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quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24546: Fotos à procura de... uma legenda (176): A "rainha de Catió", fotografada em 1964/66 (pelo João Sacôto) e em 1972 (pelo Mário Arada Pinheiro)

Guiné > Região de Tombali > Catió > CCAÇ 617 (1964/66) > "Mulher grande, rainha de Catió". 

Foto do álbum do João Gabriel Sacôto Martins Fernandes, de seu nome completo, ex-alf mil da CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66) e depois piloto da aviação civil onde chegou a comandante da TAP, reformado desde 1998. Conviveu com a população, fula e balanta, de Catió e arredores, incluindo Príame (a tabanca do cap 'comando' graduado João Bacar Jaló, 1929-1971).

Foto (e legenda): © João Sacôto (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Região de Tombali > Catió > BCAÇ 2930 (Catió, 1970-72) >  O então maj inf Mário Arada Pinheiro, 2.º cmdt do BCAÇ 2930, com a "rainha de Catió" e algumas das suas netas (?)... Em chão nalu, ela era fula. As miúdas mais pequenas estão "meio escondidas", envergonhadas ou intimidadas (como era normal, na presença dos "tugas")... (**)

Foto (e legenda): © Mário Arada Pinheiro (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Será a mesma senhora? A "rainha do Catió", fotografada por volta de 1964/66, pelo João Sacôto, e seis ou oito anos mais tarde, em 1972, pelo Mário Arada Pinheiro?

Ambos os fotógrafos lhe chamam "rainha de Catió", " mulher grande", "fula em terra de nalus"... Mas o Cherno Baldé, o nosso assessor para as questões etnolinguísticas, tem dúvidas, tendo deixado este comentário no poste P24549 (*):

(...) "Em Catió, na altura, o Bairro dos fulas, melhor dizendo futa-fulas, era logo à entrada em Priame, onde também vivia a família do Cap 
Cmd João Bacar Jaló. Por isso, quer-me parecer que a mulher grande aqui apresentada como a "rainha de Catió" poderia muito bem ser uma das suas viúvas ou uma familiar muito próxima, para merecer as visitas de um alto oficial do Batalhão sediado em Catió.

"Os fulas não têm rainhas e muito menos no chão Nalú, mesmo estando em terras conquistadas pelos seus antepassados. Talvez o Mário Arada Pinheiro nos possa esclarecer a dúvida." (9 de agosto de 2023 às 16:29 (...)

2. Comentário do editor LG:

Obrigado, Cherno, estou agora, neste mês, quase todos os dias com o coronel Mário Arada Pinheiro, tem casa de férias aqui na Praia da Areia Branca... Pertencemos ambos ao GAPAB / Vigia (Grupo dos Amigos da Praia da Areia Branca). Vou-lhe "espicaçar" a memória, que é muito boa para quem já teve a felicidade de chegar aos 90 anos. (E ainda há dias o vi a conduzir aqui na Lourinhã.) Realmente nunca vi nenhuma rainha "fula"... Dos nalus conheci, em 2008, o "rei", Salifo Camará, falecido em 2011... Aliás, "Aladje Salifo Camará, régulo de Cadique Nalu e Lautchandé, antigo Combatente da Liberdade da Pátria, o rei dos nalus" (tinha 87 anos em 2008).

Em Angola, sim, houve várias rainhas, que ficaram na história, começando pela mais célebre, Mwene Nzinga Mbandi (c. 1582, - 1663), também conhecida por rainha Njinga ou Ginga, ou Ana de Sousa (para os portugueses).

Vamos lançar o desafio aos nossos dois fotógrafos e aos nossos camaradas que tenham passado por Catió... Quem é (era ou foi) esta "mulher grande, rainha de Catió"? (***)
____________

Notas do editor:

(*) Vd,. poste de 28 de março de 2019 : Guiné 61/74 - P19628: Álbum fotográfico de João Sacôto, ex-alf mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como, Cachil, 1964/66) e cmdt da TAP, reformado - Parte VII: Catió e arredores: contactos com a população civil

(**) 9 de agostoi de 2023 > Guiné 61/74 - P24540: Fotos do álbum do cor inf ref Mário Arada Pinheiro, antigo 2º cmd do BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72) e cmdt do Comando Geral de Milícias (Bissau, 1972/73)

(***) Último poste da série > 30 de julho de 2023 > Guiné 61/74 - P24519 Fotos à procura de... uma legenda (175): Capinadores e "homens armadas" em Cutia, tabanca e destacamento no setor de Mansoa, ao tempo do BCAÇ 2885 (1969/71) (José Torres Neves, capelão)

segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24537: O Nosso Blogue como fonte de informação e conhecimento (102): Há uma diferença entre o "capim" e o "colmo" (utilizado na cobertura das moranças) (Cherno Baldé)


Guiné > Região de Tombali > Gadamael - Porto > s/d [1973?] > Tabanca, reordenada pelas NT. Em primeiro plano, do lado esquerdo, uma morança ainda com a tradicional cobertura de "colmo" (palha) (material que não deve ser confundido com o "capim")... As casas reordenadas já eram revestidas com "chapa de zinco".

Foto: Autor desconhecido. Álbum fotográfico Guiledje Virtual. Gentileza de: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) (2007).




Guiné >Região de Tombali > Gadamael - Porto > 1968 > A construção do primeiro reordenamento do CTIG, na opinião do cor art ref António J Pereira da Costa, membro da nossa Tabanca Grande. As casas ainda eram cobertas a colmo.

Fotos (e legenda): © António J. Pereira da Costa (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Guiné > Região de Tombali > Cufar > Matofarroba > Tabanca > 1973 > Aspeto do reordenamento feito pelas NT. Matofarroba ficava/fica, a 2km/3km, a sul de Cufar.

Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Guiné > Região do Oio > Sector 4 (Mansoa) > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) > Destacamento e tabanca de Cutia > Uma jornada de capinagem... A população da tabanca é balanta.



Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71) > Destacamento de Bissá > c. 1970 > Celeiro para a "bianda", neste caso o arroz... Em balanta, chama-se "flu". Ao fundo, a tradicional casa balanta, ecológica, feita de adobe e colmo.

Fotos (e legenda): © José Torres Neves (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de Cherno Baldé  (nosso colaborador permanente, assessor para as questões etnolinguísticas, vive em Bissau, tem 280 referências no nosso blogue) ao poste P24519 (*):

(...) Sobre a afirmação do(s) Editor(es) de que o capim à volta das localidades e picadas seria a "base de cobertura das casas (palhotas)" dos nativos não é exacta. 

Neste caso podemos falar, para fazer a distinção, de capim vs palha (colmo) (**):

(i)  o capim nasce em todos os sítios e, sobretudo, em zonas do mato com ou sem arvoredo;

(ii) a palha (colmo), que servia para cobrir as casas, nasce somente nas partes altas das bolanhas ou lálas, são mais finas, de uma cor entre o castanho e o amarelo, brilhantes e mais resistentes aos insectos roedores (bagabagas) podendo atingir a altura entre 1,20 m até 2m com variações que vão do norte ao Sul em função do volume de chuvas e fertilidade dos solos.

Contudo, esta excelente espécie nativa de palha das bolanhas, outrora muito apreciada e utilizada para a cobertura das casas de colmo em África a fim de amenizar o calor sufocante durante a época seca, está a desaparecer pouco a pouco, vítima das mudanças climáticas e diminuição das chuvas no território. 

Se na Guiné, sobretudo no Sul, ainda vai resistindo, nos países do sahel há muito que já tinha desaparecido, constituindo assim uma das principais razões do aumento da procura das chapas de zinco para a cobertura das casas em toda a zona África ao sul do Sahara. (...)

