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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24072: Tabanca Grande (543): Manuel Seleiro, ex-1º cabo, Pel Caç Nat 60 (São Domingos, Ingoré e Susana, 1968/70), natural de Serpa, DFA, sofreu cegueira total e amputação das mãos, ao levantar e desativar um engenho explosivo, durante uma operação, em 13/3/1970... Senta-se à sombra do nosso poilão, sob o nº 870.


Foto nº 1 > Guiné > Região do Cacheu >  São Domingos > Pel Çaç Nat 60 > 1968/70 > O Manuel Seleiro, a sintonizar o rádio e a ouvir música.


Foto nº 2 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > Pel Çaç Nat 60 > 1968/70 > O Seleiro (à esquerda), no café do Leal


Foto nº 3 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > Pel Çaç Nat 60 > Estrada  São Domingos - Susana - Varela > Proximidades de Nhambalã > 13 de novembro de 1969 > O 1º cabo caçador Manuel Saleiro, que era o "sapador" do pelotão, aqui levantando uma mina anticarro... Foi desativada sem problemas... O problema é que mais à frente havia outra não detetada pelos picadores (*)...


Foto nº 4 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > Pel Çaç Nat 60 > Três minas A/P


Foto nº 5 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > Pel Çaç Nat 60 > Estrada 
 São Domingos - Susana - Varela > Proximidades de Nhambalã > 13 de novembro de 1969 >  O Seleiro, feliz, por ter feito, com sucesso, o seu trabalho...

Fotos (e legendas): © Manuel Seleiro (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Os créditos fotográficos das fotos de nºs 3 e 5 devem ser atribuídos ao fur mil Moreira, que vive hoje em Riba D' Ave: ele foi o fotógrafo que estava lá, nesse dia fatídico de 13/11/1969, nas proximidades de Nhambalã, no blogue do Pel Caç Nat 60  estão em formato reduzido, sem edição]. 

1. Manuel Seleiro, de seu nome completo, Manuel Francisco Cataluna Graça Seleiro, natural de Serpa, 76 anos (nasceu a 29/7/1946), Cataluna da mãe, Seleiro do pai. Famílas bem conhecdias da terra, que ele já não visita  desde 2014.  João Cataluna, do grupo musical de Serpa, "Os Alentejanos", é seu primo do lado materno.

Fiquei chocado, ontem à tarde, ao falar ao telemóvel com o Manuel Seleiro , e só então saber que ele era invisual total, tinha perdido as duas vistas e as duas mãos (!) ao levantar e desactivar uma mina (creio que A/P), na  mesma ocasião  em que foi ferido o Hugo Guerra, em 13/10/1970 (*)

O José Arruda (1949-2019), o  José Eduardo Gaspar Arruda,o líder histórico da ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas), era uma figura pública, fui ao seu funeral: sofreu cegueira total e amputação (do membro superior esquerdo), um acidente com mina em Moçambique. Como também são figuras conhecidas de muitos de nós  o Cândido Patuleia Mendes (natural do Bombarral, meu vizinho,  com amigos na Lourinhã, ferido em Angola) e o Manuel Lopes Dias (não sei onde foí ferido)  (estes dois útimos membros da atual direção da ADFA, eleitos para o triénio de 2022/24, o prmeiro como tesoureiro e o segundo como secretário: mas já foram ambos presidentes da direção).

Da condição do Manuel Seleiro eu, confesso, que não sabia. Aliás, nunca nos encontrámos. Só sabia que era DFA.  Mas falou-me com uma aparente naturalidade e tranquilidade, fazendo-se valer da sua prodigiosa memória e grande coragem. Imagino o que tenha sido o seu calvário, no processo de tratamento, convalescência, reabilitação e integração ao longo de anos... Deu-me algumas detalhes... Mas eu não quis obrigá-lo a reviver o seu doloroso passado, para mais numa conversa telefónica... Disse-me que tem, não uma prótese, mas "dois dedos enxertados" numa das mãos (
a esquerda), que lhe permitem realizar algumas tarefas do dia-a-dia, incuindo comer ou  escrever no computador: recebe e responde a emails, tem dois blogues...  

Com essa mão de dois dedos edita o seu blogue (Pel Caç Nat 60) e a sua página de divulgação do Cante Alentejano (Luar da Meia Noite), que é também a sua página pessoal na Web... É "leitor" regular (!) do nosso blogue, ou melhor, acompanha o nosso blogue por voz...

Está registado no Blogger desde novembro de 2008. No seu perfil diz que a sua ocupação é a "informática". Presumimos que tenha feito formação nesta área, o que permite por exemplo acompanhar regulamente o nosso blogue (e outros) em modo áudio (há programas que leem o ecrã para os invisuais... Também foi rádio-amador. Foi fotógrafo na Guiné, mas hoje só  reconhece as fotos que tirou e que o filho digitalizou, através das legendas...

Sobre os seus passatempos, diz:

"Gosto do Mar, e do campo, a leitura, e a informática, Desporto favorito: Natação, Não gosto de animais: Adoro as aves, em particular os melros, pela sua beleza, de cantar, gosto de acordar com as suas melodias... Gostava da eletrónica. A minha cor preferida, o Azul. O pior da minha vida, foi ter que fazer a guerra. Mais vale um pássaro num ramo Que numa gaiola dourada."

Aceitou de bom grado integrar a nossa Tabanca Grande!... Passa ser o nosso grã-tabanqueiro nº 870, o lugar que lhe reservamos sob o nosso fraterno e mágico poilão, à sombra do qual se untam os amigos e camaradas da Guiné.

Sobre o seu passado militar, já sabemos que  foi 1º cabo, de rendição individual, no Pel Caç Nat 60 (São Domingos, Ingoré e Susana, 1968/70). Ficou no ativo como cabo. É DFA - Deficiente das Forças Armadas. Cegueira total, e amputação das duas mãos, na sequência da explosão de um engenho explosivo. 

Sobre o Hugo Guerra (**),  diz-me que não tem notícias dele há anos. Ao que parece, estará doente e acamado. Tal como não tem notícias da Manuela Gonçalves (a Nela), das Caldas da Raiha, professora reformada, esposa do infortunado alf mil Nelson Gonçalves, um dos comandantes do Pel Caç Nat 60, vítima de mina A/C, em 13/11/1969, que lhe levou uma perna (***), e foi a primeira mulher a integrar a Tabanca Grande... (Infelizmente, confirmámos hoje esta nossa amiga já nos deixou, conforme página do Facebook "Em memória de Manuela Gonçalves";   vamos fazer-lhe oportunamente um In Memoriam, no nosso blogue).


2. O Manuel Seleiro vive na Parede, Cascais, vamos convidá-lo para um dia destes aparecer na Magnífica Tabanca da Linha e arranjar-lhe uma boleia.

Contactos (que ele disponibiliza na sua página na Web):
Telem:  930 672 960
Email: manuelseleiro@gmail.com

Telefonem-lhe que ele gosta. Ajuda a suportar a sua solidão.  A esposa também tem problemas de visão  (lateral).

Mas, como o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (!), viemos também a saber que: 

(i) ele sabia que eu era natural da Lourinhã; 

(ii) disse-me que era casado com uma senhora do Sobral, Lourinhã; 

e (iii) tem um filho, Emanuel Seleiro, de uma primera relação: andou nos pupilos
do Exercito, está a trabalhar na Associação dos Bombeiros Voluntários da Lourinhã (BVL), de que foi presidente da direção, até maio de 2022, o meu amigo, vizinho e colega de escola Carlos Horta...

Para acabar esta apresentação do Manuel Seleiro aos membros da Tabanca Grande (****) foi-lhe fazer, talvez, uma surpresa (ele deve conhecer esta moda, mesmo que a não tenha listado na sua página pessoal, Luar da Meia Noite):



Vídeo (2' 12'') > Alojado em Luís Graça > Nhabijoes (2020). 

Lisboa > Casa do Alentejo > 8 de fevereiro de 2020 > Sessão de lançamento do livro do serpense José Saúde,  "Um ranger na guerra colonial: Guiné-Bissau, 1973-1974: memórias de Gabu" (Lisboa, Edições Colibri, 2019, 220 pp.)

Momento cultural: atuação do grupo musical "Os Alentejanos", de Serpa, com o João Cataluna ao centro (voz e acordeão). Moda alusiva ao embarque de tropas para a guerra colonial, "Lá vai uma embarcação / Por esses mares fora, / Por aqueles que lá vão / Há muita gente que chora"... (Reproduz-se a letra mais abaixo.)

Trata-se de uma homenagem sentida a um combatente da terra, o José Saúde, nascido em Aldeia Nova de São Bento, hoje vila, concelho de Serpa (em 23/11/1950), mas que foi cedo para Beja, a sua segunda terra, onde ainda hoje vive e onde nasceram as suas duas filhas, Marta e Rita.

