domingo, 13 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4947: Sons e emoções: o Cantanhez e o Dari, a terra ardente e vermelha, a gente boa (Torcato Mendonça / Zé Teixeira)

Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 31 de Dezembro de 2006 > Floresta do Cantanhez > "Um número cada vez maior de pessoas, entre nacionais e estrangeiros que vivem na Guiné-Bissau, têm começado a visitar mais assiduamente a Floresta de Cantanhez para apreciar a beleza única desta região onde para além de apreciarem e percorrerem a última floresta primária sub-húmida do país, podem visualizar animais selvagens como os búfalos, chimpanzés e diferentes tipos de macacos como os fatangos e babuínos. O povo acolhedor e o surgimento gradual de infraestruturas de acolhimento são um argumento muito forte para vencer os 270 Km de estrada, com alguns troços em muito mau estado de conservação. A existência de guias ecoturísticos formados permitem escolher vários itinerários e percursos, uns mais ligados à natureza, outros à história, à cultura e até à pesquisa científica".

Foto e legenda: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2006) (com a devida vénia...)




1. Já aqui divulgámos, através do blogue (1) ou internamente através da nossa tertúlia, dois belíssimos trabalhos de reportagem feitas na Guiné-Bissau, pelo Carlos Vaz Marques, jornalista da TSF - Rádio Notícias:

Reportagem TSF > Dari, primata como nós
(43 m) (2 de Março de 2007, 19h) >

No sul da Guiné-Bissau, o chimpanzé tem nome de gente. Na pista de Dari, uma equipa de cientistas portugueses estuda, há cinco anos, os chimpanzés das matas de Cantanhez com o objectivo de ajudar a salvar uma espécie ameaçada.

Um jornalista da TSF passou 15 dias com o grupo de investigadores, coordenado pelas primatólogas Catarina Casanova e Cláudia Sousa. Acompanhou o quotidiano das caminhadas pelo mato, da recolha de vestígios, das conversas com os habitantes das tabancas e testemunhou, guardando o registo sonoro do momento raro, o encontro com um grupo de chimpanzés.

'Dari, Primata como Nós' é uma grande reportagem de Carlos Vaz Marques com montagem e sonorização de Alexandrina Guerreiro.

Reportagem TSF > A Guerra do Patacom (33 m) (9 de Março de 2007, 19h) >

«A malta fica sempre a chorar, por causa da falta do patacom» desabafa o mecânico de bicicletas Ansumane no principal mercado de Bissau, que às vezes parece um enorme balneário da selecção portuguesa de futebol. De facto, neste que é um dos cinco países mais pobres do mundo, falta dinheiro para quase tudo.

Na escola primária de Iemberem, a 250 quilómetros da capital da Guiné, só não há falta de alunos, verifica o repórter, gravando o método da cantilena. «As duas coisas que mais matam são a malária e a ignorância» dirá Sílvia, uma missionária brasileira nesta zona remota. Eis a Guiné-Bissau, país entalado entre as bombas, por explodir, da guerra colonial e uma liberdade armadilhada de carências.

A 'Guerra do Patacom' é uma grande reportagem de Carlos Vaz Marques com montagem e sonorização de Alexandrina Guerreiro.


2. vejamos agora a reacção de dois membros da nossa tertúlia, ex-combatentes, Torcato Mendonça e José Teixeira:

(i) Torcato Mendonça (Fundão... e Fá, Mansambo, Candamã...):

Meu Caro:

Foi bonita a festa, pá!... Emociona, tantos anos depois, ouvir os sons da mata, das gentes e saber, sentir, que é de lá. É, Luís Graça, é o som do levantar da madrugada, o chilrear dos pássaros, o despertar daquela terra – vermelha e ardente – com a humidade a subir, os verdes tão diferenciados e lindos da mata. Paramos no tempo, latejam docemente as fontes, semicerram os olhos afastando-se do presente… buscamos e sentimos, leve, levemente o passado.

Encontramo-lo nos sons da busca ao Dari (desconhecia o nome), na reportagem da TSF (a rádio persegue-me desde miúdo), na voz que desconhecia do Leopoldo Amado (2), na fala de outras gentes e na doce cantilena das crianças. Candamã, não, isso diluiu-se no tempo. Tudo connosco mexe, tudo recorda algo de uma parte do meu passado.

Nem tudo é festa, pá, nem tudo é festa. Devagar, com dirigentes empenhados, projectos como a AD, Guiledje e outros, com gente determinada será festa, pá… Será no futuro festa. Acredito e, como eu, muitos.

Confesso que vivi, não tenho pejo em dizê-lo, momentos de emoção. Problema meu. Inquietação minha. Não dá, meu amigo, não dá, parece estar obcecado e isso não dá. Façamos (ou entremos em) período sabático. Serei capaz? Claro que sou. Valerá a pena? Não sei… tentemos…
Até… Um abraço, Torcato Mendonça.

(ii) José Teixeira (Matosinhos e... Empada, Buba, Mampatá, Quebo...):

Pois é Amigo e camarada Torcato. Agora imagina-te a (re)viver ao vivo esta situação que a TSF nos fez chegar. Imagina-te a sentires uma voz atrás de ti e te dizer:
- Tixera, (Teixeira) tu não lembra di mim ? eu vai na fermaria contigo Passa muito tempo... Eu sou o Kebá fermero.

Como reagirias logo no segundo dia de regresso à Guiné ! Imagina entrares na tua caserna e veres nela uma escola e as crianças saltarem de imediato das carteiras e virem fazer-te uma festa e pedir tira postal(fotografia) pra mim ou agarrarem a tua mão e muito admiradas compararem com a delas.

Imagina-te a ouvires uma voz feminina e a participares neste diálogo:
- Tixera, tu lembra Aliu de Mampatá ?
- Sim era o Alfero di milicia e chefe de tabanca.
- Tu lembra Usemane da milicia fidjo, de Shambel chefe de tabanca de Contabane ?
- Sim, mas Contabane foi queimada e Shambel firma em Aldeia Formosa.
- Shambel moreu, mas Usemane é minha marido. Tu lembra fidja de Aliu ?
- Oh ! bajuda bonito ! (E que bonita que ela era em bajuda)
- Odja (olha) para mim ! . . .
- Tu!!!! Dadá ?
- Sim, eu memo ! (Um abraço apertado e longo, lágrimas nos olhos que encerra um misto de alegria e "sôdade" e felicidade )
- Olha minha filhos, minha netos !

