sábado, 4 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7379: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (2): O primeiro dia em Bissau

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Dezembro de 2010:

Malta,
Os pequenos almoços na Pensão Lobato eram insuficientes e o meio envolvente melancólico, até soturno. Mas eu estava impaciente para calcorrear Bissau, sabendo de antemão que os dissabores seriam em maior número que os sabores. E naquele primeiro dia não era nada agradável dizer à Maria Fausta que o Abudu está mesmo muito doente, incapaz de viver na Guiné, quem já teve dois enfartes do miocárdio não pode acreditar em milagres no Hospital Simão Mendes.

Hoje seguem em separado as fotografias que tirei no primeiro dia de Bissau.
Ficarão com o copyright do nosso blogue.

Um abraço do
Mário


Operação Tangomau (2)

Beja Santos

O primeiro dia em Bissau

1. Cedo o Tangomau descobriu que o conflito que se instalara entre ele e a casa de banho da Pensão Lobato tem muito a ver com o sentimento de resignação e indiferença do povo guineense. Tomara um duche que esbanjava metade da água, a água esguichava e escapava-se na junta entre a serpentina e o punho. Mal se arranjou, informara a governanta da situação e pedira que pusessem uma lâmpada no corredor, por duas vezes tropeçara, com risco de estampanço. Resposta, com sorriso: “Não há problema, vou avisar o patrão, não custa arranjar”. Se era para o sossegar, não sossegou. Nada foi arranjado, ao terceiro dia estava tudo na mesma, era uma estragação de água, não se percebe porque é que não há uma alma que ensine a remover teias de aranha e as manchas da sujidade, cogitou o Tangomau.


2. Em vez de subir a antiga estrada de Santa Luzia, inflectiu à direita, um quarteirão à frente subiu à Praça dos Heróis Nacionais, tem uma encomenda a entregar nos escritórios da TAP, mas fica esparvoado com o escombro em que se encontra o palácio presidencial. Cá fora, as pessoas passam sem olhar aquele tecto esventrado, o vestíbulo reduzido a cacos, as janelas saqueadas. O Tangomau imagina a elegância que terá tido todo o tecto daquele vestíbulo onde agora se instalam, com o calor da manhã, bandos de morcegos. Sobe as escadas com o cimento esfarelado, tudo quanto era azulejo ou corrimão foi roubado. O salão do primeiro andar é formoso nas proporções, dá até para especular as sessões de Estado que ali se realizaram, mesmo banquetes, boas-vindas, sabe-se lá se até concertos. Pode observar a graciosidade da escadaria, permanece incólume ao vandalismo. Saiu do edifício, contornou pela direita, entrou no que terá sido o jardim, nas traseiras do palácio; expectante, está ali uma fonte apainelada por pequenos mosaicos.

O que era o Museu da Guiné, Biblioteca e Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, é hoje a Primatura, vedaram-lhe o caminho. Onde estava o Café Império é hoje a pastelaria e padaria Dias & Dias, cá fora rescende um bom cheiro da confeitaria.

Fotografias retiradas do site: http://pensaodbertabissau.wordpress.com/
Quem não conhece a Pensão Central desconhece a magnitude dos sorrisos

Ele desce à Avenida Amílcar Cabral, pára diante da UDIB e recorda, sem dificuldade, os filmes de acção que ali viu, 40 anos antes. O Hotel Portugal é um edifício abandonado. Agora, em cada edifício habitado há sempre um segurança para dissuadir os assaltos. A deambulação prossegue, a catedral fita-o das suas linhas aprumadas, está pintada de branco imaculado. Excitado, o seu olhar contempla os dois andares da Pensão Central ou Pensão da D. Berta. E sobe a escadaria em ferro, visivelmente carcomida pela ferrugem, no primeiro andar avista um jovem e pergunta por D. Berta Oliveira Bento, a Avó, o sorriso mais doce de Bissau.

Tem razões para esta excitação: aqui viveu em 1970, aqui comeu duas refeições por dia, quatro meses sem interrupção, em 1991.
A D. Berta aluga acidentalmente quartos, ela acolhe, é confidente, moraliza e dá estímulo às centenas de cooperantes, investigadores, professores e até empresários que não prescindem daquela comida caseira: uma sopa onde nunca falta o gosto da batata, um prato de peixe ou de carne, e depois a sobremesa, doce ou fruta, tudo mais a bebida por 4500 francos CFA, a preços actuais, mais barato não há em Bissau.

Pois o que vai acontecer é que o Tangomau corre por impulso, chora no ombro da Avó Berta. Desajeitadamente, confessa: “Tenho tanta saudade da sua canja!”. E ela responde, quase maviosa: “Se tem saudades hoje almoça o que há, amanhã faço a canja.”. O Tangomau olha as mesas, ali ao canto comia muitas vezes com aqueles holandeses do saneamento básico ou com o Dr. Aníbal do Centro de Medicina Tropical.

Despedem-se, ele tem urgência de ir ao Bissau Velho trocar dinheiro. Por baixo da casa da Avó estão vendedores de artesanato, sempre a incitar à compra. Ele não pára, onde era o antigo Café Bento (ou 5ª Rep) é hoje a delegação da RTP África.

Feito o câmbio, sobe até à rua da Cidade de Lisboa, tem um encontro aprazado com o embaixador António Ricoca Freire, toma café e ali ficam em amena conversa. O esforço titânico da Avó Berta veio à baila e os dois sugerem à uma ir almoçar à Pensão Central. A Avó não escondia o seu orgulho, sentada ao lado do embaixador português.

Findo o almoço, regressam à embaixada, começa uma ronda de telefonemas para avisar vários destinatários de encomendas ou para convocar encontros. Um dos camaradas da Guiné queria obsequiar as suas duas lavadeiras e mandou as seguintes referências: a primeira, a Rosita, também conhecida pelo nome de Nhamo, mora no bairro Quelélé e tem uma filha chamada Tiba; a segunda é a Mariama Gorda que pode estar em Bissau ou já em Bambadinca. O pedido era categórico: “dá-lhes um beijo por mim”. E juntava fotografias de ambas para que não houvesse confusões. E depois saiu com o Sr. Sabino, os Soncó têm precedência. A embaixada situa-se num bairro que data dos tempos de Sarmento Rodrigues, tem reminiscências Art Deco, mas um grande número de moradias dá sinais de uma ruina imparável.


Tumblo em 1968, fotografia captada em Missirá. 
A menina mais crescida é a Sadjon (uma homenagem a S. João, em frente a Bolama), uma Mané que casou com o falecido Ansumane Mané, parente de Tumblo. Sentada ao lado de Tumblo está Mai Sai, a sua mãe. Segue-se outra criança não identificada. De calção e sorriso franco Abudu Soncó, a quem o Tangomau ofereceu esta fotografia.

