segunda-feira, 30 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1714: II Encontro em Pombal (5): Perdidos & achados (Carlos Vinhal / Vitor Junqueira)

Pombal > 28 de Abril de 2007 > 2.º encontro da nossa tertúlia > Passeio cultural > O Vítor Junqueira, nosso anfitrião e guia, falando de cátedra sobre o velho Castelo de Pombal, sob o olhar atento de alguns dos nossos camaradas: Idálio Reis, à esquerda; António Pimentel, J. Armando F. Almeida e Sousa de Castro, à direita.

Pombal > 28 de Abril de 2007 > Passeio pela parte velha da cidade, à tarde, depois do almoço-convívio no Restaurante O Manjar do Marquês. Na foto, o Carlos Vinhal e a esposa...

Fotos: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem do Carlos Vinhal (próximo voluntário à força para ser co-editor do blogue, aliás já foi afixada a ordem de serviço na caserna):

Vítor:

As minhas desculpas por só hoje e agora estar a comunicar contigo.

Mais um encontro concretizado, este da tua responsabiliade. Nunca será demais salientar o bom que é estes maduros encontrarem-se, confraternizarem e mais parecerem adolescentes, que avôs, quando encontram os companheiros de brincadeira. Quanta nostalgia de tempos difíceis, mas inesquecíveis e irrepetíveis. Desta vez vi ainda mais intimidade, já somos velhos conhecidos.

Sou de opinião que o teu passeio da tarde impediu uma confraternização que se queria mais prolongada, mas não se pode ter tudo. Claro que temi pelo meu pobre carrinho pouco habituado, tal como eu, às picadas pelas quais nos encaminhaste. Maroto, levaste o jeep...

Uma das vezes que nos perdemos foi por falta de ligação dos carros que iam à minha frente com a frente da caravana. Outra foi logo à saída do estacionamento pois não havia indicação de se virar à direira ou à esquerda. Valeu a sinalização de Castelo existente logo ali. Precalços naturais numa caravana demasiado extensa. Para a próxima há que aplicar a propriedade associativa e tentar diminuir assim o número de viaturas.

Queria pedir desculpa pelo meu abandono extemporâneo da caravana mas, sendo tu médico reconheces, as mulheres quase na casa dos 60, têm problemas fisiológicos mais prementes. Assim tive que recorrer a um café e, quando tentei recolar, já não vos encontrei. Vi uma indicação para Pombal e antes que me desorientasse de todo, ali rumei.

Fico desde já ans.cioso pelo próximo encontro. A ti e à tua simpática família os nossos agradecimentos.

Já agora, julgo que no blogue nunca te referiste ao modo como conquistaste/mereceste a tua medalha. Se sim, peço desculpa pela ignorância. Se não, está na hora de contares à gente como se ganha uma condecoração como a tua. Fico(amos) à espera.


Até sempre. Recebe um abraço do camarada
Carlos Vinhal

Carlos Esteves Vinhal
Ex-Fur Mil Art MA
CART 2732
CTIG 1970/72
Mansabá
SPM1388

Leça da Palmeira
Telem 916 032 220

2. Resposta do Vitor Junqueira:

Carlos,

Na verdade, eu devia pintar a minha cara de preto! As tuas observações são justíssimas, ainda que demasiado brandas. Para ser totalmente sincero, eu acho-me merecedor de uma bela pissada à ordem. Publique-se no Blog.

Por um lado, tive mais olho de que barriga. Por outro, não tive em consideração uma série de factores a que tinha obrigação de estar atento. Será que tu e a tua esposa poderão perdoar a minha manifesta aselhice? Posso apresentar alguns factos atenuantes?

A natureza abençoou-me com uma saúde até agora sem precalços. Isto leva-me a esquecer as quase seis décadas de ... experiência. Dizem os meus amigos e eu sinto-o, que continuo tão louco como quando tinha vinte anos. São as viagens malucas por terras onde Cristo nunca andou, é o entusiasmo fácil por qualquer tontice com cheiro a aventura, é a atracção pelos desporto radicais ... estás a ver o animal? Pois é, foi isso que levou a minha ex-mulher a desistir há cerca de um ano. Não aguentou mais, demitiu-se!

Uma das actividades em que costumo envolver-me é nas andanças dos jipes. Já temos tido colunas com mais de quarenta viaturas, e tal como diz o lema dos nossos camaradas paraquedistas, aqui com outro sentido felizmente, "ninguém fica para trás". Armado em tótó, convenci-me de que seria possível fazer algo semelhante com os meus amigos e camaradas e ainda chegar a tempo de continuar a confraternização tarde e noite fora. Deu no que tinha que dar, claro!

O que isto tem de bom, é que como penitência vou oferecer-me para ficar à frente de um próximo emprendimento aqui em Pombal, e com os erros cometidos ontem hei-de aprender a fazer melhor.

Aceita um abraço do,
Vítor Junqueira
____________

Nota de L.G.:

(1) Vd. postes anteriores:

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1709: Tertúlia: Encontro em Pombal (1): Malta de cinco estrelas (José Martins)

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74: P1710: Tertúlia: Encontro de Pombal (2): Saudades (João Parreira / António Pinto / Vitor Junqueira)

30 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1712: Tertúlia: Encontro em Pombal (3): Obrigado e até ao próximo, em Monte Real (Joaquim Mexia Alves)

30 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1713: Tertúlia: Encontro em Pombal (4): O nosso bom humor (Tino Neves / Vitor Junqueira)

Guiné 63/74 - P1713: II Encontro em Pombal (4): O nosso bom humor (Tino Neves / Vitor Junqueira)


1. Mensagem do Tino Neves - assinalado na foto, ao lado, com un círculo a amarelo (1) - , enviada directamente ao Vitor Junqueira, organizador do 2º encontro da nossa tertúlia (Pombal, 28 de Abril de 2007):

Camarada Vitor:

Tem este, o fim de lhe agradecer, por ser o organizador e anfitrião do nosso encontro-convívio em Pombal (2), que gostei muito, pese embora eu ter sido um dos desenfiados involuntários, porque segui atrás de duas viaturas saídas do restaurante, que não pertenciam às NT, supostamente eram IN. Quando me apercebi já era tarde para qualquer manobra de diversão, e tive que seguir em frente até encontrar um trilho, para voltar a Pombal, e segui rumo ao velho Aquartelamento de Pombal, no ponto mais alto, e estando este abandonado, fiz um raide automobilístico pela cidade e, não conseguindo encontrar as NT, rumei a Coimbra, pois não tinha qualquer contacto telefónico para tentar saber a vossa localização. ´

Só então no Centro Comercial Dolcevita em Coimbra, via net (através do nosso Blogue), cvonsegui saber o saber o número de telemóvel do Luís Graça e liguei-lhe a saber onde estavam. Ao que ele me disse, estava no Restaurante Manjar do Marquês, para onde eu segui de imediato.

Estando no Manjar poucos elementos, rumei a casa (Almada), com muita pena do acontecido, por não porder acompanhá-los até ao fim, e despedir-me, eu e a minha esposa, de todos, convenientemente.

Apesar de tudo, gostei imenso, e como ainda somos periquitos nestas andanças, vamos aprendendo com os erros cometidos Como o meu irmão dizia e escreveu numa parede de caserna em Mueda (Moçambique), “OS CORDEIROS QUE CHEGAM, SÃO OS LOBOS QUE PARTEM”.

Um abraço do

Tino Neves
Almada

2. Resposta do Vitor Junqueira:

Olá Tino,

Tu és o mais simpático dos camaradas e as tuas palavras demonstram-no. Obrigado
Mas olha, gostei muito da forma como descreves os teus (nossos) azares. Fartei-me de rir; tu tens muito jeito para achar graça onde outros só encontrariam razões para protestos. Que Deus te conserve esse espírito!

E com os erros deste ano, aprendemos qualquer coisa para que o próximo encontro corra melhor.

Até lá, aqui vai mais um forte abraço deste camarada e amigo de Pombal,

Vitor Junqueira

___________

Notas de L.G.:

(1) Legenda da foto (pormenor de foto maior, com todo o grupo, tirada na escadaria de acesso à entrada principal do Restaurante Manjar do Marquês, Pombal):

Da esquerda para a direita:

1ª fila: Beja Santos, Mexia Alves, Jorge Cabral e António Barroso;
2ª fila: David Guimarães. Tino Neves, Luís Graça e Raul Albino;
3ª fila: Manuel Ferreira, Sousa de Castro, A. Marques Lopes, Fernando Chapouto, J. L. Vacas de Carvalho, António Duarte, Helder Sousa;
4ª fila (e última) fila: Jovem desconhecido (de óculos escuros), A. Santos, Victor Cordeiro, António Pimentel, Fernando Franco, Idálio Reis, Afonso (amigo do Helder Sousa) e João Parreira.

(2) Vd. postas anteriores sobre o encontro:

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1709: Tertúlia: Encontro em Pombal (1): Malta de cinco estrelas (José Martins)

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74: P1710: Tertúlia: Encontro de Pombal (2): Saudades (João Parreira / António Pinto / Vitor Junqueira)

30 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1712: Tertúlia: Encontro em Pombal (3): Obrigado e até ao próximo, em Monte Real (Joaquim Mexia Alves)

Guiné 63/74 - P1712: II Encontro em Pombal (3): Obrigado e até ao próximo, em Monte Real (Joaquim Mexia Alves)

Pombal > 2º Encontro da tertúlia Luís Graça & Camaradas da Guiné (1) > Visita ao castelo de Pombal, fundado por no Séc. XII por Gualdim Pais, na época da Reconquista. O competentíssimo guia foi o nosso anfitrião, Vitor Junqueira, médico, natural de Pombal. Na foto, dois camaradas da CART 3492, o António Barroso e o Joaqim Mexia Alves, que não se viam há trinta e quatro anos. O Barroso, que vive em Canidelo, Vila Nova de Gaia, é um dos membros mais recentes da nossa tertúlia (2).

