domingo, 14 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14745: Fotos à procura de... uma legenda (54): Marchas populares, marchas militares, tropa-fandanga, tropa-macaca... Qual a diferença ?




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Foto nº 1 


Foto nº 2


Foto nº 3
 

Foto nº 4





Foto nº 5


Foto nº 6


Foto nº 7


Foto nº 8


Foto nº 9


Foto nº 10


Foto nº 11


Foto nº 12


Foto nº 13


Foto nº 14

Lisboa > Av da Liberdade > Noite de 12 para 13 de junho de 2015 > Desfile das marchas populares de Lisboa...


Fotos (e vídeos): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados


1. Confesso que, em 40 anos, a viver e a trabalhar em Lisboa, foi a primeira vez que tive ocasião de assistir, horas a fio, a um desfile destes... Para mais, sentado no chão... Fui acompanhar um casal de sobrinhos do norte, gente gaiteira...

Para não me aborrecer, levei a máquina fotográfica, fiz vídeos e fotos... E depois até me consegui divertir um pouco com as bocas brejeiras e "sexistas", sobretudo,  delas, as mulheres, da assistência, gente popular dos bairros populares de Lisboa que ainda teimam em sobreviver, em Lisboa: "Ai faneca, comia-te todo!"; "A sardinha é liiiiiinda!"; "A tua sardinha é boa, mas ainda melhor é o meu carapau";  "Ai, querido, que vais tão lindo"; "Alfama é que é!"; "Oh!, cameraman, vira o coiso pra cá que a gente também somos filhos de Deus!"...

De regresso a casa por volta da uma e tal da noite, depois de me ter perdido do meu  grupo (, que a confusão era muita, com manga de turistas à mistura!), e visionar as fotos, comecei a pensar na possível relação entre marchas (militares e populares) e expressões como "tropa-fandanga" e "tropa-macaca" (*)...

Os seres humanos "adoram" tanto a "festa" como a "guerra"... E sobretudo precisam da "festa" depois da "guerra"... Sei que a cerveja esgotou na avenida da Liberdade... À uma e tal, quando o exército dos "almeidas" (os "jagudis" de Lisboa), num ápice varreram e  limparam a avenida e as laterais,  de alto a baixo, tive que me contentar com um copo de sangria... E se eu já a merecia uma "bejeca"!

Fica aqui o desafio para o leitor para legendar as fotos, à escolha (**)... se tiver humor e pachorra! Aqui vai uma ajudinha, socorrendo-me da "sabedoria" dos provérbios populares:

"Folguemos enquanto podemos, que noutra hora choraremos" ou "Enchida a pança, vamos à dança"...Ou ainda: "Em mulher de Alfama, homem do mar e relógio das Chagas, pouco há que fiar",,, Ou mas eu adoro é aquele provérbio que garante: "Em Lisboa, nem sangria má nem purga boa"... Também gosto deste: "Se não é no baile que se emprenha, é lá que se engenha".. E deste: "O soldado paga com sangue a fama do capitão"... É verdade em todas as guerras, e foi verdade na Guiné...

E já que o Santo António de Lisboa dá para a brejeirice, tomem lá mais este (que também tem a ver com tropa): "Matrimónio, praça sitiada: os de fora querem entrar, os de dentro querem sair"... Mas não percamos o fio à meada: o mote é mesmo "marchas (populares e militares), tropa-fandanga e tropa-macaca... No meio de tudo isto, fica o povo, que é quem mais... ordenha! (porque ordenar, ordenar, ordena pouco ou nada!, hoje como ontem...). O povo que é que mais... ordenha!,,, E quem mais marcha!... (Sempre foi assim, não foi ?!).

2. Estamos a falar da 83.ª edição das Marchas Populares de Lisboa, que contou com 20 marchas em competição e duas fora de concurso (A Voz do Operário e a dos Mercados) a descerem, como é da tradição,  a Avenida da Liberdade. Vi, na Net, horas depois,  que o bairro do Alto da Pina foi a marcha vencedora... . O segundo e o terceiro lugares foram atribuídos às marchas de Alfama e de  Alcântara, respetivamente.

Coisa que eu não sabia:  as marchas populares de Lisboa são avaliadas numa escala de 0 a 20 pontos em dois momentos, no MEO Arena, e no desfile na Avenida da Liberdade, nas categorias de Coreografia, Cenografia, Figurino, Melhor Letra, Musicalidade, Melhor Composição Original e Desfile,

Por categorias, o Alto do Pina levou ainda para casa o título de melhor figurino e melhor desfile da Avenida. Já a marcha de Alfama venceu nas categorias de melhor musicalidade, melhor composição original, com "Marinheiro de Alfama", e melhor coreografia, neste caso ex-aequo com a marcha da Madragoa. Alcântara venceu na cenografia e a marcha de São Vicente conquistou o título de melhor letra. E para o ano há mais!...

Este ano, as marchas em concurso foram as seguintes: Bela Flor, Mouraria, Santa Engrácia, Marvila, Alfama, Graça, São Domingos de Benfica, Carnide, Madragoa, Benfica, Bica, Alcântara, Bairro Alto, São Vicente, Olivais, Baixa, Lumiar, Alto do Pina, Beato e Ajuda. Como convidados, desfilaram também, na  Avenida da Liberdade,   o Agrupamento de Macau, a Marcha Popular de Faro, a Marcha da Madeira e o Agrupamento CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (de que não tenho infelizmente fotos)... Desfilaram ainda os gloriosos 32 noivos de Santo António.

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Notas do editor:

(*) Origem da expressão "tropa-fandanga".... Recorro ao incontornável Ciberdúvidas da Língua Portuguesa ("espaço de esclarecimento, informação, reflexão e promoção do idioma oficial dos países integrantes da CPLP, via Internet"):

"O termo tropa-fandanga é formado de duas palavras: o substantivo tropa e o adjetivo fandanga.

