terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7397: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (3): O segundo dia em Bissau

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Dezembro de 2010:

Caríssimo Carlos,
Tenho trabalho em Faro na 2ª e na 3ª feira, volto à escrita na 4ª.
Por favor, não te esqueças de legendar aquela tocante página referente ao Pel Caç Nat 63, o Jorge Cabral não me perdoaria a omissão.
A seguir, vou para Bambadinca, há um lote de sexagenários à minha espera. E depois parto para o território que percorri em todos os sentidos. E irei pela primeira vez aos diferentes territórios do então inimigo, em Madina e Belel, para lá do Poidom e na Ponta do Inglês.

Um abraço do
Mário


Operação Tangomau (3)

Beja Santos

O segundo dia em Bissau

1. Engolido um croissant sensaborão com café instantâneo, o Tangomau lança-se na Pansao N’Isla, há uma luz crua que torna a laterite ainda mais afogueada. Pela primeira vez dá consigo a pensar que cada edifício tem um guarda, habitualmente um idoso ou um jovem segurança, parece ser uma actividade que não predispõe pessoas de meia-idade. A cidade tornou-se insegura, não há empresa ou cidadão com algumas posses que não recorra a um anjo da guarda de assaltos à mão armada. Inflecte novamente para a Praça dos Heróis Nacionais e confirma que as ondulações do monumento que na era colonial foi dedicado “ao esforço da raça” são ocupadas por seres humanos que delas fazem sofá, tal a sombra que oferecem.

Descendo a Avenida Amílcar Cabral, dois quarteirões à frente interpela o segurança da casa do Eng.º Filinto Barros, com quem tem entrevista aprazada. Cerca de 19 anos antes, era o Eng.º Filinto, Ministro da Indústria e dos Recursos Naturais, quando o Tangomau chegou à Guiné para propalar algum ideário básico acerca do consumo essencial e das coisas que se podiam fazer para minorar a degradação das condições de vida. Ao tempo ainda se fizeram uns 6 programas televisivos, tudo acabou na descontinuidade, como é uso e costume. É um reencontro cordial, traz-se uma lembrança, precisamente alguns exemplares do Kikia Matcho, uma pequena jóia literária, o desalento de um combatente do PAIGC que acaba na mais profunda das solidões, ignorado mesmo pelos parentes mais novos. A conversa começa exactamente pela crítica que o Eng.º Filinto faz neste romance à desordem urbana, à exibição anárquica dos lixos e à morte dos jardins. Perdeu-se o culto pelo asseio público, o trivial a escarrar, atirar embalagens, cascas de banana, em qualquer segmento da via pública. O Eng.º Filinto fala do que anda a escrever, mais uma obra de ficção que tem como cenário o conflito político-militar e também um ensaio sobre a política económica do tempo de Luís Cabral.

O que o Tangomau vem propor é que se encontre uma pauta comum, um espaço de diálogo entre antigos combatentes, para se falar das suas visões e experiências quanto à guerra e o Outro, tudo para publicar em livro. Toda a gente sabe o muito que há por fazer: comparar os relatos, nos dois campos, confrontar, se possível, poesia e prosa, fazer recurso às memórias, relatos dispersos, relatórios de operações, o que houver. Do lado do PAIGC, observa o dono da casa, perdeu-se muita documentação e há silêncios consentidos, prudentes. Tem conhecimento de algumas iniciativas, propõe, quando o Tangomau regressar do Leste, que haja um encontro com um dirigente histórico, Chico Bá, que se envolveu num projecto com Mário Cabral e Gil Fernandes e que tem a ver com o cruzamento de testemunhos durante o antes e o após a independência, é um exercício de diferentes experiências.



2. Novamente na Embaixada, recomeçam os telefonemas, é preciso descansar o Fodé, informar o anfitrião do Bairro Joli, depositar as últimas encomendas. E começa a descida para a Baixa de Bissau, primeiro pergunta-se no serviço de impostos se está Mamadu Soaré Soncó, aquele menino que queria vir para Portugal no fim da comissão do Tangomau, em 1970. Não estava, fora ver ao hospital o irmão Quecuta, que estava muito mal. Nas ruas por onde passava era interpelado por muitos jovens, instado a cambiar euros ou dólares por francos CFA. É um ambiente que tresanda aos expedientes de gente sem trabalho. Em frente ao mercado central, parou estarrecido diante de uma porta de ferro presa a cadeado: lá dentro fora tudo consumido por um incêndio, agora o mercado era ali à volta, alfaiates, peixaria, consertos de viaturas, os sapateiros aprimoram calçado com agulhas prodigiosas. O Tangomau pergunta pelo Solar do Dez, alguém indica um local onde agora funciona uma discoteca.

A temperatura sobe, a garrafa de litro e meio, encetada nos alvores da manhã, está quase vazia. Segue-se a peregrinação ao local onde funcionou o Comando da Defesa Marítima da Guiné, foi ali que o Tangomau avistou o comandante Teixeira da Mota, em 1969. Pede licença para tirar uma fotografia à guarita, que se mantém ajanotada. Seguem-se prolegómenos de consulta, vem um oficial de dia que autoriza o registo.

Quando se despedem, ele aborda o Tangomau: “Não tens aí 5 mil francos para mim?”. O interpelado não esconde o horror da pergunta, e foge em direcção ao Pidjiquiti e daqui sobe até à Pensão Central onde o aguarda uma deliciosa canja de ostra, uma boa posta de sereia com batata cozida e duas rodelas de papaia ao ponto. Sente-se sonolento, olha tristemente a laterite que se colou aos sapatos, coça as canelas, é por que as poeiras vão subindo à procura do suor pegajoso. Vai para a varanda e lê umas páginas de “O Poder e o Povo”, de Vasco Pulido Valente, não sabe a que propósito é que trouxe este ensaio demolidor sobre os fiascos do 5 de Outubro, vem ali a história do Partido Republicano Português que não se conta habitualmente nas escolas, também ali se demonstra, preto no branco, que houve mais perseguições e desordem na I República que nos tempos da Monarquia.

E adormece, foram os minutos reparadores, pelas três da tarde apareceu o Delfim Silva, segue-se um encontro em que se fala sobre a historiografia do PAIGC, o antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros faz observações sobre essas lacunas, a conversa centra-se sobre o que se passou na Guiné e no PAIGC entre 1973 e 1974. O Delfim deixa o Tangomau no INEP, ele vai dar aulas ali perto, Mamadu Jao, o director, mostra-se receptivo a apreciar uma proposta de investigação em torno das memórias do lado português e guineense, durante a luta armada e pós-independência, investigadores não faltam, o que é cada vez mais minguado é o financiamento dos projectos.

No regresso, o Tangomau mete-se na confusão do mercado de Bandim, pergunta por panos manjacos, foi um insucesso total. É nisto que passa Mamadu Jao, vai a caminho da cidade, dá-lhe boleia, deixa-o à porta do cemitério. O calor não abranda e não se vislumbra a chegada do fim do dia. O talhão dos combatentes está limpo, alguém no cemitério explica que andaram por ali a fazer limpezas à volta do 1 de Novembro. Ele ciranda em torno doutro talhão, correspondente às campanhas de pacificação, ali ao menos há um monumento condigno, não percebe porque é que os soldados mortos durante a guerra colonial não têm direito a um monumento, uma qualquer evocação.

Reza por todos os mortos e sai para a torreira do sol, contorna a Amura, conversa com uma sentinela, não vale a pena insistir, não se pode entrar naquela área militar, mesmo para ver o túmulo de Amílcar Cabral. Mais abaixo, procura vestígios do restaurante Pelicano e o que ali encontra, sem exagero, são escombros. Atónito, interroga os passantes, é tudo muito difícil, são dadas algumas respostas breves em crioulo, dá para entender que o Pelicano caiu para nunca mais se levantar. Agora é que o Tangomau se sente descorçoado, sobe a Pansao N’Isla à procura de um duche na Pensão Lobato.


