quinta-feira, 12 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23258: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enf) Parte II

1. Parte II da publicação do texto de memórias intitulado "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra", de António Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (Bissau, Buba e Pelundo, 1969/71)


A MINHA PASSAGEM PELA GUINÉ-BISSAU EM TEMPO DE GUERRA

António Sebastião Figuinha
Ex-Furriel Miliciano Enfermeiro
CCS/BCAÇ 2884
1969/1970/1971
Parte II

L
ogo na primeira tarde que cheguei à Granja, deparei-me com uma situação que em Portugal muito se comentava, ou seja, que o Português batia com facilidade no Africano. Vi um Técnico de origem Cabo Verdiana, com uma verdasca, fustigando as costas de dois jovens que se encontravam transplantando arroz. Na Guiné por essa época, o arroz era primeiro semeado em viveiros e só depois era transplantado no local definitivo neste caso, na bolanha. Nos tempos atuais não sei como é cultivado.

Ao assistir aquela sena, gritei bem alto pedindo para que parasse, caso contrário eu teria que participar dele. O Técnico em causa, respondeu-me que só daquele modo trabalhavam como devia ser. Eu respondi-lhe que à minha frente não voltaria a acontecer, acrescentando que na metrópole se dizia que eram os brancos que batiam nos negros em África, mas aqui na Guiné, afinal, eram os naturais de Cabo Verde a bater neles. Pediu desculpas acrescentando que não voltaria a acontecer. Passado este episódio, tivemos um companheirismo muito grande até ao último dia que por aquele lugar passei. Acrescento que, por várias vezes fui convidado e aceitei, ir a casa dele que ficava no Bairro de Santa Luzia.  Acrescento também, apenas o Engenheiro-Chefe era banco, por esta altura na Granja.

A minha ida para a Granja, proporcionou-me criar amizades com civis, e principalmente com os meus colegas técnicos com os quais muito sobre a vida na Guiné vim a saber.

Este meu estágio veio a ser interrompido em Junho desse ano (1969), praticamente duas semanas depois de o ter iniciado. Fui por urgente necessidade dos serviços de saúde para o Sul da Guiné, mais concretamente para Buba, durante cerca de quinze dias.

Fui até ao aeroporto apanhar um héli destinado a levar-me para aquele local.
A viagem foi magnífica. O piloto fez questão de subir ou descer de altitude de maneira a eu tomar melhor noção sobre a paisagem florestal e pastagens daqueles locais. Eu tinha-lhe dito que na vida civil era Técnico Agrícola.

Cheguei a Buba e logo me fui apresentar ao Comando local e, de seguida, aos Médicos que na altura lá se encontravam.
A azáfama era grande naquele aquartelamento, tanto no enorme número de militares de várias especialidades (tais como Fuzileiros, Comandos, Páras, Cavalaria e Infantaria). Aqui conheci os Majores que no ano seguinte seriam assassinados na zona militar do meu Batalhão.

Além daqueles oficiais que vieram a ficar muito conhecidos pelo infortúnio que lhes aconteceu, também o Comandante Alpoim Calvão se encontrava neste Quartel, e um Capitão de uma Companhia Independente que eu tinha conhecido nas Caldas da Rainha, concretamente na 5.ª Companhia de Instrução, em Outubro de 1967, pela altura da minha recruta. Eu, nas Caldas da Rainha, estive na 6.ª Companhia comandada pelo Capitão Vasco Lourenço.

Este Capitão acabaria por ser castigado com vinte dias de prisão mais os seus Furriéis Milicianos, estes com quinze dias de prisão cada um. Tudo isto aconteceu logo uns dias a seguir à minha chegada a Buba. Vi chegar o General Spínola a quem se juntou logo o Régulo local. Este falou com o General acerca de umas mulheres que se encontravam retidas no Quartel. Elas tinham sido capturadas pela Companhia daquele Capitão que seria castigado com vinte dias de prisão por ter consentido que os seus Furriéis tivessem abusado sexualmente delas. Os Furriéis Milicianos foram castigados com quinze dias de prisão.

A minha primeira noite em Buba poderia ter sido fatal para mim. Éramos muitos Furriéis naquele abrigo. Todos os espaços livres estavam ocupados com as nossas camas. Eu, habituado a dormir descansado em Bissau, cedo peguei no sono. Por volta das duas e pouco da manhã, fui de repente acordado por um dos Furriéis para saltar da cama e me dirigir ao abrigo interno que na camarata se encontrava, mas, que eu ainda desconhecia. O quartel estava a ser atacado naquele momento.

Ensonado, não reparei que o abrigo era baixo demais para a minha altura e, como resulltado, bati com a minha cabeça no topo do muro da entrada caindo para trás desmaiado. Não mais dormi como necessitava em todos os restantes dias que ali permaneci.

O número de civis que lá se encontravam para a desmatação da estrada Buba/Aldeia Formosa era grande. Quando na segunda noite estive de serviço ao posto médico e, ao encaminhar-me para este, pisei vários homens que dormiam no chão ao ar livre em cima de papelões.

Tive aqui também a minha primeira experiência com alguém à beira da morte. Numa destas noites aconteceu que, tendo entrado no posto médico uma jovem em estado muito adiantado de gravidez e em coma, não sendo possível evacuá-la para o Hospital em Bissau pelo adiantado da hora, tentou-se que ela aguentasse até ao amanhecer. Entrei naquele turno por volta das duas horas da madrugada. Tive como principal missão fazer tudo o que fosse possível para que ela respirasse. Tinha apenas para isso uma ventosa para lhe extrair da boca o aglomerado de expetoração. Eram cerca de pouco mais das três da manhã quando a senti estremecer e verifiquei na quantidade de urina que corria debaixo do seu corpo. Uma lágrima corria-lhe dos olhos ao mesmo tempo que o a criança dava saltos na barriga da sua mãe já moribunda

Todo eu esmoreci. Chorei pela minha incapacidade para a salvar, ou pelo menos à criança que ali vi morrendo aos poucos naquela barriga inerte. Esta imagem ainda agora aviva a minha memória e a minha sensibilidade. Ajudou-me, porém, a ganhar estofo para poder vir a enfrentar outros casos traumáticos que poderia encontrar durante a guerra que se travava.

Nestes dias, e, enquanto lá permaneci, nunca tive um jantar à mesma hora. Evitava-se assim que do outro lado da bolanha nos enviassem uma morteirada para a messe como já tinha acontecido noutra altura. Outro caso peculiar naquele Quartel de Buba, foi o de, para tomarmos banho, só ser possível com a ajuda de um copo ou outro utensilio parecido para se retirar a água de um bidão e tantas vezes cheia de ferrugem, lançando-a pela cabeça e percorrendo o resto do corpo. Deste modo sentíamo-nos frescos e ferrugentos. No entanto, Buba situa-se na margem direita do Rio Grande de Buba com o seu cais muito falado e escrito de local de embarque de escravos. As suas águas eram salobras e, como tal, impróprias para tomarmos banhos.

Enquanto durou a desmatação da estrada, o nosso trabalho no posto médico foi intenso. Todos os dias as tropas e a população sofriam emboscadas. Os feridos eram sempre muitos. O material sanitário principalmente agulhas eram escassas. Foram uns dias para mim de grande experiência que me ajudou durante toda a restante comissão.

Aqui em Buba, vim a conhecer um Furriel Miliciano Enfermeiro natural da Freguesia da Lousa do Concelho de Moncorvo e, portanto, vizinho do meu concelho (Vila Nova de Foz Côa), que me pediu que enquanto eu lá estivesse e se acaso ele não regressasse vivo de alguma das patrulhas que quase diariamente efetuava, quando eu regressasse ao Continente, fosse contar à sua família como era o dia-a-dia dele para tal acontecer. Estranho pedido me era feito! Até aos dias de hoje não mais soube deste meu amigo que me ajudou a enfrentar o dia-a-dia naquele local onde praticamente todos os dias havia ataques ao aquartelamento. Durante pouco mais de duas semanas que aqui permaneci, muito trabalho tivemos (Médicos e Enfermeiros) com principalmente civis que lá se encontravam a trabalhar na desmatação da estrada que ligava este local a Aldeia Formosa. Um dia, verificamos que o material de pensos, seringas e agulhas estavam na penúria. Tive que deixar de cozer alguns golpes por falta de agulhas. A pele das pernas dos nativos era de tal modo dura, que muitas vezes, o bico da agulha se partia. Estes trabalhadores foram durante aqueles dias o alvo preferido da guerrilha. Eram dezenas de feridos diários.

Com o fim dos trabalhos de desmatação, deixou de ser necessária a minha permanência em Buba. Tratei de me escapulir o mais depressa possível daquele ambiente. Para tal, dirigi-me a um dos Oficiais do CAOP (Comando de Agrupamento Operacional que lá naquela altura se encontrava e que no Ano seguinte viriam a ser assassinados numa reunião com o PAIGC que relatarei na altura devida) que me disse para sondar os vários pilotos que lá diariamente se encontravam. Só não vim de boleia num Fiat (avião de combate) porque o piloto não tinha paraquedas para mim pois caso contrário eu tinha arriscado.

Um dos pilotos que sondei, indicou-me que fosse falar com o Coronel Paraquedista Alcino que iria para Bissau naquela manhã. Assim o fiz. Este senhor não hesitou em me dar boleia.
Durante o percurso e ao sobrevoarmos a povoação de Tite, o Coronel pediu ao piloto para baixar um pouco de modo a verificar a razão de fumos que pairavam no ar. Comentou que poderia ser rescaldo de algum ataque da guerrilha.

O Coronel Alcino aproveitou para me pregar uma partida. Pediu ao piloto para nos colocar de cabeça para baixo dando umas quatro voltas. Eu ia deitando as tripas fora. Não vomitei, mas devo ter ficado de tal modo pálido que ele pediu ao piloto para nivelar o voo.

