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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15767: Agenda cultural (465): Encarceramento colonial no século 20: uma abordagem comparativa no 80º aniversário do campo do Tarrafal (Cabo Verde) | Conferência Internacional, Museu do Aljube, Lisboa, 21-22-23 Julho 2016: chamada de comunicações até 28/2/2016



Encarceramento colonial no século 20: uma abordagem comparativa no 80º aniversário do campo do Tarrafal (Cabo Verde) > Conferência Internacional, Museu do Aljube, Lisboa, 21-22-23 Julho 2016


1. Mensagem de ontem, de Helena Pinto Janeiro

Caro Luís Graça

Após a muito proveitosa troca de ideias sobre o campo prisional da Ilha das Galinhas (*), volto ao contacto consigo para pedir a preciosa ajuda do seu blog para a divulgação desta chamada para comunicações junto de colegas que tenham investigações em curso ou estejam interessados em desenvolver investigação sobre prisões e prisioneiros políticos nos impérios britânico, francês, holandês, belga, alemão e português, no século 20.

São especialmente bem-vindos olhares transversais e transnacionais sobre o encarceramento político em situação colonial. 

As propostas de comunicações podem ser enviadas, em português ou em inglês, até 28 de Fevereiro de 2016.(**)

Muito obrigada!


Campo de São Nicolau, Angola, maio de 1974 (Foto do Arquivo Nacional da Torre do Tombo)



2. Apresentação [, com a devida vénia...]

Em inglês / English version

A historiografia sobre o encarceramento colonial no período do colonialismo europeu moderno, de finais do século 19 até às independências do século 20, tem manifestado uma vitalidade assinalável nos últimos anos, com uma explosão de estudos empíricos e novas abordagens teóricas. Um dos casos mais estudados é o da África do Sul, onde se criaram os primeiros campos de detenção de prisoneiros políticos no seguimento da guerra Anglo-Boer. A investigação sobre outros contextos coloniais europeus no império britânico, francês, holandês, belga e Italiano também revelou a utilização frequente de campos em África e Ásia para o encarceramento de membros da oposição política perseguidos em contextos metropolitanos e coloniais.

No caso do III Império Português, o encarceramento de opositores é geralmente identificado com a Ditadura Militar e o Estado Novo, que criou campos especiais de detenção para este efeito nas colónias de então. O campo de prisioneiros do Tarrafal na Ilha cabo-verdiana de Santiago é o caso mais notório, denunciado internacionalmente como o primeiro campo de concentração português. Pese embora os africanos que também aí estiveram detidos já em plena guerra colonial, é a sua ligação à política metropolitana que lhe tem conferido um maior peso simbólico e visibilidade. Se alargarmos o foco a todo o império, verificamos que, exceptuando alguns estudos recentes, a história dos campos coloniais portugueses de detenção política no século XX se encontra ainda largamente por explorar. A historiografia crescente do encarceramento colonial tem-se sobretudo focado outros impérios europeus em África e Ásia.

O Instituto de História Contemporânea (Universidade NOVA de Lisboa) e o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade pretendem marcar o 80º aniversário da abertura do campo do Tarrafal em Cabo Verde através da organização de uma conferência sobre o encarceramento político em colónias europeias durante o século XX. São bem-vindas propostas com investigações em curso sobre prisões e prisioneiros políticos nos impérios britânico, francês, holandês, belga, alemão e português, bem como olhares transversais e transnacionais sobre o encarceramento político em situação colonial. Uma selecção das comunicações apresentadas será incluída num número especial de uma revista internacional de revisão por pares.


Campo do Tarrafal, Ilha de Santiago, Cabo Verde, s/d  (Foto de José Gabriel L. de Magalhães,  Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Sobre o Tarrafal temos doze referências no nosso blogue.
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

16 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14370: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (26): Letra (em crioulo e português) e vídeo da canção "Djiu di Galinha", de José Carlos Schwarz (Helena Pinto Janeiro / António Estácio)

16 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14374: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (27): Ainda sobre o cantor José Carlos Schwarz (Bissau, 1949 - Havana, 1977) e a letra da canção "Djiu di Galinha" [, Ilha das Galinhas] (Helena Pinto Janeiro, historiadora)

(**)  Último poste da série > 12 de fevereiro de 2016 >  Guiné 63/74 - P15740: Agenda cultural (464): Lançamento, em Paris, no Museu de Arte e História do Judaísmo (MAHJ), dia 18, 5ª feira, da edição francesa do livro de Samuel Schwarz (1880-1963), "Os cristãos-novos em Portugal no séc. XX" (1ª ed, 1925) (João Schwarz)

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13372: Notas de leitura (609): "Às 5 da tarde", por António Loja; Âncora Editora, 2013 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Janeiro de 2014:

Queridos amigos,
O antigo capitão de Mejo ali bem ao pé do corredor de Guileje, autor de uma obra ímpar. As Ausências de Deus, recua até à Guerra Civil de Espanha. Deliberadamente ou não, socorre-se de uma escrita enxuta, uma envolvente emocional sóbria, e dá-nos um fulgurante retrato que tem como pano de fundo os alvores do conflito fratricida até ao triunfo nacionalista. O herói, como numa tragédia grega, toma posição no arrastar dos acontecimentos, vai de condenação em condenação, e assim chegará ao Tarrafal, um campo de concentração com que o salazarismo nos brindou.

Um abraço do
Mário


Às 5 da tarde, por António Loja

Beja Santos

O escritor António Loja volta aos temas da guerra. Se As Ausências de Deus (Âncora Editora, 2013) espelham as suas memórias como comandante de uma companhia num dos teatros de operações mais ásperos da Guiné, “Às 5 da tarde” impele-nos diretamente para a guerra civil de Espanha, desde as primícias até à derrocada republicana, em 1939 (O Liberal, 2013, email: comercial@oliberal.pt). Um poema icónico de Federico Garcia Lorca, “Llanto por Ignacio Sanchez Mejias” onde, recorrentemente, quase como um metrónomo, se escreve “A las cinco de la tarde. Eran las cinco en punto de la tarde”, serve de moldura para os acontecimentos da trama.

