quinta-feira, 12 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1169: A nossa Chaimite no Ultramar por Pedro Monteiro (Luís Graça)

Véiculo blindado Chaimite 4 x 4, de produção nacional. Foto: Pedro Monteiro > Fonte: www.defesanet.com.br (com a devida vénia...).


Mensagem que recebi de Pedro Monteiro e para a qual peço a melhor atenção dos nossos amigos & camaradas da Guiné.


Caro Luís Graça,

Antes de mais, parece-me útil uma breve apresentação da minha pessoa. O meu nome é Pedro Monteiro e desenvolvo uma actividade de pesquisa de assuntos militares. É, pois, nesta condição que sou colaborador regular e correspondente para Portugal das revistas de actualidade militar Fuerzas Militares del Mundo (Espanha) e Tecnologia & Defesa (Brasil), entre outros projectos.
Nos últimos anos, tenho vindo a pesquisar dados e documentação sobre a Chaimite (e publiquei mesmo um trabalho prévio: vd. Blindado Chaimite 4 x 4 num site brasileiro).
Na realidade, este projecto tem dois fins: a publicação de um artigo aprofundado sobre o desenvolvimento, produção e operação da Chaimite e, eventualmente, uma monografia sobre a mesma (com algum material para apoio aos modelistas).
Deste modo, não pretendo limitar as minhas pesquisas e desejo recolher o máximo de material (seja informações, relatos, fotografias e documentação) que exista acerca da mesma.
Sei, por exemplo, que no Elefante Dundum do Major Cav Mendes Paulo existem bastantes dados para confrontar. Infelizmente, soube do seu falecimento (1) e, portanto, já não será possível contactá-lo a propósito do excelente trabalho de pesquisa que fez e que lança algumas pistas que gostaria de pesquisar e aprofundar.
Entre os seus contactos, conhece alguém que me possa ajudar?
Espero ter deixado claros os meus propósitos com este trabalho. Para o caso de persistir alguma dúvida face à natureza do meu pedido, disponibilizo-me para futuros esclarecimentos por esta via ou outra (93 441 75 34).
Desde já, grato pelo tomado nesta questão.
Com os meus cumprimentos,
Pedro Monteiro
Comentário de L.G.:
(i) No meu tempo e na minha zona (Bambadinca, 1969/71), não cheguei a apanhar a Chaimite na Guiné. Só conhecida a velhinha autometralhadiora Daimler... Pelo menos, não tenho quaisquer recordações da Chainite que, depois, se vai tornar um dos símbolos do próprio 25 de Abril. Recorde-se que foi na Chaimite Bula - que integrava a força comandanda pelo Cap Salgueiro Maia no cerco ao Quartel do Carmo - que o presidente do Governo deposto, Marcelo Caetano, se rendeu e foi transportado sob prisão, para o aeroporto que o levaria à Madeira e depois ao exílio, no Brasil.
(ii) Veículo blindado nacional, a Chaimite teve o seu período áureo - em termos de produção e exportação - depois do 25 de Abril. Mas chegou a actuar no Ultramar, e inclusive na Guiné. Não tenho grande informação sobre o seu comportamento no difícil terreno da Guiné e nas duras condições da guerra que ali se travava. Nas é possível que haja camaradas que possam dar, aqui, em primeira mão, o seu testemunho sobre este veículo blindado que foi desenhado para a guerra de contraguerrilha em África.
(iii) No início de 1972, o ranger Eusébio regista a presença de Chaimites na Zona Leste (3):
(...) "Ali, no Xime, esperava-nos um esquadrão de cavalaria com os blindados Chaimite que nos iriam escoltar até á próxima paragem, Bambadinca" (...) . (LG)
______________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 13 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1067: Morreu o major Mendes Paulo (BCAV 2922, Piche, 1970/72) (José Martins)
(2) Vd. post de 27 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1119: Um periquito no Saltinho, o ranger Eusébio (CCAÇ 3490, 1972/74)

Guiné 63/74 - P1168: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (1): Periquito gozado

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Guiné > Saltinho > Pel Caç Nat 53 > 1971 > O Alf Mil Santiago, de bigode e barrete fula na cabeça, ladeado, à sua direita, pelo 1º cabo Verdete, e à sua esquerda pelos Sold Samba Seidi, bazuqueiro, e Abdulai Baldé, um dos seus fiéis guarda-costas.


Foto: © Paulo Santiago (2006) . Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.


Texto do Paulo Santiago (ex-alf mil do Pel Caç Nat 53, Saltinho, 1972/73), com data de 19 de Setembro de 2009:


Começo hoje com a primeira mensagem em que irei tentar descrever as minhas vivências com o Pel Caç Nat 53 e a CCAÇ 2701 [abrangendo o período de entrer Outubrod e 1970 e Março de 1972].

Eu, periquito, embarquei em Lisboa em 1 de Outubro de 1970, após escala no Porto(!), S. Vicente e Praia, desembarquei em Bissau a 27 de Outubro de 1970. Fui no navio Alfredo da Silva, onde era obrigatório, ao jantar, até ultrapassar o paralelo das Canárias, ir de casaco e gravata.

Como sempre fui avesso a casacos e, ainda mais a gravatas, tive durante dois ou três dias de vestir a farda nº2, com o respectivo blusão e gravata. Acrescento que os outros três Alferes que me acompanhavam, iam carregados com aqueles apetrechos civis, o que me fez sentir um pouco deslocado na sala de jantar.

Ao desembarque alguém me informou que iria para o Saltinho comandar o Pel Caç NAT 53. Era o anoitecer em Bissau com aqueles cheiros e aquele calor peganhento.

Levava uma encomenda para um Alferes que não conhecia. Era uma daquelas histórias do género Tinha um tio que tinha um amigo que tinha um sócio cujo filho era Alferes em Bissau... o tipo para quem levava a dita encomenda. Estava à minha espera no Biafra. O tal Alferes, nunca mais o vi, estava colocado no QG ( ZIAC-Zona de Intervenção do Ar Condicionado) e instalado com a mulher no Grande Hotel. Convidou-me para ir jantar aquela unidade hoteleira. Não sei se comi bem ou mal.

Apresentei-me no dia seguinte no QG a um Tenente-Coronel. Fiquei a aguardar transporte. Na messe, ao almoço, encontro o Cap Carneiro, comandante da minha companhia de instrução no
1º ciclo em Mafra, que em conversa me informa haver no Saltinho umas fragas onde os turras instalavam o canhão s/r para flagelar o quartel. Aceito como verdade.

Dia 30, apanho um Dakota para Bafatá, durante o voo conheço o Cap Carlos Gomes, comandante da CCAÇ 2700, instalada no Dulombi e, por coincidência, pertencente, ao batalhão de Galomaro, tal como a CCAÇ 2701, instalada no Saltinho.


Guiné > Zona Leste > Bafatá > 1969 > "Aqui mora a cavalaria": slogan à entrada das instalações do Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (1969/71). Imagem (diapositivo digitalizado) do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71). Foi aqui que ficou o Alf Paulo Santiago e o Cap Carlo Gomes.

Foto: © Humberto Reis (2006)


Chegados à segunda cidade da Guiné [, Bafatá] , sem transporte naquele dia para Galomaro, fico juntamente com o Cap Carlos Gomes no esquadrão de cavalaria, onde estava instalada uma companhia de paraquedistas comandada pelo Cap Mário Pinto que passou a noite a tentar assustar-me, o que em parte conseguiu.

De manhã apareceu uma viatura de Galomaro, Unimog 404, para transportar o comandante de Dulombi e onde fui à boleia. No batalhão ninguém sabia que iria chegar naquele dia.Apresentei-me ao comandante de batalhão,Ten-Cor Octavio Pimentel, antigo ajudante de campo do Craveiro Lopes,com posterior passagem pela GNR. O 2ºcomandante era o Major Sousa Teles e o Major de Operações o Batista Mendes, que viria a ser, passados anos, presidente da Liga dos Alcoólicos Anónimos.

O médico do batalhão, excelente pessoa, era o Vitor Veloso, actual presidente da Liga Pottuguesa Contra o Cancro. Passei dois ou três dias em Galomaro,aguardando o heli que me levasse até ao Saltinho, onde cheguei acompanhado pelo Sousa Teles.

A CCAÇ 2701, a que estava adido o Pel Caç Nat 53, era comandada pelo Cap Carlos Clemente, sendo comandantes de pelotão os Alferes Mi. Julião, Mota, Rocha e Valentim. Havia outro Alf Mil Mota, o comandante do 53, que iria ser substituído por mim, o qual permaneceu no Saltinho unicamente mais três dias, após a minha chegada, tendo tido muito pouco tempo para o conhecer.

Os meus Furriéis Milicianos eram o Duarte, o Martins e o Malveiro, este substituído passados dois meses pelo Almeida. O grupo de que eu iria assumir o comando era, etnicamente, bastante heterógeneo: havia fulas, balantas, mandingas e beafadas.

Fui bem recebido, principalmente pelo camarada que ía substituir.

O Cap Carneiro tinha-me enganado. Não havia quaisquer fragas que servissem de base de fogo aos canhões s/r do IN.

Paulo Santiago

quarta-feira, 11 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1167: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (4): Candamã, uma tabanca em autodefesa







Guiné > Zona leste > Sector L1 > Bambadinca > Mansambo > CART 2339 > Candamã > 1969 > O Alf Mil Torcato Mendonça e o seu Grupo de Combate em reforço do sistema de autodefesa da tabanca fula de Candamã, pertencente ao regulado do Corubal.

A população balanta e beafada do regulado estava sob controlo do PAIGC, desde o início da guerra, vivendo ao longo da margem direita do Rio Corubal. A população fula sobrevivia e resistia (mal) em meia dúzia de tabancas, pobres, em decadência, dispersas, a leste da estrada Bambadinca-Mansambo-Xitole, nomeadamente depois da contra-ofensiva lançada pelo PAIGC como resposta à grande operação (1300 homens) que foi a Operação Lança Afiada (Março de 1969).