Foi vestir o mais lindo vestido, por creme na cara e ronco no peito, chama toda a família e . . . houve festa.
- Mudjer di Shambel stá lá. - E apresenta-me uma velhinha corcunda, cabelo todo branco, de pele enrugada como nunca vi, a qual se abraça a mim e começa uma cantilena:
- Branco i na volta ! branco i na volta ! - om lágrimas a banharem-lhe o rosto. Por mais que eu lhe dissesse que agora só para matar sôdade, ela continuava Branco i na volta !

Tudo isto passados eram trinta e cinco anos após o meu regresso. Tudo isto e muito mais, muito daquilo que ouviste neste excerto radiofónico, eu já revivi. Desde os pássaros, que nos acordavam ou o ruído do macaco-cão que nos alertava para o perigo, a alegria das crianças, a alegria dos adultos que passaram pela guerra, do nosso lado a reviveram cenas de guerra em que ambos participamos e mesmo alguns que a fizeram do outro lado.

Viviam a dois a três quilómetros escondidos no mato. A bolanha onde fui baptizado no fogo. As tabancas onde vivi belos e grandes momentos e . . . momentos aflitivos onde não cabia um feijão no buraquinho.O buraco feito por uma granada de canhão na parede da caserna,(hoje transformada em escola) donde tinha fugido uns segundos antes, isto às cinco da manhã, quando eles resolveram substituir o Cabo de dia ( noite) que nos iria acordar meia hora depois para partirmos para mais uma viagem de montagem da segurança na estrada em construção....

... A bolanha dos Passarinhos, onde vi a morte à minha frente e lhe preguei uma finta ao saltar abaixo da viatura, momentos antes desta pisar uma A/C. O Rio Grande de Buba com toda a beleza das suas margens - vegetação, passarada, tapetes coloridos de caranguejos a esconderem-se no tarrafo com a nossa chegada - (Hoje, infelizmente, transformadas em campos de caju) de onde fui corrido uma vez, quando após o regresso de uma operação me fui banhar e eles estavam na outra margem à minha espera, para fazer a festa e me obrigarem a regressar nú ao quartel a 100 metros.

Peregrinei pelos locais onde vivi a minha guerra com a colaboração activa dos soldados do PAIGC a quem chamávamos Turras. Os ataques na estrada, as emboscadas em que participei. Os locais de onde fui corrido a tiro. Revi e revivi cenas que estavam fixas no sotão da minha memória e me faziam sofrer, desde as tabancas cercadas com duas fiadas de arame farpado e as minas e armadilhas que as envolviam as quais, obrigavam as crianças a não sair do perímetro da aldeia para não serem surpreendidas...

Os companheiros (milicias) de armas que nos reconhecem e começam de imediato a contar o rosário de aventuras que viverem connosco no tempo di guera. Recordam-nos camaradas que fugiram com medo, camaradas que foram assassinados pelos libertadores, outros que estão vivos lá na tabanca di . . . Alguns que se recusam a falar. As bajudas do nosso tempo, as nossas lavanderas de mama firme, hoje mudjer grandi com fidjos machos e filhas, netos que nos apresentam com alegria e orgulho. As bajudas de hoje tímidas a uma certa distância ou alegres a virem-nos cumprimentar. As cantilenas das crianças ritmadas pelas palmas ou pelo pilão a bater no arroz para o descasque.

Tudo isto e o que profundamente sentido não consigo descrever, provocou dentro de mim uma descarga emocional e libertadora Por isso te desafio, a ti e a cada um de nós, que ganhe coragem e volte lá. Cuidado. Primeiro vacina-te, senão podes ao regressar, ficar como eu (ou como o Xico Allen que em média vai lá duas vezes por ano e se fosse rico . . .) - apaixonado pela Guiné,

Um abraço fraternal

J. Teixeira
Esquilo Sorridente

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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 8 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1575: A TSF no Cantanhez, com uma equipa de cientistas portugueses, em busca do Dari, o chimpanzé (Luís Graça / José Martins)

(2) O Leopoldo Amado, membro da nossa tertúlia, é historiador e está neste momento a colaborar com o Pepito, com a AD, no projecto Guileje. Ouçam a sua entrevista ao Carlos Vaz Marques, dada no sul, no Cantanhez, em Iemberém, e onde ele fala da necessidade do povo da Guiné-Bissau voltar a ganhar a sua auto-estima, bem como da importância de preservar a memória da guerra colonial / guerra de libertação.

Daqui vai um abraço de todos nós, para ele, para o pepito e para os demais colaboradores da AD, incluindo o Domingos Fonseca (que é aqui entrevistado pela TSF). Ao todo, são 36 técnicos que na trabalham nesta ONG, liderada pelo Pepito.

Na Reportagem da TSF, a guerra continua presente através da memória das gentes do sul, do Tombali, mas também através das granadas (por exemplo, de RPG 2 e 7) abandonadas no Cantanhez, pelos guerrilheiros do PAIGC, no fimd a guerra, para não falar das bombas que não explodiram ou das missas a armadilhas... que não foram desmontadas - nossas e do PAIGC. Acidentes (mortais) com engenhos explosivos do tempo da guerra colonial / guerra de libertação (como gosta de dizer o Leopoldo Amado) continuam ainda hoje, infelizmente, a acontecer.
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Nota de C.V.:

Este poste foi originalmente publicado em 11 de Março de 2007, sob o número 1583, duplicado. Detectado o erro, fez-se uma reedição, com data de hoje.

Guiné 63/74 - P4946: Convívios (161): convívio da CCAÇ 2615, dia 12 de Setembro de 2009 em Fernão Ferro (Manuel Amaro)



1. O nosso Camarada Manuel Amaro foi Fur Mil Enf da CCAÇ 2615/BCAÇ 2892 que esteve em Nhacra, Aldeia Formosa e Nhala, nos anos de 1969 a 1971, e enviou-nos a seguinte mensagem em 12 de Setembro de 2009:


Camaradas,



Junto envio um texto e algumas fotos, sobre o convívio da minha CCAÇ 2615:

Realizou-se hoje, 12 de Setembro, no restaurante Flor da Mata, em Fernão Ferro, mais um convívio da CCAÇ 2615, comemorando o 38º aniversário da sua chegada a Lisboa, no regresso da comissão de serviço na Guiné.


