no sentido de me ter como o seu menino. Estou a tentar escrever um livro de histórias sobre as ilhas Bijagós, mas tenho muitas dificuldades, sejam materiais assim como técnicas e morais, pelo que preciso muito do seu contributo.

Como é a primeira vez espero a resposta para mais um contacto.

Muito obrigado.

Adulai Gomes Rodrigues
Natural das ilhas Bijagós - Sogá, tabanca de Eticoba
Estudante de Economia na Universidade Amilcar Cabral em Bissau
Assistente pesquisador no Projecto de Saúde de Bandim.
Celular: (+245) 667 27 88 ou 722 56 61

5.1. Comentário de L.G.:


Meu caríssimo Adulai:

Não sei a sua idade, mas eu pela minha parte devo ter a idade do seu pai... A guerra colonial acabou em 1974 (terá acabado mesmo em 1974 ?) e eu regressei da Guiné em Março de 1971... Só lá voltei em Março... de 2008. Muito tempo... Infelizmente não conheci nem conheço hoje as ilhas (que me dizem maravilhosas...) do seu arquipélago... Posso adoptá-lo como 'meu menino', quero ajudá-lo, mas sinceramente não sei muito bem como... O mais simples é perguntar-lhe se ainda precisa da minha ajuda e como posso eu ajudá-lo... Em que ponto está o seu livro ?


Entretanto, há outros membros do nosso blogue que conhecem os Bijagós e provavelemente até a sua ilha (Sogá) e a sua tabanca (Eticoba)... Vamos contar com a sua (deles) ajuda e interesse... Mantenhas.
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 9 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3428: Ser solidário (24): Em marcha a expedição de ajuda humanitária de 2009 (José Moreira / Pepito / Carlos Silva / Xico Allen)

Guiné 63/74 - P3645: As Boas-Festas da Nossa Tabanca Grande (9): Cartões de Natal de Sousa de Castro, António Santos e Mário Fitas

Mensagens de Natal de Sousa de Castro, António Santos e Mário Fitas, com votos de Boas-Festas, chegados até nós, destinados à Tabanca Grande.

1. Do nosso camarada Sousa de Castro, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo1972/74, tertuliano n.º 2 do nosso Blogue, recebemos este postal:


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2. Do nosso camarada António Santos, Ex-Sold Trms do Pel Mort 4574/72, Nova Lamego, 1972/74, um original da época:



Embora mais velhos, (gastos), o espírito continua novo, por isso fui buscar à mala este postal de Natal de outras eras, na altura pouco havia a cores, hoje é uma fartura.

Enfim, Bom natal para o Batalhão da tabanca grande, não esquecendo os familiares, e que 2009, não traga mais nenhum crash económico pois os que temos já nos chegam e além disso não somos políticos nem banqueiros, digo eu, simplesmente estivemos na Guiné o que fez de nós amigos para todo o sempre.


A. Santos
SPM 2558
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3. Ainda do nosso camarada Mário Fitas, ex- Fur Mil da CCaç 763, Cufar, 1965/66, este postal bem bonito:


Para Toda a Tabanca Grande Feliz Natal e um 2009 com o melhor que desejais Um abraço do tamanho do Cumbijã
Mário Fitas
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3643: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (8): Vitor Barata, em nome dos Especialistas da BA12 (Bissalanca, 1965/74)

Guiné 63/74 - P3644: Tabanca Grande (105): António Gomes da Cunha, Radiotelegrafista da CART 1613, "Os Lenços Verdes" (Teixeira Pinto e Guileje, 1966/68)

1. Mensagem de António Gomes da Cunha, Radiotelegrafista da CART 1613, Os Lenços Verdes, Teixeira Pinto e Guileje, 1966/68, com data de 16 de Dezembro de 2008:

Amigo Luís Graça

Sou António Gomes da Cunha, Radiotelegrafista da CART 1613, Os Lenços Verdes, que durante 11 meses permaneceu em Guileje.

Companhia do Sargento/Capitão Neto entretanto falecido, que tão explicitamente relatou os roncos e feitos da nossa malta. Ainda hoje me custa lembrar esse tempo sem deixar cair uma lágrima pelo sofrimento que ali passámos e acima de tudo pelos camaradas que ali perderam a vida para nada.

Além da nossa passagem por Guileje, logo que chegámos à Guiné fomos fazer IAO para S. João de Bolama, durante dois meses e depois ficámos seis meses como força de intervenção às ordens do Comando-Chefe das Forças Armadas, logicamente que sempre que saíamos de heli ou de barco, éramos largados no meio do barulho. Passámos 30 dias na mata do Jolmete e na semana Santa de 1967, onde fizemos o nosso primeiro ronco, ao destruír um acampamento turra. Matámos manga deles e prendemos 18 pessoas e apreendemos vário material. Nos dias que se seguiram tínhamos festa à noite com permanentes ataques.

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > O 2º sargento Neto, que fazia as funções de 1º sargento da companhia, fotogrado junto a um abrigo e à viatura blindada Fox.

Foto: ©
Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados .

Fomos por diversas vezes condecorados com medalhas de guerra a nível de Companhia e deixámos em Teixeira Pinto o nome dos Lenços Verdes bem gravados no Batalhão que ali permanecia na altura, como nas próprias populações, porque impusemos respeito aos turras da zona. Deixámos lá 5 irmãos de armas que recordo todos os dias.

Guileje/Mejo, eram zonas onde nos habituámos a viver todo o dia ao som das armas pesadas e um local onde diariamente se morria para ir buscar géneros e água a Gadamael. Todos aqueles que por lá passaram e tiveram a sorte, como eu, de regressar a casa, podemos considerar-nos as pessoas mais ricas do mundo.

Deixo aqui um abraço amigo a todos os companheiros da Guiné.
Com um abraço do
António Gomes da Cunha
(Malhado de Braga)
CArt 1613 – BArt 1896


2. Comentário de CV

Caro António Gomes da Cunha, bem-vindo ao nosso Blogue. Qualquer militar da CART 1613, do nosso querido Zé Neto, é sempre bem recebido na nossa Tabanca Grande.

Considera-te membro deste grupo de velhos ex-combatentes da Guiné, que mais não querem se não dar a conhecer as suas experiências e contar as histórias vividas no TO daquela pequena parcela de território africano.

Manda-nos as tuas fotos da praxe (uma do tempo de Guiné e outra actual) e conta-nos mais sobre a tua vivência naquele martirizado Guileje. Tens a responsabilidade de continuar a obra do saudoso Cap Zé Neto, que infelizmente nos deixou já há mais de uma ano (*). Não te esqueças que as tuas fotos de Guileje e não só, também serão importantes para o espólio do nosso Blogue (e do futuro Museu de Guileje, que os guineenses estão a construir, com a nossa ajuda).

