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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19217: Historiografia da presença portuguesa em África (138): Relatório Anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1935 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
Para se aquilatar do bom ao mau uso que estes relatórios produzidos anualmente pelos administradores de circunscrição tinham junto dos governadores, impõe-se fazer a leitura dos respetivos relatórios destes últimos para os ministros das Colónias. É o que se irá procurar fazer, depois de passar a pente fino todos os que constam da secção de Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa. Manuel Luiz da Silva já nos dera o relatório de 1932, desta vez envereda pela dimensão antropológica social, tece comentários curiosos que vale a pena registar.

Um abraço do
Mário


Relatório Anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1935

Beja Santos

Dando continuidade à publicitação de documentação constante na secção de Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa, mostra-se alguns dos elementos essenciais do relatório assinado pelo Administrador da Circunscrição dos Bijagós, Manuel Luiz da Silva, em 1935. Recorde-se já aqui se dera à estampa alguns dos elementos mais significativos do relatório de 1932, também referente aos Bijagós[1].

Passando à margem das informações que constam em todos os relatórios, vamos entrar diretamente para elementos pertinentes do presente relatório. Começa por nos dizer que a única raça que habita o arquipélago é a bijagó, seriam 44 mil, de acordo com o recenseamento de 1924. Na atualidade a população tinha diminuído devido a muitos terem emigrado para o continente por não quererem trabalhar para o pagamento dos seus impostos, levando fora do arquipélago, na maioria dos casos, vida de nómadas. Mas quando melhora o quadro de crise, voltam às suas ilhas, pelo amor que lhes dedicam:
“Aqueles que a doença os prostra ou vêem aproximar-se o fim da vida, mesmo aqueles que os seus classificam de feiticeiros ou se vêem ou se julgam perseguidos por qualquer motivo, regressam, os primeiros para morrerem de morte natural e serem enterrados na sua terra ou na sua palhota, e os segundos para se suicidar, o que é frequente, por crerem na transmigração das almas”.

E procura dar um quadro de antropologia social do bijagó:
“Raça forte, inteligente, indolente e pacífica, já não são os bijagó os piratas que noutros tempos foram. Com excepção dos de Caravela e Caraxe, que talvez por motivos de uma superstição, nunca foram marinheiros. A inteligência serve-lhe mais as vezes para o mal do que para o bem, pois são mentirosos por índole, e, ainda mais, avessos à civilização, acatando, contudo, a colonização.
São hospitaleiros a ponto de se deixarem extorquir pelos seus hóspedes, sem que procurem livrar-se desses inoportunos, porque os seus usos e costumes e a lei da hospitalidade lhos impedem.
Se tiverem queixas e tenham de exercer vingança pessoal que mereça agressão a um estranho à sua raça, esperam encontrar-se fora da sua terra para a exercerem.
As terras são da comunidade. Nas ilhas de Caravela, Caraxe, Naga, Chedian e nalgumas povoações da Formosa vigora o regime patriarcal, nas restantes ilhas é mais acentuado o regime de matriarcado; mas em todas as ilhas quem namora, quem fala e trata do casamento é a mulher, é a mulher que põe o marido fora de casa, nas ilhas onde ela predomina. No entanto, o predomínio da mulher sobre a família, nas ilhas onde existe o matriarcado, tende a extinguir-se, pouco a pouco.
Não usam a circuncisão como em outras raças, mas fazem o simulacro, nessa ocasião são os rapazes de 20 a 30 anos submetidos à prova de resistência, que consta de flagelação com chicotes, podendo durar as cerimónias 2 ou 3 meses.
As mulheres, entre elas, também passam pelas mesmas provas mas muito mais suaves e menos demoradas. Nessa ocasião procedem à tatuagem. A cerimónia da desfloração é feita em segredo, como todas as cerimónias, usando-se de uma vagem própria para o acto. Cerimónia a fazer mas desnecessária, pois a desfloração já de há muito foi feita conforme manda a natureza, na idade de 12 anos em diante.
Toda a vida do bijagó anda à volta do fanado (acto de simulação da circuncisão) e das suas vacas, de que tudo imitam, inclusive o coito, imitam a vida de alguns peixes, como o tubarão e o espadarte, dos anfíbios, especialmente a do hipopótamo, executando todos os actos brutais dos animais”.

E o relatório do Administrador Manuel Luiz da Silva adianta mais informações:
“A Companhia Agrícola e Fabril da Guiné, dentro das suas concessões nas ilhas de Bubaque, Soga e Rubane, possui cerca de 120 quilómetros. Um naturalista, aqui, tem matéria vasta de estudo. O que é certo é que é bem conhecida a existência de répteis, que já Camões, nos Lusíadas, os cita no Canto V, Estância XI. Foi dessa Estância que se baptizou um grémio existente em Bubaque, o Grémio Dórcada.
Bubaque possui uma praia, ao sul, onde é frequente os banhistas dela se servirem sem perigo dos tubarões, toda de areia consistente, com extensão de 4 quilómetros, servindo, como já tem servido, para corridas de automóveis”.

Procede depois a uma descrição dos Serviços Públicos e termina o seu documento dizendo que a ilha de Canhambaque se encontra temporariamente submetida ao regime militar, o Comandante da Força era o Tenente José de Passos Simas e o Segundo Sargento chamava-se Aníbal Augusto.



Tipos étnicos guineenses. 
Imagens retiradas da publicação “Portugal em África, Revista de Cultura Missionária”.
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Notas do editor

[1] - Vd. poste de 31 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19152: Historiografia da presença portuguesa em África (134): Relatório anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1932 (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 14 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19192: Historiografia da presença portuguesa em África (136): Crenças e costumes dos indígenas da ilha de Bissau no século XVIII - Revista "Portugal em África" (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19152: Historiografia da presença portuguesa em África (135): Relatório anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1932 (Mário Beja Santos)

Antiga casa comercial António Silva Gouveia, posteriormente utilizada para instalações militares do quartel de Bolama

Fotografia de Francisco Nogueira, retirada do livro “Bijagós Património Arquitetónico”, Edições Tinta-da-China, 2016, com a devida vénia.


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Maio de 2018:

Queridos amigos,
O mínimo que se pode dizer é que este relatório não pode ser escamoteado nos estudos historiográficos da colónia, exatamente naquele tempo em que começara a submissão de Canhabaque, última etapa das chamadas Guerras da Pacificação. O administrador Manuel Luiz Silva é pouco dado a floreados e explica o que se passa com o imposto de palhota, com as roubalheiras dos grumetes, como os Bijagós desconfiam de tudo e todos e eram na verdade uma sociedade horizontal, há muito que tinham desistido de fazer guerra aos Beafadas, preferiam o seu isolamento. Atenda-se ao que o administrador diz sobre o quadro sanitário do arquipélago e à carência de meios para garantir a soberania portuguesa.

Um abraço do
Mário


Relatório anual da Circunscrição Civil dos Bijagós, 1932

Beja Santos

Quem o assina é Manuel Luiz Silva, o Administrador, andou por outras paragens guineenses, regressou aos Bijagós e revela-se hipercrítico do trabalho desenvolvido pelos antecessores. Dando cumprimento aos preceitos estabelecidos para o que deve ser um relatório anual, logo no capítulo I, referente ao solo e clima, lembra que o arquipélago possui 19 ilhas habitadas e 16 ilhas e ilhéus e diversas ilhotas desabitados. São tudo terrenos baixos, não há qualquer espécie de elevação. Ao tempo, existe o Comando Militar de Canhabaque, a ilha é insubmissa, constituído por uma ilha habitada, oito ilhas e ilhéus desabitados. Informa que não existe nenhum rio no arquipélago e que a constituição do solo não difere do do continente. Não lhe desagrada o recurso a imagens quase poéticas, como esta: “Nas marés baixas, desnudam-se grandes superfícies, na sua quase totalidade coberta de vaza lodacenta permitindo ao indígena poder deslocar-se de algumas ilhas para outras sem auxílio de embarcações. A água é mais ou menos potável. Os problemas de saúde são graves e endémicos: as ilhas de Bubaque, Canhabaque e Orangozinho foram visitadas pela febre-amarela; grassa o tracoma, com intensidade, nas ilhas de Caravela e Caraxe e com menos intensidade noutras ilhas.
Vejamos agora a fauna e flora. Todas as ilhas são verdadeiras matas. Quanto a plantas frutíferas, apenas se veem em maior quantidade a laranjeira, a mangueira e frutos silvestres. Quanto a animais, avultam a gazela e a cabra ou fritambá em pequena quantidade na Ilha das Galinhas, Canhabaque, Orango e Caravela. A ave predominante é o papagaio cinzento".

