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segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21643: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (7): É Natal, é Natal, apesar dos confinamentos (António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74), membro n.º 822 da Tabanca Grande


Guiné > Região de Gabu > Buruntuma > 1972 > Igreja local (*)  > Natal > O presépio de barro seco ao sol e pintado com o que havia disponível de cores


Guiné > Bissau > 1973 > 
Uma montra na baixa de Bissau, com decoração natalícia... e provavelmente com animação, a avaliar pelo número de crianças especadas no passeio...

Fotos (e legendas): © António Marreiros (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem de António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74) , membro nº 822 da Tabanca Grande (**):

Data - 12/12/2020, 17:58
Assunto - Mensagem de Natal


 
Amigos:

Hoje recebi esta mensagem natalícia do Carlos Pereira um camarada e amigo dos tempos de Bigene que acho apropriado partilhar com vocês. Oxalá possam abrir este link:
 
Linda Mensagem De Natal, de Audete de Fazio

Entretanto, num álbum encontrei estas duas fotos :

(i) O presépio de barro seco ao sol e pintado com o que havia disponível de cores...Igreja de Buruntuma,  1972;

(ii)  Uma montra em Bissau numa ida à cidade (em 73, quando estava em  Bigene?), de avioneta, em serviço, talvez levantar o dinheiro para pagar a tropa em Bigene...

Lembro-me, nessa ocasião, de visitar um amigo que tinha namorada com família abastada... Lembro-me  do excesso de presentes que as crianças, que ali estavam,  nem apreciaram...

Ah!, como a memória vai ficando enevoada mas de repente uma imagem toma realidade!


É Natal, É Natal ...apesar dos confinamentos! (***)
Felicidade e cuidem-se

António Marreiros
Victoria, Canada
__________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 4 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16049: Na festa dos 12 anos, "manga de tempo", do nosso blogue (8): A bonita e original capelinha de Buruntuma, de estética modernista (José Mota Tavares, ex-alferes mil capelão, CCS/BCAÇ 1856, Nova Lamego, 1965/67)

(**) Vd. poste de 9 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21626: Tabanca Grande (506): António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil em rendição individual, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74): senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 822

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21626: Tabanca Grande (506): António Marreiros, natural de Sagres, a viver há 48 anos no Canadá, ex-alf mil em rendição individual, CCaç 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 3 (Bigene e Guidage, 1972/74): senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 822


Foto nº 1


Foto nº 2

Fotos (e legendas): © António Marreiros (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem de António Marreiros, a viver há 48 anos no Canadá (Victoria, BC, British Columbia), ex-alferes miliciano em rendição individual na Companhia CCaç 3544, "Os Roncos", Burumtuma, 1972,  e, meses depois, transferido para Bigene/Guidage, CCaç 3, até Agosto 1974 (*):


Date: sexta, 4/12/2020 à(s) 01:00
Subject: Hoje ...e 48 anos antes

Olá,  Luís Graça,

Depois de uma volta a pé nesta tarde cinzenta de Dezembro, fui à procura da caixa com fotos antigas e encontrei o grupo de Buruntuma e Bigene. Vou tentar copiar algumas mas não sei a melhor maneira de mandar:  Messenger, WhatsApp,  ou assim?

Para me registar na Tabanca aqui vai a minha foto tirada em Março [deste ano] no Algarve [Foto nº 2]  e …48 anos antes,  no rio Cacheu a caminho de Bolama ...e ainda muito "pira"! [Foto nº 1]. Penso que ainda tenho nalgum sítio aquele colar nativo feito com osso de peixe.

Sim, pelo apelido  de família [, Marreiros,] viste que sou algarvio! Nasci em Sagres e um mês depois de vir da Guiné estava numa longa viajem para este lado do Pacífico…

Nos primeiros 10 anos foi difícil regressar a casa periodicamente, mas com o tempo surgiram mais possibilidades e hoje volto  pelo menos cada 2 anos.

Ainda não respondi ao amigo Crisóstomo,  de New York, mas vou fazê-lo, ele foi tão pronto em me contactar!

Só agora é que tive coragem de abrir os outros links que me mandaste (P) …Tive dificuldade em ler a vivida descrição do ataque a Guidage e as emboscadas  (Amilcar Mendes, 38.ª CCmds) de Maio de 1973, porque eu fiz parte da tropa que se juntou aos Comandos nessa coluna que conseguiu finalmente chegar  a Guidage.

Tenho um nó no estômago outra vez... ver os nomes dos dois alferes que se perderam e toda aquele caos que se seguiu (eles voltaram dias depois a Bigene com a ajuda dos soldados africanos que conheciam o mato)…

Vou ler mais, mas noutro dia…
Um abraço do Canadá.
António Marreiros


2. Comentário do editor LG:

Camarada Marreiros, em meu nome pessoal, dos demais editores, colaboradores permanentes  e o resto da Tabanca Grande (que abaraça um leque de mais 8 centenas de camaradas que passaram pelo CTIG de 1961 a 1974), eu saúdo e faço votos para que te sintas sempre bem, ao nosso lado, sentado à sombra do nosso poilão...

Passas a ser nº 822... E o teu nome passa a constar permanentemente da lista alfabética, de A a Z, dos membros da Tabanca Grande, constante da coluna estática do blogue, no lado direito.

Peço desculpa de, no comentário anterior (*), ter confundido a tua segunda companhia, que não é a CCAÇ 19 (que estava em Guidage), mas sim a CCAÇ 3, da qual temos meia centena de referências. Mais à frente, no ponto 3, apresento-te um resumo do historial da CCAÇ 3.

 Em relação às tuas dúvidas... Tudo o que nos quiseres mandar (fotos, digitalizadas com boa resolução, em formato jpg, de preferência; ou textos em word ou pdf), usa de preferência o meu endereço de email, o mesmo que usaste agora: luis.graca.prof@gmail.com.

O nosso blogue tem algumas regras, simples, pacíficas, consensuais, que podes consultar aqui.

Mas, no essencial, devo dizer-te o seguinte, para te sentires inteiramente confortável aqui e à vontade para partilhares as tuas memórias, sem constrangimentos.

O Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, criado em 2004, é um espaço, de informação e de conhecimento, mas também de partilha e de convívio, abertos a todos os combatentes que conheceram o TO da Guiné, entre1961 e 1974). 

O nosso comportamento (bloguístico) deve estar  de acordo com algumas regras ou valores, sobretudo de natureza ética:

(i) respeito uns pelos outros, pelas vivências, valores, sentimentos, memórias e opiniões uns dos outros (hoje e ontem);

(ii) manifestação serena mas franca dos nossos pontos de vista, mesmo quando discordamos, saudavelmente, uns dos outros (o mesmo é dizer: que evitaremos as picardias, as polémicas acaloradas, os insultos, a insinuação, a maledicência, a violência verbal, a difamação, os juízos de intenção, etc.);

(iii) socialização/partilha da informação e do conhecimento sobre a história da guerra do Ultramar, guerra colonial ou luta de libertação (como cada um preferir);

(iv) carinho e amizade pelos nossos dois povos, o povo guineense e o povo português (sem esquecer o povo cabo-verdiano!);

(v) respeito pelo inimigo de ontem, o PAIGC, por um lado, e as Forças Armadas Portuguesas, por outro;

(vi) recusa da responsabilidade colectiva (dos portugueses, dos guineenses, dos fulas, dos balantas, etc.), mas também recusa da tentação de julgar (e muito menos de criminalizar) os comportamentos dos combatentes, de um lado e de outro;

(vii) não-intromissão, por parte dos portugueses, na vida política interna da actual República da Guiné-Bissau (um jovem país em construção), salvaguardando sempre o direito de opinião de cada um de nós, como seres livres e cidadãos (portugueses, europeus e do mundo);

(viii) respeito acima de tudo pela verdade dos factos;

(ix) liberdade de expressão (entre nós não há dogmas nem tabus); mas também direito ao bom nome;

(x) respeito pela propriedade intelectual, pelos direitos de autor... mas também pela língua (portuguesa) que nos serve de traço de união, a todos nós, lusófonos.