Esperamos breves notícias tuas. Até lá, recebe um abraço da nossa malta e votos de um bom Natal e um novo Ano cheio de saúde.

Carlos Vinhal
Co-Editor
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 29 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2898: Efemérides (8): O Cap Zé Neto deixou-nos há um ano (Carlos Vinhal)

Vd. último poste desta série> 12 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3610: Tabanca Grande (104): António Paulo Bastos, 1.º Cabo do Pel Caç 953 (Teixeira Pinto e Farim, 1964/66)

Guiné 63/74 - P3643: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (8): Vitor Barata, em nome dos Especialistas da BA12 (Bissalanca, 1965/74)



1. Mensagem do Victor Barata, criador e editor do blogue dos Especialistas da BA12, Guiné 1965/74:

Ilustres Companheiros!

Em nome da Tertúlia LINHA DA FRENTE, Especialistas da Base Aérea nº12, quero expressar muitos sinceros votos de Boas-Festas a TODOS os Companheiros que tão dignamente tem colaborado para que a TABANCA GRANDE seja a EXCELÊNCIA dos Blogues referentes ao passado na Guerra da Guiné.

Como os últimos são sempre os primeiros,para vocês, LUÍS, CARLOS e BRIOTE, obrigado por nos manterem vivos neste TO.

Victor Barata

2. Comentário de L.G.:

Adorei o teu/vosso cartão. Obrigado. O especialista da BA12, que esteve em Bissalanca, de 1965 a 1974, é de facto um Zé Especial, muito especial... No TO da Guiné, fez das tripas coração, da penúria imaginação e da crise oportunidade. Aguentámos uma guerra, com poucos meios e para mais obsoletos. Isto era válido para os três ramos das Forças Armadas. Graças ao teu blogue, ficamos tambem a conhecer melhor o que foi Bissalanca e o vosso espírito de corpo, solidariedade e camaradagem. E mais: tu, Victor, fizeste a ponte que faltava entre a malta do ar e a malta de terra... É também como o nosso um blogue de histórias e de afectos.

Não sei quem é o autor do Zé , mas é seguramente um tipo criativo e bem humorado. Fico, pessoalmente, muito satisfeito que o teu blogue já esteja em velocidade de cruzeiro e se tenha criado um tertúlia, com um nome muito apropriado, Linha da Frente...

Durante a minha comissão, de meados de 1969 a Março de 1971, não tive muitos contactos, personalizados, com o Zé Especial, contrariamente ao meu camarada Humberto Reis (igualmente da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71) que tinha amigos em Bissalanca... Mas deixa-me fazer minhas as palavras, de admiração, reconhecimento e camaradagem, que o Virgínio Briote, meu querido co-editor e administrador (e grande operacional dos anos de brasa de 1965/66) , escreveu ontem, no teu blogue:

Caro Vítor,

Ver e reparar aeronaves abatidas ou furadas não foi nada de excepcional para os valorosos especialistas da nossa BA12 que, rapidamente, as punham de novo operacionais. Vezes e vezes, ao longo dos anos que durou a guerra, os nossos especialistas se depararam com situações idênticas, algumas com consequências muito mais graves. Para mim foi importante, jovem maçarico, ir num DO à procura das NT, ainda envolvidas na conquista de Canjambari e sair dali vivo, sem saber como, num Dornier todo furado. A categoria do piloto e a calma que aparentava e transmitia transformou o acontecimento num simples episódio, que, no fim, até deu para rir, ao ver o capelão do BCav 490 com as calças todas borradas. Daí o meu interesse em saber do que é feito do excelente piloto.

Tive cerca de 21 meses de actividade operacional. Golpes de mão, heliportagens de assalto, helitransportes para a fronteira Norte (Barro, Bigene, Sitató-Cuntima e outras). Sempre o apoio da FA foi decisivo e constatei sempre o elevado nível do pessoal da BA 12, até por contraste com as forças do Exército. E fui testemunha do vosso trabalho, ao manterem operacionais as aeronaves que levavam a vida aos 'mortos' que viviam dentro dos arames farpados. Evacuações, transportes, correio, alimentos, eram da vossa responsabilidade. Honra vos seja feita. Cumpriram muito bem o que a Pátria de então vos pedia.

A honra é minha, caro Vítor, ao ver o 'Tantas Vidas' anexado ao blogue dos nossos especialistas da BA 12.

Um abraço para ti e para todo os Camaradas da BA 12.

Quanto às festas que se avizinham, meu caro Victor e meu Zé, que sejam como as castanhas: quentes e boas! (*) LG
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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série:

16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3631: As Boas-Festas da Nossa Tabanca Grande (7): Votos de: R.Silva/V.Condeço/P.Neves/ V.Garcia/P.Raposo/A.Paiva/S.Fernandes

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3642: Historiografia da presença portuguesa em África (13): A exótica Bissau do Séc. XVII e o papel de D. Frei Vitoriano Portuense (Beja Santos)

Uma Bissau exótica tirada da lenda e do romance,
segundo um livro extraordinário do Almirante Teixeira da Mota

por Beja Santos (*)

Teixeira da Mota, seguramente o mais importante dos historiadores da Guiné colonial, procurou em As Viagens do Bispo D. Frei Vitoriano Portuense à Guiné contribuir para o conhecimento de Bissau e dos Papéis, um verdadeiro acontecimento cientifico, já que tão pouco se sabia e sabe sobre a sua história até ao século XIX (Biblioteca da Expansão Portuguesa, Direcção de Luís de Albuquerque, Publicações Alfa, Lisboa, 1989).

É um relato fascinante pelo conjunto de registos recolhidos e que têm sobretudo a ver com as últimas décadas do século XVII, período delicado já que os missionários espanhóis estavam a ser substituídos a seguir à Restauração por missionários portugueses. O estudo do Teixeira da Mota envolve a acção missionária, a luta contra os franceses, as alterações nas relações entre os Portugueses e os Papéis, as saborosas descrições de Bissau e da sua fortaleza e o espantoso relato do baptismo do Rei de Bissau, Bacampolo-Có ou D. Pedro.

É lastimável que a nossa cooperação cultural com a Guiné-Bissau não permita uma boa divulgação destes títulos, imprescindíveis para o conhecimento da colonização portuguesa. É hoje um dado aceite que a nossa acção missionária na Guiné foi tímida, descontínua, nunca esteva à altura de superar a força do Islão ou de se ter transformado num esteio cultural.

