sábado, 11 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4670: Álbum de memórias de Bafatá, 1968/70 (1): Bafatá, álbum de memórias (Regina Gouveia)


1. No decorrer do IV Encontro Nacional do nosso blogue, e m 20 de Junho passado, na Quinta do Paul, Ortigosa, Luís Graça convidou o novo membro desta nossa Tabanca Grande, Regina Gouveia, esposa do nosso Camarada Fernando Gouveia, que cumpriu a sua comissão em Bafatá, 1968/70, como Alf Mil Pel Rec Inf, Comando de Agrupamento 2957, Bafatá, que na altura era comandado pelo Cor Hélio Felgas (já falecido), a escrever, para o nosso blogue, histórias desse tempo... aqui está a primeira:


Foi o que a Regina fez e aqui está mais um excelente e bem contada história:


Caro Luís Graça,

As partidas que a Internet nos prega…

Fiquei perfeitamente estupefacta ao ver o meu currículo exposto no Blog. Nele não consta, nem podia constar, qualquer actividade minha no âmbito da fotografia. Esse pelouro é do Fernando…

Em tempos escrevi um conto baseado nas minhas vivências na Guiné. Agora, fazendo o percurso contrário, escrevi um texto, depurando do conto apenas as referidas vivências. É o que agora te envio.

Um abraço.

A Regina, na tabanca da Rocha em Bafatá onde morámos - 1969

Bafatá: álbum de memórias

Agosto de 1969. Sobrevoo o Atlântico com destino a Bissau. O meu baptismo de voo. O avião fez escala no Sal e ainda tenho a sensação da extrema humidade que me envolveu quando saí do avião.

Agora, por sobre as nuvens, vejo o sol nascer. Gostaria de ter “engenho e arte” para descrever quão fantástico é este espectáculo.

Cá estou eu, de novo perdida nas minhas longínquas recordações.

É certo que recordo muitas vezes as minhas duas idas à Guiné. Por vezes, basta-me olhar para o pano, em tons de azul, que tenho na parede ao cimo das escadas que levam ao 2º andar, ou para as fotos no álbum, ou ainda para a bilha de Teixeira Pinto ou para o cesto de Contubuel. Mas desta vez as lembranças invadiram-me com uma intensidade inusitada.

Bilha de Teixeira Pinto

Cesto de Contuboel com a árvore de Natal de 1969 na nossa casa em Bafatá


O avião acaba de aterrar. Já vejo o Fernando, na sua farda de alferes, alferes miliciano por força da guerra cujo espectro paira, como espada de Demóstenes, sobre a cabeça de todos os jovens varões.

Pensou ainda em fugir, como tantos outros fizeram, mas foi adiando a decisão e acabou por se ver embarcado no navio Ana Mafalda com destino à Guiné. Felizmente foi mobilizado para Bafatá, onde praticamente não havia guerra, embora o obus de Piche, que se ouvia ribombar todos os dias, se encarregasse de lembrar quão sem sentido era ali a palavra paz.

E parece-me ouvir o obus de Piche ao pôr do sol e, simultaneamente, recordo-me da indescritível beleza do pôr do sol naquelas paragens.

Olho, estupefacta, o chão do aeroporto. Nacarado pelas inúmeras asas de insectos efémeros cuja vida cessou durante a noite.

Ouço, junto de mim, uma voz arrastada: “Parte um peso”. E vejo a meu lado, envolvido num pano de tom cinza, um velho de rosto muito enrugado mas simultaneamente muito belo, que me estende a mão. O Fernando explica-me o sentido da frase. Em vez de me pedir para lhe dar uma moeda de um peso, pede-me para a repartir com ele. Bonita expressão.

No Ramadão junto à Mesquita

A beleza do rosto deste velho fui encontrá-la em outros rostos que revejo, folheando o álbum de fotografias. Vejo também jovens e crianças, mulheres envoltas em panos coloridos, transportando os filhos nas costas, homens deitados no chão, voltados para Meca, nas horas de oração. Fotografias belíssimas em que o Fernando, amante de fotografia, conseguiu captar como que a beleza visível e a invisível, o explícito e o implícito.

Viajo agora de Bissau para Bafatá num Dakota velhíssimo tendo vários companheiros de viagem, alguns um pouco estranhos como galináceos e cabritos.

Continuo a folhear o álbum. Um conjunto de mulheres jovens que, envoltas em panos dum colorido exuberante transportam, sobre a cabeça, recipientes com água.

Estou na tabanca da Ponte Nova. Vim ver a arte de colorir os panos. Ali está um belíssimo em tons de azul. É mesmo aquele que eu quero. Já tem destino, a parede ao fundo das escadas que levam ao 2º andar.

Pano tingido na tabanca da Ponte Nova em Bafatá

E de novo as imagens no álbum. Imagens belíssimas do pôr do sol. E eis que surgem a Angelina, o Carlos, o Domingos e o Adrião.

O Dakota aterra na pista onde se encontram várias pessoas. Desperta-me a atenção o olhar curioso de algumas crianças de sorriso brilhante. Tento conversar com elas mas recuam timidamente e acabam por fugir embora, furtivamente, se voltem para olhar.

Chego a casa. Simples mas acolhedora. Um pequeno jardim à frente, com vários mangueiros. Três degraus e eis uma varanda coberta, a todo o correr da fachada, e uma porta de acesso ao interior.

A nossa casa, mesmo em frente ao café do Senhor Teófilo em Bafatá

Há anos, durante a campanha eleitoral que levou Kumba Yalá à presidência, vi a casa numa reportagem da TV. Os mangueiros frondosos, as paredes já desbotadas e a varanda, essa apinhada de gente.

Chego à varanda, vejo algumas crianças a espreitar do outro lado da rua. Parecem-me as mesmas que ontem estavam na pista quando o Dakota aterrou. De novo tento entabular uma conversa com elas, mas a tentativa é infrutífera e acabam por se afastar, olhando furtivamente para trás.

Como justificar este comportamento? Apenas timidez ou sentem que de certa forma represento o colonizador indesejável, o militar que vem combater o libertador? Que pensarão estas crianças da guerra?

A fotografia à porta do café do Infali, a Transmontana.

Na esplanada do Transmontana com o empregado Enfali em Bafatá

Nha na bai tomá café?

Mas isso foi algum tempo depois, quando a timidez deu lugar à confiança que lhes permitia saudar-me e dar-me conta dos seus passos, ao passarem na rua, muitas vezes a caminho da fonte.

Nó na bai fonti.