E de seguida vai esmiuçar a situação política. Em 26 de abril seguiu para as cobranças do imposto de palhota de 1930-1931:  
“Pelas ilhas onde andei, verifiquei no indígena um estado de desânimo e desconfiança. Tendo-me demorado uns 10 dias por algumas ilhas, no meu regresso mandei ao Exm.º Sr. Director dos Serviços e Negócios Indígenas uma carta em 12 de Maio com um mapa indicando o número de palhotas arroladas e cobradas durante o decénio de 1922-1932, estando nele incluído, nos dois primeiros anos, a Ilha de Canhabaque. Por ele, pode V. Ex.ª verificar a alta em 1923-1924, baixando no ano seguinte para ser elevada ao máximo em 1925-1926, sem a ilha de Canhabaque, passando a decrescer até este ano”.
Considera que os habitantes do arquipélago precisam de contrair empréstimos para pagar o imposto de palhota e assinala o êxodo para outras regiões, há indígenas válidos da ilha de Bubaque que se fixaram em Catió, alegam não terem terrenos para cultivar, pois que a Companhia Agrícola e Fabril da Guiné lhes tirou tudo, e o administrador diz que não é verdade, pois a Companhia deixa-os fazer sementeiras dentro da concessão desde que não extraiam vinho de palma, o que é inaceitável para qualquer Bijagó; dentro dessa linha do êxodo diz também que os da ilha de Soga vão assentar arraiais em Cubisseco onde têm as suas palhotas, eles dão as mesmas justificações que os de Bubaque. Comenta o administrador: 
“É uma desolação ver hoje algumas povoações, quem as viu em anos transactos, só se vêem velhos e mulheres e poucos homens novos. Sei que devido ao estado anormal em que a Circunscrição se encontra devido a enormes dificuldades em encontrar trabalho para todos, com o tempo, paciência e boa vontade, tudo se há de conseguir”.

Falando de hierarquia e poder, o relator diz que o Bijagó só reconhece como única autoridade indígena o balobeiro (padre), mas a sua obediência é só na vertente religiosa. O único régulo é o de Orango, o resto só existem para as autoridades terem a quem se dirigir.
Faz longos comentários à situação administrativa. O arquipélago dos Bijagós fez parte até 1913 da área do Concelho e da Circunscrição Civil de Bolama; em 1927 passou a ser Circunscrição Civil de Bubaque e em 1 de janeiro de 1929 ficou a fazer parte da Intendência de Bolama; em 1931 voltou de novo o arquipélago a estar sobre o regime da Circunscrição Civil e esta divide-se em quatro postos administrativos.
O relator enfronha-se agora na antropologia:
“O Bijagó, devido ao seu atraso de civilização, fugindo a esta tanto quanto pode, à sua indolência e resistência passiva, à contínua desconfiança de todos, tudo esconde”.
Falando da educação, menciona a existência da Escola Rural:
“Além de crianças de outra raça, frequentam a escola 12 indígenas que tendo vindo com as suas características saias e lopé tiveram que ser vestidos não fosse a máquina fotográfica de algum estrangeiro, auxiliado por certos portugueses, tirar alguns instantâneos, para lá fora nos deprimirem. O vestuário só o devem vestir na ocasião de irem e estarem na escola”.

Diz que o estado sanitário é precário, muitos indígenas estão atacados de bobas, bastante no estado terciário, o que leigos como ele chamam lepra; 50% da população de Caravela e Caraxe está atacada de tracoma. “Para o tratamento desta doença, o Sr. Dr. Eurico de Almeida, no seu relatório, creio que de Novembro, propunha a criação de uma ambulância sanitária em Caravela para ali os indígenas serem convenientemente tratados, mas para o bom êxito era necessário que o indígena constituísse palhotas para não dormirem na promiscuidade, para evitarem o contágio e para isso era preciso que o indígena deixasse de pagar o imposto por dois ou três anos, pois as casas não as constrói para não as pagar. Só obrigado”.

A varíola em 1930 fez grande desbaste na população. E pronuncia-se sobre a febre-amarela:  
“Todos os anos, de Outubro a Fevereiro, morrem bastantes indígenas sem se saber porquê. Dizia-se que é gripe e morrem de pneumonia. O Dr. Fritz Rennefeldt, encarregado do Hospital da Companhia Agrícola e Fabril da Guiné, em 1927-1928, diagnosticou febre-amarela. Creio que é o centro e sul da ilha de Canhabaque o foco mais ou menos virulento do vómito negro”.

Refere-se depois ao imposto de palhota e faz uma minuciosa descrição da sua cobrança. É favorável a que o imposto indígena de capitação substitua o imposto de palhota.
Quanto ao comércio, diz que o único comércio estabelecido nas ilhas é o da permuta de arroz por coconote, e nas épocas mais intensas de cobrança do imposto de palhota, aumenta o número de negociantes que se dedicam também à permuta conjuntamente com a compra de produtos a dinheiro. Revela que o indígena se desloca para fora de Circunscrição por não simpatizar muito com a Companhia Agrícola e Fabril da Guiné. A segunda empresa importante no arquipélago era a Empresa Agrícola e Comercial dos Bijagós.

Prestes a terminar o seu relatório, entende o administrador que é indispensável falar dos transportes:
“As Circunscrições do continente, todas elas, estão fornecidas de automóveis, esta é a única que não tem esse transporte nem aquele que mais precisa e bastante falta está sentindo – um barco – motor ou a vapor.
A falta de transportes com que se luta na Circunscrição, faz que em toda ela, especialmente nas ilhas onde não está autoridade que, clandestinamente se exerce o comércio com embarcações e tais comerciantes, grumetes sem dinheiro, levam os indígenas enganados para as ‘pontas’, de onde poucos voltam; induzindo os Bijagós a entregar-lhe os seus produtos e gado para irem vender em Bissau ou em Bolama por mais dinheiro do que lhe pagam os negociantes nas suas ilhas, no regresso desses indivíduos os indígenas não recebem um centavo, desculpando-se que a canoa se virou, perdendo-se tudo, só ele se salvou. Os Bijagós jamais se queixam quando lhes dizem que os produtos e gado ficaram no fundo do mar e também não são capazes de denunciar os traficantes.
Por falta de embarcações, os chefes de posto limitam a sua acção somente à ilha onde o posto está instalado. Os quatro postos precisam, cada um, de uma baleeira, embarcação que não têm, servindo-se às vezes, com o risco da própria vida, de canoas dos indígenas, assim como o signatário também já se tem servido desses dongos, uma ou outra vez de embarcações dos fiscalizados”.

Queixa-se e reclama, a autoridade portuguesa só se poderá verdadeiramente sentir quando houver meios minimamente suficientes.

Este importante relatório está na secção dos Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa.


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Nota do editor

Último poste da série de 24 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19134: Historiografia da presença portuguesa em África (133): Relatório referente ao uso e costumes dos indígenas da Região de Farim (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19067: Historiografia da presença portuguesa em África (133): Um administrador de Fulacunda reticente às ordens do Governador Carvalho Viegas, 1935 (Mário Beja Santos)

Monumento comemorativo das operações de pacificação em Canhambaque, 1935-1936.
Fotografia de Francisco Nogueira, retirada do livro “Bijagós Património Arquitetónico”, Edições Tinta-da-China, 2016, com a devida vénia.


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Abril de 2018:

Queridos amigos,

Se uma andorinha não faz a primavera, um relatório preparado à pressa por um chefe da 4.ª Secção explicando ao Senhor Governador Carvalho Viegas porque não fora bem sucedido no cumprimento da terminação de trazer 150 Beafadas para a campanha de pacificação do Canhambaque, e em que o funcionário denuncia processos de obstrução do administrador da circunscrição de Fulacunda não traz por si qualquer fotografia de um quadro de hostilidade entre o governador e os seus diretos colaboradores, os administradores da circunscrição.

O funcionário António Pereira Cardoso tinha que justificar por que é que trazia tão poucos Beafadas para a campanha, e o relatório desvela que o administrador pretendia gerir vários equilíbrios entre os régulos Beafadas do território. A mensagem principal, no entanto, parece clara: a Administração da Guiné ainda estava muito tenrinha, com muitas pontas soltas, com contestações algo surdas e veladas.

Um abraço do
Mário


Um administrador de Fulacunda reticente às ordens do Governador Carvalho Viegas, 1935

Beja Santos

Nos Reservados da Sociedade de Geografia encontrei o relatório de António Pereira Cardoso relativo ao trabalho de que foi incumbido em 1935, no sentido de mobilizar auxiliares indígenas para serem incorporados no contingente militar enviado à ilha de Canhambaque “para chamar à nossa soberania os naturais insubmissos havia anos”. António Pereira Crespo era o chefe da 4.ª Secção da Repartição Central dos Serviços da Administração Civil, em Bolama, data o seu relatório de 13 de novembro. Poderá ser para os historiadores peça extremamente útil para aquilatar a fragilidade das relações entre o governador e administradores de circunscrição, com o recurso a tricas e rivalidades entre régulos.

Escreve-se assim:

“Em 11 do corrente segui para Fulacunda, acompanhado pelo chefe dos Mandingas de Bolama, Mamadu Canté, para trazer para Bolama 150 indígenas Beafadas com destino a Canhambaque.
As instruções do Capitão Sinel de Cordes eram para preferirem indígenas voluntários de acordo com o chefe dos auxiliares, régulo Mamadu Canté. Ficou combinado que só viria um régulo que Mamadu Canté escolheu, o da região de Quínara, Buli D’Jassi. Considerei de boa política, dadas as rivalidades existentes entre os régulos Beafadas da Circunscrição Civil de Fulacunda, que não fosse só aquele régulo a fornecer homens, pelo que se convidou os régulos de Fulacunda e de Gam-Pará, Sene D’Jassi e Malam Mané.