Os dois concelhos viram sacrificados, no "altar da Pátria", 69 dos seus filhos, durante a guerra do ultramar/guerra colonial: 35, de Beja; 34, de Serpa... Só a freguesia de Aldeia Nova de São Bento teve 10 mortos, uma terra que viu decrescer a sua população para menos de metade em pouco de meio século: 8.842 habitantes em 1950, 3.073 em 2011.

Há uma versão original desta moda, de 1973, gravada pelo Trio Guadiana e o Quim Barreiros (como acordeonista). Segundo Miguel Catarino, "esta gravação data de 1973 e pertence à Banda 1 da Face A do disco EP de 45 R.P.M. editado pela 'Orfeu, etiqueta da 'Arnaldo Trindade e Companhia, Lda.', matriz 'ATEP 6514', em que o Trio Guadiana, acompanhado pelo acordeão de Quim Barreiros, interpreta quatro modas regionais alentejanas populares, com arranjos musicais do acordeonista. Esta moda é uma das mais pungentes que existe no Cante Alentejano, de seu nome 'Tão Triste Ver Partir', conhecida também como 'Lá Vai Uma Embarcação' ".

Convirá acrescentar que isto não é "cante", mas tem as suas raízes na música tradicional alentejana. No cante, não se usam, em regra, instrumentos musicais. Abrem-se exceções para a viola campaniça... A voz é o único (e grande) instrumento do cante, música do trabalho, do lazer e do protesto, cantada nos campos, na rua e na taberna... Em grupo, sempre em grupo. Homens e mulheres, se bem que os grupos corais femininos só tenham começado a aparecer há 3 décadas, por razões socioculturais... Mas as mulheres sempre cantaram, em grupo, com os homens no duro trabalho agrícola... Em grupo, num coro polifónico, "à capela" que não deixa ninguém indiferente: ou se ama ou se odeia... Um alentejano (do Baixo Alentejo) nunca conta(va) sozinho. No campo, trabalhava-se em "rancho", e cantava-se em "rancho"...O "cante" amenizava a dureza do trabalho e da vida no Alentejo dos latifúndios...

Lá vai uma embarcação (**)

É tão triste ver partir
Um barco do Continente,
Para Angola ou Moçambique
Lá lai outro contingente.

Tanta lágrima perdida,
Quando o barco larga o cais,
Adeus, minha mãe querida,
Não sei se voltarei mais.

Lá vai uma embarcação
Por esses mares afora,
Por aqueles que lá vão,
Há muita gente que chora.

Há muita gente que chora,
Com mágoas no coração,
Por esse mares afora,
Lá vai uma embarcação.

É tão triste ver partir
Um barco do Continente,
Para Angola ou Moçambique
Lá lai outro contingente.

Tanta lágrima perdida,
Quando o barco larga o cais,
Adeus, minha mãe querida,
Não sei se voltarei mais.

Lá vai uma embarcação
Por esses mares afora,
Por aqueles que lá vão,
Há muita gente que chora.

Há muita gente que chora,
Com mágoas no coração,
Por esse mares afora,
Lá vai uma embarcação.

[Revisão, fixação de texto: LG]


Contacto de "Os Alentejanos",
música tradicional Alentejana, Serpa

Telem: 962 766 339 / 938 527 595
Email: joaocataluna@gmail.com
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 15 de fevereiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24067: Blogues da nossa blogosfera (177): Pel Caç Nat 60 (São Domingos, Ingoré e Susana, 1968/74), blogue criado por Manuel Seleiro, 1º cabo caçador, DFA, natural de Serpa - Parte I: Histórias de minas que marcaram corpos e almas...

(**) Vd. poste de 25 de novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3518: História de vida (18): Evacuado duas vezes e meia...(Hugo Guerra, ex-alf mil, cmdt Pel Caç Nat 50, 55 e 60 (Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70); hoje cor ref, DFA

(...) Fiquei a comandar o Pel Caç Nat 60 e ainda tenho algumas lembranças de coisas que por lá aconteceram. Adiante.

No dia 13 de Março de 1970, ia comandar um patrulhamento até à fronteira e eis senão quando detectámos uma primeira mina reforçada, mas em tal estado de conservação que não houve qualquer problema para a levantar.

Tinha no Pelotão um Primeiro Cabo, de nome Seleiro, já com um longo historial de levantar minas e, depois de a vermos, concordei que ele a levantasse, o que foi feito sem qualquer problema. Passámos o detonador para a bolsa do enfermeiro e continuámos a progressão.

Como eu era sempre o terceiro ou quarto homem depois das picas, vi perfeitamente que os picadores tinham localizado qualquer coisa. Montada a segurança,  lá chamei de novo o Seleiro para conferenciarmos sobre aquela.

Depois de nos certificarmos que estava isolada, tinha que decidir se abortava a operação, rebentando a mesma e regressando a São Domingos, expostos a alguma emboscada do IN. Se fosse entendido desactivar a mesma, poderíamos ir ao objectivo e no regresso levantá-la sem qualquer perigo.

Um e outro rastejámos até à mina que parecia nova e eu comecei a dizer ao Seleiro que a queria levantar. Ele acabaria a sua comissão dois meses mais tarde.

Comecei a suar por todos os poros e depois de olhar bem aquela malvada, disse ao Seleiro que não era capaz. Ele disse-me que não havia crise e tomou o meu lugar.

Deitado no chão a cerca de 5 metros, acompanhei todos os seus movimentos com angústia e só relaxei um pouco quando ele, de joelhos e com a mina na mão, prestes a desarmadilhá-la me chamou:

- Meu Alferes, olhe aqui.

Comecei a levantar-me e senti o estrondo infernal, o sopro que me projectou de costas, o sangue quente a escorrer na cara e os gritos dele a dizer que estava morto…

Mas não estava. Os nossos homens trataram-nos o melhor possível, pediram as evacuações e fizeram uma macas com bambus e camisas. Tinha medo de perder a consciência e passar para o outro lado.

Aguentei, em choque, até chegarmos ao HM 241 em Bissau e o que mais me agradava naquele desespero todo era continuar a ouvir o Seleiro a dizer que estava morto. Se ele se calasse, sabia que podia ter perdido um amigo.

Quarenta e oito horas depois chegámos ao aeroporto de Figo Maduro e, como já foi dito por um camarada nosso, fomos colocados dentro de ambulâncias militares e sem qualquer barulho para não acordar a cidade, levaram-me a mim para o HMP na Infante Santo e o Seleiro foi levado para o Anexo, em Campolide.(...)


(***) Vd. poste de 26 de março de 2006 > Guiné 63/74 - P634: Uma mina na estrada de São Domingos para Susana (Manuela Gonçalves)

(****) Último poste da série > 28 de janeiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24019: Tabanca Grande (542): Eduardo Jacinto Estevens, ex-1.º Cabo Radiomontador da CCS/BCAV 3854 (Nova Lamego, 1971/73), que se senta no lugar n.º 869 da nossa Terúlia

sábado, 11 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24057: Blogues da nossa blogosfera (177): Os helicópteros Kamov Ka-32 do nosso descontentamento... (Luís Graça, A Nossa Quinta de Candoz, 29 de agosto de 2009)





Vídeo 1: 0' 50''



Vídeo 2: 1' 23"


Vídeo 3. 0' 20"

Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Candoz > 29 de Agosto de 2009 > O Kamov Ka-32 em acção na nossa terra, o heli pesado de combate a incêndios florestais, de fabrico russo... Foi um fim de semana de incêndios... Neste caso, o fogo era no Juncal, freguesia de Paredes de Viadores, ali bem perto... Um heli pesado, ao serviço da ANPC, andava, à nossa frente, num rodopio constante, abastecendo-se de água na barragem do Carrapatelo (que fica à nossa direita)... Fotos e vídeos feitos a partir nossa varanda, na  Quinta de Candoz. 

A experiência dos Kamov Ka-32 no combate contra incêndios em Portugal parece não ter sido feliz... Não sei qual o balanço feito  pela Autoridade Nacional de Proteção Civil.  Os seis Kamov Ka-32  acabaram por ir parar à FAP, e precisavam de peças para a sua manutenção. Estiveram inoperacionais durante vários anos... Mais recentemente foram oferecidos pelo Governo Português ao Governo da Ucrânia...  (O Kamov Ka-32 custa, por unidade,  cerca 6,5 milhões de dólares.)  


Fotos e vídeos (e legendas):  © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  No CTIG, o heli era uma "máquina de terror" para os homens que combatíamos na Guiné (e as populações sobre o seu controlo), sobretudo o helicanhão (ou "lobo mau", na gíria da malta da FAP). 

Para nós, o heli estava associado a cobertura aérea das NT, helioperações (com os páras e comandos),  mortos e feridos, evacuações Y (ipsilon) ou, na melhor das hipóteses, uma visita do Caco Baldé, o Homem Grande Bissaau, o Com-Chefe, o gen Spínola... 

