terça-feira, 22 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15886: Fotos do álbum da minha mãe, "Honra e Glória" (Abílio Duarte, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Nova Lamego e Paunca, 1969/70) - Parte II


Foto nº 1 > Bissau > c. 1969/70 > A sede do BNU - Banco Nacional Ultramarino... a minha entidade patronal para a qual trabalhei, como bancário, toda a vida...


Foto nº 2 > Zona leste > Região de Gabu > Piche > c. 1969/70 > Vista áerea do quartel de Piche... São visíveis, para além das instalações, o espaldão do obus e o perímetro de valas que circundavam o aquartelamento.


Foto nº 3 > Zona leste > Região de Gabu > Piche (?) > c. 1969/70 > Corte de cabelo , do soldado que, para mim, era um mistério: pessoa muito recatada, os outros obedeciam-lhe, sem qualquer dúvida; muito calmo, dialogante, julgo agora que ele era um líder religioso.


Foto nº 4 > Zona leste > Região de Gabu > Piche (?) > c. 1969/70 > Artesão fula.


Foto nº 5 > Zona leste > Região de Gabu > Piche  > c. 1969/70  > Bajudas no pilão a tratar da mandioca

Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2016). Todos os direitos reservados.


1. Continuação da publicação de fotos do Abílio Duarte [, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Nova Lamego, Paunca, 1969/1970] ("fui buscá-las a um álbum, que a minha saudosa mãe criou com fotos que eu lhe enviava").

Guiné 63/74 - P15885: Parabéns a você (1051): José Lino Oliveira, ex-Fur Mil Amanuense do BCAÇ 4612/74 (Guiné, 1974)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15867: Parabéns a você (1049): José Armando F. Almeida, ex-Fur Mil TRMS do BART 2917 (Guiné, 1970/72)

segunda-feira, 21 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15884: Manuscrito(s) (Luís Graça) (79): No Dia Mundial da Poesia, 21 de março: "Pedimos desculpa, mas hoje não há notícias"...




“Pedimos desculpa, mas hoje 

não há notícias”




por Luís Graça





Um dia gostarias de poder acordar sem notícias,
pois aí tens.
Sem notícias,
sem televisão.
sem jornais,
sem internet,
sem emails,
sem o facebook,
sem o twitter,
sem o blogue,

sem o teu blogue,
sem o ruído das ondas hertzianas,
sem radiações não-ionisantes,
sem mensagens,

sem mensageiros.




Nem sequer as duas últimas palavras
do locutor de serviço, 
a pedir desculpa 
por não haver notícias, 
e a pensar que, muito provavelmente, 
irá a seguir para o desemprego.


Um dia gostarias de poder acordar
com a notícia do fim da notícia,
ou nem sequer isso,
com a notícia do fim do circo mediático,
ou nem sequer isso.


Um dia gostarias de poder acordar
sem o teu robô, 
sem o teu andróide,
a despertar-te,
e, logo de manhãzinha,
a comandar o ritmo
e o sentido da tua vida.


Um dia gostarias de poder acordar
só com o buraco negro do ecrã,
à tua frente.


Um dia gostarias de poder acordar
no mais absoluto silêncio,
não ouvir sequer o ruído
do vaivém das ondas do mar,
ou nem sequer isso.
Só com o buraco negro do universo
em frente à tua janela. 



Um dia não gostarias sequer 
de poder acordar.

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Nota do editor:

Último poste da série > 19 de março de 2016 > Guiné 63/74 - P15876: Manuscrito(s) (Luís Graça) (78): Os homens medem-se pelas palavras...

Guiné 63/74 - P15883: Convívios (732): Almoço do pessoal da CCAÇ 2317, dia 4 de Junho de 2016, em Espinho (Joaquim Gomes Soares, ex-1.º Cabo Atirador de Infantaria)



ALMOÇO/CONVÍVIO DA CCAÇ 2317

4 DE JUNHO DE 2016

ESPINHO

AMIGO E COMPANHEIRO:

Há cerca de 200 anos a zona de Espinho começou a ser utilizada para a pesca, ainda que de forma sazonal. Esses primeiros ocupantes não construíram habitações, permanecendo na costa apenas durante a campanha, para regressar à terra de origem no inverno, quando a violência do mar impossibilitava a pesca em segurança.

A fixação da população começou a fazer-se por volta do ano de 1776, quando surgiram as primeiras habitações (os palheiros), feitas em madeira com os telhados revestidos com terra. A transição da madeira para a pedra ocorreu lenta e gradualmente.

Mais tarde, muitas destas habitações seriam adquiridas e transformadas, por famílias de posses, dando origem à colónia balnear de Espinho. Em menos de meio século, Espinho tornou-se numa das zonas de eleição do Norte de Portugal.

Palheiros de Espinho
Com a devida vénia a d'EspinhoViva

O almoço deste ano, para mudar de ares, será realizado nesta bela cidade. A intenção é que desfrutem de um belo sábado, com uma bonita viagem de comboio para contemplarem assim a paisagem da orla costeira portuguesa. Outro dos motivos é a facilidade de acesso a esta cidade a que se soma o preço económico do bilhete de comboio.

O restaurante chama-se Espaço Z e a morada é: Rua 17, n.º 1237 – Espinho.


Contactos:
Joaquim Gomes Soares
Tel.: 225 361 952 / 936 831 517
Email: joaquim.gomes.soares@hotmail.com

Como todos os anos espero poder contar com a tua presença novamente.
Este ano, o encontro é no dia 4 de junho, calha a um sábado e a partir das 12 horas estamos à tua espera.
Agradeço que me confirmes a tua presença logo que possível.

Um abraço,
Joaquim Soares
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15865: Convívios (731): XXXIII Encontro Nacional dos ex-Oficiais, Sargentos e Praças do BENG 447 - Guiné, dia 16 de Abril de 2016, em Fátima (Lima Ferreira)

Guiné 63/74 - P15882: Objectos de artesanato guineense, e não só, que trazíamos para oferecer à família e aos amigos (Manuel Coelho, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1589)

1. Mensagem do nosso camarada  Manuel Caldeira Coelho (ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1589/BCAÇ 1894, Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68), com data de 2 de Março de 2016:

Caros editores,
Vi anteriormente publicadas fotos de objectos de artesanato da Guiné, e vai disto desencantei alguns que comprei na proximidade do regresso, com um restinho de "pesos" que tinha no bolso.
Faltam aqui as coisas que já não existem, como por exemplo várias garrafas de bom wisky e de Drambuie, e também bugigangas obtidas no Niassa durante a viagem.
De notar que no porão vinha um grande caixote de madeira, e por obra de magia, quando cheguei a Lisboa, já me faltavam várias coisas entre as quais um serviço de chá.
Vendo bem, quase nada disto teve grande utilidade, valeu a "pequena vaidade" ao mostrar tudo isto à família e amigos e o saborear os "néctares" que aqui no continente estavam fora do alcance dos nossos bolsos!

Abraço
Manuel Coelho






Guiné 63/74 - P15881: Notas de leitura (820): "Descrição da Serra Leoa e dos rios de Guiné do Cabo Verde (1625)", André Donelha e o melhor da nossa literatura de viagens (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Maio de 2015:

Queridos amigos,
O conhecimento da Guiné (num espaço que podemos tratar como a Grande Senegâmbia) muito deve a viajantes e navegadores e missionários que por ali transitaram.
A obra mais prodigiosa é indiscutivelmente o Tratado de André Álvares de Almada, mas não podemos prescindir ou desgraduar relatos da maior importância como os de Valentim Fernandes, padre Fernão Guerreiro, Duarte Pacheco Pereira, padre Manuel Álvares, Cadamosto, e tantos outros.
Este documento de André Donelha vem numa edição soberba com notas e apêndices de Teixeira da Mota e de P. E. H. Hair e a tradução francesa foi feita por Léon Bourdon.
Trata-se de uma edição de luxo, um acervo de notas de uma importância excecional, com ilustrações e muito bons apêndices.
Quem gosta de literatura de viagens tem aqui um tesouro.