30 de julho de 2023 às 19:24 
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 30 de julho de 2023  Guiné 61/74 - P24519 Fotos à procura de... uma legenda (175): Capinadores e "homens armadas" em Cutia, tabanca e destacamento no setor de Mansoa, ao tempo do BCAÇ 2885 (1969/71) (José Torres Neves, capelão)

(**) Último poste da série > 29 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - P24438: O Nosso Blogue como fonte de informação e conhecimento (101): Pedido de apoio para a obtenção de antigos manuais escolares do PAIGG (com destaque para o livro da 4ª classe). editados na Suécia, em Upsala, impressos na Wretmans Boktryckeri AB (Jorge Luís Mendes, Primeiro-Conselheiro da Embaixada da República da Guiné-Bissau no Brasil)

quinta-feira, 11 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24307: Facebook...ando (27): Op Neve Gelada, na zona de Campã / Cantiré, 5 km a norte de Canquelifá, onde estavam as bases de fogos (morteiro 120 mm e foguetões 122) usados contra Canquelifá



Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Sector L4 (Piche) > Canquelifá > Março de 1974 >  O José Marques junto a um dos morteiros 120 capturados no dia 21 de março de 1974, pelos Comandos Africanos na zona de Canquelifá, quando arrumávamos as respectivas granadas. Cortesia de José Marques (Castelo de Vide) (não sabemos ainda a que unidade/subunidade pertenceu, mas fica convidado para integrar o blogue, é apenas amigo do Facebook).

Foto (e legenda): © José Marques (2023). Todos os direitos reservados. 
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1.  Seleção de comentários, gerados no Facebook da Tabanca Grande (*), na sequência da publicação do poste P24305 (**):

(i) Tabanca Grande:

Depois do ataque e destruição da tabanca de Canquelifá, 18 de março de 1974, por fogo IN de morteiro 120 mm e foguetões 122 mm), foi desencadeada a Op Neve Geada, de 21 a 23 de março de 1974, tendo sido batida a zona de Campã / Cantiré, sector L4 (Piche), a cerca de 5 km, a noroeste Canquelifá, numa ação levada a cabo pelo BCmds da Guiné, a três agrupamentos. 

 Na zona estava referenciada uma base de fogos IN. No dia 21, pelas 14h45, a base de fogos foi assaltada, tendo sido apreendidos: 

  • 3 morteiros 120 mm; 
  • 367 granadas de morteiro 120 mm;
  • 1 LGFog RPG-2; (iv) 2 espingardas automáticas Kalashnikov; 
  • e material diverso.

No dia seguinte, pelas 10h00, foi assaltada nova base de fogos e capturadas três rampas de foguetões 122 mm, além de material diverso (munições, espoletas, munições., etc.). Baixas: 2 mortos e 24 feridos, do lado das NT; 27 mortos, incluindo 2 cubanos, do lado do IN. 

Fonte: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico- Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da Actividade Operacional: Tomo II - Guiné - Livro III (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2015). pp. 479/480.)

(ii) O cor 'comando' ref Raul Folques acrescentou o seguinte:

Na Op.Neve Gelada, zona de Canquelifá, o Batalhão de Comandos da Guiné capturou ao IN_:
  • 3 mort. 120mm completos;
  • 1 tubo de mort. 120mm , 2 tripés, 1 prato/base;
  • e 367 granadas de mort.120mm. 
A operação teve lugar no fim de Março de 1974.

(iii) O Cherno Baldé levantou a questão da localização das bases de fogos:

Tabanca Grande Luís Graça, não fosse essa operação dos Comandos Africanos,  efectuada na localidade de Campã para aliviar a pressão sobre Canquelifá, ainda hoje continuariam a pensar que as bases de fogo se localizavam sempre a partir dos territórios vizinhos e assim justificar a impotência do exército português de fazer parar estes ataques. 

Antes de Canquelifa já tinha havido ataques as cidades de Bafatá e Gabú com foguetões e morteiros 120, no Sul os bombardeamentos eram constantes e temos os casos de Cufar,  por exemplo, sendo que são localidades no interior do território.


Guiné > Zona Leste > Região de Gabu >  Pormenor da carta de Canquelifá (1957) (Escala 1/50 mil) > Posição relativa de Canquelifá, tendo a noroeste Copá, e a norte, Campá (5 km em linha reta) e Cantiré (7 km) e, mais acima, os marcos fronteiriços 60, 61 e 62 que o PAIGC devia atravessar vindo as duas bases logísticas no Senegal.

(iv) A Tabanca Grande esclareceu:

Cherno, o PAIGC tinha camiões russos, em março de 1974 (e já antes, desde pelo menos 1968)... Podia perfeitamente penetrar com os morteiros 120 no território da então colónia portuguesa da Guiné... A partir de março de 1973, devia sentir-se mais "à vontade" com a proteção do Strela...

O cor 'comando' Raul Folques, "Torre e Espada", que comandava o Batalhão de Comandos da Guiné na Op Neve Gelado (mas também o cor 'comando' Carlos Matos Gomes, que comandava um dos três Agrupamentos) é que nos pode confirmar hoje (já não é segredo de Estado) se entrou ou não na República da Guiné e se as bases de fogos dos morteiros 120 mm (e dos foguetões 122 mm) estavam ou não em território da Guiné-Bissau, como parece sugerir o Cherno Baldé...  

Em relação à localização das bases de fogo, verificamos pela carta de Canquelifá (1957) (Escala 1/50 mil), que Campã (e não Campiã), uma antiga tabanca, ficava a 5 km, a norte de Canquelifá... Deve ser sido aqui que o PAIGC posicionou os morteiros 120 mm, cujo alcance máximo era de 5700 metros... Cantiré ficava um pouco mais mais longe (cerca de 7 km em linha reta)... 

Portanto, o que o Chermo Baldé diz, é correto. O PAIGC arriscou entrar no território da então Guiné portuguesa, confiando nos seus mísseis Strela... Nem  sempre as viaturas russas Zil e Gas ficaram na fronteira, nem os tipos do PAIGC deviam saber onde ficavam os marcos... Mas a verdade é que desta vez, e talvez por excesso de autoconfiança, não contaram com os comandos africanos, comandados pelo major 'cmd' Raul Folques, que apanharam 3 morteiros pesados completos mais um tubo, e provocaram 27 baixas mortais ao IN, incluindo 2 'internacionalistas' cubanos (que deviam ser apontadores de morteiro)... (Op Neve Gelada, 21 e 22 de março de 1974.)

Quanto à flagelação da Bafatá, meu caro Chermo,  terá sido efetuada apenas com foguetões de 122 mm, como diz (e bem) o... por certo que os combatentes do PAIGC, por muito valentes que fossem, não entraram pela Zona Leste  / Região de Bafatá com os morteiros 120 mm às costas, ou rebocados pelos camiões Gas ao longa da "autoestrada" do leste (que ia praticamente de Buruntuma a Bambadinca, no final da guerra).. Recorde-se que cada morteiro 120, completo (tubo, bipé e prato)  pesa "só" 275 kg (fora as granadas)...

(v) Esclarecimento de António Tavares:

O primeiro ataque a Bafatá com foguetões de 122 mm foi feito da Zona de Acção da responsabilidade da CCaç 2699, sediada em Cancolim, em 1971. A rampa de lançamento foi deixada no local onde foi montada. Felizmente não houve feridos.
Gosto

(vi) Informação do António Rodrigues:

Em Copá, nos meses de Janeiro e Fevereiro de 74, caíram algumas centenas de granadas deste morteiro.

Contávamos todas as saídas e, poucos segundos depois estávamos a contar as explosões junto de nós e só ficávamos descansados quando explodia a última de cada série, felizmente sem consequências físicas para nenhum de nós.
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Notas do editor:

(*)  Último poste da série > 24 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24247: Facebook...ando (26): Homenagem ao Xico Allen (1950-2022): a filha Inês, em Fátima, no passado sábado, no convívio anual da CCAÇ 3566, "Os Metralhas" (Empada e Catió, 1972-74)

sexta-feira, 28 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24261: Palavras fora da boca (3): As nossas santas ingenuidades... A propósito da violència do PAIGC nas "áreas libertadas" (Luís Cabral / Luís Graça / António Graça de Abreu / António Rosinha / Cherno Baldé)


República da Guiné > Conacri > c. 1960  > Dirigentes do PAIGC, junto ao Secretariado Geral: da esquerda para a direita:  (i) Osvaldo Vieira, (ii) Constantino Teixeira, (iii) Lourenço Gomes e (iv) Armando Ramos. 

