Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 4740 > c. 1972/73 > O alf mil Luis Mourato Oliveira, "o fotógrafo de serviço".
Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 4740 > c. 1972/73 > O Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil inf CCAÇ 4740, Cufar, 1972/73, e Pel Caç Nat 52, Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74, subunidade "que desmobilizei e onde terminei a minha comissão já depois do 25 de Abril"; novo membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 730. Nascido em Lisboa, tem raízes na Marteleira e Miragaia, Lourinhã, pelo lado materno.
Lourinhã > Marteleira > Confraria da Batata Raiz de Cana > c. 2016 > O Luis Oliveira, bancário refomado, á volta dos tachos e panelas, na casa de um amigo e confrade. Temos vários amigos em comum (LG).
Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
1. Mensagem enviada pelo Luís Mourato Oliveira, com data de 7 do corrente:
1. Mensagem enviada pelo Luís Mourato Oliveira, com data de 7 do corrente:
Como vou tendo tempo e escrever exercita os neurónios, lembrei-me de escrevinhar algo diferente dos actos de guerra, mas que foram acontecimentos que os acompanharam.
Talvez o texto esteja demasiado extenso e, por isso, chato. Deixo à vossa consideração a publicação por partes porque na prática são quatro estórias.
Um grande abraço para vós e as melhores saudações tabanqueiras.
A gastronomia da região onde nascemos e crescemos por mais simples e “pobre” que seja, tem uma identidade de paladares e rituais que nunca abandonarão a nossa vida, e a ausência dos aromas e sabores da nossa infância é sempre motivo de nostalgia e até de saudade, por isso considero que a gastronomia constitui um pilar identitário e cultural a que às vezes é dada pouca importância.
Quando por razões imperiosas, como a guerra ou a emigração, nos afastamos do nosso chão. é que valorizamos, como quase tudo, as comidinhas que deixámos para trás e que o local onde passámos a viver não nos oferece.
Na Guiné devido a todas as dificuldades de logística, de conservação dos alimentos e até de aquisição de alguns bens que os naturais se recusavam a comercializar, a base da alimentação era o arroz, o feijão e as conservas que, sendo excelentes alimentos, a sua presença sistemática nos refeitórios e messes, acabava por saturar e fazer crescer a água na boca só com a lembrança de batata frita ou cozida, de uma boa sardinha assada ou de um simples bife com ovo a cavalo.
Na Guiné devido a todas as dificuldades de logística, de conservação dos alimentos e até de aquisição de alguns bens que os naturais se recusavam a comercializar, a base da alimentação era o arroz, o feijão e as conservas que, sendo excelentes alimentos, a sua presença sistemática nos refeitórios e messes, acabava por saturar e fazer crescer a água na boca só com a lembrança de batata frita ou cozida, de uma boa sardinha assada ou de um simples bife com ovo a cavalo.
Cufar > Pescador de rio ou de bolanha... |
Sempre que através de uma encomenda enviada pela família ou qualquer outro acontecimento invulgar nos permitia inventar um “petisco”, era uma festa e esse acontecimento passava a fotografia que ainda hoje figura no nosso precioso e muito íntimo álbum que é a memória.
Para além de algumas outras recordações, seleccionei quatro estórias de comida que partilho com os amigos e camaradas do Blog, para que as conheçam e recordem as vossas próprias aventuras gastronómicas na Guiné.
Para além de algumas outras recordações, seleccionei quatro estórias de comida que partilho com os amigos e camaradas do Blog, para que as conheçam e recordem as vossas próprias aventuras gastronómicas na Guiné.
I. Uma oferta
dos camaradas de Cacine permitiu maionese
em Cufar
Uma das ausências nos nossos pratos na Guiné, era o peixe fresco. Sobretudo quem vivia no litoral de Portugal tinha o pescado sempre presente na sua dieta e, embora muitos preferissem a carne que era cara e por isso de uso menos frequente, a falta do “peixinho” era notada.
Na companhia que estava estacionada em Cacine, esta falta não se sentia porque abundava peixe com qualidade no rio Cacine e um belo dia foi-nos enviado um de dimensões generosas pelos camaradas daquela unidade que certamente sabiam das nossas faltas [, em Cufar]. Se o projecto de almoço era uma delícia só para a vista, a imaginação foi ainda mais rápida e pensei imediatamente em maionese, um prato frequente em minha casa, sobretudo no verão, e de que tinha imensas saudades.
Na companhia que estava estacionada em Cacine, esta falta não se sentia porque abundava peixe com qualidade no rio Cacine e um belo dia foi-nos enviado um de dimensões generosas pelos camaradas daquela unidade que certamente sabiam das nossas faltas [, em Cufar]. Se o projecto de almoço era uma delícia só para a vista, a imaginação foi ainda mais rápida e pensei imediatamente em maionese, um prato frequente em minha casa, sobretudo no verão, e de que tinha imensas saudades.
