quarta-feira, 6 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4288: Espelho meu, diz-me quem sou eu (1): Joaquim Mexia Alves




















Guiné > Três fotos do Alf Mil Op Esp J. Mexia Alves : uma na altura da partida (em finais de 1971); e duas, passados uns meses, em 1972, já no comando do Pel Caç Nat 52, uma tirada no Mato Cão, na margem direita do Rio Geba (Estreito) e outra numa visita a Bambadinca, sede do Sector L1, Zona Leste. O Mexia Alves esteve 24 meses no CTIG, de Dezembro de 1971 a Dezembro de 1973.

Recorde-se que o nosso camarada (ou camarigo, como ele prefere) pertenceu originalmente à CART 3492 (Xitole / Ponte dos Fulas), antes de ingressar no Pel Caç Nat 52 (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e, por fim, na CCAÇ 15 (Mansoa). A CART 3492 pertencia ao BART 3873 (Bambadinca, 1971/74). O Pel Ca Nat 52 estava igualmente às ordens do comando do Sector L1 (*).


1. Mensagem de Joaquim Mexia Alves, com data de ontem:

Ao ler/ver o post 4280 do Magalhães Ribeiro, (Rangers...Ya!), veio-me à ideia uma nova série de postes muito simples, que até podiam nem ter texto.

Refiro-me a fotografias na partida para a Guiné em comparação com fotografias da chegada, ou de alguns meses passados no "teatro de operações", ("engalinho" com esta expressão).

Se acharem por bem, aqui vão três fotografias, uma da partida e duas passados uns meses no comando do Pel Caç Nat 52, uma no Mato Cão e outra numa visita a Bambadinca, sede do sectoir L1, Zona Leste. É escolher uma das duas do "depois".

Mais uma abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves


2. Comentário do L.G.:

Joaquim: Apoiado!... Até sugiro um título para a série: O que fizeram de nós... Ou: O que fizeram de ti, rapaz ? Ou então: Metamorfoses... Ou: (Trans)formações: Ou ainda: Tão meninos que nós eramos... Ou ainda: Espelho meu: Diz-me quem sou eu...

Que achas, Joaquim ? Eu prefiro o último... Na Guiné não me via ao espelho. Voltei a ver-me, no regresso, e não me reconheci... Aliás, a última barba que fiz, fi-la na Guiné, como eu costumo dizer, para explicar o estranho hábito, hoje obsoleto, fora de moda, de usar barba, desde Março de 1971...(Começou por pêra, ainda em Bambadinca, com o afrouxamento da disciplinar militar, fenómeno inexorável apesar dos esforços patéticos do senhor major Anjos de Carvalho, até se cansar de andar com o RDM em punho, ameaçando bichos e homens).

Na realidade, nos três anos de tropa e de guerra por que passámos, operou-se uma série de transformações: a nível físico, mental, psicológico, social, cultural... Muita coisa mudou nas nossas vidas... Umas mais visíveis (como o aspecto físico: emagrecemos, chegávamos a perder 1, 2 e 3 quilos em operações...), outras menos visíveis (como a sanidade mental)...

Os outros (amigos, pais, irmãos, namoradas, noivas, mulheres, colegas de trabalho...) foram os primeiros a dar conta, quando fomos de férias ou regressámos de vez, "sãos e salvos"... Só depois disso é passámos a olhar para o espelho...

Vamos pedir à malta para juntar as duas/três fotos do antes e do depois com uma uma "observação ao espelho".Façamos a nossa austoscopia (s. f., Exame ou auscultação de si próprio).

Quanto ao texto, gosto sempre de um legenda, mesmo que curta...

Um abraço. Luís


PS - Lembrei-me de um poema que há tempos publiquei no meu blogue de poesia, e que tomo a liberdade (ou a insensatez) de aqui reproduzir (com algumas alterações, a começar pelo título):

Abril 15, 2009 > Blogantologia(s) II - (78): A guerra como forma (heróica) de suicídio... altruista

De cordeiro a lobo, a metaformose

Quem terá sido o grafiteiro
(avant la lettre)
que escreveu:
"Em Mueda, os cordeiros que chegam,
são lobos que saem" ? (**)

É um pensamento que é válido
para todas as situações de guerra.
E a guerra é uma situação-limite.
Os jovens, quase imberbes,
os meninos de sua mãe
(como diria o grande Pessoa),
que chegam à frente de batalha,
ainda são cordeiros,
inocentes,
virgens,
imaculados...
O horror e a violência da guerra
irão transformá-los em lobos,
em duros,
em violentos,
em conspurcados...
Não necessariamente predadores,
assassinos,
criminosos...
(que é o estereótipo
que o ser humano ainda guarda
do pobre do lobo mau!)...

Mas há, seguramente, uma perda de inocência:
não foste para a Guiné
e vieste de lá impunemente,
igual...
Não eras mais o mesmo,
o expedicionário que partiu no Niassa,
e o veterano que regressou no Uíge.
Os teus amigos e familiares deram conta disso:
já não eras o mesmo,
nunca mais foste o mesmo...

Acho que é isto
que o inspirado autor do mural de Mueda quis dizer.
É claro que há também aqui
a dose habitual de bravata e de fanfarronice:
é uma frase de caserna para intimidar
os checas,
os piras,
os maçaricos,
os novatos...

Também os militares, profissão de risco,
têm a sua ideologia defensiva,
as suas crenças,
os seus talismãs,
os seus mesinhos
(usavam-nos os guerrilheiros
na Guiné,
em Angola,
em Moçambique,
não obstante a sua formação racionalista,
marxista-leninista,
dita revolucionária)...
A bravata e a fanfarronice,
além das praxes e do álcool,
ajudavam-nos, a todos nós,
a lidar com o medo,
as situações-limite,
o risco,
a morte,
o sofrimento, físico e moral,
a impotência,
o desespero…

Não há, nunca houve,
super-homens,
super-heróis:
há apenas deuses,
que inventámos,
à nossa imagem e semelhança,
e para quem transferimos
qualidades e defeitos humanos...
Deuses que inventamos todos os dias…
Precisamos dos mitos,
das lendas,
da efabulação,
do imaginário,
do pensamento mágico,
mesmo sob a roupagem (frágil e enganadora)
da ciência e da tecnologia.

Daniel Roxo deve ainda funcionar,
para os nostálgicos do paraíso perdido do apartheid
(Moçambique, Rodésia, África do Sul...),
como o Che Guevara
que também funciona, ainda,
como um ícone,
tanto para os jovens sem ideologia de hoje,
como para os cotas,
os seus pais e tios,
os velhos revolucionários românticos
que queriam, nos anos 60 e 70,
incendiar o mundo,
criando um, dois, três, muitos Vietnames!...

Há homens que são incapazes de deixar de combater...
Mesmo, no limiar da decadência física,
a adrenalina da guerra
é mais forte que a razão...
É um pulsão quase irresistível.
O que terá levado este
e outros compatriotas nossos
a alistar-se nas forças especiais
do regime racista da África do Sul
e a morrer em Angola
por uma pátria que não era a sua ?
Poderei perguntar o mesmo pelos cubanos
que morreram em Angola (mas também na Guiné).
Dir-me-ão que lutavam
por um mundo em que acreditavam,
por uma bandeira,
por uma causa que era a sua razão de vida,
e não apenas por um punhado de dólares,
como nos filmes do Oeste da nossa infância...
Mesmo os mercenários de guerra
não matam nem se deixam matar por dinheiro...
Pura e simplesmente recusam admitir
que estão velhos e acabados...
Sou céptico,
nem optimista nem pessimista:
o ser humano é motivacionalmente muito complexo
e manipulável
e moldável…
Creio que a guerra também pode ser viciante,
havendo homens que nela entram
e dela nunca mais saem...
A guerra pode ser uma forma (heróica) de suicídio...
altruista.

_________

Notas de L.G.:

(*) Da vasta e sempre apreciada colaboração de Joaquim Mexia Alves, aqui fica uma selecção:

7 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1056: Estórias avulsas (1): Mato Cão: um cozinheiro 'apanhado' (Joaquim Mexia Alves)

12 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1271: O cruzeiro das nossas vidas (1): O meu Natal de 1971 a bordo do Niassa (Joaquim Mexia Alves)

2 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1912: Um buraco chamado Mato Cão (Nuno Almeida, ex-mecânico de heli / Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 52)

25 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1997: Álbum das Glórias (22): O Alf Mil Pires, cmdt do Pel Caç Nat 63, em Mato Cão, na festa do meus 24 anos (Joaquim Mexia Alves)

15 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2179: Fado da Guiné (letra original de Joaquim Mexia Alves)

19 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2364: O meu Natal no mato (5): Mato Cão, 1972: Com calor, muito calor, e longe, muito longe do meu clã (Joaquim Mexia Alves)

13 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2631: Dando a mão à palmatória (5): Recado para uma ida à Guiné (Joaquim Mexia Alves)

30 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2701: Blogpoesia (10): Olhando para uma foto minha, no Mato Cão, ao pôr do sol, com o Furriel Bonito... (Joaquim Mexia Alves)

15 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2845: A guerra estava militarmente perdida ? (4): Faço jus ao esforço extraordinário dos combatentes portugueses (Joaquim Mexia Alves)