O Osvaldo Vieira (1938-1974), também conhecido como "Ambrósio Djassi" (nome de guerra), terá morrido, de doença,  dizem,  por complicações pós-operatórias, em  31 de março de 1974 (não num hospital da ex-URSS, mas na base do PAIGC, em Koundara, Guiné Conacrii), e  sobretudo com a terrível suspeita de ter estado implicado na conjura contra Amílcar Cabral... Era primo do 'Nino' Vieira... Ironia(s) suprema(s):  repousam os dois, o Amílcar e o Osvaldo, lado a lado, na Amura; e o seu nome (e não o de Amílcar) foi dado ao Aeroporto Internacional de Bissau, em Bissalanca...

Recorde-se que o "estado-maior" do PAIGC instalara-se em Conacri em maio de 1960. A foto deve ser do ano de 1960, já que em janeiro de 1961 Osvaldo Vieira e Constantino Teixeira faziam parte do grupo de futuros históricos comandantes, mandados por Amílcar Cabral para a  Academia Militar de Nanquim, na China, para receber treino político-militar. Uns meses antes, em agosto de 1960. Amílcar Cabral em pessoa tinha-se deslocado a Pequim para negociar o treino dos quadros do PAIGC na Academia Militar de Nanquim.  

No grupo de quadros do PAIGC que vão nesse ano para a China incluem-se, além dos supracitados Osvaldo Vieira e Constantino Teixeira, os nome de João Bernardo Vieira ['Nino'], Francisco Mendes, Pedro Ramos, Manuel Saturnino, Vitorino Costa [irmão de Manuel Saturnino],  Domingos Ramos [irmão de Pedro Ramos e amigo do nosso Mário Dias], Rui Djassi, e Hilário Gomes.

Foto (e legenda): Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral  > Pasta: 05222.000.084 (adapt por Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, 2018, com a devida vénia...)


1. Seleção de comentários ao poste P24232 (*)... A questão da "violência" (policial ou militar) no TO da Guiné, antes, durante e depois da guerra, dá pano para mangas... Mas está longe de estar (bem) documentada no nosso blogue (Pijiguiti, Samba Silate, Cassacá, chão manjaco, Conacri, Boé, Bambadinca, Cumeré, Porto Gole...).

É um tema "delicado", para não dizer "tabu" e "fracturante",  para um blogue de antigos combatentes. Está mal documentada de um lado e do outro do conflito.

Por exemplo, do lado do PAIGC:  "A luta foi difícil, mas nunca pensei em abandonar. Quanto aos desertores, a lei do Partido exigia que fossem executados… Era a lei militar” (p. 67) (**, disse  Bobo Keita  no livro de Norberto Tavares de Carvalho, "De campo a campo: conversas com o comandante Bobo Keita /Edição de autor, Porto, 2011, 303 pp., posfácio de António Marques Lopes) .

Nas suas memórias ("Crónica da Libertação", Lisboa, o Jornal, 1984) (memórias que vão até ao assassinato do líder do PAIGC, em Conacri, em 20 de janeiro de 1973), Luís Cabral também não esconde que o Partido (sic) resolveu graves conflitos internos com execuçóes sumárias e públicas, como por exemplo, em  fevereiro de 1964, em Cassacá (pág. 190).  sobre

Nem esconde também a violência que era exercida sobre as populações civis sob controlo do PAICC (mas também sobre combatentes e até dirigentes), como no caso do Morés, em fevereiro de 1966. Violència nas suas diversas formas (incluindo a violència sexual)...

 Violência essa que escapa à "santa ingenuidade" de todos os observadores estrangeiros ocidentais  que são convidados a "visitar as áreas libertadas", dos nórdicos (suecos, noruegueses, holandeses) aos italianos e franceses... para não falar dos oriundos dos países "não-alinhados",  os do "bloco soviético", sem esquecer os da China e de Cuba...Todos (a começar pelos médicos cubanos, talvez os mais cínicos)  levavam "vendas nos olhos" ou "óculos cor de rosa", como é normal em situações de conflito em que  se polarizam as posições... Ontem como hoje, a verdade é sempre a primeira grande vítima dos conflitos armados... 

Claro, neste caso, nem o governo português de então nem o Amílcar Cabral convidavam observadores independentes (a começar pelos jornalistas) para ver o que se passava no "terreno"...  Mas ambos sabiam da enorme importância que tem/tinha a "propaganda"... E nessa matéria Amílcar Cabral era uma mestre: foi muito mais hábil que os nossos "cabos de guerra", do Arnaldo Schulz ao António Spínola, para não falar do Bettencourt Rodrigues (que foi mais um erro de "casting")... De qualquer modo, temos que ter em conta a conjuntura histórica, geopolítica, da época, muito mais favorável ao discurso anti-colonialista e anti-imperialista...

(i) Tabanca Grande Luís Graça:

"O Amílcar Cabral era bom de mais", dizia o Osvaldo Vieira...

(...) Apesar da receção calorosa que ele e os cineastas italianos (***)  tiveram no Morés, o Luís Cabral (LC) não deixa de experimentar um sentimento de isolamento e desconforto: 

“Quando eu decidia mandar chamar um ou outro camarada que conhecia bem, ficava com a sensação de que ele não estava à vontade, parecia ter medo de qualquer coisa” (pág. 262).

LC irá constatar, algum tempo depois, que a “disciplina rigorosa” que prevalecia na base, por alegadas razões de segurança, implicava também o recurso (frequente) a “castigos corporais”, a única maneira de prevenir a deserção de populações e guerrilheiros.

LC ficou impressionado com uma cena que observou, de um grupo de um dezena de homens e de uma mulher com o filho ao colo. Os homens tinham as mãos inflamadas das palmatoadas que acabavam de receber, castigo de que escapara a mulher por causa da criança (uma vez que a tinha de transportar).

LC terá ficado indignado, argumentando que o AC nunca aprovaria o uso de “castigos corporais”, prática que associava ao colonialismo

O Osvaldo Vieira “insistia que a nossa gente não compreendia outra linguagem e que o Amílcar era bom de mais” (sic)… e que não se agissem assim, com dureza, quer em relação aos combatentes, quer em relação à população, nos casos de infração às regras estabelecidas, “estavam perdidos” (sic) (pág. 265). (Negritos nossos)

É uma delícia, esta explicação, a do Osvaldo Vieira, deitando por terra o “mito” das “regiões libertadas”…

19 de abril de 2023 às 13:08

(ii) Antonio Graça de Abreu:

Afinal a "disciplina rigorosa" exercida pelo PAIGC sobre a população pobre das "regiões libertadas": Palmatoadas, mãos a sangrar, violência primária sobre um humilde povo que apenas desejava pão e dignidade, e viver em paz!

Posso imaginar o sofrimento de Amílcar Cabral, resguardado na outra Guiné-Conacri, distante das "regiões libertadas". No aparente conforto, no seio dos seus correligionários, em Conacri. Se Cabral não foi ingénuo, morto pelos seus próprios homens, em Conacri, foi o quê?

19 de abril de 2023 às 14:38

(iii) Cherno Baldé:

Eu li o livro "Crónicas da libertação" do Luós Cabral em 1989, precisamente quando estava de férias em Lisboa, mas, se a memória não me falha,  o cenário que o LC descreveu foi de um grupo de pessoas (civis) que eles encontraram amarradas com cordas, estando alguns com os membros inchados e que ele teria mandado desamarrar e, tendo confrontado o caso as pessoas presentes no local, disse que ninguém teve coragem de indicar quem tinha sido o mandante que, tudo indicava, seria o Comandante Osvaldo Vieira que reinava em chefe absoluto na zona Norte. 

No fim, o LC afirmava, no livro, que ainda não tinha chegado o tempo para se falar de todas as verdades da luta do PAIGC. O livro tinha sido publicado em 1984, salvo erro.