A mortandade entre os missionários era enorme, sobretudo por causa do clima. Os negociantes das praças e presídios não acatavam muito os missionários, sobretudo quando estes contestavam contra a escravatura.

As viagens do Bispo D. Frei Vitoriano Portuense foram, a vários títulos, um grande acontecimento. Bispo de Cabo Verde, viajou até à Guiné de forma ousada, procurou todos os apoios para fundar igrejas e fazer acolher missionários. Sabia que os Papéis e os Manjacos eram então bastante receptivos à presença portuguesa. O porto de Bissau, reconhecido por todos, estava bem localizado para servir de base de partida e de apoio da navegação costeira e fluvial.

Foi assim que nasceu à volta de Bissau a classe dos grumetes, os aculturados que aceitavam os princípios do cristianismo e que se revelaram indispensáveis para a sua irradiação. Recordo-me que os meus soldados falavam dos cristãos de Geba como aqueles que praticavam o cristianismo, que falavam o português, que trajavam à europeia e que apoiavam a própria administração colonial. Os cabos Domingos Silva, Benjamim Lopes da Costa e José Pereira, do Pel Caç Nat 52, vinham indiscutivelmente desta linhagem.

Os relatos comentados por Teixeira da Mota deixam bem claro como o povo e o porto de Bissau era um dos mais importantes núcleos da presença portuguesa e cristã na Guiné: por ali passaram os primeiros jesuítas, como o Pe. Manuel Álvares, em 1607, que deixou um informação muito rica sobre os Papéis; por Bissau passou o franciscano Fr. André de Faro, em 1663 e a seguir vários capuchinhos espanhóis, e contemporâneos da sua presença temos a actividade comercial dos franceses em Bissau, estes, mais que os Ingleses e Holandeses procuraram liderar o negócio da escravatura para abastecer as Antilhas francesas.

Com a Restauração, constitui-se a capitania de Bissau para protecção do rio Grande (hoje o rio Geba) que ficou numa fortaleza custeada pela Companhia de Cacheu e Cabo Verde. O bispo efectuou a sua primeira viagem à Guiné em 1694, tendo visitado Bissau, Geba, Cacheu, Farim, Xime e Boloura, registando um número de cristãos existentes, várias centenas.

O filho do rei de Bissau é enviado para Lisboa, aqui é baptizado com toda a pompa, tratado como um príncipe pelo rei D. Pedro II. O relato do baptismo é uma peça literária, mas pertence a outro autor. D. Frei Vitoriano Portuense volta à Guiné em 1696. Já tinha falecido Manuel de Portugal, o filho do rei de Bissau, o próprio rei tinha adoecido gravemente e queria ser baptizado. Bacampolo-Có pede antes de morrer que queria ser sepultado em terra de cristãos e pedia par não matarem os seus escravos.

O relato do bispo de Cabo Verde é de uma grande importância pelas expectativas que abre para a acção missionaria, confere grane importância ás relações estabelecidas com vários reis que aceitam converter-se ao cristianismo.

Teixeira da Mota chama depois à atenção para a presença dos franceses em Bissau, as visitas efectuadas por alguns viajantes franceses, o manifesto antiesclavagista dos últimos capuchinhos espanhóis de Bissau e atribui grande valor aos relatos dos jesuítas que tentaram implantar-se na região, sem êxito.

Depois do estudo propriamente dito, Teixeira da Mota publica a tradução dos seguintes textos: A ilha de Bissau segundo o Padre Manuel Álvares; Relato da primeira viagem do Bispo D. Fr. Vitoriano Portuense à Guiné (1694); A primeira viagem do Bispo D. Fr. Vitoriano Portuense à Guiné e o baptismo em Lisboa de D. Manuel de Portugal, filho do rei de Bissau, segundo o opúsculo de 1695; relato do baptismo de D. Pedro, rei de Bissau, e do começo da segunda viagem à Guiné do Bispo D. Fr. Vitoriano Portuense (1696); A Ilha de Bissau na relação da viagem de La Courbe (1686-1687); O manifesto antiesclavagista dos capuchinhos espanhóis de Bissau de 1686.

Só duas ou três pinceladas sobre a qualidade e importância dos textos. O padre Manuel Álvares refere-se à Ilha de Bissau do seguinte modo:

“A terra é sadia, gracioso o sítio e aprazível por causa do vário arvoredo e abundância de água, que tem a ilha suficiente quantidade dela. È benemérita esta de todos, por a terem aqui os passageiros como estalagem ou quinta de refresco, onde as embarcações se provêm de aguada e mais necessário para o cumprimento da viagem, que o tem a terra, sendo abundantíssima do vários mantimentos, como arroz, funde, feijão, inhame, abóboras, muito vinho”.

Escreve D. Fr. Vitoriano Portuense em 1694:

“É este gentio de Bissau bem inclinado; Tem grande pretensão para a cristandade. O que a chegou a receber não tornou mais a recalcitrar, o que não se acha em outras nações. O cabo daquela povoação trouxe a ser cristãos todos os seus parentes, e, não querendo a vir ser sua mãe, dizendo que era velha, tinha mais de 70 anos, respondendo o filho que, se ela não viesse, tornaria a vestir a pele e a ser gentio, convenceu a mãe e a trouxe consigo, e eu a crismei nesta visita”.

Da viagem de D. Fr. Vitoriano Portuense de 1696 dirigida ao rei de Portugal:

“ De tudo o que tenho referido pode V. Majestade conhecer a boa disposição em que está esta seara, por se colherem dela muito copiosos frutos, para o que é necessário venham trabalhadores, e sobretudo um bispo caritativo e zeloso, como já em outra ocasião disse a V. Majestade e agora o torno a repetir, por quanto o bispo da ilha de Santiago não pode, ainda que queira, cultivar esta nova vinha. E considerando eu a grande necessidade que têm estas pobres almas de quem lhes reparta o pão da doutrina cristã, peço a V. Majestade, com todo o rendimento, me maça mercê aceitar a saída do bispo de Santiago, para que vindo, não bispo, mas missionário, para estas partes, nelas passe o que me resta da vida”.

Comprei este livro numa loja da Worten por 2.99€.

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste de 12 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3607: Historiografia da Presença Portuguesa (13): Cónego Marcelino Marques de Barros (1844-1928) (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P3641: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (2): Aventura de Domingo

1. Mensagem de António Paiva, ex-Sold Cond no HM 241 de Bissau, 1968/70, com data de 15 de Dezembro de 2008:

Caro Carlos
Ter sido condutor no HM 241 tinha, por circunstâncias do momento, variações de serviços.