Ainda hoje, para mim, o som do heli é como o tinonim da ambulância do 112: ambos pressagia(va)m desgraça, aflição, aperto, catástrofes, acidentes, guerra, morte... (Mas sabia, bem, no mato, em operações, na Guiné, sentir o helicanhão ou o T-6 por ali perto de nós,  temos que o reconhecer...).

Claro, eu hoje sei que o heli têm múltiplas aplicações, não só militarrs, como civis (desde
passear turistas, transportar doentes, combater incêndios, resgatar náugrafos, etc.). 
 
Em boa verdade, quem andava de heli, no meu/nosso  tempo, no CTIG, quem se podia dar o luxo de andar de heli (e fazia gala disso) era o gen Spínola, governador-geral e comandante-chefe... E aparecia a "desoras", quando menos se esperava... O nosso heli, o Al-III,  de fabrico francês, era também por isso o terror dos comandantes de batalhão... 

O seu custo de operação era de 15 contos por hora  (lia-se nos relatórios)... Quinze contos por hora, em 1969, equivalia, a preços de hoje, a cinco mil euros... Era  "manga de patacão":  dava para comprar cerca de 300 garrafas de uísque novo... ou para ir ao restaurante cerca de 750 vezes... ou para ir ao Pilão ou ao Bataclã todas semanas durante uma comissão...

2. Já aqui falámos, em tempos desses  sons de helicóptero que ainda hoje mexem connosco" (*)... De facto, depois da "peluda", nunca os senti tão perto como na nossa Quinta de Candoz, num mês de agosto lá longínquo,  em que lá estava a passar férias... Já aqui contei a história no blogue A Nossa Quinta de Candoz (**).

(...) Estava na hora do almoço quando ao fim de uma manhã soalheirenta, ouvi, lá fora, um som que me era familiar, o som caraterístico e inconfundível de um helicóptero... Saí logo de casa, a correr, levando a máquina fotográfica, e vou ao nosso miradouro da quinta, contíguo à casa, para ver o que se passava...

A noroeste, a escassos dois quilómetros,  em linha reta, havia um incêncio nos "montes", em pleno coração do território  da nossa freguesia, para os lados da ermida de Nossa Senhora do Socorro, diziam unsm  ou talvez para os lados do Juncal, diziam outros.  Era  o primeiro incêndio, felizmente, que o povo sinalizava naquele ano por aquelas  bandas... (Os nossos "montes", esses, já tinham ardido várias vezes, nos últimos vinte ou trinta anos.)

Um heli dirigiu-se ao Rio Douro,  à albufeira do Carrapatelo, que fica a escassos cinco quilómetreos em linha reta, para se abastecer de água... Foi e veio três vezes. Daqui via-se (e continua a ver-se)  uma parte da albufeira, de Candoz vê-se Porto Antigo, já no conselho de Cinfães, distrito de Viseu, Estamos  a 250/300 metros do nivel do mar... e rodeados de floresta e montanha.

Desta vez, o  incêndio foi rapidamenmte extinto. Mas o raio do som do heli ficou a mexer comigo... Velhas recordações da Guiné, dos anos de 1969/71... (***)  


3. Sobre esta aeronave, ao serviço da ANPC (Autoridade Nacional de Proteção Civil), pudemos na altura ler o seguinte no sítio Área Militar (o link foi, infelizmente, descontinuado, o blogue já não deve existir, mas a página foi capturada pelo Arquivo,pt):

(...) "Portugal adquiriu seis destas aeronaves, na sua versão para combate a incêndios. Os Ka-32 portugueses estarão equipados com um depósito suspenso do tipo «balde» com capacidade para até 5000 litros de Água.

"O Kamov Ka-32 consegue transportar quase tanta água como a aeronave de combate aos fogos Canadair, podendo reabastecer-se tanto em rios como em simples lagos, onde a aeronave do Canadá não pode operar. Além de operações de combate a incêncios os Kamov KA-32A portugueses ao serviço da 'Protecção Civil' também colaboraram em operações de busca e salvamento" (...)

...) "Família de helicópteros Ka-25, foi concebida originalmente por Nikolai Kamov ainda nos anos 50 e o primeiro Ka-25 voou em 1961. Em 1967, um substituto para o Ka-25 começou a ser estudado. Desse estudo resultaria o helicóptero Ka-27 cujo primeiro voo ocorreu em 1974.

"A mais distintiva característica dos helicópteros Kamov, é a não existência de um rotor de cauda, que nos helicópteros convencionais é utilizada para compensar a rotação do rotor principal e manter a aeronave estável.  Ao contrário, os helicópteros da família Kamov, têm um sistema de dois conjuntos de três pás, montados num mesmo eixo, rodando cada um deles em posições opostas. A navegação é auxiliada pelos dois grandes lemes traseiros. Este tipo de configuração foi considerado adequado para operação a partir de navios, pois a não existência de cauda, torna a aeronave mais compacta" (...)

Características técnicas (para os amantes destes máquinas, agora ao serviço da paz):

(i) Dimensões: Comprimento: 11.3m; Envergadura: 15.9 m; Altura: 5.4 m.

(ii) Motores/ Potência: 2 x motores Klimov TV3-117V; Potência total: 4380 HP/CV

(iii) Peso / Capacidade de carga: Peso vazio: 6500 Kg; Peso máximo/descolagem: 11000 Kg; Numero de suportes p/ armas: 0; Capacidade de carga/armamento: 5000 Kg; Tripulação / passageiros: 2.

(iv) Velocidade/Autonomia: Velocidade Máxima: 270 Km/h; Máxima (nível do mar): Não disponível; De cruzeiro: 240 Km/h; Autonomia standard /carregado : 600 Km; Autonomia máxima / leve 800 Km; Altitude máxima: 6345 m

Fonte: Área Militar / Arquivo.pt (com a devida vénia) 

____________

Notas do editor

(*) Vd. 30 de 30 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13546: Blogoterapia (261): Esses sons de heli que ainda mexem connosco... (Luís Graça, en férias na Tabanca de Candoz)

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24043: Fauna & flora (22): Algumas boas notícias para os mais de 700 chimpanzés (ou "daris") do Boé, graças ao fantástico trabalho de conservação da Chimbo Fundation&Daridibo, com sede em Béli


Um pequeno documentário baseado em vários vídeos, obtidos por câmaras de vigilância,  de chimpanzés no Boé, Guiné-Bissau.  Narração, em fula, por Bacari Camará, que vive em Béli, e é gestor de projeto. Legendas em inglês.

Vídeo (12' 30''), da Foundation Chimbo, alojado no You Tube.  Aqui reproduzido com a devida vénia.


1. Temos dado aqui  alguma atenção à fauna & flora" da Guiné-Bissau, e em particular aos chimpanzés do Boé e do Cantanhez (temos 11 referências ao nosso "dari"),  

No tempo da guerra, entre 1961 e 1974, provavelmente nenhum de nós, antigos combatentes portugueses, deve ter visto um chimpanzé, a não ser infelizmente em cativeiro. São animais, primatas como nós, territoriais e sociais (e os mais próximos de nós, em termos genéticos e evolutivos) mas de difícil observação na natureza...

Oxalá o visionamento deste vídeo (falado em fula, com legendas em inglês) contribua também para sensibilizar os nossos leitores para a problemática da proteção do chimpanzé e da preservação do seu habitat. O chimpanzé da África Ocide
ntal (Pan troglodytes)  é considerada uma espécie ameaçada, "criticamente em perigo".

Como diz um provérbio fula, uma única árvore não poder fazer uma floresta... Daí ser fundamental trabalhar em rede, envolver outras organizações, regiões, a sociedade civil e  o Estado da Guiné-Bissau, bem como empresas mineiras, parcerias (caso da ASI - Aluminium Stewardship Initiative) e países vizinhos, mas sobretudo a população local, que, no caso do Boé, é maioritariamente fula. A caça ilegal, a pressão demográfica humana, a construção de estradas e os projetos de mineração são alguns dos factores de risco para a preservação desta espécie.

Felizmente, ao que parece, têm  sido bem sucedidos os projetos da Chimbo Foundation and Daridibo no domínio da conservação desta e doutras espécies animais, emblemáticas da Guiné-Bissau, como por exemplo o leopardo (predador do chimpanzé).

Na primavera de 2022, 178 locais sagrados do Boé, que já estavam registados como ICCA (Áreas Indígenas e Comunitárias Conservadas), foram aceites como áreas protegidas de categoria III da IUCN (International Union for Conservation of Nature / União Internacional para a Conservação da Natureza) na WDPA (World Database on Protected Areas / Base de Dados Mundial sobre as Áreas Protegidas) (Ler mais sobre isto, no boletim informativo da Fundação, de maio de 2022.)

