Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça, com o objetivo de ajudar os antigos combatentes a reconstituir o puzzle da memória da guerra da Guiné (1961/74). Iniciado em 23 Abr 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência desta guerra. Como camaradas que fomos, tratamo-nos por tu, e gostamos de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
terça-feira, 30 de março de 2010
Guiné 63/74 - P6067: As tropas Pára-quedistas preparavam-se para a guerra como para uma cerimónia em Parada (José da Câmara/Hoss)
Os pára-quedistas, com as suas G3 de coronha rebatível, impressionavam pela forma como fardavam e pela disciplina, ao ponto de, ainda hoje, estar sem saber se eles se preparavam para a guerra ou para uma cerimónia em parada.
2. O nosso camarada Sílvio Abrantes (Hoss), ex-Soldado Pára-quedistado BCP 12, Guiné, 1970/1971, reagia assim num comentário feito no referido poste:
Se me permitem vou fazer uma pequena correcção ao que escreveu o Ex-Furriel José Câmara da companhia de CCAÇ 3327.
No seu comentário o Srº José Câmara diz que nos Pára-quedistas não havia açorianos. Como Pára-quedista que fui posso dizer que havia açorianos, não eram muitos, mas havia.
Mais à frente no mesmo texto o Srº José Câmara escreve "OS PÁRA-QUEDISTAS COM AS SUAS G3 DE CORONHA RABATIVEL IMPRESSIONAVAM PELA FORMA COMO FARDAVAM E PELA DISCIPLINA AO PONTO DE AINDA HOJE ESTAR SEM SABER SE ELES SE PREPARAVAM PARA A GUERRA OU PARA UMA CERIMONIA EM PARADA"
É verdade Srº José Câmara e isso deve-se à disciplina rígida, dura que nós tinha-mos. Não era exibicionismo. Posso dizer-lhe que tenho lido muito sobre a guerra ultramarina de diversos autores e alguns dizem que a certa altura as nossas tropas estavam desmoralizadas e não obedeciam aos seus superiores, os únicos que obedeciam eram os Pára-quedistas. Aqui já pode ver como nós obedecíamos aos nossos superiores, isso deve-se à disciplina e à forma como fomos treinados. Quando andávamos na instrução, que não era nada fácil, em especial o curso de pára-quedismo e nos queixávamos aos nossos instrutores, a resposta era INSTRUÇÃO DURA, COMBATE FÁCIL. Era este o lema e a isso se deve o nosso êxito nos confrontos com o IN.
Nós não éramos melhores do que A ou B éramos assim, foi para ser assim que nos treinaram. Ainda hoje os Pára-quedistas são uma grande família e aproveito para convidar o Srº José Câmara para ir no dia 23 de Maio a Tancos ao Ex-Regimento de Caçadores Pára-quedistas e ver as centenas de ex-páras que lá se juntam para confraternizar e matar saudades de outros tempos. Pode almoçar na messe que não paga nada ou pode optar por se juntar a qualquer grupo de Pára-quedistas e almoçar com eles que será bem vindo.
Não sei se lá vou no dia 23 de Maio, tudo depende do meu trabalho se estiver disponível vou e aproveitava conhecer o Srº José Câmara pessoalmente.
Um abraço,
HOSS01010101
3. No dia 26 de Março, José da Câmara em comentário no mesmo poste reagia assim:
Camaradas,
Agradeço-vos os comentários. A minha memória é como uma manta de retalhos. O Esteves lá vai conseguindo "cozer" umas coisinhas. Afinal era a especialidade dele.
O Amigo Vinhal, sempre atento, conseguiu mais uma terraplanagem, onde todos podemos saltar em paz e harmonia.
HOSS,
Li, com agrado, o cometário que escreveu ao meu último Post. A forma como fala da sua dama, só confirma aquilo que há muito tempo eu sabia: o espírito de corpo entre os pára-quedistas, sem ser melhor ou pior que o de outras forças, era e é diferente e perdura para além do tempo normal de serviço.
Honra vos seja feita, e a todas aquelas forças que conseguem ser diferentes pela positiva.
Ontem, 19 de Março, e ainda antes de ler o seu comentário, em conversa com o Jorge Sousa, ex-fuzileiro do Destacamento 13, ele disse-me que a Companhia de Pára-quedistas que estava em Teixeira Pinto, e que o meu texto refere, tinha açorianos. Entretanto esqueceu os seus nomes.
No meu texto estava apenas a referir-me àquela Companhia. O Jorge disse-me que os Pára-quedistas quando entravam em serviço, esqueciam-se de tudo à sua volta, para se concentrarem na sua missão. Por estas palavras compreendi porque é que não descobrimos açorianos naquela Companhia. Aquela Companhia chegava junto do nosso acampamento, e de imediato entrava na mata. Nunca parava para conversarem connosco. Daí o meu lapso.
O Capitão Cordeiro, irmão do nosso camarada Carlos Cordeiro, foi certamente um dos açorianos que terá ido mais longe na hierarquia dos Pára-quedistas. Ele, ao honrar a Arma que abraçou, também honrou a região que o viu nascer. Certamente houve outros açorianos que, igualmente, se distinguiram ao serviço daquela arma e da Pátria.
E já agora confirma que era a 122 que estava em Teixeira Pinto (Abril, Maio, Junho, Julho de 1971)?
O Hoss pertenceu a essa companhia?
Senti no seu comentário um pouco de mágoa pela forma como eu observei os Pára-quedistas na Mata dos Madeiros. Se o magoei peço-lhe desculpa. A minha intenção foi boa.
Eu reconheço que podia ter ido um pouco mais longe, e ter sido mais incisivo.
Farda completa, boina verde, lenço no pescoço, botas a luzir... os Pára-quedistas eram um espectáculo no meio daquela miséria toda, que era a Mata dos Madeiros. Daí a minha observação (que teria sido melhor assim): os Pára-quedistas íam para a guerra com o mesmo cuidado e disciplina com que se preparavam para uma cerimónia em parada.