Não menos importante:

(xi) defendemos e garantimos a propriedade intelectual dos conteúdos inseridos (texto, imagem, vídeo, áudio...).

(xii) em contrapartida, uma vez editados, os "postes" não poderão ser eliminados, tanto por decisão do autor como do editor do blogue, mesmo que o autor decida deixar de fazer parte da Tabanca Grande.

(xiii) qualquer outra utilização desses conteúdos, fora do propósito do blogue (ou da página do Facebook da Tabanca Grande), necessita de autorização prévia dos autores (por ex., publicação em livro).

Dito isto, camarada António Marreiros, esperemos que partilhes também connosco alguns dos "segredos" que vais contar à tua neta, relativamente àquele período da tua vida (cerca de 3 anos) em que estiveste ao serviço do Exército Português... Happy Cristmas!... Luís Graça

PS - Noutra oportunidade, falar-te-ei do nosso camarada A.Marques Lopes, cor inf DFA,  que foi também alf mil na CCAÇ 3, tendo estado em Barro, em 1968. É autor do livro "Cabra-Cega: do seminário para a guerra colonial" (Lisboa, Chiado Editora, 2015), autobiografia escrita sob o pseudónimo João Gaspar Carrasqueira, e que conta a história de António Aiveca. É um dos históricos da Tabanca Grande. Tem cerca de 250 referências no nosso blogue.
 


3. Companhia de Caçadores nº 3  (CCAÇ 3) > Ficha de Unidade:
 
Comandantes:

Cap Art Samuel Matias do Amaral
Cap Inf Cassiano Pinto Walter de Vasconcelos
Cap Inf Carlos Alberto Antunes Ferreira da Silva
Cap Inf José Olavo Correia Ramos
Cap Art Carlos Alberto Marques de Abreu
Cap Art Fernando José Morais Jorge
Cap Inf João da Conceição Galamarra Curado
Cap Inf Carlos Alberto Caldas Gomes Ricardo
Cap Cav Nuno António Amaral Pais de Faria
Cap QEO João Pereira Tavares
Alf Mil Inf José Manuel Levy da Silva Soeiro
Cap Inf Manuel Gonçalves Mesquita
Cap Mil Inf José Maria Tavares Branco
Cap Mil Inf António Eduardo Gouveia de Carvalho
Cap Mil Inf José Maria Tavares Branco

Divisa: "Amando e Defendendo Portugal"

Início: lAbr67 (por alteração da anterior designação de 1ª CCaç)
Extinção: 31Ago74

Síntese da Actividade Operacional

Em 1Abr67, foi criada por alteração da anterior designação de 1ª Companhia de Caçadores.
.
Era uma companhia da guarnição normal do CTIG, constituída por quadros metropolitanos e praças indígenas do recrutamento local.

Continuou instalada em Barro, mantendo-se então integrada no dispositivo e manobra do BCaç 1894, com dois pelotões destacados em reforço do BCaç 1887 e estacionados em Binta e Jumbembém, este depois em Canjambari a partir de finais de Set67. 

Ficou sucessivamente integrada no dispositivo e manobra dos batalhões e comandos que assumiram a responsabilidade da zona de acção do subsector de Barro.

Após recolha dos pelotões instalados em Binta e Canjambari em 20Jul68, destacou, em meados de Out68, um pelotão para Guidage, tendo assumido, em 09Mar69, a responsabilidade do subsector de Guidage por troca com a CArt 2412 e destacando então dois pelotões para Binta, sendo especialmente orientada para a contrapenetração no corredor de Sambuiá, onde em 2l/22Jan69 tomou parte
na operação "Grande Colheita", realizada pelo COP 3.

Em 22Fev72, rendida em Guidage pela CCaç 19, assumiu a responsabilidade do subsector de Saliquinhedim, onde substituiu a CCaç 2753 e ficou integrada no dispositivo e manobra do COP 6 e depois do BArt 3844.

Em 08Dez72, foi substituída, transitoriamente, por forças da CArt 3358 no subsector de Saliquinhedim e foi colocada em Bigene para onde se deslocou, por escalões, em 26Nov72 e 08Dez72 e onde assumiu a responsabilidade do respectivo subsector em substituição da CCaç 4540/72, ficando então novamente
integrada no dispositivo de contrapenetração no corredor de Sambuiá.

Em 31Ag074, as praças africanas tiveram passagem à disponibilidade e, após desactivação e entrega do aquartelamento de Bigene ao PAIGC, o restante pessoal recolheu a Bissau, tendo a subunidade sido extinta.

Observações
Não tem História da Unidade. Tem Resumo de Actividade referente ao período
de Mai73 a Set74 (Caixa n." 129 - 2.a Div/d." Sec, do AHM).

Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), pp. .627/628
_________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21561: O nosso livro de visitas (207): António José de Sousa Marreiros, que vive no Canadá (Victoria, BC): foi alf mil, em rendição individual, CCAÇ 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 19 (Bigene e Guidaje, 1973/74)

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21561: O nosso livro de visitas (207): António José de Sousa Marreiros, que vive no Canadá (Victoria, BC): foi alf mil, em rendição individual, CCAÇ 3544 (Buruntuma, 1972) e CCAÇ 19 (Bigene e Guidaje, 1973/74)


Mapa do Canadá e posição da cidade de Victoria, capital da província da Colúmbia Britânica. Fonte: cortesia de  Wikimedia Commons


1. Comentário de nosso camarada e leitor António José de Sousa Marreiros, que vive no Canadá (Vd. poste P21532 )(*):

Amigos, 

Nunca falei muito da minha passagem pela Guiné quando vim viver para o Canadá (Victoria, BC, British Columbia). Tentei esquecer e dar lugar às novas experiências num país novo e língua diferente. 

Com os anos e para não ter muitas saudades fui enterrando memórias e aprendendo os hábitos desta nova sociedade. Só consegui manter contacto com 3 amigos que também fizeram a Guiné comigo e por um deles encontrei este blogue.

Nessa altura só tive coragem para ler umas quantas histórias e, como não gostei da depressão em que fiquei,  abandonei o site e só hoje, já perto dos 70, voltei à Tabanca. 

Estou a fazer um esforço para lembrar e escrever uma pequena história, em inglês, da minha vida forçada de militat de guerra. Estou a pensar que a minha neta, agora com apenas 7 anos, um dia vai querer saber as origens e o que fez o avô... 

A pandemia [de Covid-19] trouxe outra realidade e uma necessidade mais forte de procurar linhagens e realidades de juventude sobretude que estou fora de Portugal e das minhas raízes.Por isso tem sido mais fácil ler este mar de informação dos camaradas da Guiné e uma recolha de nomes e termos que afinal ainda estavam na meu vocabulário e apenas adormecidos. 

António José de Sousa Marreiros,
Ex-alferes miliciano em rendição individual
na Companhia CCaç 3544 (os Roncos) em Burumtuma (1972) e,  meses depois,  transferido para Bigene/Guidage, CCaçadores 3, até Agosto 1974.

Um abraço a todos e que continuem bem!

2. Comentário de Valdemar Queiroz (*):

António Marreiros.

Então por Burumtuma, quer dizer que fez a estrada Nova Lamego-Buruntuma e passou pela Ponte Caium.

A minha CART 11 (1969/70), de soldados fulas, esteve fixada em Nova Lamego (Quartel de Baixo) e depois mudamos para Paunca, mas estávamos em intervenção em toda a zona leste e também fomos a Buruntuma em operações.

Ponte Caium, ninguém acredita haver um "Quartel" em cima duma ponte naquelas condições.