"Tropa é um termo oriundo do francês troupe, redução de 'troupeau', «rebanho» (final do séc. XII), provavelmente do latim 'turba', «multidão em desordem ou movimento». Começou por designar um bando de animais e uma grande quantidade de pessoas juntas, uma multidão. No século XV, já a palavra era utilizada como designação de conjunto de homens de armas: este significado permanece, coexistindo, ao longo dos séculos, com o de grande quantidade de pessoas. No plural (as tropas), o termo passa a designar essencialmente os corpos militares que compõem o exército, o próprio exército, enquanto no singular tem várias acepções, da qual importa aqui a de «bando, multidão». Por curiosidade, refira-se que esta palavra é da família de trupe (tem a mesma etimologia), que significa conjunto de artistas, de comediantes, de pessoas que atuam em conjunto e, ainda, na gíria coimbrã, um grupo de estudantes trajados dispostos a exercer a praxe.

"A palavra fandanga é a forma feminina do adjetivo fandango, formado do substantivo que designa a conhecida dança popular sapateada, termo este que entra em Portugal, vindo de Espanha, apenas no século XVIII. Pela conjugação da vivacidade da música, do ritmo, do barulho provocado pela dança e dos que nela participavam, o substantivo fandango passa a ser usado, em sentido figurado, na acepção de «balbúrdia». Surge, então, o adjetivo fandango, com o significado de «ordinário», «desprezível», «caricato», registado em dicionários portugueses no início do século XX.

"Cria-se, assim, o termo tropa-fandanga, que significa gente desordenada, indisciplinada, grupo de pessoas que não merecem consideração, gente desprezível.

"Maria Regina Rocha 2 de julho de 2013". [Reproduzido com a devida vénia].



(**) Último poste da série > 3 de junho de  2015 > Guiné 63/74 - P14693: Fotos à procura de... uma legenda (53): Ou le(ge)ndas e narrativas.. à procura de fotos (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14744: Libertando-me (Tony Borié) (21): Glória, a quem chamavam Lola e às vezes Ruça (2)

Vigésimo primeiro episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66.




Glória, Lola, a Ruça (2)

Hoje andamos de bicicleta, passámos pela praia, não vimos a Glória, a quem também chamavam “Lola” e, às vezes, “Ruça”, mas vamos continuar com a sua história, cá vai.

Os anos foram passando, a Glória, que também era a “Lola” e às vezes a “Ruça”, frequentou a escola primária de Castanheira do Vouga, vindo fazer o exame de segundo grau na escola de Águeda, onde obteve a classificação de quinze valores, já estava crescida, começou a ficar com uns peitos saídos, umas ancas largas, as pernas altas, as feições da cara modificaram-se, os lábios carnudos e rosados, o cabelo comprido com as tais madeixas louras, os vestidos já lhe eram curtos, quase toda a sua roupa lhe era curta, estava uma rapariga bonita.

Os rapazes na aldeia diziam:
- A “Ruça”, está boa como milho!

O pai Aniceto, quando ouvia isto, corria com um pau atrás dos rapazes, dizendo:
- “Ruça”, é a burra da tua mãe!

Quase todos os rapazes andavam de olho nela, ela não prestava atenção a nenhum, excepto ao Jorge, filho do ferreiro. O Jorge era mais velho do que ela uns meses, era um rapaz franzino, um pouco envergonhado, não convivia muito com os outros rapazes, pois ajudava o pai, o senhor Silvestre, na forja e, mais tarde, era ele que fazia as contas da oficina de ferreiro, eram só dois filhos, ele e uma irmã mais nova que tinha vindo mais tarde. Andou na escola com a Glória, ficava triste e, às vezes, até se envolvia com os outros rapazes, quando estes lhe chamavam “Ruça”. Não se importava muito que lhe chamassem “Lola”, até gostava, mas “Ruça”, isso não, ficava com alguma fúria e, quando se envolvia com alguém, perdia sempre, acabava por andar sempre com marcas na cara e no corpo, era por isso que não convivia com muitos dos rapazes da sua idade.

Quando se aproximava da Glória, ficava um pouco embaraçado, mas assim que começasse a falar com ela, todo o receio desaparecia, sentia-se muito bem na companhia dela, e ele percebia que a Glória também largava tudo para estar com ele. Iam-se vendo um ao outro, até que certo dia, ela lhe disse:
- Oh Jorge, nós gostamos tanto um do outro, temos que começar a namorar.

Ele, nem a deixou acabar de falar, disse, com o ar mais feliz do mundo:
- Oh Glória, pois tu, já és a minha namorada há muitos anos, não sei se já percebeste, pois eu sinto muitos ciúmes quando algum rapaz olha para ti.

Ela, com ar também feliz, dá-lhe um beijo na face, o que o fez corar. Passaram a ser namorados, a partir dessa altura, aprenderam um com o outro todos os segredos do amor. Tanto o pai Aniceto, como o senhor Silvestre, viram este namoro com bons olhos, só a mãe Madalena, é que ficou um pouco furiosa, pois via que ia perder a “mãe” dos seus filhos. Não perdia oportunidade para a repreender, e às vezes até a ameaçava com pancada se ela perdia tempo a falar com o Jorge e, deste modo, alguma tarefa ficava para trás, noutras palavras, fazia-lhe a vida negra.

Os irmãos, alguns já tinham saído da escola, continuavam a ver na Glória, a sua mãe, chamavam-lhe “Lola”, portanto ajudavam-na, e diziam-lhe:
- Oh “Lola”, vai namorar, que nós fazemos todas as tuas tarefas.