Mas a melhor homenagem que eu poderia ter feito aos Pára-quedistas, e a todas as forças que se afirmavam pelo mesmo diapasão, é aquele parágrafo onde afirmo, e que passou a ser o lema de toda a minha actividade na Guiné, o seguinte:
"...a sobrevivência, seria tanto maior quanto maior fosse o grau de disciplina baseada no respeito, na lealdade, na camaradagem e na amizade entre todos nós. O reconhecimento colectivo dos poderes de cada um desses predicados não era mais que o perfeito reconhecimento consciente entre comandos e comandados."
Quanto ao seu convite, para estar presente em Tancos, pode ter a certeza que o aceitaria com muito gosto, não fora o facto de viver nos Estados Unidos da América desde 1973. Por esse mesmo facto também lhe peço que compreenda que, aqui e ali, falho no que escrevo. Quero-lhe assegurar que os meus erros acontecem porque não sei fazer melhor, nunca por maldade ou por desrespeito para com os camaradas ou para as forças que combateram na Guiné, quiçá nas ex-províncias ultramarinas.
No entanto fica marcado o encontro para um dia, se Deus quizer. Terei imenso prazer em dar-lhe um abraço.
Muitos anos depois da guerra terminar, fui encontrando os meus camaradas de Secção. Todos eles me trataram por Sr. ou por Furriel. Pedi-lhes que me tratassem pelo meu nome: José!
Hoje peço ao Hoss que faça o mesmo, e me trate por José. Eu acredito que o respeito passa pela forma como sentimos os outros.
O Hoss, com o seu comentário, conquistou um admirador e o meu respeito.
Como dizíamos nos Açores: haja saúde (para si e para os seus entes queridos).
Um abraço amigo,
José Câmara
4. No dia 26 de Março, José da Câmara dava-nos a conhecer uma mensagem que tinha recebido do camarada Hoss, que com a sua autorização tornamos pública.
Caro amigo José Câmara:
As suas palavras são para mim de grande apreço, fico desde já muito obrigado. Vamos voltar aos tempos áureos da nossa juventude que nos foi arrebatada por aquela maldita guerra, que por culpa de alguém nós tivemos de enfrentar e que ainda hoje faz sofrer muitos dos nossos camaradas.
Nos Pára-quedistas havia uma disciplina muito rígida, dura mesmo. Os nossos quartéis eram verdadeiros jardins. Fomos treinados duramente e sempre nos incutiram o espírito de camaradagem que ainda hoje, passados tantos anos predura.
Quando por vezes nos queixávamos aos nossos chefes da instrução tão dura a resposta era (instrução dura combate fácil), mais tarde verificámos que tinham razão.
Em 2006 comemorou-se o cinquentenário das tropas Pára-quedistas.
Juntaram-se centenas de ex-páras. Veio dos U.S.A., de Jersey, um grupo de ex-páras exclusivamente para assistir aos 50 anos, onde encontrei o meu grande amigo António Ribeiro, residente em Jersey. Desculpe se eu escrevo mal a palavra Jersey.
Nas cerimónias estava presente o Comandante Chefe das Forças Armadas General, do qual não me lembro o nome e diz para o Brigadeiro Pára Taliscas:
- É impressionante como se juntou tanto Pára-quedista. Diz o Taliscas: - Não se esqueça meu General, que no 11 de Março os Pára-quedistas foram mobilizados em 24 horas para fazer o golpe. Eu dou três semanas de instrução a esta gente e à quarta estão no ar, quer dizer a saltar.
Isto retrata a obediência que nós temos ainda hoje aos nossos chefes.
Tínhamos um lema que dizia (ninguém fica para trás). Ficaram três colegas sepultados no mato em Binta na Guiné, que devido ao forte ataque não foi possível evacuar, mas já se encontram sepultados nas suas terras desde o ano passado, devido à grande pressão feita por um colega que foi à Guiné fazer uma reportagem com a cadeia de televisão SIC e pagou as despesas de bolso dele.
Segundo informações que tenho, não há um Pára-quedista sepultado no ultramar. O meu amigo pode pensar que é balela, mas não é, é a realidade. Quando nós formávamos fosse para que fosse, as nossas botas eram sempre engraxadas, camuflado lavado e barba desfeita. Ainda hoje a primeira coisa que faço quando me levanto é desfazer a barba, está gravado a fogo no meu cérebro.
No quartel e junto aos nossos chefes éramos disciplinados, mas quando nos apanhávamos livres era um pandemónio. A PM em Bissau sofreu muito connosco, em especial comigo e com o meu amigo Jaime o "80", fazíamos-lhes as maiores patifarias.
Quanto aos açorianos tenho grandes amigos por lá, só que é difícil encontrarmo-nos.
Gostaria de estar com o meu amigo no dia 23 em Tancos, mas como posso constatar não é possível. Também ainda não sei se posso ir.
Não vou fazer perder mais tempo, espero que esteja de boa saúde, assim como os seus mais queridos.
Um abraço,
Hoss
5. Comentário de CV
Aqui fica registada uma troca de impressões entre dois camaradas. Muitos dos tertulianos poderão achar não muito interessantes, mas mostram que com cordialidade se desfazem alguns malentendidos.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 3 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5754: (Ex) citações (52): Falando de descolonização com Filomena Sampaio (José Brás)
Guiné 63/74 - P6066: Parabéns a você (94): Benjamim Durães, ex-Fur Mil Op Esp e Rec Info, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72 (Os editores)
“Luís: Com um abraço forte. Conforme a tua solicitação, em anexo seguem duas fotos minhas tiradas em Bambadinca, além de uma actual, para acompanhar a actualização dos meus dados na página da nossa tertúlia, e que são os seguintes:
Nome - Benjamim Silva Durães
Posto - Furriel miliciano
Especialidade - Reconhecimento e Informação e Operações Especiais
Unidade - CCS do BART 2917
Local - Bambadinca (Zona Leste / Sector l1)
Tempo de comissão - Maio de 1970 / Março de 1972”.