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz

3. Comentário do editor Luís Graça:

Camarada Marreiros, és bem vindo!... Não percas o contacto connosco... Vamos escrever-te para o teu email, constante do teu perfil no Blogger. E estás desde já convidado a juntar-te aos bravos da Tabanca Grande... Somos já 821, entre vivos e mortos, espalhados pelos quatro cantos do mundo.

Infelizmente, temos apenas duas referências à tua primeira companhia, a CCAÇ 3544.  Por exemplo, será que viste este poste, com referência ao Francisco Alves, um camarada da tua companhia (**) ?... Já sobre a CCAÇ 19 há pelo menos umas 25 referências

Pelo teu apelido, pareces-me ser algarvio... Quando escreveres a tua história, em inglês, para a tua neta canadiana, manda-nos um "cheirinho", ou até uma cópia... A gente faz a tradução para português. Na parte relativa à Guiné, tens aqui uma "montra" para divulgares a tua história... 

De qualquer modo, o teu gesto é de uma grande ternura. E é importante, que para lá do teu património genético, possas também transmitir à tua neta algo das tuas "geografias emocionais" (e a Guiné é, com certeza, uma delas). (***)

Um alfabravo (ABraço), Luís Graça

PS - Aqui seguem as fichas das unidades a que pertenceste no TO da Guiné:

Batalhão de Caçadores nº 3883

Identificação > BCaç 3883
Unidade Mobuluzadora > RI 2 - Abrantes
Cmdt >  TCor Inf Manuel António Dantas
2.° Cmdt > Maj Inf Manuel Azevedo Morujão e Oliveira
OInfOp/Adj > Maj Inf José Luís Guerreiro Portela

Cmdts Comp: 
(i) CCS >  Cap Inf Joaquim Pinheiro da Costa | Cap Mil Inf José do Nascimento Leal Varela
CCaç 3544 > Cap Mil Inf Luís Manuel Teixeira Neves de Carvalho | Cap Mil Inf José Carlos Guerra Nunes
CCaç 3545 > Cap Mil Inf Fernando Peixinho de Cristo
CCaç 3546 >  Cap QEO José Carlos Duarte Ferreira

Divisa: "Nobreza no Dever"
Partida > Embarque em 19Mar72 (Cmd e CCS), 20Mar72 (CCaç 3544),
22Mar72 (CCaç 3545) e 23Mar72 (CCaç 3546); desembarque em 19,22,23 e 24Mar72
Regresso: Embarque em 19,21,22, e 23Jun74

Síntese da Actividade Operacional:

Após realização da IAO, de 27Mar72 a 22Abr72, no CIM, em Bolama, seguiu em 24Abr72, com as suas subunidades, para o sector de Piche, a fim de efectuar o treino operacional e sobreposição com o BCav 2922.

Em 24Mai72, assumiu a responsabilidade do referido Sector L4, com a sede em Piche e abrangendo os subsectores de Buruntuma, Piche e Canquelifá. 

Em29Mai73, por subdivisão do subsector de Buruntuma, foi criado o subsector de Camajabá. As suas subunidades mantiveram-se sempre integradas no dispositivo e manobra do batalhão.

Desenvolveu intensa actividade operacional de patrulhamento, reconhecimentos, de vigilância da fronteira e de defesa e segurança dos aquartelamentos e aldeamentos, que foram alvo e fortes e frequentes flagelações, particularmente a partir de Ag073. 

Actuou ainda em numerosas missões de protecção e segurança a trabalhos nos reordenamentos e de reparação de itinerários, e ainda na asfaltagem da estrada Piche-Buruntuma; a par de uma decidida colaboração na promoção socioeconómica das populações da região e organização do sistema de autodefesa.

Dentre o material capturado mais significativo, salienta-se: 4 espingardas, 9 granadas de armas pesadas e a detecção e levantamento de 29 minas.

Em 31Mai74, foi rendido no sector pelo BCaç 4610/73 e recolheu a Bissau para embarque.

Companhia de Caçadores nº 3544 (CCAÇ 3544)

A CCaç 3544, após treino operacional e sobreposição com a CCav 2747, assumiu, em 24Mai72, a responsabilidade do subsector de Buruntuma, com um pelotão destacado em Camajabá e onde se manteve após a criação do respectivo subsector em reforço da respectiva guarnição até meados de Ago73.

Em 26Jan74, por troca com a 2ª C/BCav 8323/73, foi colocada em Piche, tendo então assumido a responsabilidade do respectivo subsector e cumulativamente as funções de subunidade de intervenção e reserva do sector, tendo efectuado acções de patrulhamento, emboscadas e escoltas a colunas.

Em 31Mai74, foi rendida pela 3ª  C/BCaç 4610/73 e recolheu a Bissau.
 
Companhia de Caçadores nº 19 (CCAÇ 19)

Identificação > CCaç 19
Crndt >  Cap Inf Afonso José Carmona Teixeira | Cap Mil Inf José Vicente Teodoro de Freitas | Cap Mil Inf Carlos Alberto Gaspar Martinho | Cap Mil Inf António Eduardo Gouveia Carvalho
Início > 01Dez71
Extinção>  princípios de Ago74

Síntese da Actividade Operacional

Em 01Dez71, foi constituída com quadros e algum pessoal especialista metropolitano e o restante pessoal natural da Guiné, predominantemente da etnia Mandinga e na sua grande maioria já integrante de companhias de milícias, tendo efectuado a instrução no CIM, em Bolama, de 06 a 31Dez71.

Seguidamente, foi colocada em Guidage, inicialmente em reforço do COP 3 e da guarnição local, com vista à realização de acções na referida área. Em 22Fev72, por saída da CCaç 3, assumiu a responsabilidade do respectivo subsector de Guidage, ficando então integrada no dispostivo e manobra do COP3.

Em princípios de Ago74, então na dependência do BCaç 4512/72, e de acordo com o plano de retracção do dispositivo, foi desactivada e extinta.

Observações > Tem História da Unidade (Caixa n." 117 - 2.a Div/d." Sec, do AHM).


Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas de unidade: Tomo II - Guiné - (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002), pp. 161-162 e 640
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 11 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21532: Historiografia da presença portuguesa em África (238): Uma viagem à Ilha de Orango em 1879, um magnífico relato de viagens no Boletim n.º 1, 6.ª Série de 1886, da Sociedade de Geografia de Lisboa (1) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21508: Efemérides (344): No dia de Finados, lembro os meus camaradas Manuel Gaio Neto, Joaquim Pinto de Sousa, Gabriel Pereira Bagaço e João Fernandes Caridade (Abel Santos, ex-Soldado At Art da CART 1742)



1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos, (ex-Soldado Atirador Art da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), lembrando a memória de 4 camaradas caídos em campanha, a propósito do Dia de Finados que hoje se celebra.



DIA DE FINADOS


As lembranças que tenho de vocês sempre vão secar as minhas lágrimas e me fazer sorrir
Saudades eternas, amigos e camaradas, descansem em paz, e um até já


Manuel Gaio Neto, Soldado At Art - CART 1742
Prado - Santa Maria - Vila Verde
Falecido em combate em 8 de Novembro de 1967 na Tabanca de Ganguiró

Joaquim Pinto de Sousa, 1.º Cabo At Art (MG-42) - CART 1742
Verride - Montemor-O-Velho
Falecido em combate em 19 de Dezembro de 1967 em Sinchã Jobel

Gabriel Pereira Bagaço, Soldado Apontador Morteiro 81 - Pel Mort 1191
Ribeiro do Melo - Lages do Pico - Açores
Falecido em Combate em 29 de Julho de 1968 - Ataque IN ao aquartelamento de Buruntuma

João Fernandes Caridade, Soldado At Art - CART 1742
Vitorino de Piães - Ponte de Lima
Falecido em resultado de acidente de viação em Buruntuma

____________

Nota do editor

Último poste da série de 1 de Novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21502: Efemérides (343) : No dia de Finados, lembremos os nossos queridos mortos da Tabanca Grande: já lá vão 82 em 820

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21474: In Memoriam (372): Soldado At Art João Fernandes Caridade (1946-1969), falecido em acidente de viação no dia 4 de Maio de 1969, em Buruntuma (Abel Santos, ex-Soldado At Art da CART 1742)

IN MEMORIAM

JOÃO FERNANDES CARIDADE (1946-1969)
SOLDADO AT ART 02122667 DA CART 1742


1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos, (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 19 de Outubro de 2020, enviando a biografia do seu camarada João Fernandes Caridade:

Camaradas e amigos da maior tabanca do País, envio um forte abraço de amizade castrense (e não só) a todos vós.