Neste tipo de aldeias, os tugas viviam em condições precárias, como as imagens documentam. Durante o dia, pouco ou nada havia para fazer... A caça era escassa e perigosa. A temperatura e a humidade do ar eram perigosas para o tuga... Vivia-se confinado ao espaço restrito da aldeia e do seu perímetro, demarcado por valas e toscos abrigos para a população, as milícias e os militares. A população local passava mal, não podendo afastar-se para longe para caçar, pescar ou lavrar os seus campos.

Para a própria tropa, havia dificuldades de abastecimento e a dieta alimentar era má. Em geral, os militares eram rendidos ao fim de quinze dias, regressando à sede da sua unidade (neste caso, Mansambo, sede da CART 2339). As tarefas de defesa monopolizavam praticamente todas as energias das NT. A coexistência com a população local era relativamente fácil mas superficial: havia sempre as barreiras étnicas, religiosas, culturais e linguísticas. As autoridades gentílicas eram gentis e hospitaleiras, mas poucos recursos para honrar a tradicional hospitalidade dos fulas.

Para os fulas, nós éramos vistos como aliados. Não éramos tropa ocupante, como acontecia nas tabancas balantas (Nhabijões ou Mero, por exemplo). Mas havia sempre tensão na nossa presença. As tabancas em autodefesa e com reforço das NT tornavam-se um alvo prioritário ou preferencial das acções da guerrilha. Era o círculo vicioso da guerra. Várias tabancas em autodefesa tornavam-se insustentáveis: lembro-me, logo no princípio da nossa comissão (CCAÇ 12), do caso de Moricanhe, Madina Xaquili... Entre ser milícia toda a vida, o jovem fula optava pela integração no exército dos tugas. Sempre dava mais prestígio e... patacão. Em último caso, havia a fuga para os países vizinhos, que eram um prolongamento do chão fula: Senegal, a norte; Guiné-Conacri, a leste e a sul...

Desgraçadamente, depois da independência, este homens que apostaram na aliança (político-militar) com os tugas (régulos, milícias, militares) pagaram uma pesada factura: em muitos casos, a perseguição, a prisão e até a própria vida... Pergunto-me: o que terá sido feito do jovem régulo [do Corubal]?

Observando as fotos do álbum do Torcato Mendonça, registo a nossa tremenda solidão, a existência de dois mundos que dificilmente conseguirão comunicar entre si, e, por fim, o voluntarismo de alguns de nós que, contra ventos e marés, ainda teimam em ser úteis aos guineenses ou, muito simplesmente, tentam cumprir a sua missão civilizadora... Uma escola é sempre uma iniciativa merecedora de aplauso... Mas não chega para justificar a tardia vocação civilizadora (no campo da saúde, da educação, do desenvolvimento...) que alguns de nós tinham a tentação (ou até a secreta esperança) de atribuir ao exército... Eis aqui, por exemplo, a escolinha que o Torcato ou alguém da sua CART 2339 se lembrou, em boa hora, em abrir... (LG).

Fotos: © Torcato Mendonça (2006) . Direitos reservados.


Continuação da publicação do álbum de fotografias do Torcato Mendonça, que ele teve a gentileza de me fazer chegar, pelo correio, através de um CD-ROM. Chamou-lhe fotos falantes (2)

4. Candamã, uma tabanca em autodefesa
Nesta tabanca vivia o Régulo António Bonco Baldé. Era uma pessoa fascinante. Foi empregado administrativo da Casa Gouveia, creio eu, ou da Ultramarina. Educado numa Missão Católica, conheceu, lá ou no emprego em Bissau, o Luís Cabral. Não me lembro.

Quando o pai faleceu, voltou ao seu Chão. Tempos depois, graduaram-no em Alferes de 2ª linha. Quando da visita de Américo Tomás, em 1968, recebeu espada e arreios de Oficial. Mas nunca teve tropa nem entrou na guerra. Ele lá sabia porquê. Sabíamos. Vestia como um Homem Grande Fula, comia na sua morança com as mãos, com os outros homens, e servido pelas suas esposas.

Acompanhei-o poucas vezes. Quando o convidava, comia com o talher. Falávamos longamente. Nunca direi o teor de algumas dessas conversas. Aprendi muito sobre os usos e costumes daqueles povos, sobre a Guerra e sobre a Vida.

Eu era um homem com 24/25 anos, o poder das armas, a deformação imposta por uma instrução dura, a convicção de que só a disciplina e o suor salvavam vidas, a dureza daquela guerra e o peso que quem comanda sente.

As autodefesas eram a forma de, concentrando melhor, defendermos aquela gente. Só que era doloroso para eles abandonarem os seus chãos. Para nós eram ordens e estas cumprem-se. Não fui incorrecto, uma vez, para o António Bonco. Ele compreendeu. Tanto assim que fiz um relatório, depois de relato dele, sobre a ida de muitos homens para a apanha da mancarra no Senegal. Era a exploração colonial daquela gente. Explorados na ida, durante o trabalho e no regresso. O câmbio do franco senegalês pelo peso guinéu era abjecto. Nós militares passávamos ao lado desse comércio…ou outras formas de escravidão.

Infelizmente, quase 40 anos depois temos os africanos em fuga.... e para onde? Saí das fotos falantes…mas África tem que ser discutida. Não é logicamente este o local, nem eu a pessoa indicada. Mas sou cidadão e não abdico a opinar. Estive lá.
_________

Notas de L.G.

(1) Segundo os meus registos, a CART 2339 passou a ter um pelotão (menos 1 secção) em Candamã, a partir de Junho de 1969, e uma secção em Afiá. Em Abril, tinha um pelotão em Afiá. As fprças da CART 2339 vão-se manter nestas duas tabancas em autodefesa, pelo menos até Outubro de 1969. Em 30 de Julho, Candamã irá sofrer um violentíssimo ataque. Recordo-me de ter chegado a Candamã, nessa madrugada, integrado numa força da CCAÇ 12: o cenário era o de um campo de batalha... Desolador. As forças da CART 2339 (1 pelotão) tinham-se portado heroicamente na defesa da tabanca (3).

(2) Vd. post de 5 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - P1152: Fotos falantes (Torcato Mendonça, CART 2339) (3): Braimadicô, o prisioneiro que veio do céu

(3) Vd. post de:
29 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - LXXXVIII: O baptismo de fogo da CCAÇ 12, em farda nº 3, em Madina Xaquili (Julho de 1969) (Luís Graça)

(...) "Ataque de duas horas a Candamã
"E finalmente a 30 [de Julho], o 3º e 4º Gr Comb seguiram para Candamã a fim de levar a efeito um patrulhamento ofensivo na região de Camará, juntamente com forças da CART 2339 [Mansambo](Op Guita).
"Ao chegar-se a Afiá, pelas 7.30, soube-se que Candamã tinha sido atacada durante mais de duas horas até ao amanhecer.
"Em Candamã, os dois Gr Comb da CCAÇ 12 procederam imediatamente ao reconhecimento das posições de fogo do IN, tendo estimado os seus efectivos em 60/100 elementos [1 bigrupo reforçado], armado de canhão s/r, mort 82, LGFog, metralhadora pesada 12.7, armas ligeiras automáticas.
"Havia abrigos individuais junto ao arame farpado que fora cortado em vários pontos, tendo o grupo de assalto utilizado granadas de mão.
"Em consequência da reacção das NT e da população organizada em autodefesa, o IN sofrera várias baixas, a avaliar por duas poças de sangue e sinais de arrastamento de dois corpos, além de dólmen ensanguentado que foi encontrado já num dos trilhos de retirada. Foram recolhidas várias granadas de canhão s/r e RPG-2."
"Do lado das NT houve 5 feridos (1 dos quais grave) e da população dois mortos e vários feridos graves, além de danos materiais (moranças destruídas, etc.].
"O facto do IN ter retirado ao amanhecer indicava que deveria ter um ou mais acampamentos a escassas horas de Candamã. A corroborar esta hipótese, o aquartelamento de Mansambo seria flagelado na tarde desse mesmo dia.
"A Op Guita não forneceu, porém, qualquer pista que levasse a detecção do IN na região de Camará" (...).
(...)

30 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXXX: A CAÇ 12 em operação conjunta com a CART 2339 e os paraquedistas (Agosto de 1969) (Luís Graça)

(...) O ataque a Candamã [, tabanca em autodefesa, atacada durante mais de duas horas até ao amanhecer do 30 de Julho, ] surgiu, de resto, na sequência do recrudescimento da actividade IN no tradicional triângulo Xime-Bambadinca-Xitole, após a Op Lança Afiada (...).

Guiné 63/74 - P1166: A minha preguiça e a expressão 'Siga a Marinha' (Mário Dias)

Guiné > Região de Tombali > Ilha do Como > 1964 > Op Tridente (de 14 de Janeiro a 24 de Março de 1964) > LDM [Lancha de Desembarque Média], da Marinha, desembarcando as NT.

Foto: © Mário Dias (2005).


Mais de quatro décadas depois da Operação Tridente (Ilha do Como, Janeirro/Março de 1964), eis alguns dos elementos que nela tomaram parte, fotografados a 24 de Setembro de 2005, durante o convívio dos Grupos de Comandos que actuaram na Guiné entre 1964/66.

Da esquerda para a direita: (i) sold João Firmino Martins Correia; (ii) 1º cabo Marcelino da Mata; (iii) 1º cabo Fernando Celestino Raimundo; (iv) fur mil António M. Vassalo Miranda; (v) fur Mário F. Roseira Dias; (vi) sold Joaquim Trindade Cavaco (Os postos, referentes a cada uma, são os que tinham à época dos acontecimentos).

Foto: © Mário Dias (2005)

Recebi há dias notícias do nosso mui prezado tertuliano, Mário Dias (ex-sargento comando, Brá, 1963/66) (1), confessando-se do seu pecado da preguiça, como desculpa (de mau... pecador) para o seu prolongado silêncio (2)... Ele vai voltar a aparecer dentro de dias... Até lá, aqui fica um naco da prosa que ele me escreveu...