Outras vezes, se nada havia para fazer, abriam o portão, entravam no quintal, subiam as escadas de acesso à varanda, sentavam-se no chão e esperavam que a porta se abrisse e eu aparecesse umas vezes de mãos vazias, outras com um pequeno agrado como uma guloseima ou um lápis.

Nó na bai papia com bó.

Quando lhes pedi para me ensinarem algumas palavras e frases em crioulo olharam-me sorrindo com um ar desconfiado, um pouco malicioso. Mas, pouco a pouco, começaram a levar a sério a sua tarefa. E assim fui aprendendo alguma fonologia, possivelmente um pouco adulterada pela minha interpretação dos seus sons. Se as crianças soubessem escrever teria sido mais fácil pois a grafia ajudaria a melhor compreender a fonética.

De tal modo se empenhavam na sua tarefa que chegavam a dizer-me que não me entendiam para me forçarem a tentar falar a sua língua.

Mi cá ôbi português.

Sei que tenho algures uma cassete com gravações das suas conversas. Mas onde estará ela, passados tantos anos?

Bô na disquice tudo…

Ouço a vozita na gravação. Um pouco agastado porque já não me recordava de algumas palavras que tinha aprendido na véspera. Qual deles seria? A voz da Angelina é fácil de distinguir, mas as outras… Já passaram tantos anos…No entanto, tenho quase a certeza que esta é a voz do Carlos.

Tão pequeninos ainda. As suas idades rondavam os seis, sete anos.

De novo no avião, mas de regresso à metrópole. Acabaram as minhas férias. Comigo viajam o pano destinado à parede ao cimo das escadas que levam ao 2º andar, a bilha de Teixeira Pinto e o cesto de Contubuel , ofertas do Fernando.

O sentimento que agora me envolve é o oposto do que me envolvia na viagem que há dois meses fiz em sentido contrário. Parto com tristeza, já cheia de saudades. Do Fernando, obviamente, mas também da terra, das suas cores, dos seus cheiros, dos seus sabores e das crianças. Fazem-me já falta o seu riso cristalino, a algaraviada das suas vozes, a alegria da sua infância.

Foram despedir-se de mim à pista. Já no ar, ainda via os seus bracitos oscilando, dizendo adeus. Mas estavam com um ar triste, embora lhes dissesse que voltaria no Natal.

Cá jubi, cá obi, cá miste , na jubi, na obi, na miste.

No tempo que mediou entre a partida e o regresso, embrenhada no trabalho, não tive tempo para pensar nas lições de crioulo que esperava retomar quando chegasse.

Hoje já pouco recordo do crioulo que aprendi. Ao ouvir a cassete já não entendo o significado de muitas frases. Mas, curiosamente, surgiram-me com toda a nitidez os rostitos das crianças. É terrível este sentido inexorável do tempo, do mesmo modo que é fantástica esta capacidade selectiva da memória que nos permite esquecer tantas coisas e simultaneamente recordar tantas outras que apesar de tão distantes no tempo, nos surgem como se estivessem a ocorrer precisamente no momento.

O Dakota prepara-se de novo para aterrar na pista de Bafatá. As crianças sabem da minha chegada, pois quase diariamente inquiriam o Fernando.

Desço do avião e correm para mim numa alegria contagiante. Não consigo evitar que duas lágrimas teimosas me escorram pelo rosto.

Vejo que as crianças ficam um pouco confusas ao ver-me chorar. Abraço-me então a cada uma delas e digo-lhes no meu crioulo tão deficiente: Mi gosta Angelina, mi gosta Adrião, mi gosta Carlos, mi gosta Domingos.

Dirijo-me para casa e as crianças acompanham-me. Retiro do saco de viagem umas lembranças que trouxe: uns lápis, umas borrachas, uns apara-lápis, uns cadernos e uns chocolates. Reflicto sobre a pobreza das minhas lembranças quando as comparo com a dádiva do seu riso cristalino, dum valor infinitamente superior.

Recordo a expressão “parte um peso” que tantas vezes ouvi, após aquela primeira vez, ao desembarcar em Bissau. Expressão bonita…

Que “parti” eu com eles? Afectos, por certo, mas recebi muito mais que aquilo que dei. Jamais eu poderei esquecer aquelas crianças.

A cassete chegou ao fim. Fecho o álbum e a imagem das crianças apresenta-se-me com toda a nitidez. Parece-me ouvir as suas vozes e o seu riso de cristal. Que será feito delas hoje? Por certo nenhuma se lembrará de mim. Foram efémeras as lembranças que lhes dei. Eu, pelo contrário, recordo-as com a nitidez nos seus seis, sete anos.

Que será feito delas? Serão por certo pais e até avós, dado que geralmente casam muito novos. Ainda viverão em Bafatá?

Ainda viverão? E quando me faço esta pergunta sinto um enorme aperto no peito.

Fotos e legendas: Regina Gouveia (2009). Direitos reservados.

Regina Gouveia
____________
Notas de M.R.:

(*) Vd. último poste da autora em:

Guiné 63/74 - P4669: Tabanca Grande (161): Manuel Tavares Oliveira, um sobrevivente de Gandembel / Balana, ex-1º Cabo da CCAÇ 2317 (1968/1969)



1. Manuel Fernando Tavares de Oliveira foi 1º Cabo, do 1º Pelotão da CCAÇ 2317/BCAÇ 2835, em Gandembel e Ponte Balana (1968/69), e é mais um Camarada-de-armas que se apresenta à nossa Tertúlia, passando a integrar o nosso blogue (*). O Oliveira havia-nos já enviado, em 6 de Julho de 2009, uma curta mensagem acompanhada de oito raras fotos de Gandembel, que se encontram publicadas no P4647.


A certo momento na sua mensagem dizia o Manuel Oliveira:
“Já reparei que um dos Tertulianos é o Alferes Idálio Reis, também da CCAÇ 2317, a quem aproveito esta oportunidade para enviar aquele abraço, cujo efeito sentimental só o pessoal que esteve na Guiné conhece.”

Ao que o ex-Alferes Idálio Reis já respondeu, afirmativamente, através do seguinte e-mail:

"Meu caro Oliveira:

"Tenho estado ausente, e só há pouco fui ver o correio electrónico. Uma boa nova foi saber do teu paradeiro. Em boa hora, a Tabanca Grande acaba de poder encontrar-te.

"A tua Companhia, já tinha perdido as esperanças de te reencontrar, pois a tua ausência aos nossos convívios, assim o indiciava. Há uns quantos que estavam nas tuas condições.

"Da tua Lamego de origem, não havia qualquer indicação.