Um abraço do
Mário


Descrição da Serra Leoa e dos rios de Guiné do Cabo Verde (1625): 
André Donelha e o melhor da nossa literatura de viagens

Beja Santos

Avelino Teixeira da Mota, nome cimeiro da historiografia guineense, dirigia o Centro de Estudos de Cartografia Antiga que publicou em 1977 este importante empreendimento cultural: revelar o documento de André Gonelha, peça obrigatória da nossa literatura de viagens entre os séculos XV e XVII. Teixeira da Mota escreve uma introdução primorosa, relata as viagens que Donelha fez a estas diferentes paragens, sobretudo à Serra Leoa. Donelha viajou na Guiné entre 1574 e 1585, aproximadamente pela mesma época que André Álvares de Almada, autor da obra fundamental Tratado Breve dos Rios da Guiné, em 1594.

Debruçando-se sobre as caraterísticas desta “Descrição”, refere Teixeira da Mota os comentários de autores como Jaime Cortesão, Hernâni Cidade e Joaquim Barradas de Carvalho, enfatizando a abundância, riqueza e profundidade destas obras, e cita autores como Valentim Fernandes, Duarte Pacheco Pereira, Padre Francisco Álvares, Padre Fernão Guerreiro entre outros. A exposição de Donelha privilegia, como se disse, a Serra Leoa. Teixeira da Mota comenta: “Que Donelha comece a sua obra pela Serra Leoa é sintomático da importância que ela assume aos seus olhos". Refere a benignidade do clima, insiste na fertilidade da terra, na abundância e variedade dos seus produtos vegetais. Tal como André Álvares de Almada, advoga o povoamento da Serra Leoa pelos portugueses, entendendo que esta poderia vir a tornar-se a terra mais abastada e de maior trato de toda a Etiópia. No que toca à Guiné, aqui entendida como a Senegâmbia Meridional, dá-nos imensas informações sobre o Gâmbia e o Senegal, descreve a fauna e a flora, as madeiras e os frutos, bichos e formigas, e momentos há em que sentimos no seu estilo descritivo uma capacidade de análise comparável a André Álvares de Almada: “O Cabo da Verga entra muito ao mar, é de pequena altura. A par dele estão os Bagas, os quais andam mal vestidos. A terra é baixa e alagadiça. Nela se faz sal cozido ao fogo. O resgate principal são tintas, de que carregam os navios e trazem a São Domingos; também se resgata escravos, arroz, cera, marfim, colas e algum ouro que vem dos Sossos. As armas que usam são a adargas e azagaias. São cobardes, traiçoeiros. Não comem carne humana, mas bebem o vinho no casco da cabeça humana, e as cortam e levam e fazem taças. E se a cabeça é de homem branco ou de preto cristão ou de algum senhor de terras ou de pessoas nobres que matam por suas mãos, as tais taças são mui estimadas, e por festas as mostram”. Estes Bagas viviam perto do rio Nuno, por tanto fora da Guiné atual.

E bem interessante é o que ele escreve sobre o grande império de Mandimansa: “A origem dos Manes, dizem os antigos por tradição de seus avós e o que deles ouviram, é que uma senhora mui principal, agravada do grande imperador da Etiópia Mandimansa, saiu de uma cidade com o exército de seus parentes e vassalos, tão grande e copioso que bastou a conquistar muitas e diversas terras e diversas nações. Esta senhora dizem que se chamava Macarico. E porque a multidão era grande depois que chegou ao mar, que vinha buscar o fim da terra dividiu o exército em três partes. Tinham no marchar ordem com vanguarda e retaguarda, e a força do exército no meio, por cuja causa caminhavam devagar. Com esta ordem chegaram à Mina de S. Jorge e tiveram com os nossos do castelo recontros e escaramuças”. E explica mais adiante que os capitães desta senhora depois de falecida se meteram pelas terras de Serra Leoa, alguns reis e senhores fugiram destas crueldades, meteram-se em navios de portugueses e vieram para o rio de São Domingos, fizeram as suas aldeias ao lado dos tangomaos. Chama-se tangomaos aos portugueses lançados na Guiné.

Deve-se a André Donelha uma boa descrição sobre Farim Cabo, território dos Mandingas. E começa a descida do rio Sanaga (Senegal), aqui se fazia comércio com a ilha de Santiago, comércio que se estendia até à Serra Leoa. E diz o seguinte: “O rio de Sanaga é dos três maiores rios que há na nossa Guiné. É muito largo, alto, todo de água doce; pode-se navegar por ele naus grossas mais de 100 léguas, segundo me disseram pessoas que a esse rio foram”. Estamos pois no rio de grande resgate de ouro, cera, marfim e couros. Escreve igualmente o reino dos Jalofos, estamos claramente entre o rio Gâmbia e a região do Casamansa. Segue-se um dado capital na viagem que fez a São Domingos onde há um rei que se intitula Farim, e o rio de São Domingos (Cacheu?) é apresentado como muito largo, espaçoso e fundo, e comenta da seguinte maneira: “Dizem ser muito fresco e aprazível, e há grande resgate de tudo, pelo que agora em Guiné chamam a esse rio o novo Perú, como tenho ouvido algumas pessoas. Por aqui terá andado um rei Fulo que se chamava Dulo Demba e que se envolveu em escaramuças com os reinos Mandingas da região do rio Senegal. Este rei foi destruindo tudo e avançou até ao reino dos Beafares, em Guinala, que Donelha diz ser o nosso melhor porto antigo do rio Grande e melhor para o tráfico de escravos".

A partir desta descrição Donelha regista o comércio do rio Gâmbia, não esquecendo São Domingos, descreve o reino do Casamansa, temos depois uma detalhada apreciação do reino de Guinala, com o seu porto, e volta a sublinhar que aqui há a melhor escravaria de toda a Guiné, além de se resgatar ouro, cera, marfim e às vezes âmbar. Presença constante no detalhe desta viagem são os tangomaos que como se sabe eram luso-africanos. A edição é aprimorada com um acervo de notas de grande importância e tem em apêndice um documento deveras espantoso intitulado António Velho Tinoco e a sua viagem à Guiné em 1574. Em investigação posterior, Teixeira da Mota analisa este importante relato, Velho Tinoco pretendia pedir a capitania da Serra Leoa, a qual viria a ser concedida, nos começos do século XVII, a Pedro Álvares Pereira. Vale a pena mais tarde voltarmos a velho Tinoco. Quem apreciar literatura de viagens não ficará desiludido com a primorosa Descrição de André Donelha.
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15874: Notas de leitura (817): "Seis Irmãos Em África", narrativa cativante à volta de seis irmãos nascidos entre 1936 e 1951 que foram à guerra em Angola, Moçambique e Guiné (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P15880: (De)caras (37): Os bravos da Magnífica Tabanca da Linha: relatório de mais uma operação, a 24.ª (Texto de José Manuel Matos Dinis / fotos de Miguel Pessoa)


Foto nº 1 > O "fiel amigo" (que veio do frio, da Noruega) desta vez foi rei


Foto nº 2 > O João Martins e outro camarada (não identificado), fazendo horas, à porta do restaurante (em Oitavos, estrada do Guincho, Cascais)


Foto nº 3 > Mário Fitas, de Vila Fernando, Elvas, onde mais conhecido por Calças de Palanco ou Vagabundo, e a  sua Lena...