A casa de banho está na mesma. Brunido e penteado de fresco, parte à procura da janta. Entra no restaurante Jordani e pede dois ovos estrelados com batatas fritas. Regalado, numa cidade sem iluminação, com os passeios aos altos e baixos, saltita ao sabor dos fogachos dos faróis. Pega no Pulido Valente e lê mais umas páginas, são greves, ajustes de contas, perseguição de padres. Vai adormecendo, embalado pela certeza que amanhã chegará a Bambadinca.
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Nota de CV:

Vd. postes de:

4 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7379: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (2): O primeiro dia em Bissau
e
5 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7384: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (1): Dias 18 e 19 de Novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7396: (Ex)citações (117): Transição da Soberania da Guiné, Idiotas e Ressabiados (José Brás)

1. Mensagem de José Brás* (ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68), com data de 6 de Dezembro de 2010:

Carlos, meu amigo
Junto-te aqui mais um texto, desgraçadamente mais uma vez, não de raiz de origem minha, mas enxerto em árvore de outro homem do pomar.
Naturalmente que espero que uses o espaço e o tempo para a edição de forma a que não ocupe eu o que é colectivo.

Um abraço
José Brás


TRANSIÇÃO DA SOBERANIA NA GUINÉ
Idiotas e Ressabiados


Sinceramente gostei da desassombrada franqueza do nosso camarigo editor do blogue, na declaração contida na sua entrada sobre o render da bandeira portuguesa em Mansoa.
E por ter gostado, transcrevo dela a parte que mais gosto e construo outra peça em três partes e um epílogo, garantindo desde o meu agradecimento e o abraço de camaradagem que nos une na Tabanca Grande


I.ª PARTE

Sou leonês, juro aqui solenemente, que sou leonês dos sete costados, fiel a Afonso VI; Rei de Leão e Castela, e com ele profundamente envolvido na luta pela expulsão deste meu território cristão que se estende desde as faldas dos Pirinéus, até ao extremo limite do mar Atlântico a Oeste e a Sul, após dezenas de batalhas e escaramuças com primos e irmãos pela posse e domínio completo desta nossa Hispânia imperial, junta no esforço e no sangue de tantos heróis guerreiros e legitimamente una sob a bandeira de nosso reino e de nosso senhor.

E crendo nisso acima de todas as coisas, crenças e pretensões, revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de chamados portucalenses, que, ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias estrangeiras, querelas entre bispos e chefes de condado, separadores daquilo que a nossa luta havia juntado com tanto sacrifício.


E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de Leão e Castela.


II.ª PARTE

Juro que sou sarraceno, árabe crente profundo do islão, cavaleiro servindo desígnios de Tárique e no esplendor de seu nome, o tarifado Al-Andaluz, território que se estende desde os limites das Astúrias até até ao extremo limite do mar Atlântico a Oeste e a Sul, após dezenas de batalhas e escaramuças entre irmãos árabes e Califas pela posse e domínio completo destas terras nossas por conquista a duras custas em sangue e morte que são parte integrante e natural da expansão muçulmana pelas terras a norte de nosso mar.

E crendo nisso acima de todas as coisas, crenças e pretensões, revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de seguidores do visigodo Pelagio que, ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias de cruzados estrangeiros e cristãos, assaltantes de nosso território sagrado e do islão profundo.

E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de meu povo sarraceno e de meu Deus supremo.



III.ª PARTE

Nobre romano me confesso, comandante de legiões que atravessaram e conquistaram largos territórios, dominando gálios e saxões, subindo e descendo serras até essa longínqua Ibéria que se estende dos cumes pirenaicos até ao extremo limite do mar Atlântico a Oeste e a Sul, após dezenas de batalhas e escaramuças com povos bárbaros, Tartessos, Cónios, Celtas e, sobretudo, com uma aguerrida tribo de lusitanos comandados por Viriato, consolidando a Oeste o vasto e natural e amado Império Romano.

E crendo nisso acima de todas as coisas, crenças e pretensões, revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de seguidores dos povos do Islão que, ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias africanas e de deuses estrangeiros e pagãos em prejuízo de nosso direito territorial e de César.

E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de Roma Imperial



FINAL

Eu Português me confesso, transmontano, beirão, algarvio, descobridor de novos mundos, cruzador de mares e de terras, pioneiro, bandeirante, pacificador de negros e de índios, construtor do vasto Império que se estende da Península Ibérica pela costa de África, pelo Oriente até à longínqua Índia e pelo Poente ao Brasil e outras partes, com o extremo sacrifício da Coroa portuguesa, de marinheiros, cavaleiros e infantes; pela dor e morte de tantos e tão ousados heróis, submetendo terras, povos e bens ao domínio português e ao ensino do cristianismo.

E crendo nisso acima de todas as coisas, crenças e pretensões, revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de seguidores dos povos das colónias, que ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias de liberdade e do direito dos povos, de Tiradentes e do Imperador D. Pedro, da rainha Ginga, de Gungunhana e tantos traidores aos supremos e naturais direitos da Corôa portuguesa sobre estas terras de Vera Cruz, Moçambique, Goa, Damão e Diu, Angola e Guiné.

E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de Portugal.


Devo esclarecer que me dei a este trabalho desajeitado e historicamente não muito rigoroso e sem preocupação com o rigor histórico, apenas porque fiquei sem saber em que faixa me cabe, se a dos idiotas, se a dos ressabiados, desorientação que a mim muito penalizaria por aqui estar sem astrolábio, nem sextante, nem bússola, nem GPS.

Ao Magalhães Ribeiro, ao menos pela sua franqueza, pretendo homenagear e abraçar como camarigo e amigo para sempre, sejam quais forem as diferenças que aparentemente nos separam sobre esta questão…apenas.

José Brás

OBS:- Negritos e itálicos da responsabilidade do editor
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 6 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7389: (Ex)citações (116): Ainda os Mig... e outras coisinhas (José Brás)

Guiné 63/74 - P7395: História de vida (35): Viagem para o desconhecido (Agostinho Gaspar, ex-1º Cabo Mec Auto Rodas, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612, Mansoa, 1972/74)

1. Texto, enviado em 2 do corrente, pelo nosso camarigo Agostinho Gaspar,ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), natural do concelho de Leiria, e membro da Tabanca Grande e da Tabanca do Centro:

Recordar o passado, viagem para o desconhecido

Caros amigos editores e tertulianos:

Depois do último jantar no R.I. 16, em  Évora, do dia 4 para 5 de Outubro de 1972, o Tenente João Manuel de Matos e Silva Mendonça chamou os aspirantes, os cabos milicianos e alguns soldados para a entrega dos galões, das divisas, das promoções a capitão, alferes, furriéis e 1ºs cabos. Foram horas de azáfama.

Depois de se ter entregue e feito o espólio pertencente ao quartel, já com as malas feitas e as últimas recomendações, chegou a hora da partida para um destino desconhecido, que só nos bancos da escola primária, dez anos antes de embarcar, tinha ouvido falar: era a Guiné.

Depois de receber uns certos papéis, guias de embarque e boletins de vacina, para que na hora não faltasse nada, o 1º sargento chama o capitão e avisa que há um militar que também era cabo e ia ser acompanhado sob escolta até a entrada do embarque. Eu,  que era o último dos cabos, o 1º sarg. Miguel que já faleceu no ano passado, vira-se para mim e diz:
- Ó nosso cabo,  tu e outro vão acompanhar e fazer segurança a um preso, é preciso que levantem armamento, quando o preso estiver em lugar seguro as armas serão entregues aos condutores dos nossos transportes.

