Mostrar mensagens com a etiqueta voluntariado. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta voluntariado. Mostrar todas as mensagens

sábado, 6 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19652: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (8): Bom bias, Roberto, Bom bias, seleçom.... Ou as misérias e grandezas do andebol na Guiné-Bissau!

1. Oitava  crónica do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é lisboeta,fezo Liceu Pedro Nunes, é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol, tem fortes ligações à minha terra natal, onde agora vivo, Lourinhã, Oeste, Estremadura...

Chegou a Bissau, a 2 de março de 2019, e aqui vai estar 3 meses como voluntário na Escola Privada Humberto Braima Sambu, no âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo.


Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (8): Andebol... Bon bias (boa viagem)

por Luís Oliveira


O andebol na Guiné-Bissau é um parente pobre do desporto tal como infelizmente acontece em Portugal, onde o futebol é rei e quase sempre pelos piores motivos, mas ser ignorado num país pobre e com muitas dificuldades é muito pior.

O projecto que me encaminhou para a Guiné-Bissau foi a criação de uma “oficina de andebol” na escola privada Humberto Braima Sambú. 


Dado não ter competências nas áreas de educação formal e mesmo no que se refere ao andebol, embora tenha sido praticante, treinador e dirigente, apenas fiz o curso de treinadores do segundo grau vocacionado para a formação de jovens andebolistas, foi esta a forma de dar o meu ínfimo contributo para este povo de quem tanto gosto.

Desde que a minha candidatura foi aceite, tentei actualizar conhecimentos, planeei sessões de treino, contei com a generosidade da D. Ana Maria Cabral, da Associação de Andebol de Lisboa com a doação de materiais que, embora usados, muita utilidade têm aqui, adquiri bolas e pinos destinados ao treino e tudo isto dirigido para escalões de formação Bambis e Iniciados.

Só que para planificar há que ter um conhecimento de todos os factores em análise e das suas variáveis e ignorei que a realidade da população escolar diverge do que estava habituado. Desde o primeiro ao sexto ano do ensino básico na Guiné-Bissau coexistem alunos dos 9 aos 18 anos ou por vezes até mais velhos.

Após quase duas semanas a aguardar o resgate dos materiais enviados de Lisboa, tive a feliz surpresa de ver um grupo a jogar à bola com a mão e dirigi-me de imediato para o campo onde estava a decorrer um jogo, sendo os participantes maioritariamente do sexo feminino.

Após o apito final interpelei os jovens que me pareciam dirigir aquele jogo e fiquei a saber pertencerem a um clube, Academia de Brá. Treinam num campo de reduzidas dimensões, parte integrante de instalações criadas por uma ONG no Bairro Militar .

Conversa de apaixonados pela modalidade levaram a que me convidassem de imediato a cooperar com eles e no dia seguinte às sete da manhã começo o primeiro dia de treinos na Guiné.

Planos de treino dirigidos para Bambis e Iniciados é para ignorar. Aparecem crianças e jovens adultos e há que ser flexível e adaptar à realidade do jogar a bola à mão!

Reorganizámos o horário dos treinos, dois diários das 7.30 às 10.30 e das 16.30 às 18.30, separámos o treino por escalões etários aceitáveis e começou a aventura.

O entusiasmo foi aumentando, a escola privada Humberto Braima Sambú finalmente resgatou os materiais que estavam nos correios e fez uma cerimónia simbólica da entrega destes ao Presidente da Associação de Alunos e passados três dias no treino da tarde aparecem mais de sessenta candidatos a andebolistas de todos os tamanhos e idades. 

Quase entrei em pânico, não podia excluir ninguém, porque o principal propósito do desporto de formação é a inclusão, não tinha materiais nem espaço útil para fazer andebol mas tinha que fazer qualquer coisa e as bolas 00 destinadas a iniciação tinham que acariciar as mão adultas de muitos candidatos.

Reuni com o Edmilsom e com o Yaiai e avançámos. Tivemos de abdicar de alguns candidatos a jogadores que se apresentavam ao treino de chinelos ou havaianas explicando os riscos que eles próprios corriam sem a utilização de calçado adequado, as senhoras foram convidadas a retirar fios e brincos e ainda de aparecerem de unhas cortadas no próximo treino e começamos o que eu comparo a uma viagem de dez pessoas no mesmo táxi.

