domingo, 22 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14283: Libertando-me (Tony Borié) (5): 50 anos depois

Quinto episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66.



Desde o tempo em que lutámos na Guiné, quase todos os dias sentimos um certo tipo de “arrepio” a picar-nos a pele, por vezes passamos dias de reflexão e pensamentos dos amigos que por lá caíram. Homens como o “Zargo”, o “Curvas, alto e refilão”, ou o “Bóia”, como carinhosamente o chamávamos, que foi morto por uma maldita carga explosiva, numa ponte armadilhada que existia para os lados de Porto Gole.

Lembramo-nos daquele tempo escuro, mesmo depois da guerra, que para nós durou vários anos, a nossa alma parecia que tinha sido baleada, pelas coisas que vimos, pelas coisas que cheirávamos, pelo isolamento forçado e angustioso, pelas coisas que fizemos e pelas coisas que nunca tivemos oportunidade de fazer, mas que deviam ser feitas naquela idade tão jovem. Lembramo-nos de como a vida se tornava de alguma forma menor, à medida que nos isolávamos sistematicamente daqueles que nós amávamos. Enfim, “lembranças” de irmãos de guerra, que agora, anos mais tarde, o nosso pensamento encontra todos os dias. Há dias, o companheiro Hélder dizia que estas memórias não são já do "Cifra", é verdade, pois do “Cifra” já só resta talvez o pensamento, algum espírito aventureiro e o “C” do “mister “C”, que é como aqui chamamos à doença “cancêr”, pois somos um dos felizmente muitos sobreviventes dessa maldita doença, que há uns anos contraímos e que depois de um rigoroso tratamento, recuperámos, vencemos e ainda por cá andamos.

Neste começo de ano as coisas estão a parecer-nos um pouco diferentes, pois por alguns momentos vamos retornar à personagem “Cifra” e, aquela personagem, que naquele tempo se chamava “Zargo”, hoje é o nosso amigo Jorge, que está a viver por aqui, na Florida, pelo menos uns meses, portanto encontramo-nos, falando também de guerra, mas raras vezes, pois a sua dedicada esposa, assim que houve falar em guerra, logo nos diz, “please, stop fighting with your thought”, que quer dizer mais ou menos, “por favor, parem de lutar com o vosso pensamento”.

Mas vamos à história, porque se não, o dedicado do Carlos Vinhal, ainda vai dizer que o texto é longo. Portanto cá vai.

Era manhã, havia que colocar um leve casaco nos ombros, pois a temperatura assim o recomendava, estávamos do outro lado da Flórida, na parte oeste, no Golfo do México.
A “Europa” andava por lá, aliás, por aqui, de uma maneira ou de outra, tudo nos mostra que as raízes vieram da “Europa” e, as pessoas responsáveis pelos municípios continuam a ter orgulho nessas raízes, admiram e fazem de algumas personagens europeias, os seus heróis.

Em 1982, um armazém de marinha no centro da cidade marítima de St. Petersburg, no estado da Florida, foi reabilitado e um museu foi inaugurado. Eram umas instalações frequentemente sujeitas a furacões de um clima tropical, mas no ano de 2008, depois de uma chamada de atenção quase a nível nacional, Salvador Domingo Felipe Jacinto Dali i Domènech, 1.º Marquês de Dalí de Púbol, conhecido no mundo das artes, apenas como Salvador Dalí, que foi um importante pintor catalão, conhecido pelo seu trabalho “surrealista”, tinha finalmente o seu museu.

Mais de cinquenta anos depois, o “Zargo”, nome de guerra do nosso companheiro de luta na Guiné, quando nós éramos única e simplesmente o “Cifra”, dizia-me: “Estas instalações são comparáveis a um forte antigo, mas com linhas modernas e, algo surrealistas”.


Foi construído na margem da baía, próximo do Teatro Mahaffey, na parte baixa da cidade, numa estrutura que apresenta uma grande porta de entrada em vidro em forma de triângulos, que por sua vez formam círculos por onde entra a luz natural, feito de vidro de 1,5 polegadas de espessura, a que deram o nome de "Enigma", pois esta porta de entrada de vidro tem 75 metros de altura que engloba uma escada em espiral, que nos conduz ao tal “enigma”.


As restantes paredes são compostas de concreto de espessura de 18 polegadas, projectado para proteger esta valiosa colecção dos frequentes furacões que assolam a baía, onde se inclui 96 pinturas a óleo, mais de 100 aguarelas e desenhos, 1300 ilustrações, fotografias, esculturas e objectos de arte, e uma extensa biblioteca de arquivo.


Entre outras pinturas, está “The Hallucinogenic Toreador”, que é uma pintura a óleo que Salvador Dalí em 1970, seguindo os cânones da sua interpretação particular de pensamento surrealista, transmite o desagrado de sua esposa para as touradas, através da combinação de simbolismo com ilusões de ótica e alienando ainda motivos familiares, ele cria a sua própria linguagem visual, está lá a aplicação do método paranóico-crítico, dentro desta pintura combina as imagens versáteis como um exemplo elucidativo da sua criação artística, onde uma poça de sangue se transforma numa baía abrigada, na qual uma figura humana é uma jangada amarela, vista no horizonte.

O “Zargo”, ria-se ao ouvir alguém ao nosso lado comentar, “a lot of drugs”, que quer dizer mais ou menos “muita droga”!.

As pinturas de Dalí chamam a atenção pela incrível combinação de imagens bizarras, com excelente qualidade artística e, tanto para nós, que era o “Cifra”, ou para o Jorge, que era o “Zargo”, que muitas vezes estávamos sobre influência em cenário de guerra, talvez “deambulando” por outros horizontes, que nos ajudava a viver aquela terrível guerra, apreciamos a arte de Dalí, que dizem que foi influenciado pelos “mestres do Renascimento”.

Dalí insistia na sua "linhagem árabe", alegando que os seus antepassados eram descendentes de mouros, que ocuparam parte da Península Ibérica por quase 800 anos, afinal, tal como um qualquer “Zargo” ou “Cifra” e, atribuía isso ao seu amor por tudo o que é desejado com alguma fantasia, também tal como nós, que vivemos uma guerra em África, fugindo depois para o continente Americano, na procura do desejado, que muitos de nós nunca encontrámos.

Voltando à guerra que nós vivemos, torna-se um pouco claro que o seu custo é ainda maior do que nós possamos imaginar, porque a guerra tem um apetite insaciável pela morte, que ainda hoje, continua a matar, não só a quem nela participou activamente, pois as pessoas começam com sentimentos de confusão, depois move-as um longo pensamento de raiva e, finalmente, vem a indiferença. Mas aquele esgotamento escuro e emocional ainda se encontra de pé, mesmo à beira de um abismo, convidando-nos a saltar, pensando que com essa estúpida atitude, todos os sentimentos vão acabar.
Já chega de guerra e de confusões, vamos fazer como o Dalí, “viver o nosso mundo surrealista”. Quero lembrar que, com a excepção do Teatro-Museu Dalí, criado pelo próprio Dalí na sua cidade natal de Figueres, Catalunha, Espanha, o “Dalí Museum”, na cidade de St. Petersburg, é no estado da Florida que estão as maiores coleções do mundo, de Salvador Dalí.

Tony Borie, Fevereiro de 2015
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14259: Libertando-me (Tony Borié) (4): ...e o Lisboa rasgou o cartão

Guiné 63/74 - P14282: Os Nossos Camaradas Guineenses (41): Amadu Bailo Jaló (Bafatá, 14/11/1940- Lisboa, 15/2/2015): 13 anos ao serviço do exército português (1962-1975), "em perigos e guerras esforçado mais do que prometia a força humana" (Virgínio Briote)





Guiné > Bafatá > 1968 > Guiné > Bafatá > 1968> Foto do ex-furriel mil radiomontador Jorge Tavares, CCS/ BCAÇ 2856 (Bafatá, 1968/70).