A CCAÇ 2615 fazia parte do BCAÇ 2892, (TCOR Manuel Agostinho Ferreira, Major José Sampaio e Major Pezarat Correia) e chegou a Bissau em 28 de Outubro de 1969.

No regresso, embarcou em Bissau, 6 de Setembro de 1971.


O Comando e os Serviços do Batalhão estiveram sempre em Aldeia Formosa (actual Quebo).

A CCAÇ 2615 esteve em Nhacra, Aldeia Formosa e Nhala.












Foi seu Comandante o Cap Mil António Ramalho Pisco.

Mais uma vez se fez justiça ao lema da Companhia "POUCOS QUANTO FORTES".

O número de participantes vai reduzindo a cada ano, muito por culpa das vindimas, das festas de casamento e das férias no estrangeiro.


Pelo menos são essas as razões que os telemóveis nos fazem chegar.

Mas foi uma festa bonita, com cerca de uma centena de participantes, alegres e divertidos, embora com algumas saudades dos velhos tempos à mistura...

Como habitualmente foi guardado um minuto de silêncio, em memória dos quatro camaradas mortos em combate, bem como por todos aqueles têm “partido” ao longo destes 38 anos.

E no próximo ano lá estaremos, ali ou noutro lugar, porque somos...


"POUCOS QUANTO FORTES"

















Foto da esquerda: A equipa de saúde da CCAÇ 2615 - José Boita, Amadu Djaló Candé, Américo Vicente e Manuel Amaro. Foto da direita: Fur Mil Fernando Pereira, Cap Mil António Pisco e Soldado Nunes Pinto.

Um Abraço,
Manuel Amaro
Fur Mil Enf da CCAÇ 2615


Fotos: © Manuel Amaro (2009). Direitos reservados.
Emblema: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.

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Nota de MR:

Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4945: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (7): Recuperando bolanhas em Ingoré, região do Cacheu

Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Ingoré > Título da foto: Juntos para recuperar mais terrenos para arrozais. Foto da AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 9 de Agosto de 2009. Data da foto: 21 de Agosto de 2008. Palavras-chave: segurança alimentar.

Foto e legenda: Cortesia de © AD - Acção para o Desenvolvimento (2008)


"Em Ingoré, no estuário do rio Cacheu, as populações cooperam na construção de diques de terra para impedir a entrada de água salgada nos solos das bolanhas e assim aumentar a área para a produção de arroz.

"Prática com mais de 2.000 anos, os agricultores recuperam os solos salgados ao mar através de barragens e diques anti-sal, os quais são lessivados durante a época das chuvas e começados a cultivar lgo que a salinidade atinja valores comportáveis com as variedades tolerantes ao sal.

"Embora se esteja ainda no início da época das chuvas, este ano a campanha de produção de arroz de bolanha (75% da total) parece ameaçada com a chegada tardia das chuvas e da pouca quantidade que tem caído". (*)


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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 3 de Agosto de 2009 >Guiné 63/74 - P4772: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (6): Sinalização de sítios históricos no Parque Nacional do Cantanhez

Guiné 63/74 - P4944: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (5): As obras do nosso contentamento (Pepito)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Fotos da reconstrução da 'capela de Guiledje': a última (a primeira de cima) foi tirada em 31 de Maio de 2009; as restantes são recentíssimas (11 de Setembro último).

Fotos: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2009). Direitos reservados



1. Mensagem do nosso amigo Pepito, que regressou ao trabalho, à sua terra natal, depois do seu mês férias em Portugal (entretanto a 30 de Agosto ainda teve o grato de prazer de participar na inauguração da exposição Cristina's History, do fotógrafo Mikael Levin, sobre a saga da família Schwarz, a que ambos pertencem) (*).


Assunto - Capela de Guiledje (**)

Luís

Um breve notícia, pois estou a chegar do sul do país, especialmente para os "Amigos da Capela de Guiledje".

Seguem fotos para ilustrar o avanço das obras que não pararam apesar da chuva copiosa que tem estado a cair deste a segunda metade de Julho.

A foto 0 foi tirada a 31 de Maio de 2009. Todas as outras [1, 2, 3 e 4] foram a 11 de Setembro.

Vai um agradecimento muito especial para o amigo Camilo, maior promotor da reconstrução da capela.

Estamos a acelerar para a sua inauguração ser a 20 de Janeiro próximo.

Abraço a todos

pepito

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Notas de L.G.:


(*) Lisboa, Museu Colecção Berardo - Praça do Império - Centro Cultural de Belém

HORARIOS > De 30-08-2009 a 08-11-2009 > Segunda, terça, quarta, quinta, sábado e domingo das 10h00 às 19h00 (última admissão às 18h30); Sexta das 10h00 às 22h00 (última admissão às 21h30). ENTRADA LIVRE

Vd. poste de 26 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4863: Agenda cultural (24): A História de Cristina, por Mikael Levin, no CCB, de 31/8 a 8/11 (Carlos Schwarz, 'Pepito' / Luís Graça)


(**) Vd. postes anteriores da série Grupos dos Amigos da Capela de Guileje:

8 de Julho de 2009 >Guiné 63/74 - P4655: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (4): Mãos à obra, rapaziada ! (Patrício Ribeiro)

16 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4535: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (3): Já começámos a pôr a mão... na massa do Camilo, e a 20/1/2010 haverá ronco (Pepito)

16 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4534: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (2): António Camilo oferece 300 sacos de cimento e 150 litros de tinta

6 de Junho de 2009 > Guiné 64/74 - P4469: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (1): Já temos três: Patrício Ribeiro, António Cunha e Manuel Reis

Guiné 63/74 - P4943: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (1): O gasóleo do Amílcar e a emboscada de Sare Dicó

1. Mensagem, de ontem, dia 12, às 9h17, do nosso camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/65), o mais activo e produtivo dos nossos periquitos (*), grande contador de histórias (já lá vai dezena e meia) e autor do livro Golpes de mão's - Memórias de guerra.