O administrador de Fulacunda informou-me que era impossível conseguir os 150 homens de um dia para o outro, este serviço não se faria em menos de 5 dias. Ripostei com os comprometimentos do régulo Buli D’Jassi e dos régulos de Fulacunda e Gam-Pará, pelo que dissemos ao administrador que não sairíamos dali sem cumprir a determinação de Sua Ex.ª o Governador.

Telefonei para S. João para que o chofer trouxesse arroz para ali, visto que os indígenas se iriam concentrar às primeiras horas da manhã, e que lhe comunicasse para Fulacunda o número de homens que chegassem com o régulo Buli.

O régulo Buli não chegou ao longo do dia 12, a resposta foi negativa, facto este que se repetiu durante o dia. Entretanto, particularmente, era informado por Mamadu Canté que o régulo Buli lhe dissera que o Senhor Administrador de Fulacunda estivera lá na véspera, dia 10, e este senhor lhe dissera que não deixasse sair ninguém nem fornecesse gente alguma, e que isto já lhe havia sido confirmado a ele, Mamadu Canté, durante aquele dia 12, razão por que Buli, com receio de ser castigado pelo Senhor Administrador, desobedeceu ao que por Sua Ex.ª o Governador lhe fora mandado cumprir.

No dia 12, em Fulacunda, e cumprindo as ordens de Sua Ex.ª o Governador, chamei para junto de mim Mamadu Canté, na varanda da Administração, e com o seu auxílio principiei a relacionar e identificar por cada regulado e povoação os indígenas que se apresentavam por intermédio dos régulos, tendo a dada altura o Senhor Administrador arrancado o gorro de lã que o régulo Buli trazia na cabeça, atitude esta contra o que o primeiro pretendeu reagir, alegando não se encontrar dentro da Administração e já ter cumprimentado aquela autoridade.

Aconselhado o chefe citado a cumprir a ordem do Senhor Administrador, o signatário conseguiu sanar o incidente, pretendendo no entanto aquele senhor que os régulos acompanhassem a sua gente, ao que retorqui, dizendo que as ordens de Sua Ex.ª o Governador e do senhor Capitão Sinel de Cordes eram terminantes: o chefe dos Beafadas, na campanha, seria Mamadu Canté e o subchefe Buli D’Jassi, régulo de Quínara. Mediante este esclarecimento, o Senhor Administrador de Fulacunda fez incluir no número dos indígenas recrutados um enviado de cada um dos régulos de Gam-Pará e Fulacunda, enviados esses a quem deveriam obedecer os recrutados referidos.
Perante, porém, a minha insistência, sobre as ordens que recebera, aquele senhor transigiu, condicionando que a acção de tais enviados terminaria no momento em que fossem entregues em S. João.

Pouco depois das 12 horas do já citado dia 12, como a única camioneta que se encontrava em serviço do transporte de indígenas não fosse suficiente para poder, a tempo e horas, dar cumprimento ao que me fora determinado, isto é, estarem todos os indígenas em S. João às 19 horas, mandei perguntar para o depósito de STT se não haveria mais alguma disponível, sabendo então, por intermédio do Secretário da Circunscrição, Sr. Eduardo de Lencastre Laboreiro Fiúza que o senhor Capitão Cordes se encontrava ali e a quem, veladamente, dei a entender o que se estava passando. Depois de eu ter largado o telefone, voltou o senhor Fiúza a entabular conversa com o senhor Capitão Cordes, enquanto que a lápis ia anotando o telefonema que deste senhor estava recebendo e em que o último pedia, em nome de Sua Ex.ª o Governador a cedência da camioneta da Administração para facilitar o serviço.

De posse do recado, dirigiu-se o Sr. Secretário à Administração, de onde e daí a pouco e quando o relatante aguardava a chegada dos indígenas, chegou até si o diálogo, um pouco violento, trocado entre o Senhor Administrador e o Secretário, em que o primeiro daqueles dizia em voz alta e bem timbrada: ‘Meta-se no seu serviço que já não faz pouco!... Quem manda aqui sou eu!... Deixei o resto comigo!...’.

Forçado a intervir no assunto, o caso ficou arrumado sem que a minha intervenção nele houvesse influído.

Pouco depois surgia em Fulacunda o senhor Capitão Cordes, que tomou conhecimento do número de indígenas que ali se encontravam, regressando novamente a S. João.

Pouco depois das 16 horas, tomava eu o caminho de Bolama, acompanhando os últimos indígenas – de Gam-Pará e Fulacunda –, ficando na povoação do régulo Buli, a fim de inquirir os motivos da sua desobediência e falta de palavra.

Disse-lhe algumas palavras amargas; fui até duro para com ele, e atingi-lhe o ponto vulnerável dos Beafadas, chamando-lhes preguiçosos, eternos desgraçados, acriançados, desobedientes.
Então, a reserva e o mutismo a que Buli se havia remetido quebraram-se e ele falou que a sua gente estivera toda reunida e estava ainda, quando recebeu um recado de Fulacunda dizendo que ele não seguiria. Que, em face disto, os seus homens dispersaram procurando as suas povoações, era este o motivo por que eu ali não achara ninguém e ele estava agora a sofrer de tal vergonha.
Como a camionete havia seguido para S. João, levando os últimos recrutados, pusemos os dois os pés a caminho e procurámos remediar este contratempo.

Concluindo:

Às 23 horas, pouco mais ou menos, chegávamos a S. João com 27 homens da jurisdição de Buli D’Jassi (que fiz transportar, juntamente comigo, em duas canoas gentílicas) desembarcando em Bolama cerca da uma da manhã, completamente encharcados, fazendo-os recolher à povoação de Mamadu Canté. E, sem ter jantado, sem dormir desde as duas da manhã do dia 11, após ter mudado de fato, acompanhado de Buli D’Jassi, uma hora depois, às duas da manhã, atravessámos para S. João indo percorrer o Quínara em busca de voluntários, onde conseguimos mais 23 que, também em canoas, fizemos transportar para Bolama, hoje às 8 da manhã.”

Não vale a pena fazer conjeturas sobre o procedimento do Administrador de Fulacunda quanto às instruções firmes do Governador Carvalho Viegas. Continuavam a ser muito melindrosas as relações entre os régulos Beafadas, não há qualquer elemento, só da leitura deste relatório, que permita supor que o Administrador geria airosamente o relacionamento entre régulos, procurava contrariar orientações de Bolama que agravassem as suscetibilidades entre régulos.

Acresce a hostilidade permanente entre os Beafadas e os Bijagós, estes últimos tudo fizeram para subjugar Beafadas, foram escorraçados, depois de muitas e ásperas lutas. E há documentos, como os relatórios dos gerentes do BNU da Guiné, assegurando que as vitórias de Carvalho Viegas nos Bijagós eram bem precárias. Mas em 1936, Canhambaque preferiu a capitulação, em todo o arquipélago passou a pagar-se tributo, a Guiné era oficialmente dada como colónia pacificada.




Primeira e última página do relatório do Tenente José Ribeiro Barbosa, à frente do Comando Militar do Oio, com data de 1 de janeiro de 1915, respondendo aos quesitos do Governador, publicados num Boletim Oficial de 1914.
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19049: Historiografia da presença portuguesa em África (131): Relatório de um alto funcionário maltratado na Revolução Triunfante, 1931 (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18594: Antropologia (27): Uma preciosidade: arte indígena portuguesa, 1934 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Junho de 2016:

Queridos amigos,
Já aqui se referiu detalhadamente a I Exposição Colonial Portuguesa, que se realizou no Porto em 1934. Henrique Galvão comissariou e trouxe gentes de várias proveniências. Da Guiné vieram principalmente Mandingas e Bijagós.
Artistas como Eduardo Malta ficaram embevecidos com o porte das gentes, ficaram desenhos para a posteridade; as meninas Bijagós saracoteavam-se de peito ao léu, para escândalo das senhoras respeitáveis, que foram apresentar queixa de tal desmando, faziam-se aliás excursões para ver aquelas "aves raras".
A Agência Geral das Colónias investiu a fundo num alvo em que os fotógrafos eram todos de primeira linha, disputadíssimos: Mário Novais, San Payo e Alvão. A capa foi entregue a Almada Negreiros e o texto principal era da responsabilidade de Diogo de Macedo.
Uma preciosidade e um enaltecimento da arte Bijagó, como aqui se mostra. Uma gema que não podia ficar mais tempo no esquecimento.