A Glória ficava algumas horas na conversa com o Jorge, o Aniceto e a Madalena, talvez preocupados, com a lida da lavoura, em arranjar o dinheiro para todas as despesas, mais o compromisso do pagamento aos senhores donos das terras que eles cultivavam, não reparavam que a Glória, já crescida, precisava de roupa nova e melhor. Como era a única rapariga na família, pois o último irmão também nasceu rapaz, era a que vestia diferente, alguma roupa que crescia da mãe, uns vestiditos de chita, umas camisolitas e uns sapatitos de lona, comprados na feira, que ao sábado se realizava na vila de Águeda, lá ia andando, ninguém reparava, que como a roupa lhe ia ficando mais curta, mais sobressaíam as virtudes que o criador lhe tinha dado, em outras palavras, quanto menos roupa tinha, mais jeitosa era à vista de todos.


Mas os pais tinham mais com que se preocupar, a Glória estava em casa para trabalhar e tomar conta dos irmãos, era como se fosse um objecto da casa, daquele sistema implantado desde sempre. O senhor Silvestre, preocupado com o futuro do seu filho Jorge, certo dia vem à fala com o Aniceto e diz-lhe: 

Oh Aniceto, temos que casar os garotos. O meu Jorge já está próximo da idade de ir “às sortes”, queria ver se o livrava da tropa, pois se for militar vai acabar na guerra do ultramar, e isso nunca vai acontecer, pelo menos enquanto eu for vivo.

Toda a gente no lugar sabia que o senhor Silvestre era “do contra”, não gostava do regime, uma certa vez até foi interrogado pela polícia do estado. Ele, como sabia as dificuldades do filho Jorge, franzino, pouco corajoso, mas com alguma inteligência, pois sabia de números, até lhe tratava das contas da oficina, na companhia da Glória iria ser outro homem.

A Glória era trabalhadeira, habituada a sacrifícios, criou os irmãos, vestia qualquer roupa, respondia aos rapazes da aldeia, quando lhe atiravam algum piropo mais atrevido, dizia:
- Vai dizer isso à tua irmã, cabrão!

A Glória era assim, desenvolta, activa e habituada a andar descalça, a acudir aos pedidos e choros dos irmãos, enfim habituada a sofrer. Tinha sido criada no meio de dificuldades, ela nem sabia o outro lado bom da vida, tudo isto era normal para ela. Na aldeia dizia-se:
- A “Ruça” vai ser uma mulher de armas!

O senhor Silvestre, pai do Jorge, também era um homem de trabalho, tinha algumas economias, tinha na ideia casar o filho e mandá-lo para fora do país, para fugir ao serviço militar, tinha alguns contactos e conhecimentos na vila, dos “amigos do contra”. A ideia era casar o filho, e com a desculpa da “lua de mel”, metê-los num avião para o México, mais propriamente para a colónia de férias de Acapulco. Daí, com os seus contactos, iriam atravessar a fronteira, clandestinos, para o outro lado, ou seja para os Estados Unidos. Este plano já tinha funcionado com algumas famílias “do contra”, portanto também iria funcionar com o seu filho Jorge e a sua futura esposa Glória, a quem também chamavam “Lola” e, às vezes, “Ruça”.

(Continua)

Tony Borie, Junho de 2015.
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14710: Libertando-me (Tony Borié) (20): Glória, a quem chamavam Lola e às vezes Ruça (1)

Guiné 63/74 - P14743: Parabéns a você (920): Francisco Silva, ex-Alf Mil Art da CART 3492 e Pel Caç Nat 51 (Guiné, 1971/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14724: Parabéns a você (919): Alcides Silva, ex-1.º Cabo Estofador do BART 2913 (Guiné, 1967/69)

sábado, 13 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14742: (Ex)citações (281): Sexo em tempo de guerra... O ponto de vista de um ex-capelão (Mário S. de Oliveira)

1. Mensagem de Mário de Oliveira, nosso grã-tabanqueiro,  mais conhecido como Padre Mário da Lixa), é um  dos nososs conhecidos capelães que fizeram a guerra colonial  devido aos seus problemas com o Exército, a PIDE/DGS e a hierarquia da Igreja [, foto atual à direita].

Foi alf mil capelão, CCS/BCAÇ 1912, Mansoa, entre novembro de 1967 e em março 1968; vive no concelho de Felgueiras; foi jornalista e  autor de vasta obra de reflexão espiritual e teológica. O seu último, "Fátima, S.A." mereveu destaque no "Expresso". (*)

De: Mario de Oliveira

Data: 5 de junho de 2015 às 20:57

Assunto: (Ex)citações...

Oh raio...o "pessoal" afina logo á primeira, se calhar sem aprofundar bem o simbolismo da questão. Aqui, no meu ponto, ninguém tem que se envergonhar de nada porque...era a própria política "colonialista" de uma "colonização manca"​ - falta de efetivos humanos para colonizar - que incentivava a interligação do homem branco com a mulher africana, na intenção de que (segundo D. Carlos e outros), o novo ser vivo que acaso viesse ao mundo dessa "interligação" passasse a ser o chefe de posto/cipaio/fiscal/chefe de a, b, c, dependências governamentais, para colmatar a falta de "minhotos, transmontanos, beirões (como eu), tudo na procura de "popular" os locais onde acaso tivessem assentado pé.

Ironicamente, a interligação, não comtemplava a interligação entre "a mulher branca" e o africano. Aqui, é que assenta o fulcro da questão.

No aspeto pessoal de cada quem, cada um dos intervenientes terá que ter na sua consciência a sua ligação com as africanas. Houve e há muitos que o fizeram "honestamente" por se terem assimilado-convivido com as mulheres africana em questão e, a estes, só e de louvar porque constituíram uma família.