Assunto - O gasóleo do Amilcar Ventura e a emboscada de Sare Dicó aos militares do 7 de espadas

Bom dia, Grande Luís:

Mais velho mas sem idade, estou agora a ganhar novas rotinas. Levanto-me, visto o meu fato de ginástica e antes de sair de casa venho até ao nosso blogue. Já lá fui hoje e verifico que está ao rubro, o que é fantástico.

1) P4939 de Vasco da Gama [Banalidades do Mondego, IV]


Grande senhor, este camarada de Coimbra. Não conhecia e já comentei a sua postagem onde, entre várias coisas, cumprimento e felicito os editores LG e MR. A história abana mesmo (**)... No que me diz respeita, e graças ao Vasco da Gama,deixou de me engasgar...

2) P4930: emboscada em Sare Dicó a militares do 7 de Espadas

Já recebi vários comentários e já soube notícias do meu colega e amigo do aerograma: o Carlos Cardoso Dias, da CCaç 674. Vivia em Cascais e faleceu em 2005. Vou tentar localizar a família para lhes oferecer o aerograma (que guardo há 43 anos) e algumas fotos que tenho com o Carlos. Foi um choque pois, à distância no tempo, guardamos sempre a imagem de um jovem robusto e cheio de saúde. É essa recordação que quero guardar dele.

3) O MR já tem mais uma história minha em que satirizo os nossos jogadores ' naturalizados' da Selecção Nacional, que não sabem cantar o Hino. Refiro depois outro Hino, cantado por ex-combatentes.

Vou prá rua...andar uma hora e desenferrujar a língua com vários amigos.Obviamente que lhes vou falar do blogue do 'nosso' Luís Graça e Camaradas da Guiné.

Bom fim de semana.

Um abraço do
JERO

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 14 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4686: Tabanca Grande (162): José Eduardo Oliveira, ex-Fur Mil, CCAÇ 675, Binta, 1965/66

(**) 11 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4936: O segredo de... (6): Amílcar Ventura: a bomba de gasóleo do PAIGC em Bajocunda...

Guiné 63/74 - P4942: Memória dos lugares (42): Arte & Engenho no Mato, 1968 (José Nunes)


1. O nosso Camarada José Nunes (José Silvério Correia Nunes), ex-1º Cabo no BENG 447 (Brá, 15JAN68 a 15JAN70), enviou-nos mais uma série de fotografias, em 10SET2009, sobre os excelentes trabalhos (emblemas e guiões das suas companhias e batalhões), que alguns artistas tão fielmente desenhavam em alvenaria e cimento, no ano de 1968:

Camaradas,

Hoje quero mostrar-vos algumas fotos, que muito estimo pessoalmente, reveladores da Arte e Engenho que muitos dos nossos Camaradas, foram capazes de construir em memória dos que pereceram.

Penso que deveríamos montar uma Galeria a evocar estes Artistas Anónimos, que muitas vezes, mesmo em condições adversas e poucos recursos, demonstraram e fizeram Arte nos matos e localidades da Guiné.

Seriam verdadeiros marcos de referência para as gerações vindouras.

CCAÇ 1497 - 1º Grupo de Combate, 1966/676 - Bissum/Naga

CCAÇ 1497 - 2º Grupo de Combate "Os Índios", 1966/676 - Bissum/Naga

CCAÇ 1497 - 3º Grupo de Combate "Os Águias", «Mais alto emais alto» 1966/676 - Bissum/Naga

CCAV 1747 - "Unos e firmes" «Pista Águias Negras» - Bissum/Naga

CCAÇ 556 - "Sem pavor" - Enxalé

Cordiais Saudações,
José Nunes
1º Cabo Mec Elect do BENG 447

Fotos: © José Nunes (2009). Direitos reservados.
Emblema: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de MR:

Vd. último poste da série em:


sábado, 12 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4941: Banco do Afecto contra a Solidão (4): Um grande capitão da Guiné - Eurico de Deus Corvacho - CART 1613, continua hospitalizado


Guiné > Guileje > CART 1613 (1967/68)> 1967 > Regresso ao quartel de uma operação, com o Capitão Corvalho à frente, seguido pelo Costa da Bazuca.
Foto: Zé Neto (2005). Direitos reservados.

Camaradas,

Em 23 Fevereiro 2006, foi publicado um poste da autoria do saudoso Zé Neto, com o título:

Guiné 63/74 - DLXXVI: O meu capitão, o capitão Corvacho da CART 1613 (1966/68) (Zé Neto)

Muito recentemente, mais precisamente em 6/08/2009, surgiu no citado poste a seguinte mensagem:

«Fui condutor do coronel Corvacho na 1ª comissão em Angola, na C.P.M 150. Era alferes e fui eu, com um outro soldado (hoje presidente da Câmara de Alenquer), que lhe oferecemos os galões de tenente, porque sabíamos que ia ser promovido no dia seguinte. Lidei com ele 27 meses e nunca mais irei esquecer estes fabulosos meses, que passei (foi um privilégio) com ele. Até à pouco tenho almoçado com ele regularmente, mas como o deixei de ver, fui a casa dele saber se estava melhor. Segundo me informou a Srª. sua esposa, meteu-o num Lar de Idosos, pois já não tinha paciência para lidar com ele, tal a dependência a que chegou aquele homem bom e humano. Bom não quero fazer mau juízo de ninguém, mas creio que a 1ª esposa, que bem conheci, não faria tal coisa. Com pena o deixei de ver, e até a ajudá-lo. Cheguei a ir ao Colégio Militar, aonde foi pagar uma viagem do filho mais novo.»

Três dias depois, em 9/08/2009, foi a vez da sua neta Catarina deixar também uma curta mensagem:

Em nome do meu Avô, que se encontra neste momento numa cama de um hospital a lutar contra a doença que tem (amarrado, pois a suposta família foi de férias), agradeço a homenagem.