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.

Mensagem do Joaquim Mexia Alves:


Caros Luís Graça, Vítor Junqueira e Camaradas da Guiné:


Ainda a refazer-me das emoções de Sábado, venho agradecer - quer queiram, quer não queiram:

(i) ao Luís Graça, pela ideia do blogue, pelo trabalho que nele tem e também porque por causa disso nos proporciona momentos como os de Sábado;

(ii) Ao Vítor Junqueira e a quem o ajudou a organização e tudo o que naquele dia nos quis dar, sobretudo a intimidade que nos deu de si próprio ao colocar a sua família como nossa anfitriã, mais o belíssimo gesto da condecoração;

(iii) A todos os camaradas, pelo amizade, o acolhimento, a alegria, a franqueza do abraço.

De várias idades, de vários lugares, de várias unidades militares, de diversas formas de fazer a guerra, de diversas formas de viver a vida e no entanto unidos no mesmo sentir e na mesma entrega generosa uns aos outros.

Realmente na guerra aprendemos a colocar as nossas as nossas vidas nas mãos dos outros e aceitamos ao mesmo tempo a incumbência de protegermos as vidas daqueles que em nós confiam.

Atitudes destas só podem resultar naquilo que vimos e sentimos no Sábado:

Uma amizade, um acolhimento, um abraço que vai muito para lá do simples conhecimento humano, muito para lá daquilo que vulgarmente se chama amizade, pois constitui um modo de viver diferente, baseado verdadeiramente no dar e receber.

Foi para mim muito forte e sentido ter abraçado o Barroso (2) e o Soares (3), que não via há 34 anos, ou seja, desde o Xitole.

Perdoem-me o palavreado, mas sou um tipo emocional, sempre o fui, (tenho a lágrima fácil), e se Deus quiser, quero continuar a sê-lo, para vos continuar a abraçar como amigos que melhor que ninguém entendem o que passei, porque também o passaram.

Tal como disse ao Luís Graça, Monte Real fica com as portas abertas para um próximo encontro, com a facilidade de muito alojamento, para quem quiser ficar mais um pouco e beber mais um copo.


Abraço forte e amigo a todos do


Joaquim Mexia Alves

Termas de Monte Real

tel: + 351 244 619 020
fax: + 351 244 619 029
_____________________

Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1709: Tertúlia: Encontro em Pombal (1): Malta de cinco estrelas (José Martins)

29 de Abril de 2007 > Guiné 63/74: P1710: Tertúlia: Encontro de Pombal (2): Saudades (João Parreira / António Pinto / Vitor Junqueira)


(2) Vd. post de 28 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1708: Tertúlia: Apresenta-se o ex-Alf Mil da CART 3492, António Barroso, Xitole, 1972/74


(3) 17 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1667: Tertúlia: Apresenta-se o Furriel Mil Mec Auto Artur Soares, da CART 3492 (Xitole, 1972/74)

Guiné 63/74 - P1711: Tabanca Grande (7): Rui Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 816 (Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67)




1. Mensagem de Rui Silva:


Santa Maria da Feira, 13 de Março de 2007

Sr. Luís Graça:

Receba os meus cumprimentos e os mais sinceros parabéns pelo seu Blogue (Site?) que tem na Internet.

Sou um ex-Furiel miliciano da Companhia de Caçadores n.º 816 que operou na Guiné no biénio 1965-67.

Tenho-me deliciado com o conteúdo do seu longo mas nunca(!) extenuante Blogue em referência à guerra na Guiné, pois considero-o também um trabalho super-extraordinário. Passados 40 anos reviver o passado é um sonho tornado realidade.

Envio-lhe este e-mail, pois gostava de ver referências à minha Companhia (n.º 816) que operou na zona do Oio (Bissorã, Olossato e Mansoa) sempre em combate. Sem desprimor de muitas outras Companhias, a CCAÇ 816, superiormente comandada pelo capitão Luís Riquito, tem um trabalho meritório naquela ex-província portuguesa. Tenho algumas fotos, caderno de memórias, recortes de revistas, etc. desses tempos.

Se atender à minha petição diga-me como proceder p. f.

Sem outro assunto

Sou, Atenta e respeitosamente
Rui Aníbal Ferreira da Silva
Ex- Furriel miliciano
CCAÇ 816
Bissorã
Olossato
Mansoa
1965/67

2. Rui:

1. Em primeiro lugar, sê bem vindo. Como já percebeste, aqui tratamo-nos todos por tu, como camaradas que somos. Em segundo luigar, peço-te desculpa pelo atraso na resposta! Por fim, deixa-me dizer-te que a tua vinda e a tua contribuição para este projecto colectivo (que é o nosso blogue) são muito importantes.

Já pus os teus dados e fotos na página da tertúlia.És dos nossos, há muito. Já te inclui também na nossa lista de e-mails… De qualquer modo, ficas aqui formalmente apresentado aos restantes camaradas.

Julgo que és o primeiro elemento da CCAÇ 816 a aparecer por estas paragens.

Um grande abraço para ti, camarada Rui. Fico a aguardar os teus escritos e demais fotos.


3. Referências à actividade da CCAÇ 816: vd. página da CART 1525 - Os Falcões (Bissorã, 1966/67), gerida pelo nosso camarada Rogério Freire. Esta unidade foi comandada pelo capitão de artilharia Jorge Manuel Piçarra Mourão, que já morreu, com o posto de coronel, e é autor do livro Guiné Sempre (2001), além de Da Guiné a Angola (1).

No historial desta unidade, é referida a participação da CCAÇ 816 nas seguintes operações:

Operação Estepe > Morés > 3 de Junho de 1966

Operação Elefante IV > Bará > 13 de Agosto de 1966

Há ainda um referência à CCAÇ 816, no historial da CART 1525, quando um dos seus grupos de combate esteve em actividades de diligência, mais concretamente o 1º Gr Comb, em Bissorã, de 6 a 25 de Fevereiro de 1966:

(...) "20 [de Fevereiro de 1966] - Duas secções, incorporadas nas forças da CCAÇ 1419, realizam a operação CASTOR à base central de Morés. Saindo do Olossato, montam emboscada na região de Cudana, sem incidentes. Reúnem-se depois à CCAÇ 816 que apreendera grande quantidade de material e preparam a evacuação. Foram flagelados com LGFog, sem consequências, pelo que prosseguiram no regresso, transportando o material capturado. Foram então fortemente emboscados junto do cruzamento do caminho de Canfanda com a estrada de Bissorã - Mansabá com Mort 82, armas autom. e granadas de mão, do que resultaram quatro feridos ligeiros. Continuada a progressão foi então evacuado o material já próximo do Olossato, o qual foi atingido sem mais incidentes" (...).

_______

Nota de L.G.:

(1) Vd. posts de:

18 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXIII: Piçarra Mourão, militar e escritor (CART 1525, Bissorã, 1966/67) (A. Marques Lopes)

19 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXIV: Bibliografia de uma guerra (6) (Jorge Santos)

domingo, 29 de abril de 2007

Guiné 63/74: P1710: II Encontro de Pombal (2): Saudades (João Parreira / António Pinto / Vitor Junqueira)

Pombal > 28 de Abril de 2007 > 2º encontro da nossa tertúlia > O João Parreira, ex-furriel comando do Grupo de Comandos Os Fantasmas (1965/66).

Pombal > 28 de Abril de 2007 > 2º encontro da nossa tertúlia > O António Pinto, um dos camaradas que veio de mais longe (Monção)... Ele é também um veterano, dos mais antigos, da guerra da Guiné (1963/65): esteve em Madina do Boé e em Beli (1).... Conheceu ali o João Parreira, furriel comando, que também esteve no nosso encontro de Pombal... Ele estava desolado por não emcontrar ninguém que tenha conhecido Madina do Boé e Beli... No almoço apresentei-lhe o Torcato Mendonça (1968/69), mas esqueci-me do João Parreira, que estava ali mesmo ao lado ... Não sei se chegaram a falar-se... Este é o lado mais frustrante destes encontros: o tempo é tão escasso e as solicitações são tantas que é impossível ter uma conversa decente, com princípio, meio e fim, com todos e com cada um... Ora éramos mais de 85... Pela minha parte, procurei dar uma palavrinha a todos... (LG)


1. Mensagem que acabo de receber do Vitor Junqueira, ainda antes das badaladas das 24 horas de domingo, 29 de Março de 2007:

Luís,

Tudo bem contigo? Pois eu já tenho saudades do dia de ontem!

Peço-te o favor de, quando te for possível, passares para o blogue a minha resposta a alguns e-mails que me têm chegado e de que te envio dois exemplos.
Obrigado,

Vitor


João Parreira, António Pinto e demais camaradas e amigos,

Do fundo do coração, vai o meu muito obrigado pela vossa presença no Encontro. Ao deslocarem-se a Pombal, não só manifestaram a natural consideração que têm pelos outros Tertulianos, mas também eu e a minha família nos sentimos particularmente confortados e acarinhados por ter-vos por umas horas na nossa terra e na nossa companhia. Felizmente éramos muitos, a caravana enorme, e os precalços lá estavam à espreita. Não conseguimos fazer a ligação correcta, da frente para trás como no tempo da tropa. Alguns descolaram da coluna e ... nunca mais lhe apanharam o rasto.

A responsabilidade é exclusivamente minha, e já retirei as devidas ilações. Assim, proporei para o próximo encontro, entre outros os seguintes pontos:

1º A concentração deverá começar bem mais cedo para que tenhamos tempo para conversar, trocar abraços e impressões. Neste campo ficamos todos com fome; foi pouco (o tempo), soube a pouco (a confraternização), queríamos mais (paleio).

2º Proporei que se abra a possibilidade de serem apresentadas comunicações. Algo muito bem gizado, porque não queremos transformar em congresso o que se pretende que seja apenas um encontro convivial.