Depois de ouvir o sermão e de ter acabado de falar , chegou a minha vez de falar, recordo ainda as palavras como se fosse hoje:
- Ó meu primeiro-sargento Miguel,  eu nem pertenço a esta guerra e muito menos sei mexer em armas e fazer segurança.

O capitão que estava ao lado vira-se para mim e pergunta-me quem eu era:
- Sou o cabo mecânico da companhia -  respondi.

A resposta dele foi bem clara:
- Tens razão, é melhor ser um atirador ... - Palavras e ordem tão sensatas e que alívio… Tinha chegado á companhia semanas antes e não conhecia ninguém e já o sargento me estava a meter medo e em sarilhos se corresse alguma coisa mal.

Tudo preparado, as bagagens carregadas nas viaturas, dia 5 de Outubro de 1972, era uma noite de chuva e bastante fria,  pela uma da manhã, eu já com vinte e dois anos feitos em Abril, entrámos para as viaturas com o destino a Figo Maduro, aonde um Boing 707 da Força Aérea estava á nossa espera, com uma pequena paragem pelo caminho para esvaziar a bexiga para o avião ficar mais leve.

Chegámos pelas seis da manhã, alguns familiares já se encontravam para as últimas despedidas, da minha parte não tinha ninguém, já as tinha feito em casa. Pelas sete o altifalante começou a chamar um a um pela ordem de embarque para fazer o check-in, entregar as bagagens e receber o número do lugar. Fui um dos primeiros, a minha cadeira o nº 13C, do lado esquerdo. No 13A ao lado janela ia o cabo Silva Ribeiro (o Padeiro), no13B, ao meio, o furriel mecânico, no 13C a minha pessoa,  cabo mecânico.

Mais uns tempos de espera e os últimos abraços e beijos aos familiares: pais, esposas namoradas, filhos e amigos. Por volta das nove horas novamente os altifalantes anunciavam o embarque, silêncio total, iam chamando, o pessoal ia entrando, ocupando os lugares destinados. Depois de estarem todos sentados, porta fechada, era um dia de Outono chuvoso e frio, íamos bem agasalhados, mal sabíamos que nós que passado algumas horas estaríamos a ser sufocados por altas temperaturas.

Com o roncar dos reactores, o avião começou a movimentar-se para a pista, era o meu baptismo de voo... Ao longo de toda viagem era um silêncio total. Foi servida uma refeição. Quatro horas depois chegámos a Bissau, quando o avião parou só passado mais de quarenta minutos é que abriram a porta e nós a olhar pelas janelas,  tudo aparecia diferente e estranho de ver, as pessoas em mangas de camisa e calções, e a nós só nos faltava o sobretudo.

Quando saímos da porta para fora, ao descer as escadas do avião perecia que íamos para o inferno, não sei se existe… (mas o verão quente de 73, passei-o no inferno de Gadamael, mas esta história fica para a próxima).

Ao sair do avião fomos recebidos por um graduado, não tenho a memória de quem era. Formados em parada na pista, veio  a dar-nos as boas vindas para o nosso calvário. Na maior força do calor o oficial falava, nós sem perceber o que ele dizia e a tropa a secar e a assar ao calor, e alguns até desmaiaram.

Acabadas as cerimónias militares, as viaturas rumam ao Cumeré para uma estadia de algumas semanas. Dentro do quartel, ainda em cima das viaturas, fomos recebidos pela praxe, "Pius pius pius"...Eram os da 2ª CCAÇ do nosso BCAÇ 4612/72, tinham chegado dias antes e já se consideravam velhinhos!

Um abraço aos amigos tertulianos

Agostinho Gaspar (**)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 3 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6100: Tabanca Grande (211): Agostinho Gaspar, ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74 (Agostinho Gaspar)

(...) Sou o Agostinho Gaspar, moro na Boa Vista, Leiria e fui 1.º Cabo Auto Rodas da 3.ª CCAÇ/BÇAÇ 4612/72, que esteve em Mansoa.

Não venho falar de guerra, mas sim do tempo de tropa do meu serviço militar. No meu pensar, classifico os que fizeram a tropa em três classes: felizardos, felizes e infelizes, no meu caso, devo estar no grupo dos felizes.

Em 1970 fui à inspecção militar, nos editais da freguesia contavam (19) dezanove nomes, mas no dia (das sortes) compareceram somente onze (11), os outros já tinham passado a fronteira, uns com família, outros sem família, e a viver nos arredores de Paris.

Fiz a recruta em Janeiro de 1972, na CICA 4, em Coimbra, passei para EPSM, Sacavém, onde tirei a Especialidade de Mecânico, estagiei no RI 7 de Leiria. (...) Terminado o estágio, novamente na EPSM durante a semana iam chegando os estagiários do meu turno de vários quartéis, no final mês de Agosto, fim-de-semana sai na ordem de serviço as mobilizações… dos cento e poucos do meu curso, metade estava na lista para a Guiné, e eu fui deles! Calhou-me na rifa o BCaç 4612/72 que estava a formar no RI 16 em Évora, outros foram para várias unidades que embarcaram na mesma altura. A 5 de Outubro de 1972 rumei nos aviões da TAM com destino a Bissau. (...)


(**) Último poste desta sérei > 15 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7285: História de vida (34): Do Cunene a Gadamael ou as (des)ilusões do Portugal plurirracial e pluricontinental... Para o Cherno Baldé, com apreço (José Gonçalves)

Guiné 63/74 – P7394: Controvérsias (113): Direito de resposta ao P7392 (Magalhães Ribeiro)


1. Camarada Vasco da Gama é na qualidade de membro desta Tabanca Grande, que eu Eduardo José Magalhães Ribeiro, ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74, Cumeré/Mansoa/Brá – 1974, respondo às dissertações que expuseste no poste P7392. 




Isto era escusado amigo Vasco da Gama, tens os meus números de telefones, telemóvel e e-mail, podias muito bem ter-me ligado (como já o tens feito muitas vezes) e esclarecíamos tudo intestinamente, mas há sempre uma tendência para o mediatismo (instintiva) e a reacção a quente (do mesmo modo) nestas coisas, não é?
Palavra de Honra, que o P7392, foi bom e oportuno para eu conhecer melhor o pensamento e poder interpretativo de mais alguns camaradas (só por isso valeu apena) e só vou responder porque partiu de ti, que considero um Amigo.
Outro qualquer mandava-o para aquela parte e pronto! Além de que: “Quem não se sente não é filho de boa gente.”, e eu sou!
Não percebo como interpretaste o meu texto, pois recebi diversas mensagens e e-mails, de quem gostasse e compreendesse o que eu escrevi. Aproveito a oportunidade para a estes últimos apresentar o meu muito obrigado.
Assim não foi e então aqui vão algumas explicações:
“… as letras garrafais… ” é um pequeno destaque no texto, em letra minúscula, expressando o meu pensamento e isso, que eu saiba em informática, não é ofensivo para ninguém.

“… apelidar alguns camaradas ex-Combatentes de ignorantes, de ressabiados, de fantoches apalhaçados, de idiotas, de serventias lacaias, que deturpam factos e acontecimentos porventura fatais à lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais”, temendo que esses “tipos” deturpem a História de Portugal…” os exemplos deste tipo de gente são tantos, tão conhecidos e objecto, ciclicamente, de tantas críticas em todos os média e até aqui no blogue, tão lidos, debatidos e falados, que quanto a esta matéria está tudo dito!

“... se calhar, apenas e só, por não pensarem como ele.” estou-me marimbando que muitos não pensem como eu sobre estas matérias, como noutras, pois eles, com certeza, marimbar-se–ão também para as minhas.