Em 1957, na Escola Prática de Infantaria, Carlos Magalhães faz amizade com Pedro Fonseca. Este vem do Norte, é minhoto, recorda saudosamente o seu tio António que combateu ao lado dos anarquistas numa brigada internacional na Guerra Civil de Espanha. Este tio António fora para Madrid, em 1935, pretendia fazer uma investigação sobre quem eram os rebeldes madrilenos fuzilados em 3 de maio de 1808 e imortalizados no quadro de Goya, com o mesmo título. Palavra puxa palavra, Pedro informa Carlos que em Madrid o tio António conhecera no Museu do Prado uma outra estudante de Goya, Clara, também portuguesa. Vários enigmas rodeiam a morte do tio António, em 1944. E veio à baila que na casa da aldeia havia umas caixas com papéis que pertenciam ao tio António. Os dois acordam em ir mexer no passado. E nas férias de Natal de 1957 rumam para Covas, no alto de Vila Nova de Cerveira.

Iniciam investigação, a primeira tarefa foi reunir o material encontrado e datá-lo. Descobriu-se um maço de cartas que parecia ser um diário, três cadernos de capa preta cuidadosamente manuscritos e datados a partir de outubro de 1935. E o leitor mergulha no diário de António Tomás, a viagem de Entroncamento para Madrid, a primeira visita ao Prado, o encontro ofuscante com a obra-prima “Os Fuzilamentos de 3 de Maio”. Sente-se altamente perturbado e justifica-se: “No quadro de Goya o realismo retratava a cruel violência sempre presente através dos séculos nas relações entre os homens. Perante os seus olhos, os soldados apontavam as armas aos lutadores da Liberdade violentados pela brutalidade dos invasores. Covardemente disfarçados nos seus uniformes, os soldados chacinavam sem piedade os miseráveis que emergiam, vindos de uma prisão-catacumba que se mostrava à superfície apenas como uma abertura negra rasgada no ventre da terra. Como pano de fundo, a imagem trágica da indiferença e da frieza: uma cidade entrevista apenas em silhueta, que aceitava passivamente a violência e a crueldade”.

As investigações não levam a nenhuma resposta, a documentação da época aparecia rasurada, as provas comprometedoras tinham sido destruídas. Dá-se o encontro com Clara Noronha, estudante de arte. A relação estreita-se. No início de 1936 visitam Aranjuez e amam-se. Madrid fervilha, perfila-se no horizonte uma cruzada dos nacionalistas contra socialistas, comunistas e anarquistas. A PVDE, a antecessora da PIDE, desconfia das razões da presença de António em Espanha, a família pede-lhe para voltar. António decide ficar, pretende alcançar Barcelona, uma rede de anarquistas amigos prepara-lhe um itinerário dissuasor. A guerra civil entra em cheio na trama do romance. António assiste a fuzilamentos na Andaluzia. A complexidade da trama cresce, Pedro e Carlos vão visitar Clara a Vilar de Monforte, Clara entrega-lhes mais um maço de cartas, as cartas que António passa a escrever nessa deambulação, autêntica fuga à PVDE e aos nacionalistas, os documentos concatenam-se, a viagem prossegue de Algeciras para Málaga onde António assiste ao rescalde de um bombardeamento aéreo, prossegue para Valência, e em Barcelona alista-se nas brigadas, começam, diante dos seus olhos, as disputas brutais entre comunistas e trotskistas.

Um ortodoxo soviético pretende catequizá-lo, António rejeita o fanatismo e marcha para a Frente do Ebro, estamos em 1937, entremeiam-se os relatos do diário e o desenvolvimento dos acontecimentos, os recontros, as cidades destruídas, a selvajaria dos assassinatos, António regressa a Madrid, escreve lancinantes cartas de amor e depois volta para Barcelona, já não tem ilusões, os grupos republicanos estão totalmente desentendidos, os nacionalistas possuem toda a classe de apoios, avançam imparavelmente. António atravessa os Pirenéus e refugia-se em França. E vem a guerra, as tropas de Hitler atravessam fulminantemente a França, depois de muitas peripécias António chega a Vilar de Monforte, traz indícios de tuberculose, é preso e envido para o Tarrafal. Estamos em 1942, a descrição do campo de concentração é, por si só, um libelo acusador do humanismo salazarista: alimentação indígena, condições de higiene abomináveis, o castigo da “frigideira”, onde são postos os presos punidos com isolamento. O médico do Tarrafal adverte que António é uma ameaça com a sua tuberculose, regressa e é conduzido a um sanatório no Caramulo. Os amantes reencontram-se, fazem planos, o afeto parece fazer ultrapassar todas as inquietações. E chega o desfecho fatal. Numa cadeira junto à cama, hirta, aparentemente ausente, lágrimas correndo silenciosamente pela face. Clara murmura como se fosse um autómato:
A las cinco de la tarde.
Eran las cinco en punto de la tarde.

E, depois de um breve silêncio:
Lo demás era muerte y solo muerte
A las cinco de la tarde.

O que há de profundamente tocante nesta incursão de António Loja pela Guerra Civil de Espanha é o seu tom de escritura em tempo antigo, cadenciado, uma mescla de arrebatamento entre aqueles dois seres humanos e a explosão sanguinolenta do conflito fratricida. É uma prosa cadenciada, bem mesurada, tornando plausíveis aquele diário, aquelas cartas. Os dois cadetes de Mafra, daquele ano de 1957, são um mero pretexto para a intermediação daquele enigma de uma paixão e de um compromisso com a solidariedade política. Num tempo em que o romance histórico arrebata as atenções dos leitores, tem-se aqui uma excelente oportunidade para descer aos infernos da Guerra Civil de Espanha, revisitar a insânia do fascismo, a truculência dos conflitos na esquerda e ver o funcionamento do campo de concentração do Tarrafal. O mote está dado: os fuzilamentos pintados por Goya fascinam e arrepiam. E alertam para a possibilidade da sua repetição.
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13364: Notas de leitura (608): "África" - Literatura-Arte e Cultura - Os Djumbai (Mário Beja Santos)

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Guiné 63/74 - P12383: Memória dos lugares (257): Ilha das Galinhas em 1968 (José António Viegas)

Guiné- Bissau > Região de Bolama > Ilha das Galinhas >  "Galinhas é a ilha mais a nordeste do Arquipélago dos Bijagós, Guiné-Bissau, com 50 km2 de área e uma população estimada de 1 500 habitantes. Está situada a sudoeste da Ilha de Bolama, da qual está separada por um canal com 4,5 km de largura,e a cerca de 60 km a sudoeste de Bissau, a capital da Guiné-Bissau. Os principais povoados da ilha são Ambancana, Ametite, Acampamento, Ancano e Anchorupe. Durante o período colonial funcionou na ilha uma prisão, designada por "Colónia Penal e Agrícola da Ilha das Galinhas", entretanto abandonada."