"Mas agora com o conhecimento dos nossos endereços, teremos possibilidade de te pôr ao corrente de alguns aspectos que mais te interessem.

"Diz-me da receptividade deste mail, e cá espero notícias tuas.

Um grande abraço do Idálio Reis,
que efectivamente conheceste enquanto Alferes Reis"
Caso alguém queira contactar o Manuel Tavares Olibveira, pode fazê-lo para:
maneltoliveira@hotmail.com
ou, Ubr. Ortigosa Bloco 10 - R/C Esq.
5100 - 183 LAMEGO,
Telefone 254614325
Telemóvel 966 174 331
____________
Nota de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4668: Convívios (153): Encontro / Almoço / Convívio da CART 6250/72 (Mampatá 1972/74) (António Carvalho)



1. Mensagem de António Carvalho, ex-Fur Mil Enf da CART 6250/72, Mampatá, 1972/74:

Camaradas,

Tal como estava previsto, concretizou-se no dia 4 de Julho, em minha casa, o Convívio Anual da minha CART 6250 – MAMPATÁ (1972/1974), que foi superior e competentemente comandada pelo Capitão Luís Marcelino, que acompanhou animada e embevecidamente todos os “trabalhos” neste convívio dos "seus" homens, para que nada falhasse.

Foi uma festa em cheio com muitos Amigos, Familiares e vários Convidados, que nos deram a alegria da sua participação, entre eles um bom punhado de Tertulianos, dos quais me lembro: o Vasco da Gama, Casimiro Carvalho, Pimentel, Rocha, Chico Allen, Ribeiro Agostinho, Magalhães Ribeiro e um convidado especial - o Dr. Fernando Giesteira Gonçalves (*) e esposa Dª Joaquina Silva, que foi nosso Camarada-de-armas na Guiné e que, através do Instituto Piaget, tem desenvolvido excelente trabalho naquele território africano e que, segundo nos contou, tem já na forja um projecto na área da saúde, que passa pela sua fixação, por alguns anos, na zona de Bissau.



















Duas das "vedetas" do convívio eram guineenses, a Dayane e a Janice, sendo que, a primeira, está temporariamente em Portugal onde foi sujeita a uma intervenção cirúrgica (responsabilidade do Dr. Giesteira). Brincalhonas, lindas, divertidas, irrequietas, como todas as crianças da sua idade, imprimiram maior vivacidade e alegria, à já de si alegríssima confraternização.

Todos eram unânimes em que este convívio da companhia, foi diferente para melhor até porque, logo à partida nas palavras de muitos deles, não tiveram um restaurante a cobrar-lhes uns indecentes 30/35 Euros (onde, salvo raras excepções, pois felizmente também as há, se servem refeições fracas e mal preparadas).















Aspecto geral do pessoal espalhado nas sombras pelo jardim, e à direita, Francisco Camilo com o seu filho a quem baptizou com o memso nome e sua esposa Filomena.

Em bom rigor, os convívios da C.A.R.T.6250 sempre foram organizados desta forma. Julgo poder dizer que somos os únicos, em Portugal, com este tipo de convívio. No próprio dia da festa há (tem havido) sempre um voluntário, que se anuncia como organizador do encontro, para o ano seguinte, e se encarrega, logo ali, de marcar o dia.

E temo-nos dado bem com este sistema, pois assim ninguém protesta, nem pelo preço, nem pela qualidade ou variedade da comida.

Assim, a cave e o jardim da minha casa nesta linda freguesia de Medas - Concelho de Gondomar -, permitiram que o abastado almoço volante, onde além de diversos grelhados sardinha, fêveras e entrecosto, os convivas intercambiaram os conteúdos dos seus faustos farnéis, com todo o tipo de alimentação tradicional portuguesa, onde não faltou o delicioso pão de Paços de Ferreira, o bom vinho alentejano, presunto regional, queijos de diversas origens, o leitão da velha Bairrada, o coelho do mato, o galo estufado e muitos outros acepipes e petiscos de diversas localidades nacionais.















A Tabanca esteve presente em peso, à esquerda vemos: o Xico Allen, o ex-Capitão Luís Marcelino, o ex-Capitão Vasco da Gama, o RANGER Pimentel e o Dr. Giesteira, e à direita, o Maia Simões mostra as suas fotos ao Andias.

Mais que as palavras, as fotos dizem da alegria que vivemos em fraterna harmonia, no decorrer da tarde de sábado, onde não faltaram ainda a boa música popular animada pela nossa parelha - Camaradas Andias e Tony, e as brincadeiras e paródias do buliçoso e divertido Camarada Alfredo.
















À esquerda: o ex-Capitão Vasco da Gama, Casimiro Cravalho, Eduardo Alves, Ribeiro Agostinho - À direita o António Carvalho, ex-Capitão Vasco da Gama, o Xico Allen e o Ribeiro Agostinho.

Para o próximo ano a confraternização será em Paços de Ferreira, em casa do Alfredo Silva.

Pela parte que me toca resta-me agradecer as presenças dos militares mampataenses (51) e de todos os Camaradas, Familiares e Amigos que se nos associaram.

Foi um dia maravilhoso e inesquecível que espero se repita durante muitos anos.

Um grande abraço,
António Carvalho

Fotos: © Magalhães Ribeiro (2009). Direitos reservados.
____________
Notas de M.R.:

(*) O Dr. Giesteira, que ainda não é nosso Camarada Tertuliano, contou-me uma história que já está narrada pelo Álvaro Basto, no Poste 184, do Blogue da Tabanca Pequena de Matosinhos e devidamente reproduzida neste blogue no Poste - P4653.

Reiterando o convite que já lhe foi comunicado pelo Basto, aguardo uma oportunidade, se ele a isso nos dignar em dia próximo, para lhe solicitar ceder-nos uma entrevista para o blogue, sobre a excelente e profícua mas quase desconhecida obra, desenvolvida pelo Instituto Piaget em terras da Guiné.

(**) Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4667: Tabanca Grande (160): Joaquim Peixoto, ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 3414 (Bafatá e Sare Bacar, 1971/73)

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Peixoto (*), ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 3414, Bafatá e Sare Bacar, 1971/73, com data de 10 de Julho de 2009:

Caro amigo e Camarada Carlos Vinhal:
Em primeiro lugar quero pedir mil desculpas por estar a ser um clantestino.
Tenho imenso gosto e prazer em ser membro da Tertúlia.
Embora não queira fugir à responsabilidade de não ter enviado tudo o que me era pedido, passo a explicar:

Em 1 de Abril recebi email para enviar dados pessoais, fotos e outras coisas que tais.
No dia seguinte enviei tudo, mas só agora me apercebi que o email não foi recebido por erro no endereço.
Peço desulpa.