Num domingo, vinha eu da caserna para a cantina, sou apanhado pelo Tenente Teixeira da formação, que me diz:

- Ó pá, já que aí estás, vai lá com eles levar o lixo.

Boa, lá fui eu fazer um serviço que nunca tinha feito, pois eram os africanos assim como o condutor que o faziam, todos bons rapazes, o condutor, creio que por motivos familiares, não estava.

Peguei no Unimog 404, carregado de lixo e lá fui eu para destino desconhecido com mais quatro africanos. Próximo dos Adidos, virou-se à esquerda por um caminho ou estrada de terra que ali havia, a distância era longa, lá para o fim do mundo a meu ver, mas os meus companheiros de percurso sabiam onde era.

Chegados ao local, despejado o lixo, fez-se o monte característico daquilo que não presta.

Pensei que despejado o lixo me vinha embora, mas não, tinham por hábito meter o Unimog numa bolanha ali próxima para o lavarem, tinha de ser metido de marcha atrás até meio da caixa. Não estava muito convencido, pensei, estes gajos estão malucos, mas tanto insistiram, porque era assim que faziam, que eu acabei por ceder.

Feita a lavagem, meto-me nele para o tirar, vai começar o inferno:

Começo a tentar tirá-lo lentamente… mas quê, sob as rodas de trás começa o terreno a ceder e ele a ir mais para baixo, penso cá para mim, estes cabrões lixaram-me. Tento rotores… e nada, tenho água a chegar à cabina e eu dentro dela a olhar o céu sem ter de levantar a cabeça.

Aflito e descontrolado tento sair, com certas dificuldades consigo pôr os pés em terra, logo lhes digo:

- Estão f..., enganaram-me, mas eu também os vou f…, agora metam-se dentro da bolanha e peguem nele às costas.

Gesticularam, resmungaram e não sei que mais diziam.

Não digo que o fizessem por mal, mas porra, eu é que estava em jogo. Ainda lhes disse:

- Agora vão a pé até ao Hospital e tragam ajuda.

Claro que não iam, era longe como o caraças, pensei muito mal da minha situação, sem apoio, sem nenhuma comunicação e perdido no deserto…, só me restava um milagre vindo do céu.

Passou tempo e o tempo não mais findava.

Olha, começamos aos saltos e a gesticular com os braços, o helicóptero vinha do lado de Bissau para a Base, bem alto lá longe.

- O gajo não nos vê, estamos feitos.

Mentira, vimo-lo virar à esquerda na nossa direcção, deu a volta e foi para a base.

As viaturas tinham escrito na frente Hospital Militar, o que levaria aquele piloto a pensar: - Olha, aqueles que pensam que só ajudam, também precisam dela. É verdade, todos precisavamos uns dos outros. Longo tempo depois vejo vir pelo caminho, onde tinha passado, um carrão da Engenharia que até metia medo. Lá se engatou ao, adormecido e fraco das pernas, unimog e o retirou de dentro de água.

Quero aqui, passados 38 anos, deixar o meu sincero agradecimento a esse piloto que lá do alto me deu a mão. Não sei quem foi, mas, entre os gloriosos, se vasculharem na memória feitos dos tempos passados, talvez o próprio se vá lembrar de ter visto o Hospital a olhar para o céu.

Um abraço a todos
António Paiva
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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 13 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3615: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (1): Corrida com triste fim

Guiné 63/74 - P3640: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (4): 1973, Ano Novo... Vida Velha

1. Mensagem de Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Cumbijã, 1972/74, com data de 11 de Dezembro de 2008, com mais um episódio da História dos Tigres (*).

Ano novo… Vida velha

Janeiro de 1973 inicia-se porco, feio, violento, e o primeiro aviso de que a Guiné era a sério acontece-nos a 10 de Janeiro.

Um dos nossos Grupos de Combate fazia patrulhamento em IEROIEL - SAMBA SEIDI - Rio Nafa, portanto na zona de Aldeia para a fronteira, quando o quarto elemento da coluna accionou uma mina antipessoal.

Contactado o quartel de Aldeia, logo saí a comandar um Pelotão reforçado, com a colaboração de um guia, e rapidamente chegámos ao local. Tomadas as devidas precauções, evacuei de imediato o ferido grave, de seu nome Francisco da Silva Ribeiro Mota, para Aldeia Formosa, de onde foi transportado para Bissau e, mais tarde, ainda no decurso do mês de Janeiro para Portugal. Fizemos o reconhecimento da zona e constatámos vinte e cinco abrigos bem cavados situados a cinco metros do trilho minado. Picámos cuidadosamente todo o trilho e encontrámos e levantámos duas minas anti-pessoais. Segundo o guia que me acompanhou e com quem tanto aprendi numa aula prática forçada, teria estado preparada uma emboscada por um grupo que havia abandonado o local cerca de duas horas antes, seguindo na direcção do rio Habi e flectindo depois para o sul.

Uma nota de apreço e louvor aos nossos guias

Uma pequena nota, para mim de importância fundamental, no sentido de elogiar o papel dos guias que comigo trabalharam, verdadeiros mestres de caminhar no mato e com um sentido de orientação apuradíssimo, sempre atentos a indícios que passavam despercebidos à grande maioria dos nossos soldados, e que eu exigia que eles me explicassem para que os homens que eu comandava pudessem mais tarde absorver.

Já que falo nos guias, foi com grande estupefacção que li há uns tempos atrás num poste da nossa Tabanca que o capitão de determinada companhia mandava matar os guias, finalizada que fosse a Operação em que estes participavam. Acabei por não saber se era ficção ou realidade.


Se era ficção dela ressalta o desprimor com que alguns conseguem aguiar (consultar dicionário) (**) com cores escuras e adjectivos caluniosos os que foram obrigados a combater; pelo contrário se foi realidade, não entendo o silêncio cobarde dos que não foram capazes de tornar público crimes de tal tipo no momento próprio. Nunca tive medo de nenhum superior hierárquico, sempre os respeitei, como respeitei todos os meus camaradas, mas a nenhum deles consenti que me pusessem o pé no cachaço. Nem a militares nem a civis.

Sou do tempo em que na Faculdade de Economia se fez greve a um ditador, enganei-me, a um professor muito antes do 25 de Abril! Exactamente, antes do 25 de Abril! Soube arcar com as consequências e ainda hoje aos sessenta e dois anos prefiro a fome do lobo à coleira do cão.