Mas, não duvido absolutamente nada, que outros o fizeram por necessidade fisiológica e, quiçá, de uma forma pouco respeitosa. Cada um que tenha o seu descargo de consciência mas envergonhar-se...seria errado. Arrepender-se talvez fosse mais aconselhável. (**)


Abraço a todos.

Máio S. de Oliveira

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Notas do editor:

(*)  Sobre o último livbro,m "Fátima", o nosso camarada escreveu-nos o seguinte, em mensagem de 5 do corrente:

Olá, camarada Luís Graça:
Tomo a liberdade de te fazer chegar esta informação:

A PROPÓSITO DE FÁTIMA S.A.

Saiu em meados de Maio 2015 e, até agora, só eu já despachei pelos CTT quase 200 exemplares para outras tantas pessoas que se me dirigiram interessadas na sua aquisição. A 2.ª edição sai agora, na 2ª semana de Junho. Até o grupo Leya já se rendeu ao Livro e faz encomendas à pequena Editora do Livro, Seda Publicações.

Na minha qualidade de presbítero-jornalista, "viajei" por dentro dos Documentos oficiais disponibilizados pelo Santuário de Fátima e pude ficar a conhecer todo o “segredo” de Fátima, desde 1917 até aos nossos dias. O resultado desta minha investigação é este Livro de 288 pgs, 14 capítulos

Cada exemplar fica por 17€ + 2,35€ de portes de correio. Poderei suportar os portes, se assim entenderem. Enviem-me o v/ endereço postal e o Livro vai ter a vossa casa, autografado por mim. Depois, fazem a transferência bancária para o NIB da m/ conta-reforma: 0007 0000 0077 5184 2312 3. 

Os meus direitos de Autor são integralmente para o Barracão de Cultura. Espero as v/ encomendas. Não se arrependerão. 

O meu abraço, Mário.

Guiné 63/74 - P14741: Os nossos seres, saberes e lazeres (100): Passeio turístico a Sanxenxo (Galiza) promovido pelo Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes (Carlos Vinhal)

Foto de família com os combatentes, seus familiares e amigos

No passado fim de semana de 6 e 7 de Junho, o Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes organizou e proporcionou,  aos seus sócios e amigos, um passeio até à nossa vizinha Galiza, Região de Espanha onde os portugueses se sentem como em casa.

Do acontecimento aqui se deixa um texto elaborado pelo Núcleo.


Passeio turístico a Sanxenxo

06 e 07 JUN2015

O Núcleo da Liga de Combatentes de Matosinhos realizou um passeio turístico a Sanxenxo nos dias 6 e 7 com um grupo de 25 sócios e familiares, de acordo com o seu plano de atividades para o corrente ano.

A concentração dos participantes foi em frente ao Regimento de Transmissões e deu-se início à viagem, num confortável autopullman, pelas 10h00 com destino a Sanxenxo, tendo a chegada ao Hotel Ribeiro de *** na Playa das Areas acontecido pelas 12h30, onde foi servido um almoço buffet.

No interior do autocarro reinava a boa disposição

Pelas 15H30 realizou-se o passeio de barco pela Ria Arosa, acompanhado de apresentação por guia local que nos mostrou as explorações marisqueiras, observação do fundo marinho e fauna local, finalizando este longo e agradável passeio com uma degustação de mexilhões, camarões e vinho acompanhado de música e, na altura da saída do barco, ouviu-se o nosso Hino Nacional.

 Este catamaran esteve reservado exclusivamente ao nosso grupo

 Um dos viveiros de marisco da Ria de Arosa

No cais, após o desembarque, a foto de família exclusivamente masculina

Seguiu-se uma visita à ilha de La Toja, conhecida pelas suas paisagens paradisíacas, pela sua fábrica de sabonetes e cosméticos feitos com água mineral da zona e pela Capela de San Caralampio, vulgarmente conhecida pela Capela das Conchas.

 Capela de San Caralampio revestida exteriormente por conchas

Um pormenor da parede exterior da Capela
Foto: © Carlos Vinhal

A tarde terminou com a ida de alguns sócios a banhos dados os 31 graus registados, seguindo-se o jantar – uma mariscada - que se iniciou pelas 21h00 e que se revelou, pela quantidade e qualidade do marisco, uma prova difícil de terminar, mesmo para os mais resistentes nestas lides.





Sem comentários

Este 1.º dia não poderia terminar da melhor maneira, assistindo-se a uma tradicional queimada galega levada a efeito por dois cidadãos galegos num ritual de purificação para queimar os males todos das vidas dos que estavam presentes banindo bruxas, diabos, maus olhados e afins seguido de baile que terminou já noite dentro.

Queimada galega
Foto: © Carlos Vinhal

A leitura da oração contra todos os males

 A animação é bem visível, principalmente entre as senhoras

No 2.º dia, já restabelecidos do esforço físico e digestivo do dia anterior, realizou-se da parte da manhã uma visita a Sanxenxo que se encontrava em preparativos para a procissão local do Dia do Corpo de Deus e onde se destaca a sua conhecida e aprazível praia.

 Vista de uma das praias de Sanxenxo

Em Dia de Corpo de Deus davam-se os últimos retoques nos tapetes para a Procissão

Depois do almoço no Hotel iniciou-se a viagem de regresso a Portugal com paragem e visita à bonita e pitoresca vila piscatória de Combarro.


Dois aspectos de Combarro

Este tipo de atividade, realizada pelo Núcleo pela primeira vez, caracterizou-se por momentos muito agradáveis de boa-disposição e de convívio num revitalizante fim de semana cheio de alegria e radioso sol.

Todos estavam felizes e cooperantes e foi motivo de referência o extenuante e esclarecedor trabalho do vogal da Direção, Sargento Ajudante Osório, na sua função de “guia” e a forma simpática e hospitaleira revelada pelos funcionários do hotel que inclusive fizeram questão de a demonstrar por escrito à entrada do hotel: “portugueses irmãos dos galegos – benvindos”.