Catarina Corvacho

Preocupado com um eventual agravamento do estado de saúde, deste nosso excelente Capitão da Guiné, que hoje é Coronel na situação de reforma e foi brigadeiro graduado em 1975, tendo estado à frente da região Militar do Norte, enviei um e-mail ao seu filho mais velho, em 9 de Setembro de 2009, nos seguintes termos:

Boa noite Exmo. Sr. Eurico C. Corvacho,

Quem se lhe dirige, por esta prática via, é Eduardo Magalhães Ribeiro, um colaborador do blogue de Luís Graça & Camaradas da Guiné, que foi furriel miliciano na Guiné, em 1974.

Acabei de saber agora, por uma mensagem deixada no blogue, por uma neta do nosso muito estimado por diversos dos seus bem comandados homens, que o nosso Brigadeiro Eurico de Deus Corvacho se encontra numa cama do hospital.

Será que o Senhor não nos podia fazer um ponto da situação do estado de saúde do seu querido pai, permitindo-nos a posterior "postagem" no blogue para informação e conhecimento de todos os interessados?

Desde já, em meu nome pessoal e de todos quantos se interessam de algum modo por este assunto, muito agradecido fico por todo e qualquer esclarecimento prestado.

Cordiais saudações e cumprimentos de,

Eduardo Ribeiro

No dia 10 de Setembro de 2009 recebi a resposta:

Bom dia Sr. Magalhães Ribeiro,

Tudo isto é uma história muito triste. Eu encontro-me em Luanda/Angola a trabalhar.

No decorrer da semana passada recebi um telefonema de um camarada do meu pai, Coronel Fonseca, que me conhece e o qual não vejo faz muitos anos. Foi portador da pior notícia, informando-me que o meu pai estava hospitalizado e bastante mal.

Fiquei preocupado e espantado pela forma como me chegou a notícia e porque razão estaria ele no Amadora/Sintra e não HMP.

Efectivamente tenho que dizer que não tenho as melhores relações com a minha madrasta, falamos o indispensável, no entanto, perante assunto desta gravidade, não havia razão para ela não entrar em contacto comigo ou com a minha mulher para informar, por um lado que ele estava num lar, por outro que tinha sido hospitalizado, facto que ela tem conhecimento.

Bem, de imediato coloquei-me em campo e fiquei chocado com o que encontrei.

Ele foi parar ao Amadora/Sintra por estar internado, desde data inserta, numa casa de saúde, em completo abandono.

A razão do internamento dele teve a haver com uma infecção pulmonar e, posteriormente, com uma infecção hospitalar. Continua a lutar contra a doença que o acompanha faz alguns anos e que é do vosso conhecimento.

Soube que está internado desde 13 de Agosto, sem qualquer visita ou acompanhamento de alguém. No hospital não sabiam sequer que se tratava de um Coronel do Exército. Pelo quadro de abandono, já estava envolvida uma assistente social.

Bem de imediato a minha mulher foi ao hospital, inteirou-se da situação, falou com os médicos e com a assistente social, explicando quem ele é, que tem família e as razões pela qual se tinha criado esta triste e desagradável situação.

Estamos neste momento a tratar da sua transferência para o HMP, que ainda não sei quando terá lugar, cancelando o processo de abandono com a assistente social, bem como recorrendo a apoio jurídico para o acompanhamento deste processo.

Voltando ao estado dele, encontra-se em recuperação das infecções aguardando resultados de novas análises. Está internado em regime de isolamento na medicina 1A, 6º. Piso do Amadora/Sintra e diariamente recebe visitas da nora e dos netos. É notória a alegria dele ao ver caras conhecidas e de pessoas que ama.

O comentário da minha filha mais velha, Catarina, foi um desabafo perante todo este cenário, em tempos enfiei aos meus filhos o endereço do vosso blogue para terem a noção da estripe que é feita o avó deles, um grande Homem.

Para qualquer informação adicional, não hesite em me contactar, e pode publicar o conteúdo do presente correio.

Do meu lado podem contar com informações sempre que houver algum desenrolar deste assunto.

Melhores cumprimento e grato pela vossa preocupação

Eurico C. Corvacho

Resta-me agradecer ao Sr. Eurico C. Corvacho, em meu nome pessoal e de todos os Homens que serviram sob as ordens do seu querido pai, e que dele guardam as melhores recordações, as boas notícias que nos foram prestadas, registando aqui o renovar dos sinceros desejos das melhoras do seu estado de saúde.

Com um abraço de,

Magalhães Ribeiro

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Notas de M.R.:

Vd. postes anteriores desta série em:

15 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3630: Banco do Afecto contra a Solidão (2): Ajuda ao João Santos, ex-combatente em Moçambique, que vive num contentor (Mário Fitas)

4 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3562: Banco do Afecto contra a Solidão (1): A última comissão do Coronel (Jorge Cabral)

Vd. outros postes sobre o Capitão Corvacho:

31 de Janeiro de 2008> Guiné 63/74 - P2493: Estórias de Guileje (6): Eurico de Deus Corvacho, meu capitão (Zé Neto † , CART 1613, 1966/68)

22 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1985: Prisioneiro do PAIGC: António da Silva Batista, ex-Sold At Inf, CCAÇ 3490 / BCAÇ 3872 (2) (Álvaro Basto / João e Paulo Santiago)

24 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXVIII: Corvacho, um homem com honra (João Tunes)

23 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXVII: Corvacho, um capitão de Abril (A.Marques Lopes)

23 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXVI: O meu capitão, o capitão Corvacho da CART 1613 (1966/68) (Zé Neto)

Guiné 63/74 - P4940: Filatelia(s) (1): Amílcar Cabral (1924-1973), "fundador da nacionalidade" (João Lourenço)

Guiné-Bissau > 4 selos, de 1, 2.5, 5 e 10 pesos, respectivamente, com a efígie de Amílcar Cabral (1924-1973), "Fundador da Nacionalidade", comemorativos da proclamação (unilateral) da independência, em 24 de Setembro de 1973.

1. Mensagem, de 4 de Julho de 2009, do nosso camarada João Lourenço, da Figueira da Foz
que foi Alf Mil, comandante do PINT (Pelotão de Intendência) 9288, Cufar, 1973/74) (*)

Assunto - Recordações da Guiné


Meu caro Luís Graça,

Encontrei, nos meus arquivos do tempo, esta recordação. Nem sei se, para além do valor sentimental, vale alguma coisa. Se entre os nossos bloguistas algum filantelista souber, que o diga... São, ao que julgo, a 1ª edição de selos da Republica da Guiné-Bissau e comprei-os lá.