3º Programa extra, se o houver, deverá ser do conhecimento prévio de todos para que venham preparados para o embate. Até pode ser preciso trazer fato de treino e botas de tracking!

4º Nos passeios em automóvel, parece razoável concluir que haverá toda a vantagem em distribuir os participantes pelo menor número possível de carros: Assim evitaremos as longas caravanas, os atravessamentos demorados e os polícias zelosos.

5º E aqueles que já se encontram a gozar galhardamente a sua reforma? Dispondo de todo tempo do mundo para fazer o que lhes dá na real gana, porque é que não hão-de continuar, tarde e noite fora, para jantar e honrar Orfeu?

A propósito, atentem no que dizem que disse o grande Jorge Luís Borges*, escritor Argentino (poeta, ensaísta, dramaturgo, filósofo ...), falecido há cerca de vinte anos, quando já estava prestes a arrumar as botas. Registemos e aprendamos.

Instantes

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima, trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ainda mais tonto do que tenho sido. Na verdade, bem poucas coisas levaria a sério.

Seria menos asseado, correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria em mais rios. Iria a lugares onde nunca fui, tomaria mais sorvete e menos lentilhas, teria mais problemas reais e menos problemas imaginários.

Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e produtivamente cada minuto da vida: Claro que tive momentos de alegria. Mas, se pudesse voltar a viver, trataria de ter somente bons momentos. Porque, se não sabem, disso é feita a vida, só de momentos; não percas o agora. Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um termómetro, uma saco de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas; se voltasse a viver viajaria mais leve.

Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no início da primavera e continuaria assim até o fim do Outono. Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vida pela frente. Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou a morrer.


* Este foi apenas um dos autores a quem foi atribuida a paternidade deste poema. O assunto é polémico, mas para o caso tanto faz; o que conta é a sabedoria e o aviso à navegação, contido nestes versos. A tradução é da minha lavra.



2. Caro Vitor,

Felicito-te pela excelente organização nessa terra simpática de Pombal, onde com os teus familiares nos proporcionaram um agradável convívio com muito dos nossos tertulianos. Não fiz o percurso turístico completo já que depois do Castelo concreite-me mais na conversa com o Briote do que na condução pelo que numa das rotundas perdi o rasto do carro que ia à minha frente e que devia ser o último.

João [Parreira]


3. Amigo Vítor Junqueira,


Felizmente fizemos uma óptima viagem até Monção.

Queremos, falo em nome de minha mulher e de mim próprio, agradecer-te todas as atenções que nos foram dispensadas e, ao mesmo tempo, elogiar toda a organização do almoço do Convívio e os momentos que tiveste a amabilidade de a todos proporcionar com as visitas que fizemos e que nos deu a oportunidade de conhecer as maravilhas de Pombal, de que não fazíamos a menor ideia.

Para ti e para a tua família tudo de BOM. E um até breve,

António Pinto
___________


Notas de L.G.:


(1) Vd. posts de:

17 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1437: Estórias de Madina do Boé (António Pinto) (1): a morte horrível do Gramunha Marques e o ataque a Beli em que fui ferido

3 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1397: Ataque ao destacamento de Beli em Maio de 1965 (António Pinto, BCAÇ 512)

20 de Dezembro de 2006> Guiné 63/74 - P1384: Com o Alferes Comando Saraiva e com o médico e cantor Luiz Goes em Madina do Boé (António de Figueiredo Pinto)


18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1378: António de Figueiredo Pinto, Alf Mil do BCAÇ 506: um veterano de Madina do Boé e de Beli


(2) Vd. post de 4 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1493: Estórias de Madina do Boé (António Pinto) (2): Eu e o Furriel Comando João Parreira

Guiné 63/74 - P1709: II Encontro em Pombal (1): Malta de cinco estrelas (José Martins)

Pombal > Restaurante Manjar do Marquês > 28 de Abril de 2007 > 2º encontro da tertúlia Luís Graça & Camaradas da Guiné.... Gente de cinco estrelas, chamou-lhes o José Martins... Eu sei que é elogio em boca própria, por que o Martins é a modéstia em pessoa...

Por mim, pela parte que me toca, tenho apenas que demonstrar, aqui, publicamente o meu reconhecimento, apreço, amizade e camaradagem a todos/as aqueles/as que puderam e quiseram associar-se a esta iniciativa de que falaremos mais detalhadamente durante a semana... Vieram de muitos pontos do país. No final somavam cerca de 85 cabeças... Aumentaram e enriqueceram a nossa tertúlia.

Da mais elementar e sobretudo inadiável justiça é a palavra de agradecimento que é devida ao nosso amável e afável anfitrião, o Vitor Junqueira, e à sua família: ele, mais as suas meninas e meninos (três filhas, duas netas, um genro e e um futuro genro), não podiam ter sido mais hospitaleiros e carinhosos para connosco... Receberam-nos como só os amigos sabem e podem receber.

Vitor, tu e a tua família é que merecem, com toda a propriedade, o epitíteto de gente de 5 estrelas... Só não te digo obrigado, porque tu detestas a palavra... (LG).

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.


Caro Luis

Chegado a casa do regresso de Pombal, respondi ao correio do meu/nosso amigo Raúl Caetano, que procura saber a verdade sobre a morte do seu tio e nosso camarada Manuel de Jesus Rodrigues Sobreira na Guiné em 24 de Agosto de 1968, de que te enviei cópia.

Mas a razão principal desta mensagem é a de agradecer, em nome do meu irmão mais velho, que te apresentei e que apareceu em Pombal sem que nós, eu e o meu irmão Manuel, soubessemos, pela forma como foi recebido e envolvido por toda a malta da tertúlia com quem contactou.

Não obtante ao responder que não tinha estado na Guiné, nem em nenhuma outra frente, já que cumpriu o seu serviço militar em 1953, não deixou de vir impressionado com a forma com que foi tratado. Não imaginava como é que os que tinham estado na guerra, confraternizavam e a forte amizade com nos une.

Esta manifestação de camaradagem que lhe foi demonstrada foi o mote para falar com ele sobre o blogue, que vai difundir junto de amigos, e sobre a Guiné sobre a qual nunca tínhamos falado apesar de, e visto ser bem mais velho do que eu, me ter acompanhado ao Cais da Rocha do Conde de Óbidos em Maio de 68, quando parti, e lá ter voltado em Junho de 70 para me receber.

A malta da Guiné continua a ser 5 estrelas, isto é, melhor que Marechais.

José Martins
(ex-Fur Mil Trms
CCAÇ 5
Canjadude, 1968/70)

2. Comentário de L.G.: O José Martins cometeu a proeza de juntar, ontem, em Pombal, no nosso encontro, dois dos seus irmãos, um que vive em Leiria, o mais velho; e outro que vive no Porto, toca viola e guitarra, e esteve na Gúiné no início da guerra. Que belos manos, Zé! Longa vida para vocês!

sábado, 28 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1708: Tabanca Grande: António Barroso, ex-Alf Mil da CART 3492, (Xitole, 1972/74)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) > 1970 > Coluna logística da CCAÇ 12 a caminho do Xitole.

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.


Luís: Apresenta-se António Barroso, ex-alferes miliciano do CART 3492 (Xitole, 1972/74).

Moro em Valadares, freguesia vizinha da Madalena (onde tens família) e de Canidelo (onde vive o nosso camarada Xico Allen). Foi através dos números telefónicos visionados no blogue que consegui falar, passados 33 anos, com o Mexia Alves e o António Soares, [ambos da CART 3492].

O Mexia Alves fez já algumas referências à minha pessoa no blogue e espero poder, mais tarde, acrescentar algo de interessante.

Feitas as apresentações, enviarei em breve fotografias, quero deixar a todos os que pisaram o chão da Guiné e em especial à malta do Xime, Mansambo, Xitole (e Saltinho, que no meu tempo, por razões logísticas, se encontrava muito ligada a nós) um fraterno abraço. E para ti um Bem Haja por esta iniciativa.

António Barroso

PS - Embora seja um pouco em cima da hora, gostaria muito fosse aceite a minha inscrição para o almoço em Pombal no próximo Sábado (Ementa A). De qualquer modo e antecipando-me à resposta, em contacto com o Mexia Alves, já lhe disse que lá estarei. O meu número de telemóvel para qualquer eventualidade é: 93 62 33 066.

2. Comentário de L.G.:

António: Estás em casa, na nossa tabanca grande. Fico à espera das tuas estórias do Xitole, sítio aonde fui algumas vezes quer em colunas logísticas quer em operações na ZA dessa sub-unidade do Sector L1, a que a minha companhia, a CCAÇ 12 (1969/71), esteve afecta como unidade de intervenção. L.G.

sexta-feira, 27 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1707: Um abraço de um amigo guineense que firma no Catió (Souleimane Silá)

Guiné > Região de Tombali > Catió > Álbum fotográfico de Vitor Condeço (ex-Furriel Mil, CCS do BART 1913, Catió 1967/69) > Quartel de Catió > 1968> Quartel, Foto 34 > "Fur Mil Condeço junto de um dos Obus de 14 cm, que iriam substituir os obuses de 8.8 cm [Fev 1968] ">... Uma pequena homenagem do nosso blogue a todos os naturais de Catió, com votos de que esta bela terra do sul da Guiné-Bissau não volte a conhecer os símbolos fálicos da guerra e da violência... (LG)

Foto e legenda: © Vítor Condeço (2007). Direitos reservados.


1.E-mail recebido em 31 de Março último, enviado por um visitante do nosso blogue, Souleimane Silá, guineense, natural de (ou residente em) Catió, presumivelmente a viver neste momento em Portugal.

Acabo de conhecer a vossa OBRA; não imagina como encantado estou!

No princípio desse mês comprei o meu 1º PC portátil para aprender a utilizar e me informar mais. Veja no que o destino me aponta!

Afinal, estava eu adormecido, mas espero acordar-me e colaborar convosco. Ensinem-me como poder tomar parte na vossa divulgação, a que me candidato compatrioticamente.