Mais de 50 estudantes e cientistas da Holanda, Alemanha, França, Bélgica, Índia, Brasil, Itália, Suíça, Portugal, Espanha, Senegal, Guiné-Bissau e Canadá, já realizaram pesquisas que contribuíram para a conservação do Boé.  


Doações são bem vindas:

Conta bancária

Stichting Chimbo

IBAN: NL05INGB0002734651

BIC: INGBNL2A

Contactos:

Telef +31-6-17280797 (The Netherlands)
E-mail: info@chimbo.org


2. Reprodução de uma notícia da Lusa / Porto Canal, 2/1/2015 (com a devida vénia...)

Câmaras revelam um dos últimos recantos de chimpanzés 
em terras lusófonas

Béli, Guiné-Bissau, 02 dez (Lusa) - Chimpanzés a tomar banho num lago, a encestar pedras como num "afundanço" de basquete entre ramos de uma árvore ou simplesmente em passeio.

São animais em vias de extinção a nível global, mas há horas e horas de vídeo a mostrar a intimidade destes primatas que habitam nas florestas do Boé, sudeste da Guiné-Bissau.

Nestes filmes há também leopardos a desfilar como numa passarela, imagens de búfalos, gazelas, javalis e o que parece ser a cauda de um leão - do qual já foram encontradas pegadas.

Os membros da fundação Chimbo ficam ansiosos de cada vez que penetram na densa vegetação para ler os cartões de memória das câmaras de vigilância: sabe-se lá que animais vão ver.

Alguns, como o leão, eram dados como extintos na Guiné-Bissau desde a guerra pela independência, na década de 60 e até 1974.

Há que aguçar os sentidos: "os chimpanzés gritam quando se deitam e quanto se levantam", explica Piet Wit, ecologista, especialista em Agronomia e Gestão de Recursos Naturais, um dos responsáveis pela Chimbo.

Assim, quando a noite cai é possível saber aproximadamente em que árvores fazem os ninhos para dormir, para de manhã a busca avançar até perto desses locais e esperar que acordem.

A sede da Chimbo está montada na aldeia de Béli e dali parte a maioria das saídas de campo, mas é difícil deitar olho aos chimpanzés.

"Aqui no Boé, por cada cinco saídas, há talvez duas em que os consigo observar. E por vezes só ao longe", descreve Piet.

Daí a extrema utilidade da rede de câmaras de vigilância. A rede foi montada há cinco anos, primeiro em dez locais, hoje abrange 25 e com outras tantas câmaras prontas a entrar em ação, se necessário.

"Não as usamos todas em simultâneo porque não teríamos capacidade para as gerir", explica. Só com o conjunto que está ativo "já há muitas centenas de horas de vídeos acumuladas para ver".

Esta história de observação e preservação da natureza começa com um momento trágico na vida de Piet e da esposa, Annemarie Goedmakers.

David, filho do casal holandês, faleceu inesperadamente em 2006, aos 18 anos, devido a um problema vascular na aorta. Juntos já tinham passado férias na Guiné-Bissau. Annemarie, presidente da Chimbo, bioquímica e ecologista, ainda hoje mostra a foto de David a dormir num ninho de chimpanzé quando tinha 10 anos.

"Já tínhamos a ideia de fazer algo pelo Boé, mas depois de ele morrer, isso ganhou outra força".

Um dos primeiros trabalhos da Chimbo, com financiamento da MAVA -- Fundação para a Natureza, e outros doadores, consistiu num levantamento que permitiu chegar à estimativa de que haja cerca de 700 chimpanzés no Boé.

Nos últimos dois anos, o trabalho tem sido financiado por um dos institutos Max Planck, no caso, o Instituto Para a Matemática nas Ciências, com sede em Leipzig, Alemanha.

A Chimbo está incluída no grupo de pesquisa dedicado exclusivamente aos chimpanzés. "O nosso foco é o chimpanzé. Vemo-lo como uma espécie que é o símbolo de todo um meio-ambiente importante e com benefícios para as pessoas que aqui vivem", conclui Piet.

LFO // EL
Lusa/fim

[ Seleção / revisão e fixação de texto / negritos, para efeitos de publicação neste blogue: LG]
__________

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23627: (In)citações (220): Homenageando os bravos do Batalhão de Comandos da Guiné (Raul Folques, em 15/4/2010, na sessão de lançamento do livro do Amadu Djaló, "Comando, Guineense, Português")

 

Lisboa > Museu Militar > 15 de Abril de 2010 > Lançamento do livro do Amadú Bailo Djaló, "Comando, Guineense, Português" (edição da Associação dos Comandos, 2010, ). Intervenção do cor inf 'comando' na situação de reforma ef Raúl Folques (n. 1939, em Vila Real de Santo António).

Vídeo (8' 43''): © Luís Graça (2010). Alojado em You Tube > Nhabijoes (conta do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné) (*)


1. Raúl Folques, com o posto de major, e de acordo com a nota biográfica da Wikipédia,  foi o último comandante do Batalhão de Comandos da Guiné, antes do 25 de Abril de 1974, mais exactamente entre 28 de Julho de 1973 e 30 de Abril de 1974, tendo sido antecedido pelo major Almeida Bruno (2 de Novembro de 1972 a 27 de Julho de 1973), e imediatamente seguido pelo Cap Matos Gomes (1 de Maio a 12 de Junho de 1974).  

 Estes três oficiais, juntamente com o cap pára António Ramos, foram os únicos europeus a participar, com os militares do Batalhão de Comandos da Guiné (a três companhias, a 1ª, a 2ª e 3ª CCms Africanos), e o Grupo Especial do Marcelino da Mata, na célebre Op Ametista Real, de assalto à base do PAIGC em Cumbamori, no Senegal, em 19 de Maio de 1973, e cujo sucesso permitiu aliviar a pressão sobre Guidaje. Nessa dramática operação, o major Folques foi ferido. Os números oficiosos apontam para 9 mortes, 11 feridos graves e 23 ligeiros, do ladfo das NT.(**)

O Amadu Djaló, no seu livro de memórias, deixou-nos  um testemunho de grande intensidade dramática, sobre esta operação, e nomeadamente sobre a retirada dos comandos africanos até Guidaje e depois até Bigene, já aqui publicado no nosso blogue. (***)

Merece ser recordada aqui a intervenção do cor inf 'comando' ref Raúl Folques por ocasião do lançamento do livro do nosso saudoso Amadu Djaló (Bafatá, 1940-Lisboa, 2015), num vibrante cerimónia realizada há mais de 12 anos no Museu Militar, em Lisboa, 15 de abril de 2010. (*)

Cnco anos depois o Raúl Folques seria condecorado com o  Colar de Grande Oficial da Ordem Militar da Torre e Espada (****)., 

Na altura, o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, no Regimento de Comandos, na Carregueira,  disse, a seu respeito o seguinte

(...) "O Coronel Folques é um algarvio de Vila Real de Santo António, que deixou o liceu aos 13 anos para vir frequentar o 3.º ano do Colégio Militar, aí permanecendo até ingressar na Academia, onde concluiu, em 1961, o Curso de Infantaria.

Fez parte dos militares que estiveram na origem e integraram as primeiras forças “Comando”, unidades de elite do Exército adaptadas à natureza e às exigências do ambiente operacional de África.

Nas quatro comissões que cumpriu, três em Angola e uma na Guiné, demonstrou ser um Soldado de exceção, exemplo maior de coragem, sangue-frio e serena energia debaixo de fogo. Um líder que todos estimavam e admiravam. 

 (...) Condecorado por feitos extraordinários em campanha, dando provas de elevada coragem física e grandeza moral, o Coronel Folques é um homem de bem, de carácter impoluto e altamente prestigiado entre os seus pares. Serviu Portugal com distinção, total desprendimento e a simplicidade dos grandes.
Militares,

(...) Manifestamos hoje o nosso reconhecimento a um Oficial de excecional craveira cujo exemplo deverá constituir fonte de inspiração para as gerações futuras, porque a Pátria em que nos revemos foi e será sempre determinada pelo querer, pela dedicação e pela coragem dos Portugueses.

Como Presidente da República, associo-me com todo o gosto a esta homenagem a quem, como o Coronel Raúl Miguel Socorro Folques, pautou a sua vida pelo culto da Pátria, da honra e do dever. É este homem e este militar que o Comandante Supremo das Forças Armadas distingue com a mais alta condecoração do Estado, a da Ordem da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito. (...)"

2. O Raúl Folques tem 20 referências no nosso blogue. Não integra a nossa Tabanca Grande embora o seu amigo e camarada Virgínio Briote já o tenha convidado. O convite continua de pé. A sua presença, sob o nosso poilão, honrar-nos-ia a todos.  É membro da Magnífica Tabanca da Linha.

Recordamos aqui hoje a sua intervenção na festa do Amadu Djaló, em vídeo que voltamos a reproduzir, e que os nossos camaradas que chegaram mais tarde ao blogue, não tiveram oportunidade de ver e ouvir.  