“Não, não gostei de ler esta introdução e entristeceu-me a linguagem utilizada, eventualmente porque serei ignorante no seu entendimento…”, onde é que isso está escrito Vasco? Repito onde é que isso está escrito?
O 25 de Abril ou como eu gosto de escrever 25A74... eu estive nele de G3 na mão, no RI15 – Tomar -, estava mobilizado para Guiné (há postes no blogue onde estão documentos meus comprovativos e tudo).“… de Angola…”, só conheci os meus tios que trabalharam no duro em Luanda e arredores, investindo todos os centavos ganhos naquela terra em pequenas lojas, para no pós 25A74, retornarem a Portugal apenas com roupa que tinham vestida. Os que enriqueceram podem ser muitos mas eu não me relaciono com nenhum, nem me interessam para nada.

“A “nossa” Guiné, é por ela que o nosso Blog existe, ocupava o lugar n.º 175 entre 177 países no que ao índice de desenvolvimento humano diz respeito (é o terceiro pior país do mundo para se viver), tem uma mortalidade infantil de 200 por mil e um Produto Interno Bruto (P.I.B.) inferior à facturação anual de várias empresas portuguesas.”, lamento muito, sinceramente, mas a culpa, já lá vão 36 anos, é de quem? Repito de quem?

“Escolherás o saco onde me catalogarás, mas deixa-me dizer-te que em minha opinião os maiores amigos da Guiné são os nossos camaradas combatentes, tenham feito a guerra por amor à pátria ou obrigados, como foi o meu caso.”, pois eu também sou e tenho ido, até hoje, a TODOS os encontros, aqui em Matosinhos, que têm tido por fim ajudar a Guiné-Bissau, juntando-me aos nossos solidários Camaradas como o Zé Teixeira.

“Não os insultes!”, a minha resposta é QUÊ???????????????????????????? Insultei quem????????? Fica “ressabendo” que eu integro há muitos anos a esta parte duas associações de ex-Combatentes, onde continuo a ajudar, sempre que posso, mais destes Homens que tu jamais ajudarás em dias de vida! Por exemplo, ainda a semana passada quase vi falecer o nosso bom e leal Camarada Alfredo Dinis, no IPO do Porto, tendo-o visitado sempre que pude!

Isto era escusado amigo Vasco da Gama!
Era escusada a tua completa desinterpretação das minhas palavras e esta fissuração na nossa amizade!

Um abraço,
Magalhães Ribeiro
ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:

23 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 – P7320: Controvérsias (111): Copá: Quero aqui repor a verdade dos factos! (António Rodrigues, ex-Soldado Condutor Auto do BCAV 8323) 


segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7393: Efemérides (56): Cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné (2) (Magalhães Ribeiro)


1. Dando seguimento à serie iniciada no poste P7388, continua-se a publicação de várias fotos e documentos alusivos à cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné, que fazem parte do acervo pessoal do Eduardo José Magalhães Ribeiro, fui Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74, Cumeré/Mansoa/Brá – 1974. 

Camaradas,

Como já disse no poste P7388, esta matéria sobre a cerimónia simbólica da transição da soberania nacional na Guiné, para o P.A.I.G.C., devido ao seu peso informático (40 fotografias e 2 documentos históricos) teve que ser dividida em 5 postes, que vou tentar colocar durante esta semana, para que, aquelas 
pessoas que acompanhem a leitura, não percam a sequência de factos e fotos.

Sempre que eu escrevo alguma coisa neste blogue alguns camaradas dão pulinhos. Como o balanço é muito favorável, registo o meu apreço e agrado pelos vários e-mails e comentários criticando positivamente este meu trabalho e agradeço aos outros que leiam, outra vez e calmamente, o que eu escrevi (se quiserem). Ali não há nada escondido, nem sequer entrelinhas. É directo, sincero e é aquilo que eu penso. Não retiro dali uma vírgula! Quem quiser pode sempre conversar comigo pessoalmente, ou via e-mail, sobre as matérias por mim desenvolvidas.

O fim do Império português na Guiné 


Hoje publicam-se mais 10 fotos da referida cerimónia, que aconteceu em 9 de Setembro de 1974 – aquando da entrega do aquartelamento de Mansoa ao P.A.I.G.C. 
  
Nesta foto pode ver-se a malta da família Sá que esteve presente na cerimónia. Da esquerda para a direita: Maria idília , Miloca e Zita, Fernanda Sá (de óculos com uma bandeira artesanal na mão), Maria Emilia (mais atrás), Florinda, Teresa e Maria Helena (as últimas 3 são irmãs do Antero Sá). 
Ainda a família Sá. Da esquerda para a direita: Emília Maria (Diloca), Fernanda Sá, Helder (o mais pequenito), Emília Maria, Teresa, Zita e Maria Maria Helena. 

O Hélder, o Vitor e o Nuca (filhos da Florinda e Teresa Sá)

Aspecto do povo antes do início da festa. À direita pode ver-se o Alf Mil Oliveira Marques

À esquerda os pioneiros do PAIGC, de frente está o Alf Mil OpEsp Vitor e, à direita, o pessoal a da CCS devidamente formada

Aspecto do pessoal da CCS em sentido

Os guerrilheiros representantes do PAIGC (curiosamente só falavam francês)

Os guerrilheiros do PAIGC marchando para tomar as suas posições

Os guerrilheiros do PAIGC nas suas posições

O Comandante do Batalhão, o BCAÇ 4612/74, ten cor António da Costa Varino; o  Comissário Político do P.A.I.G.C.; o 2º Comandante do Batalhão, major Ramos de Campos;  e o Representante do C.E.M.E. do C.T.I.G., o ten cor Fonseca Cabrinha.
Vários comandantes do PAIGC (dos sectores Norte Centro e Sul, segundo me disseram)

(continua)

Um abraço,
Magalhães Ribeiro
ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74

Documentos e fotos: © Eduardo José Magalhães Ribeiro (2009). Direitos reservados. 
__________

Nota de M.R.:

Guiné 63/74 – P7392: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (XII): Sobre a nova Série do nosso Blog “O fim do Império português na Guiné” do nosso camarigo Magalhães Ribeiro



1. Mensagem de Vasco da Gama* (ex-Cap Mil da CCAV 8351, Os Tigres de Cumbijã, Cumbijã, 1972/74) , com data de 6 de Dezembro de 2010:

Junto anexo mais uma Banalidade desta feita referente ao post do nosso camarada M.R.

Um abraço para todos.
Vasco da Gama



BANALIDADES DA FOZ DO MONDEGO - XII

Sobre a nova Série do nosso Blog “O fim do Império português na Guiné” do nosso camarigo Magalhães Ribeiro.

Estive na Guiné no período de Outubro de 1972 até finais de Agosto de 1974, a maior parte do tempo passado no Cumbijã, tabanca que havia sido abandonada julgo que em 1966 e que a minha companhia, a Companhia de Cavalaria 8351, companhia independente às ordens do Comando Chefe veio a reocupar nos princípios de 1973, então território de terra queimada sem o mínimo vestígio de gentes mas profusamente atulhado de minas que, pacientemente, fomos levantando até rapidamente termos ultrapassado o quarteirão, entre as antipessoal e as anticarro, simples ou recheadas com mais ou menos armadilha, tarefa que finda nos permitiu colocar duas fiadas de arame farpado para que pudéssemos erguer as nossas “moradias”, nem mais nem menos que as tendas de campanha, cavar umas valas e aguentar firme…

Entre o assalto a Nhacobá, a protecção diária à estrada Quebo-Nhacobá e à estrada Quebo-Buba num período posterior, vivíamos num perfeito isolamento, onde as notícias chegavam sempre atrasadas e onde, juro-vos, nunca ouvi falar de Migs nem de Cop’s nem nunca me deram conhecimento superior de Guidaje nem Gadamael e se o Guileje não nos passou despercebido foi porque os embrulhanços eram perfeitamente audíveis tanto no Cumbijã como em Nhacobá, tão perto e tão longe estávamos dos nossos camaradas da CCav 8350.