Propus-me imediatamente para, como auxiliar de cozinha, produzir a desejada iguaria e não se perdeu tempo, não faltavam ovos, azeite, sal e vinagre pelo que o principal estava garantido e portanto mãos à obra!
Como tinha em miúdo auxiliado a minha mãe a confeccionar a maionese (segurava a tigela), segui os passos de que me lembrava e o molho foi aparecendo na enorme malga de aço com aspecto e gosto de que me lembrava e a grande quantidade produzida permitia, além de um bom exercício de musculação para antebraço e pulso, temperar o peixe já cozido e reservado para a degustação.
O problema foi a ausência de ervilhas, feijão-verde, alface, picles, beterraba, cenoura, azeitonas, enfim, faltava quase tudo o que normalmente acompanhava aquela refeição fresca e saborosa de que me lembrava mas felizmente não faltava o apetite, o peixe e as batatas o que já era quase literalmente uma lança em África.
O peixe e as batatas foram servidos e temperados com aquela deliciosa maionese de que ainda hoje me lembro e que talvez tivesse sido a primeira maionese servida na
Como tinha em miúdo auxiliado a minha mãe a confeccionar a maionese (segurava a tigela), segui os passos de que me lembrava e o molho foi aparecendo na enorme malga de aço com aspecto e gosto de que me lembrava e a grande quantidade produzida permitia, além de um bom exercício de musculação para antebraço e pulso, temperar o peixe já cozido e reservado para a degustação.
O problema foi a ausência de ervilhas, feijão-verde, alface, picles, beterraba, cenoura, azeitonas, enfim, faltava quase tudo o que normalmente acompanhava aquela refeição fresca e saborosa de que me lembrava mas felizmente não faltava o apetite, o peixe e as batatas o que já era quase literalmente uma lança em África.
O peixe e as batatas foram servidos e temperados com aquela deliciosa maionese de que ainda hoje me lembro e que talvez tivesse sido a primeira maionese servida na
Na região Oeste onde tenho as minhas origens, os coentros eram pouco utilizados, das poucas aromáticas que tenho memória figuram a salsa, a erva azeitoneira, o louro, a segurelha, a hortelã e a cidreira. A minha primeira experiência gustativa com os coentros surgiu por acaso em Cufar, na Guiné.
Um sargento do quadro permanente que, creio, prestava serviço no COP 4 ou no Pelotão de Intendência, alentejano de gema, não dispensava os coentros para recordar os sabores natais e convidou-me para uma açorda alentejana, prato que eu desconhecia, na minha região apenas tinha comido a dita de alho que acompanhava habitualmente peixe frito embora muitas vezes constituía acompanhamento e conduto.
Um sargento do quadro permanente que, creio, prestava serviço no COP 4 ou no Pelotão de Intendência, alentejano de gema, não dispensava os coentros para recordar os sabores natais e convidou-me para uma açorda alentejana, prato que eu desconhecia, na minha região apenas tinha comido a dita de alho que acompanhava habitualmente peixe frito embora muitas vezes constituía acompanhamento e conduto.
Claro que estas ofertas nunca se desperdiçavam e aderi de imediato ao petisco que foi confeccionado na minha presença pelo sargento que dispunha de uma pequena plantação da dita erva aromática.
Pisou os alhos com os coentros e o sal, juntou o azeite e água quente de cozer o bacalhau e regou com esta extraordinária mistura uma malga onde aguardava o bacalhau já desfiado e o pão que, não sendo alentejano, cumpriu de forma admirável a sua função.
Foi um petisco maravilhoso do qual guardo boa memória, neste caso trazida da Guiné, apesar de não ser um prato da região.
Uma prova que a convivência dos militares num cenário de guerra também fomentava a troca de experiências e informações sobre costumes e tradições das diversas regiões do país o que também contribuiu para o nosso enriquecimento como pessoas e como Portugueses.
Pisou os alhos com os coentros e o sal, juntou o azeite e água quente de cozer o bacalhau e regou com esta extraordinária mistura uma malga onde aguardava o bacalhau já desfiado e o pão que, não sendo alentejano, cumpriu de forma admirável a sua função.
Foi um petisco maravilhoso do qual guardo boa memória, neste caso trazida da Guiné, apesar de não ser um prato da região.
Uma prova que a convivência dos militares num cenário de guerra também fomentava a troca de experiências e informações sobre costumes e tradições das diversas regiões do país o que também contribuiu para o nosso enriquecimento como pessoas e como Portugueses.
(Continua)