19 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2961: O Nosso III Encontro Nacional, Monte Real, 17 de Maio de 2008 (11): Às vezes dá-me umas saudades da Guiné... (J. Mexia Alves)

1 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3261: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (7): o meu amigo e conterrâneo Jaime Brandão (J. Mexia Alves)

26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3940: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (2): J. Mexia Alves, ex-Alf Mil (Xitole, Mato Cão, Mansoa)

6 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4146: Parabéns a você (3): No dia 6 de Abril de 2009, ao camarigo Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp, Guiné 1971/73 (Editores)


(**) Vd. postes de:

6 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1928: Estórias de vida (3): Sérgio Neves, meu irmão: em Moçambique, o Mercenário, amigo do lendário Daniel Roxo (Tino Neves)

7 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1933: Questões politicamente (in)correctas (30): os cordeiros e os lobos de Mueda ou a adrenalina da guerra (Luís Graça)

6 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2032: Estórias de vida (4): Ainda sobre o meu irmão, o Srgt Mil Sérgio Neves, que foi amigo em Moçambique de Daniel Roxo (Tino Neves)

24 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2127: Estórias de vida (5): Sérgio Neves, meu irmão, um homem bom (Tino Neves)

Guiné 63/74 - P4287: Convívios (121): Pessoal da CCAÇ 2700, no dia 24 de Maio de 2009, na Mealhada (Fernando Barata)


O nosso camarada Fernando Barata solicita-nos a publicação do encontro da sua companhia, que vai decorrer no próximo dia 24, na Mealhada, com o seguinte programa.

18.º Encontro da 2700, na MEALHADA, dia 24 de Maio de 2009.

Informamos-te que vamos reunir no RESTAURANTE PORTAGEM, na saída para a MEALHADA, na Auto Estrada Lisboa - Porto.

O início do encontro será ás 11,30h para convívio entre combatentes, amigos e familiares no parque do restaurante.

Pelas 13,00h terá início o nosso almoço de confraternização.

EMENTA

Entradas: Acepipes variados e aveludado de Legumes.

Prato de peixe: Bacalhau á lagareiro.

Prato de carne: Bifinhos com cogumelos á chefe.

Sobremesa: Diversas sobremesas / Bolo com distintivo da Companhia.

Outros: Vinho branco e tinto – Espumante da casa - Águas, refrigerantes, café c/ aguardente ou whisky.

Adultos - 25,00 €
Crianças dos 6 aos 11 anos - 12,50 €
Crianças até aos 6 anos - grátis

Sê rápido, confirma até ao dia 20 de Maio de 2009.

Timóteo Santos - Ap. 21 - 9700 Angra do Heroísmo
Telefone 295 213923 - Telemóvel 96 2497110

(Fernando Barata)
___________
Nota de MR:

Vd. último post da série de:

23 de Abril de 2009>Guiné 63/74 - P4277: Convívios (118): Pessoal da CCS do BCAÇ 4612/72, confraternizou no dia 02 de Maio de 2009, em Benavente (Magalhães Ribeiro)

Guiné 63/74 - P4286: O Nosso Livro de Visitas (60): Amizades muito especiais (José P. Silva, ex-alf mil, CCAÇ 2383, Cabuca, 1968/70))

1. Do nosso camarada José Pinheiro da Silva, recebemos em 04MAI2009 as seguintes notícias:

Amigo,

Sou um dos que estiveram na Guiné e hoje, na cidade da Maia, esteve reunido com a maior parte dos graduados e oficiais da Companhia de Caçadores 2383 que permaneceu na Guiné, nomeadamente em Cabuca (Gabu-Nova Lamego) e que regressou em 1970.

Pedi aos camaradas de armas que visitassem o site, porque entendo que é muito importante para todos nós trocarmos impressões e revivermos um tempo de muito sacrifício em que nasceram amizades muito especiais.

Um abraço pelo bom trabalho.

José Fernando de Sá Pinheiro da Silva
Alf. Milº da CCaç 2383 (Cruz de Guerra 4ª Classe)
________

Nota de MR:

Vd. último post da série > 01 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4272: O Nosso Livro de Visitas (59): Em busca de Pami Na Dono, a guerrilheira (Branco Alves / Mário Fitas)

terça-feira, 5 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4285: Um filme da Guiné. Jorge Freire (CCaç 153, 4ª CCaç, Bissau, Gabu, Bedanda, 1961/63)...(Virgínio Briote)

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Jorge Matias Freire 

 Encontrei o Jorge Freire há dias, em Oeiras, no Alto da Barra. É o camarada mais antigo que temos no blogue e reside há muitos anos nos EUA, em Columbia, no estado da Carolina do Sul. Das memórias que guarda, diz: 

(...) A companhia de que originalmente fiz parte, quando partimos para a Guiné, no dia 26 de Maio de 1961, foi criada em Vila Real de Trás-os-Montes. (…) 

De Vila Real, todo o pessoal viajou para Lisboa de comboio e, passada uma ou duas semanas (não me lembro ao certo), partimos em dois aviões da FAP, do aeroporto de Lisboa para Bissau, onde chegámos no mesmo dia ao anoitecer.

Passámos a noite em Bissau e seguimos logo para Fulacunda, onde permaneci à volta de dois meses, após os quais chegou a minha promoção a capitão. 

De Fulacunda fui transferido para Bissau para comandar uma companhia de nativos e render o capitão Hélder Reis. Passei 4 ou 5 meses em Bissau, depois fui para o Gabu (outros 6 meses) e daí para Bedanda onde passei o resto da minha comissão. 

No dia 18 de Maio de 1963, o capitão Nelson (meu colega de curso) veio render-me. Durante os 4 dias seguintes fiz a entrega da 4ª CCaç ao Nelson e no dia 21 de Maio vim, de avião, para Bissau.

Ai estive à espera de transporte e finalmente no dia 27 de Maio parti de volta a Portugal no navio da CUF, “Ana Mafalda”. Com o passar do tempo, a memória prega-nos partidas e não tenho bem a certeza se a companhia era a CCAÇ 164 ou CCAÇ 153. 

Voltei para Portugal e fui novamente colocado na Academia Militar, nesse tempo ainda chamada Escola do Exército, onde tinha sido instrutor desde 1957 até à minha ida para a Guiné. 

Entre 1958 e 1961, tive a oportunidade de trabalhar (nas horas livres) com um tio, que tinha uma firma de serviços de engenharia e caldeiras industriais. 

Nas férias de verão, em todos esses anos, viajei para os EUA, onde passei duas a três semanas a ajudar o meu tio em assuntos relativos aos seus negócios com duas companhias no estado da Pensilvânia. Quando voltei da Guiné, uma dessas companhias ofereceu-me o cargo de gerente de operações internacionais, com uma remuneração muito difícil de recusar. 

Nos fins de Agosto de 1963 pedi a minha demissão do Exército e parti com a minha família, (mulher e duas filhas de 3 e 2 anos), para os EUA onde me encontro há mais de 45 anos. 

Desde então tirei um curso de engenharia mecânica, trabalhei para outras duas companhias e, em 1989, formei a minha própria companhia de consultaria de projectos relacionados com energia de gás, co-geração, etc. Em 2001 parei de trabalhar a tempo inteiro, e estou praticamente reformado. 

Felizmente de boa saúde, venho a Portugal, todos os anos, e aproveito para me encontrar com um bom grupo de antigos camaradas de curso.

Tenho 3 filhas, a mais nova nasceu nos Estados Unidos e, embora todas casadas, tenho apenas um neto e uma neta da filha mais velha. A filha do meio e a mais nova ainda não têm descendentes.


Jorge Freire na festa dos 50 anos de casmento.


A Guiné está-lhe bem presente na memória. Naqueles primeiros tempos da comissão, a guerra era ainda uma ameaça. Assistiu aos sinais, cortes de comunicações, roubo de navios, abatizes. Ainda antes da guerra começar, a mulher foi ter com ele. Com a guerrilha a crescer, decidiu mandar a mulher para Lisboa. Depois a guerra começou mesmo. Minas e emboscadas causaram a morte a alguns militares da sua CCaç, em Bedanda. Regressou a Lisboa, no “Ana Mafalda”, em 1964, e tomou a decisão de não continuar no activo. Convidado por um tio, emigrou para os Estados Unidos, onde iniciou uma nova vida, que lhe veio a trazer muita satisfação.

 Longe da guerra da Guiné, não deixou de acompanhar todos os anos do conflito. Camaradas do seu curso, como os actuais Generais Hugo dos Santos, António Rodrigues Areia, Adelino Coelho, António Caetano e os Coronéis João Soares (blog Do Miradouro), Costa Martinho, Maurício Silva, entre outros, a quem se foi mantendo, continuavam nas Forças Armadas. 

Há pouco mais de um ano descobriu o nosso ponto de encontro, o blogue do Luís Graça e Camaradas da Guiné, de que é leitor assíduo, e para o qual enviou um pequeno diário dos acontecimentos que viveu em 1962 e 63. Jorge Freire, entre Setembro de 1962 e finais de Maio de 1963, fez um filme da Guiné. Embora algo deteriorado pelos anos, podemos ver como era a Guiné naqueles anos.