3. O primeiro encontro é com Tumblo, o irmão que resta ao Abudu. O Tangomau esquecera-se de fazer uma cópia à fotografia tirada em 1968 a um conjunto de crianças em Missirá: Tumblo ao lado da sua mãe, Mai Sai; Sadjon, Abudu, Samba Mané, Nhalim Cassamá e Nhima Mané. Paciência, talvez não venha a faltar outra oportunidade. Depois de visitar a casa de Tumblo seguiram ao encontro da Maria Fausta. Àquela hora, a estrada que passa por Bandim estava em convulsão, congestionada, ouvem-se as imprecações em crioulo; em Bandim, um sinaleiro garboso procura pôr o trânsito mais fluido. Não foi fácil encontrar a Maria Fausta, afinal não vive perto da Somec, mas quase no sentido oposto. O Tangomau promete novo encontro, quando regressar da região de Bambadinca. No regresso, passam pelo INEP, o Dr. Mamadu Jao, o seu director, não está, ficam os livros e as cartas geográficas, deixou-se a promessa de regressar amanhã.

De novo na embaixada, consegue-se o contacto com Nhamo, que promete vir imediatamente. Sempre solicita, a secretária do embaixador estabelece contacto com Filinto Barros e Delfim Silva, ficam marcadas reuniões para amanhã. Nisto chega a Nhamo, em todo o seu esplendor. Riu-se quando a beijei em nome do Jaime Machado.


4. Ao almoço, o Tangomau estabeleceu contacto com Patrício Ribeiro, um empresário que trabalha há 26 anos na Guiné e é assíduo frequentador do blogue. Combinaram ir jantar ao Bissau Velho. É uma dor de alma a degradação a que chegou a zona comercial da segunda capital da Guiné. São edifícios simples dos anos 40 e 50, sobretudo, possuíam cores gritantes, era ali que estavam estabelecidos os libaneses da família Saad (a incontornável Casa Taufik Saad), os estabelecimentos António Pinto, a Casa Pintosinho, entre outras. Este Bissau Velho plantara-se perto da Fortaleza da Amura, era ponto de passagem obrigatório entre o porto e a zona habitacional da cidade, perto estava o tribunal, mais adiante os correios, logo no início da Avenida da República, do lado esquerdo, a Casa Gouveia. Esta urbanização aparece admiravelmente documentada nos postais da Guiné na edição de João Loureiro, infelizmente esgotada. Pois aqui está o restaurante Tá Mar, por capricho do destino apareceu o Delfim Silva, o Tangomau já não se recordava nem como nem porquê a conversa deslizou para os testemunhos de Luís Cabral e Aristides Pereira, a riqueza e as insuficiências de cada um deles. Exausto, o Tangomau pediu a Patrício Ribeiro que o levasse até à Pensão Lobato. Fora um dia em cheio, excessivo de emoções, de alegrias, de descobertas. Mas também o sentimento de agonia e consternação pela decomposição que atravessa Bissau.


5. No INEP visitou a exposição Raízes, patrocinada pela Fundação Mário Soares. O visitante tem ao seu dispor um conjunto de fotografias que datam das décadas de 40 a 60 do século passado. Era material que estava à carga no Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, e que se deteriorara brutalmente, por falta de conservação. A Fundação Mário Soares contribuiu para recuperar meia centena de fotografias entre os milhares de espécies de um acervo de indiscutível valor histórico. Procedeu-se a limpeza e a expurgo, fez-se a reprodução fotográfica e digital e depois o respectivo restauro. Para esta exposição apresentam-se imagens de homens e mulheres da Guiné-Bissau na sua faina diária sob o olhar da “etnografia colonial”. São fotografias de uma beleza admirável, no mínimo o Tangomau recomenda que se adquira o catálogo. A ventoinha continua no seu ronronar e os grilos não se calam. O cansaço é tal que no cotejo destas notas se esqueceu a referência à maresia que vem do cais do Pidjiquiti, àquela hora da manhã embarcava gente para Catió e noutras embarcações desembarcava peixe.

Capa do catálogo da exposição do INEP

Mandinga fabricando uma esteira

Balantas trabalhando na construção de um orique

Regalado, o Tangomau cogita sobre o que vai fazer amanhã, falta descer pela Baixa de Bissau, é impreterível passar pelo cemitério, há ainda outras encomendas a entregar, ao fim da tarde quer ir à missa na catedral. Está impaciente de partir para Bambadinca, pois claro, o Fodé já esclareceu que vai aparecer muita gente, surpresas não faltarão. E, com um suspiro, volta-se para o outro lado e adormece agradado com a ideia de que uma sopa de ostra o espera na Pensão Central.
__________

Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 2 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7370: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (1): Primeiras notícias da Guiné-Bissau

Guiné 63/74 - P7378: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (32): Estava no Cantanhez, no dia 1, e fiquei emocionado com o vosso poste de parabéns que só agora, em Bissau, posso agradecer (Pepito)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Medjo > O Régulo, Umaru Djaló, trajando o seu melhor fato...




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Amindara > O milagre da água...




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Amindara > A população em festa...




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Farim de Cantanhez > Dezembro de 2010 > A Alicinha (afilhada da Alice Carneiro)  e a sua mãe, Cadi. 


1. Texto e fotos do nosso amigo Pepito:

 Data: 4 de Dezembro de 2010 17:39
Assunto: Aniversário

Amigo Luís

Fiquei comovido com o postal fabuloso do Miguel Pessoa e as mensagens que  os amigos lá puseram (*). Porque um homem não chora, as lágrimas caíram-me para dentro. Ninguém as viu. Só eu sei quanto me souberam bem. Mandei o post para duas pessoas em especial: as minhas netas Sara e Clara.

Quando li as mensagens tive uma enorme vontade em estar aí com todos os camaradas do blogue, meus companheiros de sonhos e amores comuns pela Guiné que tanto amamos, por mais partidas que ela nos pregue. Acho que ela até o faz de propósito, para nos juntar mais, para estarmos sempre a pensar nela, como as crianças bulidoras (traquinas) para nos obrigarem a dar-lhes mais atenção.

Estava em Cantanhez no dia 1 quando colocaste o post, por isso não vos agradeci imediatamente. 
Estava em Guiledje a preparar a reconstrução do oratório que o Patrício (embaixador dos portugueses em Bissau) já começou a fazer e para o qual o Grupo de Amigos de Guiledje do nosso Blogue decidiu contribuir.  

Estava em Amindara às 8 horas de uma noite escura como o breu, a receber os agradecimentos que as mulheres e os homens faziam à Tabanca Pequena por lhes ter construído um poço, com depósito elevado de água e painéis solares, que lhes permite passar a viver, segundo eles, suma brancu (como brancos).