É uma homenagem ao Amadu Djaló e aos demais bravos comandos do Batalhão de Comandos da Guiné, alguns dos quais tiveram um  miserável destino às mãos dos seus cobardes algozes, ao tempo do regime de Luís Cabral. (*****)

_________


(**) Vd. poste de 18 de junho de 2022 > Guiné 61/74 - P23364: Guidaje, Guileje, Gadamael, maio/junho de 1973: foi há meio século... Alguém ainda se lembra? (5): um "annus horribilis" para ambos os contendores: O resumo da CECA - Parte IV: Op Ametista Real, de 17 a 21 mai73, destruição da base de Cumbamori, no Senegal


(*****) Último poste da série > 13 de setembro de  2022 > Guiné 61/74 - P23614: (In)citações (219): Reflexão (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68)

domingo, 27 de março de 2022

Guiné 61/74 - P23118: Ser solidário (244): Coro Municipal e população da Lourinhã, 27 de março de 2022, 11h00: Orar pela paz na Ucrânia



Vídeo (3' 36'') > You Tube > Luís Graça (2022)

Lourinhã, 27 de março de 2022: Coro Municipal da Lourinhã, dirigido pelo jovem, talentoso e polivalente maestro Carlos Pedro Alves, com a colaboração da população local, interpreta o cânone de W. Mozart "Dona Nobis Pacem" (Dai-nos a Paz).

A vila estremenha, "capital dos dinossauros", associou-se deste modo a outras vilas e cidades europeias que, neste dia, vieram às ruas com os seus coros orar pela paz na Ucrânia.

O coro interpretou também, entre outras, a famosa e sublime canção alpina “Signore delle cime”, composta em 1958 pelo italiano Giuseppe de Marzi. 



Vídeo (1' 24'') > You Tube > Luís Graça (2022)


Signore delle cime (1958) > Letra:

Dio del cielo, Signore delle cime,
Un nostro amico hai chiesto alla montagna.
Ma ti preghiamo, ma ti preghiamo:
Su nel Paradiso, sul nel Paradiso
lascialo andare per le tue montagne.

Santa Maria, Signora della neve,
Copri col bianco soffice mantello,
Il nostro amico, nostro fratello,
Su nel paradiso, su nel paradiso
Lascia lo andare per le tue montagne.

Dio del cielo, l’alpino chè caduto,
Ora riposa nel cuor della montagna.
Ma ti preghiamo, ma ti preghiamo.
Una stell’alpina, una stell’alpina
Lascia cadere dalle tue montagne.

quarta-feira, 14 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22101: Dignidade e Ignomínia (Episódios do Meu Serviço Militar) (Fernando de Sousa Ribeiro, CCAÇ 3535, Angola, 1972/74) - Capítulo extra: uma operação helitransportada

Foto nº 1 > Um helicóptero Puma, SA-330, de fabrico francês


Foto nº 2 > Um jato F-84 Thunderjet, de fabrico norte-americano, sendo abastecido de combustível na Base Aérea 9, em Luanda.  Esta aeronave, em concreto, pode ter atuado na operação ao Quiuanda.

 


Foto nº 3 > Um avião Dornier DO-27, de fabrico alemão 



Foto nº 4 > Um helicanhão idêntico ao utilizado no ataque ao Quiuanda 




1. Mensagem de Fernando de Sousa Ribeiro [,ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535 / BCAÇ 3880 ( Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74);  membro da Tabanca Grande desde 11 de novembro de 2018, com o nº 780; tem  cerca de 2 dezenas de referências no nosso blogue: é engenheiro electrotécnico reformado; vive no Porto; é autor do livro, inédito, em formato digital "Dignidade e Ignomínia: Episódios do Meu Serviço Militar", de que se publicaram seis partes ou postes  no nosso blogue]

 

Data - 28/03/2021, 02:44
Assunto - Capítulo extra do meu livro

Caro Luis,

Quando há três meses vi pela primeira vez o filme que está ao cimo do blog da CCav 2692, do BCav  2909 (http://ccav2692susaeles.blogspot.com/), senti um arrepio na coluna, como se esta fosse percorrida por uma corrente elétrica. «Eu estou ali!», pensei, espantado. Não estava, mas vivi uma situação que foi em tudo igual à que está documentada naquele filme, tal e qual.

O filme não tem nada de especial, de modo nenhum, apenas mostra uns helicópteros em Zemba e alguns militares a embarcarem num deles, enquanto outros militares observam, cheios de curiosidade. Se algum interesse o filme possui, é o próprio facto de existir, dado que há pouquíssimos filmes sobre a guerra colonial. Mas este filme não mostra tropas em ação nem nada, não tem interesse absolutamente nenhum. Pessoalmente, sim, o filme interessa-me imenso, pois dois anos mais tarde eu fui protagonista de uma cena parecidíssima com a documentada no filme.

Eu tinha começado um esboço de capítulo para o meu livro virtual, sobre uma operação helitransportada que comandei em Zemba, mas não consegui conclui-lo, Não consegui concluir o capítulo, mas deixei ficar o seu rascunho no computador. Após visualizar o filme, decidi escrever o resto que faltava ao capítulo, completando-o e complementando-o. Acho que agora posso dar o capítulo por concluido, finalmente, e remeter-to. Faz dele o que quiseres.

Um abraço e votos de feliz Páscoa (se o coronavírus deixar)

Fernando de Sousa Ribeiro

 

AS LÁGRIMAS DE UM SOLDADO

por Fernando de Sousa Ribeiro

Quando me comunicaram que eu iria comandar uma operação militar helitransportada, não entrei em pânico, mas pouco faltou. «Como é que se comanda uma operação helitransportada?», pensei eu, sobressaltado. «Nunca me ensinaram!» 

Passei mentalmente em revista o Curso de Oficiais Milicianos que frequentei em Mafra e concluí que ninguém, em momento algum, me ensinou fosse o que fosse que estivesse relacionado com operações deste tipo. «Porque não entregam o comando da operação a alguém que tenha um mínimo de conhecimentos sobre o assunto?», interroguei-me ainda, mas logo me apercebi de que em todo o batalhão não havia um só capitão ou alferes nessa situação. Todos eles pareciam saber tanto como eu, ou seja, nada. Quis o acaso que fosse a mim, e não a outro, que calhasse a responsabilidade do comando daquela operação. 

Pouco a pouco, fui-me tranquilizando a mim mesmo, concluindo que tudo iria correr bem, pois a sorte que sempre me acompanhara na guerra, o instinto de sobrevivência e a intuição me iriam valer nessa operação, como já me tinham valido em operações anteriores. Quaisquer que fossem as dificuldades que me viessem a surgir, eu iria conseguir resolvê-las e tudo iria correr da melhor maneira possível. Sempre assim tinha sido e com certeza assim voltaria a ser mais uma vez. Quando embarquei no helicóptero que me iria largar nas proximidades do objetivo, já eu me sentia relativamente confiante e decidido a enfrentar as dificuldades que me viessem a aparecer. 

A operação foi muito mais fácil do que eu tinha imaginado. Foi, incomparavelmente, a menos cansativa de todas as operações militares que fiz, e também foi, sem qualquer sombra de dúvida, uma das menos arriscadas. Esta operação teve como objetivo uma base da FNLA chamada Quiuanda, situada muitos quilómetros a norte de Cambamba, e nela participaram dois grupos de combate da minha companhia: o 2.º grupo, que era o meu próprio, e o 4.º grupo, que era comandado pelo alferes miliciano Peixoto. 

A operação decorreu entre 20 de abril (Sexta-Feira Santa) e 22 de abril (Domingo de Páscoa) de 1973. A partida para a operação foi em tudo idêntica à que está documentada no vídeo existente no endereço de internet que a seguir se indica e que recomendo seja visto em ecrã inteiro, dada a pequenez da imagem publicada. Este vídeo foi feito precisamente em Zemba, mas no ano 1971, e mostra a partida para uma operação helitransportada feita por militares pertencentes ao batalhão que nessa ocasião se encontrava sediado lá, o Batalhão de Cavalaria 2909. 

As cenas que nós protagonizamos em 1973 foram iguaizinhas às filmadas em 1971, tal e qual: o mesmo quartel do mato, o mesmo alvoroço dos militares do batalhão perante a presença inusitada de helicópteros na pista, as mesmas serras envolventes, as mesmas florestas, as mesmas nuvens baixas no início da manhã, a mesma dissipação da névoa com o avançar do dia, o mesmo embarque de tropas, os mesmos volteios dos helicópteros no ar, enfim, tudo se passou de forma rigorosamente igual ao que se vê no filme. Só os protagonistas foram diferentes. De facto, foram muito diferentes; no filme só se veem europeus, enquanto o meu batalhão era multirracial. O filme está no endereço seguinte:


 [Vídeo, 2' 25'': vd. em ecrã grande]

Fomos levados "ao colo" por helicópteros Puma [, Foto nº 1,] até às proximidades do objetivo. Estes helicópteros eram grandes e muito fechados. Embarquei no primeiro que levantou de Zemba e à chegada fui um dos primeiros militares a saltar do aparelho que ficou a pairar a cerca de metro e meio de altura do chão, com a intenção de dirigir a colocação no terreno dos meus homens. 