Um Abraço
João Lourenço


2. Comentário de L.G.:

Meu caro João, obrigado pela tua lembrança. Em matéria de filatelia, a minha literacia é muito fraca, para dizer nula... Não sou coleccionador, mas reconheço que os selos têm (ou tinham), em muitos países (incluindo o nosso), um certo valor sentimental, estético, iconográfico, documental... Já aqui publicámos alguns selos, da época colonial... Vamos agora dar início a uma nova série, para publicar imagens digitalizadas de selos, tanto da época colonial (que circularam até Março de 1975), como da época posterior à independência. Que apareçam os filatelistas (há mais camaradas, como o Jorge Picado, o Beja Santos e a Henriques Cerqueira, a mandar-nos selos).
__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:

19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4377: Tabanca Grande (145): João Lourenço, ex-Alf Mil do PINT 9288 (Cufar, 1973/74)

20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4389: (Ex)citações (28): Ah! Grande Lourenço ou… confessando os nossos pecadilhos de Cufar 1973/74 (António Graça Abreu)

26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4415: (Ex)citações (29): A Guiné que todos temos um pouco na alma (João Lourenço)

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P4939: Banalidades do Mondego (Vasco da Gama) (V): A minha guerra foi outra, camarada Amílcar Ventura

1. Mensagem do nosso querio amigo e camarada Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Os Tigres de Cumbijã, Cumbijã, 1972/74, que regressa assim ao nosso convívio, depois de uma 'sabática terapêutica' (demasiado longa, porvetura, para aqueles que apreciam a alta qualidade literária e a inteligência emocional dos seus textos, aqui no blogue)...

Camaradas Editores, Camarada Editor Carlos Vinhal: Escrevi num ápice o texto que agora envio.Voltarei em breve.Saúde para todos e um abraço amigo do Vasco



BANALIDADES DA FOZ DO MONDEGO (Vasco da Gama) (V) > A MINHA GUERRA FOI OUTRA


Remetido há já algum tempo ao silêncio, por conselho de um editor sábio e amigo, perdendo a regularidade da leitura do nosso Blogue, dadas as férias no reino dos Algarves durante o mês de Agosto, coloquei agora em Setembro toda a minha disponibilidade de tempo a ler tudo o que havia deixado para trás, como o fazia quando era estudante e tinha os exames à porta, tentando recuperar dia e noite o tempo consumido nas jogatanas de lerpa, nas intermináveis discussões políticas, no acompanhamento constante do meu Glorioso S.L.B. aquando das suas deslocações ao norte, nos tempos em que, calmamente, se vestia a camisola vermelha, sem medo de qualquer enxovalho, estivesse na Póvoa, em Guimarães, em Braga, em Matosinhos ou mesmo na maravilhosa cidade do Porto, essa cidade invicta que me marcou para sempre e que ainda hoje adoro, com as suas gentes simpáticas, solidárias, genuínas e vernáculas.

Tal como nos finais da década de sessenta, quando estudante, era invadido por um nervoso miudinho pois eram tantos os assuntos e matérias a reter, que começava a estudar determinada cadeira já com o pensamento numa outra que se avizinhava, não conseguindo por vezes a concentração necessária para levar a bom porto toda a panóplia de teorias e teses e temas que me permitissem uma época de exames descansado, também agora em finais da primeira década do século XXI, tostado pelo sol quente do sul, regressado do enxameado Algarve, onde o nosso camarada da Guiné e do Blogue, António Manuel Conceição Santos me proporcionou uma caminhada maravilhosa pela Ria Formosa, já comecei a escrevinhar tanta coisa ao mesmo tempo com o mesmo nervosismo o mesmo frenesi e a mesma “desorganização” de há quarenta anos, que me obrigou a dizer de mim para mim, BASTA, começa e termina qualquer coisa!

Assim decidi, assim o faço neste momento, começando pela análise de um poste publicado pelo nosso camarada Amílcar Ventura com o nº 4936 (*), intitulado a bomba de gasóleo do P.A.I.G.C., com uma introdução do editor M.R.

Respeitador dos princípios que norteiam o nosso Blogue, coerente com a formação recebida ao longo da vida, incapaz de, penso eu, beliscar quem quer que seja, gostaria de tecer algumas considerações baseadas única e exclusivamente no exposto pelo nosso Camarada.

Camarada Amílcar Ventura,

A tua confissão que entendeste partilhar com todos os Combatentes da Guiné e que, estou por certo, terá aliviado a tua consciência, causou em mim um sentimento de tristeza e mal estar, pois relembrou-me de uma forma mais pungente e dolorosa as agruras que a minha Companhia de Cavalaria 8351 se viu obrigada a viver nos matos profundos do sul da Guiné no Cumbijã e Nhacobá, a escassos quilómetros de Guileje e cito Guileje, pois voltarei a esse assunto quando conseguir alinhar ideias.

Não tenho, era o que mais faltava!, capacidade para julgar quem quer que seja e sei bem que a as acções ficam com quem as pratica, mas nunca opinarei contra a minha consciência.

Há limites inultrapassáveis para qualquer cedência e colocarei sempre acima do interesse de pessoas ou de grupos a minha sinceridade, daí que gostaria de te dizer como combatente na Guine o seguinte:

Vivemos sempre no mato, sem qualquer população, sem nunca termos tido luz, vivendo em barracas de lona e construindo com as nossas mãos as casernas feitas com blocos que os meus Tigres amassavam com os pés, isto depois de regressarem das operações/patrulhamentos que DIARIAMENTE fazíamos fora do arame. Não tivemos depósito de géneros durante muitos meses, nem água nem pão quente. Fazíamos uma coluna diária a Aldeia Formosa para abastecimentos e também trazíamos bidões de gasóleo…

Tínhamos entre nós gajos de direita e de esquerda e do centro e de cima e de baixo e outros que não eram nada, mas nunca a porra da política nos separou. Os que defendiam o tal Portugal de Trás–Os-Montes a Timor, que não era o meu caso, eram irmãos dos que murmuravam contra a guerra colonial e que eram a favor da solução política para uma guerra estúpida. Sabes, tínhamos em comum as lágrimas que derramávamos pelos nossos camaradas mortos e feridos, pela impotência de não regressarmos todos juntos ao nosso e teu Portugal, estávamos irmanados nos embrulhanços que sofríamos e a nossa raiva, por que não dizê-lo?, ia toda no mesmo sentido – dirigia-se ao P.A.I.G.C.