Um abraço do
Mário


Uma preciosidade: arte indígena portuguesa, 1934

Beja Santos

No âmbito da I Exposição Colonial Portuguesa, que se realizou no Porto, em 1934, a Agência Geral das Colónias promoveu uma publicação cuja capa pertence a Almada Negreiros e o repositório fotográfico foi entregue a três artistas conceituados: Mário Novais, San Payo e Alvão. O texto introdutório é da responsabilidade de Luiz de Montalvor e o texto sobre a arte indígena é assinado por Diogo Macedo. Escreve Luiz de Montalvor que reabilitar a arte gentílica no seu injusto e obscuro isolamento é o propósito da publicação. Esta arte vive ainda a idade pura da alma humana e por isso há gente que a apelida de primitiva e de bárbara. Ele corrige: pode ser primitiva mas não é bárbara. Espraia-se em considerações, chega mesmo a introduzir uma interrogação totalmente peripatética: “Conceberá ela, um dia, nos refolhos do tempo, na indústria dos seus sonhos – atingida uma idade de ouro, radicada no domínio pleno dos seus recursos – a gestação de um Cellini, de um Ângelo, de um Botticelli indígenas, operários futuros de uma nova Beleza?”. Atenda-se que estamos a falar do mesmo Luiz de Montalvor modernista, ligado à publicação do Orpheu, poderá ser por aí que se justificará o descabimento desta diatribe.

Diogo de Macedo revela outra preparação e conhecimentos. Retoma a tónica do que é primitivo e bárbaro, dizendo que temos hoje na Oceânia e em África inúmeros tribos e povos a quem os europeus chamam raças primitivas, talvez por guardarem ainda todo o caráter inculto e rítmico dos costumes e das crenças que outros povos abandonaram em prol de um outro tipo de civilização. Só por isso é que poderá ser aceitável a designação de primitiva. Estamos a falar de povos em que a arte é principalmente escultórica, composta de feitiços, manipansos, divindades, ídolos e simples figurações animais. E desce a observações de quem refletiu cuidadosamente sobre o que viu e está a escrever: “Existe o mistério da origem da arte africana e da sua migração. Com as depreciações do estilo, da expressão e até da religião, o enigma, por enquanto, não foi resolvido. No Congo, há humildade e certa morbidez decadente; no Benim, espírito guerreiro e virilidade epopeica; na Costa Oriental, exuberância de fantasia e de grotesco; nos Camarões, tragédia e violência; a arte de Ioruba é religiosa, de mitos e de lendas; e só a da Guiné é natural e anedótica. Ali é escultura é lírica e racionalista, embora amaneirada”. Considera que o povo Bijagó é uma raça de artistas plásticos e com tendências fáceis à assimilação ocasional de ritos.

E não deixa de fazer justiça a um fenómeno sobre o qual, nessa década de 1930, muito pouco se fala ainda em Portugal: “Paris, há alguns anos e pela perceção dos pintores Matisse, Vlaminck, Picasso, Dérain e Lhote, tentou impor a arte negra como irmã da grega, da gótica ou da barroca, no seu estilo de descoberta. Aproveitaram-se da sua estrutura e expressionismo para defesa da pintura chamada “fauve” e para apoio dos ensaios do cubismo. Um grande artista – Modigliani – chegou mesmo a criar uma obra baseada na sua estética, assim como Zadkine e Lipchitz se inspiraram nestes segredos de composição para talharem a sua escultura”.

Mulher com o filho às cavalitas

Dois coloniais portugueses

Ídolo do sonho, figura de homem sentado e com a cabeça deitada sobre os braços

Gazela em madeira branca

É um álbum que honra e enaltece a genialidade da escultura guineense. A fatia de leão vai para os Bijagós, 17 gravuras num total de 107, onde se incluem obras vindas do Moxico, Macondes, Lunda, florestas de Cassinga, Congo, Cabo Delgado, Gaza e Benim.
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18560: Antropologia (26): “Produtos, Técnicas e Saberes da Tradição Bijagó”, por Fanceni Baldé, Cleunismar Silva e Mary Fidélis, editado por Tiniguena, 2012 (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18560: Antropologia (26): “Produtos, Técnicas e Saberes da Tradição Bijagó”, por Fanceni Baldé, Cleunismar Silva e Mary Fidélis, editado por Tiniguena, 2012 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Maio de 2016:

Queridos amigos,
Trata-se de um estudo do complexo Urok, do arquipélago dos Bijagós, estudo esse que pretende identificar os modos de gestão sustentável de uma parte da sociedade Bijagó como procede à transmissão de conhecimentos, como se relaciona com o ambiente envolvente, os seus deuses, os seus lazeres, o seu prodigioso artesanato, a sua gastronomia, a vida comunitária, o casamento. A sociedade Bijagó não está impermeável à mutação, gradualmente procura libertar-se das leis da natureza ou dos constrangimentos sociais.
É um trabalho que procura identificar os traços destes saberes e da inteligência dos Bijagós nas formas de gerir os seus espaços e de apelar à conservação dos seus recursos. Uma leitura saborosa para desvendar a sabedoria, a cultura e a inteligência de um povo que está a ficar abalado por algumas leis da sociedade de consumo e também por isso necessitada a refletir o que pode dar às gerações futuras.

Um abraço do
Mário


Os Bijagós e a sua cultura admirável

Beja Santos

A Tiniguena, uma organização não-governamental guineense que intervém nas ilhas Urok (Bijagós), nas regiões de Quínara e Bolama (também nos Bijagós) e nas florestas de Cantanhez (Tombali), e procura promover um desenvolvimento participativo e duradouro, de colaboração com o CIDAC, editou em 2012 uma obra muito afetiva, uma exaltação da cultura Bijagó em toda a sua amplitude: “Produtos, Técnicas e Saberes da Tradição Bijagó”, por Fanceni Baldé, Cleunismar Silva e Mary Fidélis.

Estes autores não escondem o seu deslumbramento no texto de abertura:
“A dependência da sociedade Bijagó em relação à natureza é de tal modo vital que levou a um nível de conhecimento e um grau de intimidade extremos. Como sobreviver numa ilha longe do mundo, se não se conhecesse todas as espécies plantas e tudo o que elas podem oferecer, se não se conhece os hábitos da fauna selvagem ou o comportamento dos peixes, se não se é familiar com as forças da natureza tais como as marés, as correntes, o vento ou a chuva? Como sobreviver se não se sabe fabricar os instrumentos para explorar, transportar, transformar ou consumir esses recursos? O conhecimento das leis que regem a natureza obriga, para além do mais, a respeitar esses ritmos, a não tomar mais do que aquilo que ela pode oferecer: esgotar os recursos significaria tão simplesmente esgotar-se a si próprio”.

Os Bijagós são um arquipélago atrativo para o turismo, correm lendas sobre o matriarcado, o sentido de autossuficiência do povo e a sua arte escultórica tem uma tal dimensão genial que os grandes museus procuram essas peças que falam de deuses, que são usadas nas danças, que fazem parte do culto doméstico e da sua comunicação com a fauna, os elementos da natureza, os tubarões que por ali cirandam. É uma cultura tão poderosa quanto é facilmente visível a identidade cultural Bijagó. Os autores apresentam o arquipélago, e do geral vão ao particular, às ilhas Urok, onde habitam pouco mais de 3 mil pessoas em Formosa, Nago e Chediã, uma população jovem que se entrega à agricultura, à exploração de produtos silvícolas e à pesca. O governo da Guiné-Bissau reconheceu o complexo Urok em 2005 como uma Área Marítima Protegida.

Na Formosa, vamos saber como vivem e habitam os Bijagós, perceber o seu artesanato sagrado (do oculto e cerimonial), utilitário e comercial, descrevem-se as peças artesanais como os acentos em arco, os transportadores tradicionais de objetos, as saias confecionadas à mão com base em fibras de vegetais, as máscaras que são usadas sobretudo para as danças tradicionais, os escudos tradicionais. Releva-se também o papel do artesanato utilitário como o canapé, o cesto e os chapéus tradicionais, as travessas usadas para as refeições, e as respetivas matérias-primas.


As danças Bijagós têm um destaque especial a partir do conhecimento das fases iniciáticas. A dança tem um papel dominante, está presente em praticamente todas as cerimónias. Como escrevem os autores:  

“A característica principal e comum em todas as danças praticadas no arquipélago é a relação com os aspetos da natureza, em especial representação dos animais. As danças, em todos os momentos reproduzem a forma de ser e de estar dos animais no seu meio natural. Através da natureza busca-se o conhecimento sobre as características e história do animal que se pretende representar. A escolha de animais ferozes, que possuem força, é o símbolo principal, pois para os Bijagós o valor do homem reside na sua coragem e força para enfrentar as dificuldades do dia-a-dia”.
E daí o estudo sobre as danças masculinas e as danças femininas, profundamente distintas, e os trajes que lhes estão associados.

Uma palavra sobre a gastronomia tradicional, onde primam o arroz, o óleo de palma, a mancarra, o feijão e os produtos de mar. Na cozinha Bijagó utilizam-se as folhas de bananeira para a cosedura do arroz, mexe-se a comida com uma colher de pau, há uma concha feita com o fruto da cabaça para servir os caldos e os molhos, um vasilhame para armazenar o vinho de palma, um pote em barro para conversar a água é também se usa uma técnica de transporte de peixe feita com folhas de palmeira.