À medida que eles iam saltando, eu encaminhava-os de maneira a formarem uma ampla circunferência em volta do local do desembarque, deitados no solo e com as armas apontadas para fora. Ainda hoje não sei se era assim que eu devia proceder; fiz o que me ocorreu naquele momento. Ao mesmo tempo que saltávamos dos helicópteros, diversas aeronaves da Força Aérea faziam fogo à nossa volta, provocando uma barulheira infernal. 

Fui tomado de uma enorme euforia, que só com muito custo consegui refrear, porque me senti invencível, rodeado que estava por um tão grande poder de fogo. Eu estava no meio de um inferno, mas o inferno era "bom", porque me protegia. Confesso que tive muita dificuldade em conseguir dominar-me e tomar consciência da real situação em que estava. 

As aeronaves que evolucionavam à nossa volta eram jatos F-84 [, Foto nº 2], um avião a hélice DO-27 [Foto nº 3] e um helicanhão, o qual consistia num helicóptero Alouette III possuindo um pequeno canhão MG-151 montado a bordo [Foto nº 4].

Os rebentamentos dos rockets lançados pelos aviões e as rajadas do helicanhão faziam um barulho ensurdecedor. Este barulho durou até ao momento em que o último dos meus homens saltou para o chão. Então, todas as aeronaves se calaram e partiram de regresso a Luanda, deixando-nos sozinhos no terreno. Ordenei logo ao meu pessoal que se levantasse e se preparasse para partir. Dirigimo-nos imediatamente para a base que deveríamos destruir. 

Apesar de ter uma certa importância estratégica, a base de Quiuanda era pequena e não justificava um tão grande poder de fogo por parte da Força Aérea. Os poucos guerrilheiros que deviam guarnecer a base puseram-se em fuga antes de entrarmos nela. Encontramos a base vazia de gente. 

Os guerrilheiros deviam ter sido apanhados de surpresa pelo ataque, pois deixaram pequenas fogueiras acesas com latas cheias de água em cima, em jeito de cafeteiras, provavelmente para prepararem o pequeno-almoço, em Angola chamado mata-bicho. Os guerrilheiros e a população que os apoiava costumavam reaproveitar as latas vazias e as colheres de plástico das rações de combate que a tropa portuguesa abandonava na mata durante as operações. 

Foto nº 5 
No centro da base estava hasteada uma bandeira da FNLA, que um militar que não consegui identificar,  retirou. Julguei que ele mais tarde me iria entregar a bandeira, para juntar ao restante espólio da operação, mas tal não aconteceu. O militar ficou com ela. [Foto nº 5 > Bandeira da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA)] 

Depois de termos destruído a base, saímos dela por um trilho, a fim de explorarmos a região envolvente. Mais adiante, na beira do caminho, encontramos uma mulher morta, sem metade da cara. Era evidente que ela tinha sido abatida pelo apontador do helicanhão. As balas disparadas pela arma montada a bordo desta aeronave costumavam ser de ponta explosiva. Uma bala deve ter atingido a mulher na cara, abrindo-lhe um horrendo buraco de ossos estilhaçados e sangue. 

O soldado Domingos Cangúia, que era natural do Cuanza Norte e era íntegro e puro como poucos, chorou convulsivamente a morte gratuita daquela desgraçada mulher, a quem até a vida foi tirada. Dizia o generoso soldado, entre soluços: 

— Que mal é que esta mulher fez a quem a matou? Porque foi que ele a matou? Certamente ela tinha filhos pequenos. O que vai ser agora dos filhos? 

E chorava inconsolavelmente. Há cenas que ficam gravadas na nossa memória como ferro em brasa. Para mim, esta foi uma delas. 

___________

Nota do editor:

Último poste da série > 15 de outubro de 019 > Guiné 61/74 - P20241: Dignidade e Ignomínia (Episódios do Meu Serviço Militar) (Fernando de Sousa Ribeiro, CCAÇ 3535, Angola, 1972/74) - Parte VI: Não aos crimes de guerra: os bravos não são cruéis e os cruéis não são bravos

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Guiné 61/74 - P21945: Fotos à procura de... uma legenda (144): Era uma vez um macaco do Cantanhez... Dão-se... "alvíssaras" a quem acertar no nome...


Foto nº 1


Foto nº 1A

Era uma vez, um macaco do Cantanhez...

Foto: Mikko Pyhälä (c. dez 1970 / jan 1971), "Estudantes da escola Areolino Cruz",



1. Caros/as leitores/as: O desafio é simples: de que espécie é este macaco que aparece na foto de um grupo de miúdos da "Escola Areolino Cruz" ?

A única dica que vos damos é sobre o seu habitat, na Guiné-Bissau: o Cantanhez, na região de Tombali, no chão dos nalus...

Dão-se... "alvíssaras", a quem acertar. Na legenda original, o fotógrafo chamou-lhe "vervet monkey", em inglês, mas a nós fica-nos a dúvida... Pela cor da pelagem, não nos parece que seja  um "macaco verde"... Mas o fotógrafo, finlandês, deve ter anotado a designação dada pela população local...

Estamos mais inclinados para outra espécie, de pelagem laranja avermelhada a laranja esbranquiçada... É pena estar de perfil, não se vendo bem a cara e a cabeça... Era fundamental ver-se a cara do nosso parente afastado, mas tão primata como nós... Vê-se que a cauda é longa, escura, cor vermelho ferruginosa...

Há uma outra foto (nº 2), em que se vê melhor a cara do animal... E pela imagem vê-se que não é macaco-cão nem fatango (que era a nossa primeira hipótese)...

Quem sabe como se chama a espécie ? Nome em português e em crioulo? E o nome científico? 

Pode ser que algum/a primatólogo/a nos ajude... Para saber mais, procurar aqui, está cá a resposta:

Guis dos Mamíferos do Parque Nacional do Cantanhez, da autoria de Nicolas Bout e Andrea Ghiurghi (2018, 189 pp., AD - AIN - IBAP - IUCN, ISBN: 9788890894923).



Foto nº 2

Foto: Mikko Pyhälä (c. dez 1970 / jan 1971), "Estudantes da escola Areolino Cruz"... Trata-se de um macaco verde, diz o fotógrafo



"Escola Areolino Cruz" > c. dez 1970/ jan 1971 > Pormenor da foto nº 1 (acima):
um dos miúdos segura uma brochura ou revista cuja capa ostenta o título "Les Etudiants Arabes Révolutionnaires" [Os estudantes árabes revolucionários]... É seguramente uma oferta da delegação da União dos Estudantes Internacionais, de que faziam parte, além do finlandês Mikko Pyhälä, um representante polaco e um um outro, venezuelano. À consideração do Jorge Araújo, e para uma eventual análise crítica detalhada do seu conteúdo: há um vídeo a cores, feito pelo finlandês, sobre essa visita. Disponível aqui. A cores. Infelizmente,  sem som  (26' 12'').


2. A foto [nº 1], acima, é de Mikko Pyhälä, hoje um conhecido diplomata finlandês, reformado, e grande admirador de Amílcar Cabral, da sua vida e obra.  Nascido em 1945, fez uma visita, a convite do PAIGC, a Conacri e ao Cantanhez, integrando uma missão da União Internacional de Estudantes [UIE], em finais de 1970 e princípios de 1971. 

Teve depois um papel importante na organização da visita de Amílcar Cabral à Finlândia em 1971, evento que contribuiu para um mudança da política externa do seu país em relação a Portugal. Seguindo o exemplo dos seus vizinhos escandinavos, a Suécia e a Noruega, a Finlândia passou também por dar "apoio humanitário", a partir de 1972, aos movimentos de libertação africanos, incluindo o PAIGC.

Em 1972, o  Mikko Pyhälä entrou na carreira diplomática.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21607: Boas Festas 2020/21: em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (1): Da Lapónia sueca, um vídeo da comuna de Jokkmokk, centro cultural e político do povo sami, mostra-nos o seu histórico mercado de inverno, que se realiza todos os anos, desde 1605, com temperaturas a rondar os 25 graus negativos (José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia)

 

You Tube > tinmar4 > Vídeo (11' 52'') > Tradições do povo sami: o mercado de inverno de Jokkmokk (2012) (o filme não tem legendas, nem precisa, mas talvez o José Belo nos  possa fazer um resumo mais alargado ...). Produção da comuna de Jokkmokk. [Ver, de preferência, em écrã inteiro.]

(Reprodução com a devida vénia...)