Texto: Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes
Fotos: Núcleode Matosinhos e Carlos Vinhal
Legendas: Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 10 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14726: Os nossos seres, saberes e lazeres (99): Tomar à la minuta (3) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P14740: O cruzeiro das nossas vidas (22): A viagem no Alenquer, a chegada, o desembarque e o rumo ao destino (José Martins)

1. Mensagem do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 3 de Junho de 2015, falando-nos desta vez da chegada a Bissau.

Meus amigos
Depois da Partida, eis que chega a Chegada (passe o pleonasmo).
Faz 47 anos que pisei aquela que é, para nós, a segunda pátria.
No próximo dia 10, fará 45 anos do regresso definitivo.

Abraço
Zé Martins


A CHEGADA

Dos doze passageiros que embarcaram no Alenquer, apenas três eram milicianos. Os restantes, os marinheiros e um furriel enfermeiro, eram do quadro permanente.

A viagem foi tranquila, pois despojados das fardas, que foram encerradas nos armários até ao dia do desembarque, todos vestíamos roupas civis. O próprio fardamento da tripulação, nada tinha a ver com o rigor militar.

Dado o reduzido número de passageiros, até o aviso de que as refeições iam ser servidas, era transmitido pessoalmente no convés, ou, quando caso disso, com pancadas leves na porta dos alojamentos.

Calmamente, com a calma que o mar transmite, fomos passando os dias em que foram sendo percorridas as milhas náuticas que nos separavam de África, até que, na manhã de 3 de Junho [ano de 1968], as máquinas reduziram a pressão e o barco ancorou ao largo de Bissau. Era uma Segunda-feira.

Ponte-cais, Bissau. Em primeiro, vê-se o monumento a Diogo Cão. 
Bilhete-postal, colecção "Guiné Portuguesa, 110". © Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL. Colecção: Agostinho Gaspar / Digitalizações: Luís Graça & Camaradas da Guiné 2010.

Lá longe, no cais, havia um grande vaivém de pessoas e barcos. Já não era o dia de “São Vapor” de que nos fala Amândio César no seu livro Guiné 1965 – Contra Ataque, assim era chamado o dia em que atracava um barco ao porto, fazendo com que a população se deslocasse até lá.

Ao largo, assim que começaram a descer as LDM – Lanchas de Desembarque Médio – houve um autêntico enxame de pequenas embarcações, movidas a motor ou a remos, em torno das mesmas a oferecer a venda de serviços ou comida tradicional. A tripulação que descera já dentro das lanchas, ia assumir de imediato a sua missão deslocando-se para o cais militar. Abandonaram aquela zona entre acenos despedidas e votos de boa sorte.
Mesmo nas vindas a Bissau, de férias ou em serviço, nunca mais voltei a encontrar estes companheiros de viagem. A Guiné é pequena, mas as coisas nunca estão ali à mão.

No porto do rio Geba, em Bissau, a chegada e a partida de embarcações era banal que o Alenquer teve de aguardar, ao largo, autorização e espaço no cais para poder atracar.

A acostagem só se efectuou perto da hora de jantar.
O Imediato veio informar-nos que, a partir daquele momento, a viagem tinha terminado. No entanto, como já era tarde, aconselhava-nos a pernoitar no barco, porque sendo já tarde, era muito difícil arranjar acomodações militares ou mesmo civis. Mais! Como iam demorar cerca de dois dias com as operações de descarga do navio, podíamos continuar alojados no mesmo, como convidados, devendo, no entanto, providenciar a nossa instalação futura.

Antes de jantar fomos a terra. Queríamos começar a conhecer a terra, mas também, tomar algo de fresco, porque o calor, mesmo para os que já lá estavam há algum tempo, era, digamos, insuportável. Andando e observando a cidade fomos dar ao Café Bento, conhecido pela “5.ª Repartição do QG”, uma vez que se encontrava sempre, a qualquer hora, repleto de militares em passagem por Bissau, quer na ida ou regresso de férias, quer por se encontrarem em consulta externa no Hospital Militar ou ainda a aguardar colocação.

Nos cafés a lista dos serviços que ofereciam, das bebidas aos tabacos, eram quase iguais às que oferecia qualquer café da metrópole. A diferença era no preço: a moeda local, o Peso, não tinha centavos ou pelo menos não circulavam, sendo o arredondamento efectuado, quase sempre, para a unidade inferior, o que naquela altura representava algum benefício.
As notas emitidas na metrópole eram sempre muito bem recebidas, já que tinham um valor acrescido de dez por cento. Às moedas já não lhes atribuíam qualquer mais valia.

No dia seguinte, segunda-feira, apresentamo-nos no Quartel-General do CTIG, em Santa Luzia, ficando a aguardar transporte para as respectivas unidades. Tínhamos o tempo todo livre, mas teríamos de nos apresentar, todos os dias, no Serviço de Pessoal do QG, a fim de sabermos quando e de que forma seria efectuado esse transporte para as nossa unidades.

Nesse mesmo dia, Terça-Feira dia 4 de Junho, durante o almoço a bordo do Alenquer, o imediato veio falar connosco, informando-nos que a descarga do navio estava a ser mais rápida do que o previsto. Seria aconselhável, para nós que, o jantar e a pernoita, fossem efectuadas já em terra, uma vez que tudo indicava que largassem ainda durante a madrugada do dia seguinte.

Terminada a refeição fomos apresentar, ao comandante e tripulação do navio, as nossas despedidas e sobretudo, agradecer a forma amável e distinta com que nos tinham tratado desde que a saída de Lisboa. Depois lá rumámos em direcção aos alojamentos destinados aos sargentos no Quartel-General em Santa Luzia, a escassos quilómetros da cidade.