Levar a cabo uma guerra como o fez o PAIGC por mais de 10 anos não é uma brincadeira de crianças nem de ingénuos ou inocentes, por isso e para que a luta não resultasse num redondo fracasso, foi preciso combinar a "bondade" do Amílcar Cabral com a dureza vs crueldade do Osvaldo Vieira e no final, esta última acabou por prevalecer, da mesma forma como acontece com todas as boas intençóes. 

Como disse um filósofo inglês do século XIX , "Tentem fazer o bem e as forças do mal prevalecem"

19 de abril de 2023 às 16:46
 
(iv) António Rosinha:

António Graça de Abreu, a maioria dos dirigentes dos partidos ganhadores das primeiras independências dos anos 60 em África, ou se liquidaram uns aos outros, ou escaparam a atentados, sendo eles a matar os outros.

Os que foram assassinados, tal como Amílcar Cabral, não foi por serem "ingénuos". Eles apenas arriscaram, deram o peito às balas, só que Cabral arriscou mais que qualquer outro.

Pela sua condição de ser visto como um cabo-verdiano pelos guineenses, que facilmente ficou "desarmado" quando Spínola pôs em prática a política da Guiné para os guinéus, foi com muito risco consciente que ele corria, tanto que ele mencionou as traições a que estava sujeito, dentro do próprio partido.

Mas sobre Cabral e outros "não indígenas" das ex-colónias portuguesas que optaram por formar os tais partidos ganhadores, tiveram a sua lógica anti-colonialista e simultaneamente anti-salazarista, mas haveria muito a escrever sobre eles, mas seria também muito chato.

20 de abril de 2023 às 00:59 

(v) Tabanca Grande Luís Graça:

Cherno, só agora, em 2023, li o livro do Luís Cabral, "Crónica da Libertação", edição de "O Jornal", Lisboa, 1984, 464 pp. Livro brochado, uma encadernação horrível, que se desconjunta toda. A editora já não existe, o livro é difícil de encontrar, a não ser talvez nos alfarrabistas e, claro, nalgumas bibliotecas públicas.

A cena da violência contra um grupo de população civil na "base central" do Morés encontra-se descrita nas pp.265/270. Isto passa-se por ocasião da visita, à região Norte, do realizador italiano Piero Nelli, na 1ª quinzena de fevereiro de 1966: vd. pp. 259/270. (É o autor do filme "Labanta, Negro!", premiado no Festival de Veneza desse ano.)

O Osvaldo Vieira (OV) era o responsável da Frente Norte (pág. 259). O comissário político da Inter-Regiáo do Norte era o Chico Mendes, membro do Bureau Político (tal como o Luís Cabral, LC (pág. 260). O Osvaldo trabalhou na Farmácia Moderna (diretor técnica, a dra.Sofia Pomba Guerra) (pág. 260). O Inocèncio Kani (IK), o futuro assassino de Amílcar Cabral (AC), era o "responsável da base" (pág. 267): encontrava-se pela primeira vez com o LC, tendo mostrado "um comportamento um tanto reservado". 

LC também conheceu dessa vez o Simão Mendes, enfermeiro no tempo colonial, responsável da saúde (que viria a seguir num bombardeamento à base).

Numa visita à base, o OV diz ao LC que ali teve que se impor "uma disciplina rigorosa, para neutralizar o mal que o inimigo podia fazer-lhes, partindo dos vários quartéis da região"...

É nessa visita, já depois das filmagens da fracassada emboscada, em 11/2/1966 (cito de cor), às NT na estrada Mansoa-Mansabá (que estava a ser alcatroada) e que fora preparada para "italiano ver e filmar"), o LC deu conta da existència de um pequeno grupo de civis que tinham sido maltratados:

(...) "Num pequeno largo da base, estava o Inocèncio e mais alguns camaradas de um lado, enquanto que do outro vi aproximadamente uma dezena de de homens e uma mulher com o filhinho no braço" (pág. 265).  

OV explicou "que se tratava de prisioneiros, apanhados quando se dirigiam aos quartéis inimigos da região" (sic).

"Olhando com mais atenção para os homens, verifiquei que tinham as mãos inflamadas", chamando a atenção do OV para isso. 

"Respondei que a lei estabelecida na inter-reiáo era essa e que a a mulher só tinha escapado porque tinha de carregar o filho e não podia por isso receber as palmatoadas" (sic).

O LC diz que ficou "muito impressionado com esta cena" e esperou a oportunidade para falar com o OV. Ele estava "absolutamente seguro" de que o AC "nunca daria o seu acordo a tal forma de proceder" (pág. 265)...

O OV "insistia que a nossa gente não compreendia outra linguagem e que o Amílcar era bom de mais", e que "estavam perdidos" (...) "se não agissem com dureza" tanto em relação aos combatentes como á população civil...

Na pág. 268, LC conclui que "a disciplina em Morés era (...) imposta em grande parte pela força"... e que o responsável da base, o IK, era criticado, por todos, pela sua dureza, "que muitas vezes chegava a atingir a malvadez"... Mas ele beneficiava da "confiança total" do OV... (pág. 268)...

Enfim, chega de citações, Cherno, e tira as tuas conclusóes. (Nada disto, claro, transparece no filme, de propaganda, do camarada Piero Nelli.)

19 de abril de 2023 às 22:48
 
(vi) António Graça de Abreu:

Também fui ingenuamente ingénuo. Eis a Prova, escrito há quarenta e sete anos::

Pequim, 25 de Outubro de 1977

Nas Edições de Pequim em Línguas Estrangeiras, secção portuguesa, o camarada Fu Ligang trabalha na mesma sala que eu, na mesa mais pequena, à minha direita. É uma espécie de meu secretário. O Fu estudou português em Macau, numa leva de 60 ou 70 jovens chineses que em 1964 a República Popular enviou quase secretamente para Macau, a fim de estudarem a língua de Camões.

O Fu Ligang adquiriu excelentes conhecimentos de português. Teve um professor que nunca esqueceu com o nome de Júlio Pereira Dinis. Responsável e trabalhador -- creio que é membro do Partido Comunista da China --, hoje de manhã perguntou-me:

“Então, camarada António, está a gostar de viver em Pequim, está satisfeito com a China que veio encontrar”?

Assumindo os meus antecedentes meio comunistas, na versão meio maoista, ainda com meia convicção política, respondi-lhe mais ou menos nos seguintes meios termos:

“Sim, vim encontrar um país a crescer, um povo simpático e tenho boas condições de vida e de trabalho aqui em Pequim. Depois, estou a dar o meu pequeno contributo para ajudar a construir o socialismo, para a criação do homem novo, para a construção de uma sociedade mais justa e de um mundo melhor”.

O Fu Ligang ouviu o meu discurso impassível, um levíssimo sorriso a aflorar nos lábios e, passados uns longos segundos, olhou-me pelo canto do olho e disse-me, em excelente português:

“O camarada é ingénuo.”

E não houve mais conversa. Durante o resto da manhã debruçámo-nos sobre os textos a traduzir e a corrigir.

O Fu deve ter razão. Nestes meus quatro anos de Pequim, vou tentar entender e digerir a minha ingenuidade.