Reconstituição feita pelo ex-fur mil op esp Humberto Reis, da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71): esta é(era)  rua principal (alcatroada, como todas as demais) da doce e tranquila Bafatá, com as suas casas de arquitectura tipicamente colonial; ao fundo era o mercado e cortava-se à direita, para a piscina; na primeira à direita, ficava o restaurante A Transmontana; dDo lado esquerdo, no início da foto, ficava a casa do Administrador e os CTT; a meio, a rua era cortada pela estrada que ligava a Geba.

Legenda do Amadu Bailo Jaló: Rua de Bafatá. Do lado direito, junto ao carro estacionado, era a casa do Chico Paulo, um comerciante europeu; a casa a seguir, pintada de branco,  era de um libanês, Assad,  one trabalhava o meu pai (in: Amadu Bailo Jaló - p. 17)

Foto: © Jorge Tavares (2005) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados




Guiné-Bissau >  Região de Bafatá > Bafatá > 15 de Dezembro de 2009 > 17h543 > Um das nossas conhecidas ruas de Bafatá, já ao entardecer...Foto do João Graça, músico e médico, 40 anos depois do foto da mesma artéria tirada pelo Jorge Tavares.


Foto: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

Amadu Bailo Jaló (1940-2015):

(i)  fula, nasceu em Bafatá, em 10 de novembro de 1940;

(ii) filho de Cherno Iaia Tata Jaló, nascido em 1895, e de Ana Condé, nascida em Boké, Guiné-Conacri, em 1904; o pai era empregado de balcão do comerciante libanês Assad, sendo natural de Fulamorie, também Guiné-Conacri:

(iii) os pais matricularam,-no na escola do Alcorão, que frequentou durante 3 anos; em 1948, fez a circuncisão (festa do fanado); dois meses depois, frequentava uma escola católica, dos missionários iatalianos de Bafatá; esteve lá dois anos e gostava de jogar futebol;

(iv) aos 14 anos, em 1954, o irmão mais velho levou-o para Boké, para casa de um tio, de onde era natural a mãe; viagem de nove dias, a pé,  que o marcou na sua adolescência; o irmão levava uma série de carregadores com mercadorias (roupas) para vender em Boké; a distância hoje é de c. 150 km;

(v) um ano depois, em novembro de 1955, regressa a Bafatá, numa viagem longa, também a pé;

(vi) aos 16 anos conheceu, pela primeira vez, Bissau e um ano depois Bolama;

(vii) desde muito jovem quis ganhar dinheiro e ser independente; começou por organizar bailes e festas, juntamente com um primo, para a juventude de Bafatá, a quem cobrava as entradas; as meninas de então chamavam ao Amadu o  Mari Velo;

(viii) enquanto não foi incorporado, foi trabalhando na construção civil, primeiro no Gabu, como capataz, um pouco mais tarde em Bafatá; estávamos em 1958;

(ix) nos princípios de janeiro do ano seguinte, regressou a Bafatá;  como sabia ler e escrever, foi para a campanha da mancarra;

(x) aos 20 anos quis dar um salto, tornar-se verdadeiramente independente; conseguiu abrir uma banca para negociar no Mercado de Bafatá;

(xi) mas a incorporação estava à porta; recenseado pelo concelho de Bafatá, sob o nº 21 em 1962, foi alistado em 04Jan62, como voluntário, no Centro de Instrução Militar;

(xii) depois da recruta em Bolama, seguiu-se o CICA/BAC, em Bissau, depois Bedanda na 4ª CCaç,  a 1ª CCaç em Farim;

(xiii) regressou à CCS/QG, depois os Comandos de 1964 a 1966, voltou à CCS/QG,  depois o BCav 757, BCac 1877, BCav 1905 e BCac 2856, todos sediados em Bafatá;

(xiv) em meados de julho de 1969, é  transferido para a 15ª CCmds, seguindo-se então a 1ª CCmds Africanos, o BCmds da Guiné e a CCaç 21 (base em Bambadinca) até ao 25 de Abril de 1974;

(xv) foi promovido a 1º  cabo em 1 de janeiro de 1966 e louvado pelas atuações em operações no ano de 1966;

(xvi) novamente louvado em 1967, em Ordem de Serviço (OS)  do BCaç 1877, de 30 de setembro de 1967, pelo seu comportamento em ações de combate durante o ano de 1967 (7 de janeiro /24 de setembro);

(xvii) foi graduado em furriel em 6 de fevereiro de 1970 e em  2º  sargento em 7 de novembro de 1971, tendo sido louvado pelas ações em que participou durante o ano de 1972;

(xviii) condecorado com a Medalha de Cruz de Guerra de 3ª Classe em 1973;

(xix) foi novamente graduado em alferes em 28 de junho de 1973; pela sua atuação nas operações durante o ano de 1973 recebeu novo louvor;

(xx) passou à disponibilidade em 1 dce janeiro de 1975, devido à independência do território da Guiné:

(xxi) em 1986 veio para Lisboa (, depois se ter refugiado no Senegal, até onde se estabeleceu como comerciante):;

(xxii) morreu em 15 de fevereiro de 2015, em Lisboa, no hospital militar, com 74 anos.

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sábado, 21 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14281: In memoriam (220): O último adeus ao Amadu Bailo Jaló (1940-2015), na presença de filhos, neta, sobrinho e camaradas, ontem na mesquita de Lisboa (Virgínio Briote)


Mesquita de Lisboa > 20 de fevereiro de 2015 >  O último adeus ao Amadu Bailo Jalo > Da esquerda para a direita, (i) Cor Ferreira A A Silva, (ii) sobrinho e (iii) filho do Amadú  [que vive em Londres], (iv) José António A Pereira (da  38ª CCmds), (v) filho mais do Amadú [que vive em Lérida, Espanha], (vi) neta do Amadu, (vii) Saiegh (do BCCmds Africanos), (viii) Mário Dias, (ix) Virgínio Briote e (x) um outro guineense não identificado.

Foto (e legenda): © Giselda Pessoa (2015). Todos os direitos reservados.



Mesquita de Lisboa > 20 de fevereiro de 2015 > O último adeus ao Amadu Bailo Jalo > > Da esquerda para a direita, Jaquité (fur cmd BCmd), cor cmd Rual Folques,  Amílcar Mendes e José António Pereira, ambos da 38ª CCmds, Virgínio Briote.

Foto (e legendagem): © José Colaço (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]


1. Mensagem, mais recente, do Virgínio Briote:


Data: 21 de fevereiro de 2015 às 14:52

Assunto: Amadú bailo Jaló


Caros Camaradas,

Devido aos problemas que se levantaram em relação ao transporte dos restos mortais do Amadú para a Guiné-Bissau, só ultrapassados, aliás, na véspera do embarque, não foi possível prestar as honras militares que lhe estavam preparadas pela Associação de Comandos, que, de resto, apenas teve conhecimento do ocorrido quando eu já regressava da Mesquita. Enfim, problemas que ocorrem e que escapam por vezes ao nosso controle. (*)

Anexo duas fotos, uma tirada pelo José Colaço e outra pela nossa querida camarada Giselda [Pessoa] que se manteve firme as duas horas que nos permitiram estar até se darem início aos preparativos para o encerramento do caixão.