Foto nº 4 > O sempre fiel e leal tabanqueiro Colaço, bravo do Cachil... Em segundo plano, o comandante Rosales (de costas), o Manuel Lema Santos e o Mário Fitas


Foto nº 5 > O "strelado" A. Martins de Matos,  então (em 1972/74) tenente pilav que enfrentou e fintou os Strela do Manecas...



Foto nº 6 >  O JD, ao centro...


Foto nº 7 > O fotógrafo Manuel Resende, desta vez apanhado...


Foto nº 8 > O comandante Rosales, à esquerda, a contar ao Manuel Joaquim, ao Jorge Pinto e ao Luís Moreira, como é que foi e veio, vivinho da costa, à Guiné, "in ilo tempore"... Sim, porque ele é quase do tempo do capitão diabo, o Teixeira Pinto...

Fotos: © Miguel Pessoa  (2016). Todos os direitos reservados.


De: Jose Manuel Matos Dinis

Data: 17 de março de 2016 às 21:16

Assunto: 24.º Encontro da Magnífica Tabanca da Linha

Camaradas,

O que vai seguir-se é uma tentativa de relato sobre o magnífico acontecimento que hoje teve lugar em Oitavos. Em Oitavos, lembram-se?

Pois bem, depois de uma experiência num hotel da região, com excelente serviço e boas instalações, mas, ainda assim, sujeito ao crivo apertado dos exigentes apreciadores da Magnífica, que hoje manifestaram congratular-se com o regresso ao excelente cenário do Guincho, local de onde já não se avistam as caravelas em demanda dos mares do sul, ou do Novo Mundo, mas vêem-se outras embarcações, algumas de panos coloridos que conferem vistas de riqueza caleidoscópica que não cansam ao escrevente de se extasiar com a paisagem, registou-se novo e entusiástico encontro de confraternização.

Foram apenas 44 os que se apresentaram para colmatar as necessidades estomacais, mas chegaram com boas cores, desembaraçados, e de imediato lançaram-se aos "entretantos". Este vosso criado foi chamado à presença do repórter Resende, que sem querer perturbar os cumprimentos ao Exmo. Senhor Comandante Rosales, embevecido com a presença de simpáticas gentes, delegou em mim a difícil resolução pela constatação de se registarem mais mastigantes do que o previsto.

Felizmente que o chefe desencantou mais postas do fiel amigo, e propôs-se prepará-las enquanto se desenrolava o serviço. Por isso, eu e o referido repórter atrasámos as nossas refeições, já que poderiam imputar-nos graves responsabilidades pela infeliz circunstância.

E a propósito do fiel amigo e do repórter, lanço já o desafio ao nosso chefe de produção e especialista informático, para publicar no "FB" um retrato de uma magnífica posta, bem temperada e a banhos de azeite quente, acolitada com batatinhas assadas e bróculos cosidos. É um regalo para a vista, e foi muito reconfortante para o estômago dos combatentes, ainda mal conciliados com a recordação de doses excessivas e continuadas de bianda com estilhaços.

Antes da confrontação, pedi licença às senhoras e às autoridades presentes, para ler uma mensagem do Senhor Comandante-Mor, o Luís Graça, que engendrou uma desculpa profissional a justificar a ausência, e desejou a melhor temperatura ambiente, e anexou uns versos de efeito muito agradável junto dos alinhados desta Tabanca (*)

Também tive que transmitir a mensagem do camarada Armando Pires, que vem a experimentar alguma dificuldade respiratória e, naturalmente, procura identificar o mal para tomar as medidas adequadas. Ambos mereceram salvas de palmas, que registo com agrado.

No final da refeição havia duas espécies de doçarias, pudim afrancesado, e de bom palato, e tarte cheese-cake também ela muito bem confeccionada e saborosa. Porém, fiquei agradavelmente surpreendido com os cuidados alimentares dos camaradas e familiares, pois quando me desloquei ao balcão para tomar o café, reparei que ainda se mostravam partes relevantes daquelas doçarias, que já não são susceptíveis de emboscar e fazer cair em tentações açucareiras alguns mais preocupados com a preservação das respectivas saúdes.

Saúdo-os por isso, tanto mais que já há muito diagnosticado de diabetes e a tomar eficazes medidas vai para quinze anos, parece que atingi um estado de imunidade em relação aos males dali derivados, pelo que ainda tive oportunidade de repetir na dosagem, mas por vergonha não refiro o número de vezes que lá voltei. Obviamente, quem está no bom caminho são os meus queridos tertulianos, mas em futuras organizações vou insistir pelo reforço das sobremesas, para as entremear com uns clandestinos destilados sempre bem vindos.

Lá fora, o céu azul e a temperatura amena constituíam forte apelo à tomada de ar e à invasão daquele espaço natural, embora limitados pelos meios físicos que nos privaram de asas e da realização de sonhos sobrenaturais. E foi o que aconteceu. Pouco a pouco, cada um arguia razões para sair, para rumar aos seus destinos, certamente com os espíritos vitalizados por reencontros, conversas alegres, e a curva barrigal reforçada por acentuada exibição de conforto. (**)

JD
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Notas do editor:

(*) Versinhos lidos pelo JD

Se com a G3 foram bravos,
à mesa ‘inda o são mais,
há festa rija em Oitavos,
lá no Guincho, em Cascais.

Com o Rosales, comandante,
e o Dinis, para o blá-blá,
são uma tabanca pujante,
são os da Linha, ora aqui está!

Até de longe, já se inscrevem,
p’ra alinhar nesta operação:
comem bem e melhor bebem,
com a Guiné no coração.

domingo, 20 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15879: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (15): N'fendi cadera goss!

1. Em mensagem do dia 7 de Março de 2016, o nosso camarada Abílio Magro (ex-Fur Mil Amanuense da CSJD/QG/CTIG, 1973/74) enviou-nos uma lição de crioulo da Guiné-Bissau:


N'fendi cadera goss!

O crioulo da Guiné-Bissau

O crioulo é uma língua natural, isto é; uma linguagem que foi desenvolvida naturalmente pelo ser humano, de forma espontânea e serve de meio de comunicação entre os falantes de idiomas diferentes.
Estas linguagens: “Possuem normalmente gramáticas rudimentares e um vocabulário restrito, servindo como línguas de contacto auxiliares. São improvisadas e não são aprendidas de forma nativa.”

Consta que o crioulo da Guiné-Bissau (kriol) terá surgido como uma mistura de vários dialectos das mais variadas etnias, de modo a dificultar a compreensão dos portugueses, na época do colonialismo. Trata-se de uma língua falada, e não escrita, pois há poucos livros escritos em crioulo, e também não é a língua oficial do país, não sendo portanto, ensinada nas escolas.
Durante a guerra colonial na Guiné-Bissau (1963-1974), com a chegada massiva de tropas oriundas das várias regiões de Portugal, o crioulo da Guiné acabou por absorver muitos vocábulos portugueses.
Por outro lado, os militares portugueses, “na caserna”, acabaram por “inventar” algumas expressões, misturando crioulo com regionalismos e algum calão, originando uma linguagem digna de inclusão num qualquer compêndio linguístico.
Mas como, efectivamente, não existia qualquer dicionário, nem documento escrito que informasse qual o real significado de alguns termos em crioulo, estes eram por vezes usados de maneira diferente pelos militares, conforme a época e a região em que permaneceram na Guiné.