Um abraço do bissau-guineense, de Catió,

Souleimane Silá

Tm (351) 96 222 29 12

2. Comentário de L.G.:

Caro amigo:

Este é um blogue de antigos combatentes da guerra da Guiné, portugueses, mas também aberto aos antigos combatentes do PAIGC e, de um modo geral, a todos os amigos de Portugal e da Guiné-Bissau, de um lado e de outro - amigos portugueses da Guiné-Bissau ou amigos guineenses de Portugal. O que importa é que tenham em comum o interesse pela perservação da memória da guerra colonial ou da guerra de libertação (como der mais jeito dizer)...

As nossas regras (mínimas) de convívio constam duma página que se chama Tertúlia dos Amigos & Camaradas da Guiné. Como guineense que é, independentemente da geração a que pertence (imagino que não tenha idade para ter feito a guerra de 1963/74, sob a bandeira de um lado ou de outro), o Souleimane será bem vindo a este ciberespaço de convívio, de partilha, de memória e de lusofonia...

Um ciberabraço.

Luís Graça.

Guiné 63/74 - P1706: No 25 de Abril de 1974 eu estava lá (2): Em Galomaro, região de Bafatá (Manuel Pereira, CCAÇ 3547 / BCAÇ 3884)

1. Depoimento do camarada Manuel Pereira, ex-Fur Mil do CCAÇ 3547, sobre o 25 de Abril de 1974 na Guiné (1):

Bom dia amigos Tertulianos,

Eu sou um dos muitos que a alvorada de Abril apanhou na Guiné. 

O meu batalhão terminou a sua Comissão a 25 de Dezembro de 1973, mas por birra do Spínola a quem o Governo não atribuía mais tropa para a região (a fábrica estava a falir... Lembro que uma companhia que se destinava a S.Tomé, foi desviada pelos Fiats (?) para a Guiné – fazia parte dela um jogador famoso do F C Porto - Lemos), obrigou os velhinhos a adiarem o seu retorno à Metrópole.

 Viemos (eu vim mais tarde) a 30 de Junho de 1974.

Dizia eu, que estava lá. É verdade, no dia 25 de Abril estava em reforço do Batalhão de Galomaro e só depois a 28 ou 29 é que foi com o meu Grupo ocupar as instalações abandonadas do Dulombi. 

Chorei de raiva (ninguém viu), mas foi. Já no Dulombi sou informado, por alguém do MFA, que o Coronel Tir Cmd de Galomaro, com quem sempre me incompatibilizava nos briefings, tinha sido detido e levado de Galomaro. Abandonei o Dulombi a 29 de Maio e neste aquartelamento apenas ficou uma secção de milícia.

Sobre o MFA e a nossa participação – o BCAÇ 3884 –, enquanto força oculta do mesmo, posso adiantar que a nossa missão caso o Movimento falhasse na Metrópole, seria – todos Cmd de Companhia estavam ao corrente – a sublevação, arregimentar outras unidades, deslocar-nos para Norte, passarmos a fronteira (havia contactos com oficias do exército do Senegal) e daí reentrarmos na Guiné talvez por Colina do Norte, Farim, Mansoa ou Bula e por fim Bissau.

Felizmente não foi necessário. Muitos de nós, eventualmente, teríamos caído. Nem todos estariam de acordo com as nossas opções. Para aqueles que de forma generosa se voluntariaram para esta arrojada missão, o meu (nosso) eterno agradecimento. 

Mesmo que os três D não se tenham ainda realizado – fica a esperança –digo, VALEU A PENA. VIVA O 25 de ABRIL!

Documentação e protagonistas directos seguirão num próximo capítulo.

Um abraço a Todos e particularmente aos que estarão em Pombal.
Manuel Pereira
Ex-Fur Mil da
CCAÇ 3547 - Os Répteis de Contuboel, 1972/74
__________

Nota de L.G.:

(1) Vd. post anterior > 27 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1705: Em 25 de Abril de 1974 eu estava lá (1): Em Cansissé, região do Gabu (Américo Marques, 3ª CART do BART 6523)

Guiné 63/74 - P1705: No 25 de Abril de 1974 eu estava lá (1): Em Cansissé, região do Gabu (Américo Marques, 3ª CART do BART 6523)

Guiné > Nova Lamego (Gabu) > 3ª CART / BART 6523 > Junho de 1974 > Cansissé > Os soldados do destacamento de Cansissé, entre Bafatá e Nova Lamego, junto ao Rio Corubal, empunham a bandeira do PAIGC e confraternizam com os inimigos de ontem...

"Eu sou dos últimos guerreiros do Império. Meio guerreiro, pois não acabei a Comissão e ainda participei na troca de bandeiras. A minha ignorância e o meu patriotismo fizeram-me sentir uma tristeza... mais triste [em Setembro de 1974]".


Foto: © Américo Marques (2005). Direitos reservados.

1. Comentário do editor do blogue:

Passaram 33 anos do 25 de Abril de 1974... O Movimento dos Capitães começou na Guiné. Clandestinamente. Poucos de nós se aperceberam de que estava em marcha um golpe de Estado que iria derrubar um regime semi-centenário. E que o fim da guerra se aproximava. Alguns de nós estávamos lá, na Guiné, ou estávamos cá, ainda na tropa , outros já estavam há muito na "peluda"..

Temos ainda muito poucas ou raras referências sobre o que se passou na Guiné nesses já longínquos dias de Abril (e depois nos meses imediatamente a seguir, Maio, Junho, Agosto e Septembro) de 1974...

Quem estava lá messa altura? 

Da malta registada na nossa tertúlia, temos alguns: o Américo Marques (3ª CART / BART 6523, Cansissé, Set. 74), o Antero dos Santos, o António Santos (CCAÇ 18, Aldeia Formosa, Jun. 74), o Casimiro Carvalho (CCAç 11, Paunca, Jul. 74), o João Carvalho (CCAÇ 5, Canjadude, Ago. 74), O José Bastos (Transmissões, Ago. 74), o Manuel Pereira (CCAÇ 3547 / BCAÇ 3884, Set. 74)...

Daqueles que foram para lá depois do 25 de Abril de 1974, tenho apenas conhecimento do pira de Mansoa, o Magalhães Ribeiro (CCS do BCAÇ 4612, Mansoa, Set. 74) que lá foi só para retirar e levar, debaixo do braço, a nossa bandeira verde-rubra...

Alguns chegaram a casa mesmo na véspera: é o caso, por exemplo, do António Graça de Abreu (CAOP 1, Cufar, Abr. 74), que apanhou o avião a 20 de Abril de 1974... 

A malta do BART 3873 também chegou à metrópole just in time, em Abril de 1974, não sei exactamente em que dia: o Serradas Pereira (CART 3494), o Artur Soares (CART 3492), o Luís Carvalhido (CCS), o Manuel Carvalhido (CCS), o Manuel Ferreira (CART 3494), o Sousa de Castro (CART 3494)...

Convenhamos que foram tempos de confusão e esperança, tempos contraditórios, exaltantes e angustiantes... Seria bom que falássemos sobre isso, sobre a nossa experiência, aqueles de nós que fomos protagonistas dos acontecimentos...

Temos alguns apontamentos dispersos. Mas, de certo, que mandámos notícias, fizemos comentários, enviámos fotos sobre esses acontecimentos que mudaram as vidas de uns e outros, os portugueses e os guineenses... Já começámos a publicar algumas cartas e areogramas do Casimiro Carvalho (Gulieje, Cacine, Gadamael, Paunca, Nova Lamego), também ele um dos últimos soldados do império...

É pena, por outro lado, que milhões de aerogramas se tenham perdido nestes últimos 40 e tal anos, desde que a guerra começou em 1963... De qualquer modo, vamos fazer um apelo à nossa memória. Vou começar por reunir aqui a conversa que tive ao telefone , há tempos, com o Américo Marques que apanhou o 25 de Abril em Cansissé, zona leste, região do Gabu. (LG)

Depoimento do Américo Marques (ex-soldado de transmissões, 3ª CART / BART 6523, Nova Lamego, Junho de 1973/ Setembro de 1974)

2. O Américo Marques foi, de facto, um dos últimos soldados do império (*). Em contrapartida, um dos seus irmãos foi um dos primeiros a seguir para a Guiné, em 1961, quando ainda se usava a farda amarela (**). Esteve na região do Cacheu.

A companhia do Américo Marques, a 3ª CART do BART 6523, estava colocada em Nova Lamego, enquanto ele foi destacado com um grupo de combate (25 homens) para Cansissé, a sul de Nova Lamego, a uma hora de caminho do Rio Corubal.

Ao telefone (não nos conhecemos pessoalmente), disse-me que nunca tiveram problemas nem com a população nem com o PAIGC, contrariamente aos camaradas da companhia anterior que por lá haviam estado. Nunca se armaram em “bons”, nunca provocaram os guerrilheiros do PAIGC, trataram sempre bem a população local, distribuindo comprimidos pelas mulheres, ouvindo os homens grandes, ajudando a transportar os produtos agrícolas... Davam-se bem com os fulas. O régulo era futa-fula. Com os mandingas, a coisa piava mais fino, sabendo-se que nos eram muito menos leais do que os fulas...

(i) Confundido e baralhado...

Ele era soldado de transmissões e, na noite de 24 para 25 de Abril de 1974, estava no seu posto, a sintonizar a rádio em Lisboa. Costumava fazer isso com muita frequência. Estava em contacto com todo o mundo. Os dias eram sempre iguais e custavam a passar. E as noites ainda pior. Mas "nessa noite ficou confundido e baralhado: havia movimento de tropas em Lisboa, alguma coisa se passava de anormal"…

Foi assim que teve conhecimento do golpe de estado do Movimento das Forças Armadas que depôs o Governo de Marcelo Caetano. Foi logo informou os seus camaradas. Foi um alvoroço.