Agora faço seguir o meu "curriculum", mas como sou periquito em informática, não sei se vai nos moldes que pediste.

Despeço-me, esperando, a partir de agora, ser membro do maior clube do Mundo.

Um abraço do camarada
Peixoto

OBS:-Em breve, enviarei um artigo para ser publicado

Dados pessoais:

Nome - Joaquim Carlos Rocha Peixoto
Posto militar - Furriel Miliciano
Especialidade - Atirador de Infantaria com o curso de Minas e Armadilhas
Unidade - CCAÇ 3414

As principais localidades onde estive: Bafatá e Sare Bacar

Morada:
PENAFIEL

Ainda a estou a exercer como Professor do 1.º Ciclo


O nosso camarada Joaquim Peixoto deu-nos o prazer da sua presença, acompanhado de sua esposa Margarida, no nosso IV Encontro em Ortigosa, como documenta a foto.


2. Comentário de CV:

Caro Joaquim Peixoto.
Obrigado por teres respondido tão prontamente.
As tuas amáveis palavras enviadas em sucessivas mensagens, em curto espaço de tempo, são para nós um incentivo, e bem estamos a precisar de algum neste momento, para continuarmos nesta espinhosa missão de mantermos o Blogue da Tabanca Grande, vivo e actuante, onde se discutam os assuntos relacionados com a guerra da Guiné de forma correcta, educada e sem violência verbal. O respeito pela diversidade de opinião, cor, opção política, religiosa e outras, é indispensável para uma convivência sã, e própria de verdadeiros camaradas e amigos que queremos ser.

Dizes que queres pertencer ao maior clube do mundo. Não pertencerás, mas uma coisa é certa, somos o maior blogue dedicado à guerra da Guiné. Pelo número de visitas registado na nossa página, tendo nós um registo de cerca de 350 tertulianos, vê-se a quantidade enorme de pessoas nos consultam para os mais diversos fins, entre os quais os didáticos.

Tu poderás ser mais um a narrar factos e a mostrar fotos que ajudem a reconstituir a parte da história em que nós, os ex-combatentes, fomos protagonistas.

Recebe então 352 abraços de boas-vindas.
Um especial deste teu camarada
Carlos Vinhal
__________

Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

22 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1774: A morte do Fernando Ribeiro: eu ia nessa fatídica coluna e era seu amigo (Joaquim Peixoto, CCAÇ 3414)

16 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4039: O Prémio: Sirvam , em nome da Pátria, uma bica quente a estes rapazes!, dizia o Gen Spínola... (Joaquim Peixoto)

21 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4557: IV Encontro Nacional do Nosso Blogue (3): Um dia caloroso, em que fizemos novos amigos (Joaquim e Margarida Peixoto)

9 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4659: Parabéns a você (12): Dia 9 de Julho de 2009 - Joaquim Peixoto, ex-Fur Mil da CCAÇ 3414 (Sare Bacar, Cumeré, Brá, 1971/73)

Vd. último poste da série de 9 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4662: Tabanca Grande (159): António João Sampaio, ex-Alf Mil da CCAÇ 15 e Cap Mil da CCAÇ 4942/72 (Guiné, 1973/74)

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4666: Memorias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/Mai 71) (2): De Viana do Castelo a Bissau


1. Continuação da publicação das memórias de Arsénio Puim, ex-Alf Mil Capelão, CCS/ BART 2917, e que esteve em Bambadinca entre Maio de 1970 e Maio de 1971 (A sua comissão terminou mais cedo, um ano depois de ter chegado a Bambadinca, por decisão do Com-Chefe, ao que se sabe). Vive actualmente em Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, Região Autónoma dos Açores (RAA). Está reformado como enfermeiro do Serviço Regional de Saúde da RAA (*).


  MEMÓRIAS DE UM CAPELÃO II - RECORDANDO... DE VIANA DO CASTELO A BISSAU por Arsénio Puim 


 No dia 2 de Março de 1970, o BART 2917, em que me integrava como alferes-capelão, já deixara a Pesada [, o RASP 2,] em Gaia, e encontrava-se na linda e pequena cidade de Viana do Castelo, para fazer o IAO. 

 Foram dois meses e meio de intenso treino operacional, incluindo um acampamento, em princípios de Março, na serra, para as bandas de Santa Luzia, em que também participei. Um ambiente duro, onde faltava tudo o que pudesse saber a conforto. E, sobretudo, que frio, meu Deus, durante a noite! 

 A despedida oficial do Batalhão ocorreu no dia 6 de Maio [de 1970], com desfile pela cidade e Missa solene da Unidade na bonita igreja renascentista de S. Domingos. À homilia realcei duas ideias principais que a Missa, como acto de culto ao Pai da humanidade e de comunhão da Palavra e do Pão, nos deveria inspirar e consolidar: (i) por um lado, o espírito de comunidade que deveria imperar no Batalhão 2917 ao serviço das terras da Guiné, onde íamos viver; (ii) e, por outro, os valores humanos e cristãos que devem ser apanágio de todos os homens de boa vontade em quaisquer circunstâncias. 

 «Os exércitos, referi, também têm a sua mística altamente humanitária - que não a guerra, porque essa não poderá ser um ideal ou valor em si – mas a defesa do direito de todos, a garantia da liberdade dos povos, a consecução da paz justa». Só a 16 de Maio, à tarde, deixámos Viana do Castelo, a caminho de Lisboa. Deu-se, logo à saída, um percalço: mesmo em cima da ponte, o comboio parou de repente. Acontecera que um elemento do Batalhão ficara atrás e alguém, vendo-o correr na direcção do comboio, puxou a alavanca de emergêrncia. Ao longo do percurso, muitas pessoas juntavam-se à beira do caminho de ferro e despediam-se, acenando carinhosamente. 

 Pelas 12,30 horas de 17 de Maio largámos do Cais da Rocha, [em Lisboa,] no Carvalho Araújo, em direcção à Guiné. Um clima de emoção, à mistura com a alegria ruidosa dos sempre bem dispostos, caracterizou a despedida. Volvidos cinco dias, tendo como único horizonte o mar, o Carvalho Araújo atracou, pelas 22 horas, no porto comercial da ilha de S. Vicente, onde desembarcámos até à uma hora. E, pelas 6 horas da manhã, depois de podermos apreciar a grande e bela baía do Mindelo, continuámos a viagem, agora com mar um pouco mais agitado. 