Tudo devagarinho para ninguém se aleijar no campo cimentado e com barreiras laterais do mesmo material. Aqui ninguém tem seguro e os serviços de saúde são de evitar.

Lá se fez o treino, as bolas foram experimentadas por todos os participantes e toca a reorganizar.

Da Escola Humberto Braima Sambú, apareceram já sessenta e quatro inscrições de interessados que vão dos 10 aos 18 anos (idade que decidimos ser a limite para a actividade), os dois treinos diários passaram a quatro na próxima semana, de modo a não exceder os vinte jogadores por treino e cá vamos passo a passo com a bola na mão.


Andebol... Bon bias II

Roberto Sá, licenciado pela Escola Superior de Educação Física de Bissau com a especialização de Andebol, antigo praticante, treinador e actualmente secretário da direcção Técnica da Federação de Andebol da Guiné-Bissau e quem coordena todo o trabalho da Academia de Brá, pediu-me para no passado domingo, dia 24 de Março estivesse no campo de jogos pelas sete horas. 

Embora não estivesse programada qualquer actividade e sendo o Roberto homem de poucas palavras, anuí sem nada perguntar e lá nos encontrámos à hora marcada. Apanhámos o TocaToca e rumámos ao estádio Lino Correia no centro de Bissau. Tratava-se do treino da selecção feminina da Guiné-Bissau que irá participar num torneio na Mauritânia.

Fiquei muito honrado com o convite mas tive a noção da fragilidade daquela selecção resultante da total ausência de condições de treino e de um calendário competitivo que eleve o nível físico, técnico e táctico exigido a uma seleção representativa de um país.

Durante a semana fomos dialogando sobre o atraso na partida da selecção devido a imensa burocracia da entrega dos passaportes das atletas bem como da inscrição dos vistos, situação que ia preocupando cada vez mais o Roberto. 

A data limite prevista para a partida era hoje, sexta-feira 29 de Março ainda ontem, véspera da partida não estavam concluídos os processos burocráticos e surgiu um novo obstáculo. A selecção não dispunha de equipamentos suficientes para as atletas nem de um alternativo como é obrigatório. O equipamento existente tinha sido oferecido há dez anos à Federação pelo comité olímpico e a partir daí mais nenhum apoio foi concedido.

O Roberto já tinha pedido um equipamento de guarda redes ao Romário, Presidente da Associação de Alunos da Escola Humberto Braima Sambú, mas a única solução expedita para resolver o problema era a utilização de um dos muitos equipamentos doados pela A.A.L. e telefonámos ao Romário que se reuniu connosco no campo enquanto decorria o treino. O jovem que já tinha cedido um equipamento de guarda redes mostrou-se relutante e solicitou uma carta formal da Federação para reunir com os restantes membros da direcção e decidirem o empréstimo.

Eu não queria acreditar!

A Federação não tem secretaria, não tem computador nem impressora e só estas limitações inibiam a apresentação da carta exigida antes da data de partida.

Eu tinha criado uma folha de requisição para controle da utilização materiais e equipamentos e achava ser suficiente a utilização desse documento ficando a responsabilidade de entrega por parte da Federação...mas não! 

Pela primeira vez desde que cheguei à Guiné-Bissau utilizei o meu mais vernáculo vocabulário de caserna o que deixou os interlocutores surpreendidos. Os equipamentos tinham sido cedidos gratuitamente, o custo suportado na expedição corresponde a cerca 550.000 F (850,00 €) eu próprio contribuí com cerca de 40.000 F (65,00 €), a escola tem roupa para equipar dez equipas de andebol sem ter tido praticamente qualquer custo mas o vício da burocracia que contagia e atrasa este povo sobrepunha-se ao dever patriótico de apoiar a seleção do próprio País!

Sugeri uma carta a entregar posteriormente com os equipamentos requisitados, a agradecer a amabilidade da escola, mas a coisa mantinha-se num impasse e eu já sugeria que as miúdas jogassem em calcinhas e soutien com o número escrito a marcador nas costas para vergonha de todos os que amarraram a equipa a tal situação.

O Roberto entretanto fazia telefonemas com uma serenidade que admiro e invejo e passado quase uma hora apareceu o Mário Jorge, também técnico da Federação com a tal missiva. Sorte o Mário Jorge ser polícia e estar de serviço na esquadra do Bairro Militar e aí dispor do necessário para o efeito.