Caro Luís:

Antes de mais, mea culpa pelo meu tão longo silêncio provocado por três factores:
1 - Constantes e prolongadas ausências no Portugal profundo. (Que raio de expressão!)
2 - O emergir de novos e qualificados tertulianos com maiores e mais aprofundados conhecimentos sobre a guerra na Guiné sobretudo na sua fase de maior perigo (para as NT) e violência ou seja, a partir de 1969. Como sabes, eu saí de lá em Fevereiro de 1966. Assisti e participei nos primeiros anos dessa guerra, desde 1963, quando, embora já bastante dura e perigosa, não tinha ainda atingido as proporções de (quase) catástrofe (3)
3 - O principal: preguiça.

Quanto a esta, à preguiça, é para mim fonte de grande prazer pois me posso dar ao luxo de a cultivar e usufrui-la em toda a sua plenitude. Não imaginas como é bom alguém poder sentir preguiça e fazer-lhe a vontade!... Porém, a solideriedade e a amizade que se gerou entre nós me leva a que, de vez em quando, me esforce e a sacuda para longe.

(...) Embora sem participar directamente no blogue nos últimos tempos, não tenho deixado de o visitar sempre que possível. Julgo que os textos recentemente publicados têm bastante interesse para o conhecimento da história da guerra na Guiné. A minha colaboração será mais um olhar ao passado dos felizes anos que antecederam o conflito (4), embora também tenha algo que contar sobre a guerra propriamente dita.

Aproveito esta ligeira trégua que a preguiça me concedeu para, também eu, dar a minha opinião sobre a expressão Siga a marinha.

Esta expressão não pode, com rigor, ser atribuida seja a quem for. Pelo menos desde 1950 que a ouço a muita gente e também a utilizo com frequência no sentido de "vamos em frente", "não há azar", "não há problema" , "continuemos".

A origem deste expressão perde-se no tempo. Segundo julgo saber pelo que ouvi nos meus tempos de rapaz, surgiu porque, como todos sabem, nas paradas e desfiles militares em que participam os diversos ramos das forças armadas, a marinha tem precedência por ser o ramo mais antigo e, além disso, por se encontrar em terra - casa natural do exército - tem jus a tratamento preferencial como se de hóspede ou convidado se tratasse. Por tal motivo desfila sempre à frente.

Durante o treino para uma dessas cerimónias (quando, não sei e é possível que seja bem distante no tempo), o oficial encarregado do desenrolar da cerimónia, quando chegou a altura das tropas iniciarem o desfile bradou Siga a marinha.

Também há quem assevere que tal expressão se deve à vaidade do pessoal da marinha que, por desfilarem à frente dos outros ramos das FA, a lançaram no intuito de se superiorizarem. Seja como for, a ninguém pode ser apadrinhada a expressão.

Mário Dias
___________

Notas de L. G.:

(1) Vd. post de 17 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXCVII: Mário Dias, o nosso homem da Ilha do Como

(2) Vd. último post do Mário Dias > 22 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P893: 'Matchundadi di branco' e outras blogarias em crioulo (Mário Dias)

(3) Sobre a participação do Mário Dias na Batalha da Ilha do Como (de 14 de Janeiro a 24 de Março de 1964), vd. posts de:

15 de Dezembro > Guiné 63/74 - CCCLXXII: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): Parte I (Mário Dias).

16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXV: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): II Parte (Mário Dias)
17 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXX: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): III Parte (Mário Dias)

(4)Vd. posts de:

9 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DXII: Memórias do antigamente (Mário Dias) (1): Um cabaço de leite

19 de Fevereirod e 2006 > Guiné 63/74 - LDXVI: Memórias do antigamente (Mário Dias) (2): Uma serenata ao Governador

15 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXX: Memórias do antigamente (Mário Dias) (3): O progresso chega a Bissau

Guiné 63/74 - P1165: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (16): O meu baptismo de fogo

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Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Missirá > 1968 > Um grupo de soldados do Pel Caç Nat 52, em alegre convívio.
Texto e foto: © Beja Santos (2006). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.
Mensagem de 3 de Outubro de 2006:

Caro Luís, aqui vai o meu contributo da semana para o folhetim que durará ainda 25 meses, com quatro edições mensais. Tenho tanta pena de ti como de mim: se é verdade que cai sobre mim o ónus da escrita (será que estou a escrever memórias forjadas ou um romance-documentário?) tu tens a pesada incumbência de ilustrar hipoteticas cem edições adiante. Escrever preso à cronologia de uma comissão de cerca de 26 meses passa por manter o auditório interessado com pessoas, situações, vivências, atmosferas que ultrapassam o evento traumático, embebendo a descrição muitas vezes no banal quotidiano. Eu já não estou em condições de voltar atrás, e tu és cúmplice nesta aventura de todo o terreno. E vamos agora ao meu baptismo de fogo.
Mário Beja Santos (ex-alf mil, cmdt do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70)

Continuação da série Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (1):
Esta noite improvisa-se

por Beja Santos

Pelas 2:30 da madrugada de 6 de Setembro de 1968 conheci o meu baptismo de fogo. Estava na morança, deitado numa cama de ferro de corpo e meio que pertenceu a Armando Cortesão. Lia As Sandálias do Pescador de Morris West (era um autor de best-sellers publicados em Portugal pela Clássica Editora, de que o mais célebre foi O Advogado do Diabo), a história de um Papa que vinha da Rússia e que no final da história decide oferecer todos os bens da Igreja aos pobres de todo o mundo.


Capa do livro de Morris West, edição da Clássica Editora (colecção Orbe, nº 28; disponível a 6ª edição, 490 pp., no sítio Alfarrabista.com - Livros Usados, Livros Antigos).
Foto: © Alfarrabista.com (2006) (com a devida vénia...)


Estava na página 216 quando o primeiro rebentamento de canhão sem recuo veio cair nas traseiras do meu vizinho, o Padre Lánsana Soncó, com quem, dentro de dias, irei ter uma espinhosa discussão doutrinal acerca do Ramadão e da ira de Deus. Sentei-me tenso até que o estralejar das costureirinhas e o encadeamento de várias morteiradas me levou directamente para um abrigo onde, como em cinemascópio, as frestas central e laterais me permitiram ver alguma latitude da linha de fogo.

Os guerrilheiros apresentaram-se na clareira de Missirá com apreciável potencial de fogo incluindo canhão, morteiros, bazucas e armas automáticas. Os meus vizinhos civis e militares já lá estavam a foguear, e o primeiro entendimento passou por pedir ao Lânsana que não desfizesse o tecto com rajadas, a Quebá Sissé que tomasse conta da Breda, enquanto eu, Gibrilo Embaló, Albino Amadu Baldé e Madiu Colubali fazíamos fogo de G3, apoiados pelos condutores Quim e Setúbal que enchiam os carregadores.

Às tantas, lembrei-me que as funções de Comandante pediam-me um pouco que espingardar, e saí curvado dentro da neblina de pólvora que começava a encher o aquartelamento. Visualizar a situação não era díficil, com duas moranças transformadas em tochas, vi gente a funcionar no abrigo dos morteiros, o monumento no centro da parada onde hasteavamos a bandeira já atingido por uma canhoada, vi passar por mim como uma flecha Campino bazucando para a linha de fogo, depois Cherno Suane com o tubo e o prato do morteiro 60 e um colar de granadas ao peito, pedindo colaboração aos apontadores de dilagrama.

Para que a verdade se respeite, Saiegh galvanizava a resposta, o fogo era ensurdecedor, aprendi que a gritaria não deixa distinguir a coragem, o denodo, o sangue frio da pura histeria ou dos nervos descontrolados, à primeira leitura. Em vez de correr, preferi ir para o centro da parada e juntei-me aos atiradores do morteiro 81.

Ao rememorar os acontecimentos, verifico que 30 minutos de réplica, de reacção enérgica, não esgotam a energia, só senti a bruteza e o estupor do cansaço quando o fogo dos guerrilheiros se foi extinguindo e, tal como eu já tinha lido nos manuais, tiros isolados assinalaram a retirada. O fogo continuou da nossa parte, até igualmente se extinguir.

Pedi ao Saiegh e ao Ferreira, bem como ao Casanova, que chegara há dias, que fôssemos avaliar a situação dentro do quartel. Três moranças ficaram calcinadas, a enfermaria severamente atingida, uma das paredes do depósito de géneros esburacada, procurávamos vítimas entre civis e militares. Pedi um relatório ao Adão, o nosso enfermeiro:
- Ó meu Alferes, eu nunca vi uma coisa assim. Tenho ali sentado o Mamadu Djau que meteu dois tiros num pé. Diz que lhe dói um pouco, dá gargalhadas, já pus água oxigenada, venha ver, ele deve estar em estado de choque, o melhor é pedirmos uma evacuação ao amanhecer.

Lá fomos a um abrigo onde o nosso Djau, um gigante de mais de 1,90 m, fumava e conversava amenamente com outros soldados milícias, com um pé empapado em maços de algodão. Para que conste, o nosso Djau recusou tratamentos em Bissau, pôs-se de pé e pediu para ser visto pelo médico em Bambadinca, numa próxima oportunidade. Enquanto isto se passa, veio a chuva benfazeja, é bom não esquecer que estamos na época das chuvas e que os céus mitigam as calamidades destes fogos postos.

Uma flagelação, comecei a aprender, é primeiro este aperto no coração, depois aprende-se a ir direito ao essencial e responder ao alcance das nossas possibilidades. No rescaldo, se não houver mortos para chorar, como vai acontecer esta madrugada, vamos esgotar a última tensão nervosa com conversa fiada, aspectos anedóticos, previsões descabidas. Fica uma camisa pendurada numa porta reduzida a um passador; Cherno esgravata no solo molhado o prato do morteiro que se afundou com o coice; vou conversando com homens de cara chamuscada e pele queimada pelos cartuchos...