Biografia do meu camarada João Fernandes Caridade

Mais uma vez estou de regresso ao vosso convívio com uma narração sobre o meu camarada da CART 1742, João Fernandes Caridade, falecido a 04 de Maio de 1969 em Buruntuma.

O João Caridade era oriundo do lugar de Cabreira, Freguesia de Vitorino de Piães, Concelho de Ponte de Lima, onde nascera a 16/12/1946. A sua história militar foi partilhada por mais sete rapazes de Ponte de Lima, numa estranha coincidência que fez com que oito conterrâneos convivessem na mesma Companhia militar na Província da Guiné Portuguesa.

Assentou praça no RI 8 (Braga) em 09 de Janeiro de 1967, fez o Juramento de Bandeira no dia 14 de Março e concluiu a Especialidade de Atirador de Artilharia a 14 de Maio, no RAL 5 (Penafiel). A partir de 29 de Junho ficou em diligência individual no RI 6 (Porto), aguardando embarque para a Guiné, para onde havia sido mobilizado pelo RAL 5, integrado na CART 1742 (Panteras). Era uma Unidade independente, comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Álvaro Lereno Cohen, seguiu para a Guiné Portuguesa no dia 22/07/1967, largando do Cais da Fundição no navio Timor, tendo desembarcado em Bissau no dia 30 e ficado aí adstrita ao BART 1904 cerca de dois meses, em substituição CART 1646, na segurança das instalações e população da área.

No dia 14 de Setembro partiu para Nova Lamego como Unidade de intervenção onde ficou integrada no BCav 1915, depois no BCAÇ 1933 e a seguir BCAÇ 2835. A partir de 18/04/68 foi para Buruntuma render a CCAÇ 1588, ficando integrada no BART 2857. Durante a sua comissão, a CART 1742 operou em Bissau, Nova Lamego e Buruntuma (cooperou com o BCAV 1915 na Operação Lareira), tendo realizado operações nas zonas de Ganguiró, Canjadude, Cabuca e Sinchã Jobel, e efectuado dezenas de escoltas a colunas para Béli, Cheche e Madina do Boé, Bajocunda e Canquelifá. Teve destacamentos em Ponte Caium e Camajabá, durante a sua missão foram-lhe adstritos o Pelotão de Milícias 151 (em Buruntuma) e o Pelotão de Milícias 154 (em Camajabá).

O João Caridade esteve sempre presente em toda actividade da CART 1742, e uma das mais violentas operações em que ele participou foi a “Operação Invisível”, destinada a desalojar o IN do regulado do Manso Mine, região que dominava a partir da sua base de Sinchã Jobel, comandada pelo Capitão Mil Art Carlos Manuel Ferreira, com forças da CART 1742 (2 grupos de combate) comandados pelo Alf Mil Elmano Cruz, e da CART 1690 (2 grupos de combate) reforçados com 1 pelotão de milícias, com comando do Alf Mil Art António Manuel Marques Lopes, operação na qual morreram, entre outros, o Soldado Manuel Fragata Francisco, o Soldado Vítor da Silva Gonçalves e o Alf Mil Fernando da Costa Fernandes e o 1.º Cabo Sousa, atirador da MG 42 da CART 1742.

A notícia da rendição da CART 1742 foi festejada no aquartelamento de Buruntuma em 04 de Maio de 1969, um domingo, data fatídica para o Soldado Caridade que morreu de acidente de viação na sua Unidade, ocorrido às 16:30 horas desse dia, quando D. Cecília Supico Pinto (Presidente do Movimento Nacional Feminino) se encontrava de visita, acompanhada do Comandante do COP 5.
A morte foi provocada pela queda aparatosa no chão, à entrada do quartel, durante o transporte em Unimog de 13 bidões de água para abastecimento da sua Companhia. Apesar da baixa velocidade (mais ou menos 10Km/h) um dos bidões deslocou-se devido a um pequeno ressalto, à passagem da porta de armas e provocou o desequilíbrio do Caridade que quase foi agarrado pelo seu camarada António Soares antes de cair. Foram-lhe de imediato prestados os primeiros socorros pelo Furriel Enfermeiro Manuel Gouveia Lopes, que perante o seu estado de gravidade, solicitou de imediato a sua evacuação para Bissau através do DO-27 em que tinham viajado a Senhora D. Supico Pinto e o Comandante do COP 5, no qual estes também fizeram a viagem de regresso.
Durante o voo, o enfermeiro aplicou pela segunda vez a medicação iniciada na enfermaria, e prestou respiração artificial contínua ao ferido. Por rádio, o piloto solicitou um helicóptero e uma equipa de reanimação junto à pista de Bissalanca, para que o transporte para o HM241 fosse mais rápido. De nada valeu porque o João Caridade faleceu antes de aterrar.

Entretanto em Buruntuma os seus camaradas choravam a sua morte e viam-se impotentes perante os vários adiamentos da retirada da CART 1742, que só chegaria a Bissau no dia 05 de Junho de 1969. Finalmente, a Companhia embarcou em Bissau no dia seguinte, o malogrado Caridade acompanhou-nos, tendo chegado a Lisboa a 13, dia de Santo António.

Fur Mil Art João Morgado Barbosa

Para o também limiano Fur Mil João Morgado Barbosa, a tropa só terminaria dois dias depois, porque foi nomeado Comandante da Guarda de Honra que prestou as últimas homenagens no funeral do malogrado Soldado Atirador 02122667 João Fernandes Caridade em Ponte de Lima

Descansa paz camarada.

OBS:- Biografia consultada: Heróis Limianos da Guerra do Ultramar, de Mário Leitão.

Abel Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 17 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21367: In Memoriam (371): Luís Rosa (1939-2020), ex-alf mil, CART 640 (Sangonhá, 1964/66), natural de Alcobaça... Passa a integrar a nossa Tabaca Grande, sob o n.º 718. Missa do 7.º dia, na Igreja de São de Deus, Pr. de Londres, Lisboa, amanhã, dia 18, às 19h00

sábado, 17 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21457: (Ex)citações (377): As visitas da D. Cecília Supico Pinto ao leste da Guiné (Abel Santos, ex-Soldado At Art da CART 1742)


Nhala, 10 de Março de 1974 - D. Cecília Supico Pinto

© Foto: António Murta - Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos, (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 15 de Outubro de 2020 a propósito das visitas da D. Cecília Supico Pinto ao leste da Guiné:

Camaradas e amigos da maior tabanca do País,

Queiram receber um grande abraço de amizade castrense, e não só, neste meu retorno ao vosso convívio.

Li com atenção o Poste 21442 (*) em que se fala das visitas da D. Cecília de Supico Pinto à Guiné, o qual me suscita algumas achegas, reportando-me ao tempo da minha comissão de serviço militar na Guiné Portuguesa, entre 30 de Julho de 1967 e 06 de Junho de 1969, período em que a minha CART 1742 esteve colocada no sector de Nova Lamego, calcorreando toda a zona Leste.

Diz-se no texto que a senhora foi várias vezes (4) a Madina do Boé,  Buruntuma e Nova Lamego, palavras dela, mas no período de 1967 a Maio de 1968 a senhora não passou por Madina, até porque para lá chegar era só por picadas e fazendo a travessia do rio Corubal no Cheche na célebre jangada de má recordação. 