A minha modesta participação na Tabanca Grande, que em boa hora descobri, e que julgo ter também como fundamento um convite à vida participada, vai no sentido, atrevo-me a dizê-lo, de que as gerações que se nos seguiram, incluindo os que nos (des)governam, tenham o respeito por quem tanto sofreu e não se esqueçam de se curvar respeitosamente perante todos os camaradas que tombaram em combate numa guerra que não era a deles.

A esmagadora maioria dos ex-combatentes tem a humildade e a solidariedade, que são conceitos sem significado na vossa sociedade de senhores de anéis e de podres compadrios. Penso não conhecer pessoalmente nenhum dos camaradas da Tabanca (***), mas sinto-os como elementos da minha família; vocês, os que não nos conhecem, também não conhecem nem cumprimentem o vosso vizinho que mora no andar de baixo ou de cima.

Ex-combatentes, quem são esses gajos? Eram pedreiros, carpinteiros, médicos, engenheiros, padeiros, universitários, analfabetos, arrancados à família e ao emprego e obrigados, na sua esmagadora maioria, a partir para o desconhecido com a preparação militar, em muitos casos de pouco mais de seis meses, que dependiam uns dos outros para sobreviver. A amizade que se criou e que perdura há quase quarenta anos é algo que os senhores nunca vão conseguir descobrir…

Voltemos ao malfadado ano de 1973 e , se ainda não me perdi, estamos em Janeiro.

Segurança à construção da estrada Aldeia Formosa-Cumbijã

Volvidos quatro dias, portanto a 14 de Janeiro, estávamos em preparação para uma saída que consistia numa emboscada nocturna, seriam umas 15 horas, um camarada do mesmo grupo do Mota, por distracção, ao preparar a G3, deu um tiro que felizmente só lhe arrancou parte da falangeta. Teve no entanto de ir para Bissau curar-se dessa maleita.

A 19 desse mês os Tigres voltam a ser visitados pelo Sr. Comandante Militar, novamente para apreciar a nossa evolução. Pareciam visitas a mais dos Graúdos, mas elas continuaram como vamos ver e ilustrar.

Por esta altura a estrada ia caminhando a bom ritmo e a nossa Companhia, em conjugação com outras forças, picava a frente dos trabalhos. À noite emboscávamos na Zona do Cumbijã ou vínhamos dormir a Aldeia, tudo dependia da articulação com as outras Companhias. Quando dormíamos em Aldeia seguíamos na coluna militar que protegia centenas de capinadores e outros trabalhadores da Engenharia, bem como as máquinas. Os vestígios de passagem de grupos do PAIGC eram cada vez mais evidentes. Sabíamos que antes da estrada chegar ao Cumbijã as coisas iam aquecer.

No dia vinte avancei um pouco mais com a Companhia e detectámos um carreiro enorme por onde tinham passado havia pouco tempo um grupo estimado em mais de quarenta homens. Redobrámos os cuidados, apresentou-se um relatório detalhado dos movimentos na frente dos trabalhos e, curiosamente, a vinte e cinco de Janeiro, Aldeia Formosa é flagelada durante quinze minutos, tendo sido referenciados 60 rebentamentos. Digo curiosamente pois os ataques a Aldeia Formosa provinham de bases situadas do lado contrário ao da frente de trabalhos.

Na manhã seguinte, dia 26 de Janeiro, ainda comentando o embrulhanço da véspera, que mais uma vez não causara qualquer mossa, lá vai a malta toda para a frente da estrada em coluna auto quando em XITOLE 4G 7-21 (vd carta militar) levámos com uma emboscada a parecer bem.

Para além da minha Companhia seguiam também dois grupos da CCaç 18. As crónicas oficiais rezam que fomos emboscados por um Bigrupo IN com morteiros, RPG e armas ligeiras. Na reacção à emboscada a CCaç 18 teve dois feridos graves, um dos quais era um graduado, penso que furriel. A nossa Companhia não teve feridos. Passadas umas horas uma viatura do Batalhão de Engenharia accionou uma mina anticarro na região da Pedreira, mas o condutor saiu ileso.

No dia 29 dois Gr Comb dos Tigres em conjunto com um Pelotão da 6250 detectaram uma mina anticarro com dispositivo antilevantamento e 12 minas antipessoais.

A morte de Amílcar Cabral, chorada por uns, festejada por outros

Janeiro havia chegado ao fim, mas algo de muito importante não pode deixar de ser referido: O assassinato de Amílcar Cabral que ocorreu a 20 de Janeiro de 1973 em Conacri (e não no Senegal, como alguém por distracção postou no blogue).

Não vou entrar em considerações sobre a pessoa de Amílcar Cabral, não tenho capacidade para tal e os entendidos já publicaram literatura suficiente para todos os gostos sobre essa personalidade que, quer se queira quer não, foi o paradigma das lutas de libertação das ex-colónias.

Apenas dois pequenos registos, o primeiro para dizer que um amigo do meu pai, também homem do reviralho, mas bastante mais jovem e bastante mais contundente na forma como manifestava os seus ideais, fora colega do, também como ele, engenheiro Amílcar Cabral. A segunda nota é uma nota de tristeza para a alegria com que pelo menos duas pessoas festejavam, bebendo à saúde da morte do Cabral. O nome tinha outra terminação e os artistas eram oficiais. Curiosamente ou talvez não, nenhum dos dois era operacional.

Lembro-me de cena semelhante com outros personagens, era eu professor no Instituto Superior de Contabilidade e Administração, quando a morte do Dr. Sá Carneiro foi também comemorada, dizem-me que durante toda a madrugada de 4 para 5 de Dezembro de 1980. Lembro-me da data, pois eu havia casado a 5 de Outubro de 1970. Palavras para quê?

Fevereiro, dia primeiro, mais um ataque ao aquartelamento de Aldeia durante cerca de, cito, 50 minutos com cerca de setenta granadas de canhão sem recuo e 6 Foguetões 122. Nunca tinha ouvido o estrondo de um foguetão. Esses assustaram-me, mas foram um bom treino para o que nos aguardava no Cumbijã e posteriormente em Nhacobá. Houve sempre uma coisa que me intrigou durante todo o tempo em que estivemos em Aldeia, não me lembro de nenhuma granada ter caído dentro do quartel. Teria o PAIGC receio de acertar na população que se acantonava à volta do quartel?