Pelas 5:30 da manhã, com os primeiros alvores, procede-se ao patrulhamento e também aqui a ajuda e a condução de Saiegh revelaram-se irrepreensíveis: explicam-me onde está o rodado do canhão, vejo os cartuchos vazios, seguimos o trilho por onde os rebeldes se internaram na mata, em Paté Gidé. Inevitavelmente, no regresso, começaram as especulações. Eu tinha avisado os furriéis que iríamos sair muito cedo para a zona de Mero, por ordem de Bambadinca. Aturdido pelo facto de alguns soldados me terem dito que tinham ouvido no mercado a notícia de iríamos cair de surpresa nessa povoação sobre a qual impendia a suspeita de colaboração com a guerrilha, suspendi sem data tal patrulhamento. A especulação era de quem intoxicara quem. O assunto deixou-me indiferente, eu já estava a deitar contas à vida quanto às reconstruções, registei os comportamentos valorosos, convidei toda a gente a descansarmos umas horas.

Deito-me, o sono não vem, aproveito para fazer o balanço deste mês caudaloso. Embarquei no Uíge com dois caixotes de dois metros de comprimentos por 80 de largura e 70 de altura. Caixotes com livros e discos que forçaram a risada de muita gente: era a bagagem de quem queria prolongar uma outra faceta da sua vida, continuar a devorar papel em companhia de sons melodiosos de música de ópera, sinfónica, de câmara, antiga e moderna; em Bissau comprei livros proibidos em Lisboa, discos do Zeca Afonso e do Adriano Correia de Oliveira; tomei Missirá muito a sério, oiço, medito, procuro aperceber-me do papel da logística , acho que fiz uma boa aposta na instrução das crianças e dos soldados, penso o mesmo do plano de segurança de Missirá e Finete. A cooperação entre militares e civis reforça-se. A guerra não se ilude, oiço rebentamentos em Mansabá, mas também sons mais surdos, em distâncias mais longínquas.

Estou obcecado pelas obras, por conhecer o terreno circunvizinho, já esclareci dentro de mim próprio que os patrulhamentos a Mato de Cão são só uma das faces da moeda. A mata fascina-me, logo o primeiro patrulhamento na Aldeia de Cuor com as suas ruínas monumentais de construções que quiseram rivalizar com Bambadinca me deixaram a vista assombrada, como se eu estivesse a contactar uma civilização perdida. Os rebeldes deixaram panfletos na fonte. Este quartel é muito especial, estes soldados que ripostaram tão determinados ao fogo rebelde estão-se nas tintas para os esquemas e rituais da ordem unida e do esquerda volver!; Mamadu Camará entrou-me na morança e perguntou-me se eu lhe podia vender um par de sapatos castanhos. Levou-os ofertados, andou-os a exibir com um rádio estridente nos braços.

Perdi a noção dos dias úteis e do fim de semana. Tomo a noção de que as minhas epístolas mandadas para Portugal são relatos minuciosos onde falo de tesouras corta-arame, sacos de cimento, tijolos de adobe, material de restauração e escolar, abate de material desaparecido ou inútil, autos de averiguações... mergulhei num universo insólito, felizmente o conteúdo daqueles dois caixotes faz a ponte com o mundo donde provenho.

Fiz amizade com Mazaqueu, um sobrinho de Quebá Soncó, um menino doente com dois olhos que parecem faúlhas e em permanente rodopio (perguntei há dias a Abudu Soncó se se lembrava dele, já que têm uma idade próxima e com o ar mais natural do mundo ele disse-me que o Mazaqueu trabalha em Portugal e que vai organizar um encontro). Passo próximo do professor que fui buscar ao Bambadincazinho e oiço as crianças a soletrar: casa, pai, manga, arroz, corcodilo... à noite sento-me com dois furriéis e organizamos o dia seguinte.

Assim como chove abundantemente, logo o céu descarregado se inunda de estrelas e a sombra da floresta ergue-se como um fabuloso cenário de teatro de ópera. Escrevo aos amigos e peço que me mandem jornais e revistas com mais notícias sobre a invasão da Checoslováquia. A leitura da poesia de Herberto Helder confirma-me um dos maiores nomes da literatura portuguesa de todos os tempos:

"As crianças falam até ao fim de cada palavra. A morte das crianças é uam fogueira ao lado direito de Deus, fogueira onde Deus aquece as mãos. Aprenderei no sono as submersas crianças mudas, envoltas no sangue. As crianças param no meio das folhas. Destroem o jardim numérico. As crianças ultrapassam a idade que as ultrapassa a elas. As crianças são o instante onde as liras e os dedos são uma única rosa".

Comovo-me e limpo as lágrimas. Aprendo que comandar é estar só, é responder inteiramente pelo que se sabe e até pelo pensamento e os actos alheios. Comandar, nestas circunstâncias, é resistir imperativamente ao desânimo e estimular os camaradas a inventar uma vida melhor com a parcimónia dos meios.

Em Missirá e Finete há carpintaria, há cal e cimento, tapam-se buracos, protegem-se os combustíveis, fazem-se conferências de imprensa para comentar as novas casas de banho para militares e civis. Há adobe fresco, grandes troncos de palmeira dão vigas para novos cavalos de frisa e novos abrigos. Por vezes a chuva inclemente e tropical desfaz o adobe. Mas tudo recomeça.

Verei três vezes Missirá arder e reconstruir-se. Vou habituar-me ao som das picaretas, aos ruídos fabris, ao trabalho dos trolhas, a ver passar a tinta de água, as lixas, os pincéis, o novo mobiliário. É então, enquanto agradeço a Deus a energia indómita, a saúde e o amor pelos homens que adormeço exausto. O homem que vai acordar dentro em pouco vai desafiar o terror com contraterror. Pacientemente, vai esperar, emboscar, à procura de um frente a frente. E antes do Natal virão as dores das primeiras mortes saídas da sua arma.
__________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 4 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1149: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (15): Exmo Sr Alferes: Quero ir para Lisboa

terça-feira, 10 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1164: Postais Ilustrados (7): Campune tatuada, Bijagó (Zé Teixeira)

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Postal gentilmente enviado pelo Zé Teixeira (ex-1º Cabo Enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).

Foto: © José Teixeira (2006). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.
Série Postais Ilustrados, 7. Segundo do Zé Teixeira, trata-se de um bilhete postal com os seguintes dizeres:

Nº 147: Campune tatuada (Bijagó)
Edição Foto Serra. Bissau.
Fotografia verdadeira - Reprodução proibida.

Já agora, não sei se conheces o site (em francês)
http://www.guinee-bissau.net/
V ale a pena ver. Encontras fotos antigas excelentes.

____________
Nota de L.G.:
(1) Vd. último postal > post de 7 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1157: Postais Ilustrados (6): Rapariga Papel, tatuada, do Biombo (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P1163: Memórias de Mansabá (6): Destacamento temporário do Bironque, inaugurado pela madeirense CART 2732 (Carlos Vinhal)

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Guiné > Região do Oio > Estrada de Mansabá-Farim > Bironque > Novembro de 1970 > Destacamento temporário: aspecto parcial. Este destacamento foi inaugurado pela CART 2732 (a companhia madeirense a que pertencia o Fur Mil Carlos Vinhal) no dia 26 de Novembro de 1970.

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Guiné > Região do Oio > Estrada de Mansabá-Farim > Bironque > Novembro de 1970 > Destacamento temporário: dia da inauguração.
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Guiné > Região do Oio > Estrada de Mansabá-Farim, no troço Bironque-K3 > Fevereiro de 1971 > A nova estrada alcatroada, construída pela engenharia militar, ainda coberta de pó branco.

Texto e fotos: © Carlos Vinhal (2006) (1). Direitos reservados.
Fotos alojadas no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.

Caríssimo Vitor Junqueira (2):

Estive mesmo agora a imprimir o teu belíssimo trabalho "Um dia no mato, na região de Farim" (3) e lembrei-me de ir aos meus arquivos físicos, já que a memória me estava a atraiçoar, para, quiçá, fornecer elementos para aumentar os teus conhecimentos.

Aproveito para te enviar 3 fotografias, para o caso de não teres nada sobre o tema. Peço desculpa por estar a ser um pouco tardio, mas o que está em causa para ti é a tua valorosa CCAÇ 2753.

Assim sou a informar que o destacamento temporário do Bironque foi inaugurado, sem pompa nem circunstância, pela CART 2732 no dia 26 de Novembro de 1970. Em anexo seguem 2 fotos dos momentos antes da inauguração oficial e abertura ao público.

Quando a [CCAÇ] 2753 [ - a companhia açoriana, a que pertencia o Alf Mil Vitor Junqueira -] chegou, nós já tínhamos feito a limpeza e arrumado os stands. Ainda me lembro daquela tenebrosa primeira noite em que dormimos(?) em cavidades por nós mesmos escavadas, no cimo do muro circundante do acampamento. Para ajudar, já noite dentro, o gerador lembrou-se de avariar, pelo que com muita sorte e recorrendo aos conhecimentos de alguns militares que na vida civil eram electricistas, conseguiu-se resolver o problema.

Envio também uma foto da estrada nova, entre o Bironque e o K3, em que ainda se pode ver aquele pó branco que a BECE (4) punha por cima do alcatrão e que no princípio podia servir para esconder minas. Felizmente nunca aconteceu nada e o pó foi desaparecendo com a chuva.

Carlos Esteves Vinhal (1)
Ex-Fur Mil Art Minas e Armadilhas
Nº Mec 19551569
CART 2732/Mansabá
CTIGuiné 70/72
Leça da Palmeira

___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 25 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLI: A madeirense CART 2732 (Mansabá, 1970/72) (Carlos Vinhal)

(2) Vitor Junqueira, ex-alf mil da CCAÇ 2753 - Os Barões (Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá, 1970/72)

(3) Vd. post de 23 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1110: Do Bironque ao K3 ou as andanças da açoreana CCAÇ 2753 pela região de Farim (Vitor Junqueira)
(4) BECE = Batalhão de Engenharia de Construção de Estradas ? Ou sigla de uma empresa ?

Guiné 63/74 - P1162: Guileje: CCAÇ 3477, os Gringos Açorianos (Amaro Munhoz Samúdio)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > Crachá dos Gringos de Guileje : a açoriana CCAÇ 3477 (1971/73).