Falando do casamento, observa-se que os Bijagós da Formosa não costumam formalizar a união entre o homem e a mulher, é uma união de facto em que não existem muitas obrigações sociais entre o homem e a mulher, sendo possível a troca de parceiros. É a mulher que escolhe o homem com quem pretende estabelecer a união, cabendo à mãe a confeção de um prato à base de farinha de arroz transportado por um grupo de mulheres grandes à casa do pretendido noivo. Durante a fase de noivado, o noivo deve levar ofertas constantes à família da noiva, geralmente sob a forma de produtos que retira do mato e do mar. O trabalho desenvolvido pela Tiniguena pormenoriza os produtos associados à gastronomia, os produtos florestais, os produtos de mar.

Em jeito de conclusão, escreve-se:  
“O domínio sobre as técnicas e os saberes associados a cada um dos produtos presentes na tradição Bijagó revela décadas de aperfeiçoamento. O conhecimento e respeito dos diferentes ciclos de regeneração das espécies na natureza tem permitido ao Bijagó da Formosa explorar e tirar proveito da rica biodiversidade do arquipélago. A gestão consciente e responsável dos recursos naturais é uma estratégia crucial para assegurar a continuidade do modo de vida Bijagó. Passados alguns anos desde a atribuição do estatuto de Área Marinha Protegida, permanece o desafio da adequação entre os avanços inevitáveis da modernidade e da globalização e a conservação dos valores e princípios intrínsecos ao saber tradicional Bijagó”.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16777: Antropologia (25): Um sonô, o mais valioso tesouro artístico da Guiné-Bissau (Mário Beja Santos, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52)

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18345: Fotos à procura de... uma legenda (100): quem não tem "turpeça", senta-se no chão... e quem "turpeça" também cai...



Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Jufunco ou Djufunco > 9 de maio de 2013 > Os régulos da Tabanca, Alberto Sambú (o mais novo) e o Necolá Djata, com os seus "banquinhos"  [, em crioulo, "turpeças") que os acompanham sempre.


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Jufunco ou Djufunco > 9 de maio de 2013 > O local sagrado das reuniões da comunidade, que neste dia se abriu pela primeira vez para reunir com a comunidade de brancos que visitou a tabanca, vendo-se os régulos no lugar que ocupam habitualmente, sentados nas suas "turpeças".

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Na sua visita a Jufunco, no chão felupe, em maio de 2013, o José Teixeira, régulo da Tabanca de  Matosinhos, fez as seguintes observações sobre os seus "pares", os régulos locais, e os seus símbolos do poder:

(...) O régulo faz-se acompanhar de um pequeno banco em madeira, onde só ele se pode sentar, sob pena de perda de vida. Mesmo quando nos acompanharam pela tabanca, levavam o banco debaixo do braço e, quando parávamos, sentavam-se nele. Cada terra tem seus usos e costumes, mas este é, com o devido respeito, deveras estranho.

Pudemos visitar o chão sagrado debaixo do poilão onde o povo simples vai encontrar-se com o Irã, o espírito superior, para implorar proteção e cura dos seus males, bem como o local sagrado onde os homens grandes se reúnem para decidir sobre as grandes questões que afetam o seu povo.

Neste local sagrado, os dois régulos sentados no seu banco tradicional explicaram como se desenvolvem as reuniões da comunidade, cujas decisões são seladas com um jantar bem regado com vinho de palma e aguardente de cana. Do animal morto para o repasto ficam ali guardados a cabeça ou parte da dentuça como sinal de que houve acordo e o mesmo deve ser posto em prática. Isto fez-me lembrar os meus tempos de criança quando os homens de negócios nesse interior de Portugal selavam os seus acordos com uma caneca de saboroso vinho".(...)


2. Em crioulo, este "banquinho" (que é mais do que um adereço da casa que serve para a pessoa se sentar-se) chama-se "turpeça"... Em fula, é "ciran" ou "cirange" (no plural). Alguns de nós, como o António J. Pereira da Costa ou eu próprio, temos em casa objetos destes, feitos em madeira, com função de adorno ou peça de artesanato "guineense"...

O termo apareceu-nos no subtítulo de um livro, da autoria de Santos Fernandes, recenseado pelo Beja Santos: "Lideranças na Guiné-Bissau: avanços e recuos". Na capa vem um destes banquinhos tradicionais, de que todos estamos lembrados: com a seguinte legenda: "a imagem de 'turpeça',  símbolo de poder na Guiné-Bissau" (**).

O nosso querido amigo e grã-tabanqueiro Cherno Baldé, contou-nos, a propósito, a seguinte históira: "O caso mais insólito que observei com este fenómeno das 'Turpeças', aconteceu em 2004 quando o Ministério das Obras Públicas, onde trabalhava, convidou as autoridades locais das ilhas dos Bijagós para uma reunião de concertação em Bissau. Estranhamente, todos traziam consigo uma 'turpeça', a sua 'turpeça',  porque na sua tradição estava consignado que deveriam utilizar sempre aquela e não outra qualquer. Fiquei estupefacto, mas é a realidade. Não conhecia e nunca tinha visto" (**).

3. O vocábulo ainda não vem nos dicionários da língua portuguesa, e nomeadamente no Houaiss. Mas acho que o temos de grafar. Não era, que me lembre, usado no tempo colonial... Mas hoje é usado, pelos guinenses, urbanizados. Ou faz parte do "calão político":  tenho-o encontrado com significado  equivalente à nossa "cadeira do poder"... Fala-se por exemplo dos dirigentes partidários instalados nas suas "turpeças", de costas viradas para o povo... 

E é nesse sentido que temos de entender as argustas observações etnográficas registadas pelo "régulo" Zé Teixeira, quando foi em 2013 a Jufunco em visiat aos seus colegas... O tal "banquinho" é, antes de mais, um símbolo de poder... Quem tem poder, tem "turpeça"... Quem não tem, senta-se no chão... O chão é o plano da igualdade... O chefe, nas línguas latinas, vem do "caput" (cabeça): chefe é aquele cuja cabeça sobressai da multidão de cabeças, o povo, o grupo, os outros... Daí o "banquinho", o "cirã", a "turpeça", a "cadeira", o "trono", o "penacho", o "chapéu", a "coroa", as "divisas", os "galões", as "dragonas", enfim, todos os símbolos de status que conferem poder, autoridade... (Mas há uma diferença semântica e conceptual entre líder e chefe: liderança é uma relação, chefia um atributo).

O grande músico guineense Binham tem uma canção chamada "Turpeça de mortu"... Tenho pena de não "apanhar" a letra... Julgo que ele vem da melhor tradição da grande música guineense, de crítica social e de intervenção cívica e política (Zé Carlos Schwarz, etc.)... Talvez aqui o Cherno Baldé nos possa, mais uma vez, dar uma ajudinha a perceber a letra... Há um videoclipe disponível no You Tube...

O crioulo é fascinante. A(s) língua(s) humana(s) é(são) fascinante(s). Infelizmente não podemos dominá-las todas... Mas acho que o termo "turpeça" deve ser grafado e enriquecer a nossa lusofonia. Mas pergunto, na minha "santa ingorância": o vocábuo "turpeça" (em crioulo) não será uma corruptela do português "tripeça", assento, também baixinho, composto de 3 pés, e sem encosto ? 

Aqui fica mais uma pista para os nossos leitores, amigos e camaradas da Guiné. (***)

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tripeça | s. f.

tri·pe·ça |é|
(tri- + peça)
substantivo feminino
1. Assento de três pés e sem encosto. = TRIPÉ

2. [Figurado] Ofício de sapateiro.

3. [Burlesco] Grupo de três pessoas que andam sempre juntas.

cair da tripeça
• Ter idade avançada e indícios de senilidade.

"tripeça", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://www.priberam.pt/dlpo/tripe%C3%A7a [consultado em 22-02-2018].


(***) Último poste da série > 29 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18267: Fotos à procura de... uma legenda (99): Porque é que este(s) barco(s) nunca poderia(m) chamar-se Luís Graça? Ou Virgílio Teixeira? Ou Carlos Vinhal? Ou outro nome de grã-tabanqueiro, macho?

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18163: Notas de leitura (1028): “Dinâmica da arte Bijagó, Guiné-Bissau – contribuição para uma antropologia da arte das sociedades africanas”, por Danielle Gallois Duquette, editado pelo Instituto de Investigação Científica e Tropical, 1983 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Abril de 2016:

Queridos amigos,
Não é novidade para ninguém que as peças de arte dos Bijagós e dos Nalus são procuradas por museus e colecionadores particulares de todos os cantos do mundo, conferem a esta arte um elevadíssimo grau de imaginação, um sentido estético apuradíssimo e uma criatividade transbordante nas figuras antropomórficas.
A autora esteve presente no arquipélago durante vários períodos da década de 1960, gerou confiança de chefes, religiosos, artistas e procurou entender a dinâmica socio-religiosa de um povo cioso da sua autonomia e da sua vida social horizontal. O artista Bijagó (não esquecer que toda esta investigação decorreu nos anos 1960) está no centro das tensões dinâmicas, tem que cumprir à luz da exigências de quem encomenda dentro do arquipélago e é confrontado com uma procura extremada: a dos colecionadores que buscam peças muito apuradas e um mercado de consumo alargado que se satisfaz com o bom, bonito e barato.