Ao chegar a este espaço que é o nosso Blog “Luís Graça e Camaradas da Guiné”, fi-lo sobretudo para aprender com camaradas que vivendo experiências diferentes da minha me completassem o pouco que sabia da Guiné, no seu conhecimento estrutural, também para emitir uma ou outra opinião que ajudasse a escrever a história da Guiné, homenagear os meus queridos camaradas para que os seus nomes não ficassem esquecidos, mesmo dos mármores que vão aparecendo aqui e acolá, se calhar mais em jeito de sossegar consciências de quem “ordena” do que propriamente homenagear os nossos mortos, os nossos feridos, os nossos camaradas que se vão suicidando ou estendendo a mão à caridadezinha.

Só o ler nos princípios orientadores do nosso espaço que aqui “não nos insultamos uns aos outros, que somos capazes de conviver civilizadamente com as nossas opiniões diferentes, sejam elas políticas, religiosas ou outras” encheu-me de alegria tal que de pronto me desinibi para escrevinhar aqui e acolá e comentar esta ou aquela opinião.

Faço-o agora, e de pronto, ao post 7388, não pretendendo beliscar minimamente o interesse documental das fotografias que o M.R. começou a publicar, iniciativa que aplaudo enquanto amante da aprendizagem sobre a Guiné.

Ao ler a introdução à nova série do nosso camarigo M.R. que hoje se inicia onde expressa em letras garrafais, cuja utilização a outros criticou, o conceito “de ultramar português”, para de seguida apelidar alguns camaradas ex-Combatentes de ignorantes, de ressabiados, de fantoches apalhaçados, de idiotas, de serventias lacaias, que deturpam factos e acontecimentos porventura fatais à lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais”, temendo que esses “tipos” deturpem a História de Portugal se calhar, apenas e só, por não pensarem como ele.

Não, não gostei de ler esta introdução e entristeceu-me a linguagem utilizada, eventualmente porque serei ignorante no seu entendimento, e dizer ainda antes de tocar em meia dúzia de coisas, que o 25 de Abril (por extenso, para que todos entendam) é por mim considerado como o dia da Liberdade que devolveu aos portugueses a possibilidade de aqui, ou em outro qualquer lado, discutirem com todo o àvontade o que o regime salazarista nos impedia de fazer, trocando sem medos de espécie alguma os nossos argumentos.

Não foi o 25 de Abril que colocou nas rédeas da governação este ou aquele partido, deu apenas e só ao povo a possibilidade de o fazer, o que há muito lhe era vedado: ir às urnas expressar o dever sagrado do voto, de participar activamente na eleição dos seus governantes.

Escolhemos mal? Culpemo-nos a nós que os elegemos mas deixemos o 25 de Abril sossegado.

Caro Pira de Mansoa, ao teu conceito de ultramar português, faltam algumas coisas, em meu modesto entender, apesar de também conhecer, como tu, muitas famílias
simples e trabalhadoras que, obtido que fosse o passaporte salazarista, para lá, sobretudo Angola, se deslocavam trabalhando no pequeno comércio ou na função pública conseguindo melhor sustento que a pátria salazarista lhes negava.

É que não te podes esquecer das famílias portuguesas que ascenderam a grandes patamares de riqueza à custa do controlo das matérias primas das colónias, não te podes esquecer da exploração da mão de obra indígena, do aproveitamento da escravatura, do absoluto desprezo pelos direitos dos trabalhadores, da inexistência de condições laborais com o mínimo de dignidade, da exploração da mão de obra infantil.

Administrámos territórios que foram “nossos” durante séculos a fio e estamos de mãos lavadas face à situação catastrófica em que a “nossa” Guiné se encontra?
A “nossa” Guiné, é por ela que o nosso Blog existe, ocupava o lugar n.º 175 entre 177 países no que ao índice de desenvolvimento humano diz respeito (é o terceiro pior país do mundo para se viver), tem uma mortalidade infantil de 200 por mil e um Produto Interno Bruto (P.I.B.) inferior à facturação anual de várias empresas portuguesas.

Só mais uma coisa, dizes que os portugueses procuravam uma terra que lhes desse o que não lhes era dado no Continente, justificando assim a sua ida para África…

É verdade.

E o que fazemos nós, os europeus, sim, além de Portugal também a Bélgica, a Inglaterra, a Alemanha, a França etc. foram potências colonizadoras, o que lhes damos em troca aos africanos que procuram aqui apenas e só o sustento que lhes mate a fome?
Impedimos a sua entrada, não com arcos e flechas, mas com armas mais mortais; as do racismo, da indiferença, da miséria, do desemprego ou fechando-os em guetos.

Escolherás o saco onde me catalogarás, mas deixa-me dizer-te que em minha opinião os maiores amigos da Guiné são os nossos camaradas combatentes, tenham feito a guerra por amor à pátria ou obrigados, como foi o meu caso.

Não os insultes!

Do meu Buarcos lindo, hoje carregado de nuvens cinzentas, com as paredes da minha casa brilhantes de humidade, a parecerem-se com a tristeza dos meus olhos, vos deixo, a todos, camarigos um abraço fraterno.

Vasco Augusto Rodrigues da Gama
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 14 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7130: (Ex)citações (101): Sensatez e rigor no Nosso Blogue (Vasco da Gama / José Brás)

Vd. último poste da série de 5 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 – P6675: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (XI): O escritor, o teatrólogo e o atrevido escrevinhador

Guiné 63/74 - P7391: Blogues da nossa blogosfera (40): Amadu Bailo Djaló, agora em Londres: Guineense, Comando, Português (Idriça Djaló)


O Blogue do nosso camarada Amadu Djaló

Há para já três comentários:

(i) Parabéns! É sempre estimulante ver que os Comandos,  que foram criados em Angola no ano de 1963 em Kibala Norte,  fizeram coisas extraordinárias e hoje no Afeganistão são  um exemplo a seguir! Congratulations! Atentamente, F.Gonçalves da Silva, Imigrante Português em Inglaterra.

(ii) I am so proud of my dad, he accomplished so much in life he been through alot. He is the best father in the whole world. Congratulations,  dad,  I love you. Love from your daugher, Assanato Djalo.

(iii)  Meu camarigo (camarada e amigo) Amadu:  Soube pelo teu mano Briote que estavas agora em Londres, ao pé dos teus filhos. Nós estamos bem onde estão os nossos entes queridos. Desejo-te boa estadia e boa saúde. Esse clima não é o melhor para os teus problemas respiratórios. Em contrapartida, tens o carinho e o amor da tua família. Na vida nunca temos tudo. Sei também do teu desejo de ainda voltar à tua terra, à nossa querida Guiné. Vamos manter acesa a chama da esperança. Isso vai concretizar-se, esse teu sonho. Até lá ficamos também a aguardar a publicação do teu 2º livro de memórias. É importante que o completes. Confia no Briote, que tem sido mais do que teu amigo e irmão. E confia em nós, os membros do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, onde tens muita gente que te estima, admira e leu o livro. Deixa-me referir que já tens no nosso blogue 33 referências, ou seja, postes que são sobre ti ou que te fazem referência. Parabéns por este blogue que te abriu o teu filho Adriça. Mas é preciso alimentá-lo... Prometemos vir cá de vez em quando... Um Alfa Bravo (ABraço). Mantenhas para toda a família. Luís Graça

1. Mensagem que o filho do nosso camarada Amadu Dajaló enviou ao nosso blogue através do Virgínio Briote:

Exmo. Sr. Briote,

Antes de mais um Bem Haja.

Sou Idriça Djaló, filho do Sr. Amadu Bailo Djaló [, foto à esquerda].

Gostaria de informar que já abri um email para o meu pai: ABDjaloguicomandoportugues@hotmail.co.uk

E por outro lado já abri um blogue onde pessoas podem deixar comentários. Quem quiser entrar em contacto, com privacidade,  envia um email.