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3477 (1971/77) > Oráculo, com a imagem de Nossa Senhora de Fátima e do Santo Cristo dos Milagres... O Culto de Santo Cristo está bem patente na lápida, onde se lê: "Santo Cristo dos Milagres / Nesta capelinha oramos / Para sempre sorte dares / Aos Gringos Açoreanos (sic)"... (A propósioto: a grafia correcta é açoriano, embora alguns dicionários registem também a variante ortotográfica açoreano).

Na imagem, o Amaro Munhoz Samúdio, ex-1º cabo enfermeiro, pegando ao colo um bébé de macaco-cão (?). O Samúdio é amigo do Albano Costa, o nosso tertuliano de Guifões, Matosinhos, que nos fez chegar estas fotos.

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3477 (1971/77) > O Samúdio, na porta de armas. Na base do monumento, à direita, pode ler-se: Vencer sem perigo é triunfar sem glória. Homenagem da CCAÇ 3325 aos seus mortos e feridos e aos portugueses de todas as cores, raças e credos que tombaram em defesa da Pátria" (1) .

Fotos. © Amado Munhoz Samúdio (2006). Direitos reservados.


Mensagem do nosso querido amigo e camarada Albano Costa:

Caro Luis: Já enviei mais umas fotos que arranjei para o projecto do Pepito, espero que ele vá ficar contente e que lhe sejam úteis.

Estou a enviar para ti para no caso de quereres utilizar no nosso blogue. Estás à vontade, elas são de um colega que fez parte da CCAÇ 3477 , «Os Gringos de Guileje»[, residente em Matosinhos]. E ele mostrou-se muito interessado em conhecer o blogue e vai tentar aprender a funcionar com a Net para poder contar as suas estórias.

Vou entregar ao Carlos Vinhal um CD com fotos que o Hugo [Costa] fez quando esteve na Guiné em Abril de 2006, para te oferecer no Sábado quando vocês se encontrarem no convívio [, na Ameira, em Montemor-O-Novo]. Se quiseres utilizar algumas, estás à vontade. As fotos de Guileje são de autoria de Amaro Munhoz Samúdio e as do CD são do Hugo Costa.

Um abraço,
Albano Costa


Comentário de L.G.:

Sei que o Pepito ficou entusiasmado ao receber estas fotos, já que não tenha notícias dos Gringos Açorianos. Estas últimas férias andou pelos Açores à procura deles, mas as pesquisias foram frustrantes. De repente, é localizado o Amaro Munhoz Samúdio que eu espero, eu e todos nós, se possa juntar, a partir de agora à nossa tertúlia. Um grande abraço de agradecimento ao Albano, que está sempre atento ao que se passa no nosso blogue e na nossa tertúlia...
___________

Nota de L.G.:

(1) CCAÇ 3325: esteve em Guileje de De Fev a Dez 1971. Contacto: Parracho. Vd. post de 10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLV: Projecto Guileje (7): recuperação do quartel (Pepito / Luís Graça)

Vd. também post de 2 de Dezembro de 20005 > Guiné 63/74 - CCCXXVIII: No corredor da morte (CCAV 8350, Guileje e Gadamael, 1972/73) (Magalhães Ribeiro)

segunda-feira, 9 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1161: O nosso Major Eléctrico, Cunha Ribeiro, 2º comandante do BCAÇ 2852 (Beja Santos)

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Esposende > Fão > Convívio do pessoal de Bambadinca (1968/71) > 1994 > O Mário Beja Santos (ex-comandante do Pel Caç Nat 52) com o actual Coronel Ângelo Augusto da Cunha Ribeiro, que foi segundo comandante do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), a partir de Setembro de 1969, altura em que substitui o major Viriato Amílcar Pires da Silva, transferido por motivos disciplinares. Era afectuosamente conhecido, entre as NT, como o major eléctrico...

Texto e foto: © Beja Santos (2006)


Mensagem enviada a 4 de Outubro de 2006

Caro Luís, durante o resto da semana trabalharei nas histórias de Missirá. Tu resolveste trazer à superfície uma nota nostálgica à volta do Major Cunha Ribeiro, e eu acompanho-te (1). Oxalá os tertulianos pretendam comunicar com ele. Mantém-se de espírito alertado, mordaz e pronto à polémica. Recebe a cordialidade do Mário.

Recordações fulgurantes do nosso Major Eléctrico

por Beja Santos

Quem se der ao trabalho de ler a história do BCAÇ 2852, certamente que se questionará de tantas mudanças no oficialato em Bambadinca (2). Mudámos de Comandante, de 2º Comandante, de Major de Operações, de Comandante da CCS, de médico e até de padre, com alguma surpresa e imprevisto, e nem sempre para benefício de todos. 1969 foi um ano horrível com punições e afastamentos, humilhações e dolorosas expectativas.

O Major Ângelo da Cunha Ribeiro é o 2º Comandante que vem numa vaga de substituições. Era loquaz, irónico, interveniente e um conversador compulsivo. Devo-lhe pessoalmente vários gestos ternos: foi ele que me passou a tratar por Tigre e incentivou a socialização do termo; foi extraordinário nos acontecimentos da mina anti-carro de Canturé, em Outubro [de 1969] (3); perguntava sempre sobre as necessidades em comida e material, interferia, imaginava e fazia lobby por Missirá e Finete. Não fica nada mal, parece-me, contar aqui em água forte um punhado de situações.

Começo pelo fim, pelo desastre que o vitimou na rampa de Bambadinca. Alguns dos tertulianos presenciaram ou foram forçados a salvá-lo dentro da viatura destroçada, furada pelos barrotes de cibe onde ele jazia com múltiplas facturas num jipe transformado em sucata.

Transportado para o HM 241 [Bissau], foi um doente dócil e nas primeiras semanas, irreconhecível com tanta ligadura, parecia a múmia. Quando a Dona Maria Helena Spínola lhe perguntou em que podia ser útil, ele respondeu determinado:
- Pode muito, ofereça-me a Enciclopédia Britânica, vou ter tempo de sobra para a ler.

Numa situação de desespero ou desencontro, ele aliviava com uma frase que passou a ser lendária:
- Sosseguem, o mal disto tudo começou com o Infante D. Henrique.- E o ambiente tenso logo se descomprimia.

Por ocasião das duras guerras entre o médico e o capelão (essas vivi-as eu, gritavam noite alta sobre a existência e a misericórdia de Deus...), ele ameaçou-os com uma ordem de serviço em que o médico daria a missa e o padre consulta, para verem como os outros se sentiriam desconfortados com a troca de papéis. A rábula foi curiosa, mas as discussões continuaram. Finalmente, a vivacidade e a brusquidão com que interrompia uma conversa, ao menor som suspeito:
- Pára aí, Tigre, estou a ouvir canhoada. - Eu respondi estupefacto:
- Ó meu Comandante, foi a porta do frigorífico. Simões, repete lá o que fizeste para o nosso Comandante ficar descansado.

Continuo a escrever-lhe pelo Natal e começo sempre "Meu inesquecível Comandante". Não é nenhum excesso de sentimentalismo, ele comandava mesmo, era fraterno e aquela electricidade fez bem a Bambadinca depois dos desastres humanos que vivemos a partir da flagelação de 28 de Maio [de 1969] (2).

Para quem quiser, eu dou os contactos dele. A guerra acabou com aquele acidente de viatura, mas como se viu no encontro de Fão, em 1994, ele não nos esqueceu. Como também vivemos a solidariedade intergeracional, talvez fosse interessante tirá-lo do esquecimento.

Beja Santos

Comentário de L.G.:


Meu caro Mário: As minhas relações com o major Cunha Ribeiro foram estritamente hierárquicas, formais, episódicas... Terei falado com ele, em duas ou três ocasiões... Na nossa tertúlia, não funciona a hierarquia militar mas a lógica da camaradagem... O Cunha Ribeiro tem o mesmíssimo direito de cá estar do que tu e eu... Conheces as regras da casa. Podes apadrinhar a sua entrada... Sei que ele continua a frequentar as reuniões de convívio da malta de Bambadinca de 1968/71... Estivemos juntos, em Fão, em 1994... Não lhe falei, por que não houve oportundidade... Hoje gostaria de ouvir as suas estória, a sua versão dos acontecimentos... Por mim, será bem recebido... Se ele quiser, pode ser testemunha privilegiada dos tempos em que estivemos juntos em Bmbadinca, em posições diferentes, ele oficial superio, major, 2º comandante de um batalhão, e eu, ssimples furriel miliciano de uma companhia de nharros...
___________

Notas de L.G.:

(...) Nota de L.G.: (...) "Major do BCAÇ 2852. Substituiu em Setembro de 1969 o major Viriato Amílcar Pires da Silva, transferido por motivos disciplinares. Foi vítima de acidente grave com um jipe. Era mais conhecido, na caserna - e nomeadamente pela malta da CCAÇ 12 - como o 'major eléctrico', devido à sua energia" (...).

(2) Vd. , entre outros, os postES de:

(...) "Este é um cínico relato da dura condição da guerra da Guiné, vista pelo lado dos tugas. Por outro lado, há críticas veladas, do autor do relatório, ao Comandante-Chefe, ao Quartel General e à Força Aérea (que se teria comportado como umas verdadadeira prima dona...).

"Há coisas, pouco abonatórias paras as NT, que se passaram neste operação e que eu deixo à atenção e consideração dos tertulianos e demais visitantes deste blogue. Cada um de vós que faça a sua leitura desapaixonada... Aqueles de nós, que foram operacionais, rever-se-ão mais facilmente no cenário que foi o da Op Lança Afiada... 

Sobre o desempenho dos actores, já não vale a pena assestar as bateria da crítica... Felizmente que a guerra acabou! War is over, baby!

"Seria interessante ouvir, entretanto, o depoimento de camaradas do BCAÇ 2852 que participaram na Op Lança Afiada. Infelizmente, ainda não temos ninguém dessa unidade, na nossa tertúlia.

"(...) Deixem-me só lembrar que, dois meses depois desta operação, o PAIGC retribuiu a visita das NT e apareceu às portas de Bambadinca em força: mais de 100 homens, três canhões sem recuo, montes de LGFoguetes, morteiros... Esse ataque ficou célebre: os tipos de Bambadinca foram apanhados com as calças na mão, faziam quartos de sentinela sem armas; enfim, um regabofe...