Um abraço do
Mário


Dinâmica da arte Bijagó

Beja Santos

O livro “Dinâmica da arte Bijagó, Guiné-Bissau – contribuição para uma antropologia da arte das sociedades africanas”, por Danielle Gallois Duquette, editado pelo Instituto de Investigação Científica e Tropical, 1983, é o resultado de um trabalho de pesquisa iniciado em 1972, que se prolongou por toda a década e a elaboração do documento final foi a etapa seguinte.

A autora adquiriu os seus diplomas universitários no desenho de arte e confessa a paixão que lhe despertou toda a produção plástica Bijagó, particularmente a estatuária. Trabalho aturado, de convivência com as populações Bijagós que em certas matérias foram extremamente reservadas, há segredos que não podem ser revelados. A autora orgulha-se de ter conseguido um dossiê fotográfico contendo 300 obras observadas no terreno ou nos museus ocidentais. A par da arte Nalu, a arte Bijagó é disputada pelos mais conceituados museus etnológicos em todo o mundo. Explicando a sua investigação diz-nos que o seu trabalho de campo passou por analisar os mecanismos socio-religiosos, é um trabalho que faz apelo ao facto estético total, isto é os objetos fabricados, a indagação da cultura material, o estudo das indumentárias efémeras, o conhecimento da mímica, da dança, dos cantos, da música e da palavra. Considera-se seguidora de Claude Levi-Strauss para explicar que o estudo das máscaras induz o conhecimento dos mitos, pode-se, por comparação, concluir quanto às migrações geográficas.

Prévio ao trabalho de campo foi a elaboração de um questionário em que se procurou aprofundar o conhecimento da estatuária, ornamentos de cerimónia, organizou-se um álbum de trabalho antigos realizados no arquipélago. Como fazem os antropólogos e os etnólogos, a autora muniu-se de ferramentas de escultura que depois trocou com os artistas que lhe permitiram fotografar as suas obras durante o processo de evaporação e aceitaram responder às questões que ela lhes ia pondo.


Seguindo a estrutura da obra, temos um primeiro capítulo onde se dissecam as estruturas sociais dos Bijagós, a organização espacial e arquitetónica dos seus aldeamentos e a configuração dos objetos usuais; no segundo capítulo, procura dar-se a ideia da partilha dos poderes através do estudo dos santuários, pinturas parietais e emblemas usados pelas famílias reais; os terceiro e quarto capítulos tratam dos ritos iniciáticos masculinos e femininos que são fundamentados sobre o estudo da arte do corpo e do aparato cerimonial; o quinto capítulo mostra os aspetos essências da escultura Bijagó, no capítulo seguinte procura-se distinguir o significado da morfologia e no último capítulo compara-se a produção plástica atual com a produção tradicional.

Dissertando sobre a origem dos Bijagós, o que é dado como seguro é a sua origem nilótica, tal como os Balantas são uma sociedade horizontal em que a chefia é repartida pelo Conselho dos Anciãos (a Grandeza), os reis e os sacerdotes. São fundamentalmente animistas. Desde a independência, e com êxito relativo, o PAIGC tem procurado disciplinar o tempo do fanado, proibiu que se batesse nos jovens durante a iniciação do fanado e estipulou que os períodos de iniciação devem decorrer durante as férias escolares; procurou igualmente proibir que os mortos pudessem vir a ser enterrados nas habitações.

A habitação Bijagó, como a Balanta é construída numa elevação de terra com cerca de 30 cm e dotada de um galeria circular exterior. A autora comenta a organização interna do espaço e mostra como os espíritos da família são alvo de um tratamento especial. O utilitarismo estético é muitíssimo apurado e a autora socorre de um exemplo comezinho como são as fechaduras com tratamento decorativo. Passando para os símbolos do poder, é detalhado a simbologia do altar do santuário e a importância da disposição dos participantes nas cerimónias religiosas.


Os Bijagós continuam a prezar a sua autonomia e a imagem que deles vem do passado não é lisonjeira, tirando a bravura, os vários autores que sobre eles escreveram revelam a sua barbaridade, falando de sacrifícios em que os seres humanos eram enterrados com reis, o historiador António Carreira descreveu as reações do Governador Correia e Lança, em 1889, contra a tirania dos reis que sacrificavam crianças, metendo-as nos túmulos com os cadáveres dos dignatários que acompanhavam o falecido no outro mundo. Detalhando a organização, a autora fala sobre o Conselho dos Anciãos como um dos vetores do poder social, apresenta as principais figuras do poder religioso e do poder iniciático, com sacerdotisas, padres e mestres do fanado. Como as de mais sociedade africanas, os Bijagós prezam as classes de idade, dividem a vida do nascimento à morte, o ancião é encarado como o espalho da sabedoria. Entrando nos aspetos etnológicos e antropológicos, são referidas as apresentações dos amuletos corporais, é dito que na sociedade dos Bijagós não há circuncisão nem mutilação genital mas existe a iniciação nos segredos da vida sexual e até no conhecimento dos métodos abortivos.

Centrada agora na arte, a autora descreve os materiais escultóricos e as figuras onde primam os irãs antropomórficos. A escultura tem três direções: motivação religiosa, utilitária e iniciática. Povo hospitaleiro, os Bijagós marcam distâncias, sempre consideraram os continentais como estrangeiros. A independência suscitou ao artista Bijagó novas questões: há missões religiosas que apoiam o fomento do artesanato vendido nalguns locais das ilhas e nalgumas lojas de Bissau. Há compradores que disputam as peças elaboradas utilizadas sobretudo nas danças e rituais, há uma escultura de caráter comercial que vulgariza a arte dos bancos e dos deuses, e no final do seu trabalho a autora interroga-se até que ponto o turismo e a necessidade de sobreviver vendendo obras mais baratas e vulgares não está a afetar a genuinidade artística Bijagó. Importa saber se a arte Bijagó mereceu outros estudos complementares a este, depois da década de 1980.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18153: Notas de leitura (1027): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (15) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Guiné 61/74 - P17978: Notas de leitura (1015): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (9) (Mário Beja Santos)

Bissau velho


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Setembro de 2017:

Queridos amigos,

Folheando toda esta documentação que o Arquivo Histórico do BNU me está a disponibilizar, dou conta da inusitada franqueza com que o gerente observa não só o poder político, como os servidores do Estado, as práticas comerciais, destilando por vezes críticas brutais, mencionando os boatos que correm, os desacertos protocolares, neste caso peço a vossa atenção para a primorosa descrição da chegada dos aviadores e a organização dos festejos, não falta ali o picante dos humoristas da época como André Brun ou Gervásio Lobato, reproduzíamos no espaço colonial as mesmas farroncas que usávamos na capital.

São páginas que revelam o outro lado da presença portuguesa ao tempo em que se falava de pacificação mas eram frequentes os sobressaltos de revoltosos.

E, por último, uma chamada de atenção para aqueles aviadores que lançavam granadas sobre tabancas que não estavam em revolta...

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (9)

Beja Santos

Em 21 de Maio de 1925, o gerente da filial de Bolama envia um extenso ofício para Lisboa, o assunto mencionado diz: Revolta indígena. Pela sua importância, vale a pena destacar alguns extratos significativos:  

“Desde fins de Março, princípios de Abril, que começou a constar aqui que os indígenas da ilha de Canhabaque estavam revoltados. Eram desencontradas as informações que corriam sobre a origem dessa revolta, diziam uns que ela era motivada por os indígenas se querem recusar ao pagamento do imposto, outros diziam que era devida à teimosia do governo em estabelecer postos militares em sítios que, eles indígenas, consideram como chão sagrado.

Começou depois correndo o boato de que a situação se ia agravando; o mutismo oficial continuou até que, em certo dia, começaram armando com artilharia e tropa dois vapores que o governo aqui tem e que são os únicos que estão em poder navegar. Acompanhava essa expedição um tenente do exército, o qual por ter bastantes anos de permanência na Guiné dizia conhecer bem o terreno e costumes dos Bijagós e exercer sobre eles grande influência. Ia esse tenente incumbido de diplomaticamente conseguir que os revoltosos voltassem à ordem. Poucos dias depois, regressou a essa expedição, mas continuou a nada se dizer sobre o assunto. Pouco tempo depois, porém, começaram novamente a correr boatos de agravamento da situação, de novo tornaram a armar os referidos vapores, chegaram vários grupos indígenas, na maioria Fulas, acompanhados dos seus régulos, a quem começaram a distribuir armamento para formarem uma coluna militar.
Aproveitando a estada aqui dos aviadores que fizeram o raide Lisboa-Guiné, foram estes com o seu aparelho lançar sobre os revoltosos algumas granadas; como, porém, não houve o bom senso de fazer acompanhar os aviadores por alguém que conhecesse bem a topografia das ilhas, isso deu em resultado que lançassem algumas dessas granadas sobre tabancas que não estavam em revolta. Isso deu em resultado que esses indígenas se irritassem e se unissem aos revoltosos.