Este é o endereço do blogue:  http://www.guineensecomandoportugues.blogspot.com

Os meus cumprimentos.

Atentamente, Idriça Djaló
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Nota de L.G.:

Vd. último poste desta série > 4 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7222: Blogues da nossa blogosfera (39): Vitor Mendes, marinheiro radiotelegrafista, N.R.P. Orion, 1970/1971

Guiné 63/74 - P7390: Blogpoesia (94): Pesadelo (Manuel Maia)

1. Mensagem de Manuel Maia* (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74), com data de  2 de Dezembro de 2010:

Carlos,
Desculpa que hoje é de rajada.
Aqui vão três sextilhas tituladas como "Pesadelo".

Abraço
Manuel Maia


Pesadelo

De um e outro lado da refrega,
em sofrimento atroz, ninguém o nega,
famílias "vivem" esta guerra horrenda...
P`ra história da Guiné, foi contributo
de esposas, pais, irmãos, pesado luto,
milhares em onze anos de contenda...


A vós, familiares dos contendores,
dum lado e d`outro todos sofredores,
pergunto como estais do vosso luto...
A vós a quem roubaram entes queridos,
na flor da idade, jovens destemidos,
perdidas vidas num fatal minuto...


Tamanho do vazio que sentis,
convosco, nós a quem destino quis
do inferno regressados, partilhamos...
Em quantas noites pesadelo empurra,
de volta à luta tuga versus turra,
e em sofrimento horrível acordamos?

__________

Nota de CV:

Vd. poste de 5 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7383: Blogpoesia (93): Saudades daquele tempo, ou Quisera eu... (9) (Manuel Maia)

Guiné 63/74 - P7389: (Ex)citações (116): Ainda os Mig... e outras coisinhas (José Brás)

1. Mensagem de José Brás* (ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68), com data de 5 de Dezembro de 2010:


Ainda os MIG
E outras coisinhas


Afinal, amigo Graça Abreu, não entendeste o essencial do que escrevi, e isso muito me surpreende, mesmo que admita a minha pouca competência na construção das imagens que quis construir no que disse.
Surpreende-me por te saber homem inteligente culto e sabedor, muito mais do que eu, dentro dos processos de construção da comunicação e, portanto capaz de destrinçar bem mesmo pelo meio do que terei dito com pouco talento.

E vendo bem, o que me parece é que apenas quiseste usar o que eu não disse para dizeres tu o que querias dizer. Quando se quer chegar aí, tu sabes, está sempre à mão o "ardil" do laboratório, bisturi para separar sentenças no meio de um texto, meter lupa para dentro do separado, dissecar e reconstruir de outra forma.

Não te acuso de nenhum crime e nem sequer de ofensa porque esta forma de fazer as coisas e de defender a nossa dama pode até ser positiva no aprofundar de um debate que pretenda entender as coisas, acima de tudo.

Mas vamos por partes, primeiro revendo o que eu quis dizer e o que eu disse; depois, revendo o que tu "pescaste" no meio, a fim de lhe encontrarmos o significado, a intenção e o seu valor objectivo, se isso é coisa que se consiga.

Vamos lá ver, então, ao que eu disse, querendo dizer.

No meu texto podemos descobrir quatro (4) partes que podem distinguir-se com clareza umas das outras:

1.º - O reconhecimento da qualidade do texto do camarigo Tenente General António Martins de Matos, tanto na vertente da análise tão objectiva quanto possível de uma realidade, como no escorreito da escrita usada;

2.º - A constatação de um espírito colectivo de camaradagem dentro da Tabanca Grande, que, sem matar as diferenças individuais, está a permitir um convívio saudável e mesmo um debate mais objectivo e criador, garantindo sempre a possibilidade do abraço;

3.º - A recusa de certas formas de afirmação das diferenças nesse debate incontornável e, mais ainda por afirmações que num curto texto de meia dúzia de palavras, introduzem sem qualquer dúvida conceitos ao reverso do social democrático no entendimento do ser humano na sociedade;

4.º - Uma deambulação pelos conceitos de vitória e derrota nesta caso objectivamente específico, destrinçando a realidade possível no terreno de operações de combate, e a realidade também possível da consequente solução política no caminhar da história dos povos.

E se no primeiro e no segundo casos nem vale a pena dissertar, porque havemos de estar de acordo pleno, já no terceiro e quarto, podendo ou não divergir, e divergindo, possa a divergência ser superficial e parcial ou profunda e total, devemos adiantar mais alguma coisa, pegando no texto do Luís Dias, porque no fundo, foi ele que originou o meu primeiro.

E como o texto/comentário dele é mínimo em palavras, têm, necessariamente de ressaltar duas ou três ideias/força que nele se contêm, não sendo, portanto, abusivo separá-las e comentá-las.

Não conheço o camarigo Luís Dias, não sei do seu pensamento mais profundo sobre a vida e o mundo em geral, nem sequer sobre a questão particular da Guiné.
Por isso e sem nenhum propósito redutor, admito até que tenha dito o que disse, com alguma ligeireza e sem outro objectivo do que o de manifestar apoio ao escrito de Martins de Matos e de renovar a sua convicção pessoal sobre o resultado na perspectiva militar.

Contudo, como sempre ouvi dizer que de boas intenções está o inferno cheio, não me contive sem tocar nas três questões que ressaltam do seu curto escrito.

A - Será desta que alguns deixam de nos impingir a estrondosa derrota militar, que nos estava preparada pelo PAIGC(?)

A esta questão, creio que respondi com objectividade mas, por causa de dúvidas, repito aqui o que disse antes: "devo confessar que nunca ouvi, aqui ou noutro sítio, alguém falar de estrondosas vitórias fosse de quem fosse, a não ser ao próprio PAIGC, coisa que compreendo e desculpo.", crendo que sobre esta questão fica tudo dito e que não vale a pena teimar em acusações apontadas seja a quem for.

B - "FORMA BEM MILITAR"

Que hei eu de dizer aqui, mais do que foi dito, na recusa de uma "forma" militar de estar na vida e outra "paisana". Bem sei que ainda persiste por aí, raro mas persistente aquela velha ideia de que o exército é uma reserva moral da nação, repleta de patriotismo e escola de virtudes. Contudo, todos nós descobrimos pela evidência de tantos exemplos que, não o é mais do que qualquer outra instância da organização da nação, espelho, aliás, da sociedade de onde provém e a que se obriga a servir, como qualquer outra vertente social e política, a educação, a saúde, etc..

Como vês, António, em nenhum lugar contestei a ideia do excelente e oportuno trabalho do camarigo António Martins de Matos, por trambolhões da vida Tenente General e Piloto, mas de tratamento absolutamente lhano e amistoso com todos, sejam soldados ou oficiais superiores, nesta Tabanca em que vivemos.

Antes pelo contrário, admiti e admito, que não sendo para o PAIGC a vida melhor do que para os nossos soldados; estando em minoria no que se refere ao número de homens envolvidos, divididos por etnias e crenças, cansados de anos de luta, morte e sacrifícios, que a luta podia resultar a nosso favor.

Contudo, contestei e contesto que isso significasse uma vitória que ultrapassasse o orgulho e a honra das companhias e dos batalhões em campo, e se pudesse considerar vitória total e definitiva, coisa necessariamente política e administrativa que as companhias e os batalhões têm de servir, porque não são um pais dentro do País.

Camarigo António Graça Abreu, não tinhas então grande material de apoio para o teu comentário, não fora agarrares a questão "Cada um assumindo que a verdade não é coisa só sua, nem necessariamente sua, porque é sempre feita de muitas verdades e de algumas mentiras.".

Achas tu que no caso da Guiné, não é assim porque a verdade histórica é coisa que exclui a mentira como a fundição exclui a escória. Cá por mim não me fiava muito nisso porque sei que a verdade histórica é sempre escrita pelos vencedores e se perdura no tempo, será sempre todo um povo a assumi-la, por mais inverdades que estejam nessa verdade escondidas.