2. Para melhor tentarmos avaliar o perfil do Durães, fomos mais uma vez consultar o seu signo de zodíaco que é “Carneiro, para nativos entre 21/03 e 20/04”, num site que se tem vindo a tornar muito popular nesta matéria e ao qual se tem acesso atarvés do endereço: KAZULO (http://horoscopo.kazulo.pt/4866/signos-do-zodiaco.htm).
Com os nativos de Carneiro e os que o têm com ascendente, a primeira impressão é a de uma pessoa egocêntrica e de um signo independente, assertivo e impulsivo. Os Carneiros não perdem tempo e quando tomam uma decisão, agem sobre ela de forma habitualmente rápida.
São energéticos e excelentes lideres mas nem sempre o melhor «seguidor». São óptimos a iniciar as coisas mas deixam-nas frequentemente para um dos signos fixos acabar. Altamente competitivos, gostam de se colocar à prova constantemente.
Apesar de governados por Marte e bastante temperamentais, a fúria é passageira e são em regra acolhedores e inspiradores. Apresentam qualidades como a coragem e lealdade mas também a impaciência e têm um forte sentido de individualidade.
Atraem e realçam estas qualidades também nos outros e o dia de um nativo de Carneiro começa normalmente com um entusiástico estrondo. Aparentam uma certa ingenuidade, por confiarem e acreditarem que os outros são tão directos e honestos como eles. Marte na primeira casa astrológica influência a personalidade de forma similar.
A frase chave para nativos de Carneiro é «eu sou». Com ascendente de Carneiro, as atracções viram-se para Balanças, governado na sétima casa, a dos parceiros.
Carneiro é um dos quatro signos Cardeais, por estar ligado à mudança de estação e do solstício, tendo como elemento o Fogo.
Anjo: O Arcanjo Cassiel é o protector dos nativos do Signo Carneiro. Cassiel é chamado Anjo Guerreiro e aqueles que nascem sob a sua influência são pessoas criativas, destemidas e determinadas. Líderes natos, gostam de ocupar cargos de chefia e de desempenhar funções de elevada responsabilidade.
Possuidores de um carisma e encanto naturais, são amados por todos e até mesmo as suas atitudes irreflectidas são perdoadas e encaradas como uma encantadora particularidade da sua personalidade.
O Arcanjo Cassiel desenvolve a coragem e a imaginação. Ajuda a moderar a ambição, o espírito de competição e o egocentrismo.
NESTA DATA QUERIDA,
MUITAS FELICIDADES,
MUITOS ANOS DE VIDA.
HOJE É DIA DE FESTA,
CANTAM AS NOSSAS ALMAS PARA O AMIGO BENJAMINZINHO,
UMA SALVA DE PALMAS!
E mais acrescentamos:
O nosso maior desejo, neste teu aniversário, é que junto da tua querida família sejas muito feliz e que esta data se repita por muitos, bons e férteis anos, plenos de saúde, felicidade e alegria.
Estes são os mais sinceros e melhores desejos destes teus Amigos e Camaradas, que como tu, um dia, carregaram uma G3 por matas e bolanhas da Guiné.
Com montanhas de abraços fraternos
____________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
27 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6057: Parabéns a você (63): Os novos Notáveis do Reino, Sir Charles Vinhal & Sir Edward Mc Ribeiro, armados Cavaleiros da Tabanca Redonda (Mário Miguéis)
segunda-feira, 29 de março de 2010
Guiné 63/74 - P6065: Não-estórias de guerra (5): O Furriel Dog e o cão Furriel (Manuel Amaro)
Caros Editores,
Terminado o período de rigorosa invernia. Agora que regressaram os dias de sol, aqui vai mais uma Não-estória de guerra.
Um Abraço
Manuel Amaro
Não-estórias de guerra – 5
O Furriel “Dog” e o cão “furriel”
O Furriel Dog não se chamava Dog, mas sim Orlando Nunes.
Era Furriel Miliciano Atirador de Infantaria, da CCAÇ 2615. Aliás ele afirmava que os serviços de psicologia do Exército funcionavam na perfeição, pois com a formação obtida na escola comercial do Barreiro, ele só poderia ser atirador de infantaria.
O Dog fez quase toda a comissão com o braço esquerdo engessado, devido a uma fractura (ou luxação?) do escafoide. E aquele gesso, que lhe pesava e lhe reduzia o volume da massa muscular, também lhe era de uma grande utilidade, pois libertava-o da maior parte da actividade operacional.
No entanto, por mero acaso, não o libertou no dia 20 de Março de 1970, em que numa emboscada o seu grupo de combate teve um morto (milícia) e alguns feridos ligeiros.
Nesse dia o Dog disse ter descoberto que, debaixo de fogo, um simples pé de capim, parece ter a dimensão de um imbondeiro e a consistência de um baga-baga.
Mas, à conta do gesso no braço, ainda foi durante largos meses, delegado do Batalhão, em Bissau. E à noite, quase todas as noites, como bom conversador e contador de estórias, era um dos principais protagonistas da famosa 5.ª REP.
Um dia adoptou um cão. Um cão que de imediato baptizou de Furriel. E acertou na escolha do nome, porque agradou a toda a gente. Os furriéis não se incomodaram e chamar furriel a um cão, era um motivo de orgulho dos Primeiros Sargentos e até de alguns Praças.
O Furriel não era propriamente um cão artista, mas conseguia comer à mesa, na Messe de Sargentos e beber cerveja e whisky, este com muita água. E com estas qualidades, tinha algum protagonismo.
Além de ser amigo dos cães e de todos os animais, o Furriel Dog era um exímio cantor. Antes do serviço militar tinha feito parte de um conjunto de música de baile, onde se divertia e ainda conseguia arranjar algum dinheiro de bolso.
Mas era essencialmente um baladeiro.
E possuía uma sólida formação política, a maior parte feita na clandestinidade.
Cantava todo o reportório do Zeca Afonso, do Adriano e de outros cantores aventureiros dos anos sessenta.