Finalmente, em 18 de Abril, resolveu-se o governo a quebrar o seu silêncio, publicando em suplemento ao Boletim, uma portaria declarando estado de sítio em várias ilhas do arquipélago. Partiu então para ali o governador acompanhado do seu Estado-Maior, e durante muitos dias nada mais se soube. Em 5 ou 6 do corrente começou a correr o boato de que as operações estavam terminadas e que a coluna ia regressar. Todos se admiram disso, pois que até a essa data ainda aqui não tinham aparecido nenhuns prisioneiros nem mesmo feridos ou mortos. Em 7 do corrente, quebrou o governo o silêncio publicando outro suplementos ao Boletim em que se declara que as operações estavam quase concluídas e que a ilha onde a revolta mais intensamente se tinha manifestado fora completamente batida. Nesse mesmo dia, apareceu aqui de regresso uma força acompanhando vinte e tal prisioneiros, na sua maioria mulheres e crianças. Publicado este suplemento e talvez para desfazer a má impressão causada pelo diminuto número e qualidade dos prisioneiros, fez-se constar que uma parte da coluna comandada pelo tal tenente se dirigira par a Ilha das Galinhas onde supunham que os revoltosos se tinham refugiado. Essa parte da coluna já aqui regressou mas não consta que tenha trazido mais prisioneiros. Em 3 do corrente, regressou o governador com o seu Estado-Maior. Corre o boato de que as ilhas revoltadas ficaram ocupadas pelos Balantas. Se assim é, segundo a opinião de pessoas conhecedoras, esses Balantas a pouco e pouco irão sendo disseminados pelo arquipélago.

Em resumo, as conclusões a tirar do resultado das operações são as seguintes: como certo, um desfalque nas finanças da província; um grande e duplo abalo na influência da nossa soberania visto que não se chegou a dar o devido corretivo aos revoltosos. Dizemos duplo porque essa nossa soberania perdeu muito. Como provável: dentro de um prazo mais ou menos curto, nova revolta ou provocada pelos mesmos Bijagós que se encontrão em melhores condições de armamento, visto terem-se certamente apoderado das armas que os mortos e feridos deixaram no campo, e ainda daquelas com que ficaram os Balantas ocupantes das ilhas. Se essa revolta não for promovida pelos Bijagós será, então pelos mesmos Balantas que, com a força moral que lhes deram fazendo-os ocupantes das Ilhas, e com as armas que lhes deixaram, se sentiram fortes para ela”.

No mês anterior, o gerente da filial do BNU dava conhecimento a Lisboa da chegada dos aviadores Capitão Pinheiro Corrêa e do Tenente Sérgio da Silva como do Sargento Mecânico Manuel António. Veja-se o que há de desconcertante no ofício:

“Apesar do campo da viação estar repleto de gente, a receção feitas aos mesmos foi bastante fria, por falta de iniciativa das entidades oficiais pois que, nem sequer o governador teve a lembrança de, ao receber as cartas que o Presidente da República e o General Inspetor da Aeronáutica Militar enviaram em mão do Capitão Corrêa, as ler perante o público que ali se encontrava, o que certamente daria lugar em manifestações bem merecidas. No dia seguinte teve-se conhecimento que as festas oficiais se resumiam a uma soirée na residência do governo no dia 4 e a um projetado piquenique a promover pela câmara municipal com o auxílio do comércio, no dia 6, na Ilha das Cobras”.

Bem à portuguesa, uns espontâneos quiseram organizar um baile e pediram as instalações ao BNU, diz-se no ofício que a soirée foi bastante animada, o gerente não quis participar porque tinha pouco gosto em andar em festas, mas lá compareceu por insistência do governador. Segue-se outro acontecimento à portuguesa:

“O presidente da câmara também nos tinha procurado para subscrevermos para o piquenique. Como na ocasião a Casa Gouveia ainda não tivesse indicada quantia que subscrevia, dissemos ao presidente que só depois daquela Casa indicar a sua quota nós indicaríamos a nossa. Recebemos depois convite para o piquenique mas estranhado que o presidente da câmara não voltasse a procurar-nos para saber qual a verba com que subscrevíamos, tratámos de averiguar o que havia e soubemos então que, tendo um comerciante dos mais importantes da praça concorrido apenas com 80 escudos, o governador descontente com isso ordenara à câmara para restituir os dinheiros recebidos e que custeasse do seu cofre as despesas a fazer. Constou-nos logo que o comércio melindrado pela atitude do governador resolvera não comparecer ao piquenique e, para que não se julgasse que nós nos solidarizávamos com o comércio neste protesto resolvemos, embora bastante contrariados, ir assistir ao mesmo, dando também feriado ao nosso pessoal para ele também poder ir. Correu tudo muito bem e com muito entusiasmo, tiraram-se várias fotografias e a pedido dos nossos empregados tirámos um grupo especial em que apenas figuramos nós, os aviadores e os empregados da Filial; já vimos uma prova dessa fotografia que não ficou muito boa devido a ser tirada quando a luz já era escassa, e logo que o fotógrafo a reproduza enviaremos uma V. Exas.”.


O relatório de 1925 alude categoricamente a que a Fazenda tem falta de fundos para resolver os seus compromissos, havia penúria nos cofres do governo, despesas com as comunicações e com os vencimentos do servidor de Estado. Falando destes últimos, o gerente entendeu por bem citar o padre António Vieira: “Quando mais comem e consomem, tanto menos se fartam”.

Casa Gouveia



Quanto à situação da praça, é referida uma relativa crise. E o gerente entendeu por bem dirigir uma catilinária ao comércio:  

“A forma como aqui se comercia é de ocasião e absolutamente primitiva. Aproveitando-se grosseiramente da falta de navegação, elevam com o mais alvar descaramento, os preços, quando determinada mercadoria escasseia na praça. É positivamente um comércio de assalto. Na sua maioria, comerciantes aqui desembarcados de saca e socos muito deixam a desejar. Orgulham-se, tolamente, de não precisarem do banco, mendigando-nos depois, miseravelmente, transferências. Apenas aqui existe uma casa comercial digna desse nome: é a Casa Gouveia! Não obstante, esta não deixa de enfermar de todos os vícios gananciosos do pequeno comércio, cultivando-os até com requintes de exagero”.

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 10 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17956: Notas de leitura (1013): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (8) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 13 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17965: Notas de leitura (1014): “A PIDE no Xadrez Africano, Conversas com o Inspetor Fragoso Allas”, por María José Tíscar; Edições Colibri, 2017 (3) (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17449: Notas de leitura (966): Anuário da Província da Guiné, ano de 1925 - Um documento histórico incontornável (2) (Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Fevereiro de 2016:

Queridos amigos,
Que ninguém espere encontrar aqui uma caraterização das etnias guineenses com o rigor antropológico e etnológico. Tudo aqui é observação de quem pensa que está a falar de primitivos, gente que precisa de ser civilizada, aculturada. Não que falte algum rigor em certas apreciações, mas neste documento o autor não esconde que fala de civilizado para indígena, os pobres coitados têm costumes bizarros, a cultura do branco ainda não os moldou para a cidadania. Só décadas depois é que o olhar do cientista se despiu de preconceitos raciais.

Um abraço do
Mário


Um documento histórico incontornável: Anuário da Província da Guiné, ano de 1925 (2)(*)

Beja Santos

Estes anuários tinham a apresentação de um mostruário do território, dos seus transportes, da natureza da sua administração, fazia-se uma incursão pela cidades e vilas e depois passava-se para as atividades económicas, neste tempo ainda se falava pouco do turismo mas fazia-se sempre menção da fauna e flora, eram requisitos obrigatórios do feitiço africano; e por último, mostrava-se um pouco da história da pacificação e referiam-se os usos e costumes dos indígenas.

Deixei exatamente para este texto a descrição do anuário sobre as etnias existentes na Guiné. Não se perca de vista estamos em 1925 e a antropologia e a etnologia ainda não são consideradas ciências. De acordo com o anuário, na Guiné Portuguesa o tipo de raça dominante é o negro e o negroide e o hamita cruzado. Segue-se um pálido resumo dessas raças, os usos e costumes e o autor adverte que não há intuitos “de que nos tomem por senhores doutores no assunto”.

Fulas – a sua índole é boa, se bem que de feitio concentrado. Pouco robustos em geral, são bastante atreitos a doenças. Quase todos praticam a tatuagem, nos lábios, as mulheres e os homens no rosto. Devido a esta prática absurda, acontece vermos tipos de mulheres verdadeiramente cativantes, prejudicados em absoluto pela deformação dos beiços. O Fula usa lavar-se, mas nem todos empregam o sabão, por ser crença entre eles que tal emprego faz diminuir a virilidade. São supersticiosos à sua maneira. Logo que lhes morre um filho ou parente mudam em regra de povoação, transportando para longe os seus penates. Têm a vaidade de que são grandes progenitores.