"Claro que no dia seguinte o Caco Baldé deu porrada de bota a baixo, nos oficiais todos, do tenente-coronel (o célebre Pimbas) até ao capitão da CCS... Um caso exemplar, divertido e hilariante, da guerra da Guiné... A sorte dos gajos de Bambadinca foi os canhões s/r terem-se enterrado no solo e a canhoada cair na bolanha...

"Quando nós, periquitos da CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), lá passámos, uma semana depois, vindos de Bissau e do Xime a caminho da nossa estância de férias (Contuboel, um mês e meio de paraíso... seguido depois de18 meses de inferno...quando fomos justamente colocados no Sector L1), os nossos camaradas da CCS do BCAÇ 2852 ainda estavam sem pinga de sangue..."Podíamos ter morrido todos", dizia-me 1º cabo cripto Agnelo Ferreira, da minha terra, Lourinhã... Fomos depois nós , para lá, com os nossos nharros, e em 18 meses nem um tirinho: que o respeitinho (mútuo) era muito bonito... Porrada, porrada, era só quando a gente se atrevia a meter o bedelho na terra deles, que já estava libertada... Eu faria o mesmo, na minha terra...

"Na história do BCAÇ 2852, o ataque a Bambadinca é dado em três linhas, em estilo telegráfico: 

Em 28 [de Maio de 1969], às 00H25, um Gr In de mais de 100 elementos flagelou com 3 Can s/r, Mort 82, LGF, ML, MP e PM, durante cerca de 40 minutos, o aquartelamento de Bambadinca, causando 2 feridos ligeiros" (...)

(...) "Depois de sair de Mafra fui para o extinto BC 8 em Elvas, como comandantes estavam o Pimbas e a Alzira. De lá seguimos para Abrantes para formar o Batalhão [de Caçadores] 2852 e depois Guiné.

"Só tenho boas recordações deles. Ainda serão vivos ? Bem espero. O Pimbas nasceu para ser professor, nunca um militar. Na casa comercial que era do meu Pai, na Rua da Prata, Casa dos Pneus, cruzei-me com ele. Falámos, estava ele na altura no tribunal, em Santa Clara" (...).

(...) "Conheci mal o Pimbas, conheci mal o Corte-Real, conheci mal o Magalhães Filipe, e ainda bem... Parece que eram todos bons homens, ex-professores, que ao fim de trinta anos de carreira, haviam descoberto não ter vocação militar...

"É necessário distinguir, entre a tropa miliciana, civís militarizados à força, e investidos em funções para as quais não estavam preparados, e os profissionais, designadamente os Oficiais Superiores. Comandar um Batalhão exigia possuir qualidades de liderança, determinação e coragem, que a não existirem, deviam ter impedido a Promoção. Sabemos todos, e alguns pelas piores razões, que assim não sucedeu. (...) Muitos viram, sentiram e sofreram, as prepotentes arrogâncias, os ocos autoritarismos e as criminosas incompetências" (...).

(3) Vd. posts de:

Guiné 63/74 - P1160: Lembranças de Nova Lamego (Tino Neves, CCS/BCAÇ 2893): A fatídica noite de 15 de Novembro de 1970

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Guiné > Zona Leste > Nova Lamego > 1970 > Povoação e quartel velho de Nova Lamego (Gabú). Principais edifícios civis e militares.



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Guiné > Zona Leste > Nova Lamego > 1970 > Emblema do BCAÇ 2893 (1969/71), unidade de que faziam parte as CCAÇ 2617, 2618 e 2619, além da CCS 2893, a que pertencia o nosso camarada Constantivo Neves, ex-1º Cabo Escriturário (1).

Texto e Fotos: © Tino Neves (2006). Direitos reservados. Fotos alojadas no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.


Para quem não esteve lá e não conheceu a vila de Nova Lamego... Na primeira foto, de cima, como podem reparar, estava o Quartel situado no centro da Vila, formando um rectângulo e ocupando alguns edifícios civis.

A foto, cedida pelo Tenente Roseira Coelho (2), já vinha com as marcas sem as respectivas anotações, mas eu vou apontá-las. São da minha autoria, espero não errar
nenhuma:

(1) Caserna das Praças;
(2) Casas civis (para alugar);
(3) Loja dos irmãos Libaneses;
(4) Depósito de géneros;
(5) Estação dos CTT (civil);
(6) Destacamento de Engenharia;
(7) Messe de Oficiais;
(8) Messe de Sargentos;
(9) Parque e Oficinas Auto;
(10) Refeitório;
(11) Dormitório de alguns Sargentos;
(12) Sala do Soldado
(13)Parque de Jogos

Lembranças de Nova Lamego, desde 1/12/1969 a 4/9/ 1971: Comecemos pela Flagelação de Nova Lamego em 15/11/1970.

Nesse dia fatídico, fazíamos um ano que tínhamos embarcado, na Rocha Conde de Óbidos, no navio Uíge. O nosso Comandante resolveu fazer uma festa, em comemoração desse dia, convidando um Oficial, um Sargento e um Praça em representação dos aquartelamentos mais próximos, pois, para além dum jantar melhorado para todos os presentes, também foi organizada uma festa de variedades no edifício do cinema da vila.

Como é natural, festa que se preze, não pode prescindir de um momento de fogo de artifício... Apesar de ninguém ter pensado e esperado que isso acontecesse, tivemos uma visita inesperada: sem que fossem convidados, os Turras vieram contribuir com a sua parte.

Agora a parte séria da coisa... Passo a descrever o que ficou inscrito nos manuais da História da Unidade:

Dia 15/11/70

BCAÇ 2893 COMEMOROU ANIVERSÁRIO DE COMISSÃO NESTA PROVÍNCIA; FOI CONVIDADO DE HONRA O EXMº CMDT CAOP-2.

GRUPO INIMIGO, CONSTITUÍDO APROXIMADAMENTE POR 150 ELEMENTOS, FLAGELOU NOVA LAMEGO DURANTE 35 MINUTOS, COM FOGO DE 4 MORTEIROS 82 (CERCA DE 122 GRANADAS) E ARMAS LIGEIRAS, CAUSANDO ÀS NT 3 MORTOS (1 SARG.), 4 FERIDOS GRAVES (1 MILÍCIA) E 8 LIGEIROS; A POPULAÇÃO SOFREU 8 MORTOS, 50 FERIDOS GRAVES, 30 LIGEIROS. AS NT REAGIRAM COM FOGO DE MORTEIRO 81 E DE CAN / S / R, MANOBRA DE ENVOLVIMENTO E PERSEGUIÇÃO, APOIADAS PELA FAP, CAUSANDO AO IN BAIXAS PROVÁVEIS; ARTª CABUCA E PICHE BATERAM COM FOGO DE OBUS PROVÁVEIS ITINERÁRIOS DE RETIRADA DO IN.

O Sargento morto era da CCAÇ 5 (Canjadude), e estava mais a esposa de passagem para Bissau, de férias, mas resolveu ficar mais um dia para participar na festa do aniversário do Batalhão. Morreu, junto a sua esposa, no quintal de sua casa. Deixaram órfãs 2 crianças (um casal) de tenra idade.

Os outros 2 militares eram da minha Companhia (CCS): O Soldado Básico Seixas e o Soldado Maqueiro Joaquim Rodrigues, que foram atingidos pela única granada de morteiro que arrebentou dentro do quartel, quando ambos estavam escondidos debaixo de uma viatura GMC - que estava estacionada junto ao dormitório de alguns Sargentos: vd foto acima, ponto [11]-, quando a mesma caiu a 1 metro deles.

Este acontecimento foi notícia na Metrópole como Chacina em Nova Lamego .

A nossa sorte foi os FIAT estarem na zona de Bafatá, e estarem em contacto com o comando de Bafatá e por sua vez o comando de Bafatá em contacto connosco. Ao aperceber-se do acontecimento, deu ordem aos FIAT para virem em nosso socorro, se não as morteiradas não seriam somente 122.


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Guiné > Zona Leste > Nova Lamego > 1970 > Um Natal triste, o de 1970...


Também em face do acontecimento, vieram a Nova Lamego os repórteres da RTP fazerem as respectivas mensagens de Natal. Eu também falei, tenho isso em cassete de vídeo (reportagem de 30 minutos, comprada à RTP). E tirei também uma foto alusiva ao Natal para enviar à família, a mesma que passo a mostrar.
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Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de 3 de Outubro de 2006:

Guiné 63/74 - P1146: Constantino Neves, ex-1º Cabo Escriturário da CCS do BCAÇ 2893 (Lamego, 1969/71)

Guiné 63/74 - P1145: Na fonte... com o Inimigo (ou a água quando nasce é para todos) (Tino Neves, CCS do BCAÇ 2893, Nova Lamego)


(2) Presumo que fosse tenente-aviador, da FAP.

domingo, 8 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1159: Álbum fotográfico (Hugo Moura Ferreira) (2): Bedanda, ontem (CCAÇ 6, 1970) e hoje

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Guiné-Bissau > Região de Tombali > Bedanda > 2006 > Vista de satélite (obtida através do Google Earth).


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Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1970 > Vista aérea da tabanca e aquartelamento.

Fotos: © Hugo Moura Ferreira (2006). Direitos reservados.
 
Fotos alojadas no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.

Continuação da publicação do Álbum Fotográfico do Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil de Infantaria, que esteve na Guiné, entre Novembro de 1966 e Novembro de 1968, primeiro na CCAÇ 1621 (Cufar) e depois na CCAÇ 6 (Bedanda)(1) (vd. carta de Bedanda).

Guiné 63/74 - P1158: AD anuncia para 2008 simpósio internacional 'A memória de Guiledje na luta pela independência da Guiné-Bissau'

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Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 2006 > Planta do quartel em 1966. Reconstituição de Nuno Rubim, coronel de infantaria, na reserva (1). Realização plástica de Guedes, da CCAÇ 726 (1964/66).

Foto: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2006). Direitos reservados (com a devida vénia...)


1. Mensagem do Pepito, de 19 de Setembro de 2006:

Amigo Luis

A AD está a actualizar e melhorar o seu site. Decidimos ter um site especial com informações da Guiné-Bissau. Nele pretendemos incluir, entre outras, fotos do tempo colonial.