Os equipamentos, guardados num contentor comercial de um familiar do professor Humberto, dado a escola não reunir condições de segurança para o efeito, lá foram entregues e mais um obstáculo ultrapassado e o equipamento alternativo da seleção da Guiné-Bissau ostentará o emblema da Associação de Andebol de Lisboa.

O Roberto Sá é um herói, há onze anos que rema para manter vivo o Andebol na Guiné-Bissau. O seu amor pela modalidade arrastou vários jovens que com ele há sete anos trabalham no processo de formação de jogadores, alguns pagando 400 Fancos por dia em deslocações em TocToc para o Bairro Militar, são um exemplo de resiliência, de esforço pessoal com uma motivação que resulta apenas do seu grande amor pela modalidade.

Hoje pelas 11.00 horas tive um telefonema do Roberto, o homem de poucas palavras.

-Luís,  o stress está a passar, vamos agora partir para a Mauritânia.

Vão de autocarro! Chegar ao norte da Guiné-Bissau já é uma viagem penosa devido ao estado deplorável das estradas, depois Senegal, a seguir Gâmbia e por fim lá chegarão à Mauritânia.

Independentemente dos resultados, o esforço de participar é inimaginável para os Europeus. A burocracia, a ausência de materiais e a inacreditável viagem de autocarro já faz esta equipa campeã.


Bom bias, Roberto, Bom bias, seleçom.

A minha homenagem e todo o meu respeito e admiração para:

Roberto Sá
Mário Jorge
Edmilson
Virgito
Yáia
Dona

Bissau, 29 de Março de 2019

______________

Nota do editor:

Último poste da série > 25 DE MARÇO DE 2019 > Guiné 61/74 - P19620: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (7): O futebol e não só... O futebol faz parar a cidade... E se as mulheres guineenses parassem ?... Mais de metade da população morreria de fome.

segunda-feira, 25 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19620: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (7): O futebol e não só... O futebol faz parar a cidade... E se as mulheres guineenses parassem ?... Mais de metade da população morreria de fome.






Guiné-Bissau > Bissau > Março de 2019 >  As alegrias e as tristezas do futebol...


Fotos (e legendas): © Luís Oliveira (2019) . Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).

1. Sétima crónica do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é lisboeta,fezo Liceu Pedro Nunes, é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol, tem fortes ligações à minha terra natal, onde agora vivo, Lourinhã, Oeste, Estremadura...

Chegou a Bissau, a 2 de março de 2019, e aqui vai estar 3 meses como voluntário na Escola Privada Humberto Braima Sambu, no âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo.


Data - 21/03/2019, 12:57

Olá Luís

Mais uma crónica do futebol que partilhei contigo na Google Drive.

As fotos que seguiram sem qualquer legenda representam o naming do estádio Bom Fim, a mulher festejando o golo feminino e a baliza do estádio.

O Salinas também está representado tal como a programação.

Grande abraço,

Luís Oliveira
____________

Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (7): Guiné-Bissau e o Futebol...e não só


Não sendo o desporto da minha preferência, uma das coisas que iria abdicar quando decidi vir em missão de voluntariado seriam as visitas futeboleiras ao Estádio de Alvalade para ver o meu Sporting. 


Mais que o jogo, vale o convívio com amigos de longa data, as imperiais sempre frescas e a expectativa de uma grande exibição o que infelizmente para nós, sportinguistas, há muito tempo vai faltando.

Como será na Guiné? Num café à semelhança de Lisboa, porque com tantos aficionados do futebol, os guineenses de certeza que acompanham as diversas ligas da Europa, mas aqui não há os tais cafés ou tascas que proliferam em Portugal e em certas alturas tanto jeito dão. 

Perguntei ao Abubacar onde se podia ver futebol, pois o Sporting defrontava o Boavista e era uma boa forma de passar o serão melhor ainda se o meu clube sacasse os três pontitos que tanta falta estão a fazer.
Convidou-me imediatamente para o acompanhar ao “salon” porque também ele, sportinguista, não perdia o jogo por nada. Combinámos o encontro à porta do contentor e quinze minutos antes do jogo, à hora marcada o Abubacar apresentou-se tal como eu e sem prévia combinação com a lindíssima camisola de riscas verdes que é a cor da esperança.
” Para o ano é que é !”.