Como era de prever, e isso mesmo já tínhamos constatado, o local, apesar de limpo e arejado, era o protótipo de local de passagem. As camas não dispunham de roupa nem havia qualquer local onde se pudesse requisitar material de aquartelamento.
Acomodamo-nos o melhor possível para passar a noite, não sem antes termos visitado o bar de sargentos, para o que já começava a ser habitual: tomar uma qualquer bebida fresca.

No dia seguinte, após passagem pelo Serviço de Pessoal para cumprimento das instruções recebidas, e não havendo qualquer previsão de transporte para os nossos destinos, como que impulsionados por uma mola dirigimo-nos ao cais.

Navio de carga "Alenquer" - Armador: Sociedade Geral do Comércio, Indústria e Transportes - Lisboa
Com a devida vénia a Navios Mercantes Portugueses

Surpresa... tristeza... desilusão... O Alenquer já não estava nem no porto nem se avistava no estuário. Já tinha partido.

O desalento foi total. Foi como se nos tivessem cortado o cordão umbilical, que nos ligava à metrópole. Dias depois cada um seguiu o seu rumo, que, acaso do destino, ficava quase nos vértices do triângulo que a província formava: Nova Lamego, Bedanda e Farim.

José Martins
14/JULHO/2000
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Nota do editor

Último poste da série de 28 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14672: O cruzeiro das nossas vidas (21): Os últimos dias, a família, os amigos e finalmente o embarque, em 28/5/1968 (José Martins)

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14739: Convívios (688): Rescaldo do XIII Encontro do pessoal da CART 2520, levado a efeito no passado dia 30 de Maio em Mira de Aire (José Nascimento)


1. Mensagem do nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art da CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) com data de 4 de Junho de 2015 com o rescaldo do XIII Encontro do pessoal da sua Unidade, levado a efeito no passado dia 30 de Maio, em Mira de Aire:

Amigo Carlos,
A Cart 2520 realizou o 13.º Convívio, no dia 30 de Maio, próximo de Mira de Aire, no Restaurante "A Gralha".

Foi organizado pelo 1.º Cabo Cordeiro, o Apontador de Morteiro 60 do 3.º grupo de combate.
Os antigos combatentes reuniram-se junto à antiga e bonita capela dedicada a S. Silvestre, no pitoresco lugar do Covão da Carvalha. Aí foi celebrada missa em memória dos militares falecidos em combate, pelo padre Luís.
Este pároco, que esteve durante vários anos em Ourique, no Alentejo, teve o ensejo de relatar uma pequena e emocionante história, protagonizada por um antigo militar português que cumpriu o serviço militar em Ingoré, na antiga Guiné Portuguesa.

O Almeida, assim se chamava o militar, passava através da vedação de arame farpado, o que restava da alimentação da nossa tropa e que as crianças nativas recolhiam em latas e que lhes servia para mitigar a sua sua fome e possivelmente de alguns adultos.
Passados alguns anos, depois de ter regressado à Metrópole, por circunstâncias desconhecidas o Almeida tornou-se alcoólico, ninguém queria saber dele e era desprezado pela população, devido ao seu aspecto desmazelado, cabelos compridos, barba por fazer e a roupa sempre suja.
Mas o Almeida haveria de se curar do alcoolismo e certo dia, de cabelo cortado e barba feita, passa junto a uma obra de construção civil que estava a decorrer na sua terra, ouve chamar por "ALMEIDA". Vai ao encontro desse chamamento e qual não é a sua surpresa quando reconhece alguns operários negros a quem ele, algumas dezenas de anos antes, tinha ajudado a matar a fome, naquela terra distante da Guiné. Abraçaram-se longamente...
Algum tempo depois o padre Luís saiu para outra paróquia, mais tarde soube que este seu confidente tinha falecido.

Quanto ao convívio, (este ano com um grupo muito reduzido) foi um reviver de emoções e o recordar de um tempo, que embora passado com muitas dificuldades, ajudou a cimentar muitas amizades e jamais voltará.

Recebe um grande abraço do amigo.
José Nascimento
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14732: Convívios (687): A malta da Tabanca Grande no 10 de junho de 2015, Lisboa, Belém - Parte II: homenagem às antigas enfermeiras paraquedistas (Miguel Pessoa / Jorge Canhão)

Guiné 63/74 - P14738: Os nossos médicos (85): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (15): Africanização Portuguesa

1. O nosso camarada Mário Vasconcelos (ex-Alf Mil TRMS da CCS/BCAÇ 3872 - Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72 - Mansoa, e Cumeré, 1973/74) enviou-nos a mensagem que se publica, com mais um texto de Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho [foto à esquerda], (ex-Alf Mil Médico que esteve integrado nos BCAÇ 3872 e 4518, Galomaro, 1973/74).

Como se uma ordem fosse, encaminho, retransmitindo, o texto entregue pelo ilustre amigo e camarada Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Médico, dos BCAÇ 3872 e 4518, sediados em tempos idos, em Galomaro-Guiné.
O texto aborda a problemática da "Africanização do Exército Português no CTIG".
Adicionam-se algumas fotos em sintonia com o escrito recebido.

Abraço e saudações nossas para todos os camaradas.
Que a saúde, e a alegria de vida, sempre vos acompanhe.
Mário Vasconcelos




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Notas do editor:

- As fotos referidas chegaram ao blogue sem o mínimo de qualidade para serem publicadas. Aguarda-se o envio de outras em substituição.

