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sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9095: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (6): Não matem a bajudinha...

1. Texto de José Ferraz  (ex-Fur Mil, Op Esp, CART 1746, Xime e Bissau, 1968/70;  radicado nos EUA há desde 1970):



(i) Falando de acção psicossocial, de que sempre fui partidário, lembrei-me que durante uma operação de penetração ao sul do Xime, aprisionámos 2 elementos IN (*).

Depois de interrogados, guiaram-nos a uma tabanca IN. Fizemos um assalto e durante esse combate ferimos uma miúda, bajuda, com um tiro por detrás do joelho que lhe destroçou a patela [ ou rótula].
- Mata a miúda... - disse alguém.
- Não mata nada - disse eu [, que estava a comandar o pelotão].

E ordenei ao meu pessoal para fazer uma liteira, trazendo a bajuda para o Xime de onde foi posteriormente helitransportada para o hospital em Bissau. Oxalá ainda seja viva.


Nem tudo na guerra é destruição. Talvez alguém dos meus tempos no Xime se lembre deste episódio.

(ii) Mas ainda a respeito desta bajudinha do Xime, alguém que não tenha estado nesta situação, é capaz de não perceber o que me levou a fazer o que fiz.... Por outro lado,  se alguém que tenha estado  lá comigo se lembrar [deste episódio], seguramente dirá que o tempo que levámos a preparar a liteira, deu tempo ao IN para começar a mandar morteiradas para dentro da tabanca e tiroteio de armas ligeiras como eu nunca tinha visto. De facto, poderia ter causado sérios problemas, mas graças a Deus tudo correu bem.

A minha intenção é apenas a de dizer publicamente que nós, no mato, e em situações de perigo, tínhamos coração e respeito pela vida humana, nem sempre tudo era ronco e destruição de tudo por onde pássavamos - a [alegada política da] "terra queimada".

José Ferraz (**)

________________

Notas do editor:



(*) Muito provavelmente) trata-se da Op Baioneta Dourada, iniciada em 2 de Abril de 1969, às 0h00, com a duração prevista de dois dias, e com o objetivo de "se completarem as destruições dos meios de vida na área, executadas quando da Op Lança Afiada [8-18 de Março de 1969], na região de Poindon".

As NT eram constituídas por dois 2 destacamentos:

(i) Dest A: CART 1746 (Xime) (a 3 Gr Comb) + CCAÇ 2314 (Fulacunda ou Tite) (1 Gr Comb);

(ii) Dest B: CCAÇ 2405 (Galomaro) (a 2 Gr Comb) + CCAÇ 2314 (Fulacunda ouTite) (1 Gr Comb).

Podemos publicar, oportunamente, um excerto do o relatório desta operação, em que foi capturado um elemento IN,  desarmado. Na exploração imediata de informações dadas pelo prisioneiro, o Dest A fez uma batida à zona, surpreendendo "9 homens sentados acompanhados de 2 mulheres" (sic).  Aberto fogo, foram capturadas as duas mulheres, feridas. Os restantes elementos fugiram, com baixas prováveis.

Entretanto, "ao serem prestados os primeiros socorros às mulheres feridas, um grupo IN de efectivo não estimado flagelou as NT durante cerca de 6 minutos com LGFog, mort 60 e cerca de 6 armas automáticas", sem consequências para as NT.

(Fonte: BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70. História da Unidade. Cap II, pp. 78/79).


(**) Último poste da série > 24 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9090: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (5): O desenrascanço... na justiça militar!

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8101: 7º aniversário do nosso blogue: 23 de Abril de 2011 (2): Como o tempo passa! ... (Rui Felício, CCAÇ 2405, Galomaro e Dulombi, 1968/70)

1. Mensagem do nosso camarada Rui Felício, ex- Alf Mil, CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852 (Galomaro e Dulombi, 1968/70) [Juntamente com o Paulo Raposo, o Victor David e o Jorge Rijo, o Rui faz(ia) parte dos famosos Baixinhos de Dulombi, os quatro alferes milicianos da CCAÇ 2405]. Jurista, vive em Lisboa. Conhecemo-nos no I Encontro Nacional do nosso blogue, na Ameira, Montemor o Novo, em 14 de Outubro de 2006.




Data: 11 de Abril de 2011 12:18


Assunto: Re: 7º aniversário do nosso blogue > 23 de Abril de 2011


Caro Luís Graça,


O tempo passa... Não me tinha apercebido que o teu blog já conta 7 anos!


Parabéns pelo excelente trabalho de organização que tens desenvolvido, com a prestimosa dedicação de alguns eficientes colaboradores que dão a esta publicação um lugar de topo na recordação de uma fase incipiente da vida da nossa geração. Que nos acompanhará sempre, que jamais se desvanecerá da nossa memória, enquanto por cá andarmos.


E que,  a esse desiderato, adiciona o mérito, não menos importante, de lembrar às gerações posteriores que a guerra de África foi mais do que um simples conflito armado com todos os males que qualquer guerra traz. Foi, sobretudo, a descoberta da solidariedade que, por vezes escondida, nos momentos difíceis se revelava e animava os jovens desterrados nos confins da selva.


Foi também o conhecimento de outros povos, de outras culturas, de outras mentalidades.
Com os quais partilhámos o nosso conhecimento e de quem obtivemos a sabedoria que não vem nos livros.


Um abraço
Rui Felício




Escrito e Lido é o Blogue do nosso camarada Rui Felício. Desde 1 de Dezembro de 2010. "Episódios que são sementes da vida"... Já sabíamos, do nosso blogue, que ele era um exímio contador de histórias... Infelizmente, não tem aparecido, nos últimos anos... Temos no nosso blogue (I e II Série) alguns das suas estórias de Dulombi que merecem figurar numa futura antologia do nosso blogue... Aqui ficam os links e algumas deixas...




9 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXIX: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (1): O nosso vagomestre Cabral


(...) O Natal aproximava-se… Antes da data prevista, chegara-nos um presente inesperado! Um periquito…. O furriel Cabral foi-nos mandado para substituir o furriel vagomestre, uns meses antes falecido em acidente de viação na estrada de Galomaro-Bafatá numa viagem de reabastecimento de viveres à nossa Companhia… O Cabral era uma jóia de pessoa, simpatiquíssimo, um tanto ingénuo e crédulo, sempre bem disposto e que rapidamente granjeou a estima de todos. (...)


14 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVII: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (2): O voo incandescente do Jagudi sobre Madina Xaquili


(...) Ao cair da tarde, com a luz alaranjada do sol a começar a esconder-se na linha do horizonte poente, o Paulo Raposo, alferes da CCAÇ 2405, de quem guardo as mais pistorescas histórias, estava sentado perto do bunker do Capitão, com o olhar fixo num ponto afastado a sul do aquartelamento, perto do arame farpado. Aproximei-me e comentei:
- Eh, pá, não estejas a pensar na morte da bezerra… Já faltou mais e não tarda estaremos em Lisboa a beber umas imperiais e a olhar as bajudas brancas que por lá abundam. (...)


19 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXL: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (3): O dia em que o homem foi à lua


(...) 20 de Julho de 1969. Era domingo… Durante todo o dia a rádio ia noticiando a chegada do homem à Lua… A célebre frase do astronauta afirmando que o passo que acabara de dar em solo lunar era um passo de gigante para a humanidade, era escutada repetidamente nos pequenos transístores que nos mantinham ligados ao mundo. Claro que não havia televisão na Guiné e, mesmo que houvesse, jamais seria vista em Samba Cumbera, pequena tabanca onde a luz nos era fornecida através de garrafas de cerveja cheias de petróleo, nas quais se embebiam torcidas de desperdício que, depois de acesas, nos enchiam os pulmões de fuligem e fumo. (...)


5 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1046: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (4): a portuguesíssima arte do desenrascanço


(...) Daí a poucos dias íamos finalmente embarcar em Bissau no Carvalho Araújo para o ansiado regresso… Tínhamos acabado de receber no Dulombi a Companhia de atónitos periquitos que, durante uma semana, iam ficar em sobreposição connosco. Acolhemo-los com o aquele ar superior de guerreiros invencíveis, calejados pelos combates, a pele tisnada dos sóis tropicais, e além das costumadas praxes, meio inofensivas, que exercemos sobre eles, dedicámos-lhes, com a proverbial simpatia característica dos Baixinhos do Dulombi, um hino de recepção ao periquito que ainda hoje cantamos em todos os almoços anuais de comemoração que realizamos. (...)


18 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1085: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (5): O improvisado fato de banho do Alferes Parrot na piscina do QG


(...) Já de si, o apelido originário da ascendência estrangeira da sua Família, o tornava notado. A sua invulgar estatura de quase dois metros, os olhos salientes, o cabelo arruivado, a pele branca e sardenta e o corpo magro, longilíneo e desengonçado, completavam a estranha figura propicia ao sorriso e aos mais díspares comentários. Falo do Parrot, que conheci em Mafra e que fez parte do meu pelotão do 1º Ciclo do COM da incorporação de Abril de 1967. Não era fácil, porém, tirar o Parrot da sua fleumática postura de não te rales, por mais provocações que se lhe tentassem fazer. Ele era a calma personificada, e senhor de uma inteligência fora do comum. (...)