Chegados ao aeroporto de Bissau, agradeci ao Coronel a boleia e ofereci-me para lhe levar ao meu ombro a G3 que ele transportava. Agradeceu e respondeu-me que naquele momento eu nem com as minhas pernas podia quanto mais com a G3! Voltei a encontrá-lo meses mais tarde no Pelundo. Homem extraordinário este!

De regresso a Bissau e ao Quartel Seiscentos, o meu dia-a-dia voltou a ter a rotina de na parte da manhã desenvolvendo serviços na enfermaria e ajudando o médico nas consultas, bem como orientar o material sanitário ao meu cuidado e repor as faltas de medicamentos necessários para os militares. De tarde, uma viatura militar continuou-me a levar à Granja Agrícola.

Durante os meses que aqui passei estagiando, fui aumentando os meus conhecimentos sobre as culturas tropicais. Também granjeei muitas amizades de naturais da Guiné e de descendentes de Cabo Verde. Praticamente, os meus contactos passaram a ser de civis, que ao fim de semana me convidavam para almoçar ou simplesmente lanchar.
Um destes era o chefe da secretaria da Granja na altura. Muitos fins-de-semana passei na sua companhia mais do meu colega de nome Elói. Este meu colega, após a independência da Guiné, veio trabalhar para Lisboa e no Ministério da Agricultura pois manteve a nacionalidade Portuguesa. Sei que voltou a visitar a sua terra Natal só após a saída de Luís Cabral da Guiné. Neste seu regresso, contou-me novidades que eu tive dificuldade em acreditar no que me dizia.
– Queres saber Figuinha que o chefe da secretaria da Granja em quem nós tanto tínhamos confiança com as nossas conversas era informador do PAIGC? - Eu fiquei aparvalhado!

Um outro colega e que me forneceu muitos conhecimentos durante todo o tempo que estive na Guiné foi o É Mê. Quando fui para o Pelundo ele foi para Teixeira Pinto chefiar a Granja local. Até ao fim da comissão mantivemos contactos. Apesar de ser familiar de Amílcar Cabral, sempre que necessitava de ir a Bissau procurava fazê-lo quando eu ia também na escolta. Há poucos anos vim a saber que tem casa na zona do Montijo/Barreiro.

Outros colegas vieram para Portugal logo após a Independência da Guiné. Um deles veio até viver para a margem sul perto da minha casa e aqui morreu. Mas, houve um muito especial e dos mais novos que lá conheci. No dia anterior ao meu embarque para Lisboa, encontrámo-nos num café onde ele me disse que brevemente nos iríamos de novo encontrar em Portugal. Achei naquele momento que não passava de mais uma das suas graçolas. Porém, passado pouco mais de um ano de eu ter chegado a Lisboa, o Borges Galvão estava junto de mim trabalhando no Instituto de Cereais.

Este Borges Galvão tinha um irmão que foi o primeiro representante do PAIGC na antiga Jugoslávia. O pai deles possuía uma farmácia em Bissau. Foi uma grande alegria minha tê-lo reencontrado. Brincalhão como era, havia sempre boa disposição junto dele. Recordo que um dia após ter vindo dum serviço externo na zona da Cidade de Lamego, me fez saber que os burros daquelas paragens não gostavam de ver pretos. Dei uma gargalhada e preguntei-lhe as razões daquele disparate. Então com um ar muito sério contou-me que junto a um ribeiro, perto de uma aldeia onde tinha que ir fazer um inquérito relacionado com a panificação, máquinas existentes, cereais utilizados, inquéritos estes, que decorreram em todo o País, verificou que ao tentar passar um pequeno ribeiro, um burro, que se encontrava a pastar, deu em correr em direção a ele zurrando com ar ameaçador. Então recuou e pensou que o dito burro poderia ter sido ensinado a morder aos pretos pelo dono. Que o dono do burro talvez tivesse tido um filho que por ventura tivesse morrido na Guiné, e, como tal tenha ensinado o burro a morder os pretos que lhe aparecessem pela frente. O Borges contou esta história com um ar tão sério que deu para galhofa durante meses.

Ambos fizemos na altura parte do Instituto dos Cereais e, a pedido do Governo, pretendeu-se ter informações precisas sobre a Indústria de Panificação. Tal como o Borges, eu andei também a fazer este levantamento.

Após a Independência da Guiné, o Borges regressou de novo para lá. A sua jovem mulher foi a primeira Ministra da Educação da Guiné-Bissau Independente.
Como um grande jogador que o Borges Galvão sempre foi, segundo me tinha contado, antes de vir para Lisboa trabalhar, limpou do seu ficheiro que tinha no arquivo da Granja em Bissau, as informações que ele tinha escrito de trabalhadores da Granja Agrícola de Bafatá onde esteve com responsável. O Borges não dava um passo em falso. A vida deste meu colega e amigo passou pela América e Paris pelo menos que eu saiba, conforme os cargos políticos que a mulher ia tendo. Perdi-lhe o rasto desde o ano dois mil, por força do encerramento da EPAC onde eu trabalhava. Deste modo consegui durante vários anos ser informado sobre o que se ia passando naquele País.

Voltando à minha atividade militar, enquanto permaneci em Santa Luzia no Quartel Seiscentos, aconteceu aqui um grande incêndio com muitos rebentamentos de granadas e a destruição de instalações lá existentes. O acontecimento deu-se a seguir ao almoço, encontrava-me no quarto que ocupava com mais dois Furriéis Milicianos e um Segundo Sargento Corneteiro. Os Furriéis eram o Martins (Vaguemestre) e o Wilson Ribeiro meu colega civil de profissão. Os estrondos eram tão fortes que o edifício estremecia a cada rebentamento.
O primeiro a zarpar dali foi o dito Sargento que numa corrida só deve ter parado no centro da Cidade de Bissau. Nós os três tivemos mais calma e zarpamos na mesma para a Cidade.

Por este quartel passavam muitas companhias de militares de regresso ao Continente. Aqui permaneciam durante tempos elementos do quadro permanente encargados das comissões liquidatárias de Batalhões ou de Companhias independentes.

Conheci de perto alguns primeiros-sargentos preocupados com os acertos de contas das respetivas unidades a que pertenciam. Constou-se que foi um destes casos que por descuido ou não, deixou no cesto de papéis um cigarro mal apagado. Parecia que o quartel estava a sofrer um bombardeamento. Saí como outros demais para a cidade não fosse cair uma granada nos aposentos onde me encontrava. O General Spínola apareceu e mandou logo a polícia militar investigar o caso. Outros detalhes não fiquei a saber ou a minha memória pode falhar e não escrever a verdade.

Como o material sanitário do quartel estava sobe a minha responsabilidade e as movimentações eram muitas de outros Furriéis Enfermeiros que por lá passavam, sempre que me ausentava de tarde para a Granja Agrícola ficava tenso. Aconteceu que aquando tive que me preparar para ir juntar-me aos restantes elementos da Companhia que aos poucos foram indo para o Pelundo, tive que fazer ajustes no material e, para tal, contei com a boa ajuda do pessoal do Material Sanitário de Bissau que se encontrava junto ao Hospital Militar.

Durante este período, houve um caso de saúde de um militar duma Companhia que se preparava para regressar ao Continente que me deixou perplexo e ao Médico também. Apresentou-se queixoso dos órgãos genitais e cheio de febre. O Médico solicitou para baixar as calças e tirar as cuecas e, nesse momento, um cheiro fedorento transmitiu do seu corpo. Eu nunca pensei ver de perto um caso daqueles. O Médico que tinha a especialidade de Urologia disse-me que nunca tinha visto algo igual. De um dos lados dos testículos apresentava um buracão de tecidos podres. O Médico perguntou-lhe como era possível deixar-se chegar aquele estado, ainda para mais homem casado. Chamou-lhe de porco para cima. Este caso foi um alerta para mim dos perigos de doenças sexuais em climas quentes e húmidos.

Pelos conhecimentos que adquiri ao longo da comissão, creio ser uma das causas de muitos militares com stress dessa época devido a casos que nunca os conseguiram curar devidamente. Tive casos em que já não tinha antibióticos capazes de os curar. Infelizmente muitos destes casos já foram do Continente para lá.

Durante os meses que permaneci em Bissau e, também em outros momentos que do mato tive que vir a esta cidade, fui encontrando um ou outro conterrâneo. Um deles, quase todos os fins de semana me procurava para lhe arranjar uns xaropes que lhe completassem deficiências da alimentação que tinha na sua unidade. O Carlos (conhecido em Foz Côa mais por a alcunha de Fatinário) muito meu amigo, estava encargado de vigiar uns militares nossos presos que ao fim de semana lhes era permitido arejar e dar um passeio fora da prisão.

Outros encontrei de vez em quando como seja o Adriano (conhecido pelo Pote) o Sequeirinha, o filho da Ratoeira, o Aventino Guerra e um dos Maximinos que era filho de um pastor de ovelhas.

Ainda durante o tempo que passei pela Granja, vim a saber lá que Amílcar Cabral durante a sua permanência na chefia e na sua construção, foi desviando cimento que era destinado à construção de casas para os seus trabalhadores e, principalmente, para as Granjas de Bafatá e Teixeira Pinto. Este cimento foi utilizado na construção de abrigos subterrâneos nas duas matas mais densas da Guiné.