Nesse dia também estava em Medjo, onde o Régulo Umarú Djaló decidiu vestir o seu melhor traje, para igualmente agradecer à Tabanca Pequena o poço igual ao do de Amindara, dizendo: "agora posso morrer descansado, porque vou ser sempre recordado por ter sido no meu tempo que a tabanca de Medjo passou a ter um poço tão bom e que as mulheres deixaram de ter problemas com o acesso à água". 

Estava também em Farim de Cantanhez, tendo nos braços uma linda criança a quem deram o nome de Maria Alice, vestida com roupas enviadas aí de Lisboa pela "vóvó Alice Carneiro", a companheira do nosso Luís e mãe do João que andou por Cantanhez a cuidar da saúde de pessoas que nunca tinham visto um médico.

Foi um dia em que andei, junto convosco, a percorrer os caminhos largos da solidariedade.

Por isso enviei para as minhas netas Sara e Clara lerem mais tarde o vosso post, para conhecerem o valor da amizade e saberem que o melhor mundo em que vivemos é o dos sentimentos e o da generosidade, que é nele que vamos buscar a força para viver de pé. (**)

Um abraço muito amigo

Pepito

(**) Último poste da série > 12 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7270: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (31): Achado e perdido, o meu amigo Mulai Baldé (Amílcar Ventura)

Guiné 63/74 - P7377: Facebook...ando (2): Duas fotos do Durval Faria, Nossa Senhora do Rosário, Lagoa, São Miguel, RA Açores, que pertenceu à CCAÇ Esp 274 / BCAÇ 356, CTIG, 1962/64



Fotos de Durval Faria (2010) (sem legenda)... Comentário do nosso amigo João Coelho: " O Durval Faria poderá indicar datas - e em que navio iam embarcar - mas a primeira foto é tirada na doca de Ponta Delgada, então Molhe Salazar, na ilha de S.Miguel. Curiosa a forma como as famílias acompanham os militares que mantém, apesar de tudo, uma espécie de formatura. Aqui em Lisboa a separação entre tropa e familias, na altura do embarque, era total, como sabem" ... Por sua vez, o João Moniz, natural de Lagoa, onde reside, e conhecido do Durval, diz-me, em conversa no Facebook, que o Durval, na outra foto,  é  o militar que aparece em primeiro plano (informação que o próprio acaba de confirmar no Facebook).


O João Moniz esteve igualmente na Guiné, em 1970/72, passou por Bula e Mansabá, tendo estado com o nosso camarigo António Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790... Convidei-o a ingressar no nosso blogue, de modo a poder partilhar as suas memórias, as suas histórias, as suas fotos... Mostrou-se emocionado, e prometeu contactar o seu amigo Durval, presidente da Junta de Freguesia de N. Sra. do Rosário... Como vêem, o mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é Grande.

Duas fotos deixadas no mural do Facebook da Tabanca Grande por Durval Faria, ex-combatente da Guiné, 1962/64,  fazendo parte do Batalhão de Caçadores nº 356 e Companhia de Caçadores Especiais nº 274.

 O nosso camarada Durval Faria tem conta no Facebook e é nosso amigo. Está ligado ao Núcleo de Combatentes de Lagoa. É presidente da Junta de Freguesia de Nossa Senhora do Rosário, Lagoa (, foto à esquerda).


Em termos de património, é de destacar, nesta freguesia, a  sua magnífica igreja paroquial, consagrada a Nossa Senhora do Rosário,  um templo de grandes dimensões, setecentista, construído sob uma ermida do mesmo nome (que ali existia desde o século XVI).  Tem três naves e um notável conjunto de escultura da autoria de Machado de Castro.

Quanto ao concelho de Lagoa, na costa sul da ilha de São Miguel, Região Autónoma dos Açores, foi criado a 11 de Abril de 1522 por carta régia de D. João III.  Tem uma área de 45,6 km2 e uma população de 14 126 habitantes (censo de 2001),  repartindo-se por cinco freguesias: além de Nossa Senhora do Rosário, Santa Cruz , Água de Pau, Cabouco e Ribeira Chã.

Gostaríamos de ter este camarada, açoriano, autarca, entre nós, a conversar sob o poilão da Tabanca Grande sobre os primeiros tempos da guerra da Guiné (1962/64) e sobre a unidade a que pertenceu ( CCAÇ Esp 274 / BCAÇ 356) e que não está representada no nosso blogue. 


Queríamos que este camarada aceitasse o convite para fazer parte do nosso blogue, transformando-se assim em mais um camarigo... Já agora gostávamos que ele legendasse as fotos que teve a gentileza de pôr no nosso mural. 


Deixei-lhe as seguintes mensagens:  (i) [ Primeira foto, a contar de cima] Durval, obrigado... Foto com interesse documental... Legenda ? Local e data ? S. Miguel, Açores ? Partida de um contingente militar para a Guiné ? O teu batalhão ?; (ii) [Segunda foto] Durval, por onde andaram vocês na Guiné ? Onde estás tu na foto ? Data e local ?

______________


Nota de L.G.:

Poste anterior desta série 24 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7327: Facebook...ando (1): O aerograma traçado de balas ou estilhaços na emboscada de 26/10/1971, na estrada Piche-Nova Lamego, e em que morreram 4 camaradas da CART 3332 (Carlos Carvalho)


sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7376: Agenda Cultural (93): A Sociedade Filarmónica de Crestuma (José Ferreira da Silva, ex-Fur Mil Op Esp, CART 1689, 1967/69)


Vila Nova de Gaia > Crestuma > Marcha canção "Minha Terra", letra de Eugénio Paiva Freixo e  música de António Ferreira Alves, dois ilustres crestumenses


Vila Nova de Gaia > Crestuma > Sociedade Filarmónia de Crestuma, de que é presidente o nosso leitor e amigo José Campos.



1. Mail, com data de 22 de Novembro último, enviado pelo nosso camarada Silva da CART 
1689, de seu nome completo José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69)




Camaradas Graça e Vinhal
Junto algum material que pode ser aproveitado para encerramento do caso do
"pobre camarada de Crestuma que morreu na ponte de Boruntuma" (*). Façam o que
entenderem por mais conveniente.

Um grande abraço do Silva da Cart 1689






2. Festival de Bandas > Concerto da Banda Filarmónica de Crestuma (**)

Texto e fotos: Silva da CART 1689

Camarada Luís Graça

Agradeço o convite que me foi dirigido, para assistir ao concerto da Banda Filarmónica de Crestuma, que teve lugar no dia 23 de Outubro e do qual ainda não apresentei a respectiva reportagem. Mas, mais grato  fico ainda pela excelente noite que me foi proporcionada.

