Escrevemos-lhe, a seu pedido e com muito gosto, o prefácio a este segundo volume. E o título do prefácio está alinhado com o do livro: "Aqueles que souberam fazer a guerra e a paz, com 'sangue, suor e lágrimas'… e uma boa pitada de humor de caserna"...
Pelo índice, provisório, que o autor nos mandou por email, sabemos que um dos contos inseridos tem por título "Promessas".
Este segundo volume é uma seleção, feita pelo próprio, dos melhores textos ("short stories" ou microcontos) publicados no nosso blogue sob a série "Outras memórias da minha guerra", que se seguiu à série "Memórias boas da minha guerra".
A pretexto do centenário do santuário de Fátima (1917-2017), e a propósito do inquérito sobre Fátima que termina hoje no nosso blogue (*), achamos oportuno reproduzir uma excerto desse história, "Promessas", justamente a última parte (**). Com a devida vénia ao autor... e votos de bom sucesso de vendas para este segundo volume. (***)
José Ferreira da Silva. Foto: Chiado Editora |
Promessas (excerto)
(...) Quando se aproximou o 13 de Maio de 1969, já os dois filhos mais velhos da Ti Ana haviam chegado sãos e salvos [, o mais velho, de Angola, e o outro, o Mário, da Guiné] . Agora era preciso pagar as promessas.
A Ti Ana vivia dias felizes, de bem com Deus e com todos os santos, a quem prometera sacrifícios até ao fim da sua vida. De sua casa partiram em conjunto mais de 20 pessoas, com destino a Fátima, a pé. Entre elas, seguiam vários jovens vestidos de camuflado como o faziam lá na guerra, nas Operações Militares. Um deles, estava numa cadeira de rodas. O Mário, que cumpria a sua promessa pela negativa, abeirou-se do rapaz e perguntou:
– Também vais até Fátima?
Ele respondeu:
– Sim, com ajuda da malta e da N.ª S.ª de Fátima que, graças a ela, aqui estou salvo, lá chegarei. E tu, não vais?
– Eu, não. Não fiz promessas e tive sorte. Pelo contrário, tive amigos que lá ficaram e tinham prometido ir a Fátima, Arcozelo, Peneda e Sameiro.
– Pois, tiveste sorte, é porque alguém pediu muito por ti. – respondeu o rapaz
Vinte e cinco anos depois, a Ti Ana, já com uns 70 e tal anos, deixou de poder cumprir a promessa, indo a pé. Confessou a sua impossibilidade ao padre das Missões, onde passou a colaborar, e “renegociou” as suas Promessas: passaria a organizar 2 excursões anuais, em autocarro, mobilizando mais de meia centena de seguidores de N.ª S.ª de Fátima.
Com a mãe a aproximar-se dos 90 anos, o Mário resolveu dar-lhe a alegria de ir a Fátima numa dessas excursões, que era, agora, ajudada na organização, pela filha mais nova. Ele gostou imenso daquele ambiente popular e alegre e prometeu ir lá mais vezes.
Quando, estavam em Fátima, o Armindo interpelou a Ti Ana, na frente do Mário:
– Como é que conseguiu que este herege viesse a Fátima?
– Olha, menino, quanto mais velha, mais feliz me sinto. Hoje estou a cumprir a minha promessa mais difícil. Há mais de 40 anos que a estava a dever à N.ª S.ª de Fátima!
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 16 de maio de 2017 > Guiné 61/74 - P17363: Inquérito 'on line' (115): Fátima... Com 70 respostas no início da tarde, e a menos de 24 horas para o fim do prazo, conclui-se que todos lá fomos, pelo menos uma vez na vida, antes, durante ou depois da tropa... mais como turistas (58%) do que como peregrinos (18%)
(**) Vd. poste de 24 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9650: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (15): Promessas
(***) Último poste da série > 15 de maio de 2017 > Guiné 61/74 - P17359: Notas de leitura (956): “Portugal e as Guerrilhas de África”, por Al J. Venter, Clube do Leitor, 2015, prefácio de John P. Cann (1) (Mário Beja Santos)