(Continua)
____________

Nota do editor

Primeiro poste da série de 10 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23253: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enf) Parte I

Guiné 61/74 - P23257: Convívios (926): 35.º Encontro do pessoal da CART 3494/BCAÇ 3873, dia 11 de Junho de 2022, na Carapinheira, Montemor-O-Velho (Sousa de Castro)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 8 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23246: Convívios (925): 50.º Convívio do pessoal da CCAÇ 414 (Cabo Verde, 1963/64 e Guiné, 1964/65), a levar a efeito no próximo dia 29 de Maio em Aveiro (Manuel Barros Castro, ex-Fur Mil Enfermeiro)

quarta-feira, 11 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23256: Ser solidário (245): Convite para a apresentação do livro "Terra de Afetos - Um Tributo à Guiné-Bissau", por Joana Benzinho, dia 21 de Maio de 2022, pelas 15h45, no Mosteiro de Odivelas. A receita da venda deste livro reverte para a ONGD Afectos com Letras


Caras e Caros Amigos,
Dia 21 de maio será lançado o livro "Terra de Afetos - Um tributo à Guiné-Bissau", de Joana Benzinho, cuja receita da venda reverte para a ONGD Afectos com Letras.
O evento decorre no Mosteiro de Odivelas às 15h45, com apresentação da Jornalista Sofia Pinto Coelho, autora do prefácio.
Contamos com a vossa presença.

Cumprimentos solidários.



Associação Afectos com Letras, ONGD
Rua Engº Guilherme Santos, 2
Escoural , 3100-336 Pombal
NIF 509301878
tel - 91 87 86 792
venha estar connosco no www.facebook.com/afectoscomletras

____________

Nota do editor

Último poste da série de 27 DE MARÇO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23118: Ser solidário (244): Coro Municipal e população da Lourinhã, 27 de março de 2022, 11h00: Orar pela paz na Ucrânia

Guiné 61/74 - P23255: Historiografia da presença portuguesa em África (316): Anais do Conselho Ultramarino: Curiosidades da Guiné (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Maio de 2021:

Queridos amigos,
Revelou-se bastante esclarecedora a leitura do livro de Marcello Caetano O Conselho Ultramarino, Esboço da sua História, Agência Geral do Ultramar, 1967. O investigador explica-nos de forma iniludível como Fontes Pereira de Melo criou um órgão de grande autoridade e abrangência, escolheu mesmo vogais efetivos e extraordinários de gabarito, e daí dizer-se que de 1854 a 1868 o Conselho Ultramarino viveu um período distintíssimo, obviamente que suscitando invejas políticas e muitas tensões pelos pareceres emanados e a legislação que sugeria. Como sempre acontece, os seus inimigos assim que chegaram ao poder puseram-no em coma induzido. E é por isso que dá gosto folhear estes volumes cheios de memórias, pareceres, estudos, a generalidade deles direcionados para Angola mas também percorrendo as diferentes parcelas do Império, aqui se encontram surpresas que qualquer investigador da área imperial não pode ficar indiferente, basta ver esta Guiné, seguramente a colónia mais pobrezinha de estudos, pareceres e memórias.

Um abraço do
Mário



Anais do Conselho Ultramarino: Curiosidades da Guiné (3)

Mário Beja Santos

Perguntará o leitor que importância se pode atribuir às matérias constantes nestes anais. A primeira parte da resposta passa por atribuir importância ao Conselho Ultramarino, um órgão que iniciou a sua vida em tempos de Filipe II, teve interrupções, e mesmo com outras designações chegou a abril de 1974. As obras que estão em consulta na Biblioteca da Sociedade de Geografia referem-se concretamente ao período encetado na governação de Fontes Pereira de Melo e que irá durar até à década seguinte. Iniciei a consulta na série 1.ª, vai de fevereiro de 1854 a dezembro de 1858, a edição é da Imprensa Nacional, 1867. Tem-se a sensação quando se folheia estes anais que têm qualquer coisa a ver com o Diário da República Colonial, o Conselho Ultramarino funcionava junto do Paço, refere nomeações, condecorações, composição de comissões, autorização de despesas… No artigo anterior, detetei agora, cometi o erro ao considerar que a parte oficial destes anais incluíam pareceres e até estudos, é redondamente falso, a parte oficial contempla a legislação, toda a outra matéria é versada na parte não oficial. E agora, uma breve explicação sobre a vida neste período do Conselho Ultramarino que os investigadores consideram um dos mais brilhantes e dinâmicos da sua história. Ele insere-se no período da Regeneração, este Conselho teve este período áureo entre 1851 a 1868. Deve-se a quê?

Em julho de 1851, tendo triunfado a Regeneração, Fontes Pereira de Mello decretou um novo Conselho Ultramarino, a fonte inspiradora terá sido Almeida Garrett. Era composto por sete vogais efetivos e sete extraordinários. No seu trabalho sobre a história do Conselho Ultramarino, Marcello Caetano, em publicação da Agência Geral do Ultramar datada de 1867, fala das suas amplas competências: tinha de ser necessariamente ouvido sobre importantes matérias legislativas, governativas e da administração, e tinha poder para emitir consulta nos recursos contenciosos entrepostos para o Governo dos atos dos governadores coloniais; podia tomar a iniciativa de estudar e propor providências a adotar pelo governo, fiscalizar e recrutar o funcionalismo ultramarino. Missão especial era a de velar pela execução das leis sobre o tráfico da escravatura e de estudar a colonização, dirigindo para o mundo ultramarino a emigração que se encaminhava para o estrangeiro. As resoluções do Conselho eram convertidas em consultas, provisões ou portarias, conforme os casos. Em 1854, iniciou-se a publicação do boletim e anais do Conselho Ultramarino. Os anais eram a parte oficial contendo os atos do Governo e da administração, consultas do Conselho, resoluções dos tribunais superiores, relatórios, etc., e a parte não oficial era constituída pelo acervo de memórias, notícias, narrativas e quaisquer estudos sobre matéria colonial. Como é evidente, este órgão deverá ter provocado imensos engulhos e reticências, em setembro de 1868 foi extinto e criado em sua substituição a Junta Consultiva do Ultramar. Com a I República, surgirá o Conselho Colonial (1911 a 1926).

Esclarecido o que é a parte oficial da não oficial, dá-se agora conta de alguma matéria que possa ser considerada útil para o estudo da Guiné, e que não venha noutras fontes documentais.

Em 22 de dezembro de 1857, João Severiano Duarte Ferreira, Diretor da Alfândega de Bissau, dirige-se ao Sr. Visconde de Sá da Bandeira que o encarregara de apresentar algumas reflexões relativas ao comércio da Senegâmbia Portuguesa, causas da sua decadência e meios a empregar que obstem à sua completa aniquilação. Diz ele:
“No tempo em que de Bissau e Cacheu se exportavam escravos, pouca ou nenhuma importância se dava naquelas localidades ao comércio lícito, porque dois ou três negociantes que ali residiam só tratavam de obter dos estrangeiros a maior soma possível de mercadorias próprias para a compra de escravos, com o fim de embarcar estes por sua conta para a ilha de Cuba e para os portos do Brasil, ou para os venderem aos navios que iam ali buscá-los. Os lucros resultantes deste tráfico inumano eram enormes, e aumentavam na razão direta das dificuldades no transporte dos negros. Em 1842, cessou completamente a exportação de escravos de Bissau e Cacheu, e foi então que os negociantes olharam com mais alguma circunspeção para o comércio lícito que até ali tinham, por assim dizer, desprezado. O Governo da Província ignorava completamente quanto dizia respeito a Bissau, Cacheu e dependências, porque poucos dos governadores ali iam, e os que iam, tão pouco tempo ali se demoravam, que retiravam tão instruídos das coisas da Guiné como tinham ido; e eis por que nem propunham ao Governo da Metrópole as medidas que convinham adotar para o desenvolvimento comercial e agrícola daquela parte dos domínios de África.

Quando o comércio lícito entrou a chamar a Bissau e a Cacheu maior soma de navios estrangeiros, e exportação, que até ali tinha sido clandestina, por ser de escravos, se tornou patente e visível, por ser de produtos do país, o Governo Provincial fixou para ali com mais cuidado a sua atenção. Mandou a Bissau empregados da sua confiança e orientou-se quanto lhe foi possível na importância comercial daqueles pontos; mas no desejo de remediar o mal até ali feito, de conceder por quatro o que vali pelo menos doze, caiu no extremo oposto exigindo mais do que realmente se podia e devia exigir pelos direitos de exportação e consumo.

Fala-se geralmente em comércio português de Bissau e Cacheu, quanto a mim aquele comércio é mais estrangeiro do que nacional, porque os negociantes portugueses residentes naqueles pontos não são outra coisa mais do que caixeiros das casas comerciais e inglesas, americanas, francesas e belgas, que autorizam os seus agentes a deixarem a crédito a diversos os carregamentos que para ali mandam”
.

Nesta detalhada memória para o Visconde de Sá da Bandeira, o Sr. João Severiano Duarte Ferreira tudo faz para ser minucioso: como se processa o comércio de Bissau, Cacheu e dependências; a natureza do crédito dos negociantes estrangeiros, em que os negociantes de Bissau e Cacheu chegam a dar como garantia as casas das embarcações, os escravos, tudo o que possuem; as enormes despesas inerentes ao comércio ao longo da costa correm todas por conta e risco dos negociantes portugueses ali residentes, são um sorvedor dos lucros; e temos a exorbitância dos direitos de exportação e consumo, que coloca os comerciantes portugueses em desvantagem com os comerciantes estrangeiros das colónias vizinhas, etc.

E em jeito de despedida, faz sugestões a Sá da Bandeira:
“No meu entender, a mancarra devia não só ser livre de direito de saída, mas ainda estabelecer-se um prémio honorífico para aquele negociante que maior porção dela exportasse nos portos de Bissau e Cacheu. Uma pauta ou tabela de direitos, tal qual deve ser, não é trabalho de poucos dias, nem talvez de um só indivíduo, deve ser muito estudada e meditada, devem-se consultar documentos oficiais e ouvir as pessoas competentes. Talvez este trabalho, entregue a uma comissão em Bissau, vindo os trabalhos dela relatados pelo governador-geral da Província, e finalmente vista e examinada aqui por pessoas entendidas na matéria e conhecedoras das localidades, desse o resultado que se deseja. Deus guarde a Vossa Excelência por muitos anos”.