20 de abril de 2023 às 13:34

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Subtítulo / Itálicos / Negritos: LG] (****)
___________



(****) Último poste da série > 26 de abril de  2023 > Guiné 61/74 - P24252: Palavras fora da boca... (2): "Prós insultos não há contemplações nem indultos"... e também: "Quem não tem poilão, acolhe-se à sombra do chaparro"... Proverbiário da Tabanca Grande, 5ª edição revista e aumentada

domingo, 9 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24212: Fotos à procura de... uma legenda (174): Legendas para as fotos do Ramadão de 1971, na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf / Cherno Baldé)

1. O nosso amigo Cherno Baldé prontamente respondeu ao nosso pedido de legendar as fotos que o camarada José Carvalho nos enviou, e que foram publicadas no poste P24207.
O nosso obrigado a ambos.
Ficam agora devidamente ordenadas e legendadas:


Foto 1 - Chegada e antes do início da reza que se inicia com a chegada do Imame acompanhado dos seus discíplos. O grupo deve posicionar-se de acordo com as regras da tradição islâmica, os mais doutos, com maior idade e experiência ficam a frente, junto do Imame. A lógica é simples, nenhum humano é perfeito e infalível, em caso de evidentes falhas ou impossibilidade, deve-se substituir o Imame sem interromper o ritual da reza. A seguir vem o grupo dos mais novos, mulheres e crianças.
Foto 2 - Após a chegada do Imame, dá-se início a reza com a leitura, pelo Imame, de alguns Surats do sagrado Corão, como recomenda a Sunna (prática) do Profeta do Islão, em fileiras unidas e bem compactas, fazendo lembrar o período conturbado do início do Islão no meio de rivalidades, guerras, traições e assassinatos, sobretudo no período que se seguiu a morte do Profeta em Medina.
Foto  3 - Após a leitura dos Surats, os participantes inclinam-se para a sua frente, imitando o Imame, em sinal de submissão e devoção a Alláh, o todo poderoso e misericordioso.
Foto  4 - A seguir à inclinação, o grupo levanta-se ao mesmo tempo para de seguida se prosternar, e com a testa no chão, numa postura de total submissão e devoção a Alláh e ao seu Profeta.
Foto 5
Foto 6
Foto 7
Foto 8
Fotos 5 a 8 A - Na parte final da reza tem lugar o que chamam de "Cutuba" ou Sermão com a participação de um grupo seleto de discíplos e pessoas dedicadas a causa da religião na comunidade, todos do sexo masculino, durante o qual é revisitada a longa história do Islão dos primórdios a actualidade, incluindo partes do periodo Judaico e dos textos do antigo testamento do Cristianismo com particular destaque as peripécias do antes, durante e após a fuga dos Hebreus do Egipto e a épica ou mitológica travessia do mar vermelho com o Profeta Moísés (Mussa para os Árabes) a frente da nação rumo ao deserto do Sinaí e que culmina com a vida e obra do Profeta Muahammad.
Esta parte é a mais importante, mas também é a mais monótona e menos interessante para a rapaziada que já está com os sentidos voltados para as comidinhas que, entretanto, estariam a preparar em casa de maneiras que, não raras vezes, só ficam os mais velhos a acompanhar esta longa narrativa prenhe de recomendações dogmáticas sobre a religião, a vida em comum e a necessidade e fundamentos da preservação dos ensinamentos e da tradição islámicas, a bem da comunidade.

Fotos: © José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753
Legendagem: Cherno Baldé

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Nota do editor

Vd. poste de 7 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24207: Fotos à procura de... uma legenda (173): O Ramadão de 1971 na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf)

segunda-feira, 13 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24140: Blogues da nossa blogosfera (180): Lista de provérbios crioulo-guineenses (página do professor Hildo Honório do Couto, departamento de Linguística, Universidade de Brasília) - Parte I (de A a L)

Portal dos animais > Abutres  (com a devida vénia...)

1. Os animais "também falam" nos provérbios guineenses...  Já aqui lembrámos, em tempos,  o jagudi (lê -se djagudi)  (abutre-de-capuz, nome científico Necrosyrtes monachus) numa fábula em que entra o falcão (*):  o jagudi não é ágil, elegante, superior, altivo, nobre, aristocrático e guerreiro como o falcão  mas nem por isso deixa de ter o seu lugar na criação e de desempenhar o seu papel na natureza. É certo que ele é pouco considerado tanto pelos humanos como pelos outros animais. É feio, é repelente, é desastrado, é  necrófago... E citávamos alguns provérbios. crioulo-guineenses:

(i) Kal dia ku sancu fala jugude manteña si ka pa rispitu di kacur;

ou, noutra variante:

(ii) Kal dia ku sancu fala sakala manteña si i ka na disgustu di kacur

Entenda-se: o macaco só conhece ou cumprimenta o jagudi no velório do cão.

Mas também há um outro provérbio que, de certo modo, vem em defesa do jagudi:

(iii) Jugude ka bai fanadu, ma i kunsi uju... Leia-se: o jagudi não foi à circuncisão, não passou pelo ritual do fanado, mas consegue ver as coisas, ou seja, não é parvo de todo, não o tomem como tolo...

2. Continuamos a rever a nossa lista (já antiga e que nunca tinha sido  atualizada, aumentada, corrigida,  melhorada até agora...) dos cento e poucos blogues e outras páginas na Net  que faziam parte da nossa blogosfera (c. 110) (**)... 

Essa  lista constava (e continuará  a constar,   depois de revista)  na coluna estática do nosso blogue, no lado esquerdo.

Cerca de metade desses blogues e outras páginas deixaram de estar "on line".  Nalguns casos têm novos endereços. Noutros casos, pura e simplesmente desapareceram. Alguns destes  blogues e  "sítios" (ou "web pages")  felizmente foram "capturados" (podendo por isso ser recuperados) através do Arquivo.pt.

É o caso da página de 
Hildo Honório do Couto, professor de linguística  (Departamento de Lingüística, Universidade de Brasília).sobre provérbios crioulo-guineenses.

Antigo endereço: 

http://www.unb.br/il/liv/crioul/prov.htm.

Endereço no Arquivo.pt:

https://arquivo.pt/wayback/20090520131527/http://www.unb.br/il/liv/crioul/prov.htm

Era uma página que consultávamos com alguma frequência, e que vem citada várias vezes no nosso blogue. Servia também para refrescarmos os nossos elementares conhecimentos do crioulo da Guiné. A sua utilidade e o seu interesse justificam a nossa opção por recuperá-la, através do Arquivo.pt.  

Aqui o valioso trabalho, de recolha e sistematização destas pérolas da sabedoria popular guineens (irónicas umas,  corrosivas  outras,  deliciosas quase todas ) feito pelo  prof  Hildo Honório do Couto,  fica   ao alcance de todos os lusófonos . Fizemos algumas pequenas correcções (de uma ou outra gralha) e adaptações. O autor aceita e agradece os comentários  do leitor.  

Também nesta matéria (a da paremiologia, a recolha , o  estudo e a interpretação  dos provérbios populares da sua terra) contamos com a preciosa ajuda do Cherno Baldé, nosso assessor para as questões etno-linguísticas...


PROVÉRBIOS CRIOULO-GUINEENSES  

Prof Hildo Honório do Couto (Brasil)


Aqui estão 217 provérbios do crioulo português da Guiné-Bissau. Como se pode ver, alguns deles apresentam variantes, algumas apenas de escolha de determinado vocábulo, outras mais radicais. Nesse caso, apresento as variantes com a sub-numeração (i), (ii) e assim por diante. Entre parênteses, encontra-se uma tradução relativamente livre, que sempre tem por base a primeira variante (i), no caso de haver variantes.

Infelizmente, os provérbios não estão acompanhados de uma interpretação. Na verdade, para entendê-los é imprescindível saber-se que fatos culturais estão implícitos. Quem quiser embrenhar-se nesse domínio pode consultar a bibliografia apresentada mais abaixo [Vd, poste a seguir, nº 181, desta série]

Andreoletti (1984) é a maior coleção de provérbios crioulo-guineenses que já veio a lume, ou seja, 466. Ele não fornece tradução nem explicação. Parece que não foi feita uma revisão da publicação. Entretanto, tem o mérito de ser o primeiro livro inteiramente dedicado só aos provérbios guineenses.

Quanto a Biasutti (1987) , trata-se de um dicionário crioulo-português. Em apêndice ele elenca 60 provérbios, muitos deles reproduzidos de notas manuscritas de Andreoletti.

Em Bull (1989), que é falante nativo de crioulo, temos uma seção inteira dedicada aos provérbios - são 95 ao todo -, acompanhados de tradução em português e comentários bastante detalhados.