27 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1217: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (6): Sinchã Lomá, o Spínola e o alferes que não era parvo de todo


(...) Sinchã Lomá é uma pequena tabanca a Sudoeste de Dulo Gengele e esta por sua vez fica a Sul de Pate Gibel. Quando a CCAÇ 2405 chegou a Galomaro, destacou três dos seus Grupos de Combate para regiões circundantes da sede da Companhia com a missão de marcar posição no terreno e fazer ao mesmo tempo uma espécie de guarda avançada para protecção da Companhia. A mim, coube-me ir para Pate Gibel, a tabanca mais a sul de Galomaro. (...)


8 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1352: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405)(7): Perigos vários, a divisa dos Baixinhos de Dulombi (Rui Felício)


(...) No terço final da comissão, com a Companhia finalmente concentrada no Dulombi, pensou-se em encontrar um emblema e uma divisa para a nossa Unidade. Não deveríamos deixar acabar a comissão sem legar aos vindouros um símbolo que nos identificasse, tal como a maioria das outras unidades já o tinham feito. Acolhida a ideia, estabeleceu-se um período de tempo para que fossem apresentados projectos para futura escolha daquele que merecesse o consenso geral. E assim surgiram meia dúzia de ideias para a o emblema da Companhia. (...)


30 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2073: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (8): O Fula, a galinha e o vestido


(...) Galomaro, Maio de 1981. Passados 11 anos após o regresso da CCAÇ 2405, retornei à Guiné, em 1981, naturalmente já civil, e passei alguns dias em Galomaro onde esteve sediada a Companhia antes da sua deslocação final para o Dulombi. Percorri, de jeep ou de bicicleta, toda aquela região que tão bem conheci por força dos patrulhamentos militares efectuados entre 1968 e 1970. (...)


26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2683: Estórias de Dulombi (Rui Felício, CCAÇ 2405) (9): O Jorge Félix e o Prisioneiro


(...) Num certo dia de Agosto de 1969, o Jorge Félix transportou no seu helicóptero um grupo de paraquedistas que iam fazer um assalto, a uma base do PAIGC, identificada pelos serviços de informações militares da Guiné, como estando localizada na região de Galomaro. Ao procurar local para a aterragem perto do objectivo, em plena mata, o Jorge Félix foi descendo o helicóptero e, a uns 5 metros do chão, a deslocação de ar provocada pelo movimento das pás do aparelho, afastou uma série de ramos de arbustos deixando a descoberto um guerrilheiro do PAIGC que ali se havia emboscado. O homem estava armado com um RPG7, e a granada colocada, apontando para o helicóptero, o que naturalmente deixou em pânico o piloto e os tripulantes. (...).
_____________


Nota do editor:


Vd. poste anterior da série > 13 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8091: 7º aniversário do nosso blogue: 23 de Abril de 2011 (1): Um Oscar Bravo (OBrigado) a quem nos visita, lê, comenta, divulga, alimenta, critica, incentiva, avalia, escrutina, ajuda a crescer e a melhorar... A todos os autores, comentadores, leitores, a todos/as os/as amigos/as, camaradas e camarigos/as da Guiné (A equipa editorial)


(...) Em qualquer dos casos, aqui fica o apelo, aos resistentes, aos resilientes, aos sobreviventes, aos bravos da Guiné: Ajudem-nos a todos nós, editores, colaboradores permanentes e autores, a fazer "mais e melhor"... E sobretudo, tragam caras novas, histórias novas, fotos novas (do "baú velho")... E a quem ainda tem pachorra de ir visitar o nosso blogue, uma ou até mais vezes por dia, o nosso Oscar Bravo!!! (...)

domingo, 14 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7280: Memória dos lugares (112): Mondajane, a sudoeste de Dulombi, tabanca fula em autodefesa que ameaçámos queimar no princípio de Setembro de 1969 (Carlos Marques Santos, ex-Fur Mil, CART 2339, 1968/69)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Subsector de Galomaro > Carta de Duas Fontes, 1/50000 > Posição relativa de Mondajane, tabanca fula em autodefesa, a sudoeste de Dulombi, seriamente ameaçada em Agosto/Setembro de 1969 pela penetração do PAIGC no regulado do Corubal. Com a retirada de Béli, Madina do Boé e Cheche, passou a haver um corredor por onde o PAIGC se infiltrava facilmente na parte meridional do chão fula, a norte do Rio Corubal.



Apesar do reforço temporário de tropas pára-quedistas ao subsector de Galomaro (a partir de Agosto de 1969, COP 7), bem como da CCAÇ 12 (que vai ter a sua estreia logo em Julho de 1969, em plena época das chuvas), Madina Xaquili (entre Galomaro e Canjadude) seria uma das primeiras tabancas fulas, a cair,  com a sua defesa a tornar-se insustentável (foi andonada pela população e depois pelas NT em Outubro de 1969). Padada, mais a sul, também já tinha sido abandonada (em data que não posso precisar). O PAIGC apertava o cerco ao chão fula.

Em Agosto de 1969, Madina Xaquili e o Pel Mil 147 constam no dispositivo das unidades combatentes do BCAÇ 2852, em virtude de ter constituído um novo Sector, o L5, com sede em Galomaro (onde já estava de resto a CCAÇ 2405, com forças espalhadas por Imilo, Cantacunda, Mondajane, Fá, Dulo Gengele), integrado no CO7 (Bafatá). Nunca mais ouvir falar de Mondajane, sendo muito provável que tenha sido também abandonada...


Imagem: Luís Graça (2010)



Coimbra > O Gil Maia dos Santos, de 4 anos, com a maninha, que acaba de nascer, com 2 kg. Com um Bj para  toda a tertúlia. Enviado por "Avô, babadíssimo, CMSantos, Cart 2339".





 
1. O Carlos Marques Santos (ex-furriel miliciano da CART 2339, Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69) é um dos nossos tertulianos da primeira hora [, foto à direita, de 1968].  Foi por mão dele, por exemplo,  que o Torcato Mendonça chegou até nós. É casado com a Teresa, que nos acompanha também desde o princípio, e é pai da artista Inês Santos.  Por razões de saúde (Mansambo não lhe fez bem à saúde, nem a ele nem ao Torcato), tem participado pouco na II Série do nosso blogue. Há dias (8 do corrente) mandou-nos uma mensagem: "Tenho andado um pouco distraído das questões do Blogue,  sem perder a leitura habitual. Hoje, a propósito de avós e netos informo, oficialmente, o nascimento de mais uma neta, pequenina, mas mesmo pequenina, da mana do Gil,  meu neto mais velho - 4 anos" (...).

O CMS (como eu lhe chamo) é um camarada muito querido de todos nós. É professor de educação física, reformado. Decidi, em homenagem ao nosso "baboso avô", recuperar estes textos que remontam  a 2006. (*)


(i)  Dei conta, nas minhas notas pessoais de que entre 27 de Agosto e 27 de Setembro de 1969, estive com o meu pelotão em reforço do sector de Galomaro/Dulombi, mais propriamente em Mondajane, sem no entanto haver qualquer nota na História da Companhia. (#)

Talvez na História do BCAÇ 2852 haja referência a esse tempo esquecido, mas vivido por nós, 3.º Grupo de Combate da CART 2339. (**)

A 27 de Agosto foi recebida a notícia de que iríamos para Galomaro.


A 28 saímos e chegámos cerca do meio dia com indicação de que irímos para Mondajane [, a sudoeste de Dulombi], o que não aconteceu nesse dia mas sim no dia seguinte.

No cruzamento para Dulombi rebenta uma mina na GMC que segue à minha frente  a cerca de 15/20 metros, destruindo a sua frente. Resultado: um morto (desintegrado) e um ferido (condutor) que faleceu ainda nesse dia. Nós íamos apeados, fazendo a segurança à coluna que integrava uma nova Companhia em treino operacional e que era de madeirenses.

Impossibilitados de prosseguir,  fomos para Dulombi com os reabastecimentos. Aí fomos informados que deveríamos seguir a pé para Mondajane, que atingimos e onde nos instalámos.

Aí, e enquanto aguardávamos uma coluna com as nossas coisas, sem resultado, aparece-nos um pelotão vindo de Dulombi, carregando parte das nossas coisas, a pé e à cabeça, informando ser necessário termos que ir a Dulombi carregar, a pé e à cabeça, o resto das coisas. O que aconteceu no dia seguinte.

Dia 1 de Setembro de 1969, fui a Dulombi com 17 carregadores e 2 secções de milícias,  mais 10 homens do meu pelotão, a pé e por trilhos, buscar coisas que eram absolutamente necessárias, numa zona desconhecida e densamente arborizada, o que aconteceria de 2 em 2 dias.

A população recusa-se a ajudar (a zona era perigosa) e só com a intervenção pela força (ameaçámos queimar a tabanca), isso é conseguido. Note-se que nestas circunstâncias - falta de géneros e outros bens - repartimos com as populações.

A 5 de Setembro, um nativo mata um portentoso javali e houve carne fresca confeccionada.

A 7, chega um grupo de carregadores de Galomaro, carregando ainda parte das nossas coisas que estavam em Dulombi. Nesse dia o pelotão que aí estava foi rendido.


A 9, nova caminhada para Dulombi para carregar géneros.

Entretanto a 13 um nosso soldado é evacuado por doença e a 15, à tarde, recebemos a visita dos capitães das Companhias 2405 [Galomaro] e 2406 [ Saltinho].

Dia 19 novamente ida a Dulombi para reabastecimento. A pé e pela densa mata.

Dia 23, notícia de que iríamos ser rendidos no dia seguinte. Nada.

Dia 24, rendidos finalmente e saída para Bambadinca [pela estrada Bafatá-Bambadinca], com chegada a Mansambo a 27 de Setembro de 1969. Sem incidentes.