Não deixa de ser curioso observar que esta situação comercial de ultra dependência é também observada e documentada por outros autores que por aqui andaram um pouco antes e muito depois. Estamos perto de nos despedir, há só mais dois documentos muito curiosos de que vos daremos conhecimento no texto seguinte, o último sobre estes anais do Conselho Ultramarino.

(continua)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 4 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23227: Historiografia da presença portuguesa em África (315): Anais do Conselho Ultramarino: Curiosidades da Guiné (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23254: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte XIV: Conto - O lobo e a lebre vão à pesca (pp. 75/78)





Ilustração (pp. 75 e 77) do mestre Augusto Trigo, pai da pintura guineense e grande ilustrador,
a sua obra é uma referência.



O autor, Carlos Fortunato, ex-fur mil arm pes inf, MA,
CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, é o presidente da direcção da ONGD Ajuda Amiga


1. Transcrição das pp. 75-78 do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau", com a devida autorização do autor (*)



J. Carlos M. Fortunato > Lendas e contos da Guiné-Bissau



Capa do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau / J. Carlos M. Fortunato ; il. Augusto Trigo... [et al.]. - 1ª ed. - [S.l.] : Ajuda Amiga : MIL Movimento Internacional Lusófono : DG Edições, 2017. - 102 p. : il. ; 24 cm. - ISBN 978-989-8661-68-5



Conto - O lobo e a lebre vão à pesca 

(pp. 75/78)


Ouvindo dizer que a lebre tinha um barco para pescar e que pescava muito peixe, um dia o lobo (hiena) pediu à lebre para ir à pesca com ele.

A lebre não queria ir com o lobo, pois sabia que ele era mau, mas teve medo de dizer que não, pois o lobo era até capaz de a comer, e assim disse que iriam os dois à pesca no dia seguinte.

O lobo e a lebre desceram o rio de canoa e a dada altura a lebre disse ao lobo:

−  Fica a pescar neste lugar, que tem muito peixe, que eu vou pescar mais à frente.

−  Está bem −  disse o lobo.

O lobo não pescava nada, mas a lebre não parava de gritar de contente:

−  Já apanhei um! Já apanhei dois! Já apanhei três! Quatro! Cinco! −  a lebre não parava de apanhar peixe, e o lobo nada.

O lobo furioso por não apanhar peixe, foi ter com a lebre e gritou-lhe zangado:

 Enganaste-me! No meu lugar não há peixe, mas eu vou ficar com o teu peixe e vou vender-te no mercado.

−  Tu é que não sabes pescar ou não tens sorte −  respondeu a lebre.

O lobo amarrou a lebre, meteu-a dentro da canoa e remou para a outra margem do rio, onde havia um mercado.

A lebre ficou aflita, mas arranjou logo um plano para enganar o lobo, ecomeçou cantar.

O patrão está a cantar,
o criado a remar,
que boa viagem vão dar.

O patrão está a cantar,
o criado a remar,
que boa viagem vão dar.


O lobo ao ouvir esta cantiga, disse logo:

−  Eu não sou teu criado, eu é que sou o patrão.

−  Tu é que estás a remar, eu estou a descansar, se não queres ser o criado, então podemos trocar.

−  Está bem −  disse o lobo.

A lebre trocou com o lobo, mas amarrou-o bem, e continuou a remar para ir ao mercado

O lobo, satisfeito, foi todo o caminho a cantar:

O patrão está a cantar,
o criado a remar,
que boa viagem vão dar.

O patrão está a cantar,
o criado a remar,
que boa viagem vão dar.


Quando estavam a chegar à margem, o leão, o hipopótamo, a girafa e todos os outros animais que estavam no mercado vieram ver o que se passava, e comentaram:

−  A lebre traz uma coisa para vender.

O lobo ao ver que estavam a chegar à margem, disse à lebre:

−  Desamarra-me! Rápido!

− Eu não te vou desamarrar, eu vou vender-te no mercado  
−  respondeu a lebre.

−  O quê? Eu sou mais forte do que tu! Desamarra-me ou eu mato-te - disse o lobo ao mesmo tempo que se mexia, tentando libertar-se das cordas.

A canoa começou a abanar, devido aos movimentos do lobo para se libertar, e a lebre disse-lhe:

Vais virar a canoa, e como estás amarrado vais morrer afogado, e eu vou nadar para terra, é melhor não te mexeres.

O lobo com medo ficou quieto, e a lebre vendeu-o ao leão.

E foi assim, que a lebre se conseguiu livrar do lobo.


2. Vamos ajudar a Ajuda Amiga: com pouco podemos ajudar muito

Donativos em Dinheiro



Conta da Ajuda Amiga

NIB 0036 0133 99100025138 26

IBAN PT50 0036 0133 99100025138 26

BIC MPIOPTPL

Declaração de IRS Solidária

Caro/a leitor/a: O Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné é solidário com organizações não-governamentais para o desenvolvimento que trabalham na Guiné-Bissau, como a Ajuda Amiga.

Podes fazer uma declaração de IRS solidária, não tem quaisquer encargos para ti.

A Ajuda Amiga é uma Pessoa Coletiva de Utilidade Pública e são muitas pequenas ajudas que lhe permitem realizar a sua Missão.


Ajuda Amiga ONGD > NIF > 508 617 910


Donativos em Espécie

Os bens em espécie que a Ajuda Amiga valoriza, prioritariamente, neste momento, são:
  • Dicionários de português;
  • Gramáticas básicas de português;
  • Material escolar;
  • Computador portátil;
  • Impressora laser;
  • Bolas de futebol.
3. Ajuda Amiga > Contactos:

J. Carlos M. Fortunato
Presidente da Direção da ONGD Ajuda Amiga
E-mail jcfortunato2010@gmail.com | E-mail jcfortunato@yahoo.com
Telem. +351 935247306

Escritório > Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
Rua do Alecrim, nº 8, 1º dtº
2740-007 Paço de Arcos

Sede > Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento
Rua Mário Lobo, nº 2, 2º Dtº.
2735 - 132 Agualva - Cacém

Armazém > Centro de Atendimento da União das Freguesias do Cacém e São Marcos
Rua Nova do Zambujal, 9-A, Cave
2735 - 302 - Cacém

NIPC 508617910
ONGD – Organização Não Governamental para o Desenvolvimento
Pessoa Coletiva de Utilidade Publica

Sítio: http://www.ajudaamiga.com

Facebook: https://www.facebook.com/Ajuda-Amiga-1050756531631418/?ref=hl

E-mail: ajudaamiga2008@yahoo.com

Telemóvel: +351 937149143
____________

terça-feira, 10 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23253: "A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra" (António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enf) Parte I

1. Damos hoje início à publicação de um texto de memórias intitulado A Minha Passagem pela Guiné-Bissau em Tempo de Guerra, de António Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (Bissau Buba e Pelundo, 1969/71)[1]


A MINHA PASSAGEM PELA GUINÉ-BISSAU EM TEMPO DE GUERRA

António Sebastião Figuinha
Ex-Furriel Miliciano Enfermeiro
CCS/BCAÇ 2884
1969/1970/1971
Parte I

Introdução

O meu objetivo com este texto é tão só, deixar um pequeno resumo, do que foi o meu dia-a-dia naquela época, para os meus filhos e netos. Como tal, e provando que não é ficção, menciono os nomes reais de cada um dos intervenientes neste meu texto.


Aproximava-se o fim do mês de Abril de 1969 quando, numa manhã, recebi um telefonema da Secretaria do Hospital Militar Principal dando-me a notícia que tinha dez dias para me ir despedir da minha família, comprar o fardamento e me apresentar, dia seis de Maio até às vinte e quatro horas no Porto Brandão, de modo a poder embarcar no dia seguinte para a Guiné no navio Niassa.

Tinha passado pouco mais de um mês a ser alvo de uma participação que me levaria também para a Guiné, mas, desta vez como soldado. O meu posto na altura era o de Cabo Miliciano, e a pouco mais de quinze dias de ser promovido a Furriel Miliciano.

Tudo aconteceu ao fim do jantar. Era Domingo e a refeição foi bife com batatas fritas.

O refeitório encontrava-se no edifício do Hospital Militar ao Jardim da Estrela. Aqui eram fornecidas refeições juntando no refeitório Cabos Milicianos, Cabos RD e Soldados.

Naquela noite de Domingo tudo parecia correr bem até ao momento que um dos Cabos Milicianos recém-chegados a este Hospital para realizarem o estágio de Enfermagem, resolveu acender um cigarro. Este esqueceu-se que não era permitido fumar no refeitório, mas, entusiasmado na galhofa com outros cometeu este lapso.

Nesse dia, encontrava-se de Sargento de dia à Formação o Primeiro-sargento de nome Nunes. Ao ver o Cabo Miliciano acender o cigarro, levantou a voz vinda do fundo da sala e da porta de entrada ordenando ao infrator que fosse fumar para fora do refeitório nestes termos:
- Ó nosso Cabo, não sabe que não se pode fumar no refeitório!
 
O Miliciano infrator, como havia dois tipos de Cabos no refeitório, não se apercebeu que era para ele a reprimenda. Eu, não gostando da forma como a ordem tinha sido dada, com ironia cheguei junto do Cabo Miliciano infrator dizendo-lhe em voz alta que o Sargento se estava a dirigir a ele. Como eu citei Sargento e não Primeiro-sargento, atirou-se a mim furioso, dizendo que lhe tinha faltado ao respeito perante todos os presentes e como tal, iria participar de mim. Respondi-lhe que para ser respeitado ele teria que se dar também ao respeito e ter chamado de cabo Miliciano ao infrator e não apenas de Cabo, dado encontrarem-se outro tipo de Cabos no refeitório. Mais, disse-lhe que as Ordens de Serviço ao Hospital ou à Formação para fazermos os mesmos serviços que ele estava desempenhando naquele momento nos referenciava com Cabos Milicianos e não apenas como Cabos. Se para ele, nós não passávamos apenas de Cabos também, me sentia no direito de apenas o tratar por Sargento e não como Primeiro-sargento. Mais eu já de cabeça perdida e olhos nos olhos lhe disse que quando eu saísse do Serviço Militar tinha um curso para trabalhar enquanto ele, acaso acontecesse o mesmo, restava-lhe ir para pastor de gado.