Por exemplo:
“- Djubi lá!” (para alguns “Djubi” significava “Jovem” e, para outros, significaria “Olha”; “lá” significava “ali” para todos).
Assim, para uns, “djubi lá!” queria dizer: “Jovem, olha ali!”; para outros queria dizer: “Olha ali!”
De qualquer maneira este pequeno exemplo serve para demonstrar a imaginação de caserna, pois era frequente ouvir-se os militares a usarem um novo verbo; “jubilar” (de “djubi lá”), como por exemplo:
“- Eh pá, estás a ‘jubilar’ a bunda da bajuda?!”
Que se podia traduzir por :
“- Eh pá, estás a olhar para o ‘traseiro’ da moça?!”

Conforme referi numa mensagem anterior, havia na sala onde eu prestava serviço na CSJD/QG/CTIG quatro escriturários, dois brancos e dois negros. Um dos escriturários brancos era também ajudante na Igreja Católica de Bissau (sacristão?) e falava crioulo muito bem. Deu-me algumas “aulas” e eu, na altura, “desenrascava-me” razoavelmente a falar crioulo.
Conhecia muitas frases e, embora seja minha intenção deixar aqui alguma informação sobre o assunto, não asseguro que a ortografia seja a correcta, já que o meu crioulo foi aprendido de ouvido, aliás como quase toda a gente por não existirem livros sobre o assunto.

O título deste capítulo “N’fendi cadera goss!”, era uma frase frequentemente usada pelos negros quando se “pegavam” uns com os outros e estavam prestes a chegar a vias de facto. Significava:
- n’ (eu)
- fendi (parto)
- cadera (cadeira, bunda)
- goss (rápido, depressa)

Isto é:
“- Eu parto bunda rápido!” o que, traduzido para um português mais vernáculo, queria dizer:
“- Eu parto-te já o ‘focinho’!”

Uma vez que já se passaram mais de quarenta anos e muitos dos termos já se me “varreram” completamente da memória, fiz umas pesquisas na net, onde encontrei a informação abaixo, à qual acrescentei algumas frases que aprendi de ouvido.

“Em português temos: eu, tu, ele, nós, vós, eles. Em crioulo: n', bu, i, no, bo, e. Estes são os chamados pronomes «fortes». Algumas vezes é possível usar os «fracos»; Ami, abo, elis. (eu, tu , eles).

Kuma ke bu sta? (como é que tu estás?)
Kuma bai kurpu di bo? (Como vai o seu corpo? = Como vai sua saúde?)
No na bai nus nima (nós vamos ao cinema)
Sta dretu (está certo, está bem), (o «está» virou «sta» e o «direito» virou «dretu»)
Pa bia di kê? (porquê?), (talvez uma derivação de “por via de quê”)
Alin'li (aqui estou, no sentido de «tou na boa»)


Como curiosidade, aqui vos deixo um "Pai Nosso” em crioulo da Guiné-Bissau:

“No pape ku sta na seu, (Pai Nosso, que estais no Céu)
pa bu nomi santifikadu, (Santificado seja o Vosso Nome)
pa bu renu bin, (Venha a nós o Vosso Reino)
pa bu vontadi fasidu (Seja feita a Vossa Vontade), (talvez traduzido à letra: 'para vós vontade fazida')
na tera suma na seu. (Assim na Terra como no Céu)
Partinu aos no pon di kada dia, (O Pão-Nosso de cada dia nos dai hoje)
purdanu no pekadus (Perdoai-nos as nossas ofensas)
suma ke no purda kilis ki iaranu, (Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido)
ka bu disanu kai na tentason (E não nos deixeis cair em tentação)
ma libranu di mal. (Mas livrai-nos do mal.)
Amen. (Amém)"


Alguns sinónimos:

ka = não;
ka bai = não vou;
ka tem = não tenho;
ka sabe = sabe mal, não presta;
ka sibe = não sei;
ka miste = não quero;
parte (de reparte?) = dá;
catota = vagina;
peso = escudo, dinheiro;
parte peso = dá escudo, dinheiro;
parte catota = anda fazer amor ;
parte punho = (adivinhem…);
Manga = muito;
Ronco = festa, bom, fixe, etc.

Se a duas ou três palavras em crioulo juntarmos uma ou outra palavra em português, ficamos a falar crioulo que nem um manjaco!

Por exemplo:
- Furriê, parte peso(1) (furriel dá um peso).
- Ka tem patacom (não tenho dinheiro).

Quando nos aparecia um preto que ainda não conhecíamos.
- Kal raça di bó?
- Fula.
- Manga de ronco!

Se fosse de uma outra etnia qualquer (são cerca de trinta) respondia-se de igual modo e eles ficavam felizes, claro, porque tinham orgulho na sua raça.

Nos anos de 1960-70 estava em moda uma canção de Gianni Morandi (cantor italiano) que tinha o título; “Não sou digno de ti”.

Na maioria das vezes as rádios locais transmitiam os seus programas totalmente em crioulo e, entre os militares, constava que a dada altura o locutor de serviço terá anunciado:

“- Pa tudu irmon de no tera e Mamadu Djaló cabita Catió, Giani Morandi na bai na canta pra bo, ‘Ka so dinho di bo’ ”.

Provavelmente tratar-se-ia apenas de uma ‘caricatura’, onde o uso de muitos «ós» dava à frase uma sonoridade engraçada.

“Pa tudu irmon de no tera” – Para todos os irmãos da nossa terra, para todos os guineenses.
“Mamadu Djaló” – nome muito frequente na Guiné-Bissau.
“cabita Catió” – que mora em Catió (pequena cidade da Guiné-Bissau).
“na bai na canta pra bo” – vai cantar para vocês.
“Ka so dinho di bo” – Não sou digno de ti.
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Fontes:
Wikipédia
http://marcoembissau.blogspot.pt

(1) – O peso foi a moeda da Guiné-Bissau entre 1975 e 1997, após o que foi substituído pelo Franco CFA (Colónias Francesas Africanas) aquando da sua entrada na União Monetária dos Estados da África Oriental - UEMOA (Union Économique et Monétaire Ouest Africaine).
Já antes da independência os guineenses chamavam “peso” ao escudo português da Guiné.

Abílio Magro
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de janeiro de 2016 Guiné 63/74 - P15618: Um Amanuense em terras de Kako Baldé (Abílio Magro) (14): O Prisioneiro da Ilha das Galinhas

Guiné 63/74 - P15878: Atlanticando-me (Tony Borié) (11): Smplesmente, um ovo

Décimo primeiro episódio da nova série "Atlanticando-me" do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66).




Simplesmente, um ovo!

Já devia passar das oito horas da noite, era para lá do “Paralelo 48 Norte”, naquela altura do ano, continuava de dia, havia alguns chuviscos, descíamos a montanha, por uma estrada de terra, lama e pedra, depois de passar pelo topo, onde alguma neve desaparecia lentamente, em direcção a algum ribeiro onde, entre outros animais um urso procurava algo para comer. Já tínhamos passado a fronteira, para os Estados Unidos, depois de viajar por território do Canadá, a estrada já estava mais bem tratada, mas todo o cuidado era pouco.



Próximo do fim da montanha, onde o terreno começava a ser plano, surge-nos uma placa de sinalização com alguns nomes de localidades, entre os quais estavam as palavras, “Chicken 43 milhas”. A primeira coisa que proferimos para a nossa esposa e companheira, foi:
- Chicken!. Deve haver por lá galinhas e ovos!