Fonte:  Wikipédia > Galinhas (Guiné-Bissau) (Reprodução, com a devida vénia). Inagem do domínio público, editada.

1. Mensagem do nosso camarada José António Viegas (ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54, Guiné, 1966/68), com data de 29 de Novembro de 2013:

A minha passagem pela Ilha das Galinhas ou mais correctamente Colónia Penal e Agrícola da Ilha das Galinhas.


Ao fim de 20 meses de mato fui enviado para Bolama e daí para a Ilha das Galinhas. Desconhecia por completo o que aquilo era, quando cheguei em meados de Junho de 1968.

O destacamento era composto por um Furriel, um cabo e 3 soldados.
Na parte civil e a comandar o campo tinha um chefe que era o Chefe Joaquim,  um homem de poucas conversas.


De vez enquanto encostava uma lancha LDP com um carregamento de prisioneiros, sempre em mau estado,  que vinham das prisões de Bissau, escoltado sempre por dois Pides, que entregavam os presos ao chefe e desandavam para Bissau.

Os prisioneiros andavam pela ilha soltos, mas soube que alguns passavam por ali em trânsito para o Tarrafal [, Ilha de Santigao, Cabo Verde].


Na altura não me despertava muito a curiosidade e as conversas com os prisioneiros eram poucas, a maioria trabalhava na bolanha e nas sementeiras de ananás e mancarra que havia pelo campo.

O povo Bijagó era muito afável. Passei quatro meses e acabei a minha comissão em Setembro de 68 com 25 meses de Guiné.











Guiné > Arquipélagos dos Bijagós > Ilha das Galinhas > Junho/setembro de 1968. Fotos de José António Viegas, sem legenda.

Fotos: © José António Viegas (2013). Todos os direitos reservados
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Nota do editor

Último poste da série de 20 DE NOVEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12318: Memória dos lugares (255): Missirá, Zacarias Saiegh e Jobo Baldé em 1968 (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 9 de março de 2012

Guiné 63/74 - P9587: Contraponto (Alberto Branquinho) (43): Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos Depois

1. Em mensagem do dia 8 de Março de 2012, o nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos mais um "Contraponto", desta feita uma crítica à Exposição sobre a Guerra Colonial levada a efeito pela SPA.

CONTRAPONTO (43)

“GUERRA COLONIAL – TARRAFAL 50 ANOS DEPOIS”

Aconselho uma visita à exposição acima indicada (v. POST 9573* de 7 de Março de 2012) – Sociedade Portuguesa de Autores – Rua Gonçalves Crespo, 62 – Lisboa.
Poderão verificar como se podem “enlatar” 13 – anos de guerra colonial – 13, factos e protagonistas, no espaço de duas paredes mais três terços de parede de uma sala pequena.

Mas, onde a exposição é minimalista (até porque foi montada na e pela SPA) é na mostra da produção literária sobre a guerra colonial e… seus arredores. Para além dos “costumes”… diz nada.

Nada mostra da qualidade e da coragem que houve em publicar e desconhece em absoluto o que foi publicado nos últimos dez/doze anos. Será que a razão está no facto de os autores não serem sócios da SPA?

A mostra de livros está em quatro pequenas vitrinas, no meio da sala (quarenta livros?) e nada mais.
Uma nota simpática – está lá o livro “Vindimas no Capim” do José Brás.
Bastava terem-se socorrido das listagens existentes em “sites” e “blogues” e terem ajuizado da sua qualidade.

Alberto Branquinho
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9573: Agenda Cultural (187): Inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois - CONVITE

Vd. último poste da série de 7 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9575: Contraponto (Alberto Branquinho) (42): Às voltas com Gandembel

quarta-feira, 7 de março de 2012

Guiné 63/74 - P9573: Agenda Cultural (187): Inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois - CONVITE

CONVITE


A SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES, enviou-nos o seguinte convite:

A SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES convida V. Exa. para a inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois.


8 de Março de 2012 às 18h00

ENTRADA LIVRE



A exposição estará patente entre Março e Abril de 2012.

Horário: 

De segunda a sexta-feira, das 08h30 às 19h00
Contamos com a V/presença

Atentamente,

Sala Carlos Paredes
Rua Gonçalves Crespo, 62– Lisboa
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Nota de MR:


Vd. último poste da série em:

15 DE FEVEREIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9490: Agenda Cultural (186): Exposição de fotografia do nosso camarada Renato Monteiro: Megastore Colorfoto, Av da Igreja, 30, D/E, Lisboa, até meados de Março de 2012

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8178: Controvérsias (120): Spínola, Amílcar Cabral, o Tarrafal, o golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, os guineenses e os caboverdianos, nós e o blogue (Torcato Mendonça / Pepito)





Fotograma do documentário, produzido e realizado por Diana Andringa, em 2009, Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, que foi exibido pela primeira vez em televisão, ontem, na RTP1, às 23h00. Um dos ex-presos, caboverdiano, entrevistado (em 2009), comentando a notícia do assassinato de Amílcar Cabral, em 20 de Janeiro de 1973. Qual o eventual papel dos tarrafalistas, guineenses, libertados no  tempo do Gen Spíonla, na organização e execução do assassinato de Amílcar Cabral ? O documentário de Diana Andringa, baseado em entrevistas com antigos presos do Tarrafal (1 português, e cerca de 30 guineenses, angolanos e caboverdianos),  não aborda  explicitamente esta melindrosa questão. (LG)





1. Texto organizado com base num comentário de Torcato Mendonça ao Poste P8165, originando por sua vez um comentário do seu autor, o nosso amigo Pepito:



(i) Torcato Mendonça [, foto
a esquerda, tirada no Fundão em 27 de Janeiro de 2007] 
, em comentário de 25 do corrente, ao poste P8165:



Caro Carlos Schwarz:


Actualmente tenho dificuldades de comunicação. Consegui ler o P8165. De facto, este Blogue do Luís Graça [& Camaradas da Guiné] tem contribuído muito para se falar e debater a "guerra da Guiné". Com um senão: quem aqui escreve, na quase totalidade, são ex-combatentes portugueses (incluo os guineenses que combateram com a farda de meu País). 