O Gabu, Nova Lamego, a avenida principal, um domingo à tarde com as famílias, os esquilos amestrados, a mulher do Jorge com a filha do 1º sargento da companhia, mulheres à pesca de camarão, a operação de lavagem das roupas, ou como bater bem com as peças de roupa nas pedras, as bajudas e os meninos a brincar na água, a fonte de água, o grande régulo Fula, a mulher mais nova e a mais velha, aparentemente amigáveis uma com a outra, os netos, os trajes de cerimónia, o alfaiate da terra, o campo de aviação do Gabu e imagens do ar, na viagem para Bissau no Dornier.

Em Bissau, o render da guarda ao Palácio com a população a assistir e o regresso ao Gabu. A visita do Jorge aos pelotões destacados, no marco da fronteira com a Guiné-Conackry, em Buruntuma, a passagem em Mule (ponte) Blassi e o regresso a Bissau num barco comercial, com imagens do piloto da embarcação.

E depois, Bedanda, o “aquartelamento”, as pirogas no Cumbijã, a construção de instalações, os alferes da companhia (4ª CCaç, um dos quais viria a morrer em combate, dias depois), imagens filmadas antes da saída de uma patrulha, um prisioneiro amarrado que terá, durante uma emboscada, morto um dos soldados da companhia.

Patrulhas no Cumbijã, os tarrafos ao lado, os tarrafos dos nossos descontentamentos, soldados com Mausers, uma secção destacada em Chugué, a transferência da população Fula de Imberém para Bedanda, as festas que se seguiram, bajudas com as belezas à mostra…

Comissão terminada, o regresso a Bissau e depois “eu vou chamar-te Pátria minha”, na voz do Carlos do Carmo, enquanto os olhos se espraiam lá do alto pelos rios e ribeiros, as margens, as florestas, as lalas. Imagens que era costume, alguns de nós, registarem, quem sabe com o receio de nunca mais nos lembrarmos… Em Bissalanca, um MG branco ou creme rodeado de especialistas da FAP, a torre de controlo, a visita à Guiné dos adidos comercial e militar, o coronel Jeffries, e as últimas vistas de Bissau no último fim de semana em Bissau, antes do regresso à pátria.

A fortaleza da Amura, o porto de Bissau, o desembarque no cais e o desfile de um pelotão (Caçadores?) de nativos, o capitão Simões, tão falado pelo Amadu Bailo Djaló nos seus escritos e, no dia do embarque, no “Ana Mafalda”, em 26 de Maio de 1963, o movimento em dias de movimento de navios, o cais de embarque nº 2, o navio em manobras, a afastar-se, com a Amura e Bissau a recortarem-se, cada vez mais pequenos. 

 Depois, o Atlântico, as Canárias no horizonte, até, finalmente começarem a ver a costa, com Lisboa cada vez maior, no Tejo de tantas entradas e saídas, a volta ao Bugio, o jovem capitão Jorge Matias Freire, à civil, de fato à anos 60 e, Lisboa tão perto que já se via gente à espera deles, de lenços no ar, a Torre de Belém, o Monumento aos Descobrimentos, e, como um agradecimento, as últimas imagens são do capitão, do imediato e do médico do “Ana Mafalda”. 

 A guerra na Guiné ainda estava muito, mesmo muito no princípio. Mas para os quatro soldados, um sargento e um alferes da companhia do capitão Jorge Freire, em Bedanda, a guerra tinha acabado. É, com a lembrança deles, que o Jorge Freire termina este pequeno filme, que, logo que saiba como devo fazer, vou incluir numa das nossas páginas, para completar o desejo do Jorge em o oferecer a todos os camaradas.

__________ 

Notas de vb: 

1. Artigos do Jorge Freire em





2. Informação do José Martins: 

A Companhia de Caçadores a referir é a 153 (a 164 não existiu na Guiné). Foi mobilizada pelo RI 13 de Vila Real (...) comandada pelo Capitão de Infantaria José dos Santos Carreto Curto. 

Embarcou para Bissau em 27Mai61 (via aérea) e regressou em 24Jul63. 

A 26Jul61 foi colocada em Fulacunda destacando forças para Empada, Cufar, Catió e Bolama, por periodos variaveis. 

A 7Fev62 foi rendida pela CCAÇ 274 e foi colocada em Bissau. A 11Fev62 rendeu a CCAÇ 74 em Bissau. A 21Jul63 foi substituida pela CCAÇ 510, ficando a aguardar embarque.

Guiné 63/74 - P4284: Agenda Cultural (11): Memórias Literárias da Guerra Colonial, dia 7: Viagem ao Fim do Império, romance de Martz Inura



Na Biblioteca-Museu República e Resistência, Espaço Grandella, Estrada de Benfica, 419, Benfica, Lisboa, vai decorrer o 2º Ciclo de Conferências "Memórias Literárias da Guerra Colonial", entre 7 de Maio e 25 de Junho de 2009 (Quintas-feiras, 19h00).

A primeira conferência é já no próximo dia 7 (5ª feira), com a apresentação do romance Viagem ao fim do Império, da autoria de Martz Inura, um ex-combatente.

O autor tem uma página pessoal na Net: http://www.martzinura.com/

Viagem ao Fim do Império é o seu oitavo livro publicado e o segundo em prosa. O romance aborda a guerra colonial em Angola, onde o próprio escritor esteve em missão por duas vezes. Com cerca de 500 páginas, é mais um testemunho valioso sobre a catarse da guerra. Oficial miliciano, é hoje tenente coronel reformado. Vive em São João da Madeira. É natural de Oliveira de Azeméis. Nasceu em 1945.

“Muitos dos episódios descritos no livro eu próprio os vivi. Mas o livro é uma ficção, não descrevo as coisas tão horríveis como de facto foram”, contou o escritor ao semanário Labor.

Martz Inura é o pseudónimo literário de Emídio Ferreira Aguiar.

A próxima conferência é a apresentação, a 14 de Maio, do livro do nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, A Retirada de Guileje: a verdade dos factos. Coutinho e Lima, hoje Cor Art Ref, era o comandante do COP 5, na altura da retirada de Guileje, em 22 de Maio de 1973.

Para mais esclarecimentos sobre este evento contactem o Paulo J. Sousa, da Câmara Municipal de Lisboa, Direcção Municipal de Cultura, Divisão de Gestão de Bibliotecas:

E-mail:
jose.paulo.sousa@cm-lisboa.pt

Sítios na Net:
http://republicaresistencia.cm-lisboa.pt/

http://www.cm-lisboa.pt/


_________

Nota de MR:

Vd. último poste da série em 30 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4269: Agenda Cultural (11): Ciclo de Encontros Guerra Colonial: Realidade e Ficção - Alverca do Ribatejo (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P4283: Recortes de imprensa (19): O pesadelo das minas (Nelson Herbert)

Guiné-Bissau > "Uma foto relativamente recente .. Foto minha, de explosivos e minas recolhidos, e pronto para a destruição !" (Nelson Herbert)...

Estes engenhos serão do tempo da guerra civil de 1998/99, que opôs as forças de Nino Veira, apoiadas por tropas dos vizinhos Senegal e Guiné-Conacri, às tropas revoltosas da Junta Militar, do brigadeiro Ansumane Mané... Uma guerra civil cruel, feroz e prolongada que ainda está muito viva na memória do povo da Guiné-Bissau...

No que diz respeito ao período da guerra colonial / luta de libertação, não sabemos ao certo quantas minas e armadilhas e outros engenhos explosivos (bombas da aviação e da marinha, granadas de artilharia, etc.) ficaram no terreno... Tanto nossas como do PAIGC e que continuam a matar...

César de Carvalho, responsável do CAAMI - Centro de Centro de Acção Anti-Minas, estrutura criada pelo governo guineense em 1999 para coordenar e gerir todo o processo de desminagem, a era esperado que Guiné-Bissau ficasse livre de minas até a 2006... Segundo dados da CAAMI, as minas já provocaram mais de meia centena de mortos no país e mais de 250 feridos (Fonte: Notícia da Lusa, de 18 de Outubro de 2005).


O nosso amigo Nelson Herbert, jornalista guineense de A Voz da América (VOA), membro da nossa Tabanca Grande, autorizou-nos a publicar este artigo da sua autoria...
Dele recebemos o seguinte e-mail: A primeira parte de uma reportagem, sobre os campos de minas, por mim feita no fim do conflito de 1998/99 na Guine Bissau.. A segunda parte versava os "resíduos do mesmo campos, no sul e norte do pais.. estas datadas da Guerra colonial..e da guerrilha independentista do Casamance... Esta entretanto a custar localizar estes dois últimos...

Um abraço, Nelson


Guiné-Bissau: Campos de minas antipessoais e antitanques identificados nos arredores da capital (*)

por Nelson Herbert (VOA)

São, ao todo, quatro os campos de minas antipessoais e antitanques identificados no perímetro que circunda a capital guineense Bissau. Áreas que ladeiam bairros residenciais e pequenas lavras satélites à cidade, capital guineense.

A história destes campos de minas não requer um exercício profundo da memória, para a situar em termos de temporalidade. Pois datam do conflito militar que assolou a Guiné-Bissau entre 1998/1999.