Estranho, eventualmente por ignorância, que se fale no comentário introdutório ao teu texto em “intercâmbios” entre as N.T. e o P.A.I.G.C. de "prendinhas e cervejas colocadas na picada”. As prendinhas trocadas entre a Companhia de Cavalaria 8351 e o P.A.I.G.C., foram, que eu saiba, arraiais de fogachada, minas q.b. e manga de porrada. Talvez noutros sítios, noutras circunstâncias, com outros comandos. Nunca pertenci à psico.

Camarada, dizes e passo a citar “nunca pus em perigo de vida os meus camaradas mas que ao contrário salvei alguns por ter antecipado a informação que ia haver ataque”, fim de citação. Discordo frontalmente. Quem, como os Tigres do Cumbijã, e tantas outras Companhias apanharam na tarraqueta, sabem perfeitamente que os mísseis ou as morteiradas ou as canhoadas que nos caíam dentro do arame, não traziam olhinhos para se desviarem “da malta que estava avisada”.

Lá no meu mato profundo, interrogo-me como era possível um militar português sair do seu aquartelamento na companhia de um nativo, com uma viatura e duzentos litros de gasóleo. Que controlo era esse? Que sítio era esse? Que comando era esse? Não duvido do que dizes, mas estranho! A minha guerra, Camarada, a minha guerra teve outros contornos, a minha guerra foi outra.

Sabes, uma vez num ataque ao arame, sim num ataque ao arame, Camaradas meus dizem ter visto um cubano. Nesse dia, por motivos diferentes dos teus, também nós gostaríamos de ter conversado com ele e podes ter a certeza que não era para lhe dar gasóleo.

Quase quarenta anos volvidos ainda me emociono com a Guiné. Quem diria!!!

Tive apenas e só a vontade de dar a minha opinião relativamente a algo de totalmente novo para mim. Gostaria imenso, acredita, de contigo debater este assunto, quem sabe
se quando voltar à tua maravilhosa terra de Silves. Ouvir-te-ei mais detalhadamente e eu apresentar-te-ei outros argumentos que não cabem aqui.

Com a conversa todos aprendemos, mas, caro Camarada Amílcar Ventura, mesmo para alguém com a preparação ideológica que então terias, a tua atitude, sem qualquer espécie de julgamento, foi de uma INGENUIDADE muito grande.


Para todos os meus Camaradas um abraço amigo e sincero do,

Vasco A.R.da Gama

[Revisão / fixação de texto / bold, a vermelho: L.G.]

__________

Notas de L.G.:


(*) Vd. último poste desta série:

15 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4532: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (IV): Desertores

(**) Vd. poste de 11 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4936: O segredo de... (6): Amílcar Ventura: a bomba de gasóleo do PAIGC em Bajocunda...

Guiné 63/74 - P4938: Estórias cabralianas (54): O Alfero e as mezinhas (Jorge Cabral)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 1613 (1967/68) > Mãe fula com bebé ainda de leite . Foto do nosso saudoso Zé Neto (1929-2007)

Foto : © Zé Neto / AD - Acção para o Desenvolvimento. (2007). Direitos reservados.


1. Desde o ínício de Janeiro do ano da Graça de 2006, que o nosso Alfero nos vai deliciando periodicamente com as suas estórias cabralianas (estórias e não histórias, como ele faz questão de frisar contra os puristas da língua)... Como ele é um artesão da escrita, a sua produção é unitária, peça a peça... A produtividade é baixa, mas a qualidade é alta... Digamos que, com sorte, os nossos leitores têm o privilégio de saborear uma estória cabraliana por mês... Devagarinho, já ultrapassámos a meia centena... Hoje, para assinalar a rentrée bloguística, publica-se a nº 54... Obrigado, Alfero.


Mensagem do Jorge Cabral:

Caros amigos,

Aqui estou novamente a falar dos meus tempos da Guiné. Tempos que não foram nem os melhores, nem os piores da minha existência. Foram sim, diferentes. Como se naquele período, eu tivesse vivido numa galáxia distante, onde fui outro Jorge, se calhar mais real, se calhar mais autêntico… Claro que essa experiência me marcou e muitas vezes aquele Alfero regressa e faz das suas… como aliás o prova a história de hoje.

Abraços Grandes
Jorge Cabral


2. Estórias cabralianas (54) > O Alfero e as Mezinhas (*)
por Jorge Cabral


Nem um mês tinha de Guiné e já andava a experimentar todas as mezinhas recomendadas pelo Nanque (**). Bem, todas não. Nunca bebeu a primeira urina da manhã, remédio infalível para o estômago mas ainda no outro dia o receitou a uma distinta senhora, que calculem, se zangou com ele, por se pensar gozada.

Tomou porém todas as demais, desde afrodisíacos a um chá para a tristeza, que o deixou eufórico durante quase toda a comissão… Apesar de tantos tratamentos, a verdade é que o Alfero gozava de excelente saúde.

Apenas de vez em quando algumas dores de ouvido o acometiam, mas para estas, foi facilmente encontrado medicamento eficaz. Não à primeira com leite de cabra, mas à segunda com leite de mulher. Foi da Cumba Candé e pagou-lhe alguns pesos, o que motivou a vinda ao quartel de uma dúzia de mulheres, oferecendo os seus préstimos…

Mas o Alfero já estava curado… e para muitos anos, pois foi só há dois, que lhe voltaram a doer os ouvidos. Lembrou-se então da solução e, deparando na Almirante Reis com uma gorda mãe a amamentar o filho, nem hesitou, pediu-lhe um pouquinho de leite.

Pois não é que a mulher começou a gritar:
- Velho nojento! Depravado…

Claro que fugiu a sete pés… e nem tentou explicar. E explicar o quê? Solidariedade leiteira?