A vida em Nova Lamego e em Cansissé não voltou mais a ser como dantes. Apareceram logo uns “esquerdistas” (sic), até então muito caladinhos, a organizar o pessoal, a dar ordens, a fazer reuniões... A hierarquia e a disciplina militares começaram a ser postas em causas. Eram os "comités de soldados" (sic) que tomavam iniciativas.

Acrescenta o Américo: "Às tantas já se falava tu-cá-tu-lá com os gajos do PAIGC, beijinhos e abraços, troca de roncos, como se não tivesse havido uma longa guerra"...

Esta foi a parte mais dura de engolir para o nosso amigo Américo que viu, com tristeza, a nossa bandeira ser substituída pela do PAIGC no seu destacamento… Em Setembro de 1974, ele voltava para casa, com o sentimento (amargo) de ter sido o último soldado do império...

Há coisas, na tropa e na vida, para as quais um homem nunca está bem preparado. Hoje ele escreve nos jornais da região. E promete voltar a escrever-nos, com tempo e vagar, quando vier o frio e o fogo começar a crepitar na lareira. É aí, à volta de um madeiro a arder, que ele gosta de recordar os seus tempos na Guiné e passar para o papel os sentimentos contraditórios que tem sobre esses menos de dois anos que passou lá no Gabu…

Ele prometeu-me contar alguns das suas histórias de azarado soldado de transmissões que, um belo dia, ouvia uma conversa em “português acreoulado”: suspeitando tratar-se do IN, lançou um alerta geral e pôs o Gabu em pé de guerra… Afinal, tinha interceptado comunicações entre a NT…


(ii) Os momentos do fim

Em Junho de 2005, o Américo Marques, que é técnico de higiene e segurança no trabalho, nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, já nos tinha mandado uma mensagem sobre os "momentos do fim", quando a partir de Junho de 1974 os guerrilheiros do PAIGC começaram a aparecer no destacamento de Cansissé, oferecendo a paz...

Não foi fácil para a população local (fulas e mandingas) e para alguns soldados como o Américo Marques. De repente, os inimigos de ontem, os turras, passavam a ser os amigos e até os irmãos de hoje.

Comentei na altura (***) que deverá ter sido um momento muito difícil, daqueles em que a gente fica com um nó apertado na garganta… E formulei o voto de que o Américo arranjasse tempo, fôlego, coragem e inspiração para dar um testemunho mais extenso e profundo sobre esse momento (único) do hastear da bandeira da nova Guiné-Bissau a que ele assistiu… Enfim, se ele achasse que valia a pena… Eu pessoalmente achava que valia a pena. E continuo a achar.

O Américo, que regressou a Portugal em Setembro de 1974, estava no sítio certo, no momento certo, para a nos dar conta do fim do império... 

"Eu sou dos últimos guerreiros do Império. Meio guerreiro, pois não acabei a Comissão e ainda participei na troca de bandeiras. A minha ignorância e o meu patriotismo fizeram-me sentir uma tristeza... ainda mais triste.

"Era Transmissões de Infantaria, Formado no BC 5, Campolide [ Lisboa ]. Formei Batalhão em RAL 5, Penafiel. Embarquei no N/M Niassa em Junho de 1973, na companhia de um BCAÇ de Tomar, mais duas Companhias recebidas no Funchal. Pertenci à 3ª CART do BART 6523, aquartelado em Nova Lamego.

"Estive os 17 meses em Cansissé: um destacamento (com 25 soldados) que estava à distância de 1 hora, a pé (claro), da margem direita do Rio Corubal. Quem fosse de Bafatá para Nova Lamego, virava à direita por uma picada, situada mais ou menos a meio do trajecto.

"Sou de Viana do Castelo e amigão do Sousa Castro e do Luís Carvalhido que me recebeu no Xime, em trânsito para Nova Lamego [Gabu]. Era eu um coitado dum periquito; e o Luís não me ofereceu uma bazuca, levou-me a ver um buracão feito por uma. Perdi logo a sede.

Espero que as fotos sejam mais um tijolo... para construir a historia das Dores e Agonias que estão aqui e agora. Sendo ao mesmos tempo Pedaços de Vida, que se me ofereceu (como se fossem mais uns Castelos) aquela Bandeira; muito amada e que aquece mais que mil vulcões. Um Alfa Bravo".
__________

Notas de L.G.:

(*
) Vd. post de 12 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCLXXXVI: Américo Marques, o último soldado do Império (Cansissé, 1974)

Guiné 63/74 - P1704: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (43): Em louvor de Bambadinca, a nossa tabanca grande

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Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)

Reconstituição feita, de memória, por Humberto Reis, Luís Graça e Gabriel Gonçalves (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71): Do lado esquerdo da imagem, para sul, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste). Vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3). A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole.

De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9). Apesar do apartheid (leia-se: segregação sócio-espacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (19). Do lado direito, ao fundo, para norte, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá.

O aquartelamento de Bambadinca(e posto administrativo do concelho de Bafatá) situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste). São visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24). A luz eléctrica era produzida por gerador...

Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25).

Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14). A caserna das praças da CCS (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3). Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U.

Mais à direita, situava-se a capela (13) - que funcionava também como casa mortuária - e, ao lado, a secretaria da CCAÇ 12 (14). Creio que por detrás ficava o refeitório das praças. Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).

Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e o depósito da água (de que se vê apenas uma nesga). Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto (que era um caboverdiano, na altura), e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do Alf Mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).

Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis (HR), completada por mim (LG) e, mais recentemente, pelo Gabriel Gonçalves (GG), que identificou novos sítios: cantina (27), posto de rádio (28), refeitório das praças (29) e centro cripto (no topo do edifício 5). Ficamos à espera de novos contributos, nomeademente por parte do pessoal das CCS do BCAÇ 2852 (1968/0) e do BART 2719 (1970/72) que privaram connosco, bem como as unidades adidas (Morteiros, Daimler, Intendência, Caçadores Nativos...).

Foto: © Humberto Reis (2007). Direitos reservados.


43ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado em 29 de Março de 2007. Subtítulos do editor do blogue.

Hosana e magnificat para Bambadinca

por Beja Santos



A acção de patrulhamento e emboscada chamava-se Discóbolo. Não sei onde é que o Major Pires da Silva foi buscar a sugestão à cultura grega, mas, para todos os efeitos, era de um lançador de disco que eu pensava na sala de operações quando ele anunciou que as forças de Missirá e Finete emboscariam de 5 para 6 de Maio [de 1969], na margem esquerda do Geba, enquanto o Pelotão [de Caçadores Nativos]63 entraria por Santa Helena, progredindo através de Fá Balanta até Mero ao cair da noite de 5.



Patrulhamento e emboscada à gente de Madina/Belel

O objectivo seria formar uma tenaz e obrigar possíveis rebeldes em trânsito na outra margem do Geba a cair na emboscada, em territórios do Cuor. Ao amanhecer de 6, ambas as forças nas duas orlas do Geba patrulhariam cuidadosamente até Finete e Ponta Nova com o intuito de detectar indícios de passagem recente das gentes de Madina/Belel, conhecendo-lhes o trilho. Tudo me pareceu bem, até porque ao início da tarde de 6 iria ser ouvido por um oficial superior responsável pela análise dos processos de condecoração de Adulai Djaló, Cherno Suane, Mamadu Camara e Mamadu Djau, em Bambadinca.

Pelas 6h da tarde de 5, um dispositivo estava instalado na fímbria do palmeiral de Boa Esperança e outro grupo estava posicionado mais acima, junto da antiga povoação de Gã Gémeos. Os dois grupos tinham ordens precisas para só desencadear fogo de espingarda e dilagrama, tais eram os riscos de naquela margem estreita do Geba infligirmos baixas ao Pelotão 63, numa eventual perseguição da força rebelde através da extensa bolanha de Ponta Nova a Mero.

Era uma noite estrelada, estávamos atentos aos ruídos entre Santa Helena e Mero. A partir da meia noite, a temperatura arrefeceu, a altura em que ouvimos vozes do pelotão do Almeida a deslocar-se entre Fá Balanta e Mero, após rusga na região de Santa Helena, tal como estava acordado. A pouca luz permitiu ver vultos em progressão, houve expectativa que aparecesse um grupo rebelde, mas a guerra é mesmo isto: mesmo com total sigilo da operação, o inimigo naquela noite não estava lá.

Patrulhámos ao amanhecer a região, não havia indícios recentes da passagem na região de Gã Gémeos até Gambicilai, tomámos então a estrada de Canturé, onde a força capitaneada por Bacari Soncó [, comandante da milícia de Finete, ] nos aguardava. Bacari exibia em triunfo um carregador de costureirinha, uma granada e um barrete descobertos num trilho recente que se dirigia para Malandim. O patrulhamento não fora em vão: a gente de Madina/Belel passeava-se agora pouco acima de Finete e seguia directamente para a estrada de Gambaná/Saliquinhé. Estavam confirmadas as nossas suspeitas: o inimigo usava como trilhos os caminhos abandonados, supostamente impraticáveis.



O dia de visita à sede do batalhão, Bambadinca


Era um dia limpo, o sol a caminhar para a fornalha do meio dia, sentia-se o capim a alourar e o duro barro da bolanha tornava agradável a caminhada para Bambadinca. Na orla do Geba, já nos esperava o atlético canoeiro, Mufali Iafai. A zona do cais de Bambadinca está em bulício com gente que viera de Dulombi, Gabu e Contuboel buscar os seus abastecimentos. Era um trânsito de GMC, Unimogs e até viaturas civis que rompiam no meio da gritaria das últimas saudações de despedida e do pó da laterite. Avançamos pela estrada, em direcção à rampa. No lado direito, cumprimento os alfaiates e abraço Malã Mané sempre com o seu sorriso aberto onde luz o ouro de todos os dentes da frente. Um cortejo de mulheres com trouxas à cabeça dirige-se para a fonte, um verdadeiro lavadouro público onde estoiram risos e se gesticulam cumprimentos e há falatório entre os soldados e as mulheres.