Quando cheguei ao Auditório Municipal de Gaia, fui recebido muito amavelmente pelo Presidente da Banda, Sr. José Campos. Teve logo o cuidado de me dizer:
- Se vier mais alguém do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, eu tenho muito gosto em recebê-los e dar-lhes estes convites especiais.

Fiz-lhe ver que seria muito difícil, os tertulianos, deixarem as suas terrinhas e os seus netinhos (agora muito recomendados), para se deslocarem numa noite fria a Vila Nova de Gaia.

Efectivamente verifiquei que a fila A nos estava reservada. É uma boa casa para este tipo de espectáculos, um cómodo salão, apropriado para estes eventos. Apesar das tarefas inerentes a um bom anfitrião, o Presidente arranjou tempo para vir conversar comigo acerca do nosso blogue, do qual se manifestou muito conhecedor e  grato, e, também, acerca da sua Banda, que vive uma fase de grande desenvolvimento.

Fiquei a saber que a Banda é composta por 62 elementos, com a idade média de 23 anos e que cerca de 40% são jovens mulheres. Os mais jovens estudam música e,  de entre os mais velhos, há vários licenciados pelas Conservatórias de Gaia e do Porto. Por sua vez, o Maestro José Bovião Monteiro também é jovem, mas já possuidor de um excelente currículo musical.

O programa:

1ª Parte
Maribel – Fantasia Espanhola,  de Ferrer Ferran
Tannhauser – Abertura da Ópera,   de Wilhem Richard Wagner
La leyenda del Beso – Excertos da Zarzuela,  de Reveria Soutullo e Vert Juan

2ª Parte
Cassiopeia – Fantasia,  de Carlos Marques
Português Suave – Rapsódia, de Carlos Marques
Starts and Sripes Forever – Marcha,  de Jon Philip de Sousa

Eu, duro de ouvido e um leigo nesta matéria, devo confessar que me deliciei imenso com este espectáculo, especialmente aquando das interpretações da Zarzuela e da Rapsódia.
De realçar também, as intervenções do Maestro, nos intervalos, explicando as obras e falando sobre os compositores, numa evidente demonstração de   grande conhecimento sobre a matéria.

O Presidente da Banda informou-me ainda que espera preparar uma obra baseada nos poemas de Eugénio Paiva Freixo e na música de António Ferreira Alves, dois ilustres artistas de Crestuma.

Sempre que se fala de Crestuma, estes dois nomes surgem inevitavelmente. Por isso, também não posso alhear-me disso, até porque, possivelmente, não haverá outra oportunidade de falarmos de Crestuma.

Minha Terra

Coro 

Minha terra, minha terra!
Meu pequenino rincão!
Via-Sacra dos meus passos,
Pátria do meu coração!

Ó minha terra modesta!
És pequenina, que importa?
- Cada qual gosta da festa
Que se faz à sua porta... 

II

Ó terra de lenda, 
Paninho de renda,
Bordado por mãos de fada!
Tão bela e garrida,
És a minha vida, 

Ó minha terra adorada!

Crestuma formosa,
Meu botão de rosa
No perfume e no feitio!
Talvez sejas pobre
- Mas és a mais nobre
Das terras da beira-rio!


II

Tão fresca e singela,
És uma aguarela
Cheia de luz e pureza!
Quem te deu a graça,
Que por ti perpassa,
Foi Deus, com toda a certeza!

Terra que te enfeitas
Nas ruas estreitas
De raparigas aos molhos,
Assim pequenina
Tu és a menina
Das meninas dos meus olhos!


III
Terra de meus pais!
Da montanha ao cais,
Quem te desce, anda a rezar,
Como se quisesse
Contar numa prece,
Os degraus de algum altar!

Meu ninho adorado,
De céu anilado,
Gostar de ti, quem não há-de!
Coração em ânsia,
Tu és na distância,
A presença da Saudade!

IV

Crestuma gaiata
Que o Douro retrata
Na chapa das suas águas!
Das vidas sem preço
Tu é que és o terço
Onde os pobres rezam mágoas!

Meu lar, minha cruz,
Meu doce ai-Jesus,
Meu formoso amor-perfeito:
- Enquanto viver,
Crestuma, hás-de ser
O grande amor do meu peito!



Com um abraço do
Silva da Cart 1689

_____________

Notas de L.G.:


(...) [Teve mais de meia centena de comentários... Por exemplo:] 


silva da cart 1689 disse...




Desculpem, mas a povoação Crestuma/Lever não existe. Existem sim, estas duas vilas do concelho de Gaia. Esta ligação, muito utilizada por políticos e jornalistas, deve-se ao facto de ter havido uma "guerra de limites geográficos"( a tal que condicionou a tomada de posse de Mário Soares, devido ao boicote nas respectivas eleições), quando da construção da Barragem de Crestuma, dentro do limite de Lever.


Aí, nessa fronteira, quase despovoada, junto à Barragem, na curva mais larga, onde funciona o "Centro Regional de Trabalho das Meninas dos Palop", foi onde o meu conhecido António Camelo, de Lourosa, abandonou uma cadela chamada Irene que lhe chegou a casa prenha de caezinhos de várias cores. (...)


(**) Último poste desta série > 2 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7368: Agenda Cultural (92): Lançamento do livro Pelo sistema solar vamos todos viajar, de Regina Gouveia, dia 9 de Dezembro de 2010, no Porto


Guiné 63/74 - P7375: A última missão, de José Moura Calheiros, antigo comandante pára-quedista: apresentação do livro (3): Sítio promocional

Visite a página do livro «A Última Missão»


1. Duas mensagens que recebemos hoje, do autor de A Última Missão, José Moura Calheiros:




(i) Caro Amigo Luís: Informaram-me que esteve no lançamento do meu livro. No meio da balbúrdia que aquilo foi para mim,  por causa dos autógrafos, não sei se chegamos a falar.


Muito obrigado pela sua presença.


Penso que a leitura do meu livro vai ajudar a esclarecer algumas discussões travadas untre os membros da Tabanca Grande. Espero não vir a turvar as águas...


Não sei se é possível e se está de acordo com oos regulamentos do blogue, mas, caso seja, agradecia a divulgação deste meu site àcerca do livro.


Com um grande abraço, felicitações e boa sorte para o blogue.


Moura Calheiros


(ii) Caro Amigo Luís:  Vi o blogue e, pelas razões que já lhe referi, não poderei nunca intervir. A senhora que está na mesa é a Prof Doutora Eugénia Cunha, antropóloga, que foi a Coordenadora da Equipa Técnica da Missão a Guidage. 