Chataigner (1963) é um artigo que faz um apanhado geral do crioulo, incluindo 77 provérbios. Este texto tem a peculiaridade de tratar da variedade do crioulo falada na região do sul do Senegal, chamada de Casamansa. É uma variedade muito mais conservadora do que a da Guiné-Bissau, sobretudo porque perdeu o contato com a língua portuguesa desde o final do século passado. Como se pode constatar, nos provérbios guineenses - e no crioulo guineense em geral - pode-se notar a influência da língua e da cultura portuguesa.

Quanto a Montenegro (1994a, 1994b), trata-se de um dos estudos mais percucientes sobre os provérbios crioulo-guineenses, sempre seguidos de ampla exemplificação. Ela mora na Guiné-Bissau há muitos anos, portanto conhece a cultura local como ninguém.

Em Couto (1996, 1998), finalmente, pode-se encontrar, além de interpretação de alguns provérbios, muitas referências bibliográficas. Inclusive comentários sobre as tarefas da paremiologia.

Espero que este pequeno inventário paremiológico guineense possa ser de interesse para algum internauta. Gostaria de ouvir seus comentários, sugestões e críticas.

Hildo Honório do Couto | Departamento de Lingüística | Universidade de Brasília | 70910-900 Brasília, DF, Brasil | e.mail: hiho@unb.br

* * * * *

LISTA DE PROVÉRBIOS - Parte I (de A a L)

NOTA: As seguintes letras têm valor especial:

N = "ng" do inglês (como em "song"); 

c = "ch" em inglês (church); 

j = também como em inglês (judge); 

ñ = como no português "nh" ou "ñ" em espanhol; 

s = "s" mesmo (saco), nunca como [z] de "casa".

A

(1) Abo i rasa goiaba: bu ka ten kabaku (=você é como a goiaba, não tem cavaco)

(2) Abo i rasa polon: si bu na kai, bu ka ta kai abo son (=você é como o poilão: se cair não cai sozinho)

(3) 

(i) Abo k' ten caga, bu ka ta sinti si ceru; 

(ii) Nunka algin ka ta fala kuma si caga na fedi (=você que tem ferida não sente o seu cheiro)

(4) Ami i lubu k' kema kosta (=eu sou a hiena que tem as costas queimadas)

(5) Ami i rasa papaia: N ka ta durmi na bariga di algin (=eu sou como o mamão: não fico parado na barriga de ninguém)

(6) Anduriña kuma i na pupu riba di kabesa di ñor deus, i ba kai riba di si kabesa (=a andorinha disse que caga na cabeça do senhor deus, mas caiu sobre sua própria cabeça)

B

(7) Baga baga i ka ten tarsadu, ma i ta korta paja (= o cupim não tem terçado, mas corta capim)

(8) 

(i) Baga baga ka ta kata iagu, ma i ta masa lama; 

(ii) Baga baga i ka ta kata iagu ma i ta masa lama (= o cupim não busca água, mas amassa o barro)

(9) Bagic ta masi ku si fortuda (= o hibisco cresce com sua sorte)

(10) 

(i) Baka ki ka ten rabu, Deus ta banal; 

(ii) Baka ku ka ten rabu Deus ku ta banal (= à vaca que não tem rabo, abana-a Deus)

(11) 

(i) Baka misti korda, i ka tenel, kabra tenel, tok i na rasta; 

(ii) Kabra ten korda tok i na rastal; baka mistil, ma i ka ta oja; 

(iii) kabra tene korda i ta rastal, baka misti i ka ta oca (= a vaca quer corda mas não a tem; a cabra a tem mas a arrasta)

(12) 

(i) Bakia baka di kunankoi; 

(ii) Bakia baka di kunankoi: sin liti, sin nata;

 (iii) Bakia baka di kunankoi sin litti nin nata (= a boeira pastoreia a vaca mas não aproveita nem o leite nem a nata)

(13) 

(i) Bardadi i suma malgeta: i ta iardi; 

(ii) Bardadi i malgos, ma i sertu (= a verdade é como a malaguete: ela arde)

(14) Bariga i ka ta kosadu ku laska di kana (= não se coça a barriga com lascas de cana)

(15) Bariga ka fila ku arus, ki-fadi miju (= barriga que não se dá bem com arroz, muito menos se dará bem com milho)

(16) Bariga pode debu o debu ma bu ka ta toma faka bu rumpil (= por pior que a barriga esteja, você não a corta com a faca)

(17) Bentana fiu na bida teña (= a carpa é feia mas vira tainha)

(18) 

(i) Bentana mora ku lagartu, si falau kuma lagartu ka ten uju, fia; 

(ii) Si bentana falau kuma lagartu fura uju, fia, pa bia elis ku ta kume lama juntu (= a carpa mora com o crocodilo: se ela lhe disser que ele não tem olho, acredite)

(19) 

(i) Bianda di kaleron ka ten dunu;

(ii) Bianda, ora ki kusidu, i ka ten dunu (= comida na panela não tem dono)

(20) Bianda sabi ka ta tarda na kabas (= comida saborosa não demora muito na panela)

(21) Bias bu ta sibi dia di bai, ma bu ka ta sibi dia di riba (=em viagem, só se sabe o dia de ir, mas não o de voltar)

(22) Bibidur di lagua ka ta dibi fabur (=quem bebe água na lagoa não deve favor a ninguém)

(23) Bibus na cora, ki-fadi mortus (=se os vivos choram, que dizer dos mortos)

(24) 

(i) Boka ficadu ka ta ientra moska;

 (ii) Na boka ficadu i ka ta ientra moska (= em boca fechada não entram moscas)

(25) Bolta di mundu i rabu di punba (=as voltas que o mundo dá são como as asas da pomba)

(26) Bon sapatu pe jingidu (= sapato bom em pé tordo)

(27)

 (i) Bu ka sibi si bu mama di bunda i gros, son ora k'i tene mandita; 

(ii) Bu ka ta sibi si bu mama di bunda gros, son ora ki tene mandita (= você não sabe se sua bunda é grande, a não ser quando ela tem furúnculo)

(28) Bu kunbidadu sala, bu ientra kuartu (= você é convidado para sala, você entra no quarto)

(29) Bu na duguña fundu, bu ka punta bentu (= você debulha muito sem perguntar ao vento)

(30) Bu na kuji manpatas, bu ka na jubi riba (= você apanha está colhendo mampatás sem olhar para cima)

(31) Bu na toka bu na baja (= você toca, você dança)

(32) Bunitasku di iagu salgadu i bunitu, ma i kansadu bibi (= a beleza da água salgada é grande, mas ela é desagradável para beber)

(33) Bu osa nomi suma lubu (= você desafia a sorte como a hiena)

(34)

 (i) Bu purba liti, bu pidi baka;

 (ii) Garandis kuma bu purba liti, bu pidi baka (= você provou o leite, você pediu a vaca)

(35) Burguñu i ma morti (=a vergonha é pior do que a morte)

(36) Buru tudu karga ki karga si ka sutadu i ka ta janti (= o burro, com pouca ou muita carga, se não é açoitado não anda)

(37)

(i) Bu sai na pilon, bu kai na balai; 

(ii) I sai na pilon, i kai na balen (= você saiu do pilão, caiu no balaio)

(38) Bu sinta riba di baga-baga, bu na rui con (= você está sentado sobre a termiteira, e fala mal do chão)

(39) Bu ten kujer, bu na kume ku mon (= você tem colher, mas come com a mão)

C

(40) 

(i) Cuba cobi i oca kamiñu lalu; 

(ii) Cuba tarda, oca kamiñu lalu; 

(iii) Cuba tarda oca kamiñu latu (= a chuva cai quando a estrada está molhada)

(41)

 (i) Cuba di Kabu Berdi, son di un banda; 

(ii) Anta, es cuba di Kabu Verdi? (= chuva de Cabo Verde, só em um lugar)

D

(42) Deus fala: pui mon, N judau (= Deus disse: faça sua parte que eu lhe ajudo)

(43) Deus ka ta sinta na rabada di ningin (= Deus não senta no traseiro de ninguém)

(44) Deus sibi ke k' manda iagu di mar salga (= Deus sabe porque a água do mar é salgada)