Caminhamos, cumprimento o Zé Maria, ao balcão do seu estanco, vejo o chefe de posto à porta do correio, despeço-me de um grupo de soldados que vai até à feirinha comprar tabaco e cola e depois visitar familiares, não sem antes os ter avisado que queria o pelotão formado junto ao gabinete do 2º Comandante pelas 14h.

A nossa lista de obrigações está distribuída: o Teixeira, auxiliado por Ussumane Baldé e Bubacar Sambu, vai às transmissões buscar material para o rádio; Casanova, com Sila Baldé, o Raposo, o Alcino e Quebá Sissé, vão tratar dos mantimentos, enquanto o Príncipe Samba procura comprar três sacos de arroz para os seus milícias, quase esfomeados. O mês de Maio é crucial para garantir leite em pó, marmelada, farinha, a mistura popular de café, as barricas de pé de porco, o fardo de bacalhau que vem enlatado.

Reservo para mim o papel de negociador para os materiais de construção civil e a pedincha das munições, faço-me acompanhar do Raposo e de Sadibi Camará. O Setúbal irá procurar desenrascar peças para o Unimog, há que também tratar das camisas para os petromaxes e antes do almoço ainda quero ir com o Pires tratar dos vencimentos em atraso dos milícias de Finete.

Bambadinca, o aquartelamento e os seus homens, são para nós a tabanca grande onde se operam milagres, é o nosso porto de abrigo, é ali que vou roubar os jornais com mais de 2 meses de atraso, ali vamos à enfermaria (que alguns chamam posto médico), aqui se corta o cabelo, se ouve o gralhar das crianças no recreio da escola e há a capela com missa ao domingo e onde repousam os nossos mortos, a depositar em cemitérios neste ou no outro continente...

Passando pela porta de armas, sempre aberta, saúdo o contigente militar e às vezes já distingo as gentes do pelotão Daimler dos amanuenses e escriturários, procuro ir à fala com o Ismael Augusto, o nosso santo milagreiro para os afazeres das viaturas e que dirige a falange dos mecânicos e condutores. É com o Ismael Augusto que se fazem operações com viaturas que não avariam, é graças ao Fernando Calado, o nosso oficial de transmissões, que os rádios funcionam e os seus mecânicos radiomontadores permitem a cantilena permanente, com mais ou menos ruído fanhoso, do nosso rádio em Missirá, o nosso cordão umbilical para gente amiga.

À porta da enfermaria vejo o anafado Furriel Coelho, um excelente mecânico que tem feito milagres com as nossas viaturas ronceiras. Na enfermaria cumprimento o David Payne, depois vejo ao longe o gesticulante alferes Reis e aproveito para lhe pedir que volte a Missirá para tirar as armadilhas junto à fonte de Cancumba. Ele resmunga como vários monossílabos e desaparece. Das cozinhas dos sargentos e oficiais evolam-se cheiros de peixe frito misturados com carne assada. É o auge do frenesim de Bambadinca, perto do almoço. Quem veio do Xime ou dos Nhabijões, quem veio do Xitole ou de Mansambo, está a ultimar os preparativos para regressar, o fim do dia não é de confiança.

Paro, inebriado, com este movimento, saúdo o Tenente Pinheiro, o chefe de secretaria que naquele dia não tem papelada para me distribuir. Há gente na sala de operações, vejo o Major Pires da Silva em azáfama, proponho-lhe conversarmos durante o almoço. Bala, um quase mestre de cerimónias do Comandante, vem cumprimentar-me e avisa-me que já chegou o Major que registará as minhas declarações sobre os processos das condecorações.

Esta a Bambadinca que retenho no olhar, que me toma os cinco sentidos, que vai para lá do horizonte, onde bifurcam as estradas que à direita nos levam até ao Xime e aos quintos do inferno que podem ser a Ponta do Inglês ou o Fiofioli, e à esquerda até à Ponte dos Fulas e ao Xitole, numa longa e belíssima estrada pejada de perigos. Esta a Bambadinca que por detrás da capela e da escola primária tem as casernas dos soldados e as transmissões. A Bambadinca da manutenção militar, dos paióis, das folhas de pagamentos, a Bambadinca onde é possível encontrar um bom bate chapas ou encontrar alimentos frescos ou tratamento médico ou tentar quase sem êxito fazer um telefonema para Lisboa.

Apertado pela fome, vou à messe de oficiais acabar o aerograma para a Cristina. Digo-lhe que estou feliz, que vim a Bambadinca, que naquele dia tudo me encanta e parece que me sinto em férias, reconciliado com todas as asperezas do mundo. Segue-se depois um toque de lirismo e escrevo, não sei se a propósito ou despropósito: "O que é autêntico agora é a amar-te silenciosamente. Sei que Deus confia em nós, em nós espera.".

Como habitualmente faço o relatório como se aquele deve e haver pudesse ter impacto em Lisboa: que chuvisca agora todas as manhãs e que no fim do mês, doa a quem doer, Missirá receberá o estatuto de povoação renascida; que os meus agricultores militares é gente fora de série, mas que estamos a viver as atribulações da falta de arroz; que entreguei o recurso e confio na Justiça; que já chegaram as inundações, se bem que ligeiras, temos os abrigos alagados, as formigas e a bicharada irritam-nos, há muitas tosses secas e paludismos; que estamos a ser sangrados nos efectivos, já estava uma secção das milícias de Missirá em Galomaro, agora vai outra para Cansamange. Despeço-me, amanhã escreverei mais, atravessarei o oceano cheio de ternura e à procura da mulher amada.

Ao almoço, explico quase junto ao ouvido ao Major Pires da Silva os resultados do Discóbolo, da nossa parte. O Almeida já me informou que não encontrou nada. Sinto-me esclarecido sobre a actuação actual das gentes de Madina/Belel, irei emboscar ao longo deste mês. Procuro, sem sucesso, ser aliviado das tarefas diárias a Mato de Cão, dizem-me sempre que não há efectivos em Bambadinca, tenho que fazer das tripas coração, uma ladaínha que oiço há 10 meses.

Findo o almoço, entrego-me ao interrogatório do Major na sala do 2º Comandante. É um homem de voz branda, cabelo escorrido e olhar penetrante. Começa por observar que sem pôr em causa os actos de bravura assinalados no meu relatório, lhe parece excessivo um tal número de comportamentos heróicos. Respondo que foram duas horas de inferno, aquelas que se viveram na noite de 19 de Março [de 1969]; que ouvi demoradamente as diferentes versões de todos os militares, não houvera nenhuma discordância quanto ao destemor de Cherno Suane e o seu morteiro 60, Adulai Djaló e a bazuca, Mamadu Djau também como apontador de bazuca e Mamadu Camará a incitar permanentemente os camaradas que ao fim de hora e meia de fogo começavam a sentir o desespero do fim das munições. O mesmo Mamadu Camará que, inspirado, fora retirar uma viatura de um local ameaçado pelas chamas, ele que nunca conduzira coisa nenhuma.



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Missirá > 1968 > Mamadu Camará, um dos soldados do Pel Caç Nat 52, sob o comando do Alf Mil Beja Santos que lhe propôs um louvor devido à sua acção heróica na noite do ataque ao destacamento, em 19 de Março de 1969 (2).


O Major replicou que havia muita afinidade de comportamentos em situações análogas. Terei respondido algo como isto: "Meu Major, não sou favorável à banalização das medalhas. Tenho uma força de combate altamente moralizada, estamos todos os dias fora do arame farpado e no mínimo a fazer 25 Km para garantir que o Geba seja navegável até Bambadinca. Naquela noite o fogo era intenso e sem tréguas, o alferes que me substituiu fala em canhões sem recuo e os meus soldados confirmam que eram mesmo canhões sem recuo que devastaram e destruíram abrigos, casas e a segurança do arame farpado. Os quatro militares propostos, de acordo com os depoimentos dos caçadores nativos e dos milícias, foram o verdadeiro rastilho moral que nos levou a resistir à brutalidade do ataque. E há outra coisa, o patriotismo. Estava Missirá em chamas, e Mamadu Camará foi hastear a bandeira portuguesa e avisou toda a gente que a bandeira os olhava. Distribuíram os últimos cartuchos e fizeram um pacto de sangue: se os rebeldes entrassem em Missirá aqueles soldados portugueses da Guiné não seriam apanhados vivos. Felizmente , que os rebeldes retiraram mas não quero deixar passar em vão uma façanha onde eu não participei mas que é um exemplo que eu não vou esquecer, e não quero que seja esquecido".

Lentamente, com olhar fixo nos seus apontamentos, o Major levantou-se, disse-me que não sabia que havia gente capaz de dizer e fazer o que ouvira, cumprimentou-me e agradeceu o meu depoimento.

As minhas leituras: Jean Cocteau, Albert Camus e Ellery Queen

Tenho que partir, já passa das 16h, o tempo está contado ao milímetro para entrarmos em Missirá com a primeira escuridão. Foi um dia muito belo na minha vida. No bolso da coxa direita levo A Voz Humana de Jean Cocteau, um monólogo doloroso passado ao telefone entre dois apaixonados que se separam. Viu-o representado por Maria Barroso, no Teatro S. Luiz, penso que em 1965 ou 66. Acabei ontem o romance L'étranger, por Albert Camus. Foi-me oferecido pelo Carlos Sampaio.

De Camus já lera A Queda mas este romance é marcante e não é por acaso que Jean-Paul Sartre o considera monumental, um clássico do absurdo. O personagem, Meursault, é um homem lúcido mas indiferente: a morte da mãe pouco lhe diz, gosta de Maria mas não sabe se a ama, mata um árabe sem nenhuma convicção, como pretexto de defesa; é condenado à morte e espera que haja muito público no dia da sua execução, aspira a ficar menos só nesse momento ouvindo gritos de ódio à sua volta. É uma obra árida, parágrafos desapegados uns dos outros, as frases são ilhas, um nada atrás do nada. Romance irrespirável mas nítido, em que a desordem aparente ganha a coerência da vida caótica e sem sentido que é a questão central da obra filosófica e literária de Camus.