Como parte da estratégia de defesa adoptada pelas então forças do presidente Nino Vieira, era necessário defender a franja da cidade de Bissau, que resistia ao isolamento imposto pela rebelião militar do general Ansumane Mané.

E mais no seu auge, o conflito foi responsável pela fuga de cerca de um terço da população de Bissau em busca de refúgio mais a interior do país, desbravando assim zonas residenciais estratégicas à penetração inimiga.

São os casos dos bairros de Brá, Quelele, Estrada de Bor, Ajuda, Antula, Enterramento, e mais a sul da capital, o Bairro Plaque 1, áreas minadas pelas forças governamentais afectas a Nino Vieira e por militares do Senegal e da Guiné Conacri.

No campo de minas de Bor, seguindo os regulamentos, os sapadores tinham decidido, momentos antes da chegada da nossa reportagem ao local, suspender temporariamente os trabalhos da desminagem. Em causa a ausência, justificada por doença, do paramédico do grupo. Mas mesmo assim o dia não deixou de ser aproveitado, para o Day After...

Munidos de machetes, a equipa de sapadores aventura-se escassos metros adentro da mata, recolhe ramos de árvores ressequidos que são utilizados para a feitura das convencionais estacas de sinalização característicos dos campos de minas.

A viagem até o Bairro de Bor, localizado num dos extremos de acesso a capital Bissau, dura um pouco mais de meia hora, entre estradas esburacadas e a azáfama dos mercadores que disputam, com as viaturas , as vias de acesso à localidade.

A zona tinha sido inicialmente, e com o fim do conflito militar, alvo de uma primeira acção de desminagem a cargo da Humaid, a mais antiga Organização Não governamental a operar no sector.

Mas receios da possibilidade de existência de minas não detectadas na primeira fase da desminagem, sugeriram à Humaid, dirigido por John Blaken, um ex-embaixador dos Estados Unidos, na Guiné-Bissau, a jogar pelo seguro e a regressar à zona para uma segunda escrutinização sobretudo dos terrenos que ladeiam a picada que dá a acesso à localidade.

A picada é, por sinal, a mesma que nos conduz ao bairro do Enterramento, o segundo campo de minas visitado é um dos quatro que circundam bairros residenciais da periferia de Bissau.

Na zona são ainda visíveis os sinais dos combates e dos meios bélicos e militares envolvidos nos confrontos que opuseram unidades das forças senegalesas aos rebeldes da Junta Militar. Invólucros de munições, projécteis intactos de armas pesadas recolhidos pelos sapadores, restos de minas antipessoais de origem distinta para além do que ainda resta das trincheiras militares escavadas na terra avermelhada.

Um elemento da população revela que um dos filhos perdeu uma perna na explosão de uma mina no campo e relembra que o bairro teria sido palco de alguns dos mais intensos confrontos militares do sangrento conflito.

Durante os trabalhos da abertura da picada as máquinas chegaram a detectar duas activas minas antitanques - conclui aquele popular.

Mas é entretanto por altura da época da lavoura que o perigo se destapa. Das imprudentes queimadas lançadas pela população para a abertura de clareiras à prática da agricultura de subsistência, resulta quase sempre a necessidade da evacuação da área devido às explosões de projécteis de artilharia abandonados no terreno.

Bacar Djau, um jovem de pouco mais de 25 anos de idade, assume, a embora corriqueira, mas difícil missão de nos conduzir pelo interior adentro do perímetro florestal minado e que ladeia a picada que dá acesso ao Bairro de Enterramento.

Mas antes é necessário a familiarização com as normas e as sinalizações do campo, sobretudo as estacas indiciando perigo à vista.

Era chegado o momento de um acerto de passo com o perigo... uma espécie de aventura nossa por um dos muitos campos de minas herdados do conflito militar na Guine Bissau.

As estimativas iniciais das forças de manutenção de paz da Comunidade Económica dos Países da África Ocidental, a Ecomog, enviadas para a Guiné Bissau em 1999 no quadro dos acordos de paz, de Abuja, Nigéria, chegaram a prever entre 15 a 20 mil o número de minas implantadas na periferia de Bissau.

Contas entretanto que a Humaid hoje contraria, situando em cerca de 4 mil o número aproximado de tais engenhos explosivos implantados durante o conflito.

John Blaken, um ex embaixador dos Estados Unidos na Guiné-Bissau e que assume a administração da Humaid, revela que, não obstante a existência de outros campos de minas, sobretudo no interior do país, estes do tempo da guerra pela independência do país, decidiu-se priorizar as áreas circundantes de Bissau, pelo perigo iminente que representam.

“Bem, foi dada prioridade a Bissau porque é onde se tem registado acidentes. Com excepção no norte, na fronteira com a Casamance, não tem havido incidentes no interior do país. Isto porque identificamos e marcamos os campos no sul e as pessoas conhecem-nas e tratam de se manter longe deles” - precisa aquele antigo diplomata à nossa reportagem.

Num mapa detalhado dos campos de minas já identificados em todo o território guineense, Blaken garante que, numa segunda etapa, a ONG tenciona estender as suas acções de desminagem às zonas rurais do interior, nomeadamente aos campos de minas no sul do país, que circundam o perímetro dos antigos aquartelamentos do éxercito colonial português.


“Existem 17 locais identificados no interior do país, como campos de minas do tempo da guerra pela libertação. São sobretudo campos junto aos antigos quartéis portugueses. Existem alguns locais no norte, mas este mapa não inclui as minas implantadas durante o conflito do Casamance... não temos esses campos de minas identificados” - frisa John Blaken.

Os números atestam os factos. De Janeiro de 2000 a Maio de 2005, a Humaid desactivou apenas na periferia de Bissau, mais de duas mil e quinhentas minas antipessoais, 55 minas antitanques, 144 minas submarinas, cerca de 14 mil projécteis não deflagrados com calibre superior a 12.7 milímetros e aproximadamente 30 mil munições de calibre inferior a 12.7 milímetros numa extensão de terreno calculado em 537 mil 990 metros quadrados. Terrenos que pouco a pouco estão sendo reocupados pelas populações na construção de palhotas e abertura de lavras.
“Se não tivesse tido a garantia do pessoal da Humaid, não construiria a minha casa aqui” - confirma este popular à nossa reportagem.

John Blaken, empenhado na desminagem na Guiné-Bissau confirma que à medida que a desminagem dos terrenos vai sendo concluídas, as populações reocupam as terras para a construção de habitações e a abertura de novas lavras. “Uma experiência, gratificante”, conclui este antigo diplomata americano. (**)


_____________

Notas de MR:

(*) Originalmente publicado na News VOA.com, com data de 12 de Setembro de 2005

Guiné 63/74 - P4282: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (11): Heróis... (Constantino Costa, Sold CCav 8350, 1972/74)

1. Mensagem de Constantino Costa, enviada em 28 de Abril último, às 18h45 [Bold, a cor, da responsabilidade do editor]:

Caro Senhor:

Não posso deixar de lhe endereçar os meus cumprimentos pelo importante trabalho desenvolvido no seu blogue.

Como militar participei na guerra do ultramar (Guiné), fazendo parte da CCav 8350, destacada em Guileje e Gadamael Porto. (*)

Como assíduo visitante do seu blogue, tenho verificado (com tristeza) que muitas das referências feitas sobre a nossa actuação, tanto em Guileje como em Gadamael, pecam por - creio - defeito dado que alguns dos intervenientes (Alferes Manuel Reis e João Seabra e Furriel José Carvalho) pretendem omitir acontecimentos importantes que poderiam esclarecer muito do que por lá se passou, não honrando assim a memória daqueles que lá deixaram a vida ou ficaram estropiados.

Quando defendem o [então] major Coutinho e Lima esquecem que aconselharam o mesmo a optar pela fuga.

Hoje é fácil aligeirar responsabilidades com o intuito de se justificar um abandono que em nada dignifica a CCav 8350, ou as Forças Armadas Portuguesas.

O ex-Maj Coutinho e Lima nunca se mostrou à altura do cargo e bem merece a punição que lhe foi aplicada.

Eu cheguei a elaborar relatórios de operações nunca efectuadas. O Cap Abel Quintas [, foto actual, à esquerda, ] ordenava para só alterar as datas das operações e o resto era copiado.

Por puro oportunismo alguns gostariam de ser condecorados.

No tal massacre de Gadamael os camaradas que faziam parte dessa patrulha nunca foram obrigados a sair, [foram sim mas] como voluntários.

Após o ataque em Gadamael cerca de 80 % das nossas tropas decidiu abandonar o aquartelamento apesar de aí estarem estacionadas 2 companhias de pára-quedistas, com 12 militares emboscados no mato que sofreram 4 mortos e 1 ferido grave.

Foi necessário chamar a atenção de alguns furriéis e alferes para que estes voltassem para trás.

Durante um ataque em Guileje, perante a recusa de quase todos ofereci-me para ficar de sentinela com as granadas a caírem em redor do aquartelamento, comigo escondido debaixo de o banco da guarita.

Durante uma patrulha (Colibuia) um ruído na mata fez com que todos começassem a disparar sem nexo, inclusive para próximo do aquartelamento. Mais tarde veio a verificar-se que o tal barulho tinha sido provocado por um bando de macacos.