A aviação (DO) não voava para lá, só voavam para Madina ou Béli os T-6 e os Fiat G-9 para segurança das colunas auto, aquando dos reabastecimentos às companhias lá colocadas, ou quando era pedido apoio para bombardear as zonas circundantes ao aquartelamento.

Em relação a Nova Lamego, no período em que lá estive até 13 de Abril de 1968, nunca vi a senhora por lá, já em Buruntuma esteve presente, e eu constatei isso mesmo, foi a 04 de Maio de 1969, dia de má memória para a CART 1742 pelo falecimento do camarada Caridade. Nesse dia, quando regressava ao quartel com um carregamento de 13 bidões de água para abastecimento da companhia, caiu abaixo da viatura que transportava os bidões, ficando muito maltratado.

De referir que o Caridade foi evacuado para o HM 241, onde infelizmente chegou já cadáver, no DO-27 que levou para Bissau a D. Cecília Supico Pinto.

Um abraço para todos, e até nova oportunidade. (**)
Abel Santos.
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 11 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21442: Fotos à procura de... uma legenda (128): Em maio de 1969, ao tempo do BCAÇ 2852, a Cilinha terá pernoitado em Bambadinca?

(**) Último poste da série de 16 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21454: (Ex)citações (376): As nossas comuns raízes telúricas, do Nordeste Transmontano à Estremadura e ao Alentejo (Francisco Baptista / Fernando Gouveia / José Belo / José Colaço / Luís Graça)

sábado, 4 de julho de 2020

Guiné 61/74- P21140: E as nossas palmas vão para... (20): o veteraníssimo Jorge Ferreira, que hoje faz anos, e foi o etnofotógrafo da Buruntuma de 1961/63 que não existe mais...


Capa do do livro de fotografia "Buruntuma: 'algum dia serás grande', Guiné, Gabu, 1961-63". (Edição de autor, Oeiras, 2016).]: o fotógrafo, em 1961, ao lado do então régulo Sené Sané, que era tenente de 2ª linha. junto ao marco fronteiriço ("República Portuguesa: Província da Guiné"), na fronteira com a República da Guiné. Cortesia do autor.

O autor, Jorge Ferreira, ex-alf mil da 3ª CCAÇ (Bolama, Nova Lamego, Buruntuma e Bolama, 1961/63), é membro da nossa Tabanca Grande, é um fotógrafo amador com mais de meio século de experiência, tem um página pessoal no Facebook, além de um sítio de fotografia, Jorge da Silva Ferreira.




Vídeo (11' 03'') alojado em You Tube > Jorge Ferreira (Cortesia do autor, membro da Tabanca Grande)

Vídeo: © Jorge Ferreira (2018). Todos os direitos reservados.


1. Está disponível, desde 10 de junho de 2018, no YouTube, na conta de Jorge Ferreira, este vídeo com uma seleção das belas fotos do seu livro "Buruntuma: 'algum dia serás grande', Guiné, Gabu, 1961-63". (Edição de autor, Oeiras, 2016).


Para quem ainda o não conhece, o vídeo merece as nossas palmas e uma "visita" por uma dupla razão:

(i) o Jorge Ferreira é um  bom amigo, um grande camarada, um excelente fotógrafo e um magnífico tabanqueiro, um calmeirão de um ser humano que eu, pessoalmente,  muito prezo e estimo; as suas fotos de Buruntuma inseram-se na categoria de etnofotografia; além disso, a Buruntuma que ele conheceu e fotografou, em 1961/63, não existe mais;

(ii) o vídeo tem a excecional colaboração de um outro grã-tabanqueiro (nº 642), talentoso músico guineense, lider do grupo musical Super Camarimba, Mamadu Baio, originário da tabanca de Tabató (, região de Bafatá, Guiné-Bissau), e hoje cidadão português, pai de um "djubi", português, de nome Malick, com costela alentejana; a música que ele disponibilizou é do primeiro CD dos Super Camarimba ("Sila Djanhará", c. 2010), gravado no Mali.

O nosso editor, Luís Graça, pôs na altura o Jorge Ferreira erm contacto com o Mamadu Baio e lá chegaram os dois a um acordo sobre a utilização de uma das faixas de música, com menção dos direitos de autor, na ficha técnica, no final.

O vídeo, disponível numa rede social de impacto gobal como o You Tube, não tem qualquer propósito comercial, é uma homenagem ao povo de Burintuma (que em mandinga quer dizer justamente "Algum dia serás grande"). Merece uma visita, já tem quase 800 visualizações.

Mamadu Baio:
foto de Luís Graça (2014)
2. Em dia de anos do nosso veteraníssio Jorge Ferreira, um camarada ainda do tempo da farda amarela, juntam-se mais uns versinhos, feitos este sábado, em cima do joelho, na Tabanca de Candoz, pelo nosso editor LG-

É também uma pequena homenagem aos nossos camaradas e amigos da Guiné que têm aguentado estoicamente esta pandemia de COVID-19 e que, desde março,  vêm celebrando sozinhos, trancados em casa, o seu aniversário natalício. Fazermos votos para que as nossas tabanca possam ir reabrindo, lentamente, com total segurança e confiança.  O Jorge é assíduo freqentador dos almoços-convívios da Magnífica Tabanca da Linha.


Ao Jorge Ferreira (e aos demais aniversariantes da nossa Tabanca Grande que foram obrigados a cantar "os parabéns a você", sozinhos em casa):


Amigo Jorge Ferreira,
És dos nossos veteranos,
Mas não caias na asneira,
De dizer que fazes anos.

Não há copos p’ra celebrar,
Nem na Tabanca da Linha,
Mas logo que a crise passar,
Abre o Resende a cozinha.

Em Buruntuma, as bajudas
Foram todas retratadas,
Fossem belas ou feiudas,
Solteirinhas ou casadas.

Desse tempo tens saudade,
Até marcos tu puseste,
Não te pesava a idade,
Grande alfero lá do Leste.

Retificaste a fronteira
C’o a Guiné-Conacri,
E juraste p’la bandeira:
 “Sou eu quem manda aqui”.

Saia um  peixinho da bolanha,
Feito à maneira, no forno,
Quem não tinha arte e manha,
Apanhava com um corno.


Paludismo, hepatite,
E até bilharziose,
Não faltava o apetite,
Cada um c’o sua dose.

De Paunca até Pirada,
Do Gabu até Bolama,
Não me queixo, camarada,
Dormi no mato e na cama.

Tive farda de caqui,
E chapéu colonial,
Mas só de amores morri
Pl' aquela terra, afinal.

Convivi com  o Sané,
Senhor de Canquelifá,
Percorri meia Guiné,
Fiz amigos como os de cá.

Em resorts de muitas estrelas,
Deixei pedaços de mim,
Não me lembro das caravelas,
Mas a história foi assim.

Buruntuma, hás de ser grande,
Não importa em que ano ou dia,
Seja o povo quem mais mande,
Em passando a pandemia.

Hoje o Jorge é menininho,
Vai ter ronco na tabanca,
Toda a gente, preta ou branca,
Lhe vai dar um carinho.