Albert Camus (1913-1960), escritor francês, de origem argelina, ligado ao existencialismo, movimento filosófico e literário liderado por Jean-Paul Sarte (1905-1980). Foi Prémio Nobel da Literatura (1957) e autor dessa obra-prima que é o romance O Estrangeiro. (LG).



Foto: Wikipedia (com a devida vénia...)



Com mais descontracção, li de Ellery Queen Vivenda Calamidade, um romance policial poderoso que faz parte do chamado ciclo de Wrightsville. É um horrível ajuste de contas em que uma mulher vingativa engendra ao nível máximo da perversidade a destruição do marido infiel numa representação inesquecível de vítima que acaba por não poder gozar o sabor de toda a vingança.

Esta noite há emboscada nocturna, contas para fazer, audiências, novos planos. O quotidiano continua, ritmado e do sabor do imprevisível. O que interessa agora é acabar as obras de Missirá. Só que o destino nos troca as voltas e as emboscadas montadas à volta de Madina reinstalam o sobressalto que é o timbre da nossa guerra. E um dia destes vai aparecer de helicóptero um oficial superior que pretende esclarecer a matéria do meu recurso. Como passo a relatar.


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Notas de L.G.:

(1) Vd. post anterior > 20 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1680: Operação Macaréu á Vista (Beja Santos) (42): O Tigre de Missirá volta a rugir

(2) Vd. post de 10 de Março de 2007> Guiné 63/74 - P1578: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (37): O horror do Hospital Militar 241 e o grande incêndio de Missirá

Guiné 63/74 - P1703: Álbum das Glórias (11): O autocarro da carreira Bissau/Bissalanca (Victor Barata)

Guiné > Bissau > s/d [1971/73 ] > Um autocarro dos Transportes Colectivos de Bissau, carreira Bissau/Bissalanca!... Uma verdadeira peça de museu... Uma foto para o nosso Álbum das Glórias (1)...

Foto: © Victor Barata (2007). Direitos reservados.


1. Mensagem do Victor Barata, que foi especialista de Instrumentos de Bordo, na nossa gloriosa FAP (1969/1974).
Esteve na Guiné, de 1971/73, "na linha da frente das DO 27". Aterrou em tudo o que era bocado de pista (2), tendo voado inclusive com o malogrado furriel piloto aviador Baltazar (3).

Ele já pertence à tertúlia, desde Maio de 2006. Faltava-lhe cumprir o ritual das fotos... Aqui estão, para a gente o reconhecer no encontro de amanhã em Pombal. Tem de ter um tratamemto VIP, já que ele é o único representante da Força Aérea no nosso blogue...

Vive há 20 anos na região de Lafões, mais exactamente em Vouzela, onde é empresário ligado á indústria das rochas decorativas. É amigo do Martins Julião (de quem já foi sócio), do Carlos Santos e do Rui Ferreira, e já nos desafiou para uma próximo encontro da nossa tertúlia na bela região de Lafões (área geográfica que compreende os concelhos de Oliveira de Frades, Vouzela e S. Pedro do Sul) (4)...

2. Amigo Luís: Junto anexo as minhas fotos de ontem e hoje para que me concedas a HONRA de pertencer àquela família que tu deitaste na ...Internet e tão bem tens educado e ajudado a singrar.
Muito obrigado e espero que me digas se estas sempre chegaram.

Um abraço

Victor Barata
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Notas de L.G.:

(1) Vd. o último post desta série > 30 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1636: Álbum das Glórias (10): Paunca, CCAÇ 11: Com o PAIGC, depois do 25 de Abril de 1974 (J. Casimiro Carvalho)

(2) Vd. post de 9 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXXIX: Victor Barata, MELEC da FAP (1971/73)

10 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLI: Ajudem-me a encontrar o tenente evacuado em 1973 do Corredor da Morte (Victor Barata)

(3) Vd. post de:

17 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1668: In Memoriam do piloto aviador Baltazar da Silva e de outros portugueses com asas de pássaro (António da Graça Abreu / Luís Graça)

(4) Vd. post de 14 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1661: Tertúlia: Notícias de Lafões, do Rui Ferreira, do Carlos Santos e da nossa gloriosa FAP (Victor Barata)

quinta-feira, 26 de abril de 2007

Guiné 63/74 - P1702: A guerra também se ganhava (ou perdia) nas ondas hertzianas (Helder Sousa, Centro de Escuta e de Radiolocalização, Bissau)

Guiné > Bissau > s/d > O Furriel Mil Trms TSF (Piche e Bissau, 1970/72). Junto ao cais... Depois de sete meses em Piche (junto ao BCAV 2922), passou o resto da comissão no Centro de Escuta e de Radiolocalização do Agrupamento de Transmissões da Guiné.



Guiné > Bissau > s/d [1970-1972] > O Helder Sousa no seu quarto em Bissau... Na parede, um poster (um pouco insólito) do Che Guevara, um ícone da juventude da época, mas também um grande amigo do PAIGC...

Fotos: © Helder Sousa (2007). Direitos reservados.

1. Texto do Helder Sousa (ex-Fur Mil de Transmissões TSF, Piche e Bissau, 1970/72) (1):

Caro Camarada Luís Graça:

Já tratei das formalidades junto do Vitor Junqueira, no sentido de lhe confirmar a minha intenção de estar presente no almoço/convívio/confraternização em Pombal, dando-lhe também conta de que levo um acompanhante e que escolhia a ementa B.

Já contactei também o Carlos Marques enviando-lhe uma foto actual, dando-lhe conta do contacto com o Vitor Junqueira e informando que o acompanhante é também um ex-camarada da Guiné, meu padrinho de casamento, ex-Furriel Miliciano de Transmissões TSF, Nélson Batalha, que esteve e foi ferido em Catió em Abril de 1971, que não está muito bem actualmente e que eu espero e acredito que este evento o venha marcar de forma positiva e revitalizadora.

Em anexo envio algumas fotos tiradas na Guiné que consegui recuperar (não estão grande coisa, mas foi o que consegui) e uma foto actual.

Aproveito agora para dar mais algumas informações sobre mim e sobre a minha estadia na Guiné, utilizando alguma coisa que já enviei ao António Abreu.

Assim, para além daquilo que já indiquei, que me chamo Hélder Valério de Sousa, que vivo em Setúbal, que fui Furriel Miliciano de Transmissões TSF do STM, tenho o n.º de telemóvel 93 202 56 20 e o endereço de mail soushelder@gmail.com , que sou um atento e interessado leitor do blogue e agora já também membro da nossa Tertúlia, com cujos estatutos concordo...

Acrescento que nasci em Outubro de 1948 em Vale da Pinta (Cartaxo), vivi e fui formado nas várias escolas que Vila Franca de Xira proporcionava aos seus e fui para a Guiné aonde cheguei em 9 de Novembro de 1970. Para fazer juz àquela expressão que algumas vezes encontramos de qualquer coisa e um dia, também tive a aplicação prática da mesma que se traduziu pelo facto de ter regressado em 10 de Novembro de 1972, ou sejam 24 meses e um dia.

Fui em rendição individual embora do meu curso de transmissões STM fossemos 7 em simultâneo: 3 fomos no Ambrizete e os outros no Carvalho Araújo, ao que me lembro numa viagem atribulada.

Nós os três do Ambrizete (eu e os Fur Mil de Trms Nélson Batalha e Manuel Martinho Martins) chegámos um dia antes e, como era sabido, a velhice contava..... Curiosamente andou sempre à volta do S. Martinho. Para lá levei os ingredientes necessários para alguns conterrâneos (agora vivo em Setúbal mas à data vivia em Vila Franca de Xira) poderem fazer a festa e quando cheguei de volta de vez foi exactamente para entrar nessa comemoração.

Dadas as condições específicas da especialidade (TSF), fiquei algumas semanas em Bissau, em formação para adaptação às condições de exploração dos postos, tendo acabado por ir parar a Piche (então sede do BCAV 2922, do qual não tenho encontrado nada que refira encontros), tendo andado por lá do início de Dezembro de 1970 ao final de Maio de 1971. A partir dessa data fui para Bissau integrar o Centro de Escuta que era uma das jóias do então criado Agrupamento de Transmissões.
Guiné > Algures > S/d [1970-1972] O Helder Sousa em trabalho de radiolocalização...

Foto: © Helder Sousa (2007). Direitos reservados.



Aí participei na escuta e gravação permanente às rádios dos países vizinhos (Senegal e Guiné-Conakry) bem como dos noticiários em língua francesa para África da BBC e da ORTF:

(i) enviando o resultado (fitas gravadas) para a ACAP (Assuntos Civis e Acção Psicológica) onde pontificava Ramalho Eanes (o cara de pau, como lhe chamávamos, devido ao seu semblante sempre sério e severo) (2);

(ii) fazendo os empastelamentos às emissões de rádio do PAIGC (não eramos a única entidade, tínhamos algumas frequências a nosso cargo);

(iii) fazendo pesquisa das comunicações de telex dos países vizinhos;

(iv) enviando para o ar as emissões gravadas da Voz Livre da Guiné da Frente de Libertação Nacional da República da Guiné (Conakry);

(v) fazendo a escuta e intersepção das comunicações rádio (fonia, poucas, grafia principalmente) do PAIGC;

(vi) registando os teletextos de várias agência noticiosas (MAP, APS, MENA, FrancePress, etc., as quais eram de registo obrigatório, e de outras que íamos pesquisando);

(vii) produzindo acções de radiolocalização; contribuindo com notícias (recolhidas das agências noticiosas...) para uma comunicação chamada Presse Lusitana, salvo erro.