Ovos que adoramos e que estivemos por um período de dois anos sem poder comer, pois não se fabricavam, nem havia qualquer hipótese de os obter em quantidade para fazer parte da dieta de qualquer militar combatente que estivesse estacionado no aquartelamento de Mansoa, na então nossa Guiné. Podemos estar a cometer um erro, mas cremos mesmo que naquela altura, não era só em Mansoa, devia-se passar o mesmo em qualquer aquartelamento do interior da província, ovos, era um luxo quase impossível de obter. Tão simples, um ovo, talvez os companheiros não se recordem, mas não era fácil encontrá-los.


Voltando à tal localidade chamada “Chicken”, cuja tradução pode ser mais ou menos Frango ou Galinha, depende da conversação, mas para nós é Galinha, situa-se no estado do Alaska, a sudeste da cidade de Fairbanks, é uma comunidade fundada pelos pesquisadores de ouro e, é uma das poucas áreas, ainda sobreviventes, da corrida do ouro no Alasca, onde ainda se pode ver pessoas nos ribeiros, atolados na lama, procurando o precioso metal. A população era de 7 pessoas, no Censo de 2010, no entanto, em diversas alturas do ano, existem mais ou menos 17 habitantes, que ainda se dedicam à pesquisa.

 “Chicken” faz parte da lista de nomes de lugares incomuns, mas galinha e ovos são um fenómeno que às vezes fazem com que brinquemos com as palavras, sem saber quem existiu primeiro, se a galinha ou o ovo, que quase todos nós adoramos, pelo menos ao pequeno almoço, e podem ser “mexidos”, onde aparece o amarelo quase misturado com o branco, “ensolarados”, onde o amarelo é levemente cozido e o branco não, “médios”, onde a parte branca está cozida, mas o amarelo está meio cru, onde todos gostamos de molhar o pão, ou o normal “estrelado” ou cozido, que com um pouco de sal, é excelente para se beber um bom “copo de tinto”.

Voltando à localidade “Chicken”, recebeu este nome porque os primeiros habitantes, pesquisadores de ouro, que por aqui se aventuraram por volta do fim do século dezoito, eram quase como que atacados por umas aves que dão pelo nome “ptarmigan”, muito parecidas com galinhas bravas, que fazia parte da sua dieta 7 dias por semana e, quando resolveram estabelecer-se nesta comunidade uma estação dos correios, o nome só podia ser um, que era ”Chicken”. Hoje, ainda é um posto avançado para um distrito de mineração de aproximadamente 40 milhas, que começou por ter alguma projecção a partir do início de 1900, onde ainda existem minas de ouro activas, cujo ouro é suficiente para que a sua exploração continue em actividade.

Então, já puxaram pela memória, qual dos companheiros “agarrou” um ovo, lá na então nossa Guiné, que podia ser comido, “mexido”, “estrelado” em fogo médio, até só “escaldado”, “alinhavado”, ou simplesmente “cozido”?

Só agora me lembro, os ovos também servem para demonstrar alguma manifestação de que não gostamos de qualquer personagem, não só pública, onde se podem atirar, sem fazer um mal físico, lá muito grande.

Tony Borie, Março de 2016
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15849: Atlanticando-me (Tony Borié) (10): Nós Combatentes e Elas Combatentes

Guiné 63/74 - P15877: Blogpoesia (441): "Tratar da horta...", de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

Com a devida vénia a BIOLOGIA 12º CFMT


1. Em mensagem de hoje, 20 de Março de 2016, primeiro dia de Primavera, o nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66), enviou-nos este poema dedicado ao tratamento da horta:


TRATAR DA HORTA...

De sacho na mão,
Cavo minha horta,
Cada manhã.

Revolvo a terra.
Exponho-a ao sol.
Lanço a semente.
Água fresquinha.
Imploro uma reza.
E fico à espera,
A ver o que dá.

Nunca tardou.
Na hora, aparece um rebento,
Cheio de esperança.
Põe-se a crescer,
Fugindo para o ar.

Surgem as folhas,
Na ponta dos ramos.
Rebentam flores
Com sede de luz.

Às duas por três,
Minha horta é um jardim
Que apetece contemplar.

Milagre da vida,
à frente dos olhos.
Só não vê quem não quer.

Bendito Senhor!...

No Bar Caracol, arredores de Mafra,
olhando para Sintra

20 de Março de 2016
9h29m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15848: Blogpoesia (440): "Nomes e verbos...", de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

sábado, 19 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15876: Manuscrito(s) (Luís Graça) (78): Os homens medem-se pelas palavras...


Epigrama: na real galeria de arte, com dicas para um real retrato a corpo inteiro

por Luís Graça


Se o rei tem um metro e meio de altura,
agigantem-no,
elevem-lhe o trono
até ao primeiro piso.

Mais do que boa figura,
e melhor siso,
deve ter estatura,
o rei,
para ficar bem no retrato
da história,
e não ser um rei de má memória.

Se for preciso, 
ponham-no a andar,
corram com ele,
arranjem-lhe umas andas,
ou passeiem-no de andor,
pela baixa da cidade.

Primeira regra protocolar:
rei é chefe

e, como tal, é sempre aquele
cuja cabeça está acima das outras cabeças,
por isso é uma cabeça coroada.

Pequeno detalhe:
às vezes uma almofada
resolve o problema do desconforto
de quem, coitado,
tem que pensar a vida inteira sentado
num trono,
mesmo que torto,
sem nunca cair de sono,
antes de poder chegar ao fim do reinado.

E
, a propósito,
um rei deve morrer
com toda a real dignidade,
honra,
glória,
pompa
e circunstância,
em caso algum
(cruzes, canhoto!)
degolado,
guilhotinado
ou enforcado!

Na pior das hipóteses,
fuzilado,
com honras militares!

Em boa verdade,
não há real cu que aguente
tanto tempo sentado
como o de sua majestade
que nasceu para reinar.

Mas rei não é anjinho
e, para ser santo,
falta-lhe o cinto de castidade
com fechadura,
e chave entregue ao ministro do tesouro.

Se o rei vai nu, 
ou se passeia em trajes menores pelo terreiro do paço,
é mau agouro,
por favor, senhor pintor da corte,
ponha-lhe um sorriso,
de boca a boca,
como o da “Mona Lisa”.
E um ligeiro buço,
que um rei deve ser eternamente
adolescente,
imberbe,
devoto
e púdico,
mesmo quando rei do reino mais ignoto.

E, claro, ponha-o a olhar de frente,
como o nosso menino el-rei dom Sebastião,
forrado de armadura,
perscrutando os inimigos da Nação,
d’aquém e d’além-mar.
(Que pena nunca ter tido um real pintor à sua altura!)

Se o rei tem uma vida sedentária
e aborrecida,
e se o povo e a bosta de boi
não lhe fazem urticária,
troque-se-lhe a vida palaciana
pela campestre,
espetem-lhe um coroa de espinhos na cabeça,
para saber o quão imensa e intensa é a dor,
humana.

Ou então façam-lhe o retrato equestre, 

como ao senhor dom josé,
montem-no a cavalo,
no seu garanhão branco,
puro sangue lusitano.
A coroa fica-te a matar, meu amor!

Mas também não fica mal,
à rainha, com sorte,
vestida de branca de neve,
rodeada dos seus sete anões,
quando sai à rua p’lo Natal,
de sapatos altos de cristal,
ouvir piropos de carroceiro,
que o povo é alarve e brejeiro:
ah!, meu querido Hirohito,
há quanto tempo não me vais ao pi...! 
(Atenção, que piropo agora dá prisão!).