Daí o meu pedido de autorização em que acedas a que utilizemos fotos (normalmente civis e de vistas aéreas) de zonas da Guiné-Bissau (Bafatá, Gabu, pontes, etc.), citando sempre o teu/nosso blogue como origem.

abraços
pepito

PS - Já sai água (muito pouca: 500 litros por hora) do furo de Guiledje (2)...

2. Resposta e comentário de L.G.:

(i) Querido amigo, camarada e irmão Pepito: Tens toda a autoestrada Lisboa-Bissau, livre, só para ti, e a luz verde está sempre acesa… Disseste bem: o nosso blogue…

(ii) O teu sítio - fui lá hoje visitá-lo - está um mimo, com a ajuda da rapaziada da Escola Superior de Educação de Leiria. Os meus parabéns. E faço votos para que o resto do programa comemorativo dos vossos 15 anos de existência continue em bom ritmo.

Já sei que, em Novembro de 2006 (as velas do bolo de anos serão sopradas no dia 9) , vais fazer o anúncio oficial do lançamento do Simpósio Internacional A Memória de Guiledje na Luta pela Independência da Guiné-Bissau, que irá decorrer de 1 a 7 de Março de 2008, numa iniciativa conjunta da AD, da Universidade Colinas do Boé e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa.

O programa (provisório) já está disponível, em linha. Apraz-me registar que o objectivo deste encontro é o de contribuir para: (i) a preservação da memória de Guiledje (respeito a vossa grafia); (ii) a investigação e a documentação da História na luta de libertação nacioanl da Guiné-Bissau; e, por fim, e não menos importante, (iii) uma maior aproximação das partes envolvidas no conflito político-militar entre Portugal e Guiné-Bissau.

Pepito e demais colaboradores da AD: Que não vos falte arte, engenho, apoios (incluindo o patacão!), e sobretudo a paz e a saúde, para levar a bom termo os vossos desafios para os 10 próximos anos e, mais concretamente, este simpósio internacional, em 2008, para o qual vou pedir o máximo empenho, entusiasmo e solidariedade dos nossos tertulianos. É com um pontinho de orgulho e sobretudo com muita alegria que os membros da nossa tertúlia vêem os seus textos, inseridos no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné - a par das suas fotos - fazer já parte do importante acervo documental sobre Guiledje, reunido pela AD. De facto, amigos, caramadas e irmãos da Guiné, como vocês dizem, "salvaguardar a Memória é a única forma da Vida triunfar sobre a Morte"
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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 12 de ukho de 2006 > Guiné 63/74 - P870: Ideias para um diorama do quartel ou quartéis de Guileje (Nuno Rubim)

(2) Vd. post de 10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLV: Projecto Guileje (7): recuperação do quartel

sábado, 7 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1157: Postais Ilustrados (6): Rapariga Papel, tatuada, do Biombo (Beja Santos)

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Bilhete postal > Guiné Portuguesa > 122, Rapariga papel tatuada - Biombo (1). Fotografia verdadeira - Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Reprodução proibida.
Documento gentilmente cedido Por Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (2). No verso, pode ler-se a mensagem manuscrita:

Para o Eng Ruy Cinatti (3)
Missirá, 8 de Outubro 1968

Meu caro Ruy:

Uma expressão bela e inocente desta África, onde gostava que também estivesse. Uma África onde procuro cumprir a sua lição de dádiva, ânimo sereno, aberto às amarguras e a uma incógnita que Deus protege. Se eu pudesse trasladar a saudade que desponta em Missirá. Sei que o Dear Father acena lá ao longe. Um dia escrevi-lhe a meio do Atlântico: obrigado, nómada! Obrigado pelo empurrão para as responsabilidades, para a corola deste céu [ilegível] onde nos entendemos . Desejo-lhe que esteja bem, mómada-dear Father! (...) Seu Mário.
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Notas de L.G.:

(1) Vd. carta de Quinhámel, disponível em breve.

(2) Vd. postal anterior, inserido no post de 2 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1140: Postais Ilustrados (5): Bajuda manjaca, Ilha de Pecixe (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P1156: Dar voz (e fazer justiça) aos antigos combatentes africanos (Jorge Rosmaninho)

Guiné-Bissau > Bissau > Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira > 17 de Julho de 2006 > Manifestação de antigos combatentes guineenses do Exército Português, por ocasião da chegada, com intervalo de 2 minutos, do Presidente da República de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, e do Primeiro Ministro, José Sócrates, no âmbito da VI Cimeira da CPLP. "Nós, os antigos combatentes, exigimos o cumprimento do acordo de Argel", é a mensagem que se podia ler no belíssimo pano artesanal que foi feito para a ocasião (LG) (1).

Fonte: Africanidades, blogue do Jorge Neto, ou melhor, Jorge Rosmaninho (2).
Foto: © Jorge Neto (2006) (Direitos reservados)

Texto do Jorge Neto, aliás, Jorge Rosmaninho, publicado sob o título "Os indígenas, filhos da República", no seu blogue Africanidades, em 3 de Outubro de 2006 (blogue que entretanto mudou de servidor e, que portanto, tem um novo endereço: http://africanidades.blogspot.com/ )

A França decidiu actualizar as pensões dos antigos combatentes africanos. A decisão foi provocada pelo filme Indígenas, que comoveu Chirac (o presidente haveria mesmo de reconhecer que os antigos combatentes eram Filhos da República). Villepin, por seu lado, considerou que a medida é tardia.

Uma olhadela por sites francófonos permite dizer que o descongelamento das pensões foi acolhido com reservas por parte dos antigos combatentes. Se por um lado afirmam que “mais vale tarde que nunca”, por outro referem que “a valorização das pensões é mínima e fica aquém do merecido”.

No total, cerca de 84 000 antigos soldados (57 000 reformas e 27 000 pensões de invalidez) de 23 países beneficiarão deste ajustamento. Mas a medida de Chirac não é totalmente desinteressada. Como referia na Quinta-feira na edição portuguesa da RFI certo analista, “muitos dos filhos e netos destes homens vivem hoje em França, emigrados. E votam! Apesar de esta não ser uma fatia de eleitorado muito significativa, nesta coisa da democracia todas as migalhas contam. Migalhas também são pão".

Portugal tem no gesto da França uma oportunidade de corrigir uma injustiça (1). É uma obrigação que deve aos seus antigos soldados coloniais, que ficaram esquecidos no mato e hoje vivem, grande parte, na miséria. Como disse Chirac frente aos seus ministros, “a França teve um acto de justiça e de reconhecimento para com todos aqueles que combateram sob a nossa bandeira. Devemo-lo a estes homens, que pagaram com o seu sangue, e aos seus filhos e netos, muitos dos quais são franceses.”

Sócrates pode inspirar-se nestas palavras, para um dia não ter que dizer, como disse Villepin, que “a reparação da injustiça é [será] tardia". Aliás, o peso da injustiça já deve pairar na consciência do PM português. Em Julho, quando viajou a Bissau para participar na Cimeira da CPLP, Sócrates passou por uma manifestação de ex-combatentes, mesmo à saída do aeroporto, que de bandeira verde-rubra em punho exigiam aquilo que lhes é devido. Interpelado pelos jornalistas, o PM referiu “não ter visto manifestação nenhuma.” Cegueira política.
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Nota de L.G.:

(1) Vd. post de 27 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P998: Antigos combatentes: sem pernas, sem braços mas com memória (Jorge Neto)

(2) O Jorge, o nosso correspondente em Bissau, mudou-se com armas e bagagens para a nova versão (beta) do Blogger.com... Está a passar por alguns problemas (por exemplo, não reconhecimento dos caracteres portugueses, dificuldades em moderar os comentários), que eu espero que ele possa rapidamente ultrapassar, para o bem-estar e sossego dos fãs do seu blogue, o Africanidades... Aproveitou para se registar com outro dos seus apelidos: Rosmaninho. Enfim, decidiu assumir a sua costela alentejana (sic)... Ontem fiz um negócio com ele e com o Paulo Santiago: a nosso pedido, no interesse da nossa memória comum, da nossa História comum (portugueses e guineenses), ele vai tentar entrevistar o Paulo Malu, que hoje trabalha na Direcção-Geral das Alfândegas e que em 17 de Abril de 1972 comandava o grupo do PAIGC que, no Quirafo, na estrada Saltinho-Dulombi, montou a mais mortífera ou uma das mais mortíferas emboscadas às NT... Este episódio já foi aqui abundantemente evocado, descrito, falado... Veja-se, enter outros, os posts do Paulo Santiago:

sexta-feira, 6 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1155: Álbum fotográfico (Hugo Moura Ferreira) (1): Bedanda, CCAÇ 6, 1970: O Obus 14 contra o foguete Katiusha

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Guiné > Bedanda > CCAÇ 6 > 1970 > Resposta do Obus 14 a ataque de foguetes Katiusha, de 122 mm.

Foto: © Hugo Moura Ferreira (2006). Direitos reservados. Foto alojada no álbum de Luís Graça > Guinea-Bissau: Colonial War. Copyright © 2003-2006 Photobucket Inc. All rights reserved.


1. Damos início à publicação do Álbum Fotográfico do Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil de Infantaria, que esteve na Guiné, entre Novembro de 1966 e Novembro de 1968, primeiro na CCAÇ 1621 (Cufar) e depois na CCAÇ 6 (Bedanda)(1) (vd. carta de Bedanda).

Ele mandou-nos um primeiro lote de fotografias, seleccionadas, através de e-mail de 26 de Julho de 2006. Meteram-se pelo meio as férias de verão e só agora houve disponibilidade para começar a inserir no nosso blogue esse material, de grande interesse documental. As nossas desculpas ao Hugo (que de certo nos compreenderá) bem como ao resto da tertúlia. (LG)

Caro Luís:

Tenho andado um pouco arredado por força dos afastamentos geográficos que tenho feito daqui de Lisboa. Hoje à noite vou sair outra vez por mais uns dias. Não queria, no entanto deixar de te informar que tenho lido tudo o que tens feito passar, quer por mail quer por inserção no blogue.