O PAIGC pouco ou nada diz. O Simpósio foi importante. Uma ilha a pender para um lado...?? Não cabe aqui debatê-lo nem a questão da  "guerra  perdida" e isso o Marechal Spínola sabia, disse-o e tentou inverter o curso normal da história das ditas potências coloniais.


O assassinato de A. Cabral deve ser procurado dentro do PAIGC,não ? Como o esclarecimento das divergências entre guineenses e caboverdianos.


A Op Mar Verde é um caso a estudar, como outros,  e daria excelente debates.


Boa Sorte para a AD. Abraço Torcato



2. Resposta, não publicada, do Pepito [, foto à direita],no mesmo dia:


Caro Torcato:


Concordo consigo quando diz que o assassinato de Amilcar Cabral deve ser procurado (acrescento eu, também) dentro do PAIGC. Estou à vontade para o dizer, pois defendi sempre que o golpe de 14 de Novembro [de 1980]  foi o golpe conseguido que falhou no assassinato de Cabral.


Talvez por minha ignorância militar, mas não conheço nenhuma vitória militar de Spínola. A única vitória, que não lhe nego, é política: ter apostado forte e conseguido maximizar o ponto mais forte e mais fraco do PAIGC, a unidade entre guineenses e caboverdianos. Foi aí, nessa luta,  que ele ganhou, que ele minou o PAIGC, infiltrou os seus agentes, dividiu,  organizou o assassinato de Amílcar Cabral.


Sou o primeiro a reconhecer que foram "militantes" do PAIGC que mataram Cabral, mas quem o mandou matar e organizou a sua entrada,  a partir do Tarrafal, isso poderia ter sido esclarecido se os dossiers da PIDE referentes ao Spínola não tivessem sido mandados retirar da António Maria Cardoso [, sede da polícia política até ao 25 de Abril]. 



Mais. Muito do que ainda hoje estamos a viver na Guiné-Bissau tem as suas raízes profundas no assassinato de Amilcar Cabral. O que me espanta é ouvir dizer que o Spínola nada tem a ver com o assassinato de Cabral, tanto assim é que "ele sempre o elogiou". Caro amigo, já ouvi a alguns dos implicados guineenses dizer o mesmo... Hoje em dia, até o Alpoím Calvão que bombardeou a casa de Cabral em Conakry na operação Mar Verde, nega que o tenha querido matar. Pois....



abraço

pepito




PS - Quanto à ilha a pender para um lado...que lhe respondam os militares e historiadores portugueses que estiveram no Simpósio [Interncaional de Guiledje].  


(iii) Novo comentário de Torcato Mendonça, de 27 do corrente:


Luís Graça


Faz chegar, por favor, a minha breve resposta, a possivel para quem está limitado com a Rede TMN. O computador é da Ana e noutro sistema. Em breve escreverei. Melhor em e-mail.


Spínola sabia que tinha que actuar assim. O assassinato de Cabral é assunto a ser tratado de outro modo. Nada me mete medo sobre tal ou outros assuntos. Assumo ter admirado o Marechal enquanto Com-Chefe na Guiné. Sabes isso. Da parte restante falaremos. Aquela guerra nunca seria ganha militarmente... Houve grandes combatentes de ambos os lados. Nem sempre utilizando os meios suaves... nem sei como se definia isso ou que importância terá para esta conversa entre nós.


Só dois pontos:

- Portugal vivia sob uma ditadura feroz. Os ultras e certos interesses económicos nunca suportariam uma negociação política. Marcelo era um Chefe de um Governo de fachada.

- Li e ouvi os vídeos do Simpósio. Conheço pela leitura e não só o trabalho da AD. Vai, logicamente além do que aqui tem aparecido no Blogue. É natural em quem se interessa por estes assuntos.

A "ilha estava inclinada" foi um modo de dizer como certos dirigentes actuavam...ou actuam.


Agradeço que encaminhes isto, caro Luís, para o Carlos Schwarz. Não  tenho endereços e o resto falha. Só o gosto por vocês, pelo blogue, pela Guiné e pelo o meu País me levam a tentar, quando posso e o sistema funciona, a escrever assim e a vir aqui,  religiosamente.
Abraço os dois. Através de um todos os camaradas do blogue; do outro o Povo daquela Terra vermelha e ardente que a mim ficou colada.


Abraço do Torcato (a verdade tem sempre muitas inverdades... a verdade pura é utopia).



2. Comentário do editor:  


Tanto o nosso amigo Pepito como o nosso camarigo Torcato autorizaram a publicação destes comentários feitos em registo off.


Mais concretamente o Pepito acaba de me mandar a seguinte mensagem:


Luis: Se considerares que tem interesse para os nossos bloguistas, publica.
abraço
pepito


PS - Gostei muito de conhecer os filhos do Zé Teixeira [que acaba de regressar da sua viagem à Guiné, onde foi recebido com grande alegria, reconhecimento,  gratidão, esperança e entusiasmo pelas gentes do Cantanhez] . Há uma nova geração (com os teus filhos) fora de série....

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Nota do editor:



Último poste da série > 18 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8128: Controvérsias (119): 10 de Junho: Ainda, o Dia dos Combatentes (Joaquim Mexia Alves)

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8172: Agenda cultural (116): O documentário de Diana Andringa sobre o Campo de Chão Bom / Tarrafal passa hoje na RTP1, às 23h00: Entre 1962 foram deportados para lá 100 presos políticos guineenses, 60 foram libertados em 1964 e os restantes em 1969



1. Mensagem da cineasta Diana Andringa, membro da nossa Tabanca Grande:



Data: 22 de Abril de 2011 12:15
Assunto: Tarrafal


O "Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta" vai passar na RTP1, dia 27, às 23H00.
Abraços,
 Diana

Sinopse (Fonte: RTP1):

Voltamos a este campo de desterro que tem muitas histórias para nos confessar... Chamavam-lhe "O Campo da Morte Lenta"; os críticos, naturalmente. Quando os presos eram portugueses, as autoridades chamaram-lhe primeiro, entre 1936 e 1954, "Colónia Penal de Cabo Verde" e depois quando reabriu em 1961 para nele serem internados os militantes anticolonialistas de Angola, Cabo Verde e Guiné, "Campo de Trabalho de Chão bom". Trinta e dois portugueses, dois angolanos, dois guineenses perderam ali a vida. Outros morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência do que ali tinham passado. Famílias houve que, sem nada saberem do destino dos presos, os deram como mortos e chegaram a celebrar cerimónias fúnebres.