Se o rei morre de tédio,
suspirando uis e ais,
ou vai com cio,
por montes e vales,
atrás dos javalis e lobisomens,
soltem os cães, os faunos e duendes
e convoquem os homens dos jornais,
mas não lhe chamem louco,
que é pouco!

Segunda regra protocolar:
decretem a caça às bruxas,
ou então povoem a corte de anões,
que logo o rei os fará cavaleiros e barões,
sete vezes sete,
blogue fora nada,
que dos régios cofres, é o segredo,
sempre cheios,
garante o guarda-mor do real selo,
caído em desgraça
e a caminho do degredo.

Terceiro e último aviso ao povo
que nunca foi a uma sessão de fado
com beija-mão real no paço do lumiar:
fraco rei faz fraca a forte gente (camões dixit)…

Súbditos leais,
e corteses,
mas velhos e feios,
são os marqueses,
e utilitárias as marquesas,
francesas,
de paços de ferreira
e de fartos seios,
mas dos duques teutónicos
diz-se que são maus fregueses.

Anacrónicos,
esses, são os portugueses
que ainda delapidam diamantes
com as plebeias criadas de servir
e as ‘cocottes’ burguesas…

E das duquesas,
inglesas,
senhor,
o que me dizeis ?
Ah!, que são as melhores amantes
de reis
e serviçais.

Baralhadas e dadas as cartas,
o trunfo é paus,
a cruz que Deus nos deu, 

além do trabalho
por causa do pecado original:
hipótese nula,
fica tudo como dantes,
o quartel em Abrantes,
que de Espanha nem bom vento
nem bom casamento,
nem macho ou mula com boa pinta.

Hipótese de investigação número um:
em caso de desgraça,
peça-se mercês a sua senhoria
e mande-se a conta
à mercearia. 
O elétrico ? 
É o número vinte e oito,
para a graça.

Mais vale, cariño mio,
ser rei por um dia,
do que príncipe regente toda a vida.

Hipótese dois:
em caso de fome, guerra, peste e revolução
(de que Deus nos livre!),
convém que o rei guarde a cabeça,
nalgum lugar mais esconso e seguro do palácio.
Um rei, meu filho, vale pelo trono
e o trono pela coroa
e a coroa pela cabeça.
Não há seguradoras que seguramente cubram
todo este real risco.

E, para mais, Carlota,
como vós mui bem sabeis,
há ainda o real fisco,
que é agiota,
vampiro e daltónico,
e não distingue a cor do sangue,
azul ou vermelho.

Conclusão, e bom conselho
para os reais pintores
e demais bobos da corte
e vindouros:
os homens não se medem aos palmos,
muito menos os reis;
os homens medem-se pelas palavras,
e os bois pelos cornos.



Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, Galeria de Exposições Temporárias, Wentworth-Fitzwilliam. > Uma Coleção Inglesa, 6 de março de 2016.

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Nota do editor:

Último poste da série > 14 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15747: Manuscrito(s) (Luís Graça) (77): "Nesta terra querida, / Tive mundo, e tive amor, / Não me posso queixar da vida, / Tive tudo, e também dor"... Viva a nossa decana, a dona Clara Schwarz da Silva

sexta-feira, 18 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15875: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (35): antigo quartel de Jabadá Porto, setor de Tite, ou outros antigos quarteis das NT na região de Quínara: quem quer e pode ajudar a Inês Galvão, jovem doutoranda em antropologia que vai estar até junho na Guiné-Bissau ?

1. Mensagem de Inês [Neto] Galvão,  doutoranda em antropologia pelo ICS/UL - Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa:

Data: 14 de março de 2016 às 11:53

Assunto: quartel de Jabada Porto, sector de Tite

Caro Luís Graça e demais camaradas:

Faço pesquisa de teor histórico e etnográfico sobre parentesco e política de género na região de Quínara, onde um mais-velho me contou viver cioso de retomar contacto com antigos colegas de armas e amigos portugueses. O seu nome é Luís Fanda e no cartão que me mostrou da Associação de Ex-Militares das Forças Armadas Portuguesas tem os seguintes dados:

Cartão Milícia 25/02 n.º 360
Companhia 8, Caçadores 4610
Natural de Jabada Porto, sector de Tite

Sei que fez instrução em Bolama e que terá passado algum tempo na Amura, em Bissau, contando seguir para a metrópole.

Aproveito ainda para perguntar se no vosso grupo haverá alguém disposto a conversar comigo sobre o quartel de Jabada Porto ou outros de Quínara. Interessar-me-ia entrar em contacto com quem guarde vivências do quartel e queira partilhar apontamentos sobre os habitantes da tabanca e região, bem como sobre as relações entre estes e os portugueses então lá presentes (militares ou não).

Registos fotográficos e passagens literárias, mais ou menos pessoais, que partam de Jabada e Quínara com referência a matérias de parentesco, cerimónias e animismo também me seriam úteis.

Regressarei a Lisboa em Junho deste ano.

Até lá estarei contactável por e-mail:

galvines@gmail.com

ines.galvao@ics.ul.pt

Ficaria muito feliz se se conseguisse organizar uma vídeo-conferência para que o Luís voltasse ao contacto com os seus amigos.

Um abraço,
Inês




Guiné > Região de Quínara > 1ª CCAÇ / BCAÇ4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) > 1974 >  Aquartelamento de Jabadá, na margem esquerda do Rio Geba




Guiné > Região de Quínara > 1ª CCAÇ / BCAÇ4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) > 1974 > Aquartelamento de Jabadá > Edifício das transmissões, camarata do Comandante de Companhia, bar de sargentos e oficiais, cozinha e refeitório, e secretaria



Guiné > Região de Quínara > 1ª CCAÇ / BCAÇ4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) > 1974 > > Enfermaria, central eléctrica, bar dos praças e depósito de géneros.




Guiné > Região de Quínara > 1ª CCAÇ / BCAÇ4612/74 (Cumeré, Jabadá e Brá, 1974) > 1974 > Depósito de água, padaria e cozinha

Fotos (e legendas): © António Rodrigues Pereira (2010). Todos os direitos reservados

2. Comentário do editor:

Inês, para já os nossos parabéns por (e votos de felicidade para) o seu projeto de doutoramento que, segundo a página do ICS-UL, é sobre "Género, poder e transformação social: uma etnografia histórica sobre relações conjugais entre balantas da Guiné-Bissau". (*)

Em linguagem da tropa, tiramos-lhe o quico!... Você é uma mulher valente, ao trocar este cantinho da Europa, com o seu relativo conforto e segurança, pelas agruras do dia-a-da da Guiné-Bissau.

Em relação ao seu pedido, teremos todo o gosto de ajudar, no que pudermos. Sobre Jabadá temos algumas referências no nosso blogue. Mandamos aqui umas fotos de 1974, com, o aquartelamento de Jabadá... Já nada destas instalações deve existir...

Tem também aqui o mapa de Tite (incluindo Jabadá). E há vários camaradas nossos, membros da nossa Tabanca Grande, que passaram pela região de Quínara ao longo dos anos da guerra (Tite, Fulacunda, Jabadá, Enxudé, S. João...). Aqui vão alguns (, a lista não é exaustiva). Espero que eles a possam ajudar, através de um primeiro contacto por email:

(i) José Inácio Leão Varela, ex-alf mil,  CCAÇ 1566, Jabadá, Pelundo,Fulacunda e S. João, 1966/68;  economista reformado, mora em Algés, Miraflores;

(ii) António Rodrigues Pereira, ex-fur mil at inf,  1ª CCAÇ / BCAÇ 4612/74, Cumeré, Jabadá e Brá,  1974;

(iii)  Jorge Pinto, ex-alf mil, 3.ª CART/BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74; natural de Turquel, Alcobaça; é professor do ensino secundário, reformado; mora em Lisboa;

(iv) António Correia Rodrigues, ex-fur mil cav, CCAV 677, Fulacunda, S. João e Tite, 1964/66;

(v) Santos Oliveira, ex- 2.º sarg mil armas pesadas inf, Pel Mort 912 (Como, Cufar e Tite, 1964/66).