Em suma, um mês a feijão frade. Sem banho e sem mudar de roupa.

   (ii) Humberto [Reis]: Há dias evocaste aqui uma companhia de madeirenses, que levou porrada em Madina Xaquili, no subsector de Galomaro, com vocês, da CCAÇ 12.(***)


Eu também estive em reforço a Galomaro e disso já dei referência e andei por Dulombi e Mondajane, Madina Xaquili, etc. Essa história está, por mim, contada no blogue salvo erro com o título um mês a feijão frade.

Referiste os madeirenses e presumo que são os mesmos que, em treino operacional, andaram comigo. Esses factos não estão descritos na história da minha Companhia, mas eu tenho-os registados nas minhas notas pessoais diárias que elaborei enquanto estive na Guiné.

Há poucos dias, com o Luís, que estava em trabalho em Coimbra, pude com o Victor David recordar factos de Galomaro e Dulombi.


Lembro-me que em coluna para Mondajane, onde eu iria estar em reforço da CCAÇ 2405, a coluna sofreu o rebentamento de uma mina (A/C) na viatura que seguia ao meu lado (nós estávamos apeados) e desse rebentamento um soldado madeirense, pela acção da mina, desintegrou-se. Esta mina rebentou a cerca de 12 metros de mim e felizmente nada sofri.


O Luís perguntava: então o lenço que estaria mais tarde e durante algum tempo pendurado numa árvore nesse itinerário seria dele? Presumo que sim, pois bocados desse soldado, o relógio, roupa, etc… ficaram agarrados à árvore. Seria essa a Companhia [, a CCAÇ 2446,] a que te referes? [O tristemente famoso lenço pendurado numa árvore localizava-se algures no troço da Estrada Bambadinca-Mansambo, e não no subsector de Galomaro, na estrada para Mondajane, como sugere o Carlos. L.G.]

Se foi [a mesma companhia], parece que não entraram na guerra com sorte e também não a tiveram depois. Consegues referenciar no tempo esse ataque?


Poderei a partir daí confrontar as minhas notas, desconhecendo no entanto a denominação da tal Companhia.


Um abraço,


Carlos Marques dos Santos


Cart 2339 – Mansambo, sempre em diligências solitárias  (****)
______

(#) Nota do CMS:


O alferes do Grupo de Combate da Companhia de Galomaro que nos apoiou era meu primo. Ainda bem. Para não variar, a 29, rebentamentos cerca das 7.00h e uma nossa coluna emboscada no sítio do costume. Um morto e um ferido das NT. Ainda faltavam cerca de 2 meses e meio para o regresso à Metrópole.


_____________

Notas de L.G.:

(*) Postes da I Série do nosso  blogue:

24 Janeiro 2006 > Guiné 63/74 - CDLXXVI: Um mês a feijão frade... e desenfiado (Mondajane, Dulombi, Galomaro, 1969)

2 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXXIV: a morte a caminho de Mondajane, com os madeirenses da CCAÇ 2446 (Carlos Marques Santos)



(**) Infelizmente a História do BCAÇ 2852 é omisso sobre este destacamento onde penou o Carlos Marques dos Santos e o seu Grupo de Combate. Oficial ou oficiosamente, o CMS andou um mês desenfiado, sem conhecimento das autoridades máximas do Sector L1 (Bambadina). De acordo com o registo que fica para a História, em Setembro de 1969, a CART 2339 limitava-se a ter um pelotão em Candamã (2 secções) e em Afiá (uma secção). Mas em Agosto, tinha apenas um pelotão em reforço ao COP-7 (Galomaro)...

A História da CCAÇ 12, por sua vez,  confirma a existência, em Agosto de 1969, de tropas de Mansambo em Candamã e Afiá: vd post de 30 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXXX: A CAÇ 12 em operação conjunta com a CART 2339 e os paraquedistas (Agosto de 1969) ...

Em resumo, havia muito mais vida, na Guiné do nosso tempo, do que nas secretarias das nossas companhias...


Posteriormente à inserção deste poste,  o Marques dos Santos enviou-me a seguinte mensagem: "Grato pela publicação desta nota. Isto demonstra as incongruências das 'várias histórias oficiais escritas'. Não será caso único. Que os nossos companheiros de tertúlia descubram pequenos pormenores vividos, mas não descritos. Ainda hoje, no meu dia a dia, dou extrema importância a um bem ao alcance de uma torneira – a água".

(***) Vd. postes de 7 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6686: A minha CCAÇ 12 (5): Baptismo de fogo em farda nº 3, em Madina Xaquili, e os primeiros feridos graves: Sori Jau, Braima Bá, Uri Baldé... (Julho de 1969) (Luís Graça)

 (****) Último poste desta série > 8 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7245: Memória dos lugares (110): Ponte Caium: Mais fotos ... (Carlos Alexandre, CCAÇ 3546, Piche, 1972/74)

segunda-feira, 29 de março de 2010

Guiné 63/74 - P6063: Recortes de imprensa (23): O desastre do Cheche, no Rio Corubal: excertos de artigo de Teresa Firmino, Público, 6/12/2009

 Guiné > Zona leste > Rio Corubal >  Cheche  > Ancoradouro > "Esta imagem veio publicada num número de 1971 do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. O que há de macabro é tínhamos abandonado esta região em 1969, foi exactamente aqui que se deu o horrível sinistro que levou à morte 47 dos nossos militares durante a travessia de uma jangada preparada para a operação da evacuação de Madina de Boé. Dizem que é um ponto de indizível beleza, com mata luxuriante".

Imagem digitaliazada e legenda: Beja Santos (2008).


1. A tragédia de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 , foi  evocada, de novo,  na imprensa portuguesa, através de um trabalho de reportagem da jornalista Teresa Firmino, do jornal Público (*), que já em tempos nos tinha contactado, a nós, editores do blogue, por causa de uma foto da jangada da autoria do nosso camarada Paulo Raposo (**). Ela acompanhou, na Guiné-Bissau, os trabalhos da 4ª  missão da Liga dos Combatentes, que teve por objectivo a localização e a exumação dos restos mortais de militares portugueses, espalhados por cemitérios de ocasião no sul.  Desta vez, a equipa,  chefiada pelo major-general Fernando Aguda,  esteve em sítios como Bolama, Bedanda, Cacine, Catió, Fulacunda, Quebo e ilha das Galinhas.  Em Cheche, na região de Gabu, nas margens do Rio Corubal, a equipa liderada pela antropóloga forense da Universidade de Coimbra, Eugénia Cunha, e com a colaboração do geofísico da Universidade de Aveiro, Hélder Hermosilha, terá  localizado uma vala comum onde se supõe estarem os ossos de oito das 47 vítímas mortais do desastre do fatídico dia 6 de Fevereiro de 1969. Será o o próximo local de intervenção da missão (a 5ª) da Liga dos Combatentes... Nas missões anteriores, a Guidage, Farim e Gabú, foram levantados 55 corpos. (Vd. notícia constante da revista Combatente, nº350, Dezembro de 2009.

 Neste artigo do Público, Teresa Firmino cita o nosso blogue, dizendo:

"O desastre de Cheche é hoje motivo de inúmeros relatos na Internet, nomeadamente no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Os antigos combatentes encontraram essa forma de fazer o luto colectivo da tragédia que viveram. Outros emocionam-se tanto que recusam falar disso".

2. Público 'on line' > 26.03.2010 > À procura dos militares afogados no rio Corubal

Por Teresa Firmino

[Texto originalmente publicado na edição do Público, de 6 de Dezembro de 2009. Reproduzimos aqui alguns excertos com a devida vénia...]


Durante horas a fio, as duas jangadas no rio Corubal fizeram vezes sem conta a travessia para a margem norte. A companhia de caçadores 1790 estava a abandonar o quartel de Madina do Boé, onde tinha sido constantemente flagelada pelo inimigo ao longo de 13 meses, e era apoiada por homens de outras companhias. (...)

Até ali, tudo tinha decorrido sem incidentes. Para trás, tinham ficado os 30 quilómetros entre Madina de Boé e Cheche, e o rio começou a ser transposto na margem sul ao fim da tarde de 5 de Fevereiro de 1969. Passaram toda a noite naquilo. Só podia seguir uma viatura pesada de cada vez. Eram 28, mais 100 toneladas de munições e equipamentos, três auto-metralhadoras Daimler e à volta de 500 militares, conta-nos o então capitão José Aparício, comandante da companhia 1790 em Madina do Boé.

Ao início da manhã de 6 de Fevereiro, só restava na margem sul um grupo de homens: dois pelotões da companhia 2405, outros dois daquela que estava em retirada. "Eram entre 100 a 120 pessoas", diz José Aparício.

Toda a gente entrou na última jangada, que assim levava o dobro da sua lotação de segurança. Era feita por um estrado de madeira, assente em canoas e bidões de gasóleo vazios, puxada por um barco com motor fora de borda. José Aparício ia naquele grupo de homens. O alferes miliciano Rui Felício (que comandava um pelotão da companhia 2405) também.

De repente, a jangada adornou para um lado, atirando vários homens à água. Depois, balançou para o outro e cuspiu outros tanto. Ficou meio submersa, mas não foi ao fundo. José Aparício conseguiu manter-se na embarcação. Rui Felício caiu no rio.