O Cancioneiro de Cumbijã

Seria fastidioso enumerar todos os ataques que sofremos neste período sobretudo na protecção à estrada, como seria injusto não referir uma das Companhias do Batalhão que, já muito perto do final da comissão, foi fustigada por uma série de azares: a Companhia de Caçadores 3399, vulgarmente conhecida pela 99 e comandada por um capitão do quadro chamado Horácio Malheiro, de quem voltarei a falar mais adiante. Foi meu companheiro de longas conversatas, homem extraordinariamente simpático, com quem me identifiquei pouco tempo após a chegada a Aldeia, e era sobretudo solidário nos reveses que iam surgindo.

Não o vejo desde Julho de 1973, pois a partida do seu Batalhão coincidiu com a minha vinda de férias a Portugal. Deixou-me uma carta muito simpática que ainda hoje conservo, tendo também herdado alguns dos seus bens.

Neste período de Fevereiro/Março em que a guerra das minas era tremenda, pelas minhas notas registo, relativamente à 99, um ferido grave e dois ligeiros a 4 de Fevereiro, outro ferido grave a 26 de Fevereiro também por accionamento de mina e ainda um outro em finais de Março. Também um dos nossos camaradas de Mampatá, Companhia comandada pelo Marcelino, meu colega de curso e amigo, teve a infelicidade de accionar uma mina a 16 de Março na frente de trabalhos da estrada.

A CCav 8351 havia passado incólume a este vendaval de minas. Apenas uma pequena nota pessoal para o meu camarada Manuel Félix, o melhor pica da Guiné.

Os dados estavam lançados, o destino dos Tigres era... o CUMBIJÃ.

Termino mais um capítulo, desta feita com um poema premonitório que o meu camarada Tavares de Bastos, alferes da CCaç 3399 me dedicou

NA ESTRADA DO CUMBIJÃ

Vêm picadores
Incertos descobridores
da oculta traição
e deixam pedaços de si próprios
nas bermas alagadas.
Os camaradas raivosas lágrimas
a mata ri, quietamente.
Vêm também atiradores caçadores
naquelas viaturas
às centenas os negros descapinadores
e a engenharia.
Há calor de emboscada tiroteio estrondos
crepitam as armas infernais.
Berros caralhadas ais.
Sangue.
E alguém morre sozinho no chão estranho
E o irmão de longas horas não sente
Já não quer
Apaga a dor.
O hábito queima a dimensão do perigo.

Pela manhã
Há escura guerra
Nesta terra
Do Cumbijã.

Máquinas malucas ( orgulho da técnica )
Com fúria galgam bolanhas irrompem capim selvas;
As árvores tombam… amanhã levantar-se-ão… depois…
Poeira
suor
nuvens nos olhos
a terra é rasgada violentada.
Atrás o alcatrão arrasta-se
Mas os dias, os dias não fogem
nesta terra
do Cumbijã
onde logo pela manhã
há guerra.

Lá,
onde o rio solteiro (?!) alaga extensos arrozais,
Nhacobá,
longe da confusão,
promete rebelde vulcão
que não parará jamais.


Por esta altura estava desfalcado de dois alferes. Um tinha ido para a Chamarra, outro para Bissau.

Estou cansado, camaradas, deixo-vos com duas imagens do que era o Cumbijã.

Vasco da Gama (***)


Guiné > Regiãod e Tombali > Cumbijã > 1973 > CCAV 8351 (1972/74) >A triste paisagem de Cumbijã, na época seca...

Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > 1973 > CCAV 8351 (1072/74) > As minas, sempre as minas, as malditas minas...

Fotos: © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados

___________

Notas de CV:

(*) Vd. último poste da série de 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3638: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (3): Jan 73: Com o Cherno Rachide, em Aldeia Formosa

(**) Aguiar, o m.q. fazer tratantadas

(***) O que era verdade no dia 11 de Dezembro, mas não no dia 13: O Vasco apareceu na sessão de lançamento do livro do Coutinho e Lima e teve oportunidade de fazer novos amigos...

(****) Subtítulos e negritos da responsabilidade do editor

Guiné 63/74 - P3639: Blogues da Nossa Blogosfera (11): Do Cerro do Cão, em Peniche, ao Apocalipse Now (José Pedrosa / Luís Graça)



Cópia da folha de rosto do Blogue de José Pedrosa, Cerro do Cão ("Aqui só o vento muda, sem cumprir tempos ou vontades. Aqui só o mar bate: por ciúmes ou por vaidade !").

Imagem: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados



1. O José Pedrosa já apareceu aqui no nosso blogue, no Nosso Livro de Visitas, em data recente (*). É, além disso, um dos actuais 17 seguidores do nosso blogue (**).

Ele foi Alf Mil Inf, com a especialidade de Minas e Armadilhas, na CCaç 4747. Esta companhia açoriana esteve na na Guiné em 1974: Cumeré, em Janeiro de 1974; Chugué/Bedanda, entre Fevereiro e Julho de 1974; e no Biombo, até Agosto de 1974.... "Depois, no mês de Setembro de 1974 andei a negociar com o Cap Eng Pires a entrega do campo de minas de Bissau ao PAIGC e regressei em 28 de Setembro de 1974. Foi por pouco tempo, mas deu para aprender muito daquilo que a guerra colonial ensinou às nossas gerações".

É bancário, aposentado, da Caixa Geral de Depósitos. Tem 56 anos e indica, no seu perfil, o Apocalipse Now, de Ford Coppola (1979), como um dos seus filmes favoritos.

[A propósito, a dantesca sequência do ataque da cavalaria helitransportadade, comandada pelo cow-boy do tenente-coronel Bill Kilgore, a uma aldeia vietcong, na bacia do Rio Nung , sob a inebriante música do Wagner, A Danças das Valquírias, está disponível no You Tube, num longo excerto de 18 minutos e 1 segundo; é uma das melhoras sequências de guerra de toda a história do cinema e uma das mais perturbadoras ilustrações, pela 7ª arte, da nossa pulsão assassina e da nossa condição de primatas predadores].

Este ano o José Pedrosa (Zé Pedrosa, para os amigos, penicheiros ou não, e que se autodefine como "ser humano, simplesmente") teve a felicidade de poder reunir todos camaradas, naturais de (ou residentes em) Peniche, que fizeram a guerra colonial / guerra do ultramar na Guiné. No seu blogue (que tem menos de um ano), escreveu um texto, singelo mas bonito, a marcar essa data, de 19 de Abril.

Espero, em breve, a sua companhia no seio da nossa Tabanca Grande. Espero também que ele nos possa relatar como foram os últimos meses da malta, no TO da Guiné, a seguir ao 25 de Abril. Gostaria, muito em particular, que nos ensinasse como é que se negoceia, com o inimigo de ontem, um campo de minas à volta de uma cidade...