Quanto ao antigo milícia (ou soldado do recrutamento local?) Luís Fanda, os elementos de identificação que nos manda estão, por certo, errados... Ele estaria porventura ligado ao BCAÇ 4610... Só que temos dois batalhões, com esse número, o BCAÇ 4610/72 e o BCAÇ 4610/73... Cada batalhão (c. de 600 homens)  tinha 4 companhias (três de quadrícula e uma companhia de comando e serviços)... A Inês tem que reconfirmar os dados... E perguntar ao Luís Fanda por onde andou e quando e com quem... Se ele era natural de Jabadá, pode ter andado noutras regiões (Cacheu, Tombali, Gabu...). A Guiné-Bissau é grande, do tamanho da Holanda ou do nosso Alentejo... No nosso tempo, no tempo da guerra, era muito maior... Muitos de nós só conhecíamos o "buraco" onde fomos colocados... Enfim, não conhecemos, aqui no blogue,  nenhuma "Companhia 8", nem Companhia de Caçadores 4610...

Boa sorte... Talvez possa falar pelo Skype um dia destes com estes camaradas que lhe indico, ou então falar com eles quando regressar em junho. Disponha do nosso blogue... Eles vão ficar com os seus contactos... Mande-nos também fotos da região... E notícias, claro, de si e das gentes de Quínara. (**)
LG
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Notas do editor:

(*) Descrição do projeto de doutoramento da Inês Gouveia:

Este projecto visa investigar as relações de conjugalidade na Guiné-Bissau face à polémica sobre a poligamia e os casamentos «arranjados», ditos «forçados» ou «precoces», e face aos debates sobre emancipação e subalternidade feminina. Integradas estas questões no âmbito mais alargado do parentesco e da política de género, a pesquisa tomará as populações identificadas sob o etnónimo balanta como âncora empírica. Através da exploração histórico-etnográfica do campo de litígio gerado em torno destes casamentos e do estudo de práticas de rejeição dos mesmos, considerar-se-ão conexões com processos sociais mais vastos, como aqueles movidos pela expansão da economia capitalista, pela implementação do Estado colonial e pós-colonial, bem como pelo contacto entre distintos modelos de conjugalidade e casamento. Este projeto é apoiado pela Bolsa FCT referência SFRH/BD/94769/2013.

(**) Último poste da série > 20 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15771: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (34): É crocodilo ou jacaré ? Caros leitores, corrijam as legendas, se for caso disso...

Guiné 63/74 - P15874: Notas de leitura (819): "Seis Irmãos Em África", narrativa cativante à volta de seis irmãos nascidos entre 1936 e 1951 que foram à guerra em Angola, Moçambique e Guiné (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Março de 2016:

Queridos amigos,
Estamos sempre a aprender, estes seis irmãos experimentaram a guerra e juntaram os relatos que forçosamente nos tocam pela ausência de redundâncias e arrebiques, não há para aqui declarações de valentia nem a descarga de azedumes, as coisas foram assim, e ninguém encenou bravatas, há mesmo a propensão para as horas de folia, até há uma descrição humorada de um amanuense que viu em Cacine os lances dramáticos, as sequelas dos ataques a Gadamael, naqueles bravios meses de 1973.
Honra aos Magro, pelo que se lê vieram de boa saúde e guardam o que há de melhor nos tempos de camaradagem que a guerra permite.

Um abraço do
Mário


Os seis irmãos Magro deixaram a casa e foram à guerra

Beja Santos

Trata-se de uma narrativa cativante à volta de seis irmãos nascidos entre 1936 e 1951 que foram até Angola, Moçambique e Guiné participar na guerra, cada um na sua especialidade. Não sei se existe outra família com tal historial. Juntaram memórias que primam pela singeleza e economia descritiva nas diferentes abordagens. Nada de grandes amarguras, nada de mistificações, sente-se que os Magro são folgazões e não querem fazer alarido de bravuras que não viveram. Fazem parte de um arco familiar que nunca foi esquecido, como escrevem: “Uma casa repleta de juventude e movimento ficou, no espaço de dois ou três anos, vazia, fria, envolta em tristeza, albergando apenas o pai, já viúvo. A mãe, doente, vira partir e apenas regressar um. Foi duro. Já não viu partir o sexto”.

Do mais velho já aqui falámos, o Capitão Miliciano de Artilharia Fernando Magro, que teve responsabilidades em Bissau pelas obras dos ordenamentos. Tinha prestado serviço militar entre 1958 e 1960, foi repescado em 1968. Com a saúde precária, foi colocado em Bissau nos Serviços de Reordenamentos Populacionais, chefiando depois os Serviços do Batalhão de Engenharia 447, tendo acumulado atividades extras. Retomando um texto publicado, lembra-nos que a rapaziada da Engenharia que tinha como funções dar apoio às tropas aquarteladas na Guiné, promovendo o fornecimento de geradores elétricos, orientando e apoiando as obras de reordenamentos populacionais, construindo estradas, pontes e portos de atracagem e até quarteis, também corriam perigos, como nos conta os acontecimentos vividos pelo Furriel Miliciano de Engenharia Pedro Manuel Santos, constante do livro “A Engenharia Militar na Guiné”, uma emboscada sofrida entre Piche e Nova Lamego, em 22 de Março de 1974, seguiam na coluna militar elementos do Batalhão de Engenharia. Escreve Pedro Manuel Santos: “Nesta emboscada tivemos 6 mortos, 16 feridos muito graves e 3 feridos ligeiros. Tenho na memória alguns camaradas a respirar pelas costas e já sem vida. Alguns completamente desfeitos. Quando regressei à metrópole senti-me completamente abandonado e entregue a mim próprio. Ninguém me perguntou se estava bem ou mal, se precisava ou não de qualquer tipo de ajuda. Tinha de recomeçar a minha vida”.

A seguir a Fernando vem Rogério, Furriel Miliciano Atirador de Infantaria, em Angola, 1967/1969. “O Rogério foi dos seis irmãos que prestaram serviço nas ex-províncias ultramarinas o que certamente teve o percurso militar mais duro, como maiores privações e que enfrentou maiores perigos”. Depõe sobre os seus dias em Lumbala, 48 dias a comer rações de combate, não faltaram emboscadas, relata histórias de solidariedade e até ordem de prisão. Para nunca mais esquecer foi uma história vivida em Maio de 1968 em que o mandaram levantar o dinheiro para pagar os ordenados da CCAÇ 1719, andou com a pasta apavorado uma série de dias, um pesadelo quando podiam ter sido alguns dias de férias no Luso.

O terceiro irmão chama-se Dálio, Alferes Miliciano de Engenharia, andou por Moçambique, em Marrupa, entre 1970 e 1972. A despeito da canseira das colunas e dos ataques de abelhas, é o Magro que terá levado a comissão com a maior carga de otimismo e bonomia. Temos depois o caso de Alberto, Especialista da Força Aérea, cumpriu seis anos de serviço militar entre Tancos, Angola e S. Jacinto. Guarda recordações das evacuações, das idas à caça e da operação Siroco, que envolveu tropas especiais.