Normalmente terminava as suas intervenções, cantado Catarina Eufémia… Por vezes, quase sempre, com as lágrimas a correrem-lhe pela face, o queixo a tremer, mas a voz não vacilava… “ quem viu morrer Catarina, não perdoa a quem matou….”
Um grupo de quatro ou cinco camaradas faziam coro.
Quando ele se entusiasmava e gritava “hip… hip… URSS”, uns acompanhavam-no, outros encolhiam-se.
Depois do regresso, o nosso grupo ainda fez umas noitadas nos restaurantes, bares e discotecas de Lisboa, mas a rotina, as exigências profissionais e também os divórcios, foram reduzindo os contactos.
Até que surgiu a fase da organização de convívios dos ex-combatentes.
E aí estávamos de novo juntos. Mais velhos, mais maduros, mas sempre com a boa disposição que nos levou a apelidar, quase em segredo, a CCAÇ 2615, a nossa Companhia, como a “Companhia de Circo”.
Creio que o último convívio em que participou, foi em 2000, em Campo Maior.
Pouco tempo depois, quando cuidava do pequeno barco de recreio que tinha ancorado no Tejo, o coração traiu-o. Não resistiu.
Nem imbondeiro, nem baga-baga, nem ao menos um simples pé de capim...
Hoje, a propósito de “qualquer coisa”, pareceu-me ouvir aquela frase, que lhe ouvi, tantas vezes, desde o RAL3, em Évora, até aos locais de convívio dos veteranos.
Fazia-se anunciar sempre com a frase “…Aqui o Dog chega sempre cedo”.
Não vai chegar mais... Porque já partiu.
E o Dog partiu cedo, muito cedo.
Manuel Amaro
O Furriel Dog dá de beber ao cão furriel
O cão furriel, à mesa...
Manuel Amaro e Orlando Nunes, a bordo do Uíge
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 14 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5462: Não-estórias de guerra (4): O Parto, essa grande (a)ventura (Manuel Amaro)
Guiné 63/74 - P6064: Notas de leitura (83): Livro do Cor. Costa Campos – Guiné, Bigene 1974 (Mário Fitas)
1. O nosso camarada Mário Fitas, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763, “Os Lassas”, Cufar, 1965/66, enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 27 de Março de 2010:
Camaradas,
Julgando de interesse para publicação no blogue, envio, em anexo, a recensão do livro "GUINÉ" que é uma raridade e me foi dado a ler pelo filho do autor - Cap. Luís Carlos da Costa Campos.
Antes do Cor. Costa Campos falecer, ainda vi o único exemplar que ele possuía. Entretanto surgiu esta oportunidade de o filho me o emprestar, e me permitir fazer o que achasse melhor. Só que são 230 páginas.
Ainda se está a pensar na edição, mas só a digitação de tudo isto é uma loucura. Tem de ser aos poucos. Vamos ver o que se consegue fazer, pois em termos históricos e conhecimentos sobre a Guiné é uma maravilha.
Se houver interesse, estou autorizado pelo Sr. Capitão, atrás referido, a digitar e enviar, para divulgação na íntegra, ou em capítulos, o livro de seu pai.
Costa Campos (Ten. Coronel)
G u i n é
Guiné Bigene
1974
(Dactilografado por João Neutel)
Eis a primeira página do livro que tenho em mãos.
Após uma citação de Eça de Queirós, sucedem-se nas folhas seguintes a dedicação e legado da obra, de que saliento: “Aos meus Pais que tanto deram e continuam a dar ao povo africano”. Só será possível chegar ao entendimento deste legado, aos que por qualquer forma chegaram ou tiveram acesso à obra da família Costa Campos em África.
Esta obra, que julgo ser uma grande perda não estar editada, dando assim a oportunidade de um conhecimento realístico do que era à altura denominada Província da Guiné e de júri reconhecida internacionalmente como parte integrante de Portugal, mas com a condicionante da sua emancipação como país independente, resultante dos fenómenos geopolíticos da altura, que não nos cabe aqui comentar.
Carlos Alberto W. M. da Costa Campos à altura tenente-coronel, comandante do COP3 em Bigene, oferece-nos as razões deste trabalho. Assumindo que ao longo de duas comissões na Guiné, embora houvesse algo escrito sobre esta terra, tudo se encontrava muito disperso em grande diversificação de publicações, se deparou com a falta de elementos que dessem uma ideia realista e concisa da terra e gentes da Guiné.
Referenciando essa lacuna, resolveu colmatá-la através de rigorosa investigação juntando em um só livro, o maior número possível de dados de tudo o que respeitasse quanto à história, geografia, economia e etnia, da Guiné. Tentando dar uma informação o quanto mais completa e fiável possível a todos que nesta terra desembarcassem.
Assim:
Após uma súmula, bastante interessante do passado e actual história da Guiné no primeiro capítulo. Somos confrontados com a sua descrição geográfica física, climática, fauna e flora, no segundo capítulo.
No terceiro capítulo, o coronel Costa Campos, faz uma abordagem muito interessante à economia da Província. Sendo de extraordinário relevo a descrição, da Estrutura Social na economia rural descrevendo numa linguagem muito agradável as actividades desenvolvidas na agricultura, pecuária e envolvimento das diversas etnias autóctones, nestas áreas. ~
Somos brindados no capítulo quarto com uma rica e valiosa descrição, do quadro humano, sobre a grande variedade étnica com multiplicidade de seus usos e costumes.
Seguindo a cronologia, no quinto capítulo é-nos oferecida uma abordagem teológica magnífica, sobre todas as religiões existentes, bem como a sua introdução, penetração e evolução nas diferentes etnias.
A Organização Política e Aadministrativa da Província é-nos facultada no sexto capítulo. Onde nos é dada a visão do funcionamento dessa organização desde os órgãos de Governo Próprio, aos Regulados e Congressos do Povo.
No sétimo capítulo é abordado o tema da Subversão na Guiné, com o historial dos Partidos emancipalistas até ao aparecimento da supremacia do PAIGC através do seu carismático líder Amílcar Cabral. Terminando este capitulo com uma síntese dos principais acontecimentos da subversão até àquela data.