Talvez tenha interese para o blogue, segue em anexo a intervenção de António-Pedro Vasconcelos, que é uma brilhante peça literária (*)

Com um abraço
Moura Calheiros

2. Visite a página do livro «A Última Missão»


Já à venda nas livrarias
Preço de capa: 27 €


Uma edição
CAMINHOS ROMANOS, Editora
Rua Pedro Escobar, 90 - R/C
4150 - 596 PORTO
Tel./Fax 220 110 532
Telemóvel 936 364 150
e-mail ac.azeredo@hotmail.


3. Comentário de L.G.:

Meu caro José: OK! Obrigado, tive pena de não ter estado consigo... Vi-o sempre muito atarefado, rodeado de amigos e camaradas... Fica para a próxima. Foi uma bela sessão. Cheguei um pouco tarde. Fiz alguns vídeos.  Sinta-se sempre à vontade para utilizar este mail para comunicarmos um com o outro. Tenho pena que não possa juntar-se a este grupo de camaradas e amigos da Guiné, mas entendo as suas razões.
Vou naturalmente divulgar o seu site, como faço com todos os blogues e sítios sobre a guerra da Guiné (1961/74)...  Vou também ler o seu livro com apreço e atenção.

Um Alfa Bravo. Luís Graça

____________

Nota de L.G.:

Guiné 63/74 - P7374: Blogpoesia (91): Peregrinação (Manuel Maia) (3): Cabo Miliciano, o eterno explorado


1. Mensagem de Manuel Maia* (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74), com data de  2 de Dezembro de 2010:

Carlos,
Aqui vão mais umas quantas na sequência do título acima referenciado.

abraço.
manuelmaia


PEREGRINAÇÃO - 3

A peregrinação foi nacional
da Cava Viriato à capital,
do Alentejo, Évora tão bela...
Quartel que foi convento em tempos idos,
formou um Batalhão de destemidos,
bem dentro da antiga cidadela...


José Pinheiro, à altura, Coronel,
pugnava p`lo acesso a Furriel
do Cabo Mil, eterno explorado...
E deste Comandante de Unidade,
histárias mil se contam, em verdade,
um militar à antiga, algo alquebrado...


Recordo em certo dia, reunião,
dos graduados, todo o Batalhão,
a quem na entrada é imposta a hierarquia...
Por ordem decrescente, fora claro,
e acabaria por fazer reparo
a Sargento que entrou, hora tardia...


- Que tempo tens de tropa ó moleza?
- De forma aproximada, ou com certeza?
responde com pergunta, alvo visado...
- Já mais de trinta levo de missão!
- Os postos conhecer, é obrigação!
Perdeste a alocução, ó atrasado!!!


A alocução ( leitura de uma carta...)
das muitas que ele envia, "que se farta",
para a tutela sobre os cabos mil...
Divisas amarelas, vencimento
de acordo com o curso de sargento,
chefias o rotulam de senil...


Dos cabos mil, amigo, ao que constava,
por genro que as vermelhas "ostentava"
ter curto p`ra família, o vencimento...
Bem cedo nos concede a promoção,
um mês, talvez, `ind`antes d`avião,
nos conduzir p`ra guerra/sofrimento...


D`injustiçados chama a si defesa,
talvez por ter sentado à sua mesa,
o genro, cabo mil, lá se dizia...
O posto, era uma lusa "inventona",
"colhão de galo ao preço de mijona"
(com uvas faço aqui a analogia...)

__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7353: Blogpoesia (90): Peregrinação (Manuel Maia) (2): Regimento das Beiras, Montes Hermínios, RI 14 de Viseu

Guiné 63/74 – P7373: Estórias do Zé Teixeira (39): O medo do terrífico telegrama (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)

1. Mensagem do nosso camarada José Teixeira* (ex-1.º Cabo Auxiliar Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70), com data de 2 de Dezembro de 2010:

Caríssimos editores
Junto mais um pequeno artigo com uma história verdadeira

Abraço
Zé Teixeira




Estórias do Zé Teixeira (39)

O medo do terrífico telegrama

Naquele dia 8 de Fevereiro de 1970, uma mãe esquecida do quadragésimo oitavo aniversário, preparava o almoço para os três filhos. Um quarto estava ausente na Guiné. Este, tinha feito 23 anos dois dias antes.

Era comum juntar-se a família no dia oito e cantarem-se os parabéns em duplicado. Apenas se mudavam as velas no bolo que aquela mãe, analfabeta, cozinhava com todo o carinho.

Seriam umas onze da manhã, quando o carteiro bateu à porta. Trazia um pequeno papel rectangular dobrado em quatro e tinha como destinatário o nome daquela mulher.

- D. Rita assine aqui em como recebeu.

- Mas… eu não sei assinar - retorquiu aquela mãe, com o coração já em sobressalto.

Uma vizinha prontificou-se a assinar a rogo. O carteiro foi-se embora e aquela mãe tremia de medo, com a mensagem que supunha vir dentro do malfadado papel.

- Ai que o meu filho morreu. Foi o seu primeiro pensamento.

Largou os chinelos. Com o papel junto ao coração desata a correr descalça, rua acima até ao emprego da filha, a cerca de dois quilómetros.

Chega ao destino esbaforida e sem forças, as lágrimas correm-lhe pela face.

Pede para lhe chamarem a filha. Queria ser ela a primeira a saber da sorte do seu filho.

Ao ver a filha ao longe grita:

- Ai Lai que o teu irmão morreu!

- Morreu nada, minha mãe.

- Morreu, morreu. Chegou agora o telegrama.

A filha abre o terrífico papel.

PARABÉNS PELO SEU ANIVERSÁRIO
Assina - Armanda

- Oh minha mãe, então você não se lembra que faz hoje anos?! É um telegrama da Armanda (a namorada do filho) a dar-lhe os parabéns.

- É isso que diz aí?

- É minha mãe. É o que está aqui escrito.

- GRAÇAS A DEUS.

Aquela mãe, era a minha mãe.

E eu dou Graças a Deus por poder contar, hoje, esta pequena, mas verdadeira história.

Zé Teixeira
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 15 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7287: Ser solidário (95): Com a abertura do poço em Amindara, todos ficam a ganhar (José Teixeira)

Vd. último poste da série de 14 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 – P4819: Estórias do Zé Teixeira (38): Mataram o futuro (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf)

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7372: (De) Caras (6): Convidado por Moura Calheiros para o lançamento do seu livro, A Última Missão, Manecas dos Santos, veterano do PAIGC, diz que "cada um de nós estava a cumprir o que era o seu dever" (Diário de Notícias, de 30/11/2010)


Manecas dos Santos, antigo comandante do PAIGC, o homem dos Strela... Diário de Notícias, 30 de Novembro de 2010. Recorte que nos foi enviado por José Moura Calheiros, o autor de A Última Missão (Porto, Editora Caminhos Romanos, 2010) (*) (**).