"Estava a ir ao fundo. Percebi - se calhar muitos não perceberam - que tinha muito peso. Atirei a espingarda fora, que pesava cinco ou seis quilos, e a cartucheira à cintura, com outros cinco ou seis quilos. Descalcei as botas e nadei para a jangada." Ouviam-se gritos? "Não, não ouvi ninguém a pedir socorro, a gritar. Nada."

(...) Paulo Lage Raposo, alferes miliciano da companhia 2405, atravessou o rio na viagem anterior. "Vimos que caíram uns para um lado e outros para o outro. Não houve gritos, nem esbracejares, nem coisa nenhuma. Carregados com as armas, as granadas, as botas, iam para o fundo como um prego." Muitos não sabiam nadar, o que agravou tudo. Mas naquele momento a dimensão do acidente passou despercebida.

"Só soube que tinha morrido gente - estou a arrepiar-me a contar isto - quando cheguei à margem e pedi a um furriel para formar o pelotão. Ao fim de dez minutos, fui ralhar com ele porque achava tempo demasiado para ainda faltar gente. Só percebi que se passava alguma coisa porque vi vários a chorar. Aí é que me apercebi que morreu gente. Do meu pelotão, foram 13", recorda Rui Felício.

"É uma coisa que marca para toda a vida. Tive coisas infelizes que já esqueci, mas esta não se esquece nunca. Lembro-me da data. Foi entre as nove as dez da manhã. Há pormenores que nunca mais saem da cabeça. Sei que estava um dia de sol."

(...) [47 é o número de mortos] referido, por exemplo, por José Aparício, tendo em conta os elementos que recolheu: "Morreram no desastre 25 militares da minha companhia e 22 da companhia de caçadores 2405, o que perfaz um total de 47 europeus. Morreram ainda na travessia mais cinco guineenses de um pelotão de milícias que fazia parte da guarnição de Madina do Boé. Felizmente, não morreu nenhum dos cerca de 100 elementos da população que ali viviam connosco e que foram evacuados para a então Nova Lamego, hoje Gabú. Fizeram a travessia em viagens anteriores."

(...) Duas semanas depois do naufrágio, foi organizada uma operação de recolha dos corpos por fuzileiros e mergulhadores. Muitos desapareceram para sempre. Na série de documentários A Guerra, de Joaquim Furtado, podem ver-se imagens aéreas de alguns corpos a boiar, recolhidas pelo piloto da Força Aérea José Nico. "Os [corpos] recuperados foram sepultados nas margens do rio, com as honras militares próprias", relata Joaquim Furtado. (...)

(...) Que a jangada naufragada no rio Corubal tinha excesso de peso,  não suscita grandes dúvidas. Mas o que desencadeou a queda à água de soldados é alvo de versões desencontradas. Os alferes milicianos Rui Felício e Paulo Lage Raposo (o primeiro ia na jangada, o segundo fez a travessia na viagem anterior) dizem que foi o peso a mais, tendo ficado desequilibrada. Com capacidade para dois pelotões (uns 60 homens), fazia a travessia com os últimos quatro pelotões, de duas companhias. "Às vezes facilitamos demais", diz Paulo Raposo. "Para mim, a jangada virou-se porque tinha excesso de peso, embora haja relatos diferentes", diz Rui Felício.

Um desses relatos é o do capitão José Aparício (comandante da companhia 1790, em retirada do quartel de Madina do Boé), também na jangada. Diz que se ouviram tiros de morteiros e, em reacção, o barco a motor que puxava a jangada acelerou demais e fez cair homens.

Não houve tiros de morteiro, dizem Raposo e Felício. "Havia uma paz absoluta naquele rio", lembra Felício. "Estávamos habituados a ouvir tiros. Não era com uns tiros que nos assustávamos", junta Raposo. No documentário A Guerra, de Joaquim Furtado, dá-se voz às diversas versões e suas nuances. "Os morteiros existiram. Não tenho dúvidas", diz José Aparício a Furtado. "Há pessoas que disparam armas e sabe-se quem foi. Esta gente foi ouvida." Estava previsto dispararem-se morteiros para a margem sul do rio, quando todos tivessem deixado essa margem, no fim da operação.

É mostrado um filme feito pelo piloto José Nico, que filmava a penúltima travessia mas recebeu indicações para ir filmar os morteiros. Vêem-se os disparos das armas: "É durante esta filmagem que recebe a notícia do naufrágio da última jangada", ouve-se Furtado a dizer. "Imediatamente a seguir, José Nico filma estas imagens que mostram a jangada acidentada no meio do rio, enquanto alguns militares tentam as primeiras operações de socorro." Este acidente deixou a operação Mabecos Bravios (cães selvagens) tristemente célebre. (...)
_______________

Notas de L.G.:

(*) Além do artigo, parcialmente transcrito aqui, vd.  também:  A última jangada no rioCorubal. Público, 25.03.2010.
Por Teresa Firmino, em Cheche

(...) Quatro décadas depois, continua a existir uma jangada em frente a Cheche. É agora moderna, tem motor próprio e serve para a travessia de carros apenas. O resto, pessoas, bicicletas, motas, vai de piroga, e há várias. Imperturbável, o Corubal é tranquilo nesta época do ano, a mesma do acidente, e a água, um tanto esverdeada, é ladeada por margens íngremes cobertas por árvores e vegetação densa. Ao sítio da travessia, com Cheche do lado de lá, chega-se por uma estrada larga, depois de uma sucessão de tabancas na berma de um caminho de terra, ponto de encontro de quem está à pesca, de quem lava a roupa e a estende no chão, de quem toma banho ou de quem simplesmente passa por ali.


 (**) Vd. postes recentes publicados no nosso blogue:
2 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5920: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (6): Missão da Liga dos Combatentes resgata corpos (Beja Santos)

22 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5866: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (5): uma versão historiográfica (?) (Luis Graça)

21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5861: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (4): Cem anos que viva nunca esquecerei as imagens da catástrofe e o diálogo entre o Alf Diniz e o Cap Aparício (Rui Felício)

21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5859: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (3): O oficial mais graduado que ia na jangada era o Cap Aparício, comandante da CCAÇ 1790 (Paulo Raposo)

21 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5858: Ainda o desastre do Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (2): Acima do Alf Diniz, só havia 2 homens, os Cap Aparício (CCAÇ 1790) e Jerónimo (CCAÇ 2405) (Armandino Alves)

20 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5851: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (1): Silvina Claudino, de 26 anos, uma sobrinha que o 1º Cabo José Antunes Claudino, da CCAÇ 2405, natural de Alcanhões, Santarém, nunca conheceu

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5851: Ainda o desastre de Cheche, em 6 de Fevereiro de 1969 (1): Silvina Claudino, de 26 anos, uma sobrinha que o 1º Cabo José Antunes Claudino, da CCAÇ 2405, natural de Alcanhões, Santarém, nunca conheceu

1. Comentário de Sílvia Claudino, com data de 12 do corrente, ao poste P5775 (*):

Olá, o meu nome é Silvia Claudino, tenho 26 anos e sou a sobrinha que o primeiro-cabo José Antunes Claudino, da CCaç 2405,  nunca conheceu.

O desastre de Cheche tirou a vida a muitos rapazes, incluindo a do meu tio, talvez por culpa de quem os mandou subir, talvez por culpa das águas, talvez por culpa do inimigo. O que é certo é que estes rapazes ainda tinham uma vida pela frente.

Leio constantemente relatos do que aconteceu, talvez para estar um pouco mais perto do meu tio, mas o que é certo é que nunca o vou conhecer, pelo menos não nesta vida. É-me impossível sequer tentar imaginar a dor e o desespero destes homens quando, devido à força da gravidade e do peso que traziam consigo, os puxavam cada vez mais para o fundo deste rio.

Infelizmente esta Guerra está cada vez mais esquecida nas escolas, na aprendizagem das crianças que muitas nem sabem porque é que a Guerra se deu. É como vivemos...

[ Revisão / fixação de texto / bold / título: L.G.]
_____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 8 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2819: Lista dos militares portugueses metropolitanos mortos e enterrados em cemitérios locais (4): 1968-1973 (Fim) (A. Marques Lopes)

(...)  José Antunes Claudino, 1.º Cabo / CCaç 2405 / 06.02.69 / Rio Corubal / Afogamento na evacuação de Madina do Boé / Alcanhões, Santarém / Corpo não recuperado. (...)

(...) Sobre o desastre do Cheche, no Rio Corubal, no âmbito da Operação Mabecos Bravios, e sobre Madina do Boé, vd. os postes publicados no nosso blogue (1ª e 2ª série). Há ainda uma depoimento do Brigadeiro Hélio Felgas, a publicar em breve, e que nos chegou às mãos por intermédio do Paulo Raposo, ex-Alf Mil da CCAÇ 2405. (...)

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5778: Efemérides (45): O desastre do Cheche, visto por quem esteve lá e perdeu 11 homens do seu grupo de combate (Rui Felício, Alf Mil, CCAÇ 2405, Galomaro, 1968/70)

Guiné > Zona Leste > Região do Boé > Cheche > 6 de Fevereiro de 1969 > A jangada, de reserva, com sobreviventes da tragédia de Cheche, no Rio Corubal, na retirada de Madina do Boé (*)

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados

Guiné > Zona Leste > Subsector de Galomaro > CCAÇ 2405 > 1969 > Dulombi > Na messe, os alferes milicianos Raposo (à direita) e Rijo (à esquerda); de costas, os furriéis milicianos Cândido e Magno. Os Alf Mil Paulo Raposo e Jorge Rijo estavam, em Cheche, no dia de 6 de Fevereiro de 1969.