Em Gadamael, na sua 1ª patrulha a CCav 8350 não se deslocou para o local determinado, mas sim para lá uns 500 m do aquartelamento.

Numa das suas patrulhas o pelotão ouviu disparos e quase todos largaram as armas fugindo, quando o IN só tinha 4 elementos.

Muito mais haveria para dizer, mas fico-me por aqui.

Cumprimentos,

Constantino Costa

2. O mesmo Constantino mandou-me uma segunda mensagem, menos de 24 horas depois da primeira, que publico apenas para 'documentar o processo' e para eventuais efeitos pedagógicos (tanto se aprende com as lições dos inimigos como com as críticas dos amigos):

Assunto - Heróis

Caro Senhor:

Com os meus cumprimentos, venho manifestar a minha indignação pelo modo faccioso como pretende criar adular os seus amigos (alferes, João Seabra e Manuel Reis e ainda o furriel, José Carvalho) só porque entenderam dar a sua versão sobre os acontecimentos ocorridos em Guileje e Gadamael Porto [vd. foto da época, à esquerda]...

Acontece que as suas histórias só tentam justificar toda uma acção que desprestigia de forma indigna as Forças Armadas Portuguesas.

Muitos dos factos narrados no blogue não correspondem ao que na realidade aconteceu e os únicos heróis que reconheço são todos aqueles que perderam a vida em vão e os estropiados.

A guarnição de Guileje nunca teve um Cmdt à altura, Major Coutinho de Lima e Cap Abel Quintas.

Aquando da nossa retirada a CCav 8350 tinha sofrido dois mortos em combate (continentais) e possuía abrigos à prova de armas de calibre 120 mm.

Apesar de o inimigo se encontrar a alguns quilómetros de distância, não havia serviço de água porque ninguém chefiava, já que poucos saíam dos abrigos, inclusive os graduados.

Prestei declarações à SIC mas, ao contrário do prometido, aquela estação decidiu não publicar as minhas declarações por sugestão de alguns daqueles que agora se querem fazer passar por heróis.

A verdade sobre Guilege e Gadamael tem sido desvirtuado no sentido de alguns aligeirarem responsabilidades.

Permita-me relembrar que durante o abandono de Guileje (esta é que é a verdade) grande parte da CCav debandou e largou as poucas armas só pelo facto de um africano ter tocado num ninho de abelhas.

Hoje passados mais de 30 anos do abandono de Guileje e Gadamael, alguns [estão a] dar uma versão bem diferente do que lá se passou.

Um reclama para si o papel de herói, outro foi medalhado e outro ainda estou para ver o que lhe vai calhar.

No país em que vivemos já não me surpreende tamanha desfaçatez, oportunismo de quem ousa ser detentor da verdade e só procura o protagonismo para satisfação da sua vaidade pessoal.

Entristece-me o facto de ter acreditado que o seu blogue estava aberto a todos aqueles que combateram nas antigas provincias ultramarinas. Puro engano!..

Bem Haja!!!

Cumprimentos, Constantino Costa

3. Um primeiro comentário de L.G. (foto da época, à esquerda):

Digo dizer que comecei por estranhar o teor da primeira mensagem. Embora não fosse anónimo, no mail o autor não se apresentava como devia ser... Dizia apenas que tinha sido militar da CCAV 8350, que também é conhecida por Piratas de Guileje (termo que ele nunca emprega, e está no seu direito).

Por outro lado, o registo e o tom eram de acusações (algo gratuitas mas nem por isso menos graves) a antigos camaradas, membros da nossa Tabanca Grande (João Seabra, J. Casimiro Carvalho, Manuel Reis, Coutinho e Lima), ou que já aqui foram evocados várias vezes mas que não integram o nosso blogue (caso do ex-Cap Mil Abel Quintas). Há insinuações e acusações, feitas no mínimo de ânimo leve (ou no calor da batalha), e que são repetidas na segunda mensagem:

"(...) pretendem omitir acontecimentos importantes (...), não honrando assim a memória daqueles que lá deixaram a vida (...)";

"O ex-Maj Coutinho e Lima nunca se mostrou à altura do cargo e bem merece a punição que lhe foi aplicada"...

"Eu cheguei a elaborar [o Constantino deve querer dizer dactilografar] relatórios de operações nunca efectuadas. O Cap Abel Quintas ordenava para só alterar as datas das operações e o resto era copiado";

"Por puro oportunismo alguns gostariam de ser condecorados";

" [A SIC, em 1996] decidiu não publicar as minhas declarações por sugestão de alguns daqueles que agora se querem fazer passar por heróis";

"Um reclama para si o papel de herói, outro foi medalhado e outro ainda estou para ver o que lhe vai calhar", etc., etc.

Por uma questão de lealdade, bom senso e respeito pelas regras do nosso blogue, dei conhecimento prévio do teor da mensagem aos visados, manifestando as minhas reservas, como de resto costumo fazer em circunstâncias análogas.

Através do J. Casimiro Carvalho, soube que o Constantino pertencera ao seu pelotão, e que vivia em São João da Madeira. Através da morada, conheci obter o seu número de telefone e telefonei-lhe... Achei que ele tinha ultrapassado os limites do razoável, entrando já no campo do insulto... Foi isso que transmiti aos Piratas de Guileje da nossa Tabanca Grande. Ao José Casimiro Carvalho pedi mais informações sobre o Constantino:

Carvalho, tens um telefone do teu camarada ? Vou ver se o acalmo ou tenho um conversa de 'gestor de conflitos' com ele... Ele não tem os mesmos 'privilégios' de um membro do blogue... Para já nem se apresentou, não sabia quem ele era (se não fosse o teu mail), temos sempre que admitir a possibilidade de ser um provocador ou até alguém à procura do seu minuto de fama...

Tratando-se de um pirata de Guileje, ele tem que seguir os mesnos passos dos outros: apresenta-se, dá a cara, conta a sua história, ouve as críticas e os comentários dos outros, e por aí fora...


Carvalho, por favor, explica-lhe isso e acalma-o... A gente quer conhecer a versão dele, mas não pode ser com insultos, berros, chantagem, com a G3 atrás das nossas costas...


Eis o teor do mail que enviei a seguir aos quatro camaradas visados (Coutinho e Lima, João Seabra, José Casimiro Carvalho e Manuel Reis), depois de ter telefonado ao Constantino e aparentemente ter acalmado o nosso homem (que, a entrar na nossa Tabanca Tabnca Grande, fá-lo de maneira um pouco menos ortodoxa):

Amigos e camaradas de Guileje:

Já falei ao telefone com o Constantino. Consegui, através da morada, saber o nº de telefone dele... Trabalha em artes gráficas. Parce ser um trabalhador independente. Comecei logo a tratá-lo por tu, para ficarmos ao mesmo nível...

Fiquei a saber que lê com muito interesse e emoção o nosso blogue. Era soldado do 3º Pelotão, do Alf Gonçalves. É o mesmo que o Seabra identifica como 'dactilógrafo'. Falei com ele, com toda a frontalidade, agradeci-lhe os elogios que fez ao blogue na 1ª mensagem, para logo a seguir lhe dizer que não aceitava nem apreciava as críticas 'gratuitas e insultuosas' que nos fez na 2ª mensagem, enviada 23 horas depois... Ele percebeu o recado, baixou a guarda. Disse-me explicitamente que quis ser provocatório (sic) na 2ª mensagem.

Pediu desculpa do excesso de linguagem. Vejo que tem uma versão dos acontecimentos que não coincide, nalguns pontos, com a versão dos 'chefes'... Deixou de ir aos encontros da companhia... Percebeu também que o blogue não é nenhum tribunal da opinão pública... E que o blogue tem regras (éticas) que as pessoas aceitam ou não aceitam, como por exemplo "a recusa da tentação de julgar (e muito menos de criminalizar) os comportamentos dos combatentes, de um lado e de outro".

Em suma, fiquei a saber quem ele era, onde morava, quem foi no passado (militar)...Vai entrar para o blogue como qualquer outro camarada da Guiné, cumprindo e respeitando as regras de bom e sã convívio... Vou começar por publicar o texto dele, seguido do do João, que lhe põe questões concretas... Eventualmente publicarei também os comentários do Reis, do Casimiro Carvalho... Farei uma introdução para contextualizar... (...)


4. Texto do J. Casimiro Carvalho (foto, de 1973, à esquerda):

Amigo Luís Graça:

o camarada em questão existe. Em cima estão os dados de que disponho [Casimiro Silva Costa, Rua Guerra Junqueiro (...), São João da Madeira (...)]

Não sei se era cabo ou soldado pois pelo nome não estou a ver quem é (foi) esse meu camarada.

Tem direito à sua opinião.

Quanto à patrulha em que morreram 4 homens e houve um ferido, ele devia honrar os camaradas mortos, pois se houve algum voluntário não o foi concerteza o Alf Branco nem o soldado Anselmo e nem possivelmente o Cabo Neves ("Morre o Homem fica a fama"). Eu não fui voluntário... Concerteza nem os dois camaradas que vão aos convívios e que, sendo tão novinhos, eu dispensei-os de sair (para a morte) e que sempre dizem às filhas:
- Este foi o furriel que nos salvou (talvez) a vida.