Ainda assim, conseguiram estar presentes, além da Giselda Pessoa, o Cor Folques, Cmdt do BCmds da Guiné, o Jaquité e o Saiegh do mesmo Batalhão, o Mário Dias e o João Parreira, o Amílcar Mendes e o José António Pereira, ambos da 38ª CCmds que fez várias operações com o BCmds da Guiné, e os dois filhos do Amadú, um a trabalhar em Londres, e o mais velho em Lérida (que ainda não viu despachado o seu pedido de naturalização,  apesar de o ter metido há mais de um ano) que se fez acompanhar de uma filha, um sobrinho, já meu conhecido, a trabalhar neste momento em Angola e outras pessoas naturais da Guiné.

Abraço do V Briote
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Nota do editor:

(*) Vd. último poste da série >  21 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14280: In memoriam (219): Finalmente seguiu para Bafatá, onde vai ficar ao lado do seu pai, o corpo do Amadu Bailo Jaló, "guineense, comando, português" (Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P14280: In memoriam (219): Finalmente seguiu para Bafatá, onde vai ficar ao lado do seu pai, o corpo do Amadu Bailo Jaló, "guineense, comando, português" (Virgínio Briote)



Lisboa > 2009 > O Amadu Djaló no cais do Sodré.


Lisboa > 2009 >  Virgínio Briote e Amadu Jaló...  



Monte Real > Encontro Nacional da Tabanca Grande > 2009 > O Amadu  com o Luís Rainha, o seu 2º Comandante de grupo dos comandos do CTIG (1966)



Lisboa > 2009  > Da esquerda para a direita, o coronel comando ref Raul Folques e o ten general ref Almeida Bruno (os dois primeiros Comandantes do Batalhão de Comandos Africanos da Guiné) e o Amadu Jaló.




Guiné > Bolama > 1962 > O Amadu DEjaló na escola de recutas


Fotos (e legendas): © Virgínio Briote  (2015). Todos os direitos reservados.



1.  Informação de há dois dias, do Virgínio Briote:


Caros Camaradas

Apenas para informação e a quem, eventualmente, interesse: o corpo do Amadú vai amanhã [, dia 20, 6ª feira,]  estar às 10h00 na Mesquita de Lisboa (Pr. Espanha), de onde partirá para o aeroporto de Lisboa, rumo à Guiné e à sua Bafatá.

Abraço

Vb


2. Comentário do editor L.G:

O Virgínio foi mais do que um amigo e um camarada do Amadu... Gastou seguramente um ano a ajudar o Amadu a escrever e a publicar o seu livro de memórias... Por outro lado, procurou estar sempre ao lado do Amadu nos momentos de maior dificuldade, e nomeadamente quando surgiram os seus frequentes e graves problemas de saúde...  Sempre discreto, solícito, solidário, e fora das luzes da ribalta, nada pedindo em troca... Esteve no hospital  militar ao lado do Amadu, tal como outros camaradas dos comandos (, caoso do João Parreira e  do cor Folques),  mas o Amadu já não reconheceu o amigo "tuga"... Acrescente-se por outro que o Amadu gozava de imenso prestígio entre a comunidade guineense, e em particular fula, residente na área da grande Lisboa. 

Enfim, cumpriu-se finalmente a sua última vontade. O seu corpo viajou até à sua terra querida, Bafatá, onde repousam os restos mortais do seu pai. 

Descansa em paz, Amadu, guineense, comando, português!

PS - O 1º volume do livro de memórias do Amadu está esgotado. E há camaradas que o gostaria de o ler. O Virgínio vai fazer esforços para fazer uma reedição. Incentivei, por outro lado,  o Virgínio a publicar, com a autorização da família, o resto das memórias (incompletas) do Amadu, material que deveria fazer parte do II volume, a publicar pela Associação de Comandos, Esse projeto, por várias razões (incluindo os problemas de saúde do Amadu e do próprio Virgínio) não chegou a bom termo. Mas sabemos que o Amadu tem algumas dezenas de páginas onde relata a sua amarga experiência de exílio. Tanto quanto sei, ele viveu no Senegal, em Portugal e na Inglaterra, depois da indepenência da Guiné-Bissau. Uma parte dos seus filhos vive hoje em Inglaterra. A sua família, esposa e filhos, é credora do nosso apreço e admiração. 
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Nota do editor:

Último poste da série > 15 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14262: In memoriam (218): morreu um "homem grande", o nosso camarada Amadú Bailo Jaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), que fez parte do Batalhão de Comandos Africanos e da CCAÇ 21, um combatente valoroso e um homem de valores (Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P14279: Parabéns a você (863): Veríssimo Ferreira, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 1422 (Guiné, 1965/67)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14270: Parabéns a você (862): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf da CART 6250 (Guiné, 1972/74) e Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14278: Convívios (651): IX Encontro dos Combatentes do Ultramar do Concelho de Matosinhos, dia 7 de Março de 2015, em Leça da Palmeira (Carlos Vinhal)



No próximo dia 7 de Março 2015, como vem acontecendo desde 2007, vai ser levado a efeito mais um Encontro/Convívio dos Combatentes do Ultramar do Concelho de Matosinhos, e seus familiares, aberto aos camaradas do Grande Porto que connosco queiram confraternizar.

Este ano o Almoço vai ter lugar no Tryp Porto Expo Hotel, sito na Rotunda da Exponor. Vai ser uma experiência nova que não acarreta mais custos, já que conseguimos manter o preço do ano passado, 19€.

A Ementa, quanto a nós melhorada em relação aos anos anteriores, é a seguinte:

Buffet de Entradas 
Creme de Legumes 
Bacalhau com Broa 
Bifinhos de Vitela com Porto 
Buffet de Sobremesas 
Vinhos da Casa, água, cerveja e refrigerantes 
Café 
Bolo comemorativo e uma taça de espumante

O programa do dia, que se desenrolará em Leça da Palmeira, terá o seguinte alinhamento:

11h00 - Missa de Sufrágio pelos camaradas caídos em campanha e pelos entretanto falecidos, na Capela do Sagrado Coração de Jesus, mais conhecida por Capela do Ruas, sita na Rua António Nobre.

No fim da Missa - Concentração na Marginal da Praia de Leça, frente ao Largo António Nobre (Antigo Restaurante Garrafão) para a habitual foto de família.

12h30 - Almoço/Convívio no Tryp Porto Expo Hotel, sito junto à Rotunda da Exponor

Durante a tarde convívio e animação

Passa palavra, comparece e traz um camarada

Inscrições aceites até ao dia 4 de Março para os telefones dos organizadores do Convívio:

Abel Santos - 919 253 200
António Maria - 938 492 478
Carlos Vinhal - 916 032 220
Francisco Oliveira - 917 898 944
Ribeiro Agostinho - 969 023 731
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14266: Convívios (650): Encontro do pessoal do Batalhão de Cavalaria 3846 (Companhia Independente), dia 15 de Março de 2015, na Batalha (Delfim Rodrigues)

Guiné 63/74 - P14277: A minha homenagem aos "Unidos de Mampatá" (CART 6250/72, Mampatá, 1972/74), António Carvalho, José Manuel Lopes (Josema) e Carlos Farinha... (António Murta, ex-alf mil inf, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513, Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74)



Guiné > Região de Tombali > Nhala > 1974 > Os "Unidos de Mampatá", em final de  comissão,  foram despedir-se  dos "periquitos" de Nhala... 

Fotos (e legenda): © António Murta (2015). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do  António Murta [ex-alf mil inf , Minas e Armadilhas, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74] [, foto atual à esquerda]

Data: 17 de fevereiro de 2015 às 01:25

Assunto: Aniversário do António Carvalho

​Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal.