Quase tudo o que ali é relatado é posterior à minha estadia por aquele chão. Não deixo, contudo, de viver tudo o que por lá se conta. Por mim gostaria de ser mais participativo mas as minhas memórias serão possivelmente mais curtas e depois de ler estórias tão bem contadas, com tanto conteúdo e pormenor, fico um pouco retraído e com dúvidas acerca das minhas contribuições.

E assim, penso que posso contribuir, não com estórias, mas com outras coisas, por exemplo, fotos e outras curiosidades(...).

Hoje queria aproveitar para a enviar-te meia dúzia de fotos que tu utilizarás como entenderes. Se precisares de alguma explicação complementar sobre elas, apenas farás o favor de me dizer para eu as comentar. Estão divididas em cinco pequenos conjuntos:

1 - Confraternização da CCAÇ 1621, em 2 de Julho de 2006;

2 - Bedanda (CCAÇ 6)

3 - Cufar, Cachil, Sangonhá (CCAÇ 1621)

4 - Coluna de Sangonhá para Cacine em 1968 (CCAÇ 1621)

5 - O Furriel Correia Pinto (CCaç1621, 1º Gr Comb, 3ª Secção).


2. Para abrir o álbum do Hugo, começamos por um espectacular imagem de Bedanda, à noite, com a resposta a rapaziada da CCAÇ 6 a um ataque de mísseis (?), em 1970... Julgo que deverá tratar-se de foguetes Katiusha, de origem soviética. Na foto, vê-se o clarão do nosso obus 14, no momento do disparo. A foto foi recolhida pelo Hugo, entre o pessoal da CCAÇ 6: em 1970, ele já não estava lá... (LG)

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Notas de L.G.

(1) Vd. post de 22 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXCV: CCAÇ 16121 (Cufar); CCAÇ 6 (Bedanda) (1966/68)

(2) Vd. também o Sítio do Moura Ferreira, na Net.

Guiné 63/74 - P1154: O baptismo de fogo de um paraquedista e a morte de uma enfermeira no corredor do Morés (Victor Tavares, CCP 121)


Texto do novo membro da nossa tertúlia, o ex-paraquedista Victor Tavares (CCP 121, 1972/74)


A minha primeira experiência de combate,

por Victor Tavares

Em 15 de Janeiro de 1972 cheguei ao BCP 12- CCP 121.

Apresentei-me ao comandante da Companhia de Caçadores Paraquedistas 121, Tenente Castro, o qual me encaminhou para a arrecadação para ir receber o material necessário ao equipamento operacional que era habitual ser distribuído a cada combatente.

Chegado àquela unidade operacional, fui colocado no 2º pelotão da companhia, na 1ª secção, comandada pelo Furriel Paraquedista Casalta, sendo o pelotão comandado pelo Alferes Miliciano Paraquedista Afonso Abreu.

16 de Janeiro de 1972: Recebemos ordens para formarmos equipados para sairmos para uma operação. Às 8.30 desse dia partimos em viaturas, o 1º Bigrupo de combate formado pelos 1º e 2º pelotões da CCP 121, rumo a Mansoa. Aí chegados aguardámos ordens na pista térrea, que para os Piras era surpresa, porque, além de ser de piso de terra, também não tinha nenhum tipo de controlo aéreo ou de segurança. Posta essa questão aos mais velhos, fomos informados que maiores surpresas iríamos ter, o que se viria a confirmar.

Entretanto começa a movimentação dos nossos comandantes de pelotão e de secção, os quais nos disseram Está a Preparar! . Poucos minutos depois ouve-se o trabalhar dos helicópteros que se aproximavam, vindos de Bissau.

Em equipas de 5 já preparados para embarque e por ordem de entrada nos respectivos Helis, chegou a ordem de embarque e lá fomos com a informação quase nula daquilo que iríamos fazer.... Era um heliassalto a uma zona suspeita nas matas do Sára.

Chegados ao local era para saltar logo que fosse dada a ordem, independentemente da altura a que o Heli estivesse do solo, porque este teria que ficar em segurança e a saída teria de ser rápida... E assim foi: quando o 3º Heli chega à zona, já os primeiros combatentes dos dois primeiros helis” trocavam tiros com o inimigo.

Para quem tinha chegado na véspera era uma recepção calorosa. Mas já estávamos mentalizados para qual seria a nossa missão durante a nossa comissão de serviço naquela província. Para começar não foi mau de todo, a operação demorou cerca de duas horas e fomos recuperados pelos helis no local onde tinha sido o desembarque.

Resultado da operação: captura de 2 granadas de RPG2 e fitas de metralhadora ligeira Degtyerev e uma mochila contendo medicamentos e utensílios para intervenções cirúrgicas que era transportada por uma enfermeira morta neste contacto (1).


(Foto já não disponível "on line")

Guiné > PAIGC > 1972 > Uma mãe, com a sua criança ao colo, numa das áreas sob controlo do PAIGG, ouve o discurso de um membro da Missão Especial da ONU às Zonas Libertadas. Foto: ONU /Yutaka Nagata (do livro de Amílcar Cabral Return to the Source). 

Fonte: Amilcar Cabral and the Revolution in Guinea-Bissau (1999) (com a devida vénia...)

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Nota de L.G.:

(1) Esta referência telegráfica a uma mulher guerrilheira do PAIGC, enfermeira, morta pelos paraquedistas, no dia do baptismo de fogo do Victor Tavares, traz-me à memória alguns dos mais belos, intimistas e perturbantes textos que têm sido aqui publicados no nosso blogue... Esses textos, da autoria do Virgínio Briote, merecem uma referência especial, até porque tem sido muito escassa a evocação das mulheres (de um lado e de outro) nesta guerra. Não há ninguém, como o Briote, a falar das mulheres na guerra da Guiné... Vd. posts de:

31 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74: CCLIX: Estórias do outro lado: Ana, a enfermeira do Morès (Virgínio Briote)

(...) "A enfermeira de Morés? A mulher do Paulo Ramos com a criança às costas?! Porque não fugiu? Não pode ser! Não, não lhe façam nada, ela trata do nosso pessoal da luta, faz curativos só, os tugas não me ouvem, lenço não deixa.

... Não sei, não tenho nada para dizer, meu nome é Ana, sou enfermeira, não sei nada da guerra, trato de feridos só, não pode mexer nesse papel, é carta de meu marido, ouviu? Não pode tirar bilhete de meu marido, não pode! Tenho filhinha às costas, não vê? É hora de ela mamar, largue-me! "(...).

31 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLX: Ana/Siga ou as mulheres do PAIGC de que nunca se fala (Luís Graça / Virgínio Briote)

(...) "No chão, mamilo na boca da bebé, era muito difícil, a qualquer um de nós gerir a situação. Por um lado, o respeito que a imagem nos merecia, por outro a consciência de que a Siga estava a fazer o que podia para que os [seus] camaradas tivessem tempo para nos preparar uma retirada como devia ser. E ela veio, à força, dois soldados a arrastá-la pelo chão, a bebé no colo de outro soldado, as chicotadas a ouvirem-se, os gritos dela e doutras bajudas, um pandemónio.

"Depois, já na estrada, recolhidos pela companhia de apoio, a Siga e o comandante foram na minha viatura. Ela ficou muito ofendida comigo, pela forma como foi tratada, sem humanidade, disse-me na cara. E que, quando chegasse a Mansoa, iria apresentar queixa contra mim. O que fez, vim eu a saber uns tempos mais tarde pela boca do major das operações do batalhão de Mansoa.

"O que foi deito deles? Gostaria de saber, mas não soube mais nada. Os procedimentos que seguíamos, no caso de prisioneiros, era entregá-los à chefia do Batalhão. Nunca vim a saber o que foi ou é feito deles" (...).

Vd. também o blogue do Virgínio Briote > Tantas Vidas > Guiné [1965/67]

Guiné 63/74 - P1153: Retrato-robô de uma geração (J. Vacas de Carvalho)

Guiné-Bissau > Zona Leste > Estrada Xime - Bambadinca > Carreira de tiro > 1971 > O Alf Mil Cav José Luís Vacas de Carvalho, comandante do Pel Daimler 2406, foi também instrutor de tiro de "duas ou três companhias de milícias", numa altura em que aumentava a escalada da guerra e se intensificava o esforço de africanização da das NT."Eu estou atrás do General Spínola [É visível o distintivo da arma de cavalaria na boina do Vacas de Carvalho que, para além disso, usava bigode]. Ao meu lado direito está (parece-me) o Fabião e logo a seguir o Polidoro Monteiro [comandante do BART 2917]. E atrás, de óculos escuros, parece-me ser o Tomé.

Foto: © J.L. Vacas de Carvalho (2006). Direitos reservados.


Texto do José Luís Vacas de Carvalho (ex-Alf Mil Cav, Pel Rec Daimler 2206, Bambadinca, 1969/71)

Estivemos na Guiné, já lá vão 35 anos.
É muito tempo.
Talvez na nossa memória haja coisas que tentamos apagar...talvez.
Talvez nos nossos sentimentos haja coisas que tentamos recordar ...talvez.
Talvez os nossos ideais continuem vivos ... talvez.
Talvez o que ouvimos se tenha passado connosco... talvez.
Talvez o que passámos ainda viva nos nossos sonhos .... talvez.
Somos uma geração que ouviu os Beatles, as Françoise Hardy, os Bécault,
Dançámos embalados aos sons dessas músicas.
Vimos, com o 25 de Abril, nascer e morrer ilusões.
Não tinhamos telemóvel, Internet, mas sempre o que queríamos, encontrávamos.
Faziamos amor e não tinhamos medo da SIDA,
Não tinhamos medo do balão, quando a noite era longa.
Mas quando recordamos esses tempos, há amizades sempre perfeitas,
Há cumplicidades que o tempo não mata,
Há memórias...
Há ideais,
E há amizades.

Zé Luis

PS - Em Montemor, [dia 14 de Outubro de 2006,] contem comigo,
para partilhar memórias,
viver ideais, mas acima de tudo
dar a todos um grande abraço de amizade...