Foto: © Paulo Raposo (1997). Direitos reservados

Jantar a bordo do Uíge, a caminho da Guiné > Finais de Julho/princípios de Agosto de 1968 > Os quatros alferes milicianos da CCAÇ 2405: David e Raposo, do lado esquerdo; Felício e Rijo, do lado direito.

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados


 Guiné > Zona Leste > Sector L5 > Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2405 (1968/70) > Embora pertencente ao BCAÇ 2852 - cujo comando e CCS estavam sedeados em Bambadinca -, a CCAÇ 2405 não teve grandes contactos com o pessoal da CCAÇ 12 (a quem eu pertenci: Contuboel e Bambadinca,Maio de 1969/Março de 1971).  Daí que só no I Encontro Nacional do nosso blogue, na Ameira, Montemor-O-Novo (organizado pelo Paulo Raposo e pelo Carlos Marques dos Santos), em 14 de Outubro de 2006, é que eu tive o prazer de conhecer pessoalmente o Rui Felício, a par de outros dois baixinhos de Dulombi, o Paulo Raposo e o Vitor David.

Esta foto do Rui, sentado num abrigo - em princípio, de uma  tabancas em autodefesa do sector L5, em 1969 - , foi-nos enviada pelo Victor David, seu camarada, outro alferes da companhia e nosso tertuliano, que também terá servido de fotógrafo de ocasião, segundo presumo. Não tenho informações precisas sobre a data nem o local. (LG)

Foto: © Victor David (2006). Direitos reservados. 


1. Reprodução do poste, da I Série, de 12 Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 - DXXVI: O desastre do Cheche: a verdade a que os mortos e os vivos têm direito (Rui Felício, CCAÇ 2405)

Texto do Rui Felício (ex-Alf Mil da CCAÇ 2405, Galomaro, 1968/70) (**). (Vd. poste anterior desta série  Efemérides ***.).

1. Comentário a propósito do post escrito pelo camarada José Martins sobre o desastre na travessia do Rio Corubal em 6 de Fevereiro de 1969 (1)

Preâmbulo

Acabei de ler um texto escrito pelo camarada José Martins onde relata a sua experiência na zona de Madina do Boé.

Embora tenha reconhecido que não assistiu directamente ao que se passou no célebre e lamentável desastre do Cheche, ocorrido no fatídico dia 6 de Fevereiro de 1969, o José Martins conheceu bem o local e a região e desenvolveu a sua descrição socorrendo-se de relatos e documentos alusivos ao sucedido.

E nota-se pelo seu relato que sofreu muito, e que ainda hoje sente as marcas do desastre, passados 37 anos sobre a sua ocorrência.

Ninguém, bem formado e sensível, poderia nunca, de resto, ficar indiferente a semelhante tragédia, ainda que, como o narrador José Martins, não tenha dela sido testemunha ocular.

Imagine-se então a ferida profunda que aquele desastre deixou a quem, como eu e muitos outros, foi não só testemunha ocular mas também, e principalmente, interveniente e vítima do colapso da artesanal jangada que servia de transporte aos militares e equipamentos que participaram na complexa, perigosa e cansativa operação de resgate da Companhia de Caçadores que se evacuou do célebre aquartelamento de Madina do Boé.

Desastre onde pereceram, segundo as estatísticas oficiais, 47 militares, onze dos quais, do pelotão que eu comandava… Permito-me destacar dois deles pelas relações especiais de amizade e de confiança que neles depositava, sem esquecer obviamente a dor causada pela morte de todos os outros:

(i) um, o furriel Gregório Rebelo, açoriano de sotaque cerrado e quase ininteligível que assumia as funções, embora não protocolares, de meu substituto em todas as circunstâncias, no comando do pelotão, e que mantinha a orgânica disciplinar e operacional da pequena unidade militar;

(ii) o outro, o soldado Octávio Barreira, transmontano de gema, homem rude, de uma só palavra, de têmpera sã, de antes quebrar que torcer, mas capaz de morrer para salvar a vida do seu amigo, e a quem eu atribuira as funções, também não protocolares, de meu guarda-costas.

Quem passou pela guerra colonial sabe que a escolha do guarda-costas recaía invariavelmente no soldado em que o alferes depositava maior confiança e amizade.

Aliás, como também é sabido, a designação de guarda-costas não tem a mínima conotação com a ideia que na vida civil se faz de alguém com este titulo ou funções. O guarda-costas era, acima de tudo, o soldado às ordens, o confidente, o amigo…. E muito menos, ou quase nada, o protector da integridade fisica do alferes, ao contrário do que se possa pensar.

A perda destes treze homens, que recordo com saudade e dor, sempre que a memória da Guiné me vem à lambrança, e que ajudei a formar para a guerra, em Abrantes e Santa Margarida, após oito meses de convivência próxima nas diversas tabancas onde o pelotão esteve destacado, foi um choque tremendo, inolvidável, cuja lembrança ainda hoje me faz arrepiar a alma e assomar as lágrimas.

Sobre o desastre do Corubal

Feito o preâmbulo, entro de imediato no motivo que me levou a servir-me do espaço disponibilizado pelo camarada Luis Graça a quem, sem o conhecer pessoalmente [, conhecemo-nos deopois no nosso I Encontro Nacionala, na Ameira], desde já transmito o meu aplauso pela feliz e dinâmica iniciativa da criação deste blogue.

É que é importante que seja a nossa geração, aquela que interveio, por obrigação ou por convicção ou por ambas as coisas, na guerra da Guiné, que tem que dar testemunho o mais exacto possível daquilo que por lá se passou.

Se assim não fôr, corremos o risco de a história ser deturpada, porque feita com base em documentos ou relatos nem sempre seguros, nem sempre fiéis… É por isso que, correndo o risco de desencadear alguma polémica, que não pretendo, achei que devia esclarecer alguns pontos do relato feito pelo José Martins a que atrás aludi.

Deduz-se daquele relato, publicado no blogue, que o desastre teria acontecido essencialmente devido a três factores:

(i) Os militares descomprimiram e tentaram encher os cantis com água do rio, o que terá provocado, depreende-se, o desiquilíbrio da estabilidade da jangada;

(ii) Teria sido ouvido um som abafado, semelhante a uma morteirada, que teria provocado agitação entre os militares e, em consequência, desiquilibrado a jangada;

(iii) Que, após o acidente, a água do Rio Corubal terá tomado um tom avermelhado, querendo com isso dizer-se que os crocodilos que habitavam as águas do rio, teriam consumado a morte dos militares que cairam à água.

A versão dos acontecimentos, veiculada pelo José Martins, assenta, como já se disse, em relatos e documentos sobre os factos, dado que este camarada, como ele próprio confirma, não assistiu ao que se passou. Mas, não obstante a presumível credibilidade das fontes a que recorreu, posso garantir que não foi exactamente assim que as coisas se passaram.

E digo isto com a mais profunda convicção e a mais inabalável certeza de alguém que estava na jangada, caiu à água, nadou durante uns cinco minutos e a ela retornou após a mesma se ter de novo equilibrado.

São factos que não se apagarão jamais da minha memória, por mais anos que viva, e apesar de não estar de posse de documentos que os comprovem...


2. O fime da SIC sobre o desastre do Rio Corubal

O mais curioso é que no filme, da autoria de José Saraiva, realizado por Manuel Tomás, que foi visto há uns anos atrás, por muitos milhares de portugueses através da sua transmissão pela SIC e pela distribuição de um vídeo feita na mesma altura pelo Diário de Notícias, são apresentadas aquelas mesmas razões como causas imediatas do desastre.

Já nessa altura contestei as conclusões do filme, e fi-lo por escrito e em reunião pessoal com o Director de Informação da SIC, Dr. Alcides Vieira, estando presente o realizador Manuel Tomás, que dirigiu a realização do filme.

Refiro que a carta entregue na SIC foi subscrita não só por mim mas por dezenas de ex-militares da CCAÇ 2405 que, por coincidência nessa mesma altura, no almoço de confraternização anual, a leram e assinaram.

A contestação dos factos descritos no filme foi feita nessa reunião na SIC, com a prévia concordância do Comandante da Operação, Brigadeiro Hélio Felgas, e estando presentes, além de mim próprio, o Capitão Miliciano José Miguel Novais Jerónimo e o Alferes Miliciano Paulo Enes Lage Raposo [ ambos da CCAÇ 2405].

E ela foi por nós solicitada à SIC em virtude do impacto que a exibição do filme teve nos ex-militares que a ele assistiram e que tinham estado presentes na jangada naquele dia do desastre. Com efeito, no próprio dia da exibição do filme comecei a receber telefonemas de antigos camaradas, um tanto decepcionados e alguns até revoltados, pela inexactidão dos pormenores que ali eram descritos.

Todos nós três, presentes na dita reunião, participámos na operação de evacuação de Madina do Boé, e todos estavamos presentes no local do acidente no Cheche naquele dia 6 de Fevereiro de 1969.

O Capitão Jerónimo, comandante da CCAÇ 2405, e eu próprio, estávamos na jangada no momento do acidente, onde se encontrava também o Alferes Miliciano Jorge Rijo, oficial da CCAÇ 2405, com o seu pelotão.

O Alferes Miliciano Paulo Raposo, também oficial da CCAÇ 2405, já tinha feito a travessia do rio na viagem anterior, e encontrava-se na margem norte do Corubal com o seu pelotão, observando a tragédia.