Vi há instantes que um dos aniversariantes de hoje, é o António Carvalho, de Mampatá. (*)

Tenho duas fotografias, que anexo, de um momento importante da sua comissão na Guiné e que é, precisamente, o fim dela (comissão). Os rapazinhos estão de malas feitas e vão para a peluda. Foram a Nhala despedir-se e atazanar os periquitos locais. 

Podem reconhecer-se também nas fotos o nosso poeta de Mampatá,  José Manuel Lopes [, Josema,] e o Alfero Carlos Farinha,  todos Grã-Tabanqueiros. 

Tão jeitosos que eles eram!

A qualidade destas reproduções de slides, já de si fracotes, é baixa, mas dá para ver.

Se houvesse oportunidade e espaço, era um momento bonito para as publicar e eu ficava muito agradecido. Se não, ficam para quando der jeito. (Ai, se o dia tivesse 28 horas!).

Um abração para vocês,
António Murta
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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P14276: Notas de leitura (683): “De Passo Trocado ASP”, por Carlos Vale Ferraz, Bertrand Editora, Fevereiro de 1985 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Maio de 2014:

Queridos amigos,
Temos já uma literatura que se espraia entre a recruta e a especialidade mas cujo núcleo é a guerra e os seus fantasmas, essa literatura parece deter-se propositadamente no regresso, a partir daí faz-se um silêncio púdico. Talvez porque esses regressos tenham sido em larga medida dolorosos, ziguezagueantes, confusos, tudo mudara em nós e as pessoas do nosso ambiente incomodavam-se com as histórias que trazíamos de longe.
ASP veio da Guiné e apanhou o 25 de abril em cheio, foi alterando os seus esquemas mentais e optou por uma situação extrema. É a história de um de nós, que andou sempre de passo trocado.
Um convite à literatura dos regressos, praticamente inexistente.

Um abraço do
Mário


ASP, uma história de quem regressa da guerra e vive de passo trocado

Beja Santos

O romance chama-se “De Passo Trocado ASP”, quem o escreveu foi Carlos Vale Ferraz, autor de “Nó Cego” e “Soldadó”, aqui largamente versados. Ao que se sabe, dado à estampa pela Bertrand Editora, em fevereiro de 1985, não obteve a notoriedade dos títulos atrás citados.

O autor fala-nos concisamente da trama, com malícia e ironia: “ASP é António Silva Pereira um homem que regressa duma guerra que mal acaba em África e mal recomeça ao pé da porta. Um homem que, sempre forçado pelas circunstâncias, rebenta as amarras que o ligam à segurança do cais e parte sempre para mais longe quando gostaria de permanecer onde está. Dentro e fora. Longe e perto. Receoso e esperançado. Um homem que gostaria de ser outro e viaja num barco fustigado pela tempestade e do qual se julga terem já saído os ratos e alguns passageiros clandestinos.
A história que aqui se conta é a de ASP, de mais ninguém! Não é a do barco, nem dos ratos, nem dos pilotos, nem mesmo dos passageiros clandestinos. É simplesmente a história de quem foi a guerras que não declarou, viveu como pôde os dias em que são férteis as revolução e se cruzou com os acontecimentos de passo trocado”.

É sabido que a literatura de guerra anda preferencialmente centrada na comissão militar propriamente dita, na experiência do relator e no registo do ambiente que o cerca; em muitos casos, há descrições preambulares, conta-se a recruta e a especialidade e o tempo que precede a mobilização e os eventos associados à partida, num barco ou num avião. O que é raro neste ramo literário é contar o que se passou depois, mal se regressou. Não é difícil perceber porquê, foram tempos de desconforto, ninguém percebia muito bem a nossa história bélica africana, aquelas colunas e emboscadas, aquele viver em aquartelamentos com gerador ou petromax, aquelas flagelações e aqueles golpes de mão, quem nos ouvia não podia compreender, tratava-se de um universo desconhecido, era uma guerra que não lhe entrava pelas portas adentro, vinha filtrada pelos meios de comunicação social, em suma era um desassossego todo aquele relato, toda aquela exaltação que trazíamos ainda nos poros, no coração e na boca.

Em termos arquiteturais da escrita, ASP é um cidadão que bastante protestou na sua jornada universitária, a tal ponto que engenheiro foi malhar na infantaria. No regresso, é prontamente acomodado pela ordem vigente, passa a circular no meio de comendadores da indústria. Trouxe uma grande amizade da guerra, o Picolo, “Herdeiro de família com origens perdidas no tempo”. Cai no meio de uma festa tipo bacanal em Cascais, Picolo brada pela conversão: “Irmão, estamos aqui como passageiros da classe de luxo do Titanic, enquanto ele se afunda. É o nosso último baile, o adeus ao mundo em que nascemos e fomos criados. Quando soarem as campanhas de alarme e o comandante anunciar que o navio está a ir a pique, então cada um de nós descerá aos decks inferiores em busca das baleiras de salvamento”.

Combateram na Guiné, na Companhia de Caçadores Número Mil Oitocentos e Tal, foi aí que se afeiçoou a Picolo Nunes de Almeida, eterno brincalhão, menino-bem, finalista de Direito e repetente vezes sem conta. Quando desembarca, deu-se o 25 de Abril, tem a família à espera, vai de Mercedes para casa. O sogro é o comendador Mattos, veio de trolha, fez-se a pulso. O compadre Alcides, também comendador, dá-lhe lugar como engenheiro-chefe da Metalomecânica Alcides. Depois de umas férias no Algarve, pagas pelo sogro, apresenta-se no trabalho e é apresentado aos quadros, a agitação já reina na fábrica. ASP vai falar aos trabalhadores: “Tinham o aspeto que se imagina, mãos pretas de óleo, barbas crescidas e fato-macaco como segunda pele. ASP foi reparando nos seus braços tatuados a tinta azul: Angola – 1961/63; Guiné – 1963/65; Moçambique – 1965/67, o ferro a marcar o ano e o local da comissão na guerra. Por vezes, acrescentavam pormenores, coração atravessado por uma seta e amor de mãe, em legenda; um mapa, o nome da sua tropa, as mascotes, gatos do Niassa, cágados de Buruntuma, cobras de Mueda, escorpiões daqui e dali, desejos de ir e voltar. ASP havia passado por alguns desses buracos da manta rota do império e não pode evitar sentir por eles uma certa irmandade”.

O comendador Alcides está fulo com o despautério de tanta petição, querem saber de dinheiro, querem reuniões regulares, há ameaças geladas de greve. ASP encontra uma saída no meio da alta tensão, sugere que se constitua uma comissão de representantes dos trabalhadores e dos quadros, e que se apresente um relatório, a CEAR – Comissão Encarregada de Apresentar o Relatório. Alcides está de cabeça perdida quando lhe anunciam que vem à fábrica pessoal do sindicato para uma sessão de esclarecimento, não foi fácil acalmá-lo nem ao operário a quem ele arrancou um autocolante estampado no peito. Picolo funciona como uma consciência de ASP, as recordações da Guiné vêm sempre ao de cima. E acabamos por ser introduzidos no ambiente da fábrica, é-nos criada uma certa familiaridade com os quadros, a secretária de ASP, os representantes dos trabalhadores. Vem o 28 de setembro, a dinâmica revolucionária acelera. As discussões com o sogro sobem de tom. Alcides abandona a fábrica, ASP fica ao leme, vivem-se tempos exaltantes, ninguém conhece a verdade do amanhã, Fred Mascarenhas entra em cena, é o protótipo do adaptativo, o molúsculo que tem sempre a cor da ocasião.