Luís Graça, 
Tabanca de Candoz, 4 de julho de 2020

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sexta-feira, 1 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20927: (De)Caras (158): O comerciante Mário Soares, de Pirada, quem foi, afinal? Um "agente duplo"? - Parte VII: mais uma achega do Carlos Geraldes: o caso do ataque (anunciado) a Pirada em 28/5/1965 e o linchamento do gila confundido com um espião,


Comunicado do PAIGC referindo um ataque a Pirada,  o dia 28 [, sem mês nem ano],,, Cruzando informação disponível no blogue, esse ataque só pode ser o dia 28 de maio de 1965, ao tempo da CCART

Instituição:
Fundação Mário Soares
Pasta: 07065.068.053
Título: Comunicado [Frente Leste]
Assunto: Comunicado sobre o ataque da Secção do Exército Popular ao quartel de Pirada.
Data: s.d. 
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo Documental: Documentos
Página(s): 1

Citação:
(s.d.), "Comunicado [Frente Leste]", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40762 (2020-4-29)




Mário Soares > Pirada >
14/2/1974.
Foto: António Rodrigues 
(2015)
1. Continuamos à(s) volta(s) dessa figura algo misteriosa que foi o comerciante português Mário Soares, ou Mário Rodrigues Soares, mas também identificado com António Mário Soares (*). Dizem, justa ou injustamente, que serviu dois senhores, as NT e o PAIGC. Foi acusado de ter sido informador da PIDE/DGS tanto quanto "espião" do PAIGC. Em suma, "um "hábil agente duplo (...) durante muito tempo", condição que "acaba sempre por ter um preço amargo de pagar" (, segundo o seu amigo Carlo Geraldes). No fim da guerra, terá sido escorraçado por uns e por outros.

Esteve estabelecido em Pirada, no leste da Guiné, na fronteira com o Senegal, e diversos camaradas nossos (, nomeadamente, alferes milicianos)  conviveram com ele ao longo da guerra colonial, pelo menos desde 1963 a 1974.

Tende, por vezes, a ser confundido com o  seu homónimo,  esse, sim,  inconfundível figura pública Mário [ Alberto 
Nobre  Lopes] Soares (1924-2017), presidente da República Portuguesa (1986-1996), duas vezes primeiro ministro, fundador 
e secretário geral do Partido Socialista, opositor do regime de 
Salazar-Caetano,  etc.

A ignorância pode ser tanta que até a jovem cabo-verdiana, nascida em 1991, Kathleen Rocheteau Gomes Coutinho, troca os dois nomes, os homónimos,  num trabalho académico, defendido em provas públicas numa universidade brasileira (**).

Sabemos, por testemunhos anteriores (*), que o Mário Soares: (i) era natural de Lisboa; (ii) terá vindo para a Guiné por "dificuldades financeiras); (iii) estabeleceu-se como comerciante em Pirada; (iv) era casado (com Luísa  e tinha 3 filhos (um rapaz. José, a estudar em Lisboa,  e duas raparigas, Rosa e Eva Lúcia, esta a mais nova,  nascida em 1958); (v) deverá ter nascido na década d 1920, pelo que nos anos de1964/65 já teria mais de 40 anos; (vi) era "o branco mais africano que comheci" (, segundo a opinião de José Pratas, antigo alf mil médico, CCS/BCAV 3864, Pirada, 1971/73).

Sabemos ainda que: (vii) em Pirada havia mais 4 comerciantes brancos, em 1964/65; (vii) em 1971/73,  havia um agente da PIDE na vizinhança, "bom para seviciar e intimidar", o Carvalho [, Gumersindo Fernandes Carvalho, agente de 2ª, nascido em Castanheira de Pera, 1946 ?], substituído pelo Pereira [, Manuel Rodrigues Pereira, agente de 2ª, nascido em 1945, em S. Pedro do Sul ?,]  que "tinha farroncas mas com as flagelações tremia como varas verdes" (José Pratas).

Portanto, o Mário Soares não era o gente da PIDE/DGS de Pirada, nem nunca pertenceu ao quadro de pessoal da PIDE/DGS... o que não o impedia de colaborar com a política política, aproveitando-se das "relações especiais" que tinha com as autoridades fronteiriças do Senegal. O que também não quer dizer que não fosse "informador" da PIDE/DGS...e não pudesse também ser útil ao PAIGC. Dáí que, desde muito cedo, corresse a fama de ser um "agente duplo".


Guiné - Bissau > Região de Gabu > Pirada > 2018 > Antiga delegação local da PIDE/DGS, e hoje esquadra local da polícia de segurança pública. Entre 1971 e 1973, ao tempo do alf mil médico José Pratas (CCS/BCAV 3864, Pirada, 1971/74),  terão passado por aqui dois agentes:  o Carvalho [, Gumersindo Fernandes Carvalho, agente de 2ª, nascido em Castanheira de Pera, 1946 ?], substituído pelo senhor Pereira [, Manuel Rodrigues Pereira, agente de 2ª, nascido em 1945, em S. Pedro do Sul ?,]  (José Pratas). 


Guiné > Região de Gabu > Pirada > 2018 > Antiga casa do comerciante Mário Soares. Ficava,  à esquerda,  na Rua principal que levava à fronteira do Senegal, 

Fotos (e legendas): cortesia da página do Facebook Pirada Guiné-Bissau (2018). [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]

No livro de Maria José Tíscar ("A PIDE no Xadrez Africano: Conversas com o Inspector Fragoso Allas", Lisboa, Edições Coilibri, 2017), o "patrão" da polícia política na Guiné, homem  da confiança pessoal de Spínola, o Fragoso Allas, dá a entender, abusivamente, que  o comerciante Mário Soares era "mais" agente que o "seu"agente, o Carvalho, e depois, o Pereira:  que estes, ou um deles,  viveriam na casa do comerciante, que ele é que atenderia, em 90% dos casos o rádio da DGS, e que era aceite por ele, Fragoso Allas, como "agente duplo"... Porque lhe convinha... No fundo, é menorizado o papel do Mário Soares, conforme se pode deduzir das longa conversa com a historiadora,em que ele terá aberto o seu "livro": 

(...) "Era habilidoso [, o Mário Soares], tinha boas relações com as autoridades portuguesas e tinha bons contactos, também, com as do Senegal. Teve atuações muito importantes para nós. 

(...) " Era útil como agente de contrainformação. Quando queríamos enviar informações falsas ao PAIGC dizíamos-lhe que era muito secreto e então ele ia logo transmiti-las.

/...) "As informações que ele fornecia sobre o PAIGC quase não serviam, porque nós sabíamos que ele também trabalhava para eles.


(...) "Quando cheguei à Guiné, o General Spínola estava muito zangado com ele e queria mesmo expulsá-lo da província, mas isso não seria conveniente porque o posto da PIDE estava dentro da sua casa, pelo que me interessei para que ele continuasse na sua atividade”. (...)


2. Quem mais escreveu sobre o comerciante Mário Soares,  aqui no blogue,  foi  ex-alf mil Carlos Geraldes, da CART 676 (Bissau, Pirada, Bajocunda e Paunca, 1964/66), infelizmente já falecido em 2012. 

A sua foi a primeira companhia a ficar aquartelada em Pirada (, a partir de 15 de outubro de 1964). Até então Pirada era um destacamento guarnecido por um pelotão: em 1963, por exemplo, o nosso camarada e grã.tabanqueiro Jorge Ferreira disse-me, em conversa ao telefone, que esteve lá em Pirada, dois dias, e almoçou na casa do Mário Soares, ele, e outros militares, incluindo  o comandante do destacamento, o então alf inf Artur Pita Alves, hoje cor ref, que faria mais tarde uma outra comissão na Guiné, como capitão (CAÇ 1423, Bolama. Empada e Cachil, 1965/67).

O destacamento possivelmente pertencia ao BCAÇ 512 (Mansoa e Nova Lamego, 1963/65) ou então ao BCAÇ 506 (Bafatá, 1963/65), pormenor que o Jorge Ferreira já não pode precisar, mas seria o batalhão de Mansoa,

O Mário Soares recebeu, de resto,  em sua casa vários camaradas nossos, a começar pelos veteranos, o alf mil António [de Figueiredo] Pinto (BCAÇ 506 e 512, 1963/1965), o alf mil médico Luiz Goes (BCAÇ 506, Bafatá, 1963/65), e o Carlos Geraldes (CART 674, 1964/66), os dois últimos já falecidos. (Ao António Pinto, que  vive em Vila do Conde, mandamos um especial abraço.)