Como se vê, muita actividade, sem dúvida interessante, mas longe da guerra mais dura. Por isso não tenho muitas histórias para contar que possam aproximar-se sequer daquelas que tão bem têm sido retratadas pelos nossos tertulianos, dando-nos conta das angústias, dos medos, da coragem, do altruísmo, da camaradagem, até também de coisas menos próprias, por vezes com tanta intensidade e realismo que nos fazem reviver esses climas e nos transportam para esses locais e ambientes.

Prometo que irei buscar ao meu baú de memórias algumas coisas para partilhar com a Tertúlia (porque, apesar de tudo, também tenho alguns epidódios que merecem ser relembrados) mas ficarão para depois do nosso encontro, pois espero que ele também me sirva para reavivar nomes (os nomes, principalmente, vão ficando nublados...) e ordenar acontecimentos e datas para não dar indicações erradas.

Um grande abraço e até breve!

Hélder Sousa

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1652: Tertúlia: Três novos candidatos: José Pereira, Hélder Sousa e Jorge Teixeira

(...) "Chamo-me Hélder Valério de Sousa, vivo actualmente em Setúbal, fui Furriel Miliciano de Transmissões, do STM, cumprindo a comissão de serviço na Guiné entre 9 de Novembro de 1970 e 10 de Novembro de 1972, tendo estado cerca 7 meses em Piche (contemporâneo do BCAV 2922) e o resto da comissão ao serviço do Centro de Escuta e de Radiolocalização do Agrupamento de Transmissões da Guiné.


(2) Além de Ramalho Eanes, na REP.ACAP (Repartição de Assuntos Civis e Acção Psicológica), chefiada pelo então major Lemos Pires, trabalhava também, na época, o Cap Otelo Saraiva de Carvalho, então na sua 3ª comissão se serviço no Ultramar... Vd. Autobiografia de Otelo, publicada esta semana no JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias, nº 954, de 25 de Abril/8 de Maio de 2007.

(...) "Nela foi meu subordinado um 1º cabo com piada, chamado Camacho Costa, que me acompanhou numa tournée que promovi pela Guiné como militares-artistas ali em serviço, fazendo ele a apresentação e a locução dos espectáculos. E para a repartição recrutei um outro 1º cabo em serviço, como escriturário, no Batalhão de Engenharia de Bissalanca e que eu soube fazer locução de profissão na vida civil. Chamava-se João Paulo Dinis, e pouco tempo depois,seria por mim de novo recrutado para o desempenho de importante missão na noite de 24 de Abril de 74" (...)(Excertos de: Autobiografia - Otelo Sariava de Caravalho: Era uma vez um português de 2ª classe. In: JL, 25 de Abril/8 de Maio de 2007, p. 7). (Negritos do editor do blogue).

Guiné 63/74 - P1701: Guileje: Artilharia do PAIGC: a peça 130 mm M-46 (Pedro Lauret)

Mensagem do Pedro Lauret, com data de 27 de Março de 2007:

Caro Luís,

Sobre o último post do Nuno Rubim (1) posso informar que, quando recuperei o pessoal em Gadamael em fins de Maio de 1973 (2), foi-me referido por vários camaradas, sendo um deles, se bem me lembro um capelão, que teriam sido bombardeados por uma nova arma cuja velocidade inicial do projéctil seria próxima da velocidade do som, o que tinha como consequência que quando se ouvia a saída o projéctil, este estava a chegar, não dando por isso tempo para fugir para os abrigos, constituindo mais uma factor de desequilíbrio militar e psicológico.

Este facto recorta com a informação do referido post sobre peças de 130mm.

Um abraço

Pedro Lauret

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Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 27 de Março de 2007 Guiné 63/74 - P1628: Projecto Guiledje: fotografias de armamento e equipamento, das NT e do PAIGC, precisam-se (Nuno Rubim)

(...) "O Projecto Guiledje, no que me diz respeito, tem continuado de vento-em-popa. As investigações a que tenho procedido trazem achegas que permitem clarificar várias questões mal conhecidas. Por exemplo e só para mencionar um dado, Guileje foi bombardeada em Maio de 1973 com canhões s/r de 82 mm, morteiros de 82 e 120 mm e ... só há pouco referenciado, peças de 130mm ! Os Grad (foguetões de 122 mm) não foram aí usados, só mais tarde em Gadamael (ainda por confirmar junto do então comandante da artilharia do PAIGC, com quem espero ter um encontro)" (...)

(2) Vd. posts de:

15 de Junho de 2oo6 > Guiné 63/74 - P878: Antologia (42): Os heróis desconhecidos de Gadamael (Parte I)

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte).

Guiné 63/74 - P1700: Bambadinca: Quando a cantiga... era uma arma (Gabriel Gonçalves)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1971 > O memorial da CCAÇ 2590, erguido na parada do quartel de Bambadinca, no final da comissão dos quadros e especialistas da CCAÇ 2590 (Maio de 1969/Março de 1971) que deram origem à CCAÇ 12, constituída por praças do recrutamento local.

Foto: © Gabriel Gonçalves (2006). Direitos reservados.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Nhabijões > 1970 > Pessoal da CCAÇ 12, destacada no reordenamento de Nhabijões. Em todas as unidades havia gente que sabia tocar e/ou cantar. E fazia-se jus ao ditado popular: "Quem canta, seu mal espanta"... Na CCAÇ 12, lembro-me do Gabriel Conçalves, o Zé Soua, e o Tavares (o nosso escriturário). Na foto, o furriel José Sousa, madeirense, é o primeiro da direita, seguido dos furriéis Reis e Henriques. O tocador de acordeão era o nosso 1º cabo escriturário, o Tavares, se não me engano. Baladeiros e tocadores de viola de outras unidades, lembro-me muito bem do ex-Alf Mil Cav Vacas de Carvalho, do Pelotão de Reconhecimento Daimler 2206 (1969/71), e do ex-Alf Mil da CCS do BART 2917 (1970/72)... Outro tocador de viola, soube-o há dois anos, era o nosso David Guimarães (CART 2716, Xitole, 1970/72). (LG)

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.

Mensagem do GG (Gabriel Gonçalves), o viola e o baladeiro da CCAÇ 12 que, por sinal, também era, na tropa 1º Cabo Operador Cripto (1), o que na prática o impedia de sair do arame farpado, fazendo dele uma espécie de refém da grande caserna de Bambadinca...
Curiosamente, não me lembro de alguma vez o ter visto de G3 em punho; em contrapartida da, lembro-me bem dele a entrar, amiudadas vezes, no nosso bar e messe de sargentos com a viola debaixo do braço... Hoje sei que uma das suas grandes paixões é a pesca... Infelizmente, também nunca o vi a pescar num rio da Guiné, ali por perto: o Udunduma, o Geba... Ele, de facto, vivia - ele e os outros criptos - numa espécie de prisão que tinha muito pouco de dourada: é um facto que nunca teve um ataque a Bambadinca, que nunca saiu para o mato... Mas imagino como é que um gajo pode ficar apanhado dentro do arame farpado.... Como uma desgraça nunca vem só, o GG terá o último de nós a ter direito a um periquito, ou mesmo é dizer, passaporte para poder voltar a casa... Ele já contou essas peripécias aqui, no nosso blogue (2) (LG)

Henriques:

A pouco e pouco as recordações vão chegando, apoderando-se de mim uma certa nostalgia, pois na verdade passámos bons momentos lá em Bambadinca.

Recordo que uma ocasião, estava eu na cantina das praças, entrou a ordenança do comandante e dirigindo-se a mim, intimou-me por ordem do comandante a comparecer na messe dos oficiais e que levasse a viola; claro que tive que obedecer à ordem, mas bastante contrariado, pois eu gostava de cantar, como sabes, mas na companhia da malta porreira.

Quando lá cheguei, ao passar o guarda-vento, pus-me em sentido com a viola do meu lado direito, qual G3, e bradei:
- O meu comandante dá licença?
- Está à vontade, disse ele, podes entrar e começa lá a cantar!

Adivinha tu qual foi a primeira canção que eu cantei? Pois claro "ISTO É TÃO BERA" (3). Foi a forma que arranjei para me vingar. Resta-me acrescentar que no refrão fui secundado brilhantemente por alguns oficiais milicianos, como por exemplo: Machado, Abel, Rodrigues (este último, que Deus o tenha, de tanto berrar até ficou vermelho).

Resta-me acrescentar que o major BB [, da CART 2917], ficou fulo da vida e ameaçou-me que se eu não cantasse outra coisa de jeito, mandava-me cortar o bigode!

Um abraço, GG

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Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:

18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1377: CCAÇ 2590/CCAÇ 12: Apresenta-se o 1º Cabo Operador Cripto Gabriel Gonçalves
26 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1464: Oficiais, sargentos e praças: tropa é tropa, uísque é uísque (Gabriel Gonçalves / Luís Graça)
(2) Vd. post de 2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1485: Bambadinca revisitada... ou os azares de um operador cripto em fim de carreira (Gabriel Gonçalves, CCAÇ 12)
(...) "Como tu dizes, realmente eu estive trancado no quartel, mas foi durante 22 meses, porque o meu periquito não chegou e, segundo me constou, o rapaz era sobrinho de um tenente-coronel e deu baixa ao hospital. Quando deram nota da ocorrência para a repartição de sargentos e praças, o responsável que recepcionou a nota esqueceu-se de nomear um substituto e lá fiquei eu a ver-vos partir e a gramar mais dois meses daquela merda.
"Aqueles dois meses foram os piores da minha vida... de tal maneira que em dada altura resolvi deixar de alinhar na escala de serviço, com a anuência dos meus superiores, passando apenas a dar apoio aos periquitos. Como tinha mais tempo disponível passei estupidamente a dedicar-me às bazucas [, garrafas de cerveja de 0,6 ], e dessa forma andava anestesiado o que me trouxe alguns dissabores" (...).
(3) Vd. post de 24 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1695: Cancioneiro de Bambadinca: Isto é tão bera (Gabriel Gonçalves)