Mandingas – têm boa índole, são alegres, expansivos, hospitaleiros e obedientes. São atraídos pelo comércio e a agricultura. Têm duas castas: a dos ferreiros e a dos sapateiros, não podem juntar-se com castas diferentes. Têm os Mandingas também a sua autoridade religiosa que denominam almarne (penso que o autor confundiu, a palavra própria é almani). Ele é ao mesmo tempo conselheiro político, goza de muito prestígio. É curioso como se transmitem entre eles as heranças: por morte do pai herdam os irmãos, começando pelo mais novo que tenha família. Os filhos e as mulheres fazem parte do legado, e neste caso elas ficam sendo pertença do herdeiro. Quando este tem mulheres a mais, a mulher herdada pode passar para o outro irmão, desde que ela concorde, e dividem-se os filhos entre os irmãos.

Felupes – são bem constituídos, robustos, musculados, sadios e resistentes. Quando novos e solteiros, usam várias contas nas pernas e diversas penas na cabeça. Quanto a trabalhar, não se matam muito, apenas produzem o suficiente para comer e pagar o seu imposto. Só depois dos 20 anos é que se casam e não se divorciam, separam-se do modo mais simples quando não se dão bem. Crêem em Deus e nos espíritos malignos.

Papéis – são muito vivos e espertos, musculosos e resistentes. Quase todos de caráter concentrado. Têm um costume interessante: deformar os dentes, tornando-os pontiagudos. Exímios montadores de bois ou de vacas, é costume passarem nos caminhos a trote, ou a galope. No que respeita a bebidas, apreciam o álcool e o vinho de palma. As raparigas Papéis, logo que nascem são pedidas em casamento por qualquer homem, que desde logo tem que auxiliar o pai dando-lhe aguardente e trabalhando na sua lavoura. Uma vez chegadas à idade 10 ou 12 anos, vão as raparigas para casa das mães dos seus futuros maridos e só se juntam com estes depois de atingida a puberdade.

Manjacos – são considerados como uma divisão dos Papéis, com que se assemelham fisicamente e até pelos costumes. Náuticos por temperamento, são os que mais contingente fornecem para o pessoal de embarcações. A mulher Manjaca é ordinariamente esbelta e agradável. Adora os lenços de cores vivas e ornamenta-se, como os ídolos, de bizarros colares de pontas e manilas. Os Manjacos constituem uma população densa e obedecem aos régulos, que são senhores absolutos.

Banhuns (Brames ou Mancanhas) – não crêem na alma, nem sabem o que isso seja, mas acreditam na transmigração. Há Banhuns que se caracterizam pelas horas mortas da noite em hienas e onças para exercerem pequenas vinganças. Para os Banhuns, a mulher não é bem um ser, um farrapo desprezível, sem vontade própria, que eles negoceiam como negociariam a vaca ou uma cabra. Reconhecem que precisam dela mas não se lhe dedicam. Por este facto estão sempre prontos a tê-la em casa e a recebê-la, mesmo que saibam que os filhos que ela lhes traz não lhes pertencem. Ela lavra a mancarra, corta o chabéu (cacho de coconote), lavra o milhinho, que é uma espécie de alpista ou painço; ela prepara os terrenos, sacha e monda as culturas, colhe a mancarra e quebra o coconote.

Balantas – as suas crianças, mal nascem, são lavadas e podem chorar à vontade. Hão de esperar que as mães tenham leite. Se estas morrem em resultado do parto, ou mesmo muitos meses depois, os filhos têm também de morrer por não haver quem os amamente. Quando nascem gémeos, um é abandonado junto de qualquer montículo de bagabaga e lá morre, tomando a mãe conta do outro. Aos mancebos (blufos) tudo é permitido. Praticam a circuncisão, para eles a maior festa. Escolhem as mulheres com que hão de casar. A mulher Balanta, é em geral, infiel ao marido, o que não admira, visto este normalmente ser muito mais velho do que ela. Há entre eles um costume muito curioso: se duas famílias são inimigas, fazem as pazes trocando os filhos em casamentos.

Beafadas – são uns verdadeiros amorosos de batuques. É a mulher que trabalha; é ela que trata da apanha dos produtos, ela que põe em fio o algodão, ela que o tinge, enquanto homem descansa à sombra da árvore.

Cassangas – são considerados uma espécie de Beafadas, havendo quem neles encontrasse muitas semelhanças.

Nalus – atingindo a idade de 18 anos, podem casar e terão tantas mulheres quantas forem as irmãs que tiverem. Praticam a circuncisão. As mulheres são consideradas, em geral, como escravas, não havendo nenhum cuidado com elas quando estão grávidas, chegando até a ser espancadas pelos maridos. Entre os Nalus herdam os filhos, e na falta destes, os sobrinhos.

Bijagós – são os únicos indígenas que não praticam a circuncisão. Untam os corpos com azeite de palma e, nas ocasiões das festas, juntam a este um barro branco. São bons nadadores. Alimentam-se de macacos, ratos, jibóias, cães ou outros bichos domésticos. As suas casas, em regra, são caiadas com barro branco. Algumas têm vários desenhos informes, feitos com barro vermelho e amarelo ou com uma tinta preta. Crêem todos numa entidade suprema.

E o artigo termina assim: acrescentaremos agora que, a par do Balanta, é talvez o Fula o mais corajoso na investida, de uma intrepidez mais calma.


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Nota do editor

(*) Poste anterior de 5 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17433: Notas de leitura (964): Anuário da Província da Guiné, ano de 1925 - Um documento histórico incontornável (1) (Beja Santos)

Último poste da série de 6 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17437: Notas de leitura (965): Guiné: um rio de memórias, "alegres e doridas"... Porque regressar é preciso: "costuma(-se) dizer que tem mais dores aquele que nunca regressa completamente"... E quem o reafirma é o Luís Branquinho Crespo, que lá voltou quarenta e tal anos depois...

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16710: Álbum fotográfico de Luís Mourato Oliveira, ex-al mil, CCAÇ 4740, Cufar, dez 72 / jul 73; e Pel Caç Nat 52, Mato Cão e Missirá, jul 73 /ago 74) (1) - Bolama, Centro de Instrução Militar (parte I)


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4 


Foyp nº 5


Foto nº 6


Foto nº 7

Guiné > Bolama > Centro de Instrução Militar (CIM) > c. jun/jul 1973 >  Estágio do Luís Oliveira,  de preparação para o comando de subunidades africanas. (*)


Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Antes de ir tomar posse do lugar de comandante do Pel Caç Nat 52 onde vai terminar a sua comissão (Mato Cão e Missirá, julho de 1973/agosto de 1974), o alf mil Luis Mourato Oliveira passa cerca de duas semanas em Bolama e uma em Bissau, recebendo formação sobre usos e costumes dos povos da Guiné bem como sobre ação psicossocial (fotos nºs 5, 6  e 7) e dando  ainda intrução militar a "mancebos" do recrutamento local (fotos nº 1 e 4).

Foi nesta ocasião que ele (foto nº 3) se encontra com outros graduados, que também estavam a fazer o estágio,  como o alf mil Miguel Champallimaud, sobrinho do conhecido empresário António Champallimaud  (foto nº 2),  e um furriel  (, talvez Hèlder de seu nome ?), promovido a alferes por ter feito um grande "ronco" ao apanhar ao PAIGC, no sul, um equipamento completo do "jato do povo" (foguetão 122 mm e respetiva rampa de lançamento). Eram dois dos seus parceiros de cartas e de amena cavaqueira à noite, acompanhada de um bom uísque.

Diga-se, de passagem, que essa formação, mais de natureza socioantropológica, não existia ao tempo da formação das primeiras companhias da "nova força africana", criadas logo em 1969, no primeiro ano do consulado de Spínola (por ex., CCAÇ 11, 12, 13, 14)...

De  regresso a Cufar, e depois a caminho do setor L1 (Bambadinca), o Luís perdeu o rasto a estes e outros camaradas do tempo do CIM de Bolama. Ele tinha chegado à Guiné no princípio de 1973, vinha em rendição individual, e fora  colocado na CCAÇ 4740, em Cufar. Fará férias, na metrópole,  em novembro/dezembro desse ano. Regressa a tempo de passar o Natal com os seus homens, do Pel Caç Nat 52, no Mato Cão. E traz com ele um "pão de ló de Miragaia", feito pela mãezinha.

Dessa passsagem pelo CIM de Bolama, publicam-se algumas fotos do seu álbum. Legendas complementares:

Fotos nºs 5, 6 e 7< "*Psico-compras",  em tabancas bijagós de Bolama

Foto nº 4 > "Visita aos instruendos" em formação,  no CIM.

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Nota do editor:

(*) Vd. postes de

9 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16702: De Cufar a Mato Cão, histórias de Luís Mourato Oliveira, o último cmdt do Pel Caç Nat 52 (1) - Experiências gastronómicas (Parte I): maionese de peixe do Cacine e açorda de bacalhau com coentros...

10 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16706: De Cufar a Mato Cão, histórias de Luís Mourato Oliveira, o último cmdt do Pel Caç Nat 52 (2) - Experiências gastronómicas (Parte II): Restaurante do Mato Cão: sugestões de canibalismo ("iscas de fígado de 'bandido' com elas"), "pãezinhos crocantes com chouriço" e... "macaco cão [babuíno] no forno com batatas a murro"!...