Saí de seguida porta fora numa pilha de nervos. Este homem, vim a saber, tinha fama e proveito de nos provocar.

Nessa noite fui vaguear por Lisboa tentando acalmar e, só de madrugada, me deitei um pouco.

Na manhã do dia seguinte, ao atravessar os portões da entrada principal do Hospital, soube que a minha situação como militar estava complicada porque só faltava a participação ser assinada pelo Director do Hospital.

Voltei de imediato a sair para o exterior do Hospital e dirigi-me de imediato à Escola de Serviço de Saúde, para solicitar ao Capitão que dirigia esta Escola o seu apoio.
Toquei à porta do seu gabinete pedindo para poder entrar já que tinha um assunto muito urgente que me envolvia e, para o qual necessitava do seu apoio.

Ao reparar no estado nervoso que eu apresentava, solicitou que com calma lhe narrasse os motivos que me levavam a pedir a sua ajuda. Contei-lhe então com todos os pormenores que levaram o Primeiro-sargento Nunes a querer participar de mim ao Director do Hospital. Despois de me ter ouvido, levantou o seu telefone ligando para aquele Sargento pedindo-lhe para que ele de imediato se dirigisse ao seu gabinete e fosse portador da participação que tinha em seu poder porque tinha urgência em falar com ele.
Enquanto o Sargento Nunes não chegou, o ajudante deste Capitão também um Primeiro-sargento, dirigiu a palavra ao seu chefe dizendo-lhe que eu era merecedor do castigo já que no entender dele, sabia de mais e, como tal, ao ser castigado, daria um exemplo a todos os outros Cabos Milicianos. Ao ouvir estas palavras, o Capitão levantou a voz dizendo-lhe que eu não tinha de ser castigado para servir de exemplo a ninguém! Tinha as melhores referências a meu respeito e, como tal, me iria defender a todo o custo. Olhou para mim dizendo-me para me acalmar pois tudo se ira resolver e, instruiu-me que, mal chegasse o Primeiro Nunes lhe pedisse desculpas pelos males entendidos por ele já que nunca tinha sido minha intensão faltar-lhe ao respeito o que era verdade.
Assim, mal o Primeiro Nunes entrou no gabinete, o Capitão estendeu-lhe a mão para que nela fosse colocada a referida participação. Surpreendido, recuou um passo dizendo que não o podia fazer. De novo o Capitão levantou a voz dizendo que fizesse o favor de lhe entregar a folha de papel para ser ali em frente de todos nós rasgada. Felizmente para mim assim aconteceu.

Mal me vi na rua e liberto daquele pesadelo, jurei para mim mesmo que doravante, nenhum filho da mãe militar me voltaria a pisar pois tinha acabado de levar um forte murro no estomago ao ter que pedir desculpas a um dos mais patifes Sargentos do Hospital Militar Principal.
Porém, o meu confronto com este militar não ficou encerrado naquele dia. Mais tarde e passado mais de um ano e encontrando-me de férias no Continente vindo pela segunda vês da Guiné, antes de embarcar de novo para aquele território Ultramarino, passei uns dias em Lisboa. Como namorava com uma Fisioterapeuta (mais tarde minha mulher), que naquela altura trabalhava no Hospital Militar Principal, fui visitá-la e, para isso, apanhei transporte num elétrico na Rua da Conceição que se dirigia para o Largo do Jardim da Estrela. Qual o meu espanto ao ver que na plataforma do elétrico se encontrava o dito Primeiro-sargento Nunes, que no passado tinha tentado destruir a minha vida. Não resisti e lancei-lhe as minhas mãos ao seu pescoço apertando-o e chamando-lhe todos os nomes que me vieram à cabeça. Dois outros passageiros me seguraram e, ao mesmo tempo perguntaram-me das minhas razões para te tomado aquela atitude. Contei-lhes e prontificaram-se a atirar com ele da plataforma do elétrico em andamento se fosse o meu desejo. Acalmei e segui a viagem sem mais olhar para ele.

Visitei a minha namorada combinando com ela me encontrar antes de apanhar o avião da TAP para Bissau. Contou-me mais tarde que o dito Primeiro-sargento ao ver-me falar com ela no Hospital, preguntou-lhe se me conhecia ao que ela lhe respondeu ser seu namorado. Remédio santo, sempre que a via a tratava com as melhores simpatias do Mundo.

Voltando ao momento da minha mobilização para a Guiné, logo na manhã do dia seguinte, (7 de Maio de 1969) e após ter tomado o pequeno-almoço, encaminhei-me com outros militares para uma das camionetas que nos levariam com destino ao cais de Alcântara em Lisboa, onde se encontrava o navio que nos iria levar até à Guiné.

No local, uma multidão de pessoas se encontrava para uma despedida cheia de emoções. Despediam-se dos seus filhos, namorados ou simplesmente amigos, dado a incerteza que havia, de um regresso com saúde. Não nos podíamos esquecer que partíamos para um teatro de guerra.

Como as minhas origens familiares eram do interior Norte e de precários recursos, não tive nenhum familiar próximo na despedida, mas somente, uma namorada recente e uma grande amiga quase familiar.

Na altura das despedidas, e quando me preparava para iniciar a subida das escadarias para o navio, vi uma cara bem minha conhecida da minha terra natal que também ia embarcar no mesmo navio. Era o Alferes Jorge Fachada, natural de Foz Côa como eu. Também ia para a Guiné, mas fazendo parte de um outro Batalhão e para locais diferentes do meu.

Apesar de verificar que não iria fazer parte do Batalhão onde eu estava inserido, senti-me mais confortado porque já não me iria sentir tão só durante a viagem.
Ao lado dele e no convés do navio, fomos correspondendo ao adeus dos nossos à medida que o navio se ia desviando do cais. Os gritos de adeus eram muitos. Senti que o meu peito se apertava angustiado. Não consegui deitar uma lágrima. Todo eu era um vazio.

Durante os sete dias da viagem fui conhecendo aqueles que comigo iam estar próximos (Médico, Cabo Enfermeiro e os quatro Maqueiros) mais, alguns Furriéis Milicianos da Companhia CCS do Batalhão 2884. Também eu e o Jorge fomos aproveitando umas iguarias que a minha namorada e familiares dele nos deram antes do embarque.

A viagem decorreu sem sobressaltos. Ao aproximarmo-nos do Golfo da Guiné, um bafo quente e húmido se ia sentindo. Piorou ao entrarmos no estuário do Rio Geba com a Costa à vista e as águas turvas.
Antes do navio encostar ao cais em Bissau, despedi-me do Jorge Fachada para não mais o voltar a ver naquelas paragens. Voltei a vê-lo felizmente já em Lisboa.
Conforme o navio se preparava para atracar, via o cais cheio de pessoas, mas, principalmente, muitos garotos que nos solicitavam para atirarmos moedas para a água a fim de eles mergulhare apanhando-as. Estas imagens deixaram-me triste e meditei se Deus algum dia teria passado por aqueles locais. Foi o primeiro grande sentimento de mágoa ao começar a verificar o atraso daquele território.
Salta Periquito salta, gritavam os miúdos em coro conforme íamos descendo para o cais.

Fui levado dali para um Quartel Seiscentos em Santa Luzia que ficava perto do Quartel-general em Bissau. Aqui ficou instalada a Companhia CCS da qual eu fazia parte. As restantes três Companhias Operacionais foram respetivamente para o Pelundo, Jolmete e Có.

A primeira noite foi dormida em cima de uma manta que tapava as folhas de zinco da cama. Acordei todo marcado pelas folhas de zinco e pelas mordidelas de tantos percevejos. Resolvi fazer logo uma limpeza a estes parasitas. Procurei uma vela fazendo-lhes um belo churrasco.

No dia seguinte fui conhecer o Posto de Saúde acompanhado pelo Médico do Batalhão com quem vim a aprender muito de saúde ao longo da comissão, mais o restante pessoal de saúde da CCS.

O meu primeiro trabalho foi receber e verificar todo o material sanitário que iria ficar sob a minha responsabilidade durante o tempo que permanecesse naquele Quartel. Logo ali começou a minha grande lição no sentido de estar com os olhos bem abertos ao inventário daquele material. Este meu cuidado viria a dar-me muito jeito no futuro. Mesmo estando ao meu lado o Médico, conseguimos ainda ser enganados. Aprendi que a tarimba dos mais velhos e o meio militar em tempo de guerra é diabólico. Estes pequenos erros fui conseguindo resolvê-los durante o tempo que ali permaneci de modo que, no final, entreguei o material ao que me rendeu, deixando tudo bem resolvido.

Este Quartel era um centro de passagem de tropas. Umas que chegavam do mato de passagem para Lisboa, e de Lisboa para determinadas zonas da Guiné. Durante este tempo, a azáfama foi grande.
Ainda sobre o alojamento, logo no dia seguinte foi-me destinado um quarto amplo com a companhia de mais dois Furriéis Milicianos e de um segundo Sargento do Quadro Permanente. Eu ligado à saúde, os dois Furriéis à alimentação e o segundo Sargento era corneteiro.

Logo no primeiro fim-de-semana com folga, fui começar a conhecer a Cidade de Bissau e tentar encontrar alguma morada de ex-colegas de estudo naturais da Guiné. Fiquei logo a saber que um tinha moradia à saída da porta de armas do Quartel onde me encontrava, portanto, no Bairro de Santa Luzia.

Comecei por conhecer a família Baticã (não sei se é assim que se escreve). Fiquei a saber por eles que o Pai era o Régulo de Teixeira Pinto (Régulo significa ser o chefe da etnia local), portanto, a cidade à qual a aldeia para onde eu estava destinado ir pertencia administrativamente aquela cidade. Mais tarde, este conhecimento tornou-se útil.