Jorge Cabral
3. Comentário de L.G.:

Meu caro Alfero: Desculpa a intromissão... e permite-me que cite um livro raro, de meados do Séc. XVIII, de que foi feita em 2005 um edição facsimilada e que eu tive o privilégio de prefaciar - Postilla Religiosa e Arte de Enfermeiros - para te confirmar que o teu Nanque, o teu terapeuta, estava perfeitamente actualizado, dominando os conhecimentos terapêuticos que existiam em Portugal, em... 1742 (data da edição do manual de formação dos nossos enfermeiros... militares, que na altura pertenciam à Ordem Hospitaleira de São João de Deus, tendo a sua sede no convento e hospital de Elvas).

Deixo-te aqui duas notas que são uma preciosidade (actualizei a ortografia portuguesa):


(...) "Tratado II. Arte de enfermeiros para assistir aos enfermos, com as advertências precisas para a aplicação dos remédios (p. 72)

(... ) Capítulo X. Dor de ouvidos com que se há-de acudir na ausência do Médico

"142. É mui singular remédio o mungir de uma mulher o leite do peito no mesmo ouvido do enfermo, pondo-lhe logo uma pelota de algodão em rama. Também é aprovado e pronto remédio o fumo de alfavaca-de-cobra deitando no ouvido três ou quatro gotas, e pondo-lhe a pelota de algodão" (p. 90).


Em matéria de leite e e suas virtudes terapêuticas, o tratado é peremptório:

(...) " 302. O melhor leite, e o mais proveitoso, é o de mulher; e se for preta, melhor; logo o de burras, depois deste o de cabras negras, ou ruivas, logo o de vacas, e o de ovelhas não havendo outro" (p.156).

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. as últimas cinco estórias:

28 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4750: Estórias cabralianas (53): A estranha doença do soldado Duá (Jorge Cabral)

(...) Quando uma noite, em Missirá [, o último destacamento de Bambadinca, a norte do Rio Geba, no Cuor,] o Alfero passava ronda, ficou estupefacto, ao constatar que todos os Soldados de Sentinela se encontravam acompanhados das respectivas Mulheres.- Mas que se passa? – indagou…- É por causa da doença! O Duá apanhou a doença do Victor!- Doença do Victor? (...)


22 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4723: Estórias cabralianas (52): Em 20 de Julho de 1969, também eu poisei na Lua... (Jorge Cabral)

(...) Na Guiné, há mês e meio, mas já em Fá, havia nessa tarde muito calor. O pessoal dormia e toda a gente procurara a aragem possível. Em silêncio, o Quartel repousava… Eu porém, em tronco nu, saíra, a caminho da fonte mais pequena. Resolvera isolar-me, para escrever, calculem, um poema… Lá chegado, ainda nem escolhera um poiso confortável, quando vejo surgir, não sei de onde, um vulto de mulher, apenas com uns panos, caindo da cintura. (...)



7 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4651. Estórias cabralianas (51): Alfero esfregador entre as balantas (Jorge Cabral)


(...) Tanto nas Tabancas Fulas como nas Mandingas, o Alfero actuava à vontade com as Bajudas, perante a complacência dos Homens e Mulheres Grandes… Aliás não ia além de um acariciar voluptuoso, acompanhado com promessas de encontros no Quartel. Na altura teria merecido o cognome de Apalpador. (...)

Em Novembro de 1969, visitou uma Tabanca Balanta, Bissaque [, a norte de Fá, ], e ficou deslumbrado com a beleza das Bajudas, designadamente peitoral…



3 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 – P4455: Estórias cabralianas (50): Alfero, de Lisboa p'ra mim um Fato de Abade (Jorge Cabral)


(...) - Meu Alferes! Meu Alferes! Já chegou o Senhor Abade! - O cozinheiro Teixeirinha, todo eufórico, gritava, à porta do meu abrigo.
- Abade - pensei comigo - , o Puím?

Magro, simples, humilde, o único Capelão que conheci na Guiné, viera de sintex e, antecipando-se, não esperara por ninguém, entrando no Quartel. Logo após o descanso, a missa foi celebrada, mesmo ao lado da Cantina, no local da Escola. Fiéis, sete, dois comungantes e o Padre, de paramentos verdes. (...)



12 de Maio de 2009> Guiné 63/74 - P4326: Estórias cabralianas (49): Cariño mio... Muy cerca de ti, el ultimo subteniente romántico (Jorge Cabral)

(...) Dois dias depois de chegado a Bambadinca em meados de Junho de 69, fui mandado montar segurança no Mato Cão. Periquitíssimo, cumpri todas as regras, vigiando a mata de costas para o rio, sem sequer reparar na beleza da paisagem.Mal sabia então, que ali havia de voltar dezenas de vezes, durante o ano que passei em Missirá. Pelo menos uma ida por semana para ver passar o Barco, no que se transformou numa quase agradável rotina.(...)


(**) Vd. postes de:

10 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2426: Estórias cabralianas (32): Nanque, o investigador (Jorge Cabral)

(...) O Alferes era calmo. Afável, prazenteiro, nunca se irritava. Naquela tarde porém explodiu. É que constatou que as valas estavam a ser utilizadas como retretes.Reuniu o pessoal e, no mais puro vernáculo de caserna, descompôs o Pelotão, furriéis, cabos, soldados, brancos e negros… Que vergonha! Pois não haviam assistido à valente piçada que ele sofrera, na semana passada, quando o Major Eléctrico (2), visitara o Quartel, e criticara tudo, desde a limpeza das panelas ao comprimento do seu bigode!? (...)


3 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P836: Estórias cabralianas (10): O soldado Nanque, meu assessor feiticeiro

(...) Desde que cheguei, e durante o primeiro ano, o Pel Caç Nat 63, foi pluriétnico. Mandingas, Fulas, Balantas, Manjacos, Bigajós, estavam representados. Pluriétnico e plurirreligioso, com um Manjaco, Pastor Evangélico, um Marabú Mandinga Senegalês, vários adoradores de muitos Irãs, e até alguns crentes na Senhora de Fátima, vivendo todos em Paz ecuménica, sob a batuta do Alferes agnóstico com tendências panteístas, que pensava que nada o podia surpreender (...).