____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 2 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7371: A última missão, de José Moura Calheiros, antigo comandante pára-quedista: apresentação do livro (2): Excerto de Discurso do autor

(**)  Último poste da série > 21 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7154: (De) Caras (5): Silate Indjai, um dos primeiros guerrilheiros do PAIGC a entrar em Guileje, dirige agora os trabalhos de detecção e limpeza de UXO (Pepito)

Guiné 63/74 - P7371: A última missão, de José Moura Calheiros, antigo comandante pára-quedista: apresentação do livro (2): Excerto de Discurso do autor



Amadora > Aquartelamento da Academia Militar > Grande Auditório > 29 de Novembro de 2010 > Intervenção, em último lugar, do autor do livro, A Última Missão, José Moura Calheiros, Cor Pára Ref, depois da apresentação a cargo do realizador de cinema António-Pedro de Vasconcelos (*). Editora: Caminhos Romanos, Porto.


 O título do livro é inspirado na missão, que o coronel chefiou, em Março de 2008, de recuperação dos restos mortais de três soldados pára-quedistas mortos em combate e inumados, em Guidaje, em 23 de Maio de 1973, no perímetro do aquartelamento... Recorde-se aqui os seus nomes: o Manuel da Silva Peixoto, de 22 anos, natural de Vila do Conde; o José de Jesus Lourenço, de 19 anos, natural de Cantanhede; e o António das Neves Vitoriano, de 21 anos, natural de Castro Verde. Um quarto militar da CCP 121, gravemente ferido, acabou por morrer em Bissau.  Os restos mortais de outros camaradas nossos, do exército, em nº de sete, também foram exumados nessa ocasião, em Março de 2008. A missão foi igualmente apoiada pela Liga dos Combatentes, e contou com uma equipa técnico-científica de 3 antropólogos forenses, 1 geofísico e 1 arqueóloga (Conceição Maia, irmão do sold pára Vitoriano)

Essa missão acabou por levar o antigo oficial pára-quedista, José Moura Calheiros, oriundo da Academia Militar, a rever os seus anos de guerra em África, em três teatros diferentes (Angola, Moçambique e Guiné), por ele duramente vividos , com o todo o seu cortejo de boas e más memórias.

Video (13'  32''): © Luís Graça (2010). Alojado em You Tube Nabijoes. Todos os direitos reservados.



«(…) Não se arrisca nada se se disser que A ÚLTIMA MISSÃO, com a sua boa escrita, amplo desenho, factos fortes e consistência, é a melhor peça memorialística sobre a nossa última guerra. Assim, com este seu livro inaugural sobre a guerra que levou ao Fechamento, José de Moura Calheiros, rematando um arco de séculos, ajuda a fechar bem o trabalho iniciado pelos cronistas da Expansão. Mas o valor desta obra não se esgota no reforço da nossa debilitada tradição memorialística, reside também no facto de ser uma resposta da realidade real à altura da melhor realidade imaginada – Nó Cego, de Vale Ferraz, A Costa dos Murmúrios, de Lídia, e Jornada de África, de Alegre – sobre a Guerra Colonial, como a Esquerda lhe chama, ou Guerra do Ultramar, como a Direita prefere.» (...)  (Rui de Azevedo Teixeira, prefaciador da obra)




1. Sinopse da obra (da responsabilidade da Editora Caminhos Romanos-Unipessoal, Lda., com sede no Porto; contacto do editor,  António Carlos Azeredo, na ausência de sítio na Internet:ac.azeredo@hotmail.com)


(i) Em 1973 o autor prestava serviço no Batalhão de Caçadores Pára-quedistas 12 (abreviadamente, BCP 12), com sede na BA 12,  Bissalanca (Guiné)


(ii) Em 23 de Maio desse ano, numa operação por si comandada e tendo como missão atingir e reforçar a guarnição de Guidaje, cercada pelo PAIGC, a Companhia de Pára-quedistas 121 (abreviadamente, CCP 121) sofreu quatro mortos, dos quais três tiveram que ser inumados num cemitério localizado na cerca do aquartelamento daquela localidade;


(iii) Trinta e cinco anos depois, em Março de 2008, o autor regressa à Guiné integrado numa Missão da Liga dos Combatentes destinada a exumar, em Guidaje, os cadáveres daqueles três militares pára-quedistas e de outros sete do Exército;


(iv) O autor conta-nos toda a problemática relacionada com a expedição: os antecedentes, a preparação e o seu desenrolar;


(v) Simultaneamente descreve o ambiente da Guiné de hoje comparando-o com o do tempo da guerra; os usos, costumes e religiões da região de Farim e Guidaje; o sentimento da população em relação ao antigo colonizador; as mágoas dos guineenses antigos militares portugueses por Portugal os ter enganado e abandonado; conversas com velhos guerrilheiros do PAIGC, etc.;


(vi) Ao longo da missão ocorrem situações que lhe fazem recordar o passado, o tempo da guerra; nestes momentos de rebuscar das memórias “assistimos” à evolução da guerra, bem como à do pensamento do autor e do sentimento da população portuguesa em relação a ela;


(vii) Pela ordem temporal das sucessivas comissões, descreve e caracteriza os três Teatros de Operações, sempre como pára-quedista:


(viii) Angola, primeiro, para onde vai cheio de entusiasmo, ideais e utopias, certo de que a guerra seria ganha depressa; os cuidados com a família, o choque com o clima, a grandiosidade de África; a ambientação ao capim e à mata; o encontro com a guerra, ainda mais horrível do que imaginara; a surpresa com as condições de vida das populações refugiadas nas matas; a progressiva perda das ilusões e do entusiasmo com que partira da Metrópole;


(ix) A segunda comissão,   Moçambique; o título do capítulo é sugestivo: “Moçambique, o sacrifício maior”;  drandes distâncias, operações muito prolongadas, falta de meios de apoio; a sede, uma tortura, o maior flagelo; as minas, outro flagelo; a tragédia que foram os Postos Avançados de Combate, instalados como se de uma guerra clássica se tratasse; a operação Zeta, um sucesso que esteve prestes a ser uma grande tragédia;


(x) Por fim, a Guiné, a terceira comissão; a aparente abundância de meios, para quem viera de Moçambique; as primeiras impressões, muito favoráveis, do ambiente social e militar; a degradação progressiva da situação militar a partir da morte de Amílcar Cabral;


(xi) Mais: a “caça” à delegação que a ONU enviara à Guiné; a operação "louca" de protecção ao Comandante-Chefe nas conversações de Cap Skirring; a reocupação do Cantanhez, no sul (Operação Grande Empresa, uma grande, delicada e muito bem sucedida operação); 


(xii) E ainda: os mísseis terra-ar Strela, a procura de aviões abatidos e de restos de mísseis para identificar o utilizado pelo PAIGC; a crise nas fronteiras da Guiné (Maio - Junho de 1973), os dias mais críticos de toda a guerra; a Norte, o prolongado cerco de Guidaje e as sangrentas batalhas travadas em seu redor; a Sul, o terrível assédio a Gadamael, um inferno, ocorrido após a retirada de Guileje (em 22 de Maio de 1973);


(xiii) Os sentimentos dos combatentes nas diversas fases dos com bates e nas pausas da guerra...