O mercado de inverno de Jokkmokk realiza-se todos os anos em Norrbotten, no norte da Suécia. É uma mostra  das tradições do povo desta região. Além do mercado, há diversos eventos lúdicos, tais como corridas de renas, trenós puxados por cães, música e arte...

Norrbotten é um condado, o mais a norte da Suécia, com mais de 98 mil quilómetros quadrados e cerca de 250 mil habitantes. A parte norte de Norrbotten fica dentro do Círculo Polar Ártico .A capital é Luleå (c. 48 mil habitantes)- Kiruna é outras das cidades importantes, 

Jokkmokk fica a 10 km a norte do Círculo Polar Ártico. Tem cerca de 3 mil habitantes, e é sede do município (ou comuna) de Jokkmokk. É o centro cultural e polítcio do povo sami. O Mercado de Inverno de Jokkmokk, realiza-e anualmente em fevereiro, desde 1605. Atrai cerca de 50 mil visitantes. A temperatira na época ronda em médis os 25 graus negativos.  Em 2021 será de 4 (quinta feira) a 6 (sábado) de fevereiro... com ou sem Covid.



Fotograma do vídeo com o mapa do condado de Norrbotten e a localização da cidadezinha sami de Jokkmokk.



José Belo. membro da Tabanca Grande 
desde 2009

1. Mensagem de José Belo [, régulo solitário da Tabanca da Lapónia que, ao longo destes 9 meses da pandemia de Covid-19, tem sido um camarada extraordinário, acompanhando. de maneira proactiva,  criativa, tolerante e... que sempre bem-humorada,  a produção do nosso blogue, através quer dos seus frequentes emails, quer dos seus postes e comentários;  obrigado, Zé!... ]

Com membros da Tabanca Grande, como o Zé Belo (o único português a viver no círculo polar ártico), a gente vai seguramente sobriver à Covid-19... E não queremos que ninguém morra. muito menos na praia!

E mais: prometemos fazer tudo para ficar por cá mais uns aninhos!... Neste nosso "chão". muito especial, que não paga IMI...Onde todos cabemos com tudo o que nos une e até, às vezes, com aquilo que nos pode separar...

Aguardamos, entretanto,  outras "prendinhas" dos amigos e camaradas da Guiné (vídeos, fotos, infografias, contos, poemas, cartas, etc.) para animar esta nova série e pôr na árvore de Natal da Tabanca Grande... 
~
Estamos sempre a dizer que a Tabanca Grande tem 822 membros, entre vivos e mortos, mas às vezes até parece que já lerpámos todos!...Amigos e camaradas da Guiné, o Natal de 2020 é uma boa ocasião para fazermos a "prova de vida", anual... Vamos acender as luzinhas de todas as nossas tabancas!...E haveremos de fazer, em 2021, o nosso Encontro Nacional... com "manga de ronco"|... Malta, vão já estendendo o braço para a "bacina"...mas até lá nada de baixar a guarda!... LG



De: José Belo
Data - 23 nov 2020 11h32
Assunto - Uma “fuga” ao isolamento social lusitano

Caro Luís

Ao longo de já bastantes anos tenho tentado fazer chegar aos Camaradas e Amigos alguns dos aspectos por aí menos conhecidos das realidades na Lapónia sueca e na Escandinávia em geral.

Mais de quatro décadas de vivências locais têm-me tornado observador atento.
Por vezes crítico mas,ao mesmo tempo...grato.

Comparando com outras sociedades e outras gentes, a que estou ligado tanto profissionalmente como, e não menos importante, residencialmente, surge a tal “gratidão” por muitas das realidades sociais suecas.

Neste difícil momento de restrições, isolamento, e outras medidas de sobrevivência à pandemia, encontrei este vídeo do YouTube entre material do meu arquivo.

Foi realizado pela Comuna (nome aqui dado às Câmaras Municipais) de Jokkmokk com o fim de divulgar um mercado de inverno numa pequena cidade do noroeste da Lapónia sueca.

Mais do que um milhão de palavras deste mui limitado “escriba”, o vídeo consegue transmitir todo um ambiente e maneira de “estar” locais.

Em alguns dos detalhes filmados quase, quase, quase se poderia encontrar algumas semelhanças com mercados locais lusitanos.

Creio ser apropriado para a época natalícia que se aproxima a passos largos, ajudando a seu modo,no seu exotismo,  para olhares desde a Ibéria,a uma saudável fuga momentânea das preocupações ligadas à pandemia.

Deverá ser visto em ecrã  total pois torna mais fácil a participação do observador.

Um grande abraço do J.Belo

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21454: (Ex)citações (376): As nossas comuns raízes telúricas, do Nordeste Transmontano à Estremadura e ao Alentejo (Francisco Baptista / Fernando Gouveia / José Belo / José Colaço / Luís Graça)


Lourinhã > Ribamar > Valmitão > 18 de Julho de 2009 > Dia de acender o forno a lenha, amassar a farinha, enfornar e cozer o pão de trigo feito da farinha do moleiro... o delicioso pão de trigo da nossa infância.

Ainda hoje há famílias que cozem o seu próprio pão, no concelho da Lourinhã, Estremadura, como esta, a família do Ramiro Caruço e a Rosa, meus primos da grande família Maçarico... Voz off de Luís Graça, Alice Carneiro, Ramiro Carruço e a neta do casal.

Vídeo (2' 51''): © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados


Capa do livro do Francisco Baptista, natural de Brunhoso, concelho de Mogadouro, Nordeste Transmontano,  "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o Capim Ardia" (Edição de autor,  2019, 388 pp.)

1. Seleção de comentários ao poste P21429 (*):, da autoria do nosso camarada Francisco Baptista [ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72) (**):


(i) Luís Graça:

Francisco, ainda não tive acesso ao teu livro... Gostava de ter as tuas crónicas de Brunhoso em letra de forma... Mas continuo a adorar os teus textos, aqui publicados, ricos, socioantropologicamente falando... (Só sobre Brunhoso temos quase três dezenas de referências, puseste a tua terra no mapa.)

Só conheci Trás-os-Montes depois do 25 de Abril. Antes, os portugueses não viajavam "cá dentro" , era escassa a mobilidade, a não ser para para as elites, que no Verão faziam as termas ou iam para os Algarves e demais praias do litoral...

Como casei com uma "moçoila" do Norte, tive acesso a algum dos "saberes" (e "sabores") que referes no teu texto (*): em Candoz, na fronteira do concelho de Marco de Canaveses com Baião, Resende e Cinfães, a despensa chamava-se "loja", a parte térrea, mais baixa da casa, muitas vezes escavada na rocha de granito, e com chão de "saibro", sempre fresca no verão...

Era lá que se fazia o vinho tinto verde, no lagar, se pendurava e desmanchava o porco, se guardava o presunto e as demais partes do porco, que era morto em geral no Natal / Ano Novo... (Morto atado no carro de bois, uma espetáculo cruel para os putos!)

O frigorífico chamava-se "salgadeira", uma enorme arca, de madeira de pinho bravo, cheia de sal, responsável por muitas mortes por AVC e cancro no estômago ao longo de gerações... Era lá que se guardava o "governinho" da dona de casa: por exemplo, o "presunto verde", o que não ia ao fumeiro... Era lá que o vinho verde tinto "fervia" nos pipos de carvalho: de baixo teor alcoólico, aguentava-se até maio...O branco, feito em bica aberta, esse, engarrafava-se, era para os "fidalgos" e para os dias de festa...

Fazia-se também o "bagaço", que se guardava em garrafões de 10 e 20 litros, empalhados... Houve uma época em que se produzia e vendia livremente para as tascas do Porto...que o batizavam com água do rio...

Mas no Douro Litoral, o "frigorífico" também eram as "minas", onde durante a II Guerra Mundial se escondia o milho, para evitar as "requisições" do Goveno, na época do racionamento...

Não, não havia o fabuloso pão de centeio e trigo da tua terra, apenas a enome "broa" de milho que se cozia todas as semanas... Também nas "minas" se guardava o sável e a lampreia, na sua época.. (Na minha, zona, Lourinhã, província da Estermadura, cozia-se o pão de trigo, feito da farinha do moleiro; e o melhor era o do trigo barbela.)

Eu vivi a minha infância  na "vila", sede de concelho, mas com contacto regular com a aldeia da minha mãe, que era o Nadrupe, a escassos três quilómetros: os meus tios era pequenos lavradores dores, matavam o porco, fazia vinho, tinham frutas e legumes, criação doméstica, patos, coelhos, galinhas, perús...Um tio, da Quinta do Bolardo, caçava: não nos faltavam coelhos, perdizes e até lebres. Mas também tinham acesso, os da aldeia, aos recuros do mar, ali a escassos quilómetros: a sardinha, o chicharro, o carapau, a "arraia"... E toda a gente era recoletora de moluscos  e mariscos: a lapa, o mexilhão, o ouriço do mar, o polvo, a navalheira, a sapateira...