O conhecimento do presente, (na altura) bem como as politicas em curso do Governo da Província. Participação da população, Forças Armadas e o fomento Socioeconómico e Cultural, assim como o tema Africanização dá corpo ao capítulo oitavo.
Esta obra termina com uma interessante descrição sobre as térmitas Baga-Baga, transcrição de um artigo de António Correia, no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa.
Após a leitura deste valioso documento, fica-nos a certeza que deveria o mesmo, ser editado e divulgado, pois nos parece de grande valia para conhecimento e análise da História da Guiné-Bissau.
Com as melhores saudações tabanqueiras,
Mário Fitas
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763
__________
Nota de M.R.:
Vd. último poste da série em:
26 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6052: Notas de leitura (82): Império, Nação, Revolução de Riccardo Marchi (Beja Santos)
Guiné 63/74 - P6063: Recortes de imprensa (23): O desastre do Cheche, no Rio Corubal: excertos de artigo de Teresa Firmino, Público, 6/12/2009
Imagem digitaliazada e legenda: Beja Santos (2008).
1. A tragédia de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 , foi evocada, de novo, na imprensa portuguesa, através de um trabalho de reportagem da jornalista Teresa Firmino, do jornal Público (*), que já em tempos nos tinha contactado, a nós, editores do blogue, por causa de uma foto da jangada da autoria do nosso camarada Paulo Raposo (**). Ela acompanhou, na Guiné-Bissau, os trabalhos da 4ª missão da Liga dos Combatentes, que teve por objectivo a localização e a exumação dos restos mortais de militares portugueses, espalhados por cemitérios de ocasião no sul. Desta vez, a equipa, chefiada pelo major-general Fernando Aguda, esteve em sítios como Bolama, Bedanda, Cacine, Catió, Fulacunda, Quebo e ilha das Galinhas. Em Cheche, na região de Gabu, nas margens do Rio Corubal, a equipa liderada pela antropóloga forense da Universidade de Coimbra, Eugénia Cunha, e com a colaboração do geofísico da Universidade de Aveiro, Hélder Hermosilha, terá localizado uma vala comum onde se supõe estarem os ossos de oito das 47 vítímas mortais do desastre do fatídico dia 6 de Fevereiro de 1969. Será o o próximo local de intervenção da missão (a 5ª) da Liga dos Combatentes... Nas missões anteriores, a Guidage, Farim e Gabú, foram levantados 55 corpos. (Vd. notícia constante da revista Combatente, nº350, Dezembro de 2009.
Neste artigo do Público, Teresa Firmino cita o nosso blogue, dizendo:
"O desastre de Cheche é hoje motivo de inúmeros relatos na Internet, nomeadamente no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Os antigos combatentes encontraram essa forma de fazer o luto colectivo da tragédia que viveram. Outros emocionam-se tanto que recusam falar disso".
2. Público 'on line' > 26.03.2010 > À procura dos militares afogados no rio Corubal
Por Teresa Firmino
[Texto originalmente publicado na edição do Público, de 6 de Dezembro de 2009. Reproduzimos aqui alguns excertos com a devida vénia...]
Durante horas a fio, as duas jangadas no rio Corubal fizeram vezes sem conta a travessia para a margem norte. A companhia de caçadores 1790 estava a abandonar o quartel de Madina do Boé, onde tinha sido constantemente flagelada pelo inimigo ao longo de 13 meses, e era apoiada por homens de outras companhias. (...)
Até ali, tudo tinha decorrido sem incidentes. Para trás, tinham ficado os 30 quilómetros entre Madina de Boé e Cheche, e o rio começou a ser transposto na margem sul ao fim da tarde de 5 de Fevereiro de 1969. Passaram toda a noite naquilo. Só podia seguir uma viatura pesada de cada vez. Eram 28, mais 100 toneladas de munições e equipamentos, três auto-metralhadoras Daimler e à volta de 500 militares, conta-nos o então capitão José Aparício, comandante da companhia 1790 em Madina do Boé.
Ao início da manhã de 6 de Fevereiro, só restava na margem sul um grupo de homens: dois pelotões da companhia 2405, outros dois daquela que estava em retirada. "Eram entre 100 a 120 pessoas", diz José Aparício.
Toda a gente entrou na última jangada, que assim levava o dobro da sua lotação de segurança. Era feita por um estrado de madeira, assente em canoas e bidões de gasóleo vazios, puxada por um barco com motor fora de borda. José Aparício ia naquele grupo de homens. O alferes miliciano Rui Felício (que comandava um pelotão da companhia 2405) também.
De repente, a jangada adornou para um lado, atirando vários homens à água. Depois, balançou para o outro e cuspiu outros tanto. Ficou meio submersa, mas não foi ao fundo. José Aparício conseguiu manter-se na embarcação. Rui Felício caiu no rio.
"Estava a ir ao fundo. Percebi - se calhar muitos não perceberam - que tinha muito peso. Atirei a espingarda fora, que pesava cinco ou seis quilos, e a cartucheira à cintura, com outros cinco ou seis quilos. Descalcei as botas e nadei para a jangada." Ouviam-se gritos? "Não, não ouvi ninguém a pedir socorro, a gritar. Nada."
(...) Paulo Lage Raposo, alferes miliciano da companhia 2405, atravessou o rio na viagem anterior. "Vimos que caíram uns para um lado e outros para o outro. Não houve gritos, nem esbracejares, nem coisa nenhuma. Carregados com as armas, as granadas, as botas, iam para o fundo como um prego." Muitos não sabiam nadar, o que agravou tudo. Mas naquele momento a dimensão do acidente passou despercebida.
"Só soube que tinha morrido gente - estou a arrepiar-me a contar isto - quando cheguei à margem e pedi a um furriel para formar o pelotão. Ao fim de dez minutos, fui ralhar com ele porque achava tempo demasiado para ainda faltar gente. Só percebi que se passava alguma coisa porque vi vários a chorar. Aí é que me apercebi que morreu gente. Do meu pelotão, foram 13", recorda Rui Felício.