Último poste da série de 22 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13782: Os nossos médicos (84): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (14): Onde se fala de doenças sexualmente transmissíveis (con destaque para a blenorragia) mas também de perturbações psíquicas como a depressão e o stresse pós-traumático de guerra

Guiné 63/74 - P14737: Notas de leitura (727): “Olhos de Caçador”, de António Brito, Porto Editora, 2014 (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Julho de 2014:

Queridos amigos,
É uma felicidade dispormos de esplêndida literatura nos diferentes teatros de operações.
A Guiné é a nossa estrela polar, mas temos tudo a ganhar em identificar as pepitas alheias.
Este livro de António Brito é um monumento, vaticino-lhe um futuro com grandes audiências. É uma escrita desmedida, onde se entremeiam o patético, o doloroso, o melhor do ser humano, o mistério do heroísmo, as doçuras da camaradagem e as imagens mais negras do militarismo.
Vende-se a preço abordável, ficam já a saber. E asseguro que ninguém ficará desapontado com este contrabandista que assinalará grandes façanhas, conhecerá sofrimentos inenarráveis, tudo dentro dum extremo e numa bipolaridade que nos toca o coração.

Um abraço do
Mário


Olhos de Caçador: Livro soberbo, o poliedro das brutalidades da guerra (2)

Beja Santos

“Olhos de Caçador”, de António Brito, Porto Editora, 2014, é um livro inesquecível: pelo vigor das reconstituições, pela convocatória permanente da linguagem da caserna, pela abordagem sem reservas dos estados de alma, tocando em todas as teclas desde o sublime à mais degradante miséria.

Escreve-se nos dados curriculares que Brito nasceu em Coimbra e é licenciado em Direito. Antigo combatente da guerra colonial, aos 18 anos alistou-se nas Tropas Para-quedistas, sendo mobilizado para Moçambique onde combateu nalgumas das mais importantes operações militares contra os guerrilheiros nacionalistas. Figura central do romance é Zé Fraga, contrabandista e passador de emigrantes, mobilizado à má-fila. Tem todos os ingredientes para se adaptar às durezas do mato, irá tornar-se na referência de coragem e liderança da sua companhia de caçadores, colocada em Magolé. Zé Fraga tem amigos e gente que lhe vota um ódio tremendo, caso do capitão Vinhais, alcunhado de Galo Doido. Já foram praxados em Magolé, Zé Fraga, enojado com o comportamento timorato de Galo Doido durante a flagelação, quer partir. São dois amigos, o alferes Perdigoto e o sargento Bezerra, que o dissuadem.

O fundamental é pôr Magolé ao nível de um aquartelamento seguro. Trabalhou-se assim:
“Riscámos no solo um quadrado com 150 metros de lado. Cada um dos quatro pelotões instalou-se para construir e tomar conta do lado que lhe foi destinado. A nós calhou-nos um pedaço de terra plana que em tempos parecia ter acomodado uma machamba, a avaliar pelos pés de mandioca e inhame mirrados que ainda despontavam das ervas. Só vos digo que durante dias cavámos uma trincheira, em ziguezague, com um peitoril de terra virado para fora, digna do Front de Verdun. Uns metros à frente, enterrámos estacas para fixar a barreira de arame farpado, que foi crescendo como um cordão de videiras, de onde pendiam pontas aceradas, em vez de uvas. As minhas mãos, treinadas para coisas suaves como premir o gatilho e apalpar as mamas das mulheres, foram torturadas pelo cabo da picareta e pelos bicos do arame. Trabalhávamos por turnos como nas minas de volfrâmio, de calções e tronco nu. Parecíamos personagens de um filme bíblico sobre escravos do Egipto. Em vez de erguermos pirâmides, cavávamos bunkers para nos enfiarmos. Em vez de areia do deserto, derrubávamos a floresta, omnipresente, com machados e cargas de trotil. Em vez do faraó a acoitar-nos, tínhamos os ataques de fúria do Galo Doido, insultando os soldados de preguiçosos e calaceiros. Em vez das pragas e gafanhotos, tínhamos os ataques de morteiros e as nuvens de mosquitos devorando a pele”.

Assegurou-se a segurança. Começam os patrulhamentos, e um dia Zé Fraga mata um guerrilheiro:
“Caminhava curvado, apanhando do chão para dentro de um cesto feito de folhas de palmeira entrançada, as castanhas de caju caídas das árvores. A arma permanecia em repouso no ombro, pendurada pela bandoleira. Caminhava descontraído. Avançava de árvore em árvore como um barco de ilha em ilha. Rondava uma, apanhava o caju, seguia para outra. Eu olhava para ele, fascinado, na esperança de que passasse ao lado. Mas não. Viu as ramadas escorrendo até ao chão e deve ter imaginado uma boa provisão de frutos debaixo delas. Avançou, apertando as folhas com as mãos para espreitar para dentro. Não viu caju. Viu-me a mim. Ainda esboçou um gesto para levar a mão à Simonov. A boca da G3 estava a um metro dele mirando-lhe o peito nu. Apertei o gatilho e a bala rebentou-lhe com o esterno, fazendo voar pedaços de osso, num esgar que tinha mais de estupefação do que dor”.

Zé Fraga pode ser malandro e viver de expedientes, mas não mata crianças. Haverá um assalto a um acampamento da FRELIMO, Zé Fraga deixa fugir uma miúda. Regressam com troféus, desde canhangulos, passando por facas rombas até uma PPSh-41. Por ter deixado escapar a miúda, o Galo Doido recambia Zé Fraga para o Posto 36. Estão aqui páginas impressionantes, entre as melhores que Brito escreve neste livro:  
“Oficialmente, o Posto 36 era uma guarnição avançada no cimo duma colina, a um dia de marcha de Magolé, não muito longe do corredor da guerrilha que conduz à Tanzânia. Antes da guerra, era ali que se situava um depósito de água com o número 36 pintado num dos lados, onde as populações se abasteciam nos tempos de seca. No primeiro ano de guerra, o depósito foi destruído. A floresta apossou-se do local e o posto de água deixou de figurar nos mapas do planalto dos Macondes. Só os caçadores indígenas, os guerrilheiros e os batedores do Exército sabiam onde conduzia um desvanecido carreiro que partia do Chai para Magolé e depois se perdia na floresta como um fio de água nas areias. Para o Exército, o local era somente um posto avançado, a meio caminho entre o aldeamento de Miteda e a serra Mapé. Mas os soldados conheciam-no pelo tenebroso nome de Matadouro, tantas e tão frequentes eram as baixas que os iam atingindo. Foi para ali que o Galo Doido me enviou com uma punição de cinco meses”.