Encontrava-me ainda na adaptação à nova vida militar, quando, numa manhã da segunda semana após a minha chegada a Bissau, fui chamado ao Comandante da minha Companhia que me informou ter para nessa tarde me apresentar no Quartel-General. Fiquei deveras apreensivo e receoso do destino que me iria ser dado. Todo eu era nervos. Mal cheguei já me vão dar outro destino? - Pensei para os meus botões.

O Quartel-General ficava logo nas traseiras do Seiscentos. Sendo o percurso mais curto. Como a minha apresentação era a um Oficial-General e o documento da convocatória tinha o seu nome, pedi à ordenança, que lá se encontrava, que me indicasse o gabinete do Oficial que me queria falar.

Bati à porta, pedindo licença. O Oficial mandou-me entrar e que me sentasse na cadeira em frente da sua secretária.
Tenho comigo um ofício de que é desejo do Comando-Chefe que o senhor vá fazer um estágio na Granja Agrícola aqui em Bissau e, deste modo, possa vir a utilizar os seus conhecimentos junto da população do Pelundo. Aceita? Não hesitei na minha resposta que lhe dei afirmativa. Então, a partir de amanhã, uma parte do dia será destinada ao seu estágio.

Fui assim portador de um ofício a entregar ao meu Capitão da Companhia que ficou de olhos em bico. Quanto aos meus companheiros de jornada, bem como os Furriéis da CCS, todos fizeram cara de espanto, ficando com alguma inveja que, em alguns, perdurou durante toda a comissão.

O meu Médico da Companhia (Dr. Dinis Calado) ficou com mais trabalho, mas contente pela oportunidade que me era dada. A partir daquele dia, todas as tardes a seguir ao almoço, uma viatura militar levava-me à Granja. No regresso, vinha em viatura civil daquela instituição.

(Continua)
____________

Nota do editor

[1] - Vd. poste de 9 DE MAIO DE 2022 Guiné 61/74 - P23249: Tabanca Grande (534): António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (Bissau, Bula e Pelundo, 1969/71). Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar n.º 861

Guiné 61/74 - P23252: 18º aniversário do nosso blogue (14): até meados de 1971, o Serviço de Reordenamentos do BENG 447, com o apoio das unidades militares e as populações locais, construiram 8 mil casas cobertas a colmo e 3880 cobertas a zinco


Capa do livro "A Engenharia Militar na Guiné - O Batalhão de Engenharia". Coord. Gabinete de Estudos Arqueológicos da Engenharia Militar. Lisboa : Direcção de Infraestruturas do Exército, 2014, 166 p. : il. ; 23 cm. PT 378364/14 ISBN 978-972-99877-8-6. Cortesia de Nuno Nazareth Fernandes.


Guiné > Região do Cacheu > Bissássema > c. 1971/73 > Construção de uma casa no reordenamento de Bissássema. Na foto: 1.º Cabo José Leonardo e os Soldados João Ventura e Idalmiro Melo da CCAÇ 3327 (Teixeira Pinto e Bissássema, 1971/73).. Foto de José Leonardo, cedida por José da Câmara.

Foto (e legenda): © José Leonardo / José da Câmara (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Na celebração do 18º aniversário do nosso blogue (*), vamos também repescar postes que, por um razão ou outra, não tiveram a devida divulgação, ou têm informação relevante para os nossos leitores mais recentes. 

É o caso, por exemplo, deste poste, sobre os reordenamentos populacionais (**). Merece ser reeditado, pela quantidade e qualidade da informação técnica, para mais sendo  da autoria do então cap mil art, Fernando Valente (Magro), que chefiava os competentes serviços, no BENG 447 (Brá, 1970/72). 

Foi mobilizado para o CTIG aos 33 anos, sendo já na vida civil engenheiro
técnico. Hoje está reformado, e é, além disso, escritor. Faz também hoje 86 anos de idade, sendo o mais velho dos elementos do Núcleo de Combatentes da Família Magro: foram ao todo seis os manos Magro que fizeram o serviço militar ao tempo da guerra do ultramar / guerra colonial, tendo estado  três na Guiné, um em Angola, outro em Moçambique e outro ficou por cá, como suplente.  Três dos manos Magro integram a Tabanca Grande, o Fernando,o Abílio e o Álvaro.

O Fernando Vicente (Magro) é membro da Tabanca Grande desde 5/7/2013, tem 36 referências no nosso blogue, é autor do livro (e da série) "Memórias da Guiné" (Lisboa: Edições Polvo, 2005, 86 pp.). Viveu na Guiné, em 1970/72, com a esposa e o filho.

Os reordenamentos populacionais

por Fernando Magro (**)


Fui colocado nos Serviços de Reordenamentos Populacionais. Inicialmente, e durante cerca de dois meses, trabalhei no Planeamento, no Comando-Chefe, na Amura. E depois chefiei os Serviços no Batalhão de Engenharia 447, em Brá.

Tratava-se de um serviço dirigido por militares destinado essencialmente às populações civis. Tinha em vista proceder ao agrupamento de diversas pequenas "tabancas" com o fim de constituir médios aldeamentos onde fosse rentável dotá-los com algumas infra-estruturas, tais como: escolas, postos sanitários, fontanários, tanques de lavar, cercados para gado, mesquitas ou capelas.

Além disso tinha-se também em vista, com a execução do Reordenamento, a defesa e controlo da população.

Na Amura estava à frente dos Serviços o major Matos Guerra, indivíduo muito instável e nervoso. Foi substituído, passados alguns meses, pelo major Carlos Azeredo que mais tarde foi chefe da Casa Militar do Presidente Mário Soares, comandante da Região Militar Norte, Governador da Madeira...

No Comando-Chefe eram decididos os trabalhos a realizar e de lá chegavam ao Batalhão de Engenharia ordens da natureza desta que a seguir transcrevo:

"From: Comchefe POP
To: Batengenharia

Mande comprar materiais para construir um Pool de: 1.550 casas zn; 50 T2; 40 escolas; 10.000 m de arame farpado. Deve indicar urgentemente a este necessidade aquisição ferramentas."


No Batalhão de Engenharia 447 foi organizado um mapa de medições para os vários tipos de construção e de acordo com essas medições assim eram quantificados os volumes de materiais a adquirir bem como colecções de ferramentas necessárias para a execução dos trabalhos.

Para, por exemplo, 60 casas T2, havia necessidade de adquirir:

  • 11.700 ripas; 
  • 780 kg de pregos n.º 15; 
  • 600 kg de pregos n.º 7; 
  • 480 kg de pregos zincados; 
  • 420 anilhas de chumbo 6/8";
  • e 8.520 chapas de zinco.

As paredes das construções eram em adobe, que os beneficiários eram incumbidos de executar, o que faziam bem, amassando terra argilosa com palha e secando os adobes ao sol.


A armação das coberturas das construções era em rachas de cibe (árvore da família das palmeiras). Um tronco dessa árvore aberto em duas partes e cada uma dessas metades aberta de novo ao meio dava origem a quatro rachas de cibe.

Os cibes eram adquiridos pelo Batalhão de Engenharia. Tinham de respeitar normas específicas: 
  • terem determinados metros de comprimento;
  • serem secos;
  • possuírem uma certa secção; 
  • e não fazerem qualquer curvatura, de modo que, quando aplicados, não apresentassem flecha.

As unidades militares em cuja área se executavam reordenamentos tinham interesse em adjudicar o fornecimento das rachas de cibe aos indí­genas da região. Dessa maneira, estando ocupados, deixavam de fazer a guerrilha, além de materialmente poderem beneficiar de modo a satisfazerem algumas das suas aspirações.

As obras eram geridas e supervisionadas pelo pessoal da Unidade Militar da área. Geralmente era nomeado um alferes, um furriel e dois cabos (um carpiteiro e o outro pedreiro nas suas vidas civis) para fazerem um estágio de alguns dias no Batalhão de Engenharia da Guiné onde praticavam na construção de algumas casas.

Havia pelo menos:
  •  uma casa no início de construção, na fase das fundações; 
  • outra com as paredes exteriores em execução; 
  • outra ainda com as paredes interiores e a armação do telhado a serem realizadas;
  •  e finalmente uma outra em fase de acabamento. 


Essa equipa, depois de ficar devidamente elucidada sobre o modo de construção das casas, regressava às suas unidades e ficava responsável pela execução dos trabalhos na sua área.

Como já referi, os materiais eram fornecidos pelo Batalhão de Engenharia à exepção dos adobes que eram executados pelos nativos. Quanto às rachas de cibe, ou eram obtidas na própria área das construções ou fornecidas pelo Batalhão de Engenharia.




Construção de uma casa no reordenamento de Bissássema. Na foto: 1.º Cabo José Leonardo e os Soldados João Ventura e Idalmiro Melo da CCAÇ 3327

Foto: © José Leonardo, cedida por José da Câmara


No Comando-Chefe era elaborado um plano de urbanização (se assim se podia chamar) com a planta dos arruamentos e a disposição das casas e a localização das várias infra-estruturas.

O local dos reordenamentos também era escolhido pelo pessoal do Comando-Chefe e naturalmente tinha em linha de conta a possibilidade de as terras próximas serem agricultáveis e a defesa das populações poder ser viabilizada.

No decurso das obras sempre que havia qualquer problema de ordem técnica,  o Batalhão de Engenharia dava o respectivo apoio.

Fiz, por isso, algumas viagens para o interior da Guiné em helicóptero ou de avião (Dornier) a que chamávamos DO. Fiquei, então, com uma visão geral da Guiné. Desloquei-me para o sul. Estive em Cufar, Catió e Cacine. No norte estive em Binta e Farim. Para leste fui a Bafatá, Bambadinca, Nhabijões, Nova Lamego e Buruntuma.

Nas férias da Páscoa de 1971 passei alguns dias na Ilha de Bubaque, no Arquipélago de Bijagós.