Nem precisaria de ir muito longe e ficava-me pela verdade histórica deste meu e teu País que desde a sua fundação se encheu de mentiras e de verdades e que me enche de orgulho e amor por ela e por este povo que é a minha Pátria.

Um abraço
José Brás

OBS:- Negritos da responsabilidade do editor
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Nota de CV:

Vd. postes de :

4 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7381: (Ex)citações (114): Ainda os Mig... heróis e outras coisas (José Brás)
e
5 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7382: (Ex)citações (115): No caso da Guiné, interessa-me a verdade histórica, a verdade dos factos, o que realmente aconteceu (António Graça de Abreu)

Guiné 63/74 - P7388: Efemérides (55): Cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné (1) (Magalhães Ribeiro)

1. Em conversa com o nosso Camarada Luís Graça, eu havia-lhe dito que possuo no meu espólio documental da Guiné, de várias fotos e documentos alusivos à cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné, onde como sabeis eu, Eduardo José Magalhães Ribeiro, fui Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74, Cumeré/Mansoa/Brá – 1974. Como só agora acabei de ordenar e identificar as fotografias, inicio hoje a sua publicação.
Camaradas,
Esta matéria sobre a cerimónia simbólica da transição da soberania nacional na Guiné, para o P.A.I.G.C., foi já aqui ligeiramente abordada no blogue e vou agora desenvolvê-la na totalidade.
Devido ao seu peso informático (40 fotografias e 2 documentos históricos) terá que ser dividida em 5 postes, que tentarei colocar durante a semana que vem para que, aquelas pessoas que acompanharem a leitura, não percam a sequência de factos e fotos.
Ao iniciar esta série não posso deixar de registar o meu pensamento sobre as origens da guerra, de modo apolítico pois além de não sentir qualquer simpatia, ou nostalgia, pelo regime que cessou em 25A74, também, infelizmente, não me revejo, minimamente, nas palavras, atitudes e procedimentos dos actuais líderes dos partidos políticos da nossa tão mal servida Pátria.
Assim, resumida e pessoalmente, penso que:
O ULTRAMAR PORTUGUÊS ERA UM LEGADO HISTÓRICO DA EXPANSÃO PORTUGUESA, ANCESTRAL, REGADA COM O SACRIFÍCIO, SUOR E SANGUE DE REIS, DESCOBRIDORES, AVENTUREIROS E GUERREIROS, DESTEMIDOS, OUSADOS E VALENTES, QUE PERCORRERAM O MUNDO, LÉS A LÉS, DESCOBRINDO NOVOS MUNDOS, NOVOS POVOS, NOVOS PRODUTOS, MATERIAIS, ETC. E QUE, AO LONGO DOS SÉCULOS, FOI SENDO POVOADO E DESENVOLVIDO POR MILHARES DE PORTUGUESES, OUSADOS E DESTEMIDOS TAMBÉM ELES, À PROCURA DE UMA TERRA QUE LHES DESSE O QUE NÃO ERA DADO NO CONTINENTE, PARA SI E SEUS FILHOS E, ACIMA DE TUDO, MELHORES CONDIÇÕES DE VIDA.
Revolta-me, irrita-me e desgosta-me profundamente, ler e ouvir tanto dislate e tanta burrice em inúmeras declarações de ex-Combatentes, que, ou são ignorantes, ou são ressabiados e, ou, fantoches apalhaçados de certas filosofias partidário-políticas.
E se os idiotas estão perdoados por motivos óbvios, já o mesmo não se pode dizer dos ressabiados que com as suas serventias lacaias, deturpam factos e acontecimentos que, de algum modo, podem vir a ser fatais à honestidade, lealdade e veracidade que se exige nos registos paginais que a esta matéria são, e serão, dedicadas na História de Portugal.

O fim do Império português na Guiné
Pertenci à C.C.S. - Companhia de Comandos e Serviços -, do Batalhão de Caçadores 4612/74, que foi o último batalhão que partiu para a Guiné, e também o último que de lá saiu, em Novembro de 1974, no navio Uíge.
Um dos objectivos deste contingente foi substituir o BCAÇ 4612/72, que se encontrava a prestar serviço há 22 meses na região de Mansoa e a sua última missão consistiu em assegurar a evacuação do dispositivo militar, que se encontrava estacionado naquela ex-província ultramarina portuguesa (cerca de 27 mil homens), e testemunhar alguns factos históricos.
Entre eles vou narrar um, enriquecido com 40 fotografias, que aconteceu em 9 de Setembro de 1974 - a entrega do aquartelamento de Mansoa ao P.A.I.G.C., que incluiu uma muito concorrida cerimónia oficial do último arriar da bandeira nacional e o hastear da primeira bandeira da Guiné-Bissau (simbolizando o surgir de uma nova nação), facto este que, ao mesmo tempo, incluiu a oficialização da transferência da soberania neste território.
MANSOA, 9 de Setembro de 1974
Como é do conhecimento geral, principalmente para aqueles que acompanharam as notícias, após a revolução de 25 de Abril de 1974, sobre a evolução da situação dos conflitos em África, foram quase de imediato iniciadas negociações com os movimentos de libertação, que combatiam as tropas portuguesas e que tem vindo a ser designada, ao longo dos anos, por Guerra do Ultramar ou Colonial (nas frentes de Angola, Guiné e Moçambique).
Assim, após várias reuniões para o efeito foi decidido que na Guiné, o poder administrativo, político e económico, seria transferido para os guerrilheiros do P.A.I.G.C., incluindo-se a cerimónia oficial durante a entrega do aquartelamento de Mansoa, como foi referido no dia 9 de Setembro de 1974.
Estiveram presentes nessa cerimónia; os militares da C.C.S. do batalhão 4612/74 comandada pelo major Ramos de Campos, o CMDT do mesmo batalhão – ten cor Américo C. Varino -, um bi-grupo de combate do P.A.I.G.C., um grupo de pioneiros do mesmo partido, Amélia Araújo (Maria Turra), Ana Maria Cabral (viúva de Amílcar Cabral) e seu filho, vários comandantes dos sectores norte, centro e sul do P.A.I.G.C. e suas mulheres, o comissário político do P.A.I.G.C. - Manual Ndinga e - em representação do C.E.M.E. do C.T.I.G. -, o major Fonseca Cabrinha.
À cerimónia compareceram ainda uns largos milhares de nativos locais, de diversas etnias: papéis, balantas, fulas, futa-fulas, mandingas, manjacos, etc., e umas dezenas de jornalistas de todo o mundo.
A bandeira foi arriada por mim e desta cerimónia possuo 40 fotografias, que me foram oferecidas por um dos fotógrafos suecos.
Este acontecimento foi gravado em filme e pode ver-se inserido na série televisiva: Século XX Português, da SICnotícias – Episódio sobre a “Descolonização”, acompanhado de uma entrevista guiada pelo jornalista Mário Augusto, sobre diversos factos por mim vividos nesse tempo.
P.S.: Segundo vim a saber posteriormente, após a saída do BCAÇ 4612/74 ficaram ainda em Bissau, durante mais algum tempo, dois pequenos destacamentos de tropa portuguesa, um na já ex-BA 12 - em Bissalanca e outro nas instalações que eram da Marinha, colaborando na transição e transmissão de técnicas, conhecimentos e experiências de navegação aérea e marítima, com elementos do P.A.I.G.C.


Anexo à Ordem de Serviço da CCS do BCAÇ 4612/74, do dia 6 de Setembro de 1974, assinado pelo Comandante da Companhia - Capitão António Marques Fontes -, que determinava a distribuição do pessoal de serviço, na entrega do aquartelamento e as respectivas competências de cada um. A mim, um Operações Especiais, tocou-me entregar: a cantina, a arrecadação de géneros e o refeitório, por o vaguemestre ter sido evacuado devido a doença (cirrose).