O mano seguinte é Álvaro, Primeiro-Cabo Auxiliar de Enfermagem, começou em Mansambo, participou numa operação militar, adormeceu e quando acordou viu-se sozinho. O irmão Fernando, Capitão em Bissau, tudo fez para o trazer para o Hospital Militar de Bissau. É por esse tempo que morre a mãe dos Magro, ainda muito nova, foi um abalo para aquela ninhada de oito irmãos.

O último dos Magro, de nome Abílio, foi Furriel Miliciano Amanuense. Deixa-nos um registo do Major Leal de Almeida, amigo do irmão Fernando. Viveu a contragosto o período turbulento dos ataques a Gadamael e de toda aquela gente que se foi recolher a Cacine. Não esqueceu as bombas em Bissau, no café Ronda, no autocarro da Base Aérea e o dia 25 e 26 de Abril em Bissau. Mas divertiu-se imenso, gostou de aprender crioulo, é um belíssimo relato. No termo destas memórias, fecha-se o arco familiar falando dos pais, Acácio Lamares Magro e Adelina de Pinha Valente. Seis irmãos que andaram por várias paragens e que passaram a limpo as suas memórias, sem prosápia nem farronca; dá gosto esta leitura de gente que não precisa de fazer alarde nem teatro nem fantasia do que experimentaram e guardaram para nos contar.
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15855: Notas de leitura (816): "Seis irmãos em África", edição de autor, Porto, 2016... Um excerto: "Perdido no mato de Mansambo... por uma hora!" (Álvaro Magro, ex-1º cabo aux enf, CART 3494, Mansambo, e HM 241, Bissau, 1971/74)

Guiné 63/74 - P15873: Agenda cultural (469): Apresentação do livro "A Tropa Vai Fazer De Ti Um Homem", da autoria de Juvenal Amado, levada a efeito no dia 16 de Março de 2016, na Tertúlia semanal da Tabanca de Matosinhos

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 17 de Março de 2016, a propósito da apresentação do seu livro na Tertúlia semanal da Tabanca de Matosinhos, no passado dia 16:

Meus caros amigos e camaradas
Eu não escrevo por compulsão mas por impulso. Assim necessito de uma ignição, dum clique que me desbloqueie e que faça voar e alinhar as palavras.
Por isso eu não sou um escritor mas sim um contador de estórias. E contador porquê? Porque é necessário um facto, uma foto, um risco no chão, um encontro com um amigo, um cheiro, um lugar etc, enfim um momento que faz despoletar a imaginação que dá ordem aos dedos e então escrevo.

Por vezes quando me faltam as palavras e se me embarga a voz, recorro a outro estratagema. Passo a alinhar pensamentos, palavras, emoções, donde saem arremedos de poesia, mais ditados pelo coração do pela razão e pela qualidade.
E foi o que aconteceu ontem na Tabanca de Matosinhos a Tertúlia onde amigos me receberam para além do que eu esperava.
Naquele encontro aconteceu calor humano, amizade, poesia e emoção e pensarão alguns, que é coisa pouca, mas não é, pois nem só de pão vive o homem.
Para acontecer amizade, só precisamos de um amigo e estavam lá tantos!

Comecei este texto a denunciar-me.
Não tenho nenhuma formula mágica, sai naturalmente após o clique, escrevo as “coisas” que evoluem como cozinhado, onde se vai fazendo e provando de sal aqui, ervas aromáticas ali e finalmente, deixando apurar até que o calor manso, faça libertar os aromas e o sabores que estavam escondidos.
Depois disto tudo, leio e digo para comigo, “foi fácil, como é que não me tinha lembrado disto”?

Ontem o José Teixeira leu um poema retirado do meu livro. Ouvi-lo ler, foi das experiências mais maravilhosas que me aconteceram na vida.
O poema não era meu, era de quem o estava a ler, pois ele ao fazê-lo recriou-o, deu-lhe tudo o que lhe tinha faltado até então.
Deu-lhe voz, deu-lhe som, projectou as imagens de frescura e luz, fez-me recordar o rapazola que foi para a Guiné e a pessoa que de lá regressou.

Zé Teixeira ao ler o poema e a amizade demonstrada por todos, fez de mim um homem feliz num dia que não esquecerei nunca.
A todos os camaradas quero agradecer as provas de amizade e na verdade, ir para a tropa e para a Guiné fez de nós homens diferentes.

Está mais que provado.
JA

************


2 - Poema lido pelo José Teixeira

UMA PARTE DE NÓS FICOU PARA SEMPRE LÁ

A luz fere-me os olhos
O mar que me embalou na viagem
Quebrou-se manso na barra
Lá está a ponte no seu vai e vem
Ainda guardo a imagem da partida

Para trás ficaram as águas barrentas
O calor sufocante
O cacimbo
O Céu de chumbo
Os dias e noites de insónia
A insanidade afogada num copo
O rosto, que duvido se terá existido

Tão ansioso da partida
Mal posso esperar pela chegada
O Sol resplandece na manhã fria
A maresia invade-me o peito
Voltam os cheiros adormecidos
No cais a molhe de sorrisos cresce

Lisboa maravilha-me
O ar fresco e límpido
Mal posso esperar pelos braços que me aguardam
Haverá lágrimas, serão de alegria

Deito o cigarro fora
Fico a vê-lo rodopiar até tocar na água
Finalmente caminho no passadiço
Vim para ficar
Pensei que o passado ficara para trás

Como pude ser tão cego
Pensar que esquecia tudo
Que uma parte de mim não ficaria lá para sempre
Na ânsia da partida
Neguei-me a olhar para trás

E agora, que a saudade me corrói
Sei que nunca regressei na totalidade

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3 - Algumas fotos da apresentação do livro "A Tropa Vai Fazer De Ti Um Homem", na Tabanca de Matosinhos

É este o ambiente de camaradagem que se vive na Tabanca de Matosinhos, semana após semana, todas as quartas-feiras, desde há muitos anos...

...Onde a música também marca presença. À esquerda, atacando o cavaquinho, o nosso camarada tertuliano João Rebola

Juvenal Amado durante a sessão de autógrafos

Juvenal Amado com o António Tavares e o Manuel Carvalho Passos. Três camaradas da tertúlia do nosso Blogue

Juvenal Amado e Francisco Baptista. Ambos têm em comum o saber falar das suas terras e das suas gentes

Muito bem "intrometido" entre o Juvenal e o Tavares, o nosso contador-mor de belas histórias de amor, o José Ferreira da Silva (o Silva da CART 1689).

 Juvenal Amado veio a Matosinhos também para saborear o belo bacalhau do Milho Rei. Aposto.

Juvenal Amado e o seu colega escritor António Marques Lopes, autor do livro "Cabra Cega - Do Seminário para a Guerra Colonial".

Juvenal em conversa com o Manuel Passos, combinando talvez outra visita a Matosinhos. Quem sabe?

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Selecção e legendagem das fotos da responsabilidade do editor
Fotos enviados por Juvenal Amado
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de março de 2016 Guiné 63/74 - P15851: Agenda cultural (468): Juvenal Amado apresenta o seu livro "A Tropa Vai Fazer de Ti um Homem! (Guiné 1971-1974)", na sua terra, Alcobaça, na Biblioteca Municipal, sábado dia 19 deste mês, às 16h00. Além do alcobacense José Alberto Vasco, o livro será apresentado também por Belarmino Sardinha, nosso grã-tabanqueiro