Na referida reunião da SIC, o realizador Manuel Tomás argumentou que o filme fora realizado com fundamento em entrevistas e em documentos oficiais militares a que tinha tido acesso, pelo que considerava o filme suficientemente documentado.

E disse que esses documentos atestavam as razões acima referidas, isto é, que a jangada se virou porque, no essencial, teria havido disparos de morteiro que, supostamente vindos do IN, teriam criado o pânico nos militares, os quais, ao agitarem-se, teriam provocado o desiquilíbrio da jangada.

Perante a irredutível posição da SIC em manter a versão veiculada pelo filme, nada mais nos restou do que desistirmos do pedido que lhe fizémos para que fosse proporcionado esclarecimento público sobre as conclusões desse filme.

Foi dito, nessa reunião, ao Dr. Alcides Vieira e ao Sr. Manuel Tomás,  que, por muito credíveis que pudessem parecer os documentos militares em que fundamentaram a versão filmada, nenhum deles jamais desmentiria ou apagaria da minha memória e dos meus camaradas o que realmente se passou.

Mais importante que os documentos preparados no silêncio dos gabinetes militares, sabe-se lá com que inconfessados motivos, era a indesmentível memória daqueles que tinham sido protagonistas e vítimas do desastre.

É com o mesmo espírito de esclarecimento da verdade dos factos que volto hoje ao assunto, desta vez no ambiente mais acolhedor de um blogue criado e gerido por alguém como o Luis Graça que, tendo estado na Guiné, sabe melhor que ninguém que não queremos honrarias, distinções ou protagonismo público.

Queremos tão só que a história seja o mais verdadeira e exacta possivel... Esse é o legado que queremos deixar aos vindouros, para que jamais seja ignorado o sacrificio de uma geração inteira, retirada à sua despreocupada juventude para fazer uma guerra em longínquas terras, em nome dos seus deveres e obrigações para com a sua Pátria.


3. A verdade do que sucedeu

Mas então, o que se passou realmente naquela manhã de 6 de Fevereiro [de 1969]?

A CCAÇ 2405, comandada pelo Cap Mil Inf Novais Jerónimo, integrava a coluna militar que tinha partido na manhã do dia anterior de Madina do Boé, rumo ao Cheche, e tinha como missão escoltar a Companhia de Caçadores [1790] evacuada daquele aquartelamento e que era comandada pelo Cap Inf Aparício (que, após o 25 de Abril, veio a assumir a função de Comandante Geral da PSP de Lisboa).

Ao fim desse dia a coluna chegou às imediações do rio Corubal, junto ao local de cambança para o Cheche. E durante toda a noite a jangada fez contínuas viagens transportando pessoal de apoio e, sobretudo, equipamentos militares e de transporte.

Ao amanhecer, as viagens de transporte entre as duas margens continuaram consecutivamente, até que chegou o momento em que na margem sul do rio Corubal já só restavam quatro grupos de combate, todos eles comandados pelos respectivos alferes, bem como os capitães Aparício e Novais Jerónimo. Além destes, encontrava-se o 2º Comandante da Operação [Mabecos Bravios], um major cujo nome já não recordo.

Segundo a rotina estabelecida e as instruções recebidas pelo responsável pela condução da travessia (Alf Mil Diniz), esperávamos na margem do rio que este responsável mandasse entrar metade do pessoal ainda ali estacionado, ou seja, dois dos quatro pelotões acima referidos.

É que a jangada, segundo bem explicou o alferes Diniz, tinha uma lotação de segurança de um máximo de 60 homens (2 pelotões). E o alferes Diniz assim fez, à semelhança do que tinha já feito dezenas de vezes ao longo da noite, zelando para que a carga da jangada não excedesse os limites de segurança estabelecidos.

Mandou entrar o meu pelotão e o do Alferes Rijo, ficando na margem para a viagem seguinte, os dois pelotões da Companhia do Capitão Aparício. Subitamente porém, assisti a uma conversa entre o 2º Comandante da Operação e o Alferes Diniz, em que este foi intimado pelo referido 2º Comandante a mandar embarcar os dois pelotões restantes, dado que não se podia atrasar mais a operação.

Apesar dos argumentos do Alf Diniz, tentando que em vez dos 4 pelotões embarcassem apenas dois, prevaleceu a autoridade da patente militar mais alta e assim acabaram por embarcar os 4 pelotões, para a derradeira viagem da jangada...


E foi de facto a sua derradeira e trágica viagem... Ainda não estavam percorridos 10 metros e já a jangada submergia e, de seguida, se virava projectando para a água quantos nela seguiam... E não me recordo de ter ouvido qualquer disparo de morteiro, antes do desastre... E não me lembro de ter detectado antes qualquer sinal de pânico entre os soldados... Aliás, a sua experiência operacional no teatro de guerra era já apreciável e não entrariam em pânico por um simples disparo de morteiro que estou seguro que não existiu.

Houve alguns disparos de morteiro, é verdade, mas após o desastre e feitos pelas NT, no intuito de prevenir qualquer aproveitamento do IN que eventualmente estivesse emboscado nas imediações.

Exceptuando os militares que infelizmente pereceram afogados no Corubal, passados poucos minutos, todos restantes retornavam à jangada que, pouco depois, se reequilibrou e retomou a sua viagem para a margem norte do rio. E eu fui um deles... Depois de me ter libertado da espingarda, das cartucheiras, das botas e das granadas, cujo peso me puxava inexoravelmente para o fundo...

Em nenhum momento descortinei qualquer tipo de pânico quando regressei à jangada e, talvez nervosos ainda do desastre, todos sorriamos e aceitávamos o banho forçado como uma dádiva divina depois de vários dias de sede e calor.

Ninguém se apercebeu de nenhum camarada em aflição ou pedindo socorro. Ninguém sequer sonhou que a tragédia tivesse atingido as proporções que tomou. Só na margem norte do rio, quando mandei formar o meu pelotão e o vi reduzido a quase metade é que tive consciência da desgraça que tinha acontecido.

E foi então que, algo descontrolado, me dirigi à margem do rio que engolira os meus soldados na esperança de ainda ver alguém... Mas a tragédia estava consumada de forma silenciosa, definitiva e rápida.

Em resumo e concluindo:

(i) O desastre do Cheche ficou a dever-se, em minha opinião, ao excesso de peso entrado na jangada;

(ii) E ela é corroborada por todos aqueles que, como eu, viajavam na jangada e que em conversas a seguir ao desastre manifestaram a mesma opinião;

(iii) Note-se que a mesma jangada tinha já feito dezenas de travessias sob as ordens directas do Alf Diniz sem nunca se ter detectado qualquer problema;

(iv) Esse problema surgiu de forma trágica na última travessia, ou seja, naquela em que o responsável Alf Diniz não pôde efectivamente proceder segundo o que estava estabelecido, deixando entrar na jangada o dobro da sua capacidade, por ordem do 2º Comandante da Operação a que, pela natureza da hierarquia militar, não poderia opor-se;

(v) Mas fê-lo, e disso dei testemunho no âmbito do inquérito que se seguiu, advertindo previamente o seu superior hierárquico para o facto de estar a infringir as determinações que tinha sobre a forma de fazer a travessia do rio e da lotação definida para a embarcação;

(vi) E estou convencido que a rapidez do desaparecimento das vítimas nas águas calmas, escuras e profundas do Corubal, se ficou a dever ao facto de todos transportarem consigo pesado equipamento de guerra que lhes tolheu os movimentos e os conduziu para o fundo do rio, de forma tão rápida, com a agravante de que a maior parte deles não sabia nadar;

(vii) Finalmente, não posso deixar de fazer referência ao que o José Martins diz ter ouvido de "alguém que esteve no centro do acontecimento" de que as águas tomaram um tom avermelhado.

(viii) Sei da existência de crocodilos naquele troço do rio Corubal.

(ix) Sei que alguns dos corpos de soldados encontrados dias mais tarde, apresentavam sinais de terem sido dilacerados por crocodilos.

(x) Mas sei também que as águas, naquele dia, e após o acidente, apenas apresentavam o tom natural verde escuro de um rio calmo e profundo e tenho dúvidas que os crocodilos tivessem estado presentes naqueles momentos, com o ruído de helicópteros sobrevoando as águas a baixa altitude, na tentativa de encontrar e socorrer algum soldado em dificuldades.

(xi) Não devemos dramatizar mais o que só por si já foi suficientemente dramático (2)...


4. Breves dados sobre a CCAÇ 2405 (1968/70)

Composição da CCAÇ 2405:

A CCAÇ 2405, à data dos acontecimentos, tinha a sua sede em Galomaro (3).

Comandante: Cap. Mil. José Miguel Novais Jerónimo

1º Grupo de Combate – Alf Mil Jorge Lopes Maia Rijo
2º Grupo de Combate – Alf Mil Vitor Fernando Franco David
3º Grupo de Combate – Alf Mil Rui Manuel da Silva Felício
4º Grupo de Combate – Alf Mil Paulo Enes Lage Raposo


O 2º Grupo de Combate, comandado pelo Alf Mil Vitor David, não integrou a Companhia na operação de evacuação de Madina do Boé, ficando na sede da Companhia em Galomaro, onde porém a acompanhou através dos meios rádio.

As baixas resultantes do desastre do Cheche foram sofridas pelos 1º e 3º Grupos de Combate, que viajavam na jangada na altura do acidente.


Rui Felício
(Ex-alf mil inf CCAÇ 2405

[ Fixação / revisão de texto / bold a cores / título: L.G.]
_________

Notas de L.G.