Chegou o tempo da reconversão, ASP procura levar a fábrica a bom porto, os militares vão chegar, chegou a hora da intervenção, ASP está convicto de que age bem, adere à revolução, passou a acreditar nela. Conversa com Picolo, este graceja, desengana-o, vem para aí um refluxo devastador. A sua vida familiar é quase neutra, entretanto nasceu-lhe um filho. A mulher vai ser fulminada por um cancro, felizmente que existe o trabalho, os operários acreditam nele, no seu esforço por manter a fábrica de pé. E veio depois o descarrilamento, ASP, no termo da revolução, é sujeito a inquéritos, suspenso e depois readmitido, se bem que marginalizado. Gradualmente, ASP entra na clandestinidade, processo que Carlos Vale Ferraz manuseia com o extremo cuidado, dando-nos os claros-escuros da nova personalidade desse ASP que não acredita nos novos triunfadores e aceita fazer a revolução com bombas e tudo. A clandestinidade é absoluta, ASP desapareceu num bairro da lata, mudou de identidade, trabalha numa oficina clandestina, deixa mesmo de ter acesso ao filho, educado pelos sogros. Com todas as cautelas, visita o cemitério onde vai “conversar” com a defunta mulher, sente-se já muito esquecido da antiga personalidade e dúvida que consiga adaptar-se à vida à face da lei (…) ASP abandona-se a esse tempo de águas paradas no rio, fumos serenos de fábricas a fechar, sons de ecos infinitos. Afinal, toda a sua vida tem sido uma progressão contínua de passo trocado. Sem nenhuma dor na consciência, constata que fora assim, deste estudante inconformista, passando por resignado gestor de fábrica, até revolucionário. Em “De Passo Trocado ASP”, Carlos Vale Ferraz deu-nos um poderoso fresco social e humano mesclado de densidade dramática, da atmosfera cínica e cruel em que se movem os alcatruzes da nora, entre as escolhas políticas e as do coração.
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14264: Notas de leitura (682): "Guerra Colonial - Fotobiografia", por Renato Monteiro e Luís Farinha, Publicações D. Quixote (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P14275: (Ex)citações (261): Uma coisa posso dizer com clareza: o povo guineense é um povo digno de admiração (Manuel Joaquim, membro da ONGD Ajuda Amiga)









Fonte: Solidariedade - Para Amizade Sovieto-Africana, boletim de informação, agência Novosti, 8, 1969, p.4. (Material apreendido ao PAIGC em Nhacobá,. Região de Tombali, Guiné, em maio de 1973 (*).. Coleção de António Murta [ex-alf mil inf , Minas e Armadilhas, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74]

Foto: © António Murta (2015). Todos os direitos reservados [Edição de CV]



Sintra > Azenhas do Mar > Setembro de 1977 > Adilan, o menino balanta-mané que o Manuel Joaquim trouxe da Guiné em 1967 e que criou como se fosse seu filho... Aqui,com as suas "manas"... Hoje, o José Manuel S. C., com 54 anos, casado, pai de filhos, é cidadão português e está plenamente integrada da sua segunda pátria.

Foto: © Manuel Joaquim  (2010). Todos os direitos reservados.



Cascais > Janeiro de 2011 > Quando fez 50 anos, em 12 de janeiro,  o Adilan [, José Manuel S.C....] com as suas "manas", não de sangue mas de afeto... Uma belíssima história, já aqui contada e recontada, e que na começa num operação militar ao Morés (**)...

Foto: © Manuel Joaquim  (2011). Todos os direitos reservados.



1. Comentário de Manuel Joaquim (***) [, membro da ONG Ajuda Amiga,  ex-fur mil  armas pesadas, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67; padrinho do "Adilan, nha minino";  professor do ensino básico, reformado; por todas as razões, talvez o camarada da Tabanca Grande que menos de lições precisa de dar e receber  em matéria de afetos lusoguineenses...]

Vamos aos afectos, queridos camaradas da Guiné! (Veem como estou afectuoso?) Falo por mim que de afectos é o que mais preciso agora, neste momento de opinar.

Isto de levar a dianteira em matéria de afectos será complicado de gerir pelos sujeitos da afeição:"Quero lá eu saber se aquele chegou em 1º ou em último lugar; agrada-me é que gostem de mim, o resto é lá com eles".

Bem, não dirão nada pois não terão conhecimento desta tão agradável notícia, digo eu.

O objectivo é saber se há uma relação afectuosa entre alguns (muitos, poucos?) portugueses e os guineenses. Porque entre os dois conjuntos, "povo português" e "povo guineense", duvido que alguém consiga avaliar essa relação. E penso que, a ser avaliada, não obteria uma posição de relevo se comparada com a de outros povos ditos amigos da Guiné-Bissau.

É verdade que tenho afeição ao povo guineense mas este inquérito não é sobre afectos individuais.
Começo já por dizer que concordo totalmente que "em matéria de afectos e em relação aos guineenses, levamos a dianteira ....". 

Mas agora me pergunto: Qual a posição nessa dianteira? Encostados, mais ou menos perto ou muito à frente do segundo lugar?

Não sei responder. Russos, chineses, cubanos, suecos, etc.etc., actuaram na guerra colonial em favor do povo guineense?

Aceitando a linguagem política da questão, digo que sim, que actuaram na retaguarda, na formação militar e ideológica e na logística da guerra do PAIGC, alguns a participarem directamente nos combates (quase só cubanos).

Ajudaram sob o signo da amizade? Ajudaram, sim. Mas não o fizeram só pela amizade (ficava-lhes caro demais). 

As «Associação de Amizade X - Guiné-Bissau», (sendo, por exemplo, X o nome de um dos países ajudantes) parecem querer dizer que sim mas a Amizade" talvez seja o último dos objectivos a atingir pelos parceiros da Guiné-Bissau. Há outros, económicos e estratégicos, mais importantes e prioritários. De resto a chamada "amizade entre os povos", notariada em cerimónias diplomáticas, é quase sempre fantasia para uso político-económico, onde os afectos não contam.

Na dianteira dos afectos vão os portugueses. Acredito, mas até quando?

Afinal o que é que nos liga à população guineense, qual foi o "cimento" e o adubo desses afectos?
Penso que o "cimento" foi a guerra colonial e o adubo tem vindo a ser distribuído desde o início da guerra. Mas não podemos equiparar à realidade actual o grau afectivo das relações entre muitos dos antigos combatentes portugueses e a população guineense com quem conviveram. E é o que pode acontecer quando se escrutinarem os resultados desta consulta, pois quer-me parecer que haverá gente a responder pensando "particular" (em si) e não "global".

Esta afectividade ainda existente, não sei em que grau, deve muito aos afectos nascidos durante a guerra e presentes na memória de muitos dos participantes nessa guerra ainda vivos, combatentes ou não, militares ou civis.

Mas o tempo não perdoa. Muitos dos usuários dessa memória, a maior parte deles guineenses, já morreram. Por isso não acredito que os laços afectivos se tenham vindo a fortalecer apesar de não ser difícil encontrar notícias de afectividades recentes resultantes dos contactos de cidadãos portugueses que têm visitado a Guiné nos últimos anos. Tenha-se em atenção que muitas destas afeições são interesseiras, só existem no discurso: "a necessidade aguça o engenho!".

Creio que esta relação afectiva não é igual de parte a parte. Será mais forte do lado guineense do que do lado português. O desenrolar da vida política, social e económica da Guiné tem sido um desastre desde a sua independência. Como não admitir que o povo sabe fazer comparações sobre a sua situação entre os tempos de antes e o pós-independência?

 Afinal o que é que liga à Guiné, afectuosamente, muitos dos antigos combatentes portugueses?
Será a recordação dos tempos difíceis e das situações aflitivas por que passaram, dos momentos de camaradagem, de alegria e de sofrimento, das marcas deixadas pela guerra e que, para o bem e para o mal, não se apagaram?