(45) Di li pa pó sinti, kabaku prumedu ku ta sinti (= para o tronco sentir, primeiro a casca tem que sentir)

(46) Dinti mora ku lingu, ma i ta daju i murdil (= os dentes moram com a língua, mas às vezes eles a mordem)

(47) 

(i) Dinti, tudu branku ki branku, i ka ta sai sangi;  

(ii) Garandis kuma dinti ka ten sangi (= os dentes, por mais brancos que sejam, não sangram)

(48)

 (i) Dun di boka i ka ta pirdi si kamiñu;

 (ii) Dun di boka ta tene pe; (iii) Dun di boka ka ta pirdi ku kamiñu (= quem tem boca não se perde no caminho)

(49) 

(i) Dun di boka mas di ke dun di fraskera; 

(ii) Dun du boka, mas dun du fraskera (= quem tem boca vale mais do que quem tem a carteira)

(50) Dun di kujer na kume ku mon (= tem colher, come com a mão)

(51) Dun di un uju ka ta brinka ku reia (= quem tem olho não brinca com areia)

(52) 

(i) Dun du caga ka ta sinti fedos di si pe; 

(ii) Dun di mal ka ta obi si mal (= quem tem chulé não sente o cheiro do próprio pé)

(53) Dus galu ka ta kanta na un kapuera (= dois galos não cantam no mesmo terreiro)

E

(54) E fila suma gatu ku kacur (= eles se dão como gato e cachorro)

F

(55) 

(i) Faka di atorna ka ta moku, i ta moladu;

 (ii) Faka di atorna nunka i ka ta moku;

 (iii) Faka di atorna ka ta moku (= a faca da vingança não está sem corte, está afiada)

(56) 

(i) Fala di magru ka ta ciga na tabanka; (ii) Palabra di magru ka ta obidu na kau di fola baka;  (iii) Kunbersa di magru ka ta obidu na kau di f ola baka (= palavra de magro não é ouvida no lugar de esfolar vaca)

(57) Falta di mame, bu ta mama dona (= na falta de mãe, mama-se na avó)

(58) Febri medi katar (= a febre tem medo do catarro)

(59) 

(i) Fiansa ta kebra kujer di prata;  (ii) Fiansa ta kebra kujer di po (= confiança excessiva pode quebrar colher de prata)

(60) Fiju di gatu ta raña (= filho de gato arranha)

(61) Fiju di sinsibi ka ta maradu di kampaiña (= filho de se-eu-soubesse não traz amarrada em si a campainha)

(62) 

(i) Fiju ta padidu tras di si pape, ma i ka tras di si mame; 

(ii) Fiju ka ta padidu tra di si mame (= filho pode nascer longe do pai, mas não longe da mãe)

(63) Filanta ma panga uju (= combinar antes vale mais que que um piscar de olho)

(64) Firminga ka ta janti, ma i ta ciga (= a formiga não toma a dianteira, mas ela chega)

(65) Forsa di pis, iagu (= a força do peixe é a água)

(66) 

(i) Fulanu ten boka di sanbasuga: i ta murdi, i ta supra; 

(ii) Fulanu i tene boka di sanbasuga, i ta murdi i ta supra; 

(iii) Sanbasuga i ten dus boka, ma i ka ta murdi si kabesa (= ele tem boca de sangue-suga: ele morde, ele sopra)

G

(67) Galiña garbatadur ta fas di kontra ku os di si mame o di si dona (= galinha esgaravatadora pode encontrar osso de sua mãe ou de sua avó)

(68) 

(i) Galiña kargadu ka sibi si kamiñu i lunju; 

(ii) Galiña ka konse si kamiñu lonji; 

(iii) Galiña pindradu ka ta sibi si kamiñu lunju (= galinha carregada não sabe se o caminho é longo)

(69) Galiña ta guarda si frangas bas di si asa, ma kil ku sta fora mañote ta rabatal (= a galinha proteje seus pintinhos debaixo das asas; aquele que escapa o milhafre o arrebata)

(70) 

(i) Garafa ka ta juntu na jugu di pedra; 

(ii) Garafa ka ta ientra na jugu di pedra; 

(iii) Garafa ka dibi di miti na jugu di pedra; 

(iv) Kin k' miti garafa na jugu di pedra, si ka kebra ki ba buska; 

(v) Ku mati garafa na jugu di pedra, si ka kebra ki misti? (= garrafa não se mete em jogo de pedras)

(71) 

(i) Garandi i polon, ma mancadu ta durbal; 

(ii) Polon podi grandi-o-grandi, ma macadu podi durbal; 

(iii) Polon tudu garandi ki garandi, mancadu ta durbal (= o poilão é grande, mas o machado o derruba)

(72) Garandi i puti di mesiñu (= o ancião é um pote de remédios)

(73) 

(i) Garandi ki jungutu, ta ma oja lunju di ke mininu ki sikidu;

 (ii) Beju ki jokoni ta ma uja lonji di ke mininu ki sikidu (= um ancião acocorado vê mais longe do que um menino em pé)

(74) Garandi ku firma ka pasa mandadu; (ii) Garandi en pe ka pasa mandadu (= ancião em pé pode ser incomodado)

(75) 

(i) Garandis fala kuma: joia ku bu kuji na kau di baju, na kau di baju ki ta bin pirdi; 

(ii) Garandis fala kuma joia ku bu kuji na kau di baju, na kau di baju ki na bin pirdi (= os anciãos dizem que o que se ganha na festa, na festa se perde)

(76) 

(i) Garandis fala kuma manganas si ka hululidu i ka ta padi; 

(ii) Manganas si bu ka uli-ulil, i ka ta padi; 

(iii) Manganasa, si bu ka uli-ulil bunda i ka ta padi; 

(iv) Garandis fala kuma manganasa si ka ululidu i ka ta padi (= o manganás, se não chamuscado, não dá frutos)

(77) 

(i) Garandis fala kuma sen mantanpadas i ka sabi tama, ma i sabi konta; 

(ii) Sen mantanpada i ka sabi tama, ma i sabi konta (= os anciãos dizem que cem chibatadas não são agradáveis de tomar, mas de contar)

(78) 

(i) Garandis kuma kasa linpu ka ta somuna; 

(ii) Kasa linpu ka ta somna (= os anciãos dizem que em casa vazia não há barulho)

(79) 

(i) Garandis kuma kanua sin remu ka ta kanba mar; 

(ii) Kanua sin remu ka ta kamba mar (= os anciãos dizem que canoa sem remo não atravessa o mar)

(80) Gatu fartu ka ta montia (= gato farto não caça)

I

(81) 

(i) I ka ten sabi ku ka ta kaba;

 (ii) Puti di mel, i na sabi o sabi, mas i ta ten dia ki ta kaba (= não existe nada agradável que não acabe)

(82) I sabi moska, ki-fadi bagera (= isso agrada a mosca, que dizer da abelha)

(83) I sancu di dus matu (= é macaco de dois matos)

J

(84) Jisilin ka ta kema ku beja dus bias (= o gergelim não queima com vela duas vezes)

(85) 

(i) Jugude ka bai fanadu, ma i kunsi uju; 

(ii) Jugude ka bai fanadu, ma i kunsi uju (= o abutre não foi à circuncisão, mas consegue ver as coisas)

(86) Jungutudu ka ta pui na ragas (= o acocorado não carrega nada no colo)

(87) Justu di bai cur, ka ciga karga don (= só ir ao velório não implica em chorar)

K

(88) 

(i) Kabra nunka i ka ta misa dianti di lubu; 

(ii) Kabra ka ta misa dianti di lubu (= ba cabra nunca mija perto da hiena)

(89) Kabra rispitadu pa bia di si barba (= o cabrito é respeitado por causa de sua barba)

(90)

 (i) Kabra tene barba, ma baka ki si garandi; 

(ii) Kabra tene barba, ma baka ki si pape (= o cabrito tem barba, mas a vaca é sua anciã)

(91) 

(i) Kacur di mangu kuma pa kada kin sibi di si kabesa; 

(ii) Kacur di mangu konta kuma kada kin sibi di si kabesa (= o mangusto diz que cada um sabe de si)