“Salon” I


O “salon” é apenas um armazém com cerca de cento e cinquenta metros quadrados. Cem Francos CFA para entrar e lá dentro uns bancos corridos, um mega LCD na parede e umas engenhocas estranhas onde estava incluída uma ventoinha apontada às box não fosse o jogo aquecer e aquilo dar para o torto.
Lá começou o jogo e logo no início da transmissão uma primeira paragem. Não se deveu por excesso de velocidade dos jogadores do Sporting, porque após a acção bem direcionada da ventoinha e das manobras mágicas do técnico, acompanhadas de pancadinhas na box, quando voltamos a ter imagem o Sporting já perdia por 1-0.
Como em todas as tascas em Portugal, um dos espectadores, certamente já precavido com as interrupções que aqui não são da responsabilidade do VAR, de banana no ouvido não perdia uma! Até deu com antecedência a noticia do invisível para nós golo Boavisteiro.

Jogo morno de pouca qualidade que finalmente chegou ao intervalo empatado. Em substituição da bica ou do gelado em Alvalade, o Abubakar brindou-nos com laranjas descascadas que uma mulher grande vendia à porta do “salon”.
Final do Jogo, 2-1 para o Sporting com pontapé de penalty polémico contestado por uns justificado por outros e semelhança do que acontece no estádio todos comentámos o jogo e as suas contingências. Não faltaram as críticas ao árbitro, ao posicionamento e empenho dos jogadores, às opções do mister Kaiser… Éramos todos treinadores de “salon” .

“Salon” 2

Dia de jogo da Champions que parecia estar a entusiasmar os guineenses e eu não percebia bem porquê, jogavam a Juventus versus Atlético de Madrid.

Confesso que em Espanha a equipa que mais admiro é o Atlético de Madrid, para além de ser o clube do povo republicano e inicialmente achincalhada pela elite aristocrática madrilena pelo seu equipamento às riscas se assemelhar ao colchões da época (colchoneros), rendo-me à garra, à ausência de galácticos e à personalidade combativa inspirada por Diego Simeone. Mas sendo o adversário a Juventus, agora a reboque do nosso Ronaldo, a minha escolha está feita porque nisto de futebol é impossível não tomar partido.


A Silvia e Nôno são aficionadas do futebol, a Silvia, filha de um brilhante futebolista, Pedro Barny, que jogou no Boavista e no meu Sporting na posição de central e chegou à Selecção Nacional de Portugal, também quiseram assistir ao jogo mas desta vez fomos acompanhados pelos nossos vizinhos do lado, familiares da Maia, proprietária da casa dos voluntários.

Os nossos companheiros atrasam-se, ou até já teriam partido sem nos chamar, mas um telefonema da Maia fez com que rapidamente nos viessem buscar e encaminharam-nos para outro “salon”. 

Dia de grandes jogos dois mega LCD (um para transmissão do Manchester City) mas o seu interior não diferia do primeiro onde estive, só que em dia de Champions e com Ronaldo a jogar, a coisa pia mais fino e a entrada aumentou para duzentos e cinquenta Francos.
O Salão estava a abarrotar já não havia lugares sentados e o “peão” era em qualquer lugar desde que houvesse uma nesga para espreitar o jogo. Ronaldo, muito mais do que acontece em Portugal, era o único responsável por toda aquela agitação que nos contagiava e elevava o nosso entusiasmo a níveis que nem todos as claques juntas de Portugal teriam capacidade.

A temperatura ultrapassava em muito os quarenta graus, transpirávamos por todos os poros e toda a gente cabeceava a bolas imaginárias tentando assim empurrar mais alto o Cristiano para que conseguisse por a “teimosa” dentro da baliza mas infelizmente o primeiro golo não valeu! 

À segunda foi de vez ...Gól!, Gól! Gól! Duzentas gargantas a gritar talvez quatrocentas pernas aos saltos, uma festa. Um ruído ensurdecedor.

Ao intervalo toda a gente veio para a rua onde os trinta graus da altura sabiam a frescura. Todos os espectadores receberam um bilhete de prova de pagamento para voltar a entrar, sendo nós (os voluntários) dispensados deste formalidade de segurança, não pelo facto de sermos voluntários, mas facilmente identificados por sermos os únicos brancos no “sálon”.