O Jorge Ferreira (ex-alf mil da 3ª CCAÇ,  Bolama, Nova Lamego, Buruntuma e Bolama, 1961/63),  autor do livro de etnofotografia, "Buruntuma: 'algum dia serás grande', Guiné, Gabu, 1961-63". (Edição de autor, Oeiras, 2016), estava nessa altura destacado em Buruntuma. Portanto, em 1963, ele também confirma que o Mário Soares já estava estabelecido em Pirada.

No Arquivo Amílcar Cabral, disponível no portal Casa Comum, criado pela Fundação Mário Soares, há pelo menos 11 referências a Pirada, mas nenhuma referência ao nome ou à pessoa do comerciante Mário Soares...

Sabe-se que em 1963 o PAIGC tinha muitas dificuldades de implantação na região, devido à hostilidade dos fulas e à fraca lealdade dos seus simpatizantes e militantes,  de maioria mandinga,  bem como à concorrência da FLING. Por outro lado, o Senegal, de Leopoldo Senghor, impunha, na época,  sérias limitações à liberdade de movimentos do PAIGC.

Se o Mário Soares fosse militante ou simpatizante do PAIGC seria, na época, um recurso precioso: os homens do PAIGC queixavam-se, então,  de que passavam fome, não dispunham de cuidados médicos, não tinham  armamento em condições nem muitos menos explosivos para a destruição de pontes, eram combatidos pelos fulas... Em suma, o moral era baixo ou estava em baixo.



Excerto de carta (manuscrita) remetida por Areolino Cruz a Pedro Pires, data de Pirada, 17/7/1963. É referido um ataque a "quartel de Pirada", no dia 15, tendo sido incendia a casa de um "tipo da PIDE".  Resultados: (i) "morreu um soldado europeu"; (ii) " soldados europeus têm agora medo de sair à noite, e mesmo depois das 6 da tarde"... O PAIGG não teria na época um bigrupo, o Areolino Cruz diz que "fomamos de agora em diante um só grupo comandado por Chico Tê, aproximadamente 22 homens"... (Não temos noticia de que nessa data, 15/71963, tenha morrido algum militar português no TO da Guiné.)

(Fonte: Arquivo Amílcar Cabral... Com a devida vénia; Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)

Citação:
(1963), Sem Título, Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_36881 (2020-4-30)


3. O primeiro verdadeiro ataque a Pirada só acontece em 28 de maio de 1965, ao tempo da CART 676. (Talvez não por acaso, o PAIGC desencadeou mais do que um ataque ao longo da guerra, nessa efeméride, evocativa do 28 de maio de 1926,  data histórica em que triunfou, em Portugal, o golpe de Estado que deu origem à Ditadur Militar e ao Estado Novo; estou-me a lembrar, por exemplo, do ataque a Bambadinca, em 28 de maio de 1969.) 

Estava então o Carlos Geraldes de licença de férias na Metrópole... [Há um interregno da sua correspondência para a Metrópole entre 18/4/1965 e 13/6/1965, correspondente ao período - mês de maio - em que não apenas gozou a sua licença de férias como celebrou  o seu primeiro casamento.]

A posteriori, logo a seguir, quando regressa a Pirada e a Paunca (onde o seu pelotão está destacado), reconstitui esse ataque e os acontecimentos que se lhe seguiram, o linchamento de um pobre gila (comerciante ambulante), confundido com um espião,  por ter sido encontrado transportando alguns sacos de invólucros na sua bicicleta depois do ataque do PAIGC...

Não tendo sido "testemunha ocular" nem do ataque do PAIGC  nem do linchamento do gila,  Carlos Geraldes, por uma questão de honestidade intelectual, começa a narrativa com a segyinte reserva: "Não sei se o deva contar"...Mas depois conta, e o que escreveu está  publicado no blogue, na sua série "Gavetas da Memória".

Voltamos a reproduzir essa crónica, com título e subtítulos nossos. Pode ser que, entretanto, mais algum camarada possa confirmar ou infirmar  (ou acrescentar algo mais sobre) o que aconteceu nesse dia 28 de maio de 1965, em Pirada.


O caso do  ataque (anunciado)  a Pirada em 28/5/1965 e o o linchamento do gila, confundido com um espião (**)


(i) O Primeiro Ataque a Pirada

Não sei se o deva contar, porque nem sequer fui testemunha ocular. Nesse dia, 28 de Maio de 1965, estava de férias na Metrópole junto com a família. Um mês inteiro longe da guerra, na total ignorância de como as coisas se iam passando por lá,  a milhares de quilómetros. Só quando regressei de avião a Bissau é que me contaram a novidade.

Pirada tinha sido atacada!

Ao princípio custou-me a acreditar, até porque quem mo contou também não sabia bem os pormenores. Mal pude conter a impaciência nos dias que se seguiram à espera de boleia num Dakota (o velhinho, mas muito útil DC-6) para Nova Lamego onde depois teria um jeep da Companhia para me ir buscar. O sempre sorridente alferes Pinheiro lá estava pontualíssimo para me servir de condutor de regresso a casa.

E então lá me contou como tudo se tinha passado, enquanto eu o ouvia,  embasbacado, ainda pouco crente que me estivesse a falar verdade.

O M[ário] Soares, como sempre, fora informado que um numeroso grupo de guerrilheiros se estava a juntar do outro lado da fronteira, no Senegal. Estava bem armado e tinha intenção de fazer qualquer coisa ao quartel da tropa em Pirada. E até se sabia o dia e a hora em que isso iria acontecer. 

O nosso Capitão fez aquilo que a prudência mandava, entrincheirou-se o melhor que pôde e aguardou. Aliás, tomou até uma medida que sempre me pareceu um pouco ousada e timorata. Quis contra-atacar. Planeou então uma manobra para emboscar o inimigo que supostamente viria atacar o aquartelamento do lado ocidental a coberto da povoação nativa, a cintura de palhotas que envolvia Pirada. Para isso mandou que o alferes Pinheiro e o seu Grupo de Combate se fossem colocar, muito discretamente, do lado de fora da tabanca, numa zona baixa, já perto da bolanha, onde aí, montariam uma emboscada e contra-atacariam os assaltantes encurralando-os contra o quartel. Só que as coisas nem sempre correm tão bem como se planeiam no papel. A noite estava escuríssima, conforme me ia contando o Pinheiro:

"Eu mal consegui dar com o sítio que o capitão me tinha dito onde eu e os meus homens nos deveríamos ocultar para depois apanhar os gajos. E depois quando a festa começou deu-me a impressão que afinal estávamos mais afastados do que era previsto. E pelo arraial que faziam deviam de ser mais de duzentos. Olha, eu, pelo sim pelo não, para não estar para ali a fazer fogo sem mais nem menos, resolvi que o melhor seria esperar muito caladinho e ver como as coisas se iriam passar. Se revelássemos a nossa posição até talvez ficássemos numa situação muito perigosa. Aliás poderia acabar por fazer fogo contra os nossos, não achas? Por isso, ficámos ali muito quietinhos à espera que tudo passasse. No quartel estavam mais bem protegidos pelos abrigos, eu ali não tinha protecção nenhuma!"

Sim, o alferes Pinheiro tinha razão, era insensato atacar às cegas um inimigo que não se sabia bem onde estava nem de onde vinha, muito superior em número e armamento. Tomou uma decisão que à primeira vista poderá ser tomada como um acto de cobardia, mas que na verdade, tratou-se apenas de evitar um mero suicídio colectivo totalmente gratuito e ineficaz.

Assim o ataque desenrolou-se durante grande parte da noite, com a população nativa aterrorizada, escondida o mais que podia para escapar às balas perdidas que voavam em todas as direcções, varando de lado a lado as palhotas e as vedações dos quintais, enquanto do quartel atiravam morteiradas em todas as direcções e abriam fogo de metralhadora à vontade numa ânsia de aniquilar um inimigo que nem conseguiam descortinar.