 Às dez horas do dia 25 de Maio entrámos no Canal do Geba, muito largo e envolto por uma neblina acinzentada que mal nos deixava ver as margens. Quatro horas depois – tanto demorou o percurso da ria - aportámos, finalmente, em Bissau. Pequena cidade, arborizada e agradável, de traça espaçosa e com capacidade de expansão; presença marcantemente negra, falando habitualmente o crioulo; os homens fortes e bem constituídos, trajam mantos longos ou vestem como os europeus; nos hábitos das mulheres, o pano comprido a cingir o corpo e o lenço em touca, de cores vistosas, contrastam com a mini-saia e o penteado trabalhosamente ripado; fácil convívio racial; calor intenso e derrotante, vida pacata: foi assim que eu vi pela primeira vez Bissau, onde permanecemos alguns dias. 

 No dia 27 teve lugar a apresentação e desfile do Batalhão perante o general Spínola. Na ocasião, o Comandante-Chefe e Governador da Guiné desenvolveu um longo discurso, onde traspareciam conceitos dum patriotismo exacerbado e a aceitação de Portugal como povo eleito. Pareceu um homem de mentalidade fechada, incapaz de compreender ideologias diferentes, todas baptizadas de traição. Para os oficiais da Unidade, foi mesmo duro, chegando a dizer que sabia haver entre eles alguns «mal encaminhados» de ideias. Seria uma frase, de fins preventivos, usual nos seus discursos às tropas recém-chegadas? 

O que sei é que ouvi, mais tarde, Spínola dizer as mesmas palavras numa recepção aos capelães militares da Guiné. Definiu, no entanto, perspectivas de acção pelo progresso sócio-económico do povo da Guiné como único meio de ganhar a guerra, que, disse, «nunca se vencerá pelas armas». E acentuou que ou fazemos alguma coisa nesse sentido, assegurando pelas armas um ganho de tempo para o realizar, ou «não temos nada que fazer em África». 

 Hoje, julgo entrever, nestas palavras do General Spínola, sinais da concepção sócio-política ultramarina que viria a culminar com o projecto, muito «sui generis», do «Portugal e o Futuro», vindo a lume em 1974, ainda antes da Revolução dos Cravos. 

 Arsénio Puim 

 __________ 

Guiné 63/74 - P4665: Memória dos lugares (33): A minha visita a Missirá, na passagem de ano de 1970, com o médico Mário Ferreira (Arsénio Puim)

Viseu > 26 de Abril de 200 > Convívio do pessoal da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e unidades adidas > O Jorge Cabral, o segundo a contra da esquerda, "entre um Psiquiatra (Marques Vilar) e um Cardiologista (Mário Ferreira Gonçalves, autor do Romance Tempestade em Bissau)" (**)... Na ponta, do lado direito, o nosso camarada David Guimarães. Acrescenta o Jorge que ambos os médicos "me visitaram em Missirá, quando eu comandava o Pel Caç Nat 63, tendo o Mário, passado lá o Natal de 70, com o Padre Puim"...

Foto: © Jorge Cabral (2008). Direitos reservados

Mensagem do nosso camarada Arsénio Puim, que vive actualmente em Vila Franca do Campo, S. Miguel, Região Autónoma dos Açores, e que foi Alf Mil Capelão, da CCS do BART 2917, Bambadinca, entre Maio de 1970 e Maio de 1971.(***)


A MINHA VISITA A MISSIRÁ
por Arsénio Puim

Li no blogue uma evocação de Jorge Cabral relativa à visita do Capelão Puim ao Destamento de Missirá, na Guiné, em Dezembro de 1970. (****)

Foi realmente em Dezembro, mas no último do mês, e aí passei a noite de fim de ano.

O transporte foi de sintex através do rio Geba, à tardinha [Vd. foto à esquerda, sendo que o camarada que está de pé, e de G3 em punho, não é o capelão Puim, que não tinha arma distribuída, mas o Alf Mil Joaquim Mexia Alves, dois anos depois, em 1972, comandante do Pel Caç Nat 52, destacado em Mato Cão].

A placidez das águas, a arborização das margens, a sinuosidade do trajecto e sobretudo a abundância, a variedade e a beleza das aves – de cores as mais variegadas – fizeram desta uma viagem encantadora.

Da margem ao acampamento, julgo que ainda distavam um ou dois quilómetros, que percorri a pé mais o médico Mário Ferreira, que também visitava Missirá. Numa dada altura, ouvimos um grande tropel dentro do mato. Parámos. Mas logo vimos que era um bando enorme de macacos em deslocação. Ao atravessarem o caminho, olhavam-nos e logo continuavam a correria.

A noite de passagem do ano foi muito alegre, com boa comida e alcoolfarta. Houve discursos e música (admito que também discursei) no acampamento, que – é a impressão que guardo – se caracterizava por quase não haver separação física e humana entre ele e a tabanca e por todo um espírito que me pareceu nada ter a ver com o lema, demasiado redutor, pertencente a um Pelotão antigo, que ainda se podia ler, impresso num bloco de cimento, na parada [, referência provável ao Pel Caç Nat 52, anterior ao comando do Alf Mil Beja Santos - Missirá, 1968/69 - cuja divisa era 'Os Gaviões: Matar ou Morrer' : vd. foto à esquerda].

No primeiro dia do ano tivemos missa no pequeno aquartelamento de Missirá, e voltei a Bambadinca.

Esta é uma das minhas boas recordações da Guiné, graças também ao comandante do Destacamento e grande régulo de Missirá, o ex-alferes Jorge Cabral, que saúdo com amizade.

Arsénio Puim

____________

Notas de L.G.:

(*) Vd poste de 16 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2847: Convívios (57): CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72): Viseu, 26 de Abril (Jorge Cabral)

(**) Vd. poste de 10 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2092: Antologia (61): Tempestade em Bissau (Mário G. Ferreira)

Mário G. Ferreira, Tempestade em Bissau: Ano 1970. Lisboa: Pallium Editora. 2007. 216 pp. Preço 14 €.

O autor foi Alf Mil da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72).

Vd. poste de 15 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1527: Lista de ex-militares da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e unidades adidas (Benjamim Durães)

(***) Vd. poste de 14 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4521: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/ Mai 71) (1): No RAP 2, V.N. Gaia, onde fez mais de 60 funerais

(***) Vd. poset de 3 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 – P4455: Estórias cabralianas (50): Alfero, de Lisboa p'ra mim um Fato de Abade (Jorge Cabral)

Guiné 63/74 - P4664: Blogoterapia (116): Os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são (José Martins)

1. Comentário do José Martins (na foto, o primeiro da direita), a comentário de um leitor do nosso blogue, estranhando o espaço que foi dado à manifestação da nossa solidariedade na dor e no luto, por ocasião da morte da Maria da Glória (*):

Não tenho Ordens nem Formação Eclesiástica. No entanto, entendo o que se passa nas Celebrações da Igreja Católica Romana, e quais os objectivos das mesmas.