Mais perto de Bissau desloquei-me de automóvel diversas vezes a Nhacra, Safim, João Landim e ao Cumeré.

Na minha actividade, integrado no Batalhão de Engenharia, estive sempre atento para que nunca faltasse material nem ferramentas nos locais dos reordenamentos, pois o General Spí­nola fazia muitas viagens para o interior de helicóptero e sempre que via do ar um reordenamento em execução ordenava que o piloto aterrasse para poder visitar as obras.

O meu receio era que alguém, alguma vez, se queixasse da demora do envio de materiais por parte do Batalhão de Engenharia para justificar um possível atraso na execução dos trabalhos. Isso, porém, que eu saiba, nunca aconteceu.

Por outro lado era absolutamente necessário que na proximidade da época das chuvas as casas estivessem com a cobertura executada, cobertura essa que se prolongava para além das paredes exteriores mais de um metro, formando um terraço coberto à volta das casas, pois se assim não fosse as paredes de abobe, sem qualquer protecção, eram destruí­das pelas chuvas.

Desta minha actividade houve um facto que me poderia ter trazido graves consequências se não tivesse procedido com firmeza imediatamente após ter dele conhecimento.

Um coronel foi um dia oferecer-se ao meu Comandante (Tenente-Coronel Lopes da Conceição, já falecido com o posto de General) para promover o corte de rachas de cibe na área do seu Batalhão e posterior fornecimento à Engenharia das mesmas.

O meu Comandante chamou-me ao seu gabinete. Apresentou-me o Coronel e disse-me o que ele pretendia.A ideia do Coronel era pôr os nativos da região da sua Unidade militar a trabalhar na floresta, dando-lhes oportunidade de auferirem algum rendimento.

Uma vez que se tratava de um material imprescindí­vel para as obras que tinha em curso, e embora na área do Batalhão que o Coronel Comandava não houvesse qualquer reordenamento, aceitei imediatamente a proposta e indiquei as condições em que se teria de fazer o fornecimento: o custo e as normas específicas que as rachas de cibe tinham de respeitar.

Dei-lhe mesmo um pequeno caderno de encargos-tipo que teria de ser seguido.

Passados uns tempos o Primeiro Sargento que comigo colaborava apresentou-se no meu gabinete e, depois da continência militar, bradou:

- O meu Capitão já viu os cibes que estão a ser depositados à volta do campo de futebol?
- Não.
- Se o meu Capitão tivesse alguns minutos disponí­veis propunha-lhe que os visse.

Levantei-me e fui com o Primeiro Sargento até ao local onde estavam depositados os cibes. Tinham vindo da área do Batalhão do tal Coronel. As rachas de cibe eram verdes, arqueadas e com secção inferior à das normas.

Fiquei furioso. Encaminhei-me imediatamente para a Central Rádio e lá redigi uma mensagem que mandei emitir, que dizia mais ou menos isto:

"As rachas de cibe recebidas no Batalhão de Engenharia não respeitam as normas específicas de que lhe foi dado conhecimento. Não serão aceites nem pagas por este Batalhão pelo que deverá mandar retirá-las do local onde foram depositadas."

Esta guerra das rachas de cibe para mim tinha acabado, julgava eu. Mas não. Volvidos alguns dias sobre este acontecimento, o meu Comandante mandou-me chamar ao seu gabinete. Muito sisudo, disse-me que o Coronel (não pretendo mencionar o seu nome) se tinha queixado de mim ao General Spí­nola por causa de uma mensagem rádio que eu lhe tinha enviado.

Contei-lhe a história e convidei o Comandante a deslocar-se ao campo de futebol onde ainda estavam depositadas as rachas de cibe. Pegou no pinguelim, pôs a sua boina e para lá nos dirigimos.

Depois de ter constatado no local em que condições foram fornecidas as rachas de cibe, disse-me:
- Tem toda a razão. Não se preocupe mais com isso. Eu tratarei do assunto com o nosso General.

Na mensagem que enviou poderia ter sido menos duro, mas não tenho dúvidas que fez o que devia.

Soube mais tarde que o General Spí­nola apreciou a minha atitude e, evidentemente, não concordou com a maneira de agir do Coronel nessa sua iniciativa.

Em Julho de 1971 deslocou-se à Guiné uma delegação da ONU. Como dessa visita constava a sua passagem pelo Batalhão de Engenharia 447, os Serviços de Reordenamentos Populacionais tiveram de redigir um pequeno memorando, a fim de elucidar os elementos dessa delegação sobre as suas actividades, memorando que transcrevo adiante:

Serviço de Reordenamentos Populacionais
 
ActividadesApoio técnico e de materiais às obras de reordenamentos.

Cada reordenamento é constituído por:

  • um número determinado de casas de adobe destinadas à população; 
  • uma ou duas casas de adobe também, mas com melhor acabamento destinadas aos chefes; 
  • uma ou duas escolas em blocos de cimento; 
  • um posto sanitário em blocos de cimento; 
  • um ou dois cercados para gado; 
  • fontanários; 
  • bebedouros e lavadouros.

Prevê-se futuramente uma construção destinada ao culto religioso.

O Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia elaborou as Instruções de Reordenamentos, onde constam normas e pormenores das construções, desenhos, sequência de trabalhos, medições, orçamento e quadro resumo dos materiais necessários.

Tem o Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia habilitado inúmeros oficiais, sargentos e cabos com o estágio de reordenamentos. Esses elementos, formando equipas constituídas por um oficial (alferes), um encarregado de obras (furriel),  um pedreiro (cabo) e um carpinteiro (cabo) executaram no interior da província com a colaboração das populações, cerca de 8.000 casas cobertas a colmo e 3.880 cobertas a zinco nos últimos anos.

O Serviço de Reordenamentos do Batalhão de Engenharia 447 tem apoiado essas construções com material e, quando solicitado, tem prestado assistência ténica localmente.

A esse volume de trabalho correspondem as seguintes quantidades de materiais:

  • Rachas de cibe - 542.000
  • Chapas de zinco - 550.960
  • Ripas - 756.600 metros
  • Pregos - 120.280 kg
  • Anilhas de chumbo - 27.160 kg
  • Cimento - 19.400 sacos
[ Revisão / fixação de texto, para  efeitos de publicação deste poste no nosso blogue: LG ]

____________

Notas do editor


Guiné 61/74 - P23251: Antropologia (43): Os futa-fulas fazem cortes distintivos nos temporais, mas não são os únicos a fazé-lo na Guiné e na região (Cherno Baldé)

Crianças da Guiné-Bissau. Com a devida vénia a CNBB


1. Mensagem do nosso camarada Constantino Neves (mais conhecido por "Tino Neves", ex-1.º Cabo Escriturário da CCS/BCAÇ 2893 (Nova Lamego, 1969/71), com data de 2 de Maio de 2022, pondo uma questão que enviei para o nosso amigo e colaborador permanente para os assuntos Étnico-Linguísticos, se pronunciar:

Camarada Carlos Vinhal.
Vou contar não uma história mas sim um acontecimento que me aconteceu com um jovem Fula ou Futa-Fula.
Já se passaram mais ou menos 2 anos, no Fórum Almada (Centro Comercial de Almada).
Estava eu numa fila para almoçar, quando chegou perto de mim um jovem guineense, afirmo desde já que seria um guineense, pelo facto de ter nos temporais um corte, que é um sinal para distinguir os Fulas dos Futa-Fulas, mas como eu já não me recordo a diferença de um corte dos que têm dois cortes, tive a ousadia de lhe perguntar se era Fula, apontando para os meus temporais? Ele teve uma reação que eu não esperava, olhou-me dum modo que eu interpretei por ódio ou algo parecido, e desapareceu.
Não é meu hábito interrogar todos os negros que encontro, mas quando por algum facto acabo por entabular conversa com algum, acabo por perguntar sempre qual a sua origem.
Pensei agora contar esta história e pedir ao Cherno Baldé, que é a pessoa indicada para nos esclarecer, pois nem todos os ex-combatentes da Guiné têm conhecimento disso.

Abraços
Tino Neves
Almada

********************

2. Mensagem/resposta do Cherno Baldé em 4 de Maio:


Caro amigo Carlos,
Em resposta a questão colocada por Constantino Neves, tenho a dizer que a questão nao é assim tão simples de responder porque, para isso precisava de mais elementos (físicos sobretudo). O tempo que o Constantino fez em Gabu podia permitir-lhe reter algumas caracteristicas peculiares e distintivos dos fulas e/ou futa-fulas, todavia o que é obvio para um guineense pode ser complicado para um portugués (europeu). Os futa-fulas fazem cortes distintivos nos temporais, mas não são os únicos a fazé-lo na Guiné e na região. Também os balantas fazem cortes nos temporais e, às vezes, na testa, mas, geralmente, são mais pequenos e finos e também mais difíceis de enxergar.

Os futa-fulas, de cor de bronze, mais claros de pele, antigamente (agora sáo mais raros) traziam dois cortes ligeiros e pouco profundos mas bem visíveis nos temporais, enquanto que os fulas boencas (das colinas do Boé), por serem fulas assimilados, faziam dois cortes maiores, mais fundos e mais compridos (muito feios) para além de terem uma cor mais escura. Porque razão se faziam estes sinais nos corpos das pessoas em África?

Ainda não se fizeram estudos de investigação sobre estas marcas de distinção rácica em Africa e na nossa sub-região em particular, mas as razões podem ser várias, e entre as mais importantes, posso citar as guerras, as razias e as constantes movimentaçoes de uma zona para outra (nomadismo económico) a que estas populações estavam sujeitas em virtude das suas actividades económicas (criação de animais) e pela necessidade das frequentes mudanças de uma região para outra acompanhado do seu gado, atravessando regiões onde nem sempre eram bem vistos e recebidos.
O fenómeno de roubo de mulheres e crianças também era normal e bem conhecido em diferentes regiões de África, durante muito tempo e o aparecimento do comércio de escravos veio piorar esta situação em que famílias inteiras desapareciam na natureza sem deixar rastos.