Serão as memórias da sua juventude passada na Guiné, para muitos deles tempos de muitas dificuldades mas também tempos de revelação de si próprios,  das suas capacidades e do comportamento humano perante o bem e o mal, tempos de descoberta de outros "mundos", de outros lugares, de outro(s) povo(s) com seus usos e costumes?

Será para alguns a lembrança da ternura e da afabilidade sentidas nos momentos de convívio com a população que os rodeava, contrapondo esses consolos aos momentos de tristeza e medo, provocados pela guerra para onde foram obrigados a ir e de onde regressaram (os que regressaram) muito diferentes do que eram quando lá chegaram?

Procurar conviver com a população foi para muitos um objectivo facilmente cumprido pois o povo que os "recebeu" tinha, em geral, um comportamento não conflituoso com os militares. Era mais frequente mostrar afabilidade que indiferença. Sinais visíveis de desprezo seriam raros, o que não quer dizer que não pudessem existir em número mais elevado. Mas também havia sinais de dedicação e de sacrifício no apoio a muitos militares portugueses.

A afectividade ainda hoje existente nasceu de tudo isto?

Os afectos que muitos dos ex-combatentes têm por muitos guineenses poderão assentar nestas recordações de uma terra estranha para onde foram lançados e onde se viram obrigados a situarem-se de modo a lhes ser mais fácil alimentar a esperança de regressarem, vivos e inteiros.

Procurando um ponto de equilíbrio, conscientemente ou não, criaram laços, criaram amigos, "forçaram" relações pessoais e/ou aceitaram de bom grado outras delas, entraram de cabeça, uns, de mansinho e receosos outros. E assim conviveram sem sobressaltos de maior com o povo que lhes rodeava os aquartelamentos.Quem perde a memória feliz daqueles momentos?

 Durante algumas centenas de anos não houve naquela terra qualquer tipo de convívio social de portugueses com a generalidade da população da Guiné. Não me admira nada, os tempos eram outros, a visão centralista europeia olhava os povos africanos não como seus semelhantes mas como seus servidores. Portanto não acuso ninguém.

Não houve convívio mas houve muitos conflitos violentos, guerras mesmo.

Algumas relações sociais existiram mas para permitir acordos de negócios entre as partes, entre o poder colonial, oficial ou particular, e o dos chefes tradicionais locais. Acordos estes que variavam "conforme os ventos".

Outras relações, entre patrões e serviçais, entre dominadores e dominados, "colonos" e "colonizados", estavam assentes em posições de domínio absoluto do mais forte.

O poderem ter acontecido relações afectivas, pontuais e muito limitadas no tempo, no espaço e na sua abrangência, não me leva a dizer que as relações do poder com a população criaram afectos que se foram cimentando no decorrer do tempo. Não se acusa ninguém, há que ter em conta a relatividade histórica na análise do comportamento das sociedades.

Para que serve, então, bater na tecla das relações de amizade com os povos da Guiné, de há 500 anos para cá? Não serve nada, deixemos esta balela para gestão política.

Relações de amizade? Não estou a falar de relações sociais, amigas ou não, entre reduzidos números de portugueses residentes e algumas entidades gentílicas. 

Falo dos afectos resultantes da convivência diária, da partilha de vivências, da aculturação mútua surgida de contactos mais duradouros que foi o que se verificou em muitos lugares durante a guerra colonial de 1963/74.

A ida para a Guiné de tantos militares transportando a diversidade cultural existente na sociedade portuguesa, proporcionou ao povo guineense o ter alguma noção do que é "ser português" (o povo não é burro). Apesar de andarem de armas na mão, estes militares, não se pareciam com os antigos que, há séculos, se vinham sucedendo muitas vezes lançados ao deus-dará e a assumirem o poder colonial sem que para isso estivessem preparados nem mandatados, decididos a serem obedecidos a qualquer preço, na satisfação dos seus caprichos e ambições.

E quanto ao futuro?

Vai havendo bom trabalho, feito por organizações portuguesas e guineenses. Mas é pouco. Sei alguma coisa do que falo. Sabemos, aqui no blogue, de algumas associações e do seu trabalho na manutenção deste ambiente solidário e amigo entre muitas pessoas da Guiné e de Portugal. Convivo regularmente com guineenses, alguns deles antigos militares portugueses.

A base de sustentação dos afectos está, principalmente, nos antigos combatentes na Guiné e em poucos mais. Mas estes poucos mais não são  "pouco", são o sinal de que a solidariedade afectiva não morreu. Na Guiné sucede o mesmo. Há muita gente que gosta dos portugueses mesmo que políticos de serviço tenham algumas vezes afirmado o contrário. A população que conviveu com os militares portugueses não os esqueceu.

Não deixámos más memórias ao povo com quem convivemos. Isto na generalidade pois pode sempre haver "fruta podre nas caixas". Mas o povo não é estúpido em lugar nenhum do mundo, ainda que muita gente o afirme.  E, normalmente, sabe relativizar os acontecimentos, princípio básico necessário à sua sobrevivência com alguma dignidade social.

E uma coisa posso dizer com clareza: O povo guineense é um povo digno de admiração.

Agradecendo a quem se deu ao trabalho de ler todo este meu "discurso" um pouco atabalhoado. (****)

Abraços para todos
Manuel Joaquim
__________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14226: A guerra vista do outro lado... Documentos apreendidos ao PAIGC em Nhacobá em 17 de maio de 1973 - Parte I (António Murta, ex-alf mil inf, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74)

(**) Vd. poste de:

 10 de novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7261: História de vida (32): Adilan, nha minino. Ou como se fica com um menino nos braços - 1ª Parte (Manuel Joaquim)

12 de novembro de 2010 >  Guiné 63/74 - P7267: História de vida (33): Adilan, nha minino. Ou como se fica com um menino nos braços - 2ª parte (Manuel Joaquim)

(***) Vd. poste de 11 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14240: Sondagem: somos um povo de afetos ? Resultados preliminares (n=70): 80 % dos respondentes "concordam totalmente", com a proposição segundo a qual "em matéria de afetos, e em relação aos guineenses, levamos hoje a dianteira a russos, chineses, cubanos, suecos e outros que apoiaram o PAIGC no tempo da guerra colonial"...

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14274: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, Palace Hotel de Monte Real, 18 de Abril de 2015 (3): Abertura das inscrições e outras informações complementares

Monte Real, 14 de Junho de 2014 > Foto da Grande Família do Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné
Foto: © Manuel Resende  (2014). Todos os direitos reservados.


X Encontro Nacional da Tertúlia

Mensagem da Organização

Estão abertas as inscrições

Definitivamente estamos a arrancar com a Operação Monte Real 2015.

A partir de hoje, e até ao dia 10 de Abril, aceitaremos as inscrições da tertúlia e demais combatentes da Guiné, assim como de seus familiares e/ou amigos, que queiram participar no X Encontro Nacional da Tabanca Grande, a levar a efeito no próximo dia 18 de Abril, no Palace Hotel de Monte Real.

Como dissemos no último Poste, o Hotel vai manter o preço do almoço dos anos anteriores, 30€ para adultos e 15€ para os mais pequenos, lanche incluído. 

É também disponibilizada a hipótese de os participantes pernoitarem no Palace Hotel de Monte Real pelos preços de:
Quarto duplo - 60€
Quarto Single -  55€
Pequeno-almoço incluído.

A reserva para pernoita deve ser feita só através da Organização do Encontro, sendo confirmada, logo que possível, de acordo com a disponibilidade do Hotel.

Voltamos a lembrar que no acto da inscrição devem identificar a/o vossa(o) acompanhante, mencionarem de onde se deslocam e se querem pernoitar no Hotel.