Quanto à patrulha em Colibuia, eu fazia parte da mesma, foi um tiroteio danado, não me apercebi se era tão disperso (o tiro) mas foi originado por mim, pois vi um africano numa árvore(ao longe) e disparei pois ele desceu muito aflitivamente ao ser descoberto (só então disparei) e todos me secundaram...claro.

Quanto a Guileje, eu...não estava lá.

Agora o camarada estar a dizer que se pretende omitir algo, eu não entendo, pois ele deve ter sofrido e bem o que nós sofremos.

Pelo menos que esclareça o seu ponto de vista. Temos direito a isso e ele também

Um abraço deste Pirata para o Pirata C Costa.

PS - Eu era do Grupo [de Combate] do Alf Gonçalves, portanto do C. Costa.

5. Mensagem do Manuel Reis (foto actual, à esquerda):

Amigo Luís:

Não me lembro deste camarada, embora o nome não me seja estranho. Nada mais pretende que lançar a confusão.

As mentiras são tantas, que não há muito para dizer. Essa de elaborar relatórios de patrulhamentos (não feitos) a pedido do capitão, não lembra ao diabo!

Pela montruosidade destas afirmações terei de pensar que haverá alguém, por trás, a ajustar o tiro.
Que existam camaradas que discordem da decisão do Coronel Coutinho e Lima é natural, são as excepções, que confirmam a regra.

Eu lembro uma situação vivida em Gadamael-Porto no dia em que o Coronel Coutinho e Lima saiu, sob prisão, para Bissau. Os soldados, representativos de todos os grupos, encarregarem-me, conjuntamente com o Seabra, de falar com o Coronel Coutinho e Lima e transmitir-lhe a sua solidariedade, disponibizando-se para impedir a sua saída de Gadamael-Porto (acontecimento um pouco esquecido).

Coutinho e Lima recusou. Veio, posteriormente, a pedido do advogado, solicitar-me que manifestassem, por escrito, o seu apoio. Tal não se veio a concretizar por força do 25 de Abril.

Nos nossos convívios o Coronel Coutinho e Lima é sempre alvo de manifestações de carinho. O respeito e admiração que nutrem por ele é enorme.

Espero que o referido camarada apareça no nosso convívio (7 de Junho, na Covilhã) mas duvido que o faça. Não me lembro da presença dele em qualquer outro convívio e estive em todos.

Uma palavra de gratidão para o amigo Luís Graça pelo seu alerta. Situações idênticas vão certamente repetir-se.

Um abraço amigo para todos. Manuel Reis

PS - Estou como diz o furriel Carvalho: Ele que fale!

O problema dele com a SIC deve reportar-se a 1996, referente à reportagem "De Guilege e a Gadamael o Corredor da Morte", em que eu e o Coronel Coutinho e Lima participámos. Aguardo a publicação das suas declarações para lhe responder.

6. Comentário do João Seabra:

Luís, se quiseres a minha opinião, acho que deves publicar a mensagem.

Não me recordo desta pessoa (passaram muitos anos). Todavia, pela referência ao destacamento em Colibuia, presumo que pertencesse ao 3º Gr Comb (o meu era o 2º e o do Reis o 1º) e, segundo parece, também fazia uns biscates como dactilógrafo de confiança.

Comecemos pelas omissões. O verbo “omitir” é transitivo, pede complemento directo, quem omite, omite alguma coisa. Que ocorrências e situações, que fossem do meu conhecimento directo, omiti eu?

O Constantino Costa alguma vez saiu comigo em patrulhamento ou escolta? Constatou que algum Gr Comb ou agrupamento comandado por mim não se deslocasse ao local determinado? Fugi eu de Gadamael? Onde é que estava o Manuel Reis na manhã de 1 de Junho de 73? Nessa data já lá estavam duas companhias de pára-quedistas? E foi nesse dia que 12 militares (da CCav 8350) foram emboscados, resultando 4 mortos e um ferido grave? Eu ou o Manuel Reis fomos dos alferes a quem “foi chamada a atenção para que voltassem para trás”?

Já houve quem dissesse que os meus escritos são muito meticulosos (chatos são certamente). Gostaria que o Constantino Costa fosse mais específico: quais os concretos, precisos e determinados “acontecimentos importantes”, em relação aos quais eu sou omisso?

Quanto aos meus pretensos “conselhos” ao Major Coutinho e Lima, “Se non è vero è ben trovato”: só tomei conhecimento da decisão quando ela já estava tomada, mas, como referi em escrito publicado recentemente, não tendo levantado objecções, é como se eu próprio a tivesse tomado.

Abraço, João Seabra


7. Mail do Coutinho e Lima (foto à esquerda, de 1995):

Caro Luís:

Relativamente ao texto do Constantino, farás o que melhor entenderes: Pela minha parte não vou responder; a maior parte dos factos passam-se em Gadamael e Colibuia e já tiverem intervenções do Reis, Seabra e Casimiro Carvalho; na parte que me diz respeito, não tem ponta por onde se pegue, pois não apresente argumentos para sustentar as afirmações que faz.

De qualquer maneira, a possível difusão dará à opinião do Constantino uma "propaganda" que talvez não mereça. Um abraço, Coutinho e Lima.

8. Comentário (final) de L.G.:

Amigos e camaradas de Guileje:

Estamos de acordo que se publique o texto do Constantino... Ele não é membro da nossa Tabanca Grande mas, como diz o J. Casimiro Carvalho, também tem direito a "contar a sua história"... Devemos exigir que ele se explique, fundamente as suas afirmações...

Se concordarem, e não considerarem o texto como 'insultuoso' (em especial, o Coutinho e Lima), podemos publicar isto na série Dossiê Guileje / Gadamael 1973... Mas antes quero ouvir a vossa opinião... O assunto é delicado, vindo de um pirata de Guileje que só agora manifesta a sua opinião, quatro décadas depois... Mas mais vale tarde do que nunca... Um abraço, Luís

PS1- Já viram o livro do Vasco Lourenço, que saiu há dias [Do Interior da Revolução, editora âncora] ? São entrevistas, feitas entre 1992 e 1995 por Maria Manuel Cruzeiro, no âmbito do projecto de História Oral do Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra)...

Li por alto a parte relativa à Guiné (apenas um capítulo, sendo o resto do livro centrado no 25 de Abril e no PREC) ... Tem uma apreciação altamente elogiosa do comportamento militar do Coutinho e Lima em Guileje, e muito crítica em relação ao Spínola e à sua 'entourage'...

PS2 - O Pepito (AD - Bissau) diz-me que a construção do Museu Memória de Guileje está a avançar... e que quer inaugurá-lo em Setembro...

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 1 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4271: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (10): Respondendo ao João Seabra (António Martins de Matos)

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4281: Tabanca de Matosinhos (10): O nosso camarada Almeida de Gandembel precisa de ajuda (José Teixeira)

1. Mensagem de José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70, com data de 2 de Maio de 2009:

Caros amigos e camaradas.

Junto o texto que escrevi sobre o Almeida de Gandembel.
Pela sua leitura podeis sentir o seu estado de saúde e o meu estado de alma.
Na segunda-feira vou à ADFA saber o que se pode fazer por ele

Abraço fraterno
José Teixeira


O MONSTRO DE GANDEMBEL CONTINUA A FAZER VÍTIMAS

O dia estava a chegar ao fim. Minha mãe, velhinha de oitenta e oito anos, esperava-me à porta do Centro de Dia de apoio à terceira idade.

Ali ao lado um rosto conhecido de alguém da minha idade, que não via há uns tempos e nunca pensei encontrá-lo ali. Era o camarada Almeida de Gandembel. Abatido, psiquicamente destruído.

Ao ver-me a comoção tomou conta dele, as lágrimas deslizaram pela face. Eu contive as minhas, mas o meu coração estremeceu e chorou também. Era o seu primeiro dia naquela casa que outrora os povos do norte da Europa batizaram de casa dos elefantes.

O Almeida de Gandembel que algumas vezes nos deliciou na Tabanca de Matosinhos cantando o Hino de Gandembel e tantas outras canções que nos transportavam de novo para a nossa juventude. O Almeida deixou de cantar o seu hino. Agora chora de desalento.

O Hino que os camaradas da CCaç 2317 cantarolavam, quantas vezes acompanhados pelo ribombar das canhoadas que o um inimigo impiedoso, raivosamente despejava sobre Gandembel, bem no meio da mata do Cantanhez, como que a porta do carreiro da morte.

O Hino que nos fins dos anos sessenta era o símbolo da nossa resistência, nos muitos campos de batalha semeados pela Guiné, como que um grito de lamento.

O Hino que o Almeida gravou em CD com tanto carinho em 2007 e foi o centro do show musical que animou a festa de recepção aos participantes do Simpósio de Guilege em 2008, no antigo quartel general em Bissau, agora transformado num Resort.

Ali, ao som da sua música, combatentes das duas frentes, deram as mãos, cantaram e dançaram, animados pelo Conjunto Furkuntunda que deu nova alma ao nosso hino, transformando um lamento de guerra num grito de paz.

O Almeida perdeu a vontade de cantar.

http://www.youtube.com/watch?v=wPZ05F0eo7w

-Sabes, Teixeira, a mulher continua a trabalhar e eu fico sozinho em casa, mas não consigo suportar o isolamento. Aquele silêncio!...
Os fantasmas que te perseguem
, pensei eu.