Não, na minha terram à beira mar, não se fazia presunto, nen salpicões, como em Candoz ou em Brunhoso, porque o clima marítimo era inimigo do fumeiro... Fazia-se, isso, sim os "chouriços de carne", os "chouriços de sangue"...Tal como em Leiria, também se fazia a "morcela de arroz", se bem me lembro... Com sangue de porco...

Todas as casas da aldeia tinham, além da residência da família, uma adega, um logradouro ou quintal com "estrumeira", e anexos agrícolas (com lugar  para a carroça, e os animais de tração: o burro, o macho, o cavalo), barraco para a lenha, etc.... E, claro, dentro ou fora da cozinha, o grelhador e o  forno de cozer pão... (e nos dias de festa, assar o borrego, o cabrito, o perú, o galo...). No inverno, comia-se a batatada com peixe seco, uma tradição mais ribeirinha e piscatória... Mas nas aldeias também se deixava o caparau, o chicharro e a raia a secar, no telhado, ou no estendal da roupa...

Mas cedo, nos anos 60, começou a generalizar-se a mecanização da lavoura: veio a motocultivadora, o trator,a motorizada,  e depois a eletricidade, o frigorífico, a casa de banho, etc. Cozia-se o pão de trigo, todas as semanas, ainda não havia o "pão de plástico",o horrível papo-seco ou o "pão de carcaça" que só tinha alguma graça quando se comprava, quentinho, na padeira da vila... Em todas as aldeias, havia dois, três ou quatro ou até mais moinhos de vento..As "panificadoras" industriais (reunindos os pequenos padeiros artesais) só começam a aparecer em meados dos anos 60..

Depois as grandes vinhas e as grandes searas de trigo desapareceram... E a nossa paisagem rural modificou-se profundamente. A partir dos anos 60, quando fomos para a tropa e para a guerra, nada seria mais como dantes...

Resumindo: temos, Francisco, uma grande dívida para contigo por seres o grande cicerone de Brunhoso do teu tempo de menino e moço, e nos ajudares a redescobrir as nossas raízes telúricas... Muitos de nós, ex-combatentes, nascemos e crescemos em aldeias ou pequenas vilas e cidades, onde a ruralidade ainda estava muito presente... Já lá estive perto de Brunhoso, mas ainda não se proporcionou conhecer a tua linda terra natal... Temos que combinar um encontro...

Saúde e longa vida. Mantenhas. Luís Graça

8 de outubro de 2020 às 22:07

(ii) Francisco Baptista:
 
Luís, o mestre és tu, que fazes uma bela descrição da economia familiar de duas regiões distintas e da forma como conservavam os alimentos.

Na despensa da minha casa, que ainda existe, um pouco alterada, e como menos objectos de museu do que a do meu amigo Zé (*), não se fazia o vinho. O meu pai não herdou nem plantou vinha, bebia pouco mas comprava todos os anos uma pipa em terras de Miranda para dar de beber aos trabalhadores.

Todos os anos se matavam dois porcos, eramos muitos em casa, que eram curados na despensa. Os presuntos estavam algum tempo cobertos com sal grosso e penso que depois com cinza. Quando começavam a ficar rijos eram pendurados do tecto. Nunca se punham no fumeiro como no Minho e Douro Litoral por serem zonas com muita humidade. O frio seco do Inverno e as condições de temperatura permanente da adega "curavam" os presuntos. O tempo de despensa ou adega, o sitio era o mesmo dava qualidade aos alimentos. Recordo -os a todos com gulodice e saudade e quando entro numa ainda guarnecida com alguns desses produtos, como a do meu amigo, parece-me que estou a entrar num lugar sagrado.

Em Trás-os-Montes o clima e a comida dos animais, erva e plantas da horta, davam qualidade aos alimentos, a cozinha transmontana era simples, a posta da vaca. tal como a marrã do porco só precisavam de algum sal quando a assar em boas brasas, as batatas, as cebolas. as vagens e outras hortaliças eram boas e saudáveis. O presunto e o toucinho depois do tratamento inicial ia-se fazendo e melhorando na despensa.

Os grandes pães de trigo e centeio tinham um gosto que já não há, por lá ainda há padarias que fazem grandes pães de trigo, de centeio é raro, com um gosto que se aproxima. O Douro Litoral e Minho têm uma cozinha trabalhada que faz as delícias de qualquer comilão, sei-o bem. a minha mulher é de Viana

A escrita já vai longa, caro Luís, convidava-te para o almoço que talvez te agradasse. Não é trabalhado como gosta a minha cozinheira minhota preferida, é simples à maneira da minha terra. Batatas cozidas com nabiças acompanhadas de alheiras grelhadas. O pão trigo é de Mogadouro. É bom.

Abraço Francisco Baptista

(iii) José Belo:

Caro Amigo e Camarada. (E, ão menos, companheiro na colónia de “férias” que foi a nossa Buba!)

Com os teus textos consegues criar insinuante nostalgia. Não feita das amarguras tão frequentes nos menos jovens como nós, mas antes como calor envolvente surgido de cinzas ainda ardendo.

Sente-se a aceitação, orgulho e interiorização de uma forma de vida que,durante infindáveis gerações acabou por formar mais um dos muito especiais “povos” que constituem a nossa tão diversificada “gente”.

Lisboeta, chico esperto de Estoris e Cascais, vivendo há muitas décadas entre as verdadeiras esquizofrenias que são as abissais diferenças entre as minhas raízes Lusitanas, as tradições e família escandinavas, e a muito especial maneira de olhar (todo o resto!) do mundo desde os Estados Unidos, para mim os teus textos são ...viagens de reencontro.

E,se só por isso,fico-te grato.

Um grande abraço do J .Belo

8 de outubro de 2020 às 07:57

(iv) José Botelho Colaço:

Olá, amigo Francisco Baptista, os hábitos dos nossos antepapassados em parte eram comuns em quase todo o nosso país com pequenas alternativas. DSou um exemplo nas linguíças: a minha mãe era normal não utilizar o azeite, utilizava sim a "manteiga", ou seja, a gordura dos fritos da carne do porco principalmente do lombo e das costelas que,  devido ao colorau ou pimentão,  ficava com um tom rosado a que nós dávamos o nome de "manteiga encarnadinha"... Nessa manteiga metia as linguiças numa panela de esmalte e aí se conservava todo ano sem perder qualidade e até aumentava o paladar. 

Um abraço amigo.

8 de outubro de 2020 às 16:02

(v) Francisco Baptista:

Amigo e Camarada José Colaço: (...) No Nordeste Transmontano, em tempos dei-me conta que nalgumas aldeias davam o tratamento de conservação, que referes aos salpicões e linguiças, penso que nessas terras não se colhia azeite, não sei se seria o caso da tua. 

Tu e grande parte dos que já leram os meus textos sabem que as tradições, os hábitos de vida, a moral e os costumes, os trabalhos duros e a miséria da vida , eram comuns a todas as aldeias por esse Portugal fora. 

Quando falo e valorizo os homens da minha terra, do tempo dos meus pais, será talvez porque cresci num tempo em que Brunhoso teve homens grandes, mas a minha homenagem vai para todos esses homens e mulheres que se sacrificaram tanto para criar a geração de cinquenta, sessenta, setenta
Muito obrigado meu amigo do coração, como dizem os tripeiros.

Francisco Baptista

8 de outubro de 2020 às 19:02

(vi) Fernando Gouveia:

Mais um belo texto,  Francisco. Como deves imaginar, na minha aldeia,  não longe da tua, também tenho uma "adega" semelhante à que tu mostras como a adega do Zé. Muito poderia dizer sobre a minha mas agora foi a tua vez… Só quero referir o que me aconteceu comprovando o que tu contaste em relação ao vinho que,  por não levar conservantes,  se vai estragando e o dono não se vai apercebendo. 

Há uns anos quem me tratava, lá na aldeia, da feitura do vinho, como era normal, parte do vinho era para ele e uma menor quantidade para mim. Nesse ano fui a casa dele, o Sr. Miguel, buscar os garrafões a que tinha direito. Em casa, na primeira refeição, vai de provar o vinho. Era intragável. Peguei nos garrafões e fui devolvê-los ao Sr. Miguel,  adiantando-lhe que o vinho não prestava. Resposta dele: eu ando a bebe-lo e sabe-me bem…

Um grande abraço e continua a escrever.
Fernando

9 de outubro de 2020 às 23:38


(**) 16 de outubro de  2020 > Guiné 61/74 - P21453: (Ex)citações (375): recordando mais trágicos acidentes com minas e armadilhas (Joaquim Sabido, advogado, Évora; ex-alf mil art, 3.ª CART / BART 6520/73 e CCAÇ 4641/73, Jemberém, Mansoa e Bissau, 1974)