A convite do Presidente da República de Cabo Verde, Pedro Verona Pires, os sobreviventes reencontraram-se para um Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal, resultou deste encontro este documentário produzido e realizado por Diana Andringa com o apoio da Fundação Mário Soares e da Fundação Amílcar Cabral.



 2. Comentário de L.G.:

Já aqui nos referimos ao documentário de Diana Andringa sobre o Campo de Chão Bom, Tarrafal, Ilha de Santiago, Cabo Verde. Realizado em 2009, foi estreado em Lisboa, no IndieLisboa'10, 7º  Festival Internacional de Cinema Independente, Culturgest,  23 de Abril de 2010. 

Para o Campo de Chão Bom foram deportados, em 4 de Setembro de 1962, cem presos políticos guineenses, juntando-se aos angolanos que já lá estavam.  Muitos dos guineenses terão sido presos arbitrariamente pelo PIDE, não  tendo  qualquer ligação ao PAIGC, criado em 1956,  e que a partir de 3 de Agosto de 1961 irá passar à chamada acção directa ( sabotagens, corte de vias de comunicação, etc.), antecipando assim a luta armada, iniciada oficialmente (segundo a historiografia do PAIGC) em 23 de Janeiro de 1963, em Tite. 

Este período, de 1961 a 1963, de forte repressão por parte da PIDE (que não teria no território mais de 30 agentes metropoliitanos), é  ainda mal conhecido da maior parte dos portugueses e dos guineenses, incluindo os combatentes (do lado e do outro) da guerra colonial de 1963/74.  

Já foi feita, no entanto, referência à  figura do advogado e escritor Artur Augusto Silva (1912-1983), casado com a nossa amiga Clara Schwarz e pai do nosso amigo Pepito, e que se destacou nesta época na defesa de presos políticos guineenses:  Cidadão empenhado, grande africanista,  português e guineense, jurista corajoso,   amigo pessoal de gente ligada às letras e às artes, mas também de diversas figuras ligadas ao Estado Novo, a começar pelo Prof Marcelo Caetano, de quem foi aluno,  foi advogado de defesa em 61 julgamentos de presos políticos, acusados de sedição, um deles com 23 réus, tendo tido apenas duas condenações em todos esses julgamentos. Em 1966, acaba também ele por ser preso pela PIDE, à chegada a Lisboa, e mantido vários meses no forte de Caxias sem culpa formada. Acabou por ser solto, mas impedido de voltar à Guiné.

Os 100 guineenses, deportados em 4 de Setembro de 1962,  foram juntar-se  aos 107 angolanos que já lá estavam. Os guineenses foram alojados numa ala separada.  Em 1964 saíram cerca de 60 guineenses, sem qualquer culpa formada nem julgamento,  sendo os restantes libertados em 30 de Julho de 1969, no âmbito da política "Por uma Guiné Melhor", do Governador Geral e Com-Chefe António Spínola.  Recorde-se que, ao todo, Spínola mandou libertar 92 presos políticos, incluindo um dos históricos do PAIGC, Rafael Barbosa  (1926-2007), detido na colónia penal da Ilha das Galinhas, nos Bijagós.

Dos 238 presos angolanos, guineenses e cabo-verdianos que estiveram no Tarrafal, na 2ª fase (1961-1973), apenas menos de um quarto (cerca de 50) estavam ainda  vivos, em 2009. No 1º período do Tarrafa (1936-1954) , o número de presos foi de cerca de 340, todos eles portugueses, opositores ao regime de Salazar, literalmente desterrados, presos arbitrariamente, sem direito a defesa nem a cuidados de saúde... 

O documentário de Diana Andringa, com duração de hora e meia, foi feita basicamente com  três dezenas de entrevistas, feitas no interior do antigo campo, e inclusive nas antigas celas, por ocasião do Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal, que teve lugar entre 28 de Abril e 1 de Maio de 2009. A realizadora preferiu concentrar-se na 2ª parte da história,   menos conhecida ou menos falada, deste campo de concentração, ou seja, o período em que foi reaberto, em 1961, e que vai até 1974.   
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Nota do editor:

Último poste da série >  11 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8085: Agenda Cultural (116): Conferência de António Graça de Abreu, Museu do Oriente, 3ª feira, 12 de Abril, 18h00, entrada livre > A megacidade de Xangai, um olhar de 30 anos

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6887: Recortes de imprensa (27): Repressão da PIDE/DGS, em Cabo Verde, na sequência do assalto, feito por militantes do PAIGC, ao barco de cabotagem Pérola do Oceano, Ilha de Santiago, 19 de Agosto de 1970 (Nelson Herbert)

"
1.  Eis uma notícia que passou na imprensa de Cabo-Verde, em 19 do corrente, com a publicação de um comunicado ou nota de imprensa da Associação Defesa da Memória, ONG cabo verdiana (ainda pouco conhecida), assinalando uma efeméride, considerada importante para a história recente daquele antigo território português, o 40º Aniversário do maior número de prisões feita pela PIDE em Cabo Verde, num só dia... O recorte de imprensa foi-nos enviados pelo membro da nossa Tabanca Grande, Nelson Herbert (jornalista, Voz da América, EUA, foto à esquerda), natural da Guiné, filho do famoso, no seu tempo, jogador de futebol Búfalo Bill, o Armando Lopes, que celebra justamente hoje 90 anos, e a quem reiteramos os votos de parabéns (LG).


"Efeméride: 40º Aniversário de maior Prisão feita pela PIDE em Cabo Verde

"Há precisamente 40 anos, em 19 de Agosto de 1970 a PIDE, Polícia Internacional de Defesa do Estado Português, realizou a sua mais extensiva captura e aprisionamento políticos de militantes da resistência interna do PAIGC (Partido Africano para Independência da Guiné e cabo Verde) em Cabo Verde"!, diz a nota de imprensa distribuída pela Associação de Defesa da Memória.