Como sempre, pedimos que não se deixem para tarde para facilitarem a vida a quem tem em mãos a coordenação das reservas para o Hotel e das inscrições para o almoço, no caso, o nosso camarada e amigo Joaquim Mexia Alves.

Este ano o camarada Miguel Pessoa vai enviar aos participantes no X Encontro um modelo de crachá, personalizado, que servirá também para futuros Convívios e outras ocasiões onde os seus possuidores se queiram identificar como pertencentes à Tertúlia do nosso Blogue.
Futuramente estes mesmos crachás serão enviados só a novos participantes dos nossos convívios ou a quem o solicitar.

O camarada Joaquim Mexia Alves, a exemplo dos dois últimos anos, vai diligenciar no sentido de ser celebrada, pelas 11h30, uma Missa de sufrágio pelos nossos camaradas e amigos caídos em combate e pelos que nos foram deixando ao longo do tempo depois de cumprir as suas missões terrenas.

Em tempo: 
Está confirmada Missa às 11h30 na igreja matriz de Monte Real, celebrada pelo Padre David Nogueira, pároco de Monte Real. 
O Pe David, é um homem novo e conhece África pois já esteve como missionário em Angola, recentemente.

Após a Missa será efectuada a foto de família.

Relembramos que este Convívio é destinado à tertúlia do nosso Blogue, acompanhantes por eles inscritos (amigos e/ou familiares), extensivo também a todos os camaradas que tenham cumprido a sua comissão de serviço na Guiné, ou a pessoas que de alguma maneira se sintam ligadas à actual Guiné-Bissau, por exemplo: cooperantes, naturais e outros.
A Organização poderá rejeitar a inscrição de pessoas que não se encontrem nas condições acima descritas.

Continuamos ao vosso inteiro dispor no email carlos.vinhal@gmail.com para qualquer esclarecimento adicional.

OBS: - Se eventualmente já se inscreveram e o vosso nome não consta da lista que se segue, por favor reinscrevam-se.

Albano Costa e Maria Eduarda - Guifões/Matosinhos
António Osório, Ana e Maria da Conceição - Vila Nova de Gaia
António João Sampaio e Clara - Leça da Palmeira/Matosinhos
Carlos Alberto Cruz, Irene e Paulo Jorge - Oeiras
Carlos Vinhal e Dina - Leça da Palmeira/Matosinhos
Coutinho e Lima - Lisboa
João Alves Martins e Graça - Lisboa
João Sacoto e Aida - Lisboa
Joaquim Mexia Alves - Monte Real
Lucinda Aranha e José António - Torres Vedras
Luís Graça - Alfragide
Miguel e Giselda Pessoa - Lisboa
Ricardo Sousa e Georgina - Lisboa

Os Organizadores:
Luís Graça
Joaquim Mexia Alves
Miguel Pessoa
Carlos Vinhal

E M E N T A

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Nota do editor

Poste anterior de 6 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14124: X Encontro Nacional da Tabanca Grande, 18 de Abril de 2015 (2): Divulgação da Ementa, preços, prazos para as inscrições e outras informações (Joaquim Mexia Alves / Miguel Pessoa / Carlos Vinhal)

Guiné 63/74 - P14273: (Ex)citações (260): Posso afirmar com conhecimento de causa que muitos deles se sentem “guineenses de Portugal” e eu sinto-me "português da Guiné" (José Teixeira)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Medjo > 2 de maio de 2013 > O nosso camarada Zé Teixeira, "régulo" da Tabanca Pequena de Matosinhos,  com o régulo de Medjo, na sua última viagem à Guiné-Bissau.


Foto: © José Teixeira (2014). Todos os direitos reservados



Guiné-Bissau > Região de Quínara > Buba > Tabanca Lisboa > 2005 > O José Teixeira com o chefe da tabanca e a sua lindíssima filha. "Um feliz reencontro. Regresso às origens em 2005. Encontro com um Português da Guiné, antigo paraquedista, que tem uma linda história para ser contada, pelo que sofreu e como consegui iludir o PAIGC para sobreviver à chacina de antigos combatentes portugueses".

Foto (e legenda): © José Teixeira (2005). Todos os direitos reservados


1. Comentário do José Teixeira José [ ex-1.º cabo aux enf, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatáe Empada, 1968/70; membro fundador e animador da Tabanca de Matosinhos]:

Em matéria de afetos, não tenho dúvidas que estamos à frente, a muitas léguas de todos os povos que acidentalmente passaram pela Guiné. Digo acidentalmente, porque na realidade só houve um povo, o português, que deixou raízes. Foram quinhentos anos de vida em comum. Houve violências de parte a parte e os últimos doze anos de convivência foram terríveis por um lado e exemplares por outro, quando tratávamos as populações que estavam do nosso lado com respeito e as defendíamos de um inimigo comum.

Confesso que quando lá voltei em 2005 pela primeira vez, ia preocupado com a possível reacção dos guineenses, afinal eu tinha sido um "tuga", mas fui desarmado logo na fronteira, com o sorriso do guarda, que me perguntou onde estive no tempo da guerra e ao saber que estive em Buba, retorquiu: "Então conheceste o meu irmão que foi soldado milícia em Buba". Confesso que me senti, de imediato, em casa, e é assim que me sinto, quando aterro em Bissalanca.

Outras vezes se sucederam. A ligação ao povo português é de irmão para irmão. Antigos guerrilheiros abraçam com mesmo calor, que antigos soldados do exército português, qualquer de nós. É evidente que as conversas são naturalmente diferentes, mas já vi mais que uma vez, antigos "turras" a analisarem, com visitantes portugueses, no terreno, sem "paixões" acontecimentos que forma vivenciados em campos opostos. E também já senti na pele e de lágrimas nos olhos o prazer de abraçar inimigos do terreno que se cruzaram comigo, analisaram comigo os acontecimentos vivenciados, pediram “discurpa” e pediram para a partir dessa data sermos “ermons”,  é gente que acabada a guerra, voltou às suas terras, fez a paz com os familiares que estavam da outra banda e continuaram a construir o futuro.






Guiné-Bissau  >  Região de Bafatá > Xitole > 1 de maio de  2013 > "O Francisco Silva  mais um antigo guerrilheiro do PAIGC, procurando localizar pontos de guerra comuns". [ Companheirop de viagem do Zé Teixeira, em 2013 (**), o Franscisco, hoje cirurgião,  esteve no Xitole, como laf mil, ao tempo da CART 3942 / BART 3873 (1971/73), antes de ir comandar o Pel Caç Nat 51, Jumbembem, em meados de 1973]

Foto (e legenda): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados


As marcas que ficaram da guerra colonial estão a desaparecer ao ritmo do desaparecimento prematuro dos combatentes guineeses. Nós, portugueses,  temos uma vida mais longa. Os guineenses mais novos, naturalmente, como os nossos filhos estão insensíveis à guerra, mas o testemunho que ficou é, a meu ver, pelas experiências que já tive nas várias visitas que fiz à Guiné, extremamente positivo em relação aos portugueses. O sonho deles é vir para Lisboa.

A luta, de facto, não era contra o povo português, mas contra o regime e Amilcar Cabral conseguiu passar bem esta ideia, tendo como colaboradores diretos os nossos soldados, a começar pelo Governador Spínola que colocou o povo guineense em primeiro lugar, apesar da luta que se travava.
Recordo por exemplo as palavras do tabanqueiro Zé Belo, meu comandante, ao chegar a Mampatá. Foi mais ou menos isto. "rapazes,  se tratarmos bem esta gente, seremos bem tratados e respeitados e eu quero levar-vos todos para casa daqui por dois anos. Se receber alguma queixa da população, o desgraçado comerá com toda a justiça do RDM que eu lhe puder dar".