(ii) O enigmático Mário Soares


Segundo depois me contou o M[ário] Soares, elementos do PAIGC passearam-se mesmo pelo centro do povoado, donde, até debaixo do alpendre da sua casa, fizeram fogo na direcção do quartel. Mas a ele e à família nem num cabelo tocaram. 

Admirável cavalheirismo romântico, que não seria fácil encontrar ali no mais remoto interior da Guiné. Gesto que, no entanto, lhe acarretaria futuros problemas com as desconfianças que a tropa foi alimentando a seu respeito, esquecendo que paralelamente M. Soares sempre lhes fornecera amplas e atempadas informações das andanças dos grupos inimigos que transitavam regularmente pelo Senegal, vindos da Guiné-Conacri em direcção à região do Morés, no triângulo Mansabá-Mansoa-Bissorã.

Na verdade a imunidade de M. Soares devia-se muito à sua condição de hábil agente duplo que soube manter durante muito tempo e isso acaba sempre por ter um preço amargo de pagar.

Com o raiar do dia [, 28 de maio de 1965], já depois de as armas se terem silenciado,  é que, aos poucos e poucos se foram verificando os estragos. Felizmente do nosso lado não houve mortos nem feridos, apenas danos materiais. As instalações ficaram com as paredes crivadas de balas, e duas viaturas foram atingidas mas nada de grande monta. [No comunicado do PAIGC, acima reproduzido, fala-se em 3 viaturas incendiadas: 1 jipe, 1 Unimog, 1 Mercedes Benz; mais: diz-se que "incendiámos toda a Pirada"...]

Na tabanca é que tinha sido pior, tinham ardido umas dezenas de casas, devido talvez ao nosso fogo de morteiro. Quatro mortos a lamentar e bastantes feridos sem grande gravidade, pois grande parte da população tinha fugido para longe. O posto médico depressa se encheu e o pessoal de saúde não teve mãos a medir, enquanto patrulhas percorriam toda a zona de onde o inimigo teria estado a fazer o fogo, agora facilmente identificável pelo elevado número de cápsulas vazias de vários calibres 
espalhas pelo chão. 

Os rastos deixados pelo grupo dos atacantes indicavam também que deveriam ter sofrido algumas baixas pelos vestígios de sangue deixados nos percursos de fuga em direcção do Senegal [, pelo menos dois mortos, conforme comunicado do PAIGC acima reproduzido].


(iii) O linchamento do gila


Mal recuperados do susto que tinham apanhado, tanto oficiais como sargentos e praças nem tinham vontade de falar no assunto.

Mas envergonhados também pelas reacções primárias a que se entregaram, quando ainda naquela manhã, prenderam um atónito gila que, inocentemente, tinha carregado na sua bicicleta vários sacos de cartuchos vazios que fora apanhando pelo caminho que percorrera despreocupadamente (?). 

Logo ali o acusaram de espião e resolveram fazer justiça pelas próprias mãos. Enquanto o capitão e o resto dos oficiais e sargentos se fecharam na caserna, a turba,  uivando cada vez mais enfurecida, arrastou o pobre desgraçado para o meio da parada e,  no meio de insultos e pancadaria, acabou de matar o pobre do gila, regando-o em seguida com gasolina e chegando-lhe fogo.

E até me mostraram fotografias, que acabaram por depois fazer desaparecer, cientes da barbaridade cometida.

Ainda cheguei a tentar falar com o capitão sobre o acontecimento. Mas apenas me respondeu com um silencioso encolher de ombros, revelador de uma total incapacidade de impedir o linchamento. E se calhar até de algum tácito consentimento para serenar os ânimos.

Mas só na antiga Roma é que os cruéis imperadores proporcionavam ao povo espectáculos de morte, para o poder controlar a seu bel-prazer! Teria acontecido aqui o mesmo?

Porém, com o passar do tempo,  tudo foi esmorecendo e caiu no esquecimento.Mas, o gila teria deixado família? Mulher,  filhos, outros parentes? Qual teria sido a raiva e a dor deles? Como teriam encarado o futuro?

A guerra não foi só recheada de heroísmos, ou uma alegre perseguição das bajudas lavadeiras apanhadas desprevenidas no regresso da bolanha, ou uma imprevidente saída para o mato na escuridão de uma noite tenebrosa.

A guerra foi também um longo rosário de pesadelos que nos marcou profundamente, mas que teimamos em não valorizar também.

Recolhi a Paunca [, destacamento da CART 676], logo que pude, para tentar esquecer.

(iv) A guarda republicana senegalesa corre com todos os grupos armados que podem ameaçar os postos fronteiriços portugueses (****)


(...) Voltando à vaca fria, nesta guerra, como se pode ver mais uma vez, tive sorte. Pois foram logo escolher o dia do ataque para quando estava de férias. Parece que eles ainda pensaram em voltar, mas viemos a saber depois que tinham resolvido ir atacar outra zona que, se calhar, lhes seria mais favorável. Entretanto a população regressou e tudo voltou à normalidade.

O Presidente do Senegal (Senghor) enviou para esta região membros da guarda republicana senegalesa para correr com todos os grupos armados que circulam por aqui e que já o estavam a inquietar, de maneira que hoje de manhã [, 15 de junho de 1965,]tivemos a inevitável confraternização, mesmo sobre a linha de fronteira.

Confraternização essa que levámos a efeito em regime estritamente confidencial, pois mais ninguém deveria saber, para não se armarem as habituais confusões junto do poder central. De um lado, eu, o Capitão, o alferes Carvalho [, pseudónimo do Pinheiro], e o alferes médico representando a tropa. O M. Santos representando os civis. Do outro lado, três guardas senegaleses.

O ambiente foi bastante cordial e prometeram-nos nunca mais autorizar a permanência, nesta zona, de grupos de guerrilheiros armados que, pelos vistos, também já os estariam a preocupar e incomodar. (...)

[Seleção, revisão e fixação de texto, incluindo negritos, itálicos e realces a amarelo: editor LG]
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(**) Katheleen Rocheteau Gomes Coutinho - A Política Externa de Cabo Verde (1975 a 1990): uma análise da configuração e atuação da política externa de Cabo Verde durante a guerra fria. Monografia apresentada ao Instituto de Relações Internacionais como requisito parcial à obtenção do Bacharel em Relações Internacionais. Brasília, Unibversiade de Brasília, Faculdade de Relações Internacionais, Instituto de Relações Internacionais, 2015. Disponível em: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/16366/1/2015_KathleenRochteauCoutinho_tcc.pdf

(...) Estes dois fatores [, a vitória da luta de Libertação Nacional levada a cabo pelo PAIGC,  e a Revolução dos Cravos ou Revolução de 25 de abril de 1974,] foram importantes e estiveram na origem do Acordo para a independência de Cabo Verde, assinado em 19 de dezembro de 1974, pelas delegações do governo de Portugal e o PAIGC, nomeadamente entre Mário Soares (representando Portugal) e Pedro Pires (representando o PAIGC). (...)

Em nota de rodapé, diz-se que o seguinte: 

(...) Mário Rodrigues Soares- Português, 1922. Comerciante na região de Pirada onde acabou por funcionar como “agente” ou “espião”, nos contatos entre as autoridades portuguesas, senegaleses e o PAIGC. (Lopes, 2012).(...) [LOPES, José Vicente. “Aristides Pereira, Minha Vida, Nossa História”. Spleen edições, Cabo Verde, Cidade da Praia, 2012.]

(...) Pedro Pires, Cabo-verdiano 1934. Oficial miliciano na Força Aérea Portuguesa. Membro do PAIGC. Formação militar em Cuba e URSS. Comandante da Região Militar do PAIGC. Lidera a delegação do PAIGC na assinatura (...)

(****) Excerto da carta datada de  Pirada, 13 de junho de 1965, reproduzida aqui;

7 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4916: Cartas (Carlos Geraldes) (6): 2.ª Fase - Abril a Junho de 1965