A nossa presença numa missa de exéquias, sufragando alguém, é, sendo praticantes e crentes, uma manifestação de Fé; se somos católicos, porque nessa fé fomos baptizados mas não a seguimos de perto, é um acto de solidariedade.

Porque é que se encontravam presentes membros da nossa tertúlia? Porque o Mário e a Cristina (**) pisaram a mesma terra que nós – a Guiné – e, como já foi dito e fez escola, “os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são”. A Glória também é nossa filha!

Mas, o acaso proporciona algumas surpresas.

Se a nossa atenção acompanhou as leituras – a do Antigo e do Novo Testamento – e superiormente comentadas pelo Cónego Feytor Pinto, que para quem conheça a sua eloquência, não é estranho, ouviu a “história dos Doze”. Do AT [Antigo Testamento] os 12 filhos de Israel, do NT [Novo Testamento] os 12 Apóstolos, ou seja, o trabalho desenvolvido propõe a esses “eleitos” trazer ao Seu convívio, o maior número de elementos.

Haverá alguma relação, por muito estranha e/ou forçada que pareça, com o aparecimento e crescimento do nosso blogue? Poucos, no princípio apenas um, mas que hoje, efectivamente declarados, somos mais de 350, além dos que se intitulam “apenas leitores”? Fica a pergunta.

Também não quero deixar de referir que, imediatamente antes do final da missa, na altura em que o Ministro abençoa os presentes e deles se despede, subiu ao Ambão uma senhora que, pensava eu, iria alertar os paroquianos para qualquer evento ou facto que fosse motivo de aviso.

Mas não. Com voz suave e firme, apesar embargada pelo momento, soaram palavras de alguém que conheceu a Glória desde sempre e de muito perto, como vim a saber mais tarde, que nos transmitiu “um pedaço de si mesma e com muita saudade” mas que foi uma autêntica oração e elogio à Locas.

José Martins

__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 9 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4660: In Memoriam (26): Fazendo o luto pela Maria da Glória e agradecendo a todos a solidariedade (Mário Beja Santos)

(...) Não vejo qualquer interesse público no exercício desta elegia que me parece excessiva, tanto por não saber de quem se trata como por não entrever qualquer dimensão da defunta (rip). Sede comedidos, senhores. (...)

Comentário de um leitor, anónimo, e posteriormente assumido e assinado por Salvador Nogueira.

(**) O Beja Santos tem uma vastíssima e regular colaboração no nosso blogue. A Cristina Allen, por sua vez, publicou os seguintes postes:


9 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3713: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (1): Just married...

8 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3850: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (2): Quarto, precisa-se, por favor!

19 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3913: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (3): Quanta chuva, Mário ?


24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3933: Os meus 53 dias de brasa em Bissau (Cristina Allen) (4): Cenas, pouco edificantes, de caserna, que não contarei...

24 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3667: As Nossas Mulheres (2): De Bissau a Lisboa, com amor (Cristina Allen)

Guiné 63/74 - P4663: Blogpoesia (53): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (VIII Parte): Da Monarquia Constitucional à República

Portugal > Proclamação da República em 5 de Outubro de 1910 > Alegoria (desconheço o autor)

Fonte: Página oficial da Assembleia República (com a devida vénia...)


Lisboa > Terreiro do Paço (antes do terramoto de 1755) > Azulejos (pormenor) > Casa do Alentejo > 17 de Janeiro de 2009.

Foto: © Luís Graça (2009). Direitos reservados.


VIII parte da História de Portugal em Sextilhas, escritas pelo Manuel Maia, licenciado em História (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74). Texto enviado em 4 de Julho último (*).


Da Monarquia Constitucional à República

221-De Trás-os-Montes sai Barão Casal
a perseguir escocês, anti-liberal,
que as forças miguelistas comandava.
Centenas, lá por Braga, chacinou
chegado à Invicta, entrada não ousou
pois líder da cidade intimidava...


222-À Causa Setembrista há uma adesão
dum velho general que passa então
a comandar, nas Beiras, Patuleias.
Chegado ao Porto, Póvoas, o visado,
ficou deveras entusiasmado
ao ver no povo a força das ideias...


223-Com frota para o sul cedo zarpou,
Sá da Bandeira em Lagos aportou,
p´ra juntar forças lá p´ro Alentejo.
Ocupa a capital do rio Sado,
permanecendo ali, qual sitiado,
à espera dum levante, junto ao Tejo...


224-Ao Porto é enviado um emissário
da quádrupla aliança mandatário
p´ra suspender a fratricida guerra.
Proposta já prevê uma amnistia
que aos revoltosos dava a garantia
de livres eleições na sua terra.


225-Recusa o Conde de Antas tal proposta,
com quatro barcos ruma junto à costa,
disposto a invadir a capital.
Travão disuasor da inglesa esquadra,
em plena Foz na altura fundeada,
levou à rendição do general.


226-De pouco ou nada valem os protestos
da junta, p´la ingerência e manifestos
que o Almirante Maitland debitava.
Os Passos combateram bravamente,
Saldanha, que avançara finalmente,
e em Grijó revolta terminava...


227-Gramido vai trazer a rendição,
dos Patuleias sob condição,
de acordo que jamais será cumprido.
Cabral ao regressar gera sarilho,
num fervilhar de ódio, qual rastilho
pois vencedor humilhará vencido...


228-Matosinhenses meios abastados,
geraram dois irmãos mui bem fadados,
mostrando p´ra política aptidões.
Nas guerras liberais estão envolvidos,
na Patuleia esforços são perdidos,
derrota sofrem manos de Guifões...


229-Brutais espancamentos e prisões,
recriam novamente as condições
p´ro eclodir de outra situação.
De novo o Porto tem papel fulcral
ao sediar revolta inicial,
que a História chama Regeneração.


230-A Invicta reclamou uma vez mais
amor à liberdade e ideais,
na rua clama o fim da repressão.
Saldanha, Regeneradores comanda,
a roda p´ros Históricos desanda,
partiu Cabral, rejubilou Nação...


231-Depois desta Maria Educadora,
o filho Pedro Quinto surge agora
p´ra um curto mas profícuo reinado.
Combóio fez rolar entre os carris,
telégrafo implantou desde a raíz,
consigo esclavagismo é extirpado...