"Essa acção da PIDE foi realizada na sequência do assalto ao navio Pérola do Oceano em Agosto de 1970, por um grupo de militantes do PAIGC de Santa Catarina, infiltrados por um informante da PIDE, José Borges, como sendo coronel do PAIGC, com intuito de irem buscar arma(s) na Guiné Conacry para a Libertação de Cabo Verde. Nesse ambiente repressivo e de movimentação da PIDE e das forças armadas portuguesas em toda a ilha de Santiago, mais de quarenta suspeitos foram aprisionados. Entre eles destacava-se Pedro Martins, responsável do PAIGC, estudante do 7º ano dos liceus, preso com grande aparato militar.

"Pelas informações arrancadas em outros detidos, particularmente no grupo dos assaltantes do Pérola de Oceano, a PIDE convencera-se que tinha capturado uma das cabeças mais importantes do PAIGC em Cabo Verde.


"Sujeito a uma tortura impiedosa de quase seis meses, Pedro Martins, de facto,  resistiu à PIDE, proeza a que poucos se podem gabar, considerando a impunidade e a barbárie dessa polícia colonial fascista. Nenhum segredo do PAIGC e nenhum nome de militante foram-lhe arrancados pela PIDE. Esse comportamento só poderá ser atribuído à sua firme convicção e dedicação à Luta para Independência de Cabo Verde.


"No então concelho de Santa Catarina viveu-se momentos de muita repressão e tensão políticas. “O ar tornou-se irrespirável",  como afirmaria um militante do Partido. Entretanto, os companheiros de Pedro Martins não desistiram e prosseguiram com a militância política em prol da Independência de Cabo Verde.


"Quarenta anos depois desse acontecimento histórico, do comportamento patriótico de militantes do PAIGC, como o do Pedro Martins, sentimo-nos na obrigação de assinalar a data histórica de 19 de Agosto de 1970 e de saudar a Luta pela Independência Nacional e particularmente dos que estiveram na resistência interna e enfrentaram o poder repressivo colonial".


A referida Associação exorta, por fim, os s professores de história para "que ensinem aos alunos o significado que foi essa data para o triunfo da Independência Nacional no dia 5 de Julho de 1975".

(Nota de imprensa publicado, pelo menos em: Expresso das Ilhas, Vision News, de Cabo Verde; mas também no Correio da Manhã. Reproduzida no nosso blogue com a devida vénia...)

2. Comentário de L.G.:

A Semana tem uma outra versão deste episódio, e aponta a data de 20 de Agosto de 1970, como eféméride, em artigo de opinião assinado por Emanuel C. D’Oliveira

(...) "Nesse dia ou melhor noite, do ano 1970, o barco recebeu carga e passageiros para S. Filipe e Furna, como habitual e rotineiramente fazia. Ninguém desconfiou, nem podia desconfiar, que entre os embarcados encontrava-se um grupo de assaltantes que, disfarçados de passageiros, iam com a intenção de sequestrar e apoderar-se do barco. O grupo ia protagonizar um feito inédito na história do arquipélago.



"!Os planos, porém, não correram como esse grupo, sob disfarce, tinha previsto. Afinal tratava-se de uma manobra da polícia política para desmantelar e capturar elementos afectos ao PAIGC que actuavam na clandestinidade, na ilha de Santiago, mais precisamente em Santa Catarina e Assomada. Veio-se a saber mais tarde que um elemento do grupo tinha montado uma armadilha aos restantes que, na sua boa-fé, pretendiam ir combater o regime português a partir do continente. A desventura do grupo, que acabou preso, é contada ao pormenor em duas obras literárias da nossa praça (Testemunhos de um Combatente,  de Pedro Martins e Tarrafal, Memórias e Verdades,  de José V. Lopes). (...)

(...) "Os assaltantes acabaram presos pela PIDE com a ajuda de militares e da Polícia de Segurança Pública. Nem todos foram encontrados no mesmo dia. Primeiro estiveram detidos na extinta Cadeia Civil que se localizava onde hoje se encontra o Hotel Trópico. Mais tarde transferiram-nos para Tarrafal, tendo sido libertados quatro anos depois, após a revolução portuguesa de 25 de Abril, em 1974". (...)


De qualquer modo, este episódio é pouco conhecido entre nós, e até mesmo entre os guineenses e os cabo verdianos. O nosso blogue é um ponto de (re)encontro de gentes e memórias. Faz por isso sentido evocar aqui esta efeméride. Em Maio passado foi estreado o filme "O Sonho de Liberdade", do cineasta Júlio Silvão Tavares,  baseado nestes factos históricos.

Ficha técnica > Realizador: Júlio Silvão Tavares;  Produtora: Silvão – Produção, Filmes;  Equipa artístico: Assaltantes do navio Pérola do Oceano, familiares e outros testemunhos;  Local de Rodagem: Cabo Verde – Ilhas de Santiago;  Data de início e tempo de rodagem: Abril / Maio de 2007, 25 dias Duração: 52 minutos. Estreia: Cidade da Praia, 9 de Maio de 2010.

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Nota de L.G.:
 
(*) Último poste desta série > 15 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6743: Recortes de imprensa (26): A morte do africanista Basil Davidson (1914-2010), amigo e admirador de Amílcar Cabral (Nelson Herbert / Luís Graça)

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6303: Historiografia da presença portuguesa em África (35): 100 presos políticos guineenses enviados em 1962 para o Campo de Chão-Bom, Tarrafal, Ilha de Santiago, Cabo Verde (Luís Graça)

































Lisboa > IndieLisboa'10 > 7º  Festival Internacional de Cinema Independente > Culturgest > 23 de Abril de 2010 >  Sessão de estreia do filme Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, de Diana Andringa (2009)  >  Não se trata de fotogramas mas de imagens obtidas por máquina fotográfica durante a exibição do filme (com a devida vénia à realizadora  a quem não pedi expressamenete autorização...), e editadas por mim  > (*)

As três últimas fotos são de sobreviventes guineenses, que são entrevistados no filme e cujos nomes, lamentavelmente, não consegui fixar. Apreciei a descontracção, a naturalidade, a capacidade de memória, a coragem, a dignidade  e a emoção com que estes homens evocaram esses duros tempos de exílio e de prisão. Um deles  (o da última foto) confessou, inclusivamente, que por três vezes abriu a sua própria cova, lá na Guiné, e por três vezes foi salvo, talvez graças à sua juventude... 