A sorte tem sido madrasta para o Almeida. Não lhe bastou, a fome a sede, o medo e a raiva ao ver os seus camaradas tombar, mortos ou feridos a seu lado. Não lhe bastou ter fintado tantas vezes a morte, nos trezentos e setenta e dois encontros (ataques e emboscadas) com o inimigo, que um se camarada foi contabilizando, nos cerca de oito meses que viveu em Gandembel, sem contabilizar tantos outros que vivenciou nas picadas de Buba.

Uns anos mais tarde, o seu filho único, quando cumpria o serviço militar, morreu num estúpido acidente. Regressava à sua Unidade vindo de Santa Margarida onde estivera em treino operacional. Um acidente na estrada, entre duas viaturas de civis, fê-lo saltar da viatura para acorrer às vítimas na sua missão de enfermeiro. Nesse instante uma terceira viatura, ceifa-lhe a vida.

A família Almeida ficou destroçada. Ele nunca mais voltou a ser o mesmo Almeida, mas a sua grande fé ia lhe dando forças. Tentava abafar as suas mágoas rezando e cantando. Na última vez que esteve na Tabanca de Matosinhos, trouxe a Biblia para nos ler um Salmo e a sua voz para nos deliciar mais uma vez com a sua canção preferida – O Hino de Gandembel e outras canções do seu reportório de outros tempos, que acompanhamos com prazer.

Agora, passa o dia sentado num velho sofá a ver televisão, absorto da realidade que o rodeia.

O Monstro Gandembel que um governador mandou construir, enterrando lá centenas de contos, e outro governador, no mesmo ano, mandou abandonar, deixando lá cerca de cinquenta jovens vidas e enviando outras tantas para Lisboa, quantos delas estropiadas para o resto da vida. Esse terrível monstro continua a fazer vítimas.

Neste dia de quinta feira, a noite chegou mais cedo para mim.

O Almeida a cantar na nossa Tabanca de Matosinhos


2. Comentário de CV

Hoje o nosso camarada José Teixeira não veio até nós com as melhores notícias da Tabanca de Matosinhos. Infelizmente a vida também é composta de acontecimentos menos agradáveis, e a falta de saúde do nosso camarada Almeida de Gandembel, é um assunto preocupante, principalmente para os camaradas que mais de perto privam com ele.

Aqui deixamos os nossos votos de rápidas melhoras.
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Vd. último poste da série de 19 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4212: Tabanca de Matosinhos (9): Manga di ronco na grande Tabanca de Matosinhos (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P4280: No 25 de Abril eu estava em... (9): RI 15, Tomar, à espera de ir para a Guiné (Magalhães Ribeiro)

Eduardo Magalhães Ribeiro, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, da CCS/BCAÇ 4612/74, Cumeré, Mansoa e Brá (1974), que recentemente entrou para o grupo de editores deste Blogue.

Nasceu no dia 27 de Março de 1952, no concelho de Matosinhos. Seguiu para a Guiné, em 1974, já depois do 25 de Abril, tendo regressado em 15 de Outubro do mesmo ano, na última viagem, com tropas, do navio Uíge.

Vive e trabalha no Porto (Departamento de Manutenção Mecânica da Produção Hidráulica, EDP). Actualmente é Vice-Presidente da Delegação do Porto da APVG (Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra) e pertence aos Corpos Directivos da AOE (Associação de Operações Especiais) e da LAMMP (Liga dos Amigos do Museu Militar do Porto).

Estandarte e Brasão do BCAÇ 4612/74. Divisa: Dignos e Leais. Ao centro, Estandarte do RI 15 de Tomar. Divisa: Conduta Brava e em Tudo Distinta


1. O Eduardo, desde o fim do mês de Abril, é co-editor do nosso Blogue. O eterno Pira de Mansoa é periquito na idade, na Guiné e no grupo dos editores. Temos que lhe arranjar um poleiro na Tabanca.

A sua colaboração vai ser muito importante, dada a necessidade que tínhamos de mais alguém para nos ajudar a levar a cabo este trabalho diário, muito desgastante.

Se virmos as estatísticas do mês de Abril, verificamos que foram publicados 149 postes, distribuídos do seguinte modo: Luís Graça, 30; Vinhal, 117 e Eduardo 2. Vejam que há praticamente 5 postes publicados por dia, a que corresponde um trabalho de cerca de 4 horas. A juntar a isto há que responder às diversas solicitações nos bastidores da Tabanca.

Pelos motivos expostos, saudamos a chegada do Eduardo ao corpo editorial.
CV


2. Mensagem de E. Magalhães Ribeiro com data de 1 de Maio de 2009:

Boa noite amigos Luís, Vinhal e Briote,

Estive aqui a teclar uma carta que enviei ao meu Amigo e RANGER Raul Moreira da Silva Marques, em 27 ou 28 de Abril de 1974.

O Marques estava em Mansoa e pertencia à CCS do BCaç 4612/72.

Sempre vivemos os dois aqui no Porto, éramos da mesma Especialidade e o meu destino era substituí-lo, pertencendo eu à CCS do BCaç 4612/74.

Escusado será dizer que somos amicíssimos.

Infelizmente, o Marques está a recuperar, segundo me disse, relativamente bem, de vários problemas de saúde.

Espero que, com a colaboração da sua filha Elisa, o consiga convencer, mais dia menos dia, a tornar-se mais um camarada a juntar-se a nós no blogue.

Já temos um camarada bloguista - o Jorge Canhão -, do mesmo batalhão dele, mas que era da 3.ª Cia.

Penso que este texto é oportuno, dados os 35 anos que decorreram sobre a Revolução do dia 25 de Abril de 1974.

Já o disse, mais que uma vez e repito, que dado estar mobilizado para a Guiné desde no início do ano de 1974, e pelo modo como evoluia a guerra, achei o 25A74 um milagre.

Repara que eu já estva casado desde 05MAR72 e, entretanto fui pai de um puto maravilhoso em 04NOV73.

Muito resumidamente, penso que houve pelo menos duas hipóteses dos governos de Salazar e Ceatano terem resolvido pacificamente os problemas ultramarinos, evitando a mencionada revolução:

1 - deviam ter dado emprego aos africanos que acabavam os seus cursos superiores, pois foi uma maioria deles que, revoltada pelo ostracismo e rejeição a que foram votados, incentivou e deu vida aos movimentos de libertação;

2 - podiam ter pensado, já depois de iniciadas as hostilidades, na possibilidade de autodeterminação aos povos envolvidos através de eleições livres;

Isto é o que eu penso, pois com o avançar dos anos na guerra, como todos bem sabemos, até no armamento estávamos a ficar cada vez mais inferiorizados, com muito material desadequado e, ou obsoleto, muito dele proveniente da 2.ª Guerra Mundial, enquanto o inimigo ia recebendo armas cada vez mais modernas e eficazes (mísseis incluídos).

Uma das bocas que eu ouvi não raras vezes, em fins de 1973 e inícios de 1974, era que o nosso pessoal andava na Guiné a combater mísseis com G3.

Despeço-me com um abraço Amigo para vós do MR.

Fotos de contraste, para dar uma ideia dos efeitos físicos que a Guiné, me provocou. Uma antes da partida para a Guiné e outra já no regresso, na sala de estar, a bordo do Uíge.


Tomar, 27 de Abril de 1974

Amigo RANGER Marques,

Eu sei que a informação que vos chega aí a Mansoa sobre o que aqui se passa no Continente é praticamente nula e, ou, muito deturpada, por isso, vou-te descrever, resumidamente, os últimos acontecimentos.

GOLPE DE ANTEONTEM - 25 de ABRIL

No passado dia 25 de madrugada, decorreu aqui no Continente um golpe de Estado. Uma coluna militar, com carros blindados, da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia, acompanhado por 240 homens (a maioria recrutas com pouca experiência militar), avançou para Lisboa a fim de destituir o Primeiro Ministro - Marcelo Caetano -, que, na altura, se encontrava no Quartel do Carmo.

Assim se iniciou uma marcha revoltosa, que diziam envolver muita gente, mas o que é certo, é que quando a dita coluna chegou ao Terreiro do Paço, cerca das 05h30 da manhã, não estava lá mais ninguém.

Pelas últimas notícias, esta coluna, tinha como missão, ocupar ao Terreiro do Paço, controlar o Banco de Portugal, a Rádio Marconi e os acessos à Praça do Município, enquanto outros militares revoltosos tinham a seu cargo apoderar-se de outros pontos vitais em Lisboa como, a TV, rádios, PIDE, polícia, aeroporto, ministérios, etc.

É claro que este golpe foi previamente preparado, ao pormenor durante vários meses, entre um grupo de militares, muitos deles capitães, afirmando-se descontentes quanto ao modo como o país estava a ser governado e, fundamentalmente, em relação ao problema da Guerra que travamos em África.

Mas, muitos outros militares ignorantes deste movimento, continuavam, como é lógico, a serem fiéis à política adoptada, quer pelo falecido Salazar, quer posteriormente, quase na íntegra, seguida por Marcelo Caetano (MC).