São descrições análogas à que vimos no filme Apocalypse Now. Uma descrição épica, aquela marcha com carregamento suplementar, com imprevistas chuvas diluvianas. Os soldados vivem em buracos, disparam para a mata quando lhes apetece. “Ao simularem ataques do inimigo, aqueles homens só vagamente lembravam um grupo organizados de soldados. Mais pareciam uma quadrilha de malfeitores fugidos das autoridades”. São finalmente recebidos por um tenente que fica furioso quando descobre que não trouxeram cerveja fresca, quando tinham trazido tudo que era essencial para a reparação do gerador. Brito é elaboradamente excessivo, agarra o leitor pela gola tratando o horrendo como se fosse trivialidade: “Em redor de montículos de insetos caídos por terra, mortos pela luz dos candeeiros, encontrei dois gajos barbudos recolhendo os insetos maiores, levando-os para cima duma chapa aquecida na fogueira. Os bichos, postos a grelhar, libertavam um cheiro estranho, como se estivessem a chamuscar alfazema e rosmaninho. Os mais gordos rebentavam libertando um líquido esverdeado que se espalhava a fumegar pela chapa quente. À medida que arrefeciam, os barbudos metiam-nos na boca, mastigando-os com deleite. Viram-me especado a olhar para eles e ofereceram-me um inseto gordo, carbonizado, que recusei, abandando a cabeça enojado. Ante a minha repulsa, um deles comentou: - Este ou é muito fino ou não tem fome. - Nem esfomeado eu comia essa merda verde – respondi-lhe”.

O posto 36 anda à deriva, não tem rotinas, não há plano de tarefas. Quando se comia, aparecia quem queria, quem não queria não aparecia. A higiene estava diretamente dependente do nível de água dos bidões de reserva. Tudo se improvisava, quando há flagelações incendeiam-se uns montículos de lenha previamente dispersos em redor do arame. Os frelimos andam por ali à solta. Os acidentes gravíssimos sucedem-se. Zé Fraga descobre num bunker o capelão Tomé, devorando pela febre do paludismo. Irão ter discussões acesas sobre os assuntos do céu e da terra. Zé Fraga descobre, aturdido, que os soldados do posto 36 guardam bocados de guerrilheiros e um dia dão-lhe uma sandes de coirato que ele irá descobrir ter comido uma orelha humana.

(Continua)
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Notas do editor

Primeiro poste de 8 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14713: Notas de leitura (724): “Olhos de Caçador”, de António Brito, Porto Editora, 2014 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 1 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14730: Notas de leitura (726): “Guerra na Bolanha”, de Francisco Henriques da Silva - (Programa Fim do Império, Âncora editora, Lisboa, 2015) - O regresso de África e a reinserção - parte II (Francisco Henriques da Silva)

Guiné 63/74 - P14736: Convívios (688): A malta da Tabanca Grande no 10 de junho de 2015, Lisboa, Belém- Parte III: homenagem às antigas enfermeiras paraquedistas (Manuel Lema Santos, 1º Ten RN, imediato no NRP Orion, 1966/68)










Lisboa, Belém, Forte do Bom Sucesso, Monumento aos Combatentes do Ultramar > 10 de junho de 2015 > Cor inf ref José Aparício (antigo cmdt da CCAÇ 1790, Madina do Boé, 1967/69), e grupo de antigas enfermeiras paraquedistas homenageadas (Ao todo, cerca de 3 dezenas; terão faltado 7 das que estão vivas, segundo informação da Giselda), Grã-tabanqueiras que estiveram na cerimónia, para além da Giselda Pessoa; a Maria Arminda,  a Rosa Serra e Aura  RicoTeles (,se não erro) (LG)


PARAQUEDISTAS

Se o ter asas simboliza a liberdade
Que a vida nega e a alma precisa,
Olhai, paraquedistas, tendes tudo:
Lá no céu elevai vossas almas
Que cá na terra a dor é nossa
E a fraqueza que ela tem,
Tendes ao menos a força de não a
Mostrardes a ninguém.

Aura Rico Teles
Tenente Enfermeira  Paraquedista


Fotos: © Manuel Lema Santos  (2015). Todos direitos reservados [Edição: LG]


1. Mensagem do  Manuel Lema Santos [,1º tenente da Reserva Naval, imediato no NRP Orion, Guiné, 1966/68; membro da nossa Tabanca Grande desde 21 de abril de 2006] [, foto atual  à esquerda]:

Data: 11 junho 2015 18:05



Assunto - Lisboa, Belém, 10 de junho de 2015, homenagem às enfermeiras paraquedistas

Luís Graça,

Dentro das minhas magras possibilidades e porque as fotografei, aqui vão algumas fotos aquando da homenagem às Enfermeiras Páraquedistas.

Como mera curiosidade, como muitos saberão, o Cor José Aparício que fez a alocução, foi comandante da CCaç 1790 [, tragicamenmte ligada ao desastre de Che-Che,  Corubal, 6/2/1969], pertencente ao BCaç 1933, em que meu irmão esteve integrado como médico (1967/69),

Abraço,
MLS
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