(1) Vd. post do José Martins > 6 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - D: Madina do Boé, 37 anos depois

(2) Vd os posts anteriores sobre este tópico:

17 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIX: Antologia (7): Os bravos de Madina do Boé (CCAÇ 1790)

(...) "Apresentação do livro de Gustavo Pimenta, sairómeM - Guerra Colonial (Palimage Editores, 1999), no Porto, Cooperativa Árvore, em 10 de Dezembro de 1999. Autor do texto: José Manuel Saraiva, jornalista do Expresso" (...)

2 de Agosto de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXIII: O desastre do Cheche, na retirada de Madina ...

(...) "Este documento, que me chegou às mãos através do Humberto Reis, relata a dramática operação em que participou a CCAÇ 2405, sedeada em Galomaro, e pertencente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), operação essa que tinha em vista operação essa que tinha em vista retirar as NT da posição insustentável de Madina do Boé, cercada pelo PAIGC"(...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXX: A retirada de Madina do Boé (José Martins)

(...) "O mês de Fevereiro de 1969 tivera inicio há poucos dias quando passou, no aquartelamento de Canjadude, uma coluna cuja missão era retirar a Companhia de Caçadores nº 1790 do seu destacamento de Madina do Boé. Paralelamente a guarnição do posto do Cheche, pertencente à Companhia de Caçadores nº 5, também retiraria e juntar-se-ia à nossa companhia em Canjadude" (...)

8 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXXXI: Comentário de Afonso Sousa ao texto sobre a retirada de Madina do Boé

(...) "Emociona este seu testemunho. Eu só faço uma pequena ideia do sofrimento de todos vocês, naquele momento trágico, nas horas e nos dias seguintes - em terras de solidão, em paragens dos confins da Guiné" (...).

(3) Em Fevereiro de 1969, a CCAÇ 2405 era a unidade de quadrícula de Galomaro, pertencendo ao Sector L1, e estando afecta por isso ao comando do BCAÇ 2852, sediado em Bambadinca.
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quarta-feira, 1 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4618: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (9): Cansamba, subsector de Galomaro, 1 de Agosto de 1969

Guiné > Zona leste > Galomaro > 2º Gr Comb da CART 2339 (Julho/Agosto de 1969) > Fotos Falantes I (10, 11, 12) > Aspectos da vida do 2º Gr Comb, destacado em Julho/Agosto de 1969, para o reforço do subsector de Galomaro, incluindo a tabanca em autodefesa de Cansamba.


Fotos: © Torcato Mendonça (2009). Direitos reservados.




Estórias de Mansambo II > CANSAMBA I - O 1º de AGOSTO
por Torcato Mendonça (*)


Fotos Falantes I (10, 11, 12)


No dia 1 de Agosto de 69, fomos destacados para a Tabanca em autodefesa, de Cansamba [ subsector de Galomaro]. Mas como e porquê?

Façamos uma breve introdução.

A meio de Julho, dia 13, saímos de Candamã e Afia (**), tabancas em autodefesa, depois de uma estadia de um mês, e regressámos a Mansambo. Pouco descansámos, pois, dia 16 partimos em diligência para Galomaro em reforço da CCaç 2405 e do COP7.

Ficámos então dependentes da 2405, cerca de vinte e cinco militares do 2º Grupo e três ou quatro picadores. Trinta militares ou trinta e dois no total [vd. fotos].

Logo, no dia seguinte ou no outro, assistimos a uma operação, helitransportada, dos pára-quedistas. Efectivamente, era outra tropa. O treino, os meios, a autoconfiança. Isso e muito mais faziam a diferença.

Cerca de meia hora depois, da primeira saída dos helis com tropas já, no regresso, traziam material apreendido. Até uma gazela que o IN estava a esfolar veio... Assim valia a pena. Tinham, em comum connosco o sermos feitos da mesma massa. Óptimos militares a merecerem o meu respeito. Pena nós não termos mais meios. Mesmo com o pouco íamos cumprindo. Curiosamente cumprimos e detesto o termo – tropa macaca – porque não nos sentíamos diferentes dos que eram apelidados de bons… E gostávamos de certas operações. Vidas!

O IN estava muito activo na zona, quer a Sul/Sudeste de Galomaro quer, mais longe, para oeste, à volta de Mansambo. Atacou várias vezes Mansambo, Candamã e Afiá e, naquela zona, atacou Cansamba, onde estava um Grupo, creio que de uma Companhia de periquitos e Madina Xaquili.

Tínhamos acompanhado a Companhia que para lá foi, em 22 de Julho [de 1969], para trazer as viaturas para Galomaro. Não gostámos daquela Tabanca… já tínhamos mais de dois terços de comissão e o cheiro da mata era sentido de forma mais forte. Creio que antes do regresso, o dissemos a um alferes ou furriel, T-shirt de Operações Especiais, a memória pode falhar. Certo é que o IN foi lá experimentar… hoje, tanto tempo depois, parece-me ter sido a CCaç 12.

O IN, com os corredores abertos, mostrava-se com certo à vontade. Na margem esquerda do Corubal (zona leste) onde não haviam aquartelamentos nossos. Na margem direita, vendo a Carta da Guiné, sabendo as nossas posições, é fácil compreender a progressão das forças do PAIGC, aproveitando a época das chuvas. E não só, não só…

No primeiro dia de Agosto, fomos mandados para Cansamba a substituir o Grupo que lá estava. Saíram de lá felizes, os piras.

Antes trocámos breves palavras, recebemos algum material e eles foram-se. A partir daí era connosco. Vimos que era forçoso haver mudanças rápidas. Era uma Tabanca enorme. A cerca de quinhentos metros estava uma outra pequena. A razão era que esta era habitada por futa-fulas. A grande tinha uma mesquita, simples ou humilde, e uma escola (madrassa). Era uma povoação com alguma importância, resultado da junção de várias tabancas.

Assim, demos início ao trabalho.

Os Furriéis (só dois, o Rei e o Sérgio) deram uma volta, falaram com a população, viram as defesas e o que observaram não os agradou. Eu via o material que tínhamos, esperava pelo regresso dos africanos que iam connosco, a passear pela tabanca na obtenção de informações e ia tomando apontamentos.

Depois todos juntos, estudámos rapidamente os elementos que dispúnhamos e estabelecemos uma estratégia. Para o imediato tínhamos que falar com o Chefe de Tabanca, ver o armamento que estava distribuído à população, organizar minimamente a defesa. Na segunda fase, para os dias seguintes, teriam que ser abertas mais valas, colocado mais arame farpado, organizada a defesa e tentar modificar aquilo. Assim, como estava, era um perigo. Num ataque forte entravam por ali adentro com facilidade.

Mandámos chamar o Chefe. Estranhámos a sua ausência e mais estranhámos a sua demora. Estávamos na zona das suas moranças e ele devia já ter aparecido. Demorou. Demorou tempo demais. Quando chegou vimos estar em presença de um homem que nos ia dar problemas. Talvez por isso a alegria da saída do Grupo de periquitos.

Para grandes males grandes remédios. Tivemos que lhe dizer que, a partir daquele momento quem mandava éramos nós. Compreendeu à segunda. Como? Bem… certamente porque não era parvo. Viria a ser, no futuro, um óptimo colaborador. Após ter compreendido porque estávamos ali, respondeu ao nosso primeiro pedido e rapidamente reuniu todos os homens com armas distribuídas. Era uma loucura ver tanta gente com Mausers, G3, dilagramas e muitas munições. Um bando. Nós, à volta de trinta…

Falamos àquele exército, o chefe traduzia e os picadores (milícias) confirmavam com sinais, olhares... nós percebíamos. A linguagem gestual ou por olhares é óptima…

A noite aproximava-se. Mandámos toda a gente em paz e já não fomos à tabanca dos futa-fulas.

Achámos melhor dividirmo-nos em três grupos, separados a uma distância prudente, com possibilidades de entreajuda. Tínhamos bolsa de enfermeiro mas não tínhamos enfermeiro. Tínhamos operador de rádio mas sem aparelho. Claro que estávamos desfalcados, os meios eram os possíveis. Assim se fazia a nossa guerra. A falta de meios, a normalidade.

O Chefe ficava a dormir na sua morança (escolha dele, claro…) mas eu dormia lá também. Cá fora, no telheiro, dois homens, a revezarem-se. As sentinelas eram feitas pelos três grupos, aos pares. De preferência um picador e um soldado. Claro que os turnos cabiam a todos.

Comemos, arrumámos o material, montámos uma precária defesa e preparámos o descanso. De repente uma saída e começou o ataque. Vinham dar as boas vindas. As ordens eram responder o mais forte possível. Alguém já tinha montado a nossa pesada. Ou seja, um bidão aberto totalmente num lado e só metade no outro. Lá dentro uma simples G3 em rajadas curtas, mas a fazer um barulho dos diabos. Estava lá um 82, do IN, que funcionava com as nossas munições e as deles. Nessa noite foi a triplicar.

Mas o pior não foi o inimigo. O pior foi a população. Vinham á porta das moranças e disparavam as Mauser ou as G3. Gritávamos para virem para as valas, mas nada. Pedíamos ao Chefe, que estava ao nosso lado, entre dois militares, para mandar parar o fogo da população. Nada. Nós, no meio, à frente os inimigos, logo atrás os amigos, posição óptima.