No grupo que se abeirou de nós para a conversa havia um adepto de Ronaldo especialmente entusiasmado que lamentava a ausência de jogo interior pela Juventus, fazia falta um dez como Modric, mas mesmo sem um dez Ronaldo é o maior e se ele fosse para Angola, jurava que passaria a ser angolano.
Lá recomeçou a partida e toda a gente sem ponta de cansaço. Incentivos permanentes e graças a eles, Gól! Gól!, Gól!. Ronaldo tinha marcado o segundo e passei a ver apenas metade do ecrã porque o movimento daquela massa humana já não me permitia ver mais. Dois golos eram insuficientes e eu já pedia a todos os santinhos que o Cristiano marcasse mais um porque não ia aguentar o prolongamento e devo ter sido ouvido porque mesmo no final do encontro uma falta para pontapé de penalty a favor da Juventus.

Ronaldo avança para o local da marcação. Vai ser mais um hat trick, afiancei às voluntárias e a bola entrou mesmo! Loucura total, apesar da falta de espaço toda a gente aos saltos, cânticos de aves que nunca tinha ouvido, uma alegria enorme, contagiante e pacifica que não me recordo de alguma vez ter vivido num estádio.

Concluí que Ronaldo é o nosso maior embaixador e devemos-lhe respeito e gratidão e encontrei naquele “salon” a verdadeira alegria do futebol que talvez apenas aqui tenha direito ao titulo de Desporto Rei.


“Katem salon” (Não há salão)

No dia da mulher, também celebrado na Guiné-Bissau, no Bairro Militar zona de Santa Clara, as mulheres resolveram mostrar su valor e desafiaram os homens para um jogo de futebol. O prélio não se disputou no Estádio Bom Fim, mas junto às tabancas onde moram e num terreiro que apesar dos buracos e outras irregularidades oferece espaço para a diversão e, a partir das quatro, quando o calor perda a força avançou a força da Mulher.

Duas pedras a fazer a marcação das balizas, equipamento ká tem e o que distingue os jogadores é o género e aqui não há supremacia, elas lutam com garra de igual para igual ignorando as normas sociais e a própria regulamentação do Estado que as condiciona e humilha.

Só assisti ao jogo até que a equipa da mulher marcou golo. GÓL!, GÓL! GÓL! Fiquei para assistir à festa do golo e após esta pequena vitória afastei-me para guardar a alegria com que elas me contagiaram. Para mim este resultado foi o final.

O jogo vai prolongar-se muito para além dos noventa minutos, talvez anos mas o desporto, neste caso o futebol, é um dos veículos de integração e que pode contribuir na via para a igualdade de género em todas as áreas da sociedade.

P.S. - O Sociólogo guineense Miguel Barros, investigador da ONG Guineense Tiniguena venceu o Prémio Humanitário Pan Africano em pesquisa de grande impacto social, neste refere a importância da mulher guineense na economia da família e do próprio País.
Alguns dados:

-30% das mulheres menores de idade escolar não frequentam o ensino.

-São as mulheres que trabalham no campo e quase tudo o que se consome na Guiné Bissau é produzido por elas. Trabalham em terras emprestadas ou concessionadas temporariamente. 

-Não têm acesso à propriedade, a própria lei do Estado não permite e mesmo no casamento quando a família oferece um dote, este ficará para sempre na posse do marido e na morte deste e na ausência de filhos a propriedade é herdada pelo irmão do falecido.(#)

Se as mulheres guineenses parassem, mais de metade da população morreria de fome.

(#) A religião muçulmana tem regras próprias que permitem à viúva a posse da propriedade, tratando-se de um dote, mas são frequentemente desrespeitadas.
Bissau, 21/3/2019 
_______________

sexta-feira, 15 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19589: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (5): Apelo à solidariedade dos nossos amigos e camaradas: campanha por uma cadeira de rodas para o professor Humberto, que teve paralisia infantil e que é um caso extraordinário de doação aos outros


Guiné-Bissau > Bissau > Escola Privada Humberto Braima Sambu > 8 de março de 2018: o fundador e diretor da Escola, na sua velha cadeira de rodas... 