Na Guiné, os fulas ainda acreditam que os seus vizinhos balantas, para além de bons "ladrões de gado", também eram bons "ladrões" de mulheres e crianças e não é em vão que temos (fulas e balantas) quase as mesmas características fisionómicas, exceptuando aquelas que fazem deles os mais exímios lutadores assim como os melhores trabalhadores da região.

Acho que o tal jovem não era fula, provavelmente o Tino confundiu um jovem balanta, com dois cortes ligeiros nos temporais, com um fula e daí a irritação do mesmo que não gostou daquela confusão que, na sua cabeça de balanta orgulhoso, não tolera ser tomado por um fulazinho (pequeno fula, como dizem) e pior ainda de um futa-fula da Guiné-Conacry (Nania - termo depreciativo). Na Guiné-Bissau, as etnias em geral são muito orgulhosas e bem ciosas da sua pertença étnica e da sua cultura, situação que começa a mudar ligeiramente nas cidades e sobretudo no meio das novas gerações, mas que a classe política e o aproveitamento político de cariz tribal, tende a perpetuar por mal da nossa Guiné.

Resumindo:
Se o corte fosse um só nos temporais e/ou no fronte (testa), de certeza que não era fula. Podia ser balanta, da mesma forma que poderia se tratar de uma outra etnia menos conhecida. Os futa-fulas faziam dois cortes nos temporais, podendo ser pequenos ou grandes.

PS: Carlos, ainda tenho na memória a interessante história do "menino" do Manel Joaquim, o Kunte, que era de uma família Balanta-Mané do Norte e quando foi confrontada com o aparecimento de um menino que procurava os seus familiares, a mãe só teve a certeza de que era seu filho após examinar e reconhecer os sinais no corpo da criança que tinha acontecido por um acidente, quando era criança, mas que, para eles serviu como uma marca de identificação para todo o sempre. As marcas serviam para casos como esses em que um dos familiares pudesse ser raptado ou se ter perdido e fosse necessário identificar suas origens étnicas e/ou clânicas.

Com um abraço amigo,
Cherno Baldé

********************

3. Mensagem de Tino Neves, reagindo à explicação do nosso especialista antropólogo, Cherno Baldé:

Amigo Cherno.
Os meus agradecimentos pelos seus esclarecimentos.
De facto, desconhecia que havia outras etnias com essa prática.
Eu pensei, que o jovem fosse futa-fula, pelo facto de eu saber que o termo significava de algum modo "Fula de segunda", mas não tinha a certeza, dai o meu pedido, que agradeço mais uma vez. Para esclarecer mais um pormenor de que expõe: O jovem era bem negro e só tinha um corte, que julgo ser dos profundos.

Abraços
Tino Neves
Almada
____________

Nota do editor

Último poste da série de 7 DE ABRIL DE 2021 > Guiné 61/74 - P22076: Antropologia (42): "Grandeza Africana, Lendas da Guiné Portuguesa", por Manuel Belchior (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23250: Parabéns a você (2063): Fernando Valente (Magro), ex-Cap Mil Art do BENG 447 (Bissau, 1970/72) e Henrique Matos, ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)


____________

Nota do editor

Último poste da série de 8 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23241: Parabéns a você (2062): Arsénio Puim, ex-Alf Mil Capelão da CCS/BART 2927 (Bambadinca, 1970/72)

segunda-feira, 9 de maio de 2022

Guiné 61/74 - P23249: Tabanca Grande (534): António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (Bissau, Bula e Pelundo, 1969/71). Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar n.º 861

1. Mensagem de António Sebastião Figuinha, enviada ao Blogue a 4 de Maio através do Formulário de Contacto:

Já lá vão vários anos desde que o meu amigo Tunes, leitor deste blogue, me dava na cabeça para eu nele escrever sobre a minha passagem pela Guiné onde fiz parte do mesmo Batalhão.
Posso enviar para o vosso mail em pdf já que o texto é longo?

Cumprimentos,
Figuinha António Sebastião


********************

2. Mensagem enviada no mesmo dia ao António Figuinha:

Boa tarde.
Claro que sim. Utilize o endereço luis.graca.prof@gmail.com e, se quiser, também carlos.vinhal@gmail.com.

Ao dispor
Carlos Vinhal


********************

3. Ainda no mesmo dia recebemos esta mensagem com o PDF do António Figuinha:

Para poder dar o meu pequeno contributo sobre a nossa passagem pela Guiné, resolvi escrever com o meu pequeno jeito para a escrita o que desde já peço desculpas por algo que não possa estar com o português correto.
Como Furriel Miliciano Enfermeiro, o meu dia a dia não foi de emboscadas ou patrulhamento. O meu dia a dia foi dedicado aos nossos militares e à população. Acrescento o meu apoio à agricultura no Pelundo.
Fiz parte da CCS do Batalhão 2884 de 1969/1971.

Com um grande abraço.
António Figuinha


********************

4. Mensagem enviada pelo coeditor em 5 de Maio ao nosso camarada de armas António Fuiguinha:

Caríssimo António Figuinha
Como camaradas de armas, tu armado de seringa e eu armado de G3, permite que nos tratemos por tu.

Ficamos gratos pelo envio do teu texto que vai merecer a publicação de alguns postes no nosso Blogue.
Já dei uma vista de olhos rápida às tuas memórias, e para já, aquela cena com o sargento Nunes não me é estranha. Na verdade eram mais os sargentos do QP que nos desrrespeitavam do que o contrário.
Na minha Companhia os dois Sargentos que estiveram connosco de princípio ao fim, eram excelentes pessoas e excelentes camaradas. Tivemos temporariamente um primeiro sargento também chamado Nunes (S. Nunes P.) que não era flor que se cheirasse mas felizmente esteve pouco tempo connosco.

A minha mensagem tem também a nobre missão de te convidar a fazeres parte da nossa família (tertúlia) de antigos combatentes da Guiné. Tu tens já muito caminho feito pelo que só te peço que me envies uma foto actual, tipo passe ou não, cá me arranjarei, e me digas as datas exectas de ida e volta da Guiné, unidade (Companhia e Batalhão) e os locais, também da Guiné, onde tiveste os melhores dias da tua vida.
Fico à espera das tuas notícias indo desde já adiantando serviço, começando a editar os textos para publicação. Por favor, se me puderes enviar futuros textos em Word, em vez de PDF, facilitavas-me a vida.
Muito obrigado.

Segue um fraterno abraço do camarada e amigo
Carlos


********************

5. Mensagem enviada pelo nosso novo tertuliano António Sebastião Figuinha, ex-Fur Mil Enfermeiro da CCS/BCAÇ 2884 (Bissau, Buba e Pelundo, 1969/71) com data de 6 de Maio de 2022:


Boa tarde caro amigo e ex-Combatente na Guiné.
[...]
Bem, saí de Lisboa para a Guiné em 7 de Maio de 1969 e cheguei a Bissau a 12 do mesmo mês.
Em Bissau permaneci até Setembro desse ano interrompido em Junho com uma ida de pouco mais de 15 dias até ao Sul em Buba.
Durante estes meses de permanência em Bissau e a convite do Quartel General fui fazer um Estágio na Granja Agrícola de Bissau ocupando as tardes úteis de cada dia. As manhãs eram dedicadas no Seiscentos à saúde.
Estive de férias em Outubro na Metrópole e no regresso a Bissau fui-me finalmente juntar à CCS do Batalhão 2884 no Pelundo. Parte desta Companhia permaneceu em Bissau enquanto eu lá estive. Conforme as instalações do Quartel se construíam assim foram para lá os vários serviços que a componham.
Em Novembro de 1970, fui destacado para uma nossa Companhia Operacional dado ter ficado desde há muito sem Médico como depois sem Furriel Enfermeiro e, o meu Comandante do Batalhão achou que eu era o mais bem preparado para dar assistência aos nossos militares bem com à população local.
Voltei ao Pelundo antes do fim da Comissão por causa duma inauguração do novo Posto Médico do Quartel que não chegou a acontecer por falta de mobiliário que eu havia a devido tempo requisitado para Bissau e que até àquele dia não havia chegado. Como resultado, o General recusou-se a inaugurar paredes e, tive que lhe dar todas as explicações sobre o sucedido. Isto deu bronca em Bissau nos Serviços de Saúde Militares. Acabei por regressar definitivamente ao Pelundo depois de passar a pasta ao Furriel periquito no começo de Fevereiro.
Embarquei para Lisboa onde cheguei com o Batalhão em 3 de Março de 1971.

O Fur Mil Enfermeiro António Figuinha

Espero ter dado os meus dados necessário e por isso me despeço com um grande abraço.
António S. Figuinha

António Figuinha actualmente

********************

6. Comentário do coeditor CV:

Caro António Figuinha,
Depois das mensagens que trocámos, uma delas trazendo as memórias que escreveste e que vão fazer parte do teu legado, não só para os teus descendentes como também para o espólio deste Blogue, tenho um particular prazer em te receber nesta tertúlia, assumindo desde já o papel de teu "padrinho".

O que li deu para perceber a tua versatilidade, és o exemplo de que a guerra não se fez só aos tiros. Além da tua nobre missão ao serviço da saúde dos teus (nossos) camaradas, ainda participaste num Estágio na Granja Agrícola de Bissau, acho que como monitor, já que está ligado à tua formação académica.
Se tiveres fotos que possam ilustrar os textos à medida que os for publicando, vai enviando para as inserir.

Renovo o nosso abraço de boas-vindas com votos de saúde.
CV

____________

Nota do editor

Último poste da série de 26 DE ABRIL DE 2022 > Guiné 61/74 - P23202: Tabanca Grande (533): João da Silva Alves, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 5 (Canjadude, 1970/72). Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar n.º 860