E ao fim de 6 meses quando fomos deslocados para Buba, a população veio despedir-se de nós junto à saída para a picada.

Foram marcas como estas que vingaram. Éramos duros e agressivos no mato. Reagíamos com violência aos ataques do inimigo, mas tratávamos bem a população que estava connosco.
Hoje, posso afirmar com conhecimento de causa que muitos deles se sentem “guineeses de Portugal” e eu sinto-me "português da Guiné". (***)

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de 8 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14234: Sondagem: opinião "em matéria de afetos, e em relação aos guineenses, levamos hoje a dianteira a russos, chineses, cubanos, suecos e outros que apoiaram o PAIGC no tempo da guerra colonial"...




Guiné 63/74 - P14272: Inquérito online: 88% está de acordo com a proposição segundo a qual "em matéria de afetos, e em relação aos guineenses, levamos hoje a dianteira a russos, chineses, cubanos, suecos e outros que apoiaram o PAIGC no tempo da guerra colonial"







Lisboa > 5 de janeiro de 2015 > Um dos mais célebres murais de "street art" de Lisboa > "O  androide dos artistas VHILS e  PIXEL PANCHO

"Depois de esculpir rostos pelas ruas de Lisboa, o artista Alexandre Farto (mais conhecido por “Vhils”) juntou-se ao artista italiano Pixel Pancho e passou quatro dias a trabalhar numa obra junto ao rio no Jardim do Tabaco. O mural mistura o estilo dos dois, com figuras robóticas que são a imagem de marca de Pixel Pancho, e um típico rosto esculpido por Vhils. Foi assim criada uma imagem de um androide destruindo um barco com a mão, e quem for vê-la de perto poderá também deparar-se com barcos verdadeiros, pois a obra encontra-se junto de um dos terminais de cruzeiros da cidade." (Fonte: LisbonaLux.com)

Fotos: © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados.

A. Resultados finais da nossa última sondagem (*)


1. Concordo totalmente  > 87 (80,6%)

2. Concordo em parte  > 8 (7, 4%)

3. Não concordo nem discordo / Não sei  > 7 (6,5%)

4. Discordo em parte  > 2 (1,8%)

5. Discordo totalmente  > 4 (3,7%)

Votos apurados: 108

Sondagem fechada em 15/2/2015, 15h

B. Alguns comentários (a desenvolver em postes posteriores) (*):


(i) Carlos Vinhal:

(..:) Pressupõe-se que temos de responder como portugueses e não na qualidade de ex-combatentes.
Surge-me uma pergunta, por que se põe esta questão em relação à Guiné e não a Angola ou a Moçambique onde residiam mais portugueses (da metrópole) e o número de combatentes foi muito maior?  Que diz a Guiné em relação aos normais portugueses? Lembram-se de quando éramos mobilizados para a Guiné, aqui tão perto, as pessoas ficavam mais aterrorizadas do que se fôssemos para o distante território de Timor, lá do outro lado mundo?

Estou-me a lembrar de que nos primórdios dos anos 80, Matosinhos se geminou com Mansoa. Pergunto, quem da minha cidade saberá onde fica Mansoa? E o que fez Matosinhos por Mansoa?
Quebrando o sagrado segredo de voto, digo que respondi que não sabia, porque como português não sei da qualidade dos afectos dos meus compatriotas para com os guineenses. Se fosse sobre o meu afecto, enquanto ex-combatente, a isto sim saberia responder. (...)

(ii) Cherno Baldé (Guiné-Bissau):

(...) A semelhanca de alguns intervenientes, acho que esta sondagem só pode ter interesse na medida em que seja considerada simplesmente pedagógica e, ainda assim, ficam muitas questoes sem resposta, dependendo da posição o em que nos situamos e da perspectiva que temos do assunto, desde o mais pessimista aos mais positivos ou sentimentais.

(...) Eu não votei, na mesma linha que o Carlos porque, também, não sei qual a afeição que o povo português nutre em relação ao povo guineense, para além da evidente necessidade de encontrar um refúgio temporário que se transformaraá em definitivo mesmo se a Europa não levar a cabo a presente integração forçaada com capa de laicidade e de republicanismo que nunca existiram. (...)

(...) Quanto aos paises citados, podemos falar, sim, de afectos em relação aos Cubanos, mas duvido que o mesmo se possa dizer dos Russos e Suecos que são povos simpaticos, mas não conhecem o nosso povo, a nossa realidade e só ouviram falar de longe. Com os portugueses é diferente, foi uma relação difícil mas que deixou marcas que ninguém pode ignorar. (...)

(iii) António Rosinha: 

(...) Na Guiné ou em outra ex-colónia, quando algum cidadão desses países tem algum bom relacionamento com portugueses, corre o risco de os vizinhos ou colegas o alcunharem de "lacaio" ou mesmo no caso do crioulo "catchurro" do tuga.

Com o tempo esse risco pode diminuir, mas devido ao discurso político urdido por conveniências políticas, ainda vai demorar uns tempinhos ao estigma colonial desvanecer. (...)

(iv) José Belo (Suécia):

(...) Afectos entre povos em busca de graduações valorativas?

Nos exemplos apresentados,(portugueses, russos, chineses, cubanos,suecos, alentejanos, etc) aspectos menos platónicos não deveräo ser escamoteados. "Com carinho e com afecto" do luso-tropicalismo,ou "com economia e com afecto" à sueca? (...)

(v) António José Pereira da Costa:

(...) Olá,  Luís. Estou como disse o Beja Santos: continuas a provocar o "nativo". É bom. Para ver se isto aquece e o debate se instala, mas acho que as "declarações de voto" que acabo de aqui ver resumem muito bem a situação.
É certo que só os velhos e ainda por cima que passaram pela Guiné é que votam. Há um indício técnico para que quero chamar a tua atenção. Neste momento há convívios de ex-combatentes em que as mulheres vão para uma mesa e os maridos para outra.  Isto significa que elas, que nunca lá foram (...), começam a ter dificuldade em se rever no fenómeno e que os "ex-" estão cada vez mais sozinhos na sua nostalgia. (...)

(vi) C. Martins:

(...) Nem é preciso sondagens...digo eu. Quem já lá foi após a independência e desde que os tratemos com respeito manifestam-nos a sua profunda amizade e até os próprios guerrilheiros do PAIGC  pedem desculpa: "era a guerra" dizem ... mas agora podemos ser amigos. Falo obviamente da população, porque os "políticos"... sobre esses estamos conversados. (...)


(vii) Vasco Piers (Brasil):

(...) Dizes bem, Luís, mais exploradores que conquitadores.  Ousaria dizer, que somos o povo de um pequeno País de costas voltadas à Europa que precisou de buscar a sua subsistência (a partir do século XV) no mar e pelo mar.  Desde Ceuta,andamos por aí,em busca "do pão " que rareava em casa.  As feitorias, o ouro da Mina, os escravos, a "pimenta " da Índia, o ouro do Brasil, a volta a África, sempre em busca da subsistência como povo, e consequentemente da nossa existência como Nação.

Após a morte do nosso "último Imperador",e com o fim do sonho Imperial, voltamos á Europa,e parece que não deu muito certo.  Nessa nossa saga através dos mares,até longínquos povos,tivemos um relacionamento "sui generis" com esses povos, bem diferente dos nossos nossos vizinhos do Norte.  Miscigenamo-nos,como já tínhamos feito com Bérberes e Semitas,na África, na Ásia, na América, logo a nossa relação afetiva com outras gentes,foi necessariamente diferente da de outros colonizadores.

Melhor? Pior? Será que compete a nós dizê-lo? (...) (*)