Guiné-Bissau > Bissau > Escola Privada Humberto Braima Sambu >  17 de abriu  de 2018 >  Aspeto de uma aula.



Guiné-Bissau > Bissau > Março de 2019 > Na casa do Cherno Baldé: ao centro, o Humberto Braima Sambu, de camisa azul, na sua velhinha cadeira de rodas, segudo à direita do Luís Mourato Oliveira e do dono da casa... Desconhecemos a identidade dos restantes dois amigos, à esquerda e à direita... Um deles deve ser o Braima Camará um jovem professor que trabalhou com o Humberto Sambu,  e que é professor em Bafatá.

Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2019) . Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).


1. Mais três mensagens (, formando a quinta crónica,) do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol; lisboeta, tem fortes ligações à Lourinhã, Oeste, Estremadura...

Chegou a Bissau, a 2 de março, e aqui vai estar 3 meses como voluntário na Escola Privada Humberto Braima Sambu, no âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo. (*)


Ser solidário com o professor Humberto Braima Sambu que precisa de uma nova cadeira de rodas...


por Luís Oliveira


(i) 15/3/2019, sexta-feira, 16:26



Olá, Luis


Sem muitas coisas interessantes para contar, de momento, vinha propor por sugestão do professor Humberto a admissão do Braima Camará na Tabanca Grande.

O Braima Camará é um jovem guineense, professor em Bafatá com enorme sensibilidade e capacidade para na escrita transmitir sentimentos positivos.

Infelizmente  está em greve porque os professores não recebem ordenado desde Outubro do ano passado.

Se leres alguns textos dele no Facebook,  creio que apoiarás a sugestão e é também uma forma de renovação da Tabanca Grandeonde infelizmente a idade de todos os que a habitam vai avançando.

Deixo-te o endereço e-mail dele.

 
(ii) Sexta-feira, 09/03/2019, 23:30


Boa noite,  Luís

Acabei de assistir ao prélio entre o Boavista e o Sporting em relato que farei oportunamente.



Quando me preparava para sair tive a visita do Cherno Baldé,  acompanhado pelo professor Humberto e pelo Braima, um jovem professor que trabalhou com o Sambu.

Foi muito gentil e convidou-me para o visitar sempre que quiser para continuarmos as nossas conversas. Pedi-lhe o email e, como não havia forma de registo, autorizou que tu mo facultasses.

Espero que as crónicas sejam divertidas e que consigam dar um cheirinho desta terra tão mal tratada.


(iii) quarta-feira, 13/03, 17:10



Boa tarde, Luís

Após algum tempo sem te enviar noticias, cá estou eu de novo. Os dias decorrem com grande rapidez porque após o Carnaval começaram as aulas e os voluntários estão cá para colaborar, nessa vertente temos passado parte dos dias na escola.

O meu trabalho não tem sido na área que previa porque, apesar de já terem chegado 16 volumes enviados de Lisboa, o preço que pedem para o levantamento nos correios é incomportável para a escola.

Fui hoje com o professor Humberto pela segunda vez aos correios onde entregámos uma carta a tentar sensibilizar o director daquele serviço para dispensar a entrega sem custos ou por custos reduzidos comportáveis com as nossas possibilidades.

Por essa razão tenho auxiliado nas aulas de educação formal e com a falta de professores tive de improvisar e criar sessões de Educação Civica Global, prevista pela ONU e Unesco e creio que muito úteis e interessantes neste país.

Quanto à abordagem que fiz ao professor Humberto para integrar a Tabanca Grande, aceitou de imediato e fica muito honrado com o convite que agradece.

Relativamente às suas condições de mobilidade, queria colocar um desafio à Tabanca. O professor teve paralisia infantil e está agarrado a uma cadeira de rodas em péssimo estado (, eu que o diga que tenho andado com ele para todo o lado e esse exercício faz-me suar mais que uma intensa sessão de ginásio) , não tem apoio para os braços, as rodas estão para o empenado devido aos caminhos donde há mais buracos que terra plana e creio que não irá durar muito mais.

Penso que talvez uma campanha solidária para permitir a continuação do trabalho do professor que iniciou a sua actividade dando educação a jovens, sob uma árvore com um quadro, e que merece muito mais que uma cadeira de rodas pelo seu papel na sociedade.