(92)

 (i) Kacur endadur os o pankada; 

(ii) Kacur iandadur, os o pankada (= cachorro vadio encontra osso ou pauladas)

(93) Kacur ka ta tene kacur (= cachorro não tem cachorro)

(94) 

(i) Kacur, tudu brabu ki brabu, nunka i ka murdi si dunu ku ta dal di kume; 

(ii) Kacur, tudu brabu ki brabu, nunka i ka murdi si dunu (= o cachorro, por mais feroz que seja nunca morde quem lhe dá comida)

(95) Kal dia ku galiña di matu pistadu po di dismanca kabelu (= quando é que se emprestou o pau de arrumar o cabelo à pintada)

(96) Kal dia ku galiña di matu sinta na kapuera (= quando é que a pintada ficou no mato)

(97) 

(i) Kal dia ku lubu Ntergadu fumer;

 (ii) Jintis kuma kal dia ku lubu Ntergadu fumer (= quando é que se entregou o fumeiro à hiena)

(98) 

(i) Kal dia ku paja juntadu ku fugu si ka kema ki misti;

 (ii) Kal dia du paja i juntadu ku fugu si i ka kema ki misti (= quando é que se junta palha com fogo que não seja para queimar)

(99)

 (i) Kal dia ku sancu fala jugude manteña si ka pa rispitu di kacur; 

(ii) Kal dia ku sancu fala Sakala manteña si i ka na disgustu di kacur (= quando é que o macaco cumprimenta o abutre a não ser no velório do cachorro)

(100) 

(i) Kama ku bu ka dita nel, bu ka sibi si ten dabi; 

(ii) Dun du kama ki konse si dabi (= você não pode saber que a cama em que não deitou tem percevejos)

(101) Kamalion kuma janti i ka nada, ciga ki tudu (= o camaleão diz que andar depressa não importa, o importante é chegar)

(102) 

(i) Kana seku i ka ta dobradu; 

(ii) kana seku ka ta dobra (= cana seca não se dobra)

(103) Karna di buru ta kumedu na tenpu di coba, di fugalgu na tenpu di seku (= carne de burro se come na estação, a de animal nobre na seca)

(104) Karu beju lestu dana (= carro velho estraga depressa)

(105) Kasa beju ka ta falta barata (= em casa velha não faltam baratas)

(106) Kasamentu ta kaba, ma kuñadadia ka ta kaba (= o casamento pode acabar, mas os laços familiares não)

(107) Kaska fison ka ta kontra ku uña kunpridu (= descascar feijão não combina com unhas grandes)

(108) Kau k'i kosau bu ta kosal; ma kau k'i ka kosau, ka bu kosal, pa bia, si bu kosal, i ta fola (= coce onde há coceira, onde não há coceira não coce, do contrário esfola)

(109) Ken ki basau iagu, son bu ferga kurpu pa i linpu (= se o puserem na água, você tem que esfregar o corpo para que fique limpo)

(110) Ken ki ka ta coranta si fiju, amaña si fiju ta corantal (= quem não faz seu filho chorar, fa-lo-á chorar seu filho)

(111) Ken ki ma bu leña, ta ma bu sinsa (= quem é mais lenha do que você é também mais cinza)

(112) Kil ku urdumuñu tisi na bu mon, bentu ku na bin lebal (= o que a tempestade lhe trouxe o vento levará)

(113) 

(i) Kin ku mata, i ta kabanta fola; 

(ii) Si bu misti forel, para balei (= quem mata, deve esfolar)

(114) 

(i) Kin ku misti forel, i ta para balen; 

(ii) Kin ku misti forel, ta para balei (= quem quer farelo apresente o balaio)

(115) 

(i) Kin ku misti pis, i ta ba moja rabada na iagu; 

(ii) Si bu misti pis, bu ten ku moja rabada (= quem quer peixe tem que molhar o traseiro na água)

(116) 

(i) Kin ku ta durmi ka ta paña pis; 

(ii) Kin ku ta durmi i ka ta paña pis (= quem dorme não apanha peixe)

(117) 

(i) Kin ku ta labra kifri, el prumeru ku ta fidi; 

(ii) Kin ku ta labra kifri, el prumeru ku ta fidi (= quem lavra o chifre é o primeiro a se ferir)

(118) Kin ku ten kabelu na pe, i ka ta kanba fugu (= quem tem pelo nas pernas não deve atravessar o fogo)

(119) Kobra kuma riba tras ka ta kebra kosta (= a cobra diz que dobrar-se para trás não quebra as costas)

(120) Kombe kuma i medi iagu salgadu ma la ki ta mora nel (= o combé diz que tem medo de água salgada, mas é nela que mora)

(121) 

(i) Kon kuma lebsimenti na rosta ki sta; 

(ii) Kon kuma lepsimentu i na uju; 

(iii) Kon kuma lebsimentu na uju ki sta nel (= o macaco-cão diz que a ofensa está no rosto)

(122) Konsiju di beja i misiñu (= conselho de anciã é remédio)

(123) Korda ta kansa kabra, ma i ka ta matal (= a corda cansa a cabra, mas não a mata)

(124) 

(i) Kunpra saniñu na koba; 

(ii) N ka ta kunpra saniñu na koba (= comprar saninho na toca)

(125) 

(i) Kuri ku kosa juju ka ta ndianta; 

(ii) Kuri ku kosa juju ka ta fila; 

(iii) Kore ku konsa juju, ka pode njenta (= correr e coçar o joelho não é possível)

(126) Kusa ki mankañ kuda, tarda ki lingron sibil (= o que faz o mancanha conhece-o há muito o lingueirão)

L

(127) Lagartisa ta bibi ku galiña (= a lagartixa bebe água da galinha)

(128) Lagartu ka ta sinadu murguja (= não se ensina o crocodilo a mergulhar)

(129) 

(i) Lanca fundiadu ka ta gaña freti; 

(ii) Lanca fundiadu ka ta gaña freti (= barco fundeado não ganha frete)

(130) 

(i) Lifanti ka pirgisa ku si dinti; 

(ii) Lifanti ka ta prgisa ku si dinti (= o elefante não se cansa com seu dente)

(131) Lifanti ka ta sinti si tuada (= o elefante não sente o próprio barulho)

(132) 

(i) Lifanti ki nguli kuku, i pa bia i fiansa na si bunda;

(ii) Lifanti ki nguli kuku, i fiensa na si kadera; 

(iii) Si bu oja lifanti na Nguli kuku di sibi, bu ta sibi kuma i fiansa na si trasera (= o elefante engole coco porque confia em seu cu)

(133) Lifanti si na jubi tapada, te i ka entra, i pa bia i ka tene parenti dentru (= se o elefante vê uma cerca e não entra é porque não tem ninguém seu lá dentro)

(134) Lobu ki kema kosta, di sol ki sebedu (= a hiena que tem as costas queimada, é dela que se fala)

(135) Lubu kuma i ka son kusa sabi ki ta incisi bariga (= a hiena diz que não é só o que é saboroso que enche a barriga)

(136) Lubu kuma si sol mansi di repenti, i ka el son ku ta burguñu (= a hiena diz que se amanhecer de repente não é só ele que passará vergonha)

(137) Lubu nin ki bu negal, ka bu dal paja di bobra (= não dê folha de abóbora à hiena mesmo que não gostes dela)

(138) Lutu di mar ka ciga kuspi mon (= luta no mar não exige cuspir na mão)

 (Continua)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23775: Fauna e flora (21): "Ó Falcão, o Jagudi não vai ao fanado, mas olha que não é parvo de todo!"... Uma "fabulosa fábula" guineense sobre o último dos últimos, o que ri melhor...

(**) Último poste da série > 25 de fevereiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24095: Blogues da nossa blogosfera (179): "Reserva Naval", criado e mantido pelo nosso camarada Manuel Lema Santos, chega ao fim... por razões pessoais e familiares do autor (mas também, em parte, pelo cansaço bloguístico e pela ingratidão das nossas instituições e associações)