D. Pedro V de Portugal (nome completo: Pedro de Alcântara Maria Fernando Miguel Rafael Gonzaga Xavier João António Leopoldo Victor Francisco de Assis Júlio Amélio de Bragança, Bourbon e Saxe Coburgo Gotha). Nasceu e morreu em Lisboa, no Palácio das Necessidades, a 16 de Setembro de 1837 e a 11 de Novembro de 1861, respectivamente. De cognome, O Esperançoso, O Bem-Amado ou O Muito Amado, era o filho mais velho da Rainha D.Maria II e do príncipe consorte D.Fernando II, de origem alemã.

Reinou de 1853 a 1861. Foi o mais culto dos reis da monarquia constitucional. Foi o 32º monarca portugês. Sucedeu-lhe o irmão D. Luís.

Filomena Mónica escreveu sobre ele uma notável biografia, editada por Círculo de Leitores e Temas e Debates (2007).


Fonte: Wikipédia. Imagem do domínio público.



232-Senhor de uma cultura de invejar,
partiu p´ra Europa, dado a viajar,
na busca do melhor para o seu povo.
Mal começara as lides do reinado
enfrenta as febres, vive atormentado,
morrendo, já viúvo, moço novo...


233-Após D. Pedro vem, rei Popular,
Luis, que o Porto irá remodelar
com obras de que a urbe carecia.
A doca de Leixões, Palácio e pontes
irão rasgar, por certo, horizontes,
passando o sonho além da utopia...


234-Para obstar a crítica bem dura
de compadrio com a escravatura,
na África distante e ignorada,
a lusa Sociedade de Geografia
apoia expedição que se exigia,
em gesta mui difícil e ousada...


235-O fito foi tomar conhecimento,
fortalecer presença no momento,
da imensidão da África que estranham.
Exploradores partiram co´a intenção
de se empenharem numa ligação
terrena, entre oceanos, que a banham.


236-Projecto português intenta unir
Angola a Moçambique e permitir
a ligação das costas via terra.
Com alemães convénio é definido,
mal mapa cor de rosa é conhecido
tão logo surge atrito co´a Inglaterra.


237-Orgulho de Tendais, país profundo,
um luso, Serpa Pinto, homem do mundo,
tal como, em S.Miguel, Ivens é tido.
Soltando seus vagidos em Palmela ,
Capelo engrandeceu terra já bela,
com feito tão brilhante cometido...


238-Zarparam Serpa Pinto, Ivens, Capelo,
catando com minúcia e com desvelo,
do Zaire e do Zambeze a foz ignota.
Mau grado algum prestígio p´ra Nação,
não fôra conseguida a ligação
difícil, face aos p´rigos dessa rota...


Selo de 25 réis, com a efígie de D. Carlos I, 34º Rei de Portugal. Reinou de 1889 a 1908. Foi assassinado com 44 anos, juntamente com o príncipe herdeiro Luís Filipe.

Fonte:
Wikipédia. Desenho e Gravura: Eugéne Mouchon. Print: Tipográfica, na Casa da Moeda. (Private collection Henrique Matos) (com a devida vénia...).


239-A ideia desta ligação por terra
chocava com interesses da Inglaterra,
em cuja zona intenta pôr a pata.
A prepotência gera o Ultimato,
D. Carlos cede a tal desiderato,
começa mal reinado o Diplomata...


240-Pintor sensível, fino aguarelista,
da natureza amante e desportista,
D. Carlos foi rei culto e estudado.
P´lo mar apaixonado há muitos anos,
investigou a fauna aos oceanos
a bordo do Amélia, requintado.


241-Do rei, republicanos fazem réu
com estigma de traição, forte labéu,
no Porto vai estalar revolução.
Janeiro de oitocentos, nove e um
o trinta e um virou dia incomum,
revolta só a custo tem travão.


242-Surgiram n´ultramar rebeliões ,
Mouzinho, em Chaimite, impôs galões,
ao soba Gungunhana, alta figura.
D. Carlos, portugueses quer unidos,
e p´ra pôr termo à guerra dos partidos,
forçou o João Franco e a ditadura.


243-Centúria nova, oitavo ano, fevereiro,
a tarde era do seu dia primeiro,
de volta ao paço está coche real.
Buissa despejando a sua ira,
ao rei e um infante a vida tira,
está perto a monarquia, do final.

244-Reflexo do desfecho violento,
país estremeceu, nesse momento,
face à assassina sanha ocorrida.
Republicanos vão forçar acções,
capazes de criar rebeliões,
que hão-de conduzir a nova vida.

245-Imposta a João Franco a retirada
por incapacidade demonstrada,
foi acto de pressão sobre o infante.
Nem mesmo a Acalmação vai trazer frutos
pois sete vezes surgem substitutos,
mas monarquia está agonizante...

246-El-rei D.Manuel, adolescente,
revolta quer travar mas é impotente,
e o povo extravasa, chega ao rubro.
República terá seu nascimento
um dia após proclamação de evento,
mil novecentos dez, cinco de Outubro.

Manuel Maia

[ Fixação / revisão de texto / selecção de imagens: L.G.]

__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores:

2 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4274: Blogpoesia (43): A história de Portugal em sextilhas (Manuel Maia)

3 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4278: Blogpoesia (44): A história de Portugal em sextilhas (II Parte) (Manuel Maia)

6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4290: Blogpoesia (45): História de Portugal em Sextilhas (Manuel Maia) (III Parte): II Dinastia, até ao reinado de D. João II

15 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4351: Blogpoesia (47): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (IV Parte): II Dinastia (De D.Manuel, O Venturoso, até ao fim)

3 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4456: Blogpoesia (48): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (V Parte): III Dinastia (Filipina)

22 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4561: Blogpoesia (49): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (VI Parte): IV Dinastia (Brigantina) (até 1755)

30 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4610: Blogpoesia (51): História de Portugal em sextilhas (Manuel Maia) (VII Parte): De Pombal (1755) até ao regente D. Miguel (1828)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4662: Tabanca Grande (159): António João Sampaio, ex-Alf Mil da CCAÇ 15 e Cap Mil da CCAÇ 4942/72 (Guiné, 1973/74)

1. Mensagem de António João Sampaio, ex-Alf Mil na CCAÇ 15 e Cap Mil na CCAÇ 4942/72, Barro, 1973/74, com data de 8 de Julho de 2009:

Caro amigo
Desde o passado dia 20

Como vizinho aqui em Leça, abuso ao mandar-lhe algum material. Já mandei ao Graça ainda antes de Monte Real sobre um comentário que está inserto no blog sobre a 4942/72 em Barro, que ainda não vi publicado. Mais tarde em 24 de Junho mandei mais uma página (só aos poucos é que vou conseguindo alguma coisa) que ainda não vi também publicada.