Aqui fica um excerto do seu blogue, com a devida vénia... Devo acrescentar que não é um blogue centrado na experiência da Guiné, mas sim na sua condição de filho de Peniche, adoptado, e no exercício da sua cidadania.

Em troca deixo-lhe também, em roda pé, uma excerto de um poema (meu) sobre o meu pedaço de costa preferido, Paimogo, com as Berlengas, o Cabo Carvoeiro e Peniche à vista (***) (LG)

2. Blogue Cerro do Cão >José Pedrosa > Segunda-feira, 21 de Abril de 2008 > Memorial da Guiné

Reviver o passado é custoso. Dói-nos muito comparar o que somos e o que fazemos com o que fomos e o que fizemos. É uma dolorosa emoção: embarga a voz, humedece os olhos e faz com que a alma fique por ali, cataléptica, à espera de ordens do intelecto.


É sempre assim quando nos (re)encontramos com a história, a nossa história pessoal que, normalmente, tem episódios ou causas que nos ligam a outros como nós.

E depois dessa dor, do embaraço de rever dois, cinco, dez e mais companheiros duma causa comum - cruel e violenta, que involuntariamente fez parte da nossa vida - depois disso, vem a alegria contagiante com que cada um de nós quer partilhar o lembrar-se de si mesmo.

Foi assim, sábado passado (dia 19) no 1º Encontro dos Penicheiros Ex-Combatentes na Guiné; sem heroísmos nem falsos orgulhos, com humildade e respeitando tanto o passado como o presente.


Para a história de Peniche (se me é permitida a imodéstia) fica esta memória.

_______

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3590: O Nosso Livro de Visitas (48): José Pedrosa, ex-Alf Mil da CCAÇ 4747 (Guiné, 1974)

(**) Vd. poste anterior desta série > 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3635: Blogues da Nossa Blogosfera (10): De Porto de Mós a Gandembel (Paulo Sousa / Luís Graça)

(***) Paimogo da minha infância

(...)

Quando eu era menino e moço,
No tempo em que ainda partiam soldados
Para a Índia, para Goa,
Havia uma princesa, moura, encantada,
Num das tuas grutas submarinas;
O corpo coberto de ágar-ágar,
Era fonte de água pura, quente e doce,
Donde bebiam os ofegantes cavalos alados,
Com as suas enormes narinas.

E o vento, a nortada,
Nas velas dos barcos e dos moinhos,
Falavam-me da tragédia antiga,
Mas ainda viva,
Da filha do teu capitão
Que se havia matado do alto da arriba,
Dizem que por amor e solidão.

No antigo reino mouro
E depois franco e fero da Lourinhã,
Também os búzios me diziam
Que à noite as luzinhas,
A sul das Ilhas Berlengas,
Eram as alminhas
Dos que morriam
No mar, sem sepultura cristã.

Pobres náufragos,
Marinheiros, pescadores,
Poetas loucos, errantes, noctívagos,
Imigrantes clandestinos,
Corsários, contrabandistas, pecadores,
À deriva, sem um ui nem um ai,
Agarrados às tábuas do barco Deus é Pai (****).

Hoje não acredito mais
Nessas lendas das alminhas
Que eu ouvia aos ceguinhos das feiras,
Vendedores de letras de fado
E do Borda-d’Água:
Afinal essas luzinhas,
Lá longe e ali tão perto,
São apenas as traineiras
Ao largo do Mar do Serro,
Atrás dos cardumes de sardinhas.


(****) O concelho da Lourinhã, donde eu sou natural, também tem a sua quota-parte na história trágico-marítima deste país. Há registo, entre 1968 a 2000, da ocorrência de pelo menos seis naufrágios de barcos de pesca onde morreram três dezenas de filhos da terra, com especial destaque para as gentes de Ribamar (fora outros acidentes de trabalho mortais, cujo número se desconhece).

Um desses naufrágios foi o do barco Deus é Pai, em 26 de Março de 1971, no Mar do Serro [ou Cerro, já vi as duas grafias), ao largo do Cabo Carvoeiro. Os restantes foram os do Certa (15 de Maio de 1968), Altar de Deus (6 de Novembro de 1982), Arca de Deus (17 de Fevereiro de 1993), Amor de Filhos (25 de Julho de 1994) e Orca II (antigo Porto Dinheiro) (19 de Julho de 2000).

Entre estes homens há parentes meus, da grande família Maçarico, de Ribamar, donde era oriunda a minha bisavó paterna (nascida em 1864).

Num comentário de boas vindas ao poste P3590, já tinha dito ao Zé Pedroso o seguinte:

Sei que fizeste de Peniche também a tua terra. Para além das relações de vizinhança, é o mar e a comunitária piscatória que me atraiem em Peniche e que dão o forte traço de personalidade a esta terra da costa estremenha. Ainda hoje, apesar das profundas mudanças do sector.

Parte dos meus antepassados, do meu lado paterno (os 'Maçaricos', de Ribamar), estão ligados de há séculos ao mar, à pesca e à marinhagem... Mais uma razão, para além da Guiné, um dia destes nos conhecermo-nos pessoalmente.

Vou quase todas as semanas à Lourinhã, onde tenho casa e de vez em quando dou um salto a Peniche, para almoçar e passear. Um Alfa Bravo (abraço) do Luís Graça

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3638: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (3): Jan 73: Com o Cherno Rachide, em Aldeia Formosa

1. Mensagem do Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Os Tigres de Cumbijã (Cumbijã, 1972/74) (*):

Camaradas e Amigos,

Após a minha leitura diária no nosso Blogue e quando há tempo e alguma dificuldade em escrever, exactamente o que nesta fase da história da Companhia me está a acontecer , busco em postes antigos, tudo o que tenha a ver com a passagem pela Guiné dos Tigres do Cumbijã.

Hoje li um poste do camarada Antero Santos sobre o chefe religioso Cherno Rachide (**), bem como um comentário sobre o mesmo, do nosso camarada L.G. (**)

A minha participação de hoje é mais de índole fotográfica. Vou enviar quatro fotos do arquivo da patroa e transcrever o que nelas escrevi em Janeiro de 1973. Por favor, se for caso disso corrijam algum lapso.

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > Janeiro de 1973 > CCAV 8351 (1972/74) > Foto nº 1. "A população na sua maior parte constituída por homens grandes (velhos ) segue a missa (leitura do Alcorão) pelo Cherno Rachide. Todos estão descalços e sentados em esteiras ou panos. Os fatos que envergam não os usam habitualmente, mas só em dias festivos como o Ramadã ou a Festa do Carneiro que para eles significa o início de um Novo Ano".