Creio que o MC, não sabia de nada (ou muito pouco) sobre esta marcha sobre Lisboa.

Mais penso que ele, ainda escaldado pelos acontecimentos do 16 de Março, deste ano, com o pessoal do RI5, trazia alguns dos seus intervenientes sob a alçada da PIDE, e devia ter alguma informação, por muito dispersa e vaga que fosse, sobre alguns zuns zuns, que sempre escapam nos preparativos como o desta revolta.

Por isso, o MC devia estar a contar, mais dia menos dia, com uma nova tentativa de revolta militar.

Mas é fácil deduzir que ele pensava estar seguro e que, quando tal acontecesse sobre a sua pessoa e tudo o que o envolvia, e ele representava em Portugal, contaria nas horas decisivas com o socorro/combate suficiente, de muita gente que lhe era fiel, afim de dominar os seus protagonistas.

Foi isso mesmo que aconteceu, quando se apercebeu que estava em movimento mais uma revolta, MC apelou àqueles que lhe haviam jurado estarem do seu lado ou, pelo menos, ao lado da Pátria e a bem de Portugal.

Assim, correspondendo aos seus apelos, poucas horas depois o Brigadeiro Junqueira Reis acorreu ao Terreiro do Paço com um coluna, constituída por vários carros blindados, do Regimento de Cavalaria 7, cuja base é na Calçada da Ajuda. Nota bem que estes carros de combate eram de grande calibre e poder de fogo.

A certa altura deu-se o confronto, que eu imagino como sendo um duelo do tipo dos filmes americanos, tendo de um lado o Cap Salgueiro Maia e o seu pessoal, e do outro o Brigadeiro Junqueira Reis com os seu blindados e soldados.

Foram momentos de muita tensão e angústia, mas cruciais ao bom sucesso do golpe.

Apesar de outros momentos dramáticos que então se viveram, esta foi a resistência mais séria e perigosa colocada aos revoltosos, que podia ter redundado num banho de sangue.

Às tantas o brigadeiro ordenou seca e rispidamente a um dos seus homens que fizesse fogo sobre o Capitão Salgueiro Maia.

UM MILAGRE DEU-SE ENTÃO!

Foi o Alferes Miliciano Fernando Sottomayor, do RC7, que na Ribeira das Naus, desobedeceu, inequivocamente, às ordens do Brigadeiro Junqueira dos Reis para disparar sobre Salgueiro Maia e as suas tropas.

O Brigadeiro furioso, deu ordem de prisão ao Sottomayor e ordenou aos soldados que o rodeavam que disparassem, tendo-se também este recusado a disparar.

Então o Brigadeiro Junqueira dos Reis disparou dois tiros para o ar, tentando com esta atitude que alguém lhe seguisse o gesto e começasse a disparar.

Vendo que ninguém reagia às suas palavras e acções, abandonou o local e dirigiu-se para a rua do Arsenal.

ASSIM DESTA FORMA SE EVITOU O QUE PODERIA TER REDUNDADO UM HORRÍVEL E TRÁGICO BANHO DE SANGUE DE CONSEQUÊNCIAS IMPREVISÍVEIS!

Felizmente as coisas correram bem a esta malta que se envolveu nesta arriscada e imprevisível aventura.

2 HERÓIS

Digam o que disserem, escrevam o que escreverem, sobre a revolução do 25 de Abril de 1974, jamais mudarei de ideias sobre os dois Homens destemidos, que fizeram vingar a revolução.

Um, o Capitão Salgueiro Maia, porque deu corajosa e frontalmente, a cara e o peito desarmado como poucos homens o fariam neste mundo, e o Alferes Miliciano Fernando Sottomayor porque, como foi dito, desobedecendo a uma ordem superior, não disparou o tiro que podia ter originado o caos no país inteiro.

DEPOIS DISTO APARECERAM MUITOS HERÓIS

Posteriormente, ao descobrirem-se mais a fundo outros detalhes programados a cumprir entre o pessoal envolvido na revolução, soube-se que outros militares, que deviam estar em vários pontos cruciais antes da coluna do Capitão Salgueiro Maia chegaram muito depois, cumprindo as acções que tinham assumido pela sua parte, como prender os Ministros da Defesa, do Exército e da Informação e Turismo que, entretanto, ao saberem do movimento em curso, tiveram tempo para fugirem, pelas narrações que me chegaram, por um buraco que conseguiram abrir na parede de um pátio que, fazia paredes meias com o Ministério da Marinha.

Depois já se sabe o que aconteceu, por demais noticiado, surgiram e continuam a surgir muitos heróis a dizer que: - Eu estive lá, eu fiz, eu aconteci... etc. etc.

Entre as objectivas e simples declarações de um homem sério, justo e humano que considero ser Salgueiro Maia, uma jamais esquecerei, que se referia à memória dos seus homens (na flor da idade) a morrerem em combate no tarrafo, nas bolanhas e sob as minas na guerra da Guiné

NÓS EM TOMAR NO RI 15

Agora reina uma grande confusão e bandalheira, nós aqui no RI 15 (em Tomar), estivemos em estado de grande preocupação e angústia, porque durante os dias 25 e 26 a informação que nos chegava era escassa, confusa e até contraditória.

Durante a dia 25 recebemos ordem para nos armarmos e municiarmos todos e vimos as viaturas a saírem das garagens. Estava tudo preparado só não sabíamos para quê!

Chegavam notícias de Unidades que aderiam aos golpistas e outras não.

Aqui devem estar mais de 600 homens em armas, pessoal que já cumpriu a recruta e que neste momento está com 4 semanas de instrução na Especialidade de Atiradores de Infantaria.

Começou a constar (boato?), que o nosso comandante, se mantinha fiel ao Regime e não aderia ao entretanto designado MFA (Movimento das Forças Armadas) e, caso houvesse resistência aos revoltosos ele avançaria connosco para Lisboa em socorro do MC.

Ainda não consegui saber se isto foi verdade ou boato.

No dia 26, estava tudo resolvido, a bem, e afinal acabou por imperar o bom senso e, pelo menos, excluindo algumas saídas de secções (12 a 13 homens), para prender os PIDES, e efectuar algum controle em pontos vitais dos acessos a Tomar, nada de anormal me constou.

Até breve se Deus quiser, espero que isso por aí em Mansoa vá correndo pelo melhor, os 18 meses que aí tens estão quase a terminar e facilmente presumo, que estás ansioso que nós aí cheguemos, para poderes regressar a casa.

Vamos a ver no que isto dá, já que muita malta já diz que não quer ir para a Guiné, que não deve ir nem mais um soldado para o Ultramar, etc.

Espero que não se instale a anarquia e a bandalheira total.

Um grande abraço amigo do
Magalhães

Apesar de a Nação se encontrar em estado de alerta, ainda houve quem arranjasse um passaporte de dois dias.


3. Comentário de CV:

Ainda não tínhamos um testemunho de alguém que estando na Metrópole, já mobilizado, à espera de embarque para a Guiné, tivesse assistido ao 25 de Abril. O Eduardo deixa-nos aqui as suas impressões em cima do acontecimento, numa carta que enviou ao seu (nosso) camarada Marques, este sim em Mansoa, à espera de ser rendido.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 30 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4106: No 25 de Abril eu estava em... (6): Pirada, a ferro e fogo (Joaquim Vicente Silva, 3ª CCAV / BCAV 8323)

Guiné 63/74 - P4279: Blogoterapia (101): Obrigado, Manuel Maia, emocionaste-me até às lágrimas (José Brás)

1. Mensagem do nosso camarada José Brás, que foi Fur Mil da CCAÇ 1622 (Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68), e é autor do romance Vindimas no Capim, Prémio de Revelação de Ficção de 1986, da Associação Portuguesa de Escritores e do Instituto Português do Livro e da Leitura):

Caríssimos

Carlos, Luís e Briote


Não tem nada a ver com a guerra, isto que quero dizer-vos, agora, de lágrimas a rebentar por sob as pálpebras quando leio de voz alta, só e em frente ao monitor, a escrita do Manuel Maia (*).

De voz alta porque quero emocionar-me até ao limite, na oportunidade de não ter quem me chame de maluco.

De lágrimas a rebentar porque, felizmente, continuo a poder emocionar-me perante os sinais do humano quando chegam altos como este rio de palavras engenhosas, talentosas e suadas.

Que maravilha!

Cercados por centrais globais de (des)informação e por um real saído dos noticiários das televisões, o dia-a-dia carrega-nos de pesadas preocupações acerca do futuro do mundo e da humanidade.

Talvez que, no fundo, não seja mais do que a velhíssima tendência para o pessimismo que nos atinge depois de anos de lutas e esperanças.

Gente como o Manuel Maia são a garantia de que não passa disso e de que a comoção e a imagem das mãos dadas por cima de incertezas continuarão a marcar o homem do futuro na sua dualidade divina e na sua multiplicidade de andarilho.

Afinal, já nem sei se foi de guerra ou não que quis falar, porque ninguém fala de guerra senão para falar de paz.

Um abraço (normal) para vocês e outro de agradecimento ao Manuel Maia.

José Brás

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 3 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4278: Blogpoesia (44): A história de Portugal em sextilhas (II Parte) (Manuel Maia)