 A ÚLTIMA MISSÃO é um livro de sentimentos, os dos soldados e os dos Comandantes, estes nas suas angústias, dúvidas e responsabilidades, enquanto chefes e homens.


Toda esta história real é contada a par da descrição da juventude e da preparação militar dos três Páras inumados em Guidaje e da sua actividade na CCP 121,  a que pertenciam.O livro dá-nos uma noção muito real da forma como os Pára-quedistas actuavam em operações, dos seus sentimentos em cada circunstância e de como era a vida numa Unidade de Intervenção de excelência – o BCP 12. E, também, da idiossincrasia dos Páras portugueses, dos seus valores, ideais e princípios.


____________


Nota de L.G.:


(*) Vd. poste de 29 de Novembro de 2010  > Guiné 63/74 - P7359: A última missão, de José Moura Calheiros, antigo comandante pára-quedista: apresentação do livro (1): Intervenção do cineasta António-Pedro Vasconcelos


Guiné 63/74 - P7370: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (1): Primeiras notícias da Guiné-Bissau

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Dezembro de 2010:

Malta,
Por favor, peguem na carta de Bambadinca. Acima de Missirá, na confluência com os regulados de Mansomine e Joladu temos o rio Gambiel. Aqui vim pela primeira vez na primeira semana de Agosto de 1968. Fiquei deslumbrado com tanta beleza: palmares imponentes, palmeiras de Samatra, nas margens de um rio que fertiliza as bolanhas, na altura abandonadas do lado do Cuor e discretamente cultivadas na outra margem, como vim a perceber, quando levei com uma carga de morteiro, meses depois.
O Gambiel era para mim, tal como Chicri, um dos panoramas assombrosos, que eu queria rever nesta viagem. Lá fui de motocicleta, na companhia de Lânsana Sori, um jovem da Guiné Conacri. Depois da guerra ali apareceu uma nova tabanca, Madina de Gambiel. Chegados ao local, pedi para falar com o chefe da tabanca. Levantou-se um homem, quando ouviu a minha voz. Chegou ao pé de mim e disse-me:

- Reconheci-te pela maneira de andar e pela voz, sou o Ieró Baldé, do pelotão de milícias de Missirá.

E caímos nos braços, um no outro, não me coibi de soluçar por alguém que me reconheceu, mais de 40 anos depois. E de mão dada fomos até ao Gambiel.

Estou de regresso, acho que vocês têm todo o direito de receber as primeiras notícias. Muito provavelmente, volto lá em breve.
Se aqui se vai instalar a recessão, quero informar-vos que cortei o cabelo na barbearia Chiado, no Bissau Velho, por 2€. Então vou até à Guiné para dar um pontapé na crise.
Trago toneladas de fotografias. Se houvesse aí uma alma caridosa em Lisboa que me ajudasse a abrir este ficheiro, fico antecipadamente grato. É assunto sério e urgente.
Venho de boa saúde, comi canja de ostra, muita papaia, banana-maçã, bifes de sereia e cachupa de milho.

Um abraço do
Mário


Operação Tangomau (1)

Primeiras notícias da Guiné

Beja Santos

1. Na concepção logística, a operação começa a tremelicar em pleno check in, três horas antes do voo para Bissau, no fim do dia 17 de Novembro. O Tangomau leva mais de 40kg de carga, é fácil supor porquê: as inevitáveis mudas de roupa, artigos de higiene e asseio, enfim, dois pares de sapatos e umas chinelas, tudo aquilo que parece ser imprescindível para um conforto básico no início da época seca. Não são os bacalhaus, chouriços e azeite que fazem mossa, a culpa é dos livros, cartonados. A menina do check in é intransigente: ou paga o excesso a 9 euros por quilograma ou a bagagem não é expedida.

É aí que intervém o providencial Abudu, experiente nestas coisas da carga em excesso. Alivia-se da mala que vai no porão e sobrecarrega-se na carga que vai nas espáduas do Tangomau, é ele que decide quando as malas já estão no tapete rolante. O Tangomau protesta, a proposta do Abudu é inadmissível, há uma pasta que vai ajoujada com papéis e os livros do costume, endereços, cadernos e canetas, na mão esquerda, qual Lusíadas, sobraça a prenda mais preciosa que segue para a Guiné, as cartas da Guiné portuguesa em 1:50.000, a prenda que Humberto Reis depositou nas mãos do Tangomau e que vai ser transferida para o INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa, o verdadeiro arquivo nacional da Guiné-Bissau que foi profundamente vandalizado durante o conflito político-militar de 1998-1999.

Não querendo adiantar os factos, foi nas instalações do INEP que ficaram as tropas senegalesas, as baterias da Junta Militar despejaram algumas canhonadas sobre o edifício e os garbosos senegaleses aqueceram-se com fogueiras em que a matéria-prima era documentos de inegável valor histórico… pois bem, o saco que vai na outra espádua tem já peso exorbitante. É aí que Abudurramane Serifo Soncó dá uma lição admirável a quem protesta, furtando-se a ser burro de carga:

- Aquela menina é uma malvada, tu até lhe mostraste a capa dos livros, se ela tivesse bom coração nem ameaçava com multas. Tu vais levar os livros todos, há uma grande expectativa a rodear a tua viagem, arrastas os sacos até entrar no avião, pensa nas alegrias que vais dar aos outros.

A advertência sortiu efeito, o Tangomau rilhou os dentes, comeu umas coisas para enganar a fome, foi apresentando o passaporte aqui e acolá, atirou o corpo para uma cadeira e começou a ler “O Nosso Jogo”, de John Le Carré. Sim, leva dois livros de John Le Carré, este e o que acaba de sair, de título “Um Traidor dos Nossos”. “O Nosso Jogo” é uma obra-prima. Há muito que o autor do clássico “O espião que veio do frio” reciclou as temáticas da Guerra Fria, agora os problemas são do mundo confuso e turbulento e multipolar: vamos ser confrontados com conflitos étnicos acirrados por potências que pretendem debilitar a Mãe Rússia; vamos ficar chocados com os actos criminosos de certa indústria farmacêutica que não olha a meios para testar novos medicamentos usando populações em abuso de fraqueza para chegar a novas combinações; vamos acompanhar a manipulação dos serviços secretos que preparam uma cilada envolvendo velhos espiões para agitar o papão do terrorismo talibã… Em “O Nosso Jogo”, dois espiões reformados vão aparecer no barril de pólvora do Cáucaso, é a luta do povo inguche contra a Rússia e a Ossétia.
Até Bissalanca, o Tangomau vai saboreando a trama urdida por Larry Pettifer que arrasta o seu amigo Timbo até ao sacrifício supremo. Na pasta, leva outras preciosidades. Por exemplo, “O Poder e o Povo”, de Vasco Pulido Valente.