Admito que da minha parte houve duas falhas de extrema importância. Não mandei nenhuma das fotografias pedidas e também não me identifiquei suficientemente.

Para si mando um documento com 3 fotos (actual, CCAC 15 e 4942) e outro que é a tal 1.ª página de algumas recordações do que por lá se passou.

Peço também ajuda para tentarmos encontrar o camarada Alf. Lima, que foi um companheiro inestimável.

Obrigado.


Agora... quem sou eu

António João Sampaio
Parambos – Carrazeda de Ansiães

05983269
Alferes na CCAC 15
Capitão na 4942/72

Hoje:
Médico Veterinário (reformado por invalidez)
Consultor na área empresarial na AEP (Parque Invest)
Residente em Leça da Palmeira

Sou novo nestas andanças deste Blogue.

Obrigado ao Luis Graça por ter aberto a porta do sótão a muitos que, provavelmente como eu, teimavam em não deixar sair a poeira.

Graças ao amigo Mexia Alves, meu padrinho na CCAÇ 15, já estive presente no Encontro do Paúl, este ano e prometo que vou mandando notícias à medida das possibilidades e dos acasos.

Da minha estadia naqueles azimutes, faço questão, a não ser que o impeçam, de dar conhecimento do que de relevante foi ocorrendo.

Por questão de a propósito não vou respeitar a ordem cronológica das histórias mas terei sempre o cuidado de as enquadrar no tempo.

Como súmula de todo o tempo, este amigo foi para a Guiné em Outubro 1973, fazer o CCC. Saiu-lhe na rifa a CCAÇ 15. Passou Abril e os primeiros dias de Maio no continente e seguiu novamente para o CTIG, até ao fim da nossa presença.

E agora o folhetim, que o meu amigo fará o favor de filtrar como bem entender, por forma a não se tornar chato.

Um abraço
António Sampaio



Contributo sobre a CCAÇ 4942/72
O encontro


Tudo o que aparece na Blogue corresponde à verdade.

Eram uns valentes que conseguiram resistir à Guiné, ao IN e também às outras adversidades, que provavelmente não foram as menos importantes e de quem guardo grandes e boas recordações.

Era um grupo heterogéneo, soldados Madeirenses com um número significativo de refractários e alguns desertores (O Mosca era um deles salvo erro), com graduados e também alguns especialistas do continente. Guardo deles uma imensa saudade e para isso nada melhor que recordar.

O nosso encontro foi completamente casual.

Tinha acabado de chegar a Bissau, onde como é sabido, por norma se passavam alguns dias a gozar a messe e a piscina.

Para um recém graduado capitão era esperada uma estadia de dez a quinze dias até haver colocação.

Mas eis que de repente (que me desculpe o Júlio Dantas), ainda não tinha aquecido a cadeira, surge o impedido do Cmdt da 1.ª Rep (Ten Cor Delgado, salvo erro) que me informa que sou chamado de urgência ao QG.

- Ó Sampaio, também sou ex-aluno do Colégio Militar (situação incontornável para qualquer ex-aluno), temos um problema com a Companhia de Barro que tem de ser resolvido por gente com o nosso perfil (??????????), blá, blá, blá, blá, blá, blá. Embarcas no TAIGP com o Pombo amanhã da manhã para Ingoré. Vai contigo o Alf Comando Africano ??? que vai tomar conta da CCaç de Bigene e vai ficar directamente ligado ao comando de Barro até se fazer a ligação com o Batalhão de Ingoré de quem os dois vão depender operacionalmente.

Assim, setenta horas depois de ter aterrado em Bissalanca no célebre Boing 707 dos TAM, pilotado pelo Major Quintanilha e sua tripulação. Como gostava de conhecer o homem que me levou das duas vezes para a Guiné para lhe agradecer o valente cagaço que nos pregou quando na primeira vez se apresentou.

- Fala-vos o Major Quintanilha. Sobrevoamos neste momento Dakar, capital do Senegal, país com quem Portugal não mantém relações diplomáticas. À nossa asa poderão ver dois Fiat que tentarão evitar que sejamos atingidos por um míssil inimigo. (Foi a maneira encontrada para dar as boas-vindas e o povo agradeceu)

O que transcrevo foi a informação exacta que me deram da situação em que me iam meter.

A realidade só mais tarde a descobri. Primeiro em Ingoré onde me foi feito o ponto da situação conhecida e nessa noite já em Barro, onde a CCS do Batalhão de Ingoré me foi levar, já que de Barro ninguém respondia às mensagens rádio que foram sendo enviadas desde as 10 horas da manhã até cerca das 4 da tarde.

Com a escolta da CCS de Ingoré, com um saco mochila e uma mala ainda não desmanchada desde Lisboa, cheguei por volta das 5 da tarde ao que era suposto ser o quartel de Barro, mas onde não se via ninguém fardado, não havia porta de armas e o que havia mais dentro das instalações era africanos da aldeia.

Passados uns minutos, já no chão da parada e só, porque tinha mandado a escolta embora, apareceu o primeiro branco, à civil que me disse ser o Alferes Lima.



3. Comentário de CV:

Caro camarada António Sampaio, de acordo com as normas vigentes na Tabanca Grande, entre os Tertulianos não há qualquer distinção entre os antigos postos militares, estes servem apenas como referência à nossa actividade como ex-combatentes; idades, somos todos velhos companheiros de luta; habilitações literárias; profissão, assim como a posição que cada um ocupa presentemente na sociedade. Isto, porque só uma coisa nos une, a Guiné. Une-nos aquele chão, aquele povo, aquelas matas, as horas difíceis que vivemos, a fome, a sede e tudo o mais que descrevemos nas nossas memórias.

Posto isto, em nome da Tertúlia, deixo-te um abraço de boas-vindas, com votos de que venhas, com as tuas histórias, aumentar as nossas páginas recheadas de testemunhos, contados por aqueles que sentiram na própria pele os efeitos daquela guerra.

Antes de terminar chamo a atenção para o pedido do nosso novo camarada António Sampaio que quer localizar o Alf Mil Lima que foi encontrar em Barro.
CV
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4640: Tabanca Grande (158): José Albino P. Sousa, ex-Fur Mil Inf do Pel Mort 2117 e BAC 1 (Bula e Tite, 1969/71)