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > Janeiro de 1973 > CCAV 8351 (1972/74) > Foto nº 2. "Depois da degola do carneiro. O Cherno é o que tem a faca na mão. À sua esquerda está um dos filhos".

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa > Janeiro de 1973 > CCAV 8351 (1972/74) > Foto nº 3. "Festa Fula da matança do carneiro. A figura central é o chefe religioso Cherno Rachide, que neste preciso momento acabou de sacrificar o carneiro depois de ter rezado missa". [O periquito do Cap Mil Vasco da Gama, por detrás do Cherno Rachide, não perde pitada da cerimónia]

Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa (***) > Janeiro de 1973 > CCAV 8351 (1972/74) > Foto nº 4. "Festa do carneiro, Janeiro de 1973". [O Cap Mil Vasco da Gama segue atrás do Cherno Rachide.]

Um abraço para todos

Vasco da Gama

PS - L.G., o teu comentário merece a minha total concordância, e se não fossemos exagerados/revoltados aos vinte e poucos anos na Guiné, mal de nós. Acrescento apenas que as ofertas em dinheiro e em ouro e não digo mais, também são prática no nosso burgo...

Fotos (e legendas): © Vasco da Gama (2008). Direitos reservados

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

7 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3581: A História dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (1): Apresentação e Chegada a Bissau

15 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3624: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (2): Natal de 1972 em Aldeia Formosa

(**) Poste de 18 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCX: O Cherno Rachid da Aldeia Formosa (Antero Santos, CCAÇ 3566 e CCAÇ 18)


Vd. também os seguintes postes:

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2714: Antropologia (5): A Canção do Cherno Rachide, em tradução de Manuel Belchior (Torcato Mendonça)
(...) "Cheguei à Guiné em 23 de Março de 1972 e fiz parte de CCAÇ 3566 - Os Metralhas [a mesma unidade a que pertenceu o Xico Allen]; a partir de 4 de Janeiro de 1973 e até ao fim da comissão passei a fazer parte da Companhia Africana CCAÇ 18 - Aldeia Formosa (Quebo para os africanos), tendo regressado [ à Metrópole] em 24 de Junho de 1974.
"De momento pretendo somente acrescentar uma nota acerca do chefe religioso Cherno Rachide que também conheci pessoalmente: faleceu em 1973 (dentro de dias informo a data exacta) durante o período em que estive em Aldeia Formosa.
"Na realidade o poder deste chefe religioso era enorme: a guerra parou para que um conjunto de autoridades religiosas dos países vizinhos se deslocasse a Aldeia Formosa para participar no seu funeral.
"Antero Santos, ex-furriel miliciano" (...)
4 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1815: Álbum das Glórias (14): o 4º Pelotão da CCAÇ 14 em Aldeia Formosa e em Cuntima (António Bartolomeu)

16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXVIII: Um conto de Natal (Artur Augusto Silva, 1962)

15 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LVII: O Cherno Rachid, de Aldeia Formosa (aliás, Quebo) (Luís Graça).
(...) "Tive hoje, aliás, a oportunidade de conhecer pessoalmente o Cherno Rachid e constatar o seu carisma e o poder de atracção que ele exerce sobre os africanos islamizados. Esteve vários dias em Bambadinca, de visita ao chão fula. Com avioneta ou helicóptero, às ordens, claro!
"Sentado numa esteira, de pernas trançadas, recebia nos seus aposentos privativos os fiéis que, descalços como na mesquita, o iam cumprimentar, trazendo-lhe presentes, sobretudo em dinheiro (às vezes mesmo somas importantes!) em troca duma oração, dum conselho ou dum objecto cabalístico" (...).

Sobre as possíveis ligações do Cherno Rachide ao PAIGC, vd. os postes de:

27 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3361: PAIGC - Docs (2): O grande marabu Cherno Rachide, de Aldeia Formosa: um agente duplo ? (Luís Graça)

28 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3374: Controvérsias (8): Cherno Rachide Djaló: um agente duplo ? ( José Teixeira / Manuel Amaro / Torcato Mendonça)
(***) A Região de Tombali fica situada no Sul da Guiné-Bissau, fazendo fronteira com as Regiões de Bafatá, Bolama/Bijagós, Gabú, e Quínara. Tem uma superfície de 3.736 Km2, e uma população de c. 90 mil habitantes. Os sectores que compõem a Região de Tombali são:
Bedanda; Catió; Komo; Quebo; Quitafine. (Fonte: PAIGC)

Guiné 63/74 - P3637: Em busca de... (58): 2.º Sargento Coelho da 1.ª CCAÇ Africanos (Farim) (António Paulo Bastos)

António Paulo Bastos

António Paulo Bastos


1. Mensagem de António Paulo Bastos (*), ex-1.º Cabo do Pel Caç 953, Teixeira Pinto e Farim, com data de 15 de Dezembro de 2008:

Amigos da Tabanca Grande,
Já que se está em maré de pedidos aqui vai mais um.

Caro amigo, eu, ex-1.º Cabo do Pelotão Caçadores Independente 953, António Paulo Bastos, quando da minha estadia em Canjambari passou por lá nos meses de Abril e Maio 1965, um 2.º Sargento que nós conhecíamos só por Coelho. Pertencia à 1.ª Companhia de Caçadores Africanos sediada em Farim, sei que esse companheiro era da zona do Porto. Veio de licença a Portugal no mesmo vôo que eu, em Agosto de 1965, e também sei que em 1967 esteve no Depósito Geral de Adidos, em Belém, a fazer o espólio aos companheiros que desembarcavam.

Já fui para os Arquivos do Exército ver se encontrava alguma pista, mas como não sei o nome completo, é dificil.

Será que há algum companheiro que me possa ajudar?

Mais uma vez o meu muito obrigado, e um bom Natal.

António Paulo Bastos
Ex-1.º Cabo
Pel Caç 953

2. Comentário de CV:

Esperamos caro Paulo que encontres, não só o 2.º Sargento Coelho, mas também mais algum dos teus camaradas de Pelotão. Aqui ficam as tuas fotos na expectativa de que alguém te reconheça.
____________________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de > 14 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3621: Em busca de... (57): Ex-combatentes do BCaç 2928 (Bula...1970/72) (António Matos)

(*) Vd. poste de 12 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3610: Tabanca Grande (104): António Paulo Bastos, Pel Caç 953 (Teixeira Pinto e Farim, 1964/66)