O avião acaba de poisar, o hangar de Bissalanca está iluminado e vai acolher quem chega.


2. Os trâmites da viagem passaram pelos seguintes procedimentos: encontrar um agitador encartado que convoque todos os antigos soldados caçadores e milícias: o Fodé Dahaba aceitou a incumbência, melhor trombeteiro não há; encontrar uma alma caridosa que desse cama e mesa na região de Bambadinca: o embaixador Inácio Semedo e o Eng.º Fernando Semedo embarcaram na aventura, o Tangomau vai aboletar-se no Bairro Joli, premonitoriamente em frente da bolanha de Finete e com vistas desafogadas até Chicri e Mato de Cão; até o embaixador de Portugal na Guiné-Bissau promete apoios, o Tangomau tem pela frente viagens por bairros ínvios, esconsos, labirínticos: Bairro Militar, Bairro Bissaque, Bairro Missirá, Bairro Quelélé…; camaradas da Guiné fazem pedidos desordeiros: entregar envelopes às antigas lavadeiras; um senhor de Mansambo, Lorde Torcato, pede informações sobre gente no eixo Bambadinca-Xitole; um anarca, de nome Jorge Cabral, quer estimativas na compra de uma morança em Finete, obra asseada, chapa de zinco com forro de cibes, duas janelas à frente e duas atrás, cozinha e casa de banho, de preferência com vista para a bolanha, o Tangomau é mandatado para descobrir um construtor e negociar o terreno com o chefe da tabanca local; anarca assumido e poeta dissimulado, esse tal Jorge Cabral demanda que vá a Fá e mais tarde proceda a um relato… mas há mais pedidos, alguns aparentemente inocentes que o Tangomau pagará com língua de palmo: por exemplo, o Humberto Reis, a quem chamam o cartógrafo-mor, manda uma carta para um tal Zeca Braima Sama, o dito Zeca depois quer entrevistas, ele faz agit-prop em Bafatá, este Tangomau veio mesmo a calhar, um encontro de sexagenários que foram combatentes não é notícia que se dê todos os dias, depois o rumorejar vai até à RTP África. Não vale a pena dissecar a torrente de acontecimentos, eles irão ser perfilados, de acordo com a calendarização prevista e as inúmeras situações imprevistas. Fiquemos por aqui, já estamos na madrugada do dia 18, o senhor Sabino, da embaixada de Portugal, majestoso no porte e dotado de um português bem cadenciado, ajuda-o a pôr os cerca de 40kg dentro de um Land Rover e vai encaminhá-lo para a Pensão Lobato na Pansao N’Isla, que no passado era a estrada que unia o Bissau Velho a Santa Luzia, o Quartel-General.


3. O que é que há a destacar e que começa a gravar-se na memória perdurável? A lufada de um vento quente com os seus aromas peculiares: as acácias floridas, os odores putrefactos devido aos gafanhotos mortos, deve também haver umas gomas e resinas que rescendem odores acres, e tudo misturado é aquele calor de estufa nocturna, o Land Rover afoita-se pelas dezenas de milhares de buracos dessa estrada só iluminada pelos faróis das viaturas, já perto de Bissau há o movimento das discotecas, passa-se pelo espectro do HM 241, chega-se à Chapa Bissau, para o lado esquerdo temos o Bairro Caracol, por aqui pode descer-se até ao Quartel-General, para a direita temos o mercado de Bandim, a Mãe de Água no alto do Crim, àquela hora está tudo adormecido, com tudo é permanente a zanguizarra dos grilos. E depois de muitas sacudidelas e fintas dentre o alcatrão esburacado chega-se à Pensão Lobato. O Tangomau é recebido por algumas baratas, uma ventoinha ruidosa que lembra a do filme Apocalypse Now. São três da manhã, a pele já está empapada de suor, põe-se o despertador para as 8, não há leituras para adormecer, a pituitária acomoda-se aos cheiros e o Tangomau lembra aquela primeira noite de Missirá, já lá vão 42 anos, em que tudo estranhou e até sorriu antes de adormecer a pensar como aquela comissão militar passou depressa, mas não fugazmente. Fez uma jura a si próprio: o primeiro dia em Bissau irá ter parecenças com a experiência vivida em 29 de Julho de 1968, o dia da descoberta da cidade. Puro engano, como se vai ver a seguir, com a máquina digital na mão vai percorrer os escombros do palácio presidencial, passará bem próximo do que foi o museu da Guiné (agora chamado Primatura ou escritório do Primeiro Ministro), também na Praça dos Heróis Nacionais, segue-se a descida da Avenida Amílcar Cabral, a UDIB, o Hotel Portugal e a primeira grande, grande comoção: a Pensão Central onde a D. Berta o vai acolher de braços abertos.
(Continua)

Comentário: Meu querido Jorge Cabral, ao percorrer o mercado de Bambadinca (no antigo Bambadincazinho ), fui abordado por Dungo Queta, que perguntou por ti. Sei que vais ficar muito magoado com o obituário. Entreguei uma folha ao Dungo e pedi-lhe para fazer uma lista da malta do 63. Aqui tens. O original será para ti. O que não te posso entregar é a dor de alguns dos teus antigos soldados, desfizeram-se em confissões, pedidos, o mais que sabes. Já tenho o orçamento da tua casa. O “passeio” a Fá não foi fácil. Vou dar notícias, mais adiante.

Estas eram as minhas obrigações para com o Abudu. Acabaram por se multiplicar: o Tumblo, por telemóvel, mandou-me ao bairro Missirá, eu tinha que ir visitar a família, um Soncó tem que partir mantenha logo que chega. Mamadu Soncó estava enlutado, acabara de morrer o seu irmão Quecuta, que conheci em criança. Só o voltei a ver em 1 de Dezembro, pediu-me para trazer um dos filhos para jogar futebol em Portugal.
__________

Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

27 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7347: Notas de leitura (177): Marcelino Marques de Barros, um sábio guineense (Mário Beja Santos)
e
12 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7269: Operação Saudade 2010 (Mário Beja Santos) (5): Páginas de um diário quase improvável, antes de viajar para a Guiné (3) 1 de Novembro