Dois ou três militares levantaram o Chefe acima da vala e então, como estivesse a ser capado, berrou e bem. Calaram-se os amigos e pouco depois os inimigos, talvez a esperar melhor ocasião, fizeram o mesmo. Estavam dadas as boas vindas ou feito o teste aos recém-chegados. Por isso, logo no dia da chegada fomos recebidos assim. O nosso 1º de Agosto.

Um morto da população e um ferido. Disparar dilagramas com bala real era terrível. No outro dia começou a instrução, para a não repetição de situações daquelas e melhorar o uso e conservação do armamento. Além disso começámos a estudar onde e como abrir valas e abrigos. Antes visitámos a Tabanca dos Futa-Fulas. Tinham falta de munições e de outras coisas. Parece que tinham estado em Madina do Boé e vindo para a zona após a evacuação do aquartelamento. Gente habituada aos tiros. Se necessário podia contar com eles na protecção de um flanco. Assunto a ser tratado posteriormente.

Recebemos a meio da manhã a visita do Comandante do COP 7, creio que um Major Pára-quedista, porque em Galomaro ouviram o ataque. Não tinhamos rádio. Pusemo-lo ao corrente da situação e fizemos os pedidos de material.

Estivemos até ao dia quinze em Cansamba. Foram quinze dias óptimos. O apoio da 2405 foi excelente. Em Cansamba tivemos ocasião de contactar com a população, falar com Homem grande que ensinava árabe e o Corão aos miúdos. Era homem de grande sabedoria, talvez um marabú. Tive oportunidade e tempo, de falar com ele e assim aprender a compreender melhor aquele Povo e a sua religião. Eu tinha (tenho) o meu nome tatuado, em árabe, no braço esquerdo e sabia fazer as saudações ou cumprimentos. Isso fez com que a aproximação fosse mais fácil. Interrompida, infelizmente, porque estive dois ou três dias fora, em Galomaro, a curar o meu quinto ou sexto ataque de paludismo. Regressei e notei as benfeitorias.

Reforçou-se a auto defesa, a população teve melhor instrução militar, impedimos que a Administração, através de um Cipaio que por lá apareceu (em Galomaro estava um Chefe de Posto), interferisse com a população… perceberam… e foram-se. Certamente causava-lhes prejuízo a população não pagar o imposto!

Quase nos considerávamos em férias. Recebemos nova ordem: apresentar em Bambadinca no Batalhão. Assim foi. Reunião e saída para Candamã.

Missão: procurar onde era o acampamento do Bi-Grupo, reforçado com artilharia que tinha feito tantos ataques na zona em tão pouco tempo. O Comandante, Mamadu Indjai. Descobrimos a acampamento, os Paras destruíram-no e militares da 2339 (3º Grupo) emboscaram-nos fazendo dois ou três mortos e vários feridos, entre eles o Mamadu Indjai.

O Coronel Hélio Felgas não teve razão com a ameaça – só saiem de lá depois de os encontrar… Enganou-se. Pena foi ter-se acabado Galomaro e o sossego de Cansamba. Um mês bem passado, metade em Galomaro, a outra em Camsamba.

Até ao fim da comissão foi sempre a andar…

[Continua]

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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores desta série:

29 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4435: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (7): Bissau, a caminho de Fá

4 de Junho de 2009 Guiné 63/74 - P4459: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (8): Mussá Ieró, tabanca fula em autodefesa, destruída em 24/11/68

(**) Vd. poste de 11 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1167: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (4): Candamã, uma tabanca em autodefesa

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3799: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (3): O hino da CCAÇ 2405 (1968/70) (Victor David)

1. O Victor David (foto do lado esquerdo) respondeu, em 24 do corrente, a um pedido meu, dirigido ao pessoal que passou por Dulombi, para nos mandarem letras do Cancioneiro de Dulombi / Galomaro ("Amigos e camaradas de Dulombi, avós, pais e netos: Para vosso conhecimento. Infelizmente não tenho o mail (actualizado) do Jorge Rijo. O dos seguros foi desactivado: julgo que ele passou à reforma. Reforço o pedido: Kadé o Cancioneiro de Dulombi ?")...

Na véspera, já tinha recebido um mail do Rui Felício. Do Jorge Rijo, não há notícias. O Paulo Raposo, por sua vez, vai aparecendo, de tempos a tempos.


2. Mensagem do Rui Felício (ex-Alf Mil, CCAÇ 2405, Dulombi, 1968/70), de 23 do corrente:


Meu caro Luís Graça:

A minha ausência das lides bloguistas não significa menos atenção ao teu blog, que visito com a regularidade possível. Respondendo ao teu e-mail referente ao designado Cancioneiro do Dulombi :

(i) Como disse na altura que escrevi o post que tu referes, fui eu de facto o autor da letra da cantoria dedicada aos periquitos que nos substituiram, e que a malta da CCAÇ 2405 costuma cantar nos almoços anuais que realiza. A música foi arranjada pelo Jorge Rijo, essa sim plagiada de uma cantiga que na altura andava em voga (essa cópia da musica está assumida também no mesmo post);

(ii) Por isso fiquei um tanto confuso com a reivindicação de autoria feita pelo tal Luis Dias. Ou então não entendi bem o que ele quiz dizer com isso;

(iii) Não me faz diferença nenhuma que a autoria me seja atribuida ou não, até porque aquilo foi uma versalhada sem qualquer valor poético ou literário. Mas as coisas são o que são e não tenho a menor dúvida que fui eu que a escrevi e nem sequer me inspirei nalguma outra de que me tivesse servido como molde ou como ideia;

(iv) O que não quero é que se pense que me intitulei autor de versos que o tal Luis Dias diz que já tinham sido feitos por ele. E não quero porque não é verdade...

(v) Como também disse na mesma altura do tal post que referes, não sou já capaz de a reproduzir integralmente e quem a tem transcrita para papel é de facto o Jorge Rijo, cujo contacto de e-mail não tenho. Aliás, da última vez que falei com ele disse-me que ia arranjar um endereço electrónico mas desde então nada mais me disse.

Reencaminho este e-mail para ao Vitor David e para o Raposo. Pode ser que eles possam encontrar os tais versos.

Um abraço do teu amigo
Rui Felício

3. Comentário de L.G.:

Rui, não quero que o avô se zangue com o neto... O que o Luís Dias reclamou, muito modestamente, foi apenas a paternidade... da letra do Adeus Guiné:

É o fim do castigo ,
Terminou a comissão,
É necessário gritar
Piras! Não venham,
Deixem isto acabar,
Morrer de tédio,
Sem remédio.
Isto é vida de cão,
A velhice vai embora
Enquanto a bajuda chora
E a nau está a naufragar.
(...)

Entretanto, tenho notícias frescas do Victor David. Um abraço para os baixinhos de Dulombi, Jorge Rijo, Paulo Rsposo, Rui Felício e Victor David. LG


4. Mensagem do Victor David (ex-Alf Mil, CCAÇ 2405, Dulombi, 1968/70):

Caríssimo Luís Graça:

A minha veia de escritor passou toda para o Felício aquando da nossa passagem pela Guiné, pelo que não tenho colaborado no blogue activamente, mas não tenho deixado de ser um leitor atento e interessado na grande qualidade dos seus escritos e orientação. Para mim continua a ser dos mais completos, interessantes e valiosos documentos para a memória dos tempos inesqueciveis que passámos na Guiné, sobretudo porque são depoimentos de quem viveu os factos e não de quem os trata jornalisticamente, impingindo-nos a sua versão não vivida!...

Bem, mas respondendo ao pedido que foi lançado no blogue àcerca da letra do Hino da CCaç 2405, na altura da recepção à companhia que nos foi render em Dulombi e, depois de devidamente analisada a papelada em arquivo próprio, aqui vai ela (de autoria do Felício - ou do Rijo - já não sei) e música, também me não lembro de quem - mas de uma canção na moda naquela altura:

SÊ BENVINDO, PIRIQUITO,
PIRIQUITO,
JÁ CANSAVA DE ESPERAR,
DE ESPERAR.

COMO VÊS ISTO É BONITO,
COM MUITA COBRA E MOSQUITO
E GUERRILHA A CHATEAR,
A CHATEAR.

ANDA CÁ, ESTÁ SOSSEGADO,
DESCONTRAI, POUSA A CANHOTA
QUE O IN ESTÁ NOUTRO LADO,
ANDA PRAÍ EMBOSCADO,
EM ALGUM PONTO DE COTA.

ATAQUES, FLAGELAÇÕES,
MUITAS MINAS, EMBOSCADAS,
VERY LIGHTS AOS MONTÕES
E MANGA DE ROQUETADAS,
AS SABOROSAS RAÇÕES
E A CARNE AFIAMBRADA.

HÁ ABELHAS E MOSQUITOS,
OLÉ LÉ LÉ LÉ,
MOSCA CHATA E FORMIGA,
OLÉ LÉ LÉLÉ,
SAPOS, RÃS E UNS LAGARTITOS,
OLÉ LÉ LÉ LÉ
MAS É TUDO MALTA AMIGA!
OLÉ LÉ LÉ LÉ.

Um abraço
Victor David
BAIXINHO DO DULOMBI ( com muita honra!)

P.S. Quem souber de que canção era a música, que dê uma ajuda!

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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes desta série:

20 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3763: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (1): Adeus, Guiné / É o fim do castigo, / Terminou a comissão... (Luís Dias)

21 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3772: Cancioneiro de Dulombi / Galomaro (2): Tecnil, Tecnil / Eu passei lá muitas noites / Certamente mais de mil (Luís Dias)