Julgo que muitos deles não teriam qualquer ligação ao PAIGC, criado em 1956,  e que a partir de 3 de Agosto de 1961 passa à chamada acção directa - sabotagens, corte de vias de comunicação, etc- , antecipando a luta armada, iniciada oficialmente em 23 de Janeiro de 1963. Este período, de 1961 a 1963, de forte repressão por parte da PIDE (que não teria no território mais de 30 agentes metropoliitanos), é mal conhecido de todos nós, e está pouco documentado no nosso blogue...  Tal como é pouco conhecido o papel do Exército na "luta contra a subversão", neste período.

Já aqui evocámos, em tempos, a figura do advogado e escritor Artur Augusto Silva (1912-1983), casado com a nossa amiga Clara Schwarz e pai do nosso amigo Pepito, e que se destacou nesta época na defesa de presos políticos guineenses:

"Cidadão empenhado, africano nacionalista, jurista corajoso, fez questão de defender presos políticos guineenses, muitos deles seus amigos 'ou que passaram a sê-lo, acusados de sedição pela potência colonial'; mais concretamente, 'foi defensor em 61 julgamentos, um deles com 23 réus, tendo tido apenas duas condenações';

Fotos: Luís Graça (2010)


Por Portaria nº 18539, de 17 de Junho de 1961, assinada pelo então Ministro do Ultramar,  Adriano Moreira, foi reaberto o antigo campo de Tarrafal (que funcionou entre 1936 e 1954), agora designado Campo de Trabalho de Chão Bom, na Ilha de Santiago, Cabo Verde, originalmente destinado aos presos políticos de Angola.

Trinta e dois portugueses - incluindo Bento Gonçalves (1902-1942), secretário-geral do PCP, entre 1929 e 1942- , dois angolanos e  dois guineenses perderam ali a vida. Outros morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência das condições infra-humanos em que ali viveram. "Famílias houve que, sem nada saberem o destino dos presos, os deram como mortos e chegaram a celebrar cerimónias fúnebres".

Os últimos detidos (angolanos e cabo-verdianos) foram libertados apenas em 1 de Maio de 1974.... Trinta cinco anos, e a convite do presidente da República de Cabo Verde, Pedro Pires, os sobreviventes  reencontraram-se no âmbito de um Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal. Durante a realização do Simpósio, a cineasta Diana Andringa entrevistou mais de 3 dezenas desses sobreviventes, incluindo o português Edmundo Pedro, um dos que foram estrear o Tarrafal, em 1936. Mas a realizadora preferiu concentrar-se na 2ª parte da história  menos conhecida ou menos falada, deste campo de concentração  (**).

O documentário, com duração de hora e meia, foi feita basicamente com estas três dezenas de entrevistas, feitas no interior do antigo campo, e inclusive nas antigas celas.

Em 4 de Setembro de 1962 chegou uma leva de 100 presos políticos da Guiné, que se juntaram aos 107 angolanos que já lá estavam (mas alojados em alas separadas). Em 1964 saíram cerca de 60 guineenses, sendo os restantes libertos no tempo de Spínola, em 30 de Julho de 1969, no âmbito da política "Por uma Guiné Melhor". Recorde-se que. ao todo, Spínola mandou libertar 92 presos políticos, incluindo um histórico do PAIGC, Rafael Barbosa  (1926-2007), detido na colónia penal da Ilha das Galinhas, nos Bijagós.

Dos 238 presos angolanos, guineenses e cabo-verdianos que estiveram no Tarrafal, na 2ª fase (1961-1973), apenas menos de um quarto (cerca de 50) estão ainda hoje vivos. No 1º período (1936-1954) , o número de presos foi de cerca de 340, todos eles portugueses, opositores ao regime de Salazar, literalmente desterrados, presos arbitrariamente, sem direito a defesa nem a cuidados de saúde...

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 21 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6204: Agenda cultural (72): Documentário, de Diana Andringa, Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, no IndieLisboa '10, na Culturgest, a 23 (Grande Auditório, 21h30) e 25 (Pequeno Auditório, 18h30)

(**) Vd.,  no blogue  Caminhos da Memória, o texto de um comunicação de José Augusto Rocha     feita em 29/10/2008, no Colóquio Internacional «Tarrafal: uma prisão, dois continentes» > 29 de Outubro de 2009 > Tarrafal – 29 de Outubro de 1936. O autor, um conhecido advogado, defensor de presos políticos antes do 25 de Abril,  foi Alf Mil da CCAÇ 557 (Cachil, Bafatá, Bissau, 1963/65).

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6204: Agenda cultural (72): Documentário, de Diana Andringa, Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, no IndieLisboa '10, na Culturgest, a 23 (Grande Auditório, 21h30) e 25 (Pequeno Auditório, 18h30)



Sítio do  IndieLisboa '10 - 7º Festival Internacional de Cinema Independente, Lisboa, 22 de Abril a 2 de Maio de 2010


Tarrafal: Memórias do Campo da Morte, documentário de  Diana Andringa:  "Longas horas de pé sobre um banco, espancado se tentasse apoiar-se na parede, foram uma das torturas sofridas por Arlindo Borges, de Cabo Verde".




 Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta, documentário de Diana Andringa:  "lanta do campo gravada num osso de vaca cuidadosamente preservado"


1. Mensagem enviada pela nossa amiga Diana Andringa, realizadora, no passado dia 19:

Assunto - Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta no IndieLisboa '10

 Olá! 

Às 21H30 do dia 23 de Abril   passa no Grande Auditório da Culturgest (Caixa Geral de Depósitos, Campo Pequeno), o documentário que fiz sobre o Campo de Concentração do Tarrafal – "Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta".

Teria muito gosto em que fosse visto por muita gente nessa noite. A imagem do João Ribeiro e o som da Armanda Carvalho são ainda melhores  naquelas condições. Tenho alguns convites para oferecer aos que o desejem.

O filme repete no Pequeno Auditório da Culturgest no dia 25, às 18H30.

 Diana Andringa

Tarrafal: Memórias do
Campo da Morte Lenta.


Chamavam-lhe "o Campo da Morte Lenta". Os críticos, naturalmente. Que as autoridades, essas, chamaram-lhe primeiro, entre 1936 e 1954, quando os presos eram portugueses, "Colónia Penal de Cabo Verde" e, depois, quando reabriu em 1961 para nele serem internados os militantes anticolonialistas de Angola, Cabo Verde e Guiné, "Campo de Trabalho de Chão Bom". 