Se alguns dos nossos camaradas junto de alguma associação de beneficência ou bombeiros arranjasse maneira de fazer voar uma cadeira de rodas para a Guiné, seria um contributo inestimável e que muito prestigiaria a iniciativa. Poderia ser mesmo uma cadeira usada e com uma única condição principal - ser muito resistente para aguentar o futuro que lhe estaria reservado.

Conto enviar mais crónicas, mas cada vez mais apaixonado pela actividade até as minhas leituras tenho descurado.

Recebe um abraço amigo de quem se manterá na Tabanca e partilhará as suas histórias e segredos debaixo do nosso poilão.

Abraço,
Luís Oliveira
____________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 12 de março de  2019 > Guiné 61/74 - P19577: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (4): dia de Carnaval + Eleições = Carnaval Total

quarta-feira, 6 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19554: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (1): a ansiedade da partida e o calor humano da chegada, em 2 de março de 2019

Luís Oliveira
1. Texto do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol; vai estar 3 meses como voluntário na Guiné-Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambuno âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo. (*)

Esta é a primeira crónica que ele nos prometeu escrever para o blogue da Tabanca Grande, e que nos acaba de chegar... 


2. Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (1): a ansiedade da partida e o calor humano da chegada, em 2 de março de 2019


A partida para Bissau, marcada desde Dezembro, parecia nunca mais chegar. Detesto as longas esperas, sobretudo quando a caminhada é uma incógnita e fértil em surpresas que até poderão não ser as melhores.

Depois as conversas com os amigos:

­‑ Tás é tótó, agora o velhadas quer ir para a Guiné! Pensas que tens vinte anos...isso era dantes, agora estás lixado, vais levar com os mosquitos, com a lagartada, pensas que tens a EPAL, estás f…! Tem mas é juizo e passa o bilhete a outro, os guineenses já nem falam português, nem te percebem!

E os dias foram passando lentamente, a ansiedade aumentando até que, tal como há quarenta e cinco anos atrás, chegou aquela tranquilidade que me protege nas alturas mais complicadas, passei a dormir melhor, a obsessão do embarque ficou distante e a partida, e tudo o que surgiu a seguir, passou a ser uma data de calendário com uma nota em agenda: “!Voo TAP TP1479, 17.40 do dia 2 de Março”.

E lá estava eu no aeroporto, convencido a ficar fechado naquele contentor voador durante quatro horas, sem direito a soltura, sujeito ao ar forçado e à simpatia das hospedeiras. Nem quero falar do que chamaram “jantar”, porque por sinal tratou-se apenas de um pormenor. O “pormaior” foi o assalto que a companhia de bandeira nacional fez a todos os passageiros cujas malas de cabine não cabiam na reduzida forma que criaram com o fim sacar cento e cinco Euros a todos os desprevenidos.

A minha mala de cabine que voou para Londres, Barcelona, Madrid, Roma, Milão nunca pagou um Euro e apresentava a medida certa, desta vez ou dilatou com o calor ou a TAP temia a sua dilatação no espaço aéreo Guineense e cobrou a quem podia e a quem não o podia fazer. Passageiros houve que deixaram a bagagem para que a mala apresentasse a elegância exigida pela bitola TAP.


Escola Privada Humberto Braima Sambu >  O novo uniforme dos alunos. 
Cortesia da Página do Facebook da Escola.  21 de novembro de 2018


Chegados a Bissau, digo chegados porque a Silvia Barny, voluntária do ParaOnde, também viajou neste voo e, após recolhidas as bagagens, tivemos a emotiva surpresa da recepção. Além do director da escola, o professor Humberto Braima Sambu e alguns professores, um numeroso grupo de alunos com o uniforme da escola cantaram as boas vindas e proporcionaram um acolhimento extraordinário.

Estava na Guiné das minhas memórias, o mesmo povo, a mesma simpatia daqueles que nunca deixarão de ser irmãos.

Bissau, 5 de Março 2019


__________

Nota do editor;

(*) Vd. poste de 8 de fevereiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19482: Ser solidário (222): O nosso camarada Luís Mourato Oliveira parte dia 2 de março para Bissau, para fazer voluntariado durante 3 meses, através da organização sem fins lucrativos "ParaOnde"... E qualquer ajuda humanitária adicional pode ser encaminhada para (e seguir por conta de) a loja "Paris em Lisboa", no Chiado