"É uma coisa que marca para toda a vida. Tive coisas infelizes que já esqueci, mas esta não se esquece nunca. Lembro-me da data. Foi entre as nove as dez da manhã. Há pormenores que nunca mais saem da cabeça. Sei que estava um dia de sol."
(...) [47 é o número de mortos] referido, por exemplo, por José Aparício, tendo em conta os elementos que recolheu: "Morreram no desastre 25 militares da minha companhia e 22 da companhia de caçadores 2405, o que perfaz um total de 47 europeus. Morreram ainda na travessia mais cinco guineenses de um pelotão de milícias que fazia parte da guarnição de Madina do Boé. Felizmente, não morreu nenhum dos cerca de 100 elementos da população que ali viviam connosco e que foram evacuados para a então Nova Lamego, hoje Gabú. Fizeram a travessia em viagens anteriores."
(...) Duas semanas depois do naufrágio, foi organizada uma operação de recolha dos corpos por fuzileiros e mergulhadores. Muitos desapareceram para sempre. Na série de documentários A Guerra, de Joaquim Furtado, podem ver-se imagens aéreas de alguns corpos a boiar, recolhidas pelo piloto da Força Aérea José Nico. "Os [corpos] recuperados foram sepultados nas margens do rio, com as honras militares próprias", relata Joaquim Furtado. (...)
(...) Que a jangada naufragada no rio Corubal tinha excesso de peso, não suscita grandes dúvidas. Mas o que desencadeou a queda à água de soldados é alvo de versões desencontradas. Os alferes milicianos Rui Felício e Paulo Lage Raposo (o primeiro ia na jangada, o segundo fez a travessia na viagem anterior) dizem que foi o peso a mais, tendo ficado desequilibrada. Com capacidade para dois pelotões (uns 60 homens), fazia a travessia com os últimos quatro pelotões, de duas companhias. "Às vezes facilitamos demais", diz Paulo Raposo. "Para mim, a jangada virou-se porque tinha excesso de peso, embora haja relatos diferentes", diz Rui Felício.
Um desses relatos é o do capitão José Aparício (comandante da companhia 1790, em retirada do quartel de Madina do Boé), também na jangada. Diz que se ouviram tiros de morteiros e, em reacção, o barco a motor que puxava a jangada acelerou demais e fez cair homens.
Não houve tiros de morteiro, dizem Raposo e Felício. "Havia uma paz absoluta naquele rio", lembra Felício. "Estávamos habituados a ouvir tiros. Não era com uns tiros que nos assustávamos", junta Raposo. No documentário A Guerra, de Joaquim Furtado, dá-se voz às diversas versões e suas nuances. "Os morteiros existiram. Não tenho dúvidas", diz José Aparício a Furtado. "Há pessoas que disparam armas e sabe-se quem foi. Esta gente foi ouvida." Estava previsto dispararem-se morteiros para a margem sul do rio, quando todos tivessem deixado essa margem, no fim da operação.
É mostrado um filme feito pelo piloto José Nico, que filmava a penúltima travessia mas recebeu indicações para ir filmar os morteiros. Vêem-se os disparos das armas: "É durante esta filmagem que recebe a notícia do naufrágio da última jangada", ouve-se Furtado a dizer. "Imediatamente a seguir, José Nico filma estas imagens que mostram a jangada acidentada no meio do rio, enquanto alguns militares tentam as primeiras operações de socorro." Este acidente deixou a operação Mabecos Bravios (cães selvagens) tristemente célebre. (...)
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Notas de L.G.:
(*) Além do artigo, parcialmente transcrito aqui, vd. também: A última jangada no rioCorubal. Público, 25.03.2010.
Por Teresa Firmino, em Cheche
(...) Quatro décadas depois, continua a existir uma jangada em frente a Cheche. É agora moderna, tem motor próprio e serve para a travessia de carros apenas. O resto, pessoas, bicicletas, motas, vai de piroga, e há várias. Imperturbável, o Corubal é tranquilo nesta época do ano, a mesma do acidente, e a água, um tanto esverdeada, é ladeada por margens íngremes cobertas por árvores e vegetação densa. Ao sítio da travessia, com Cheche do lado de lá, chega-se por uma estrada larga, depois de uma sucessão de tabancas na berma de um caminho de terra, ponto de encontro de quem está à pesca, de quem lava a roupa e a estende no chão, de quem toma banho ou de quem simplesmente passa por ali.
(**) Vd. postes recentes publicados no nosso blogue:
2 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5920: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (6): Missão da Liga dos Combatentes resgata corpos (Beja Santos)
22 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5866: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (5): uma versão historiográfica (?) (Luis Graça)
21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5861: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (4): Cem anos que viva nunca esquecerei as imagens da catástrofe e o diálogo entre o Alf Diniz e o Cap Aparício (Rui Felício)
21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5859: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (3): O oficial mais graduado que ia na jangada era o Cap Aparício, comandante da CCAÇ 1790 (Paulo Raposo)
21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5858: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (2): Acima do Alf Diniz, só havia 2 homens, os Cap Aparício (CCAÇ 1790) e Jerónimo (CCAÇ 2405) (Armandino Alves)
20 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5851: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (1): Silvina Claudino, de 26 anos, uma sobrinha que o 1º Cabo José Antunes Claudino, da CCAÇ 2405, natural de Alcanhões, Santarém, nunca conheceu
Guiné 63/74 - P6062: Blogpoesia (70): Sete fotopoemas da (e)terna China (António Graça de Abreu)
República Popular da China > A Grande Muralha...
[ Edição / legendas / título do poste: L.G.]
domingo, 28 de março de 2010
Guiné 63/74 - P6061: Fajonquito do meu tempo (José Cortes, CCAÇ 3549, 1972/74) (5): A mina A/P que estropiou o Vasconcelos na estrada para Cambajú
Data: 7 de Março de 2010
Assunto: Narrativas de Fajonquito
Como prometi na minha entrada para a tertúlia, aqui vai a narrativa de um acontecimento, durante a comissão na Guiné.