Trinta e dois portugueses,  dois angolanos, dois guineenses perderam ali a vida. Outros morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência do que ali tinham passado. Famílias houve que, sem nada saberem do destino dos presos, os deram como mortos e chegaram a celebrar cerimónias funebres.

"Ali é só deixar de pensar. Porque se não morre aqui de pensamentos. É só deixar, pronto. Os que têm vida ficam com vida. Nós aqui estamos já quase mortos." A frase é do angolano Joel Pessoa, preso em 1969 e libertado, com todos os outros presos do campo, em 1 de Maio de 1974.

No 35º aniversário desse dia, a convite do presidente da República de Cabo Verde, Pedro Verona Pires, os sobreviventes reencontraram-se para um Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal.

"Tarrafal: memórias do Campo da Morte Lenta" resultou desse reencontro. Durante os dias em que os antigos presos voltaram ao Tarrafal, gravámos entrevista após entrevista, registando as suas recordações. Trinta e dois presos, desde o português Edmundo Pedro, um dos que o estreou, em 1936, aos angolanos e cabo-verdianos que foram os últimos a deixá-lo, no 1º de Maio de 1974, passando pelos guineenses que, ali chegados em Setembro de 62, saíram em 64 uns, em 69 os restantes.  Um guarda, Joaquim Lopes, cabo-verdiano e convertido ao PAIGC. Uma das raras pessoas que testemunhou a vida no Tarrafal desde a sua abertura ao seu encerramento, Eulália Fernandes de Andrade, mais conhecida por D. Beba.

É um documentário feito à base de depoimentos e filmado quase sempre no interior do campo, afinal, o espaço em que os presos se moviam. Entre as raríssimas excepções, o cemitério, onde acompanhamos a homenagem dos sobreviventes aos que ali ficaram. Vozes, caras expressivas contra fundo de cela. Alguns objectos surpreendentes: as calças rasgadas  pelo chicote e puída pelo chão prisional, a planta do campo desenhada num osso de vaca, a bengala que testemunha o resultado da tortura. A alegria de se verem lembrados em duas exposições nas celas que tinham ocupado.

A alegria: palavra estranha num filme sobre o Tarrafal. Mas essa é a grande lição destes homens: porque, como diz um deles, o caboverdiano Jaime Scofield, "o mais importante não é que eles nos tenham querido matar lentamente. O mais importante é que nós resistimos."

Esta é a história de homens a quem quiseram destruir toda a esperança e que souberam resistir até à vitória: "Porque no Tarrafal nós inventámos a vida, sempre!"

TESTEMUNHOS
- por ordem de entrada no filme -

Edmundo Pedro (Portugal)
Eulália de Andrade, D. Beba (Cabo Verde)
Joaquim Lopes, guarda (Cabo Verde)
Cândido Joaquim da Costa (Guiné)
Caramó Sanhá (Guiné)
Francisco Mendes Vieira (Guiné)
Manuel Neves Trindade (Guiné)
Carlos Sambu (Guiné)
Augusto Pereira da Graça (Guiné)
Macário Freire Monteiro (Guiné)
Nobre Pereira Dias (Angola)
Amadeu Amorim (Angola)
Fernando Correia (Guiné)
Mário Soares (Guiné)
Jorge da Silva (Guiné)
Agnelo Lourenço Fernandes (Guiné)
Lote Sachicuenda (Angola)
Augusto Kiala Bengue (Angola)
Evaristo "Miúdo" (Angola)
Silva e Sousa (Angola)
Joel Pessoa (Angola)
Lote Soares Sanguia (Angola)
Jaime Cohen (Angola)
Alberto Correia Neto (Angola)
Vicente Pinto de Andrade (Angola)
Justino Pinto de Andrade (Angola)
Carlos Tavares (Cabo Verde)
Luis Fonseca (Cabo Verde)
Jaime Scofield (Cabo Verde)
Luís Mendonça (Cabo Verde)
Arlindo Borges (Cabo Verde)
António Pedro Rosa (Cabo Verde)
Pedro Martins (Cabo Verde)


Ficha técnica:
Imagem: João Ribeiro
Som: Armanda Carvalho
Montagem: Cláudia Silvestre
Música; "Abandono" ("Fado Peniche") Poema: David Mourão-Ferreira Música: Alain Oulman Voz: Amália Rodrigues
Assobio: Bruno Morgado
Voz off: Jorge Sequerra
Misturas: João Ganho
Produção e Realização: Diana Andringa [, 2009]
Tempo: 1H 30'




2. Comentário de L.G.:

Além deste trabalho da Dina Andringa, que que eu recomendo vivamente e vou ver, espero que não percam também o filme de Rui Simões, de 2010, com a duração de 95', Ilha da Cova da Moura,  um bairro do Concelho da Amadora, injustamente estigmatizado e mal amado, que pode ser visto, simbolicamente, como a última ilha que nos restou do arquipélago a que um dia chamámos Império Colonial... Parafraseando uma jovem moradora local, "português preto não existe" (sic)... A frase, na sua ambiguidade,  pode também querer sugerir duas coisas: que há, entre nós um velho racismo subliminar nunca resolvido, e que a exclusão social e o racismo andam quase sempre de mãos dadas...

Um trailer do filme, com a duração de 1' 45'', pode ser visto aqui.

Exibições: 28 Abril, 19:00, Culturgest, Grande Auditório
30 Abril, 18:30, Culturgest, Pequeno Auditório

Sinopse:

Na área da Grande Lisboa, o nome Cova da Moura nunca foi sinónimo de bem-estar, educação ou prosperidade. Pelo contrário, esteve sempre associado à ideia de violência, insegurança, perigo, ou, na melhor das hipóteses, de falta de instrução ou simplesmente pobreza. O documentário de Rui Simões não pretende apenas procurar o outro lado do bairro e fazer um retrato positivo da sua comunidade. O objectivo deste projecto não é o de apagar uma série de ideias feitas mas procurar as causas e efeitos desses preconceitos. Assim, o realizador seguiu o quotidiano deste bairro, descobrindo nele reflexos de Cabo Verde e procurando os modos como a exclusão social se combate ou perpetua nas vidas dos seus moradores.