Eu a dirigir-me para o meu posto e ao fundo pode ver-se a porta-de-armas e a massiva afluência de populares que queria ser os primeiros a testemunhar in locco os factos

O Fur Mil Mec Armamento Fernandes, distribuindo entre os guerrilheiros do PAIGC, várias metralhadoras portuguesas HK-21, para eles montarem a segurança dos seus homens, no quartel, durante a cerimónia

A chegada de uma viatura, proveniente de Bissau, com um grupo de pioneiros do PAIGC


Abertura da cancela da porta-de-armas ao povo


Muitos populares foram contidos à distância e em respeito por alguns guerrrilheiros do PAIGC, podem ver-se à frente os djubis locais


A formação ordenada dos pioneiros (juventude educada e doutrinada) do PAIGC

Dois jovens pioneiros

Duas jovens pioneiras


As mulheres dos comandantes dos sectores operacionais norte, centro e sul do dispositivo militar territorial do PAIGC


Outro aspecto das mulheres dos comandantes dos sectores operacionais norte, centro e sul do dispositivo militar territorial do PAIGC
(continua)
Um abraço,
Magalhães Ribeiro
ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BCAÇ 4612/74

Documentos e fotos: © Eduardo José Magalhães Ribeiro (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P7387: Os Anos da Guerra Colonial (1961-1975), de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (1): Um obra enciclopédica, de 838 pp.


Título: Os Anos da Guerra Colonial (1961 - 1975) (*)
Autores: Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes
Editora: Quidnovi
Local: Matosinhos
Ano: 2010
Formato: Brochado
Nº pp.: 838
Preço de cappa: c. 45€

Infelizmente não pude estar presente, por razões profissionais,  na sessão de lançamento do livro dos nossos camaradas Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, no passado dia 29  de Novembro (*). Gostaria de ter podido lá estar, para dar um abraço a estes dois autores, e manifestar-lhes o meu apreço e o meu respeito pelo seu labor enciclopédico e historiográfico.

Já conheço o essencial da obra, através dos 16 volumes que foram lançados em 2009 pelo Correio da Manhã, sob a chancela da QuidNovi. Mas sei que o livro, de 838 pp.,  traz algumas melhorias (e correcções) em relação à edição anterior,  distribuída em fascículos. De qualquer modo, ficam aqui os nossos votos de sucesso para mais esta obra monumental  de historiografia da guerra colonial que passa a ser de incontornável referência.

O livro conta ainda com a colaboração do historiador catão Joseph Sánchez Cervelló (que conheci em Bissau, por ocasião do Simpósio Internacional de Guiledje, 1-7 de Março de 2008, foto à esquerda, na Amura, com o Matos Gomes; fez o seu doutoramento com uma tese sobre a Revolução Portuguesa e sua Influência na Transição Espanhola, 1961-1976, de que há um livro, em português, editado pela Assírio e Alvim, 1993).A colaboração é ainda extensiva aos portugueses David Martelo, Nuno Santa Clara Gomes, João Moreira Tavares, Sandra Araújo e Dulce Afonso. 

Sinopse

Saber o que aconteceu durante os anos de 1961 a 1975, os anos em que a Guerra Colonial esteve no centro da nossa História, das nossas vidas. Saber o que aconteceu em cada um dos locais onde a guerra foi travada, nas “picadas” mais perigosas, nas “matas” do Norte de Angola e de Moçambique, nas “chanas” do Leste, nas “bolanhas” da Guiné, a bordo de navios e lanchas, de aviões e de helicópteros. Saber o que pensaram os homens que decidiram a guerra, que a conduziram, que a fizeram de ambos os lados. Mas pretendemos também Compreender. Compreender por que foi assim que os factos aconteceram, por que foram escolhidas estas soluções e não outras. Compreender as dúvidas dos homens que tiveram de decidir num momento o caminho a seguir e ajudar a perceber as consequências dessas decisões. É, pois, sobre o Saber mais e o Compreender melhor os anos da Guerra Colonial que trata esta obra.

Sobre os autores:


ANICETO AFONSO

(i)  Coronel do Exército na situação de Reforma; 
(ii) Nasceu em Vinhais em 1942;
(iii)  Fez os estudos secundários em Bragança;
(iv) Concluiu o curso de Artilharia da Academia Militar em 1963;
(v) Cumpriu comissões em Angola (1969-71) e em Moçambique (1973-75);
(vi) Fez a licenciatura em História pela Faculdade de Letras de Lisboa em 1980 e o Mestrado em História Contemporânea de Portugal pela mesma Faculdade em 1990;
(vii) Foi professor de História na Academia Militar de 1982 a 1985 e de 1999 a 2005;
(viii) Foi director do Arquivo Histórico Militar (Lisboa) de 1993 a 2007, integrando vários grupos de trabalho e comissões relacionadas com os arquivos militares, a documentação e a História;
(ix) Foi responsável pelo Arquivo da Defesa Nacional de 1996 a 2007;
(x) É membro da Comissão Portuguesa de História Militar e do Comité dos Arquivos da Comissão Internacional de História Militar, desde 1998; 
(xi) É investigador do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa e autor de várias obras, incluindo O Meu Avô Africano, editado pela Casa das Letras (2009).

CARLOS DE MATOS GOMES  [, foto à esquerda, Guiné-Bissau, Bissau, Amura, 7 de Março de 2008. Foto de L.G.]

(i) Coronel do Exército, na situação de reserva;
(ii) Nasceu a 24 de Julho de 1946 em Vila Nova da Barquinha;
(iii) Fez os estudos secundários no Colégio Nun’Álvares, de Tomar e o curso de Cavalaria da Academia Militar;
(iv) Durante a guerra colonial cumpriu três comissões, em Moçambique, Angola e Guiné, nas tropas “Comando”;
(v) Foi ferido e condecorado;
(vi) Foi auditor do Curso de Defesa Nacional, do Instituto de Defesa Nacional;
(vii) Paralelamente à carreira militar desenvolveu desde 1983 uma continuada actividade literária, tendo escrito argumentos, romances e várias obras de cariz histórico; como ficcionista usa o pseudónimo Carlos Vale Ferraz, entre eles o Nó Cego, considerado já um clássico não só da literatura da guerra colonial, como da literatura lusófona.


Fonte: Adapt. parcialmente de Quidnovi



Lisboa > Centro Comercial Plaza, nas Picoas > Livraria Bertrand  > 30 de Novembro de 2010 > 18,30 h > Sessão de lançamento do  livro “Os Anos da Guerra Colonial, 1961-75”, da autoria dos nossos camaradas Aniceto Afonso e Carlos Matos, editado pela QuidNovi. Na mesa,  da esquerda para a direita: Joaquim Furtado (apresentador da obra), Carlos de Matos Gomes e Aniceto Afonso (autores)

Foto: Cortesia de QuidNovi (página no Facebook) (**)
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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 25 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7332: Agenda Cultural (91): Lançamento do livro Os Anos da Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes, dia 30 de Novembro de 2010 na Bertrand Picoas Plaza, Lisboa (Carlos Matos Gomes)
 
(**) A QuidNovi, com sede em Matosinhos, é  "uma editora especializada na produção de livros e outros conteúdos para venda associada a jornais". Desde a sua fundação, em 1995, a editora tem colaborado regularmente com todos os principais jornais e revistas portugueses.


O sucesso deste projecto  levou a empresa A dar um novo passo, criando paralelamente uma "editora tradicional", orientada para o mercado livreiro. A  QuidNovi surge assim, em 2005, "com esta nova faceta, marcando presença no mercado editorial português, com um catálogo diversificado, onde se tem destacado sobretudo pela colecção de autores portugueses, com vários títulos premiados e muito elogiados pela crítica".