A mina que estropiou o Vasconcelos.
Estamos em Outubro de 1972, mais ou menos 6 meses de comissão, dia 12 ou 13.
Ao fim da tarde daquele dia, três viaturas civis estão estacionadas na parada do aquartelamento, junto ao parque auto, a carregar pessoal. Como sabes, a lotação das viaturas era mais que lotada.
Partiram logo de seguida com destino ao Senegal, via nosso destacamento de Cambajú, que ficava junto á fronteira.
Passado pouco tempo de terem partido, talvez uma hora, ouvimos rebentamentos. Contactados os destacamentos, Cambajú dizia que era na estrada de acesso ao destacamento, mas que não havia NT no local.
Informamos que iam a caminho três viaturas civis com destino ao Senegal.
Saiu o grupo do furriel Deus, e ao chegar à picada, o que demorou algum tempo pois tiveram que cumprir as normas de segurança entre as quais picar a estrada, depararam com as três viaturas incendiadas dentro do mato e com os civis alguns mortos e outros feridos, principalmente queimados. Foram atacados a roquetada.
Foram levados para o destacamento e foi pedida a evacuação dos feridos.
A evacuação só podia ser feita no dia seguinte pois entretanto escureceu e os helis não voavam de noite.
No dia seguinte logo cedo é formada uma coluna de apoio ao destacamento, tanto para reabastecimento como para ajudar a cuidar dos feridos civis.
A coluna partiu, e a partir da Bolanha de Nhacra, começa-se a pôr em prática os processos de segurança entre os quais a picagem da estrada. A velocidade da coluna é reduzida e avançamos a passo de caracol, como era necessário.
Eu seguia na Mercedes, uma viatura pesada de carga, que transportava colchões para os civis que não precisavam de evacuação mas ficavam no destacamento para serem tratados. E outros artigos de reabastecimento. A meu lado seguia o condutor, salvo erro era o Celestino, apoiado no guarda lamas e em cima do pára-choques ia o Vasconcelos, soldado mecânico, que era a primeira vez que saía do aquartelamento.
Como a velocidade das viaturas era reduzida devido à picagem, e a segurança até ao local do acidente no sentido Cambajú - Fajonquito estava feita pelo pessoal do destacamento, quando nos aproximamos do local onde as viaturas tinham sido atacadas, a coluna parou, para que a segurança que estava na estrada seguisse nas viaturas para o destacamento e deixávmos os nossos na estrada.
O Vasconcelos, pela sua inexperiência, mal viu as viaturas queimadas, saltou do pára choques da Mercedes, para ir ver as viaturas que estavam dentro da mata aí uns 20-30 metros. Ao dar os primeiros passos,. ouviu-se um rebentamento... Tudo no chão... Quando o pó começou a assentar, os gritos do Vasconcelos quebram o silêncio que entretanto se estabeleceu pelo susto. O Vasconcelos tinha pisado uma mina A/P que estava colocada no trilho de acesso às viaturas civis.
A experiência do comandante do pelotão de milícia de Cambajú, e talvez não só, não se safou de ser apontado como sabedor da localização das minas, tal foi a rapidez com que detectou a segunda mina e procedeu ao seu levantamento.
Depois de levantada a mina, fomos buscar o Vasconcelos que não parava de gritar. A sua perna direita tinha desaparecido até á coxa, o fémur estava sem carne até ao joelho e a sua perna esquerda tinha fractura exposta do perónio e no joelho.
Colocado o Vasconcelos num colchão dos que vinham na viatura, a mesma partiu em direcção ao destacamento, onde tinha acabado de chegar heli que ia fazer a evacuação dos civis feridos no ataque do dia anterior.
No destacamento foi outra guerra, porque os civis não queriam deixar que o nosso homem fosse evacuado e eles não. Os ferido mais graves acompanharam o Vasconcelos e os mais ligeiros ficaram, mas foi preciso o furriel Deus impor a sua autoridade de arma em punho.
Isto passou-se salvo erro (pelo dia) no dia 14 de Outubro de 1972. Nunca mais soubemos nada do Vasconcelos.
Em Novembro de 1998, 26 anos depois, ouvi na Rádio Renascença uma mensagem onde só apanhei a palavra Deixóspoisar, liguei para a RR onde me foi dado o contacto de quem tinha deixado a mensagem. Quando liguei e do outro lado me responderam que quem falava era o Vasconcelos, as lágrimas caíram pela cara abaixo, a minha mulher de volta de mim a perguntar o que era, eu sem poder falar, tal era a emoção de estar a falar com a pessoa que eu nunca mais pensava encontrar. No fim de semana seguinte o Vasconcelos almoçou em minha casa comigo, começamos a trocar alguns contactos que tínhamos e a partir daí os encontros da companhia fizeram-se anualmente, coisa que nunca tinha acontecido nos 27 anos antes.
Pronto, esta foi uma das ocorrências em que estive envolvido, depois hão-de seguir outras.
Um abraço, José Cortes
2. No mesmo dia o José mandou a seguinte mensagem do seu camarada José Bebiano, com conhecimento ao nosso blogue:
Caro amigo José Bebiano: Espero não te maçar com os meus emails, nem sei se queres recordar os tempos da Guiné.
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Nota de L.G.:
(*) 19 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6022: Fajonquito do meu tempo (José Cortes, CCAÇ 3549, 1972/74) (4): Ainda o caso do Cap Patrício que foi, por castigo, para a CCAÇ 15, Mansoa, e do comandante do Esq Rec Fox de Bafatá que invadiu o Senegal com as chaimites
Guiné 63/74 – P6060: O meu álbum de fotos (3) (Alfredo Dinis)
Camaradas,
Hoje envio mais algumas fotos das minhas "férias" passadas em Nova Lamego.
Estas considero-as de rara oportunidade, pois foram obtidas no início do ano de 1974, após uma mortífera emboscada que nos preparou o PAIGC, onde a nossa Companhia sofreu 7 mortos e 2 feridos com gravidade.
Alfredo Dinis
1º Cabo Enf CCS do BART 6523
Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
21 de Março de 2010 > Guiné 63/74 – P6033: Estórias avulsas (78): O meu álbum de fotos 2 (Alfredo Dinis)
Guiné 63/74 – P6059: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (36): Reunião magna no Palácio do Governador (Mário G R Pinto)
1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a sua 36ª mensagem, em 25 de Março de 2010:
Camaradas,
Ao desfolhar o caderno de apontamentos, onde se encontram as minhas memórias descritivas, fui encontrar este curioso acontecimento que se propunha, então, mudar o curso da guerra.
REUNIÃO MAGNA NO PALÁCIO DO GOVERNADOR
De todos os pontos do território afluíram a Bissau, os oficiais com as patentes de capitão e seus superiores (majores, tenentes coronéis e coronéis), que além de Bissau comandavam as unidades chamadas do “Vietname”.
Como é óbvio, todos se digiram para a capital, interrogando-se sobre o que teria o "Caco" em mente, para convocar tão magna reunião.
Especulava-se entre os oficiais, durante o jantar no dia anterior á reunião no Solar dos Dez.
A presença dos majores Passos Ramos, Pereira da Silva e Osório, do Comando Operacional de Teixeira Pinto, deixava antever que alguma coisa estaria relacionada com aquele sector.
No dia seguinte, há hora estabelecida para a reunião magna, 09H00 da manhã, deu entrada no salão o General Spínola e o seu Staff de oficiais, para presidir a tão alta reunião.
Depois de agradecer a presença de todos expôs, aos presentes, o seguinte:
"Meus senhores, a guerra na Guiné pode terminar dentro de pouco tempo, porque dos contactos directos havidos no Norte, entre oficiais Portugueses e grupos rebeldes, estes têm revelado intenção de se entregarem às autoridades Portugueses, desde que tenham garantias de que não serão sujeitos a represálias, e que serão integrados na sociedade Guineense.
Este propósito, a materializar-se, pode conduzir a uma reviravolta da política Nacional em relação à Guiné e, posteriormente, aos restantes territórios Ultramarinos.
Portanto, todas as unidades militares têm que estar preparadas para receber os grupos rebeldes, que voluntariamente deponham as armas, pois é muito provável que o movimento, a partir do Norte, se estenda rapidamente a todas as regiões da Guiné".
Era o nosso General e Com-Chefe, na sua maior convicção de psicologia enganosa que iria mais tarde custar a vida aos célebres majores; Passos Ramos, Pereira da Silva, Osório e ao Alferes Mosca, juntamente com os Guineenses que os acompanharam, numa morte cruel e bárbara como se veio a constatar mais tarde.
Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art
Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
6 de Março de 2010 > Guiné 63/74 – P5941: Estórias do Mário Pinto (Mário Gualter Rodrigues Pinto) (35): A dança das bazucas (Mário G R Pinto)
sábado, 27 de março de 2010
Guiné 63/74 - P6058: Convívios (208): Encontro de Confraternização da CCAÇ 763, em 22 de MAIO de 2010 – Boleiros/Fátima (Mário Fitas)
Anexo o programa do encontro da CCAÇ 763 os "Lassas".
Solicito que seja incluída a indicação, que este encontro se encontra aberto a todos os que, em CUFAR e ao redor, colaboraram com a CCAÇ 763.
Enfim todos aqueles que connosco conviveram em CUFAR e queiram estar no nosso neste 45º Aniversário da nossa chegada à Guiné.
E Já lá vão 40 anos!!!
OPERAÇÃO ROLO
21 de Maio de 1966 – A Companhia de Caçadores 763, a 2 Grupos de Combate, sai do Quartel de Cufar, pelas 04h00, colaborando na Operação ROLO que visava a desobstrução da estrada para Bedanda. Até às 09h30 foram retiradas ou destruídas 33 abatizes de grande porte.
Enquanto a coluna auto seguia pela estrada escoltada pela CCAV. 703 que, entretanto, tinha montado a segurança, a nossa Companhia recebeu a missão de se deslocar para a região de Cabolol, tendo sido atacada pelo IN junto das povoações de Cabolol Balanta e Cabolol Lande.
Nessa operação, a Companhia que teve o apoio dos T-6, sofreu um ferido ligeiro.
Companheiros,
Quando a 13 de Fevereiro de 1965 embarcámos para a Guiné, éramos mais novos, é verdade, mas não sabíamos o que hoje sabemos.
Desde esse dia até hoje, todos vós, todos nós, temos continuado a lutar pela vida, agora, não só pela nossa, mas também por a daqueles que nos rodeiam.
A vida é dura, companheiros, mas não adianta apenas lamentarmo-nos. Afinal, ainda cá estamos e, melhor ou pior, vale a pena continuarmos vivos e, na medida do possível, aproveitar algo de positivo dessa situação.
É, exactamente, porque sabemos como é sempre um momento de alguma satisfação, que te vimos desafiar para o:
COMPANHIA DE CAÇADORES 763
ESTE ANO, O NOSSO ALMOÇO DE CONFRATERNIZAÇÃO VAI REALIZAR-SE NO DIA 22 de MAIO de 2010
12.00 horas – Chegada ao Restaurante TRUÃO (Estrada de Minde – Largo da Capela – Boleiros), telef. 249521542.
13.00 horas – ALMOÇO
- Entradas na mesa
- Açorda de Cherne com camarão
- Galo c/ couves e miúdos do dito
- Buffet de sobremesas
- Vinhos Verde e da Região
- Café
- Digestivos
Familiares ..................... 27,00 euros
Crianças ........................ 12,00 euros
Sem ti não haverá Almoço?
CONTACTOS (telemóveis):
Mário Ralheta ………….....….. 965591915
Belarmino Acúrsio ……....….. 917588896
Artur Teles ………….......….….. 969031452
Jorge Paulos ........................... 962333356
RESTAURANTE / ITINERÁRIO:
Um abraço do tamanho do Cumbijã,
Mário Fitas
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763
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Nota de M.R.:
Vd. último poste da série em: