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quarta-feira, 24 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14791: Agenda cultural (413): "Guiné-Bissau: Biodiversidade, desenvolvimento e cooperação", audição pública promovida pelo Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Guiné Bissau: Lisboa, Assembleia da República, sala do Senado, 6ª feira, 26, 14h30-18h: sessão de livre acesso.



1. Fomos alertados, ontem, por um mail da nossa amiga Catarina Gomes,  jornalista do "Público", para a audição pública sobre a Guiné Bissau que se vai realizar na nossa assembleia da república, na sala do senado, no dia 26, sexta.feira, com  início às 14h30.

O tema é "Guiné-Bissau: Biodiversidade, desenvolvimento e cooperação".

Trata-se de um sessão de livre acesso (ou seja, aberta todos aqueles  que queiram assistir),  promovida pelo Grupo Parlamentar de Amizade Portugal - Guiné Bissau (de que  é presidente  a deputada Catarina Martins,  do Bloco de Esquerda; vd. abaixo a composição deste grupo parlamentar, onde se inclui o nosso grã-tabanqueiro, Arménio Santos, deputado do PSD).

Reproduz.se acima o programa existente (provisório) que  inclui: (i) abertura pela Presidente da Assembleia portuguesa (que visitou recentemente a Guiné-Bissau,  entre 16 e 19 deste mês); (ii)  projeção de  dois pequenos documentários; (iii)  intervenções de representantes do Instituto Camões, do projeto Casa dos Direitos da Guiné.-Bissau  e da Plataforma das ONGD portuguesas;  (iii) dois momentos de debate; e (iv) encerramento.

Além dum representante da embaixada da Guiné-Bissau, está prevista a presença de: (i) representante da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau; (ii) director da ONGD Tiniguena, Miguel Barros; e (iii) director do IBAP de Bissau, Alfredo Silva.

Para os organizadores, no momento em que se está a finalizar o programa de cooperação entre Portugal e a Guiné - Bissau para os próximos anos,  é importante que esta sessão  tenha uma divulgação alargada e conte com uma  presença significativa de pessoas interessadas,  guineenses e  portugueses, amigos da Guiné-Bissau.







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Nota do editor;

Último poste da série > 21 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14779: Agenda cultural (410): Conferência Glória e Martírio do Corpo Expedicionário Português (1914-1918), no âmbito do Ciclo de Conferências de 2015, que se realizará no dia 26 de Junho, pelas 21h30, no Museu Bernardino Machado, em Vila Nova de Famalicão

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Guiné 63/74 - P14038: (Ex)citações (256): Afinal, a foto do "BOR" era de 1978/79, tirada em Bolama por um casal de brasileiros (João Parreira)


Guiné-Bissau > Bolama > c. 1978/79 > O ferry boat Bor, em fim de vida... Fazia a carreira Bissau-Bolama


Guiné-Bissau > Bolama > c. 1978-79 > O barco de carreira "Corubal" que fazia a ligação Bolama-Bissau.

Fotos: Cortesia do sítio Guiné-Bissau Recordações em Imagens (*)


1. Mensagem enviado ao nosso camarada Manuel Amante da Rosa [, atual embaixador de Cabo Verde em Roma: ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau, 1973/74]

Data: 13 de dezembro de 2014 às 07:23
Assunto: "BOR"

Boas festas, embaixador!..

Tinhas razão em relação à agonia do "BOR"... Vou publicar esta nota do João Parreira, comando de Brá, 1965/66...

Um natal sem vulcões nem tsunamis...

Bebo um grogue à tua saúde e à felicidade do teu povo.
Luis

2. Mensagem do João Parreira  [, foto atual, à esquerda]:

[ex-fur mil op esp, CART 730 / BART 733, Bissorã, 1964/65; ex-fur mil comando, Gr Cmds Fantasmas, CTIG, Brá, 1965/66]

Data: 12 de dezembro de 2014 às 23:09
Assunto: "BOR"

Boa noite Luís,

Os meus camaradas que fizeram a viagem para Bolama na "BOR"[, em 1964,]  e que contatei, já me responderam a dizer que não tinham nenhuma foto.(**)

Assim, comecei a procurar e acabei agora de descobrir onde fui buscar a foto do ferry-boat "BOR" com a qual ilustrei o meu diário na parte referente à minha viagem para Bolama em 1964.

Foi no blog guinebissaulembrancas.blogspot. A foto da balsa "BOR" foi tirada em 1978 por um casal de brasileiros que viveu na Guiné em 1978-79.

Um abraço.
João


3. Comentário de LG:

O nosso camarada Manuel Amante, que conheceu bem as embarcações que sulcaram os rios e braços de mar da Guiné, já nos tinha chamado a atenção para o facto de esta foto do "BOR", enviada pelo João Parreira, ser de alguns anos após a independência da Guiné, sendo mais provavelmente  do "início possível do seu desmantelamento". E comentava: " Uma sombra triste e desolada de uma embarcação que, sob qualquer tempo ou contingência, muito navegou pelos rios e canais da Guiné". (***)

No sítio Guiné-Bissau Recordações em Imagens, encontrámos uma foto de outra embarcação que faz parte parte das memórias do Manuel Amante, o "Corubal"
________________

Notas do editor:

 (*) Sítio Guiné-Bissau Recordações em Imagens (*):

De um casal de brasileiros que viveu naquele grande pequeno país em 1978-79, voluntários das Nações Unidas, professores do Jardim Escola e da Escola Piloto do PAIGC, na ilha de Bolama, arquipélago dos Bijagós.

(**) Vd. poste de 3 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13969: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (90): Foto do ferryboat BOR que levou a CART 730, de Bissau para Bolama, um dia depois de desembaracar do T/T Niassa (João Parreira, ex-fur mil op esp e cmd, CART 730 / BART 733, Bissorã, 1964/65; Gr Cmds Fantasmas, CTIG, Brá, 1965/66)

(***) Último poste da série > 7 de dezembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13981: (Ex)citações (255): Fomos pioneiros numa série de coisas: (i) a colorir fotos a preto e branco para matar o tempo; (ii) a recliclar garrafas de cerveja; (iii) a fazer cadeiras de baloiço com as aduelas dos barris ... (José Nunes, ex-1º cabo eletricista, BENG 447, Brá, 1968-70)

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13886 Da Suécia com saudade (47): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte VII): E depois da independência e até 1994, atingiu os 2 mil milhões de dólares! (José Belo)


Foto nº 15  > Quem disse que em tempo de guerra não se limpavam armas ? [Legenda original: "15 Soldiers in the liberated areas in Guinea Bissau"]



Foto nº 6 > Isto não é uma picada, é uma autoestrada...  [ Legenda original: "Soldiers marching in the liberated areas in Guinea Bissau"]


Foto nº 23 > Mezinhas para o povo...   [Legenda original: "Medical examination in the liberated areas in Guinea Bissau"]



Foto nº 22 >  O trabalho da menino é pouco mas quem não o aproveita é louco... [Não, não é a apologia do trabalho infantil, é um ditado popular português...[Legenda original: "Harvesting rice in the liberated areas in Guinea Bissau. The rice was stored in the little house with straw roof in the background"]


Foto nº 5  > Uma visão idílica da guerra de guerrilha por parte dos escandinavos... [Legenda original: "In a boat on the river in the liberated areas in Guinea Bissau.]



Foto nº 31 >  

Guiné-Bissau (ou Guné-Conacri) > PAIGC > s/l> Novembro de 1970 > Algures, na Guiné Conacri ou nas "áreas libertadas" (sic) da Guiné-Bissau, fotos do fotógrafo norueguês Knut Andreasson, por ocasião de um visita de uma delegação sueca.

Algumas destas foto foram publicadas no livro Guinea-Bissau : rapport om ett land och en befrielserörelse, da autoria de Knut Andreassen, Birgitta Dahl (Stockholm : Prisma, 1971, 216 pp.). [Título traduzido para português: Guiné-Bissau: relatório sobre um país e um movimento de libertação].

A chefe da delegação, a controversa deputada socialdemocrata e antiga presidente do parlamento sueco, Birgitta Dahl, fez um relatório desta missão, em sueco, e que infelizmente não está disponível na Net: a visita foi à Guiné-Conacri e às "áreas libertadas" da Guiné-Bissau, no período de 6 de novembro a 7 de dezembro de 1970 [”Rapport från studieresa till Republiken Guinea och de befriade områdena i Guinea-Bissau, 6 november–7 december 1970” (”Relatório da viagem de estudo à República da Guiné e às zonas libertadas da Guiné-Bissau, 6 de Novembro–7 de Dezembro de 1970”), Uppsala, Janeiro de 1971 (SDA)].

Fonte: Nordic Documentation on the Liberation Struggle on Southern Africa [Com a devida vénia] [Seleção, edição e legendaqgem livre: LG]

[As fotos podem ser usadas, devendo ser informado o Nordic Africa Institute (NAI) e o fotógrafo, quando for caso disso. Este espólio fotográfico de Knut Andreasson (, relativo à visita ao PAIGC na Guiné-Conacri  e, alegadamente, às áreas sob o seu controlo na Guiné-Bissau, em novembro de 1970, de uma delegação sueca) foi doado pela viúva ao NAI.]


1. Última parte da publicação de alguns dados e notas de contextualização, sobre a ajuda sueca ao PAIGC, a partir de 1969, e depois à Guiné-Bissau, a seguir à independência e até 1994, da autoria do nosso camarada José Belo (na Suécia há quase 4 décadas, e a quem a gente chama carinhosamente o "régulo da Tabanca da Lapónia") (*)


Data: 6 de Novembro de 2014 às 20:27

Assunto: Auxílio Sueco à Guiné (pós independência)

Caro Luís Graca.

A partir do dia 12 parto para os States por um bom período de tempo. Aproveitarei para umas longas férias "blogueiras" em todos os azimutes.


Um abraco, José Belo

[O blogue do Zé Belo, Lapland Near Key West tinha a seguinte inscrição à porta do iglô, às 19h00 ontem, de Lisboa: "Sorry, we 're closed  for vacation" ( Desculpem, estamos fechados para férias).] (LG)


2. Depois da independência a Suécia continuou a ser o maior fornecedor de assistência à Guiné (*).

O auxílio estatal era dado pela Swedish International Development Cooperation Agency (SIDA) e pela Swedish Agency for Research and Cooperation with Developing Countries (SAREC), para além de Organizações  näo Governamentais (ONG) como por exemplo a Save the Children/Sweden (Rädda Barnen).

O auxílio estatal entre 1974 e 1993 foi de 2 mil milhões (!) de dólares (USA),

De entre projectos financiados pela SIDA [, A Agência Sueca Para o Desenvolvimento e Cooperação  Internacionais] salientam-se:

(i) Programa de Desenvolvimento Rural Integrado (PDRI) administrado desde o Centro Olof Palme, em Bula:

(ii) Fábrica de Blocos e Tijolos em Bafatá;

(iii) Estaleiros de reparação GUINAVE em Bissau;

(iv) Oficinas mecânicas GUIMETAL em Bissau;

(v) Companhia de madeiras SOCOTRAM que operava 3 serrações, uma fábrica de mobílias,e uma fábrica de revestimentos de madeira para construção civil:

(vi) Uma rede telefónica automática:

(vii) Oficinas Volvo de reparação e manutenção;

(viii)  A PESCARTE - Direcäo Nacional da Pesca Artesanal

(ix) Laboratório Nacional de Saúde Pública e apoio em especialistas e material hospitalar para o diagonóstico e tratamento do  HIV/SIDA


Dos projectos financiados pela SAREC - Swedish Agency for Research and Cooperation with Developing Countries, salienta-se:

(x) Financiamento e assistência ao INEP-Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa.(Assstência e apoio ás publicações, projectos de pesquisa, conferências académicas, grupos de estudos, bolsas académicas).


Em 1994 uma avaliação  muito crítica(!) aos resultados da assistência desde 1974 recomendou uma redução  substancial da mesma por, entre outros motivos...menos diplomáticos..."O auxílio dado à Guiné-Bissau durante 20 anos ter resultado num crescimento económico muito limitado".

Cinco anos mais tarde, na sequência da destrutiva guerra civiil de 1998-1999 a embaixada sueca em Bissau foi encerrada.

José Belo 

[ ex-alf mil inf da CCAÇ 2381,Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70; cap inf ref, é jurista, vive Suécia há quase 4 décadas, e onde formou família: e, ultiimamente, reparte o seu tempo com os EUA, aonde família tem negócios].

3. Mail do José Belo,  recebido ainda hoje de manhã, por volta das 10h30:

Caro Luís Graça.

Aproveito já estar na minha casa em Estocolmo a aguardar o voo de amanhã para os States,  para enviar sugestão quanto à interessante leitura do documento de um dos estudos sobre os auxílios da Agência Estatal Sueca SIDA à Guiné, Moçambique, Nicarágua e Vietname, na época os países que maior auxílio sueco recebiam: (i) "Aid and Macroeconomics", de Stefan Vylder; (ii) "An evaluation of Swedish Import Support to Guinea-Bissau, Mozambique, Nicaragua and Vietnam".

É interessante a Suécia ter mantido um perfil muito discreto nos diálogos políticos com as autoridades de Bissau sobre os programas de ajustamentos estruturais. No relatório de estudo e análise, mais ou menos crítica,  de 1993,  constata-se não ter tido a Agência Estatal Sueca-SIDA uma influência nas políticas económicas do governo da Guiné,  compatível com a realidade de ser de longe a dadora do maior auxílio económico e dispondo de especialistas nesta área com mais vasta experiência do que a de outros países envolvidos.

A política seguida pela SIDA até essa data foi a de permitir ao Governo da Guiné a formulação das suas prioridades e solicitar auxílios de acordo com as mesmas. A seu modo auxílios... "requisitados".

Esta política (diferente de a seguida por outros países que têm sempre procurado estabelecer condições formais para fornecimentos de auxílios bilaterais) tem feito com que o governo local olhe a SIDA como um dador "soft", a ser encarado como amigo(!).....

Os resultados?

De qualquer modo é interessante o aumento dos números quanto aos milhões de coroas suecas fornecidas de ano para ano.

1988-1989...3 milhões.
1989-1990...6 milhões.
1990-1991...28 milhões

Um abraço do José Belo


PS - 1 Euro = 9,2691 Coroas Suecas (SEK); 1 SEK = 0,10787 €,  em 13/11/2014 (LG)

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Nota do editor:

(*) Últimos postes desta série:

3 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13842: Da Suécia com saudade (40): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte I)... à Guiné-Bissau, de 1974 a 1995, foi de quase 270 milhões de euros... Depois os suecos fecharam a torneira... (José Belo)

4 de movembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13847: Da Suécia com saudade (41): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte II)... Um apoio estritamente civil, humanitário, não-militar, apesar das pressões a que estavam sujeitos os sociais-democratas, então no poder (José Belo)

5 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13849: Da Suécia com saudade (42): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte III)... Pragmatismos de Amílcar Cabral e do Governo Sueco, de Olaf Palme, que só reconheceu a Guiné-Bissau em 9 de agosto de 1974 (José Belo)

6 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13853: Da Suécia com saudade (43): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte IV): Rússia e Suécia, vizinhos e inimigos fidalgais, foram os dois países que mais auxiliaram o partido de Amílcar Cabral (José Belo)

7 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13859: Da Suécia com saudade (44): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte V)Quando se discutia, item a item, o que era ou não era ajuda humanitária: catanas, canetas, latas de sardinha de conserva... (José Belo)

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13853: Da Suécia com saudade (43): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte IV): Rússia e Suécia, vizinhos e inimigos fidalgais, foram os dois países que mais auxiliaram o partido de Amílcar Cabral (José Belo)


Guiné-Bissau > PAIGC > s/l> Novembro de 1970 > Algures, nas "áreas libertadas", foto do norueguês Knut Andreasson, com um grupo de homens, jovens adultos, possivelmente balantas e guerrilheiros, a maioria deles descalços, ostentando todos eles o livrinho de leitura da 1ª classe, o primeiro em uso nas escolas do PAIGC (e que, se não erro, foi oferecido por estudantes noruegueses e impresso na Suécia, num total de 20 mil exemplares).

Fonte: Nordic Documentation on the Liberation Struggle on Southern Africa  [Com a devida vénia]

[As fotos podem ser usadas, devendo ser informado o Nordic Africa Institute (NAI)  e o fotógrafo, quando for caso disso. Este espólio fotográfico  de Knut Andreasson (, relativo à visita ao PAIGC  e, alegadamente,  às áreas sob o seu controlo, em novembro de 1970,  de uma delegação sueca) foi doado pela viúva ao NAI.]


Imagens da capa de "O NOsso Livro Livro da 1ª Classe", o primeiro livro de leitura, usado nas escolas do do PAIGC... Exemplar capturado pelo nosso camarada Manuel Maia no Cantanhez, possivelmente em finais de 1972 ou princípios de 1973. Vê-se que esse exemplar tinha uso. A capa teve de ser reforçada com uns improvisados adesivos (aparentemente autocolantes, que acompanhavam embalagens de apoio humanitário, vindas do exterior).

Foto: © Manuel Maia (2009). Todos os direitos reservados

José Belo

1. Continuação de alguns dados e notas de contextualização sobre a ajuda sueca ao PAIGC, a partir de 1969, e depois à Guiné-Bissau, a seguir à independência (*):


Data: 3 de Novembro de 2014
Assunto:   O exemplo sueco é seguido por outros países


Resumo: 

Durante a guerra o governo sueco enviou para o PAIGC um total de 53,5 milhöes de coroas, ao valor actual [c. 5,8 milhões de euros]. Destinaram-se a financiar a maioria das actvidades civis do partido: alimentacäo, transportes, educação, saúde, incluindo um vasto número de avultados fornecimentos às Lojas do Povo. 

A Guiné foi posteriormente incluída (como único país da África Ocidental) nos chamados "países programados" para a distribuicäo da assistência sueca ao desenvolvimento. Recebeu durante o período de 74/75 a 94/95, um total de  2,5 mil milhões de coroas suecas [c. 270 milhões de euros], colocando a Suécia entre os 3 maiores assistentes económicos da Guiné-Bissau. 

A Suécia nunca deu nenhum cheque em branco ao PAiIGC, tanto mais que Portugal era um dos seus importantes parceiros comerciais no âmbito da EFTA - Associação Europeia do Comércio Livre, a que ambos os países pertenciam, e de que foram membros fundadores. Ainda em vida de Cabral, em abril de 1972 o Comité ds Nações Unidas para a Descolonizacäo tinha adoptado uma resolução reconhecendo o PAIGC como o único e legítimo representante do território da Guiné-Bissau. Foi um tremendo sucesso político-diplomático para o PAIGC. Isso em nada alterou o pragamtismo da diplomacia sueca. A Suécia só irá reconhecer a Guiné-Bissau como país independente, em 9 de agosto de 1974, ano e meio depois da  morte de Amílcar Cabral (que também era um político pragmático).


1. O auxílio sueco ao PAIGC abriu caminho a um cada vez maior número de apoios de outros países ocidentais.

A Noruega estabeleceu em 1972 uma assistência oficial e directa,semelhante ao modelo sueco, que veio a ter grande repercussão política internacional pelo facto de ser um país membro da NATO.

Neste período eram a Suécia e a Uniäo Soviética  (URSS) os países que mais apoiavam o PAIGC.

Um apoio de modo algum coordenado mas... real, numa divisäo "de facto" de funções entre os dois países, que mais tarde se veio a manter em relação aos outros movimentos de libertação africanos.

Apesar de tanto os Estados Unidos como outros países ocidentais acusarem a Suécia de fazer causa comum com o bloco comunista, isto não veio impedir que o Parlamento Sueco e o Governo Social Democrata continuassem a aumentar gradualmente a assistência não militar.

Deve-se no entanto ter o cuidado de colocar estas acusações dentro de uma perspectiva realista da história local.

O "inimigo histórico tradicional" da Suécia é a Russia,  e para tal basta abrir um qualquer livro de 
história da instrução primária sueca.

Isto independentemente de ser a Rússia do séc XVII, a Rússia dos comunistas ou...a Rússi actual.

José Belo

(continua)
____________

Nota do editor


segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13842: Da Suécia com saudade (40): A ajuda sueca ao PAIGC, de 1969 a 1973, foi de 5,8 milhões de euros (Parte I)... à Guiné-Bissau, de 1974 a 1995, foi de quase 270 milhões de euros... Depois os suecos fecharam a torneira... (José Belo)


Suécia > s/l > s/d > Visita de uma delegação de um país africano ou de um movimento nacionalista africano (parece-me mais provável ser do ANC do que do PAIGC...). Pelo vestuário e pelo fenótipo, os africanos devem ser originários da Africa do Sul... Provavelmente ainda no tempo do "apartheid"... [O Cherno Baldé veio depois corrigir-me: pelas vestes e traços fisionómicos, são representantes do povo massai, seminómadas; são menos de um milhão, e vivem no Quénia e no norte da Tanzânia] 

Foto do arquivo de José Belo (sem indicação da fonte).


1. Mandei  ontem a seguinte mensagem ao José Belo, o nosso régulo da Tabanca da Lapónia:

 José: 

Bom dia!.. Ainda não nos roubaram o sol, que é a única coisa (de Portugal) que deve fazer inveja aos teus suecos...

Olha, diz-me se sabes algo mais sobre estes rapazes, que também ajudaram os guineenses a aprender a falar e a escrever a nossa língua... (uma das poucas boas que lá deixámos).

Esta tipografia (e editora ?) de Upsala imprimiu dezenas de milhares de manuais escolares para o PAIGC... Quem é que pagava ? O meu sueco do Google não dá para perceber tudo...

Um abração. Luis


PS -  Vd. poste P13837: (...) "Wretmans Boktryckeri AB era um tipografia, fundada em 1889, por Harald Wretmans, tipógrafo com formação alemã, e que faliu em 1973, depois de ter passado por várias mãos, e de ter 40 funcionários na década de 1940. Tinha fama de apresentar boas encadernações." (...)

2. Resposta do Jose[ph] Belo, na volta do correio:

Quem pagava era o Departamento Estatal "Swedish International Development Autority".

Com um início modesto em 1969, o governo sueco acabaria por enviar para o PAIGC,  durante a guerra, um total de 53,5 milhöes de coroas suecas (ao valor actual). [cerca de 5, 8 milhões de euros;  1 euro = 9,2761 SEK, à taxa de câmbio em 31/10/2014].

Assistência que, em crescendo rápido, acabou por vir a financiar a maioria das actividades näo militares do PAIGC,s alientando-se o sector alimentar, transportes, educacäo e saúde.

A isto somavam-se vastos e constantes fornecimentos para as chamadas "Lojas do Povo".

Posteriormente à independência,  a Guiné-Bissau foi o único país da África Ocidental a ser incluída nos denominados países programados para a distribuicão da assistência sueca ao desenvolvimento.

Com resultados muito díspares(!), a assistência total à Guiné independente, durante o período de 1974/75-1994/95,  foi de 2,5 mil millhões (!) de coroas suecas [, c. 269,5 milhões de euros,], colocando então a Suécia entre os 3 maiores assistentes económicos do país.

Hoje?....A história é outra.

José Belo
Tanto as ajudas estatais como particulares, o interesse, e os sentimentos de solidariedade foram destruídos na quase totalidade pela corrupção de políticos e militares, e näo menos pelo narco-tráfego.

Um abraço do José Belo.

PS - São alguns números do Nordiska Afrikainstitutet,  de Uppsala.

Entre documentos antigos encontrei algumas curiosidades relacionadas com Amílcar Cabral e a Suécia que creio serem menos conhecidos por muitos.

Vou traduzir no meu melhor português de 40 anos de assuecamento e enviar para aí.

Um abraço.
Literalmente...Tabanca da Lapónia!,
agora como http://laplandnearkeywest.blogspot.pt [Lapland Near Key West / A Lapónia ao pé de Key West, Flórida, EUA]



Blogue do José Belo, há cerca de 40 anos na Suécia: "Lappland near Key West" [A Lapónia ao pé de Key West, Florida, EUA]. Ao cimo, do lado esquerdo, abaixo do título, há uma frase muito didática e certeira, antietnocêntrica, prevenindo-nos contra a tentação de ver o mundo através do nosso umbigo: "We dont see the things as they are, we see them as we are"... Traduzindo: "Nós não vemos as coisas como elas são, vemo-las como nós somos"... [A frase é atribuída à escritora Anïs Nin (1903-1977)] (LG).

domingo, 2 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13837: Postes Escolares Militares (2): Com os meus camaradas já no Puto, fui destacado para fazer exames da 4ª classe, em Mansabá, a soldados metropolitanos... Ao chegar, sem arma, apanhei logo um forte ataque IN... No dia seguinte, deixei passar metade dos examinandos... (Paulo Salgado, ex-alf mil op esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72; professor primário, administrador hospitalar, cooperante)



Guiné > Região do Oio > CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72) > O alf mil op esp Paulo Salgado... Embora essencialmente operacional,  não se coibia de dar uma mãozinha quer no posto sanitário quer na educação de adultos.

Na foto acima, vemo-lo, no Olossato, prestando ajuda como voluntário ao fur mil enf Carvalho. Professor primário, ele já tinha vocação, na época, para a administração de serviços de saúde. E particular motivação e sensibilidade para as questões da cooperação e da solidariedade. Irei encontrá-lo, mais tarde, em 1982 em Lisboa, como aluno do Curso de Especialização em Administração Hospitalar, da Escola Nacional de Saúde Pública. Mas só depois da criação do blogue, é que demos conta, por volta de setembro de 2005,  que éramos também "camaradas da Guiné" e tínhamos uma "paixão comum por África"...

O Paulo (e a sua inseparável companheira, a Conceição Salgado, economista, também ela nossa grã-tabanqueira, tal como a filha de ambos, doutorada em biologia, investigadora no Reino Unido,  Paula Salgado) vive neste  momento entre Vila Nova de Gaia e Luanda.

O casal (o Paulo e a São) regressam a Luanda neste domingo,   à sua suite, na baía de Luanda, na Clínica da Sagrada Esperança. Boa viagem, camarada Paulo, e amiga São! Um kandandu para os nossos amigos comuns!... Vocês são feitos da massa dos portugueses de Quinhentos!...

PS - O Paulo é  nosso grã-tabanqueiro desde a  primeira hora (setembro de 2005) (*).

Foto: © Paulo Salgado (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]


1. Mensagem do nosso camarada e amigo Paulo Salgado, cada vez mais angolano, sem perder as suas raízes transmontanas e muito menos a alma lusa:


De: Paulo Salgado

Data: 20 de Outubro de 2014 às 07:39

Assunto: Aprender a ler (**)...


Meu Caro Luís,

Grande Tertuliano,


Havia dois professores na companhia: o furriel Carvalho (enfermeiro) que dava aulas aos camaradas, e eu, menos disponível, dava uma ajuda.

O manual era o quadro preto com invenções nossas e os livros usados pelos tugas por esse "império" mal construído...eram os do  Continente...como poderíamos fazer de outra maneira?

Mas uma história que penso ter contado: a companhia estava já no puto [, metrópole,] e este modesto escriba e mestre-escola foi destacado para fazer exames da 4.ª classe em Mansabá para onde foi transportado de propósito. 

Nesse dia, ao entardecer, um forte ataque do IN e...para onde ir...? No dia seguinte, ao ditado - que fazia parte do exame - reparei que ao primeiro parágrafo cada palavra seu erro; solução: cópia...

Lá passaram mais de metade para, ao menos escreverem, sem interposto camarada, o aerograma à mulher, à noiva, à madrinha de guerra. E para "tirar" a carta de condução...

No final de dois dias, lá vim de coluna, sem arma, com a farda n.º 2...sem qualquer emboscada.

Saudação tertuliana

Paulo Salgado

 NOTA: No mato, os livros utilizados pelos professores do PAIGC de Cabral eram didáctica e pedagogicamente mais correctos e apelativos...Eles ensinavam o português...Sou testemunha.



Guiné-Bissau > PAIGC > Novembro de 1970 > s/l > Uma escola algures numa "região libertada". Imagem do fotógrafo norueguês Knut Andreasson (com a devida autorização do Nordic Africa Institute, Upsala, Suécia). A fotografia não traz legenda. Tudo indica que tenha sido tirada na Guiné-Conacri, numa base de rectaguarda do PAIGC, talvez Boké, ou mais provavelmente na própria capital, Conacri, onde havia desde Março de 1965 uma escola-internato para os filhos dos militantes, dirigentes e guerrilheiros.

Fonte / Source: Nordic Africa Institute (NAI).  Foto / photo: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a autorização do NAI / courtesy of NAI) (Edição / Edited by LG]



Guiné-Bissau > PAIGC > s/l> s/d> Foto do secretário geral do PAIGC, incluída em O Nosso Livro,  2ª Classe, editado pelos Serviços de Instrução do PAIGC - Regiões Libertadas da Guiné (sic). Tem o seguinte copyright: © 1970 PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Sede: Bissau (sic)... A primeira edição teve uma tiragem de 25 mil exemplares, tendo sido impresso em Upsala, Suécia, em 1970, por Tofters/Wretmans Boktryckeri AB..

[Wretmans Boktryckeri AB era um tipografia, fundada em 1889, por Harald Wretmans, tipógrafo com formação alemã, e que  faliu em 1973, depois de ter passado por várias mãos, e de ter 40 funcionários na década de 1940. Tinha fama de apresentar boas encadernações.]

Foto: Fotógrafo desconhecido. [Imagem reproduzida e editada por LG, a partir de um exemplar gentilmente disponibilizado pelo nosso camarada Paulo Santiago].

Imagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014). [Edição: LG]




PAIGC > Imagem do livro da 1ª classe, também editado em 1970, impresso e encadernado pela Wretmans Boktryckeri AB, Uppsala, Suécia.  Exemplar apreendido em 1973, no Cantanhez. numa operação "para lá do bolanha de Cafal " (Cortesia de Manuel Maia).
2. Comentário de L.G.:

No interior da Guiné, no "mato", nas "regiões libertadas", não havia estruturas, escolas, hospitais ou outros equipamentos sociais, de pedra e cal... Pela simples razão, que eram um alvo fácil para a aviação portuguesa, bem como para a artilharia e forças terrestres (que continuaram sempre a ir a todo o lado, com maior ou menor resistência dos guerrilheiros). Por outro lado,  eram difíceis os caminhos que levavam às bases de retaguarda, na Guiné-Conacri (e mais tarde, no Senegal). 

Além disso, sabemos que eram duríssimas as condições de vida e de trabalho tanto das populações controladas pelo PAIGC como dos guerrilheiros... [Por exemplo, no interior da Guiné, na zona leste, no setor L1, que eu conheci  bem, enquanto graduado da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71]....

 A propaganda para consumo essencialmente externo, contava outra história, orientada para a heroicização dos combatentes da liberdade da pátria, homens e mulheres, quer na retaguarda quer na frente... Acontece isso em todos os movimentos revolucionários. O PAIGC, de inspiração marxista-leninista, não fugia à regra. Por seu turno, Amílcar Cabral era um líder carismático e um homem sedutor, a par de um hábil diplomata,  tendo conseguido um importante capital de confiança em países nórdicos como a Suécia onde eram impressos, por exemplo, os manuais escolares do PAIGC, pelo menos os livros da 1ª e 2ª classes, ainda antes da independência...  Depois os nórdicos cansaram-se da Guiné-Bissau,,, contrariamente aos portugueses, pelo menos a alguns portugueses como nós... (LG)

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Notas do editor:

(*) 18 de setembro de 2005 > Guiné 63/74 - P175: Tabanca Grande: Paulo Salgado, ex-Alf. Mil. da CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72)

(...) Penso que nos cruzámos na Escola Nacional de Saúde Pública,  por volta de 1982... Do outro lado da mesa [estava] o assistente, e deste lado o aluno de Administração Hospitalar. Foi assim, não foi?

Mas nunca tivemos OPORTUNIDADE DE conversar ... o raio do peso institucional... da Escola. Vou gostar de participar neste blogue.

Fiz a minha comissão no Olossato e Nhacra entre Abril de 1970 e Março de 1972.

Fiz uma segunda comissão em 1990/92, como cooperante na área da saúde. Matei fantasmas; chorei no Olossato; ri-me com as crianças que rodearam a minha viatura; revisitei o Suleiman que me reconheceu passados vinte anos!!! E depois vieram alguns homens grandes...e imensos...

Tenho ido várias vezes a Bissau desde 1996 - os amigos que tenho feito...! As desilusões que tenho sentido da parte dos guineenses. Mas também a esperança. Irei fazer outra comissão de um ano, dentro de poucos dias...! Loucura? Utopia? Talvez. (...)



(...) Aqueles de nós que foram professores primários, nos postos militares escolares, como o Carvalhido da Ponte (Xime), o Manuel Amaro (Aldeia Formosa) ou o Manuel Joaquim (Bissorã), podem falar, com propriedade e autoridade, sobre as dificuldades, perplexidades mas também sobre o prazer de ensinar, com o eventual apoio dos nossos velhos manuais escolares ou de outros textos (que eu desconheço se havia outros manuais na Guiné), a língua, a cultura e a história portuguesa aos putos das tabancas guineenses... É que nos nossos manuais bem sequer havia uma simples imagem com a cara do "pretinho da Guiné"... (...)

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12103: (In)citações (55): Eu desejo acreditar na Guiné-Bissau, nos seus jovens, mulheres e homens de boa vontade, que trabalham nas bolanhas, nas matas, nos rios e no mar... (Paulo Salgado, ex-alf mil, cav, op esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72; cooperante)

1. Mensagem de Paulo Salgado, com comentário a propósito da nossa sondagem, que encerrou a 27 do corrente, sobre o futuro das relações da Guiné-Bissau com Portugal (*)


Data: 28 de Setembro de 2013 às 18:34

Assunto: As minhas ideias - à guisa de sumário


Luís e restantes Camaradas do Blogue,


Por diversas vezes tenho manifestado o quão importante foi para mim ter "regressado" à Guiné em trabalho da minha profissão [, como administrador do Hospital Nacional Simão Mendes, Bissau].

Tive oportunidade de conhecer grande parte do território daquele País Irmão (sim. repito, Irmão, sem qualquer pejo e sem deslumbramentos...), de contactar muitas pessoas, mesmo antigos combatentes do PAIGC.

Tive oportunidade de escrever alguns textos sobre algumas experiências que vivenciei.

Sobre o tema das relações entre os dois Países, direi o seguinte (é a minha opinião, claro):

Primeiro: As relações entre os nossos Países deveriam caracterizar-se pelo direito de reciprocidade (entenda-se: igualdade, solidariedade, justiça); nenhum tem mais culpa ou menos culpa de as mesmas decorrerem bem ou mal. Que fique bem claro: há muitos aspectos destas relações que poderiam estar mais transparentes e amistosos se Portugal tivesse uma postura mais proactiva com todos os PALOP - esta questão tem anos e nunca foi resolvida devidamente...

Segundo: Existem, desde há alguns anos, interesses externos que convergem para a ganância de uns tantos, através de processos indignos de corrupção. Sabemos todos quem são os mestres desta "aventura", comendo à mesa da corrupção activa e passiva (ou são as duas activas?), prejudicando o normal desenvolvimento e crescimento da Guine-Bissau.

Terceiro: Permito-me recordar algumas ideia do grande cineasta Flora Gomes (Atual - Expresso, de 18 de maio de 2013: «Tenho confiança que a África vai mudar. O problema é a velocidade a que as coisas hoje se processam, o que pode dar azo a novos atropelos. Temos muitos jovens formados cheios de boas ideias, à espera de uma alternativa.»

Eu desejo acreditar na Guiné-Bissau, nos seus jovens, nas mulheres e homens de boa vontade, que trabalham nas bolanhas, nas matas, nos rios e no mar... (**)

Paulo Salgado

[ex-alf mil cav, op esp.,  CCAV 2721, 
Olossato e Nhacra, 1970/72; 
administrador hospitalar reformado, 

quarta-feira, 6 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11200: Notas de leitura (462): Rosa no Pais das Flores da Luta, por Maria do Céu Mascarenhas (Francisco Henriques da Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, Mansabá e Olossato, 1968/70), ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999, com data de 24 de Fevereiro de 2013:

Meus caros amigos e ex-camaradas de armas,
Dado o seu interesse, junto vos envio uma recensão da obra "Rosa no País das Flores da Luta" de Maria do Céu Mascarenhas relativo à sua experiência como professora cooperante na Guiné-Bissau, poucos anos depois da independência.
O livro é interessante na medida em que se trata de uma versão do conhecido livro "Alice no País das Maravillhas" do escritor inglês Lewis Carroll adaptado à realidade africana, ou, mais especificamente, à realidade bissau-guineense.

Com os meus cumprimentos cordiais e amigos
Francisco Henriques da Silva
ex-Alf. Mil. de Infª. CCaç 2402,
ex-embaixador de Portugal em Bissau 1997-1999


UMA NOVA VERSÃO DE ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS, NESTE CASO NA GUINÉ-BISSAU POUCO DEPOIS DA INDEPENDÊNCIA

Francisco Henriques da Silva

Maria do Céu Mascarenhas publicou recentemente uma obra que estaria há muitos anos na forja e que por vicissitudes várias, que não importa adiantar, só agora viu a luz do dia. É um livro, a todos os títulos interessante, imaginativo, bem estruturado, num português escorreito e bem elaborado e que se refere a um período da história da Guiné-Bissau, logo após a emancipação plena, sobre o qual, infelizmente, muito pouco se escreveu, nem do lado português, nem do lado bissau-guineense. Torna-se, por estas razões, uma obra obrigatória para todos aqueles que se interessam pela Guiné-Bissau, o país onde tantos, de um e de outro lado, verteram o seu sangue; o país que marcou toda uma geração que por lá passou ou cujos familiares por lá deambularam de arma na mão e que prosseguiu, anos depois por caminhos erráticos senão ínvios. Estamos a falar de “Rosa no País das Flores da Luta” (Chiado Editora, Lisboa, 2012).

A autora segue muito de perto a estrutura da célebre obra de Lewis Carroll “Alice no País das Maravilhas”, adaptando-a ao cenário de um país africano tropical, neste caso a Guiné-Bissau, alterando o nome dos personagens, o desenvolvimento das cenas, com considerações sobre um sem número de aspectos da vida quotidiana e das suas próprias elucubrações e inserindo permanentemente um relato onírico ou semi-onírico (porque, a bem dizer, não se trata de um estado de devaneio permanente, nem tão-pouco desfasado do real) com uma narração factual. Para ilustrar bem estas diferenças, a autora opta pela utilização de duas tonalidades: negrito, para o estado de vigília e regular (ou normal) para os estados sonial ou para-sonial, que vai alternando ao longo de todo o texto. Finalmente, o livro é enriquecido com inúmeras fotografias a cores da autora.

Maria do Céu Mascarenhas apenas permaneceu na Guiné-Bissau um ano lectivo (1977-78), como professora cooperante, no antigo Liceu Honório Barreto, denominado Kwame N’Krumah, após a independência. É perceptível o seu grande amor pelas crianças e o próprio título assim o indica: as “Flores da Luta” seriam as crianças, numa frase que é comummente atribuída a Amílcar Cabral e que se repete, de boca em boca, assumindo-se que a autoria pertence ao ex-líder do PAIGC, sem que, todavia, exista, tanto quanto se sabe, qualquer referência explícita a tal expressão nos seus discursos ou na sua obra escrita.

Tal como no livro de Lewis Carroll, as incursões pelo “non sense”, pelo absurdo, são permanentes e a Guiné-Bissau, que hesitava ainda em dar os primeiros passos, já lá vão 35 anos, prestava-se, magnificamente, a isso mesmo. Neste particular, refira-se a obra do embaixador António Pinto da França, contemporâneo de Maria do Céu Mascarenhas, “Em tempos de inocência” que menciona precisamente e numa linguagem meramente factual (ou seja, sem recurso ao sonho), num livro de memórias, esses aspectos absurdos da vida quotidiana bissau-guineense.

Por outro lado, a autora, ao longo do livro, revela muita da sua experiência de vida, da sua formação académica e do seu pensamento: uma vida predominantemente urbana, uma educação forjada nas escolas portuguesas dos anos 50 e 60, o Portugal do salazarismo-marcelismo, o catolicismo mitigado pelo racionalismo, as ilusões, as esperanças e os mitos da sua infância e da sua juventude. Tudo isto diz muito às gentes da minha geração e constitui um ensinamento relevante às gerações que nos sucederam e que desconhecem, quase por inteiro o que foi aquela época.

Uma das imagens eventualmente chocantes para os leitores menos avisados, mas que infelizmente se inscreve no vale de lágrimas que é – e tem sido - a política cultural portuguesa em África. Má em tempos idos e não muito melhor, diga-se de passagem, nos dias que correm. A autora salienta que em 1977-78, “a única biblioteca digna desse nome em Bissau era a do Centro Cultural Francês uma demonstração de como a França sabia aproveitar uma área de influência cultural que Portugal, em tantos anos de administração, tinha negligenciado como se de um pormenor sem importância se tratasse.” (p. 90) e acrescenta que era o embaixador português, muito empenhado e dinâmico, quem já estava nesse momento a diligenciar no sentido da fundação de um Centro Cultural Português”. Tratava-se de Pinto da França que envidava esforços insanos para tal conseguir, acabando por lograr os seus intentos. Era o “minimum minimorum”, para um PALOP como a Guiné-Bissau.

Um dos capítulos, a meu ver mais impactantes e com maior vigor da obra, é o VII “Uma festa de loucos com nome de guerra”, ou seja na estrutura de Lewis Carroll ”A Mad Tea-Party”. Trata-se de uma deslocação a Mansabá que Maria do Céu Mascarenhas, olhando para um antigo abrigo dos militares portugueses, compreende, de algum modo, toda a tragédia da guerra de África, que está ali, naquele “bunker” abandonado: o isolamento, o desconforto, o sacrifício, o próprio temor da morte, o horror da guerra. Ouçamo-la, na descrição onírica: “Era um buraco inóspito. Qualquer condenado à morte dispõe de uma cela mais confortável, pensou Rosa, contraída, com um nó na garganta, e aquele aperto no estômago” (p. 95). E agora, descendo à realidade .”Ficara como que petrificada a imaginar os jovens que teriam encontrado recolhimento num tal covil, o tempo sem fim que teriam permanecido acampados na planura desesperante que se estendia em frente” (ib.). E em seguida, descreve o que se passava na “metrópole”, em que as pessoas cumpriam a agenda do seu dia-a-dia, num Portugal que paulatinamente ia prosperando, mas que ignorava, a “guerra distante e sem fim”. Nestas curtas pinceladas bem reais, Maria do Céu Mascarenhas dá-nos conta do que foi a guerra, a nossa guerra, o que passámos, o que sentimos e a indiferença a que fomos votados. Mais adiante, depois de se referir aos direitos das mulheres (atentos os padrões da sociedade da época) remata: “ Sim, igualdades, muito bem, mas na hora da verdade eram os homens que tinham de abandonar tudo aquilo de que gostavam, família, carreira, para irem para a guerra.”(p. 99). De facto, para quem visitasse os lugares da guerra, anos depois dos acontecimentos, era uma “Mad tea party”. Tudo aquilo não se quadrava, nem se podia quadrar, nos parâmetros do real.

Um outro capítulo particularmente interessante é o IX “A Lenda do Tocador de Corá”, em que a autora estabelece algumas distinções em termos de estruturas mentais e culturais entre bissau-guineenses e portugueses e entre duas épocas, a colonial e a actual, em que Rosa, a protagonista, diz: “Demo-vos um Deus em quem acreditar oferecemo-vos uma língua de civilização.” Ao que a sua interlocutora responde: “O tempo colonial felizmente já passou, não vamos discutir. O teu Deus, o Deus dos muçulmanos e os nossos irãs não se dão mal entre nós, e a língua portuguesa, mesmo quando por cá a falamos de outra forma serve-nos perfeitamente” (p. 133)...”Minhas amigas, fiquemos com a cultura portuguesa que, como se diz, o saber não ocupa lugar, alem de que inevitavelmente faz parte da nossa História, mas conheçamos também as nossas lendas, a história dos nossos povos antes da chegada dos europeus...” (ib.). A análise comparativa é interessante, mas, no meu entender, quase epidérmica, demasiado curta e parca de pormenores. Mereceria, quiçá, um tratamento um pouco mais aprofundado, talvez sob a forma de diálogo e optando por uma forma simplificada, mas o texto tal como está carece de mais explicações - coloco-me, bem entendido, na pele do leitor interessado que pretende ir mais além.

Reveste-se de manifesto interesse, a passagem de Rosa, por uma escola internacional em Inglaterra, uns anos antes, em que o facto de ser portuguesa dá origem a algumas brincadeiras e dichotes de gosto duvidoso por parte de colegas estrangeiros. No fundo, é o eterno problema do nosso Portugal estar sempre na berlinda pelas mais variadas razões e quase nunca as melhores. Ao falarem-lhe em colónias, Rosa, candidamente, talvez sem compreender muito bem o alcance das graçolas, passa mentalmente em revista as ideias-força do Portugal da década de 60 que integravam o nosso subconsciente colectivo: “Ela, até então, só tinha ouvido chamar-lhes províncias ultramarinas, e possuía duas fotografias enviadas por um familiar Oficial do Exército, que com patriótica fé comandava tropas no norte de Angola, onde não sabia que algum tempo mais tarde haveria de perecer, nelas se viam soldados portugueses tratando ferimentos de crianças indígenas e acamaradando com elas, no âmbito de acções psico-sociais.” (pp. 148-149). Eu, próprio, fui várias vezes alvo de situações semelhantes, noutros contextos, compreendo, pois, muito bem onde a autora quer chegar.

Maria do Céu Mascarenhas fala-nos do conceito de Pátria, o que era, que significado tinha: “Achas que os rapazes que estão lá fora na guerra, em terras tão distantes da terra e da família deles, têm consciência nacional?” (p. 151) São interrogações importantes que todos os que têm sensibilidade política e sentido de portugalidade formulam. Os conceitos, aparentemente simples, tornam-se complexos e de difícil solução, atentos os parâmetros da época. O mundo apontava noutra direcção. As respostas começavam a pecar pela ambiguidade. Existiam outras soluções, outros caminhos, outras vias. Está, aqui creio todo o drama da geração de Maria do Céu Mascarenhas que é também a minha.

As deambulações pela história, em especial pela história colonial, mereceriam explicações mais pormenorizadas. Refiro-me à cobiça dos outros; ao Portugal, elo mais fraco do mundo ocidental; aos poucos quilómetros quadrados que nos sobraram na costa ocidental de África, ao porquê da mudança da capital de Bolama, uma cidade então moribunda e hoje morta e muitos, muitos outros temas, mas existem naturais limitações para a escrita e a extensão das explicações, o que é compreensível.

A aparente ausência de complexos em relação ao colonizador e até o amor a Portugal e aos portugueses está bem patente na visita à cidade de Gabú (antiga Nova Lamego) no Leste da Guiné-Bissau, em que os visitantes são, saudados de forma algo bizarra por um homem que se equilibrava num cabaço, tocava um apito e fazia a continência. “ Rosa, comovida, sentia-se num País das Maravilhas onde as coisas mais insólitas se tornavam possíveis, milagres de convivência que não saberia explicar, porque não os podia ela mesma totalmente compreender.” (p. 172).

É uma obra que deve figurar em qualquer biblioteca, que se lê com muito agrado e que, numa suave linguagem feminina, nos fala de nós, da nossa geração e do nosso relacionamento com o Outro, neste caso o bissau-guineense. Infelizmente, os rumos da História foram outros, embora, certamente, já perceptíveis quando Maria do Céu Mascarenhas por lá peregrinou.
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Nota do editor:

Vd. último poste da série de 4 de Março de 2013 > Guiné 63/74 - P11190: Notas de leitura (461): Texto policopiado e publicado pelo Comissariado Nacional da Mocidade Portuguesa - Ultramar (2) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11114: Tabanca Grande (387): Carlos Afeitos, professor, ex-cooperante na Guiné-Bissau, agora a viver em Inglaterra, novo grã-tabanqueiro nº 606


1. Mensagem de ontem, do Carlos Afeitos, professor de matemática, cooperante na Guiné-Bissau, durante 4 anos (2008-2012), e nosso novo grã-tabanqueiro, com o nº 606 [, foto à esquerda]
.
.
Luis:

Bom dia mais uma vez,

Aceito o seu convite para fazer parte da Tabanca Grande. Como lhe disse anteriormente o meu tempo não é muito, mas posso contribuir com o que tenho e com algumas das minhas passagens. Tenho boas e más recordações, mas como costumo dizer VIVI. 

Em anexo encontra a minha foto digitalizada. Se precisar de mais alguma coisa é só avisar.Obrigado,  Carlso Afeitos.


2. Mensagem anterior de L.G,, agradecendo o envio de mais fotos de antigos aquartelamentos das NT, neste caso o K3, depois de já termos publicado aqui uma primeira coleção sobre Gadamael Porto (, fotos tiradasa em 2011):

Carlos... Estas fotos são testemunhos, preciosos, para todos nós, antigos combatentes. Sei que agora estás com pouco tempo para te preocupares connosco, mas gostaria de convidar-te para integrar a nossa Tabanca Grande. Por certo que te identificas com os nossos objetivos de partilhar memórias (e afetos), bem como com as nossas "regras editoriais"... 

Se aceitares o nosso convite, passarás a ser o grã-tabanqueiro nº 606. Gostaríamos de poder ter uma foto tua (, tipo passe, digitalizada). Por certo que a lusofonia e a Guiné são um aponte de união entre nós. Desejo-te os melhores sucessos académicos e pessoais. Boa estadia em Inglaterra

Um Alfa Bravo (ABraço). Luís Graça

3. Comentário final de L.G.:

Carlos:  Nós aqui, somos, mais que uma comunidade virtual, somos uma "grande família", a dos amigos e camaradas da Guiné. A nossa tabanqueira mais velha tem... 98 anos. E é a única que não tratamos por tu. É a nossa decana. Foi cofundadora (e professora) do Liceu Honório Barreto, em Bissau, no final dos anos 40... Amiga de mulher do Amílcar Cabral e próprio Cabral, mãe do nosso amigo Pepito, da AD (que deves ter conhecido, tem duas filhas, em Bissau)... Tu és de matemática, é isso ? Não tenho um CV abreviado teu, mas vi qualquer coisa na Net... Vou te apresentar à Tabanca Grande. Quatro anos de Guiné como cooperante é obra, nos tempos que concorrem e nas difíceis circunstâncias daquele país irmão, de gente sofrida mas corajosa. Gostei do que escreveste: "Tive coisas boas e más, mas confesso que vivi!"... Sê bem vindo, amigo, à Tabanca Grande.  Um abração, Luis.

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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11090: Tabanca Grande (386): João Ruivo Fernandes, ex-fur mil, de rendição individual, CART 3494 (Xime, dez 1972 / jan 1973), onde foi praxado... É agora o grã-tabanqueiro nº 605, apadrinhado pelo Sousa de Castro, grã-tabanqueiro nº 2

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10978: Diário de Iemberém (Anabela Pires, voluntária, projeto do Ecoturismo, Cantanhez, jan-mar 2012) (1): A chegada


1. A nossa amiga Anabela Pires [, foto à esquerda,] (*)  chegou no dia 17, do corrente, a Auroville, no sul da Índia, onde vai viver nos próximos seis meses, até ao início do nosso verão.  Mandou-nos duas mensagens, ontem, que reproduzimos:

(i) Comentário do poste P10930

 (...) Muito obrigada aos grã-tabanqueiros pelas mensagens enviadas. Já estou em Auroville desde 5ª feira (dia 17). [. Vd a fotogaleria do sítio de Auroville]. Isto aqui também é "mato" mas um "mato" com mais recursos e mais organizado. Estou e estarei em fase de adaptação com algumas limitações - o meu mau inglês, o facto de não me poder deslocar sozinha depois do pôr do sol por ser perigoso (esta é a pior de todas e difícil de vir a ser ultrapassada) e a tentativa que estou a fazer de me deslocar de bicicleta - falta de treino para fazer vários quilómetros pois Auroville é bem maior do que eu imaginava. Um abraço grande (...)

(ii) Mensagem pessoal:

(...) Luís, com toda a justiça tens a minha autorização (*) Não me esqueci da minha promessa e tenho um post-it neste PC a dizer "ver Diário da Guiné" mas como estou sempre a adiar ..... OK! Confio que farás a devida triagem mas lamento dar-te a ti esse trabalho. Passou um ano depois que cheguei à Guiné, é justo que não esperes mais. Agora comecei a escrever a minha experiência por aqui e .... bem, como já não quero andar stressada , o mais natural era ir adiando esse trabalho. Um grande abraço para ti e para a Alice. Até breve, Anabela

(*) Resposta da Anabela ao meu mail do dia anterior, que dizia o seguinte:

(...) Minha malandra: primeiro, parabéns, por teres chegado "sã e salva"... Espero que seja mais uma experiência enriquecedora para ti. Segundo, foste-te embora sem me dares "autorização" para publicar no blogue o teu diário de Iemberém, expurgado naturalmente de referências mais intimistas ou pessoais...O que importa são as tuas impressões dos lugares e das gentes... Autorizas-me a que faça uma "edição" do teu diário, só com a parte da tua "leitura sociológica"?  Seria interessante para todo nós e para futuros viajantes... Prometo que faço uma boa "triagem"...Diz-me da tua justiça... Beijinhos meus e da Alice.   (...)

2. Vamos começar hoje a publicar excertos do Diário de Iemberém, da Anabela Pires, chegada a Iemberém, no Cantanhez,  há justamente um ano atrás, a 18 de janeiro de 2012, para trabalhar como voluntária no projeto de ecoturismo da AD - Acção para o Desenvolvimento.

Vamos utilizar dois tipos de parênteses para indicar eventuais alterações ao texto original: (i) parênteses curvos, seguidos de três pontos (...) para assinalar eventuais cortes feitos pelo editor (por ex., referências muito pessoais a terceiros) ; e os (ii)  parênteses retos  [ ] para indicar texto ocasionalmente inserido pelo editor  (subtítulos, links, informações adicionais, etc.). O ficheiro, em formato doc, que temos à nossa disposição,  tem 30 páginas, e vai de 18 de janeiro a 25 de março de 2012. 

3. Diário de Iemberém, por Anabela Pires

18 de Janeiro de 2012  [Chegada a Bissau e Iemberém]

Cheguei ontem a Iemberém (sector de Bedanda ou Cubacuré, região de Tombali, Guiné-Bissau).

[ Foto à esquerda: um avião da TAP, no Aeroporto Internacional de Bissau, 29 de fevereiro de 2008, foto de L.G. ]




São já 7 horas e 8 minutos, os galos já cantam, o dia começa a clarear mas ainda não vejo nada dentro de casa, sem luz. Acordei há já uma hora e é com a lanterna a energia solar, que a Catarina me trouxe da Índia, que ando dum lado para o outro. De vez em quando jogo instintivamente a mão aos interruptores da luz! 

Finalmente embarquei em Lisboa no dia 13, sexta-feira, às 21.30 e cheguei a Bissau às 2 da manhã do dia 14. O voo saiu com atraso de Lisboa pois o avião vinha completamente cheio. Para minha admiração metade do avião era ocupado por não guineenses! Desde um grupo de 30 brasileiros(as) que foram para Gabu fazer 20 dias de voluntariado no hospital, a freiras e padres italianos, havia um pouco de gente de diversas partes do mundo.

À minha espera estava o Gibi, colaborador da AD (Acção para o Desenvolvimento, ONG guineense para onde vim como voluntária) e o Domingos, motorista da AD.

O aeroporto de Bissau tem um aspecto apresentável. Recordo-me de a Dulce me ter contado que uma amiga dela, que aqui veio há uns anos, lhe ter referido que os funcionários escreviam em cima de caixas vazias. Portanto, algumas coisas vão mudando na Guiné-Bissau.

Fui instalada no Centro de Formação de Hotelaria que a AD tem no Bairro de Quelélé, nos arredores de Bissau.

Apesar de já ter visto imagens do Bairro de Quelélé na televisão e no site da AD, não imaginava o que encontrei. O Bairro fica entre o aeroporto (a 8 km da cidade) e a cidade e é um bairro bem popular em que a maioria das casas são as tradicionais palhotas. As ruas são mal definidas e todas em terra batida. A minha chegada a este bairro às 3 da manhã contribuiu para alguma perplexidade! Não o imaginava como é de facto e muito mais me espantou o facto dos mais importantes dirigentes da AD nele viverem. A AD tem todas as suas instalações no Bairro Quelélé e quem a dirige vive também no bairro. Há, portanto, uma grande fusão entre a AD e o Bairro Quelélé.

(Continua)
_________________

Nota do editor:

(*) Vd. alguns postes anteriores da (ou referentes à)  Anabela Pires:

12 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10930: Os nossos seres, saberes e lazeres (50): A caminho de Auroville, a "cidade do amanhecer", no sul da Índia... Mas se pudesse escolher, era já para Iemberém que eu queria voar (Anabela Pires)

(...) Vou voar de hoje a oito dias na companhia aérea dos Emirados Árabes - Lisboa- Dubai - Chennai. Dia 16 ficarei a dormir em Chennai e dia 17 irei então para Auroville num táxi da sua companhia de táxis. Chegarei no mesmo dia em que o ano passado cheguei a Iemberém. E se pudesse escolher era para Iemberém que voaria também este ano. 

 Penso passar a 1ª quinzena a conhecer Auroville e a integrar-me. Depois ou opto por uma participação ativa, ajudando onde for preciso - penso que vou privilegiar as quintas para continuar a aprender a cultivar - ou opto por um projeto de voluntariado. Tudo vai depender dos projetos de voluntariado que houver. Tenho como limitação a língua mas pelo menos espero regressar a falar inglês mais fluentemente. Penso regressar/chegar a Portugal dia 3 de Julho. (...)

5 de junho de 2012 > Guiné 63/74 - P9998: Em busca de... (191): Pessoal da 26ª CCmds, camaradas do João Gertrudes Luz, natural de Faro, sold cond comando (Brá e Teixeira Pinto, 1970/71), tragicamente desaparecido em 2007 (Anabela Pires, de regresso à Pátria)

(...) Recorde-se que a Anabela Pires esteve em Iemberém, na Região de Tambali, desde janeiro de 2012, como voluntária da AD, a trabalhar no projeto do ecoturismo do Cantanhez. Na sequência do golpe de estado de 12 de abril, acabou por ir para São Domingos e depois Dacar, no Senegal, por razões de segurança... Esteve lá mais de um mês, na casa de um amiga casada com um diplomata... Regressou há uma semana e picos a Portugal, na esperança de voltar à Guiné, em 2013, depois das "prometidas" (pelos golpistas!) novas eleições presidenciais...

Entretanto, ela tinha-me falado deste seu amigo, o João Gertrudes Luz, nosso camarada, tragicamente desaparecido em 2007, e da "dívida" que ela ainda tinha para com ele... Simbolicamente, com a publicação deste poste, fica saldada essa "dívida" em aberto, embora infelizmente tenhamos poucas notícias, no nosso blogue, da 26ª CCmds... Mas contamos, desde já, com os resultados das boas diligências dos nossos leitores, tabanqueiros e não tabanqueiros... Por certo que teremos resposta ao pedido da Anabela. (...)


21 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9931: Ser solidário (127): Anabela Pires, voluntária da AD, de regresso a casa, depois das suas (des)venturas em Iemberém e em Dakar

(...) Sinto que preciso de fazer o "luto" da minha experiência interrompida na Guiné e por isso não tenho, para já, o meu coração muito aberto a um trabalho como voluntária noutra ONG. Como há muitos anos que desejo aprender a cultivar estou à procura de uma quinta, de preferência de agricultura biológica, que me queira receber em troca de trabalho. Estou a procurar no WWOOF. Pode ser em Portugal ou noutro país desde que a viagem para o mesmo não seja muito cara. Tenho especial interesse em aprender a cultivar legumes e eventualmente árvores de frutos. Gostaria de começar o mais tardar em Outubro uma vez que, pelo menos em Portugal, é o início do ano agrícola. O ideal seria encontrar uma família portuguesa, daquelas que deixou a vida da cidade para ir para o campo. Se a família tiver uma componente de turismo rural tanto melhor pois aí também posso dar "uma mão". Gostaria de ir viver para o campo e ter uma actividade física. (...)


16 de abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9753: O Nosso Livro de Visitas (132): Não se preocupem se não der notícias - só estamos sem eletricidade porque o gasóleo acabou! (Anabela Pires, Iemberém, Cantanhez)

(,,,) Acabou-se o gasóleo que sustenta as nossas 4 horas de luz por dia e a água no depósito! Portanto, estamos novamente sem luz e sem água nas torneiras (aqui em casa tenho 2 no WC o que é muito bom). Isto significa que é mais difícil recarregar a bateria do computador. A minha amiga francesa que mora a 3 km e tem painel solar leva-me o PC e põe-o a carregar mas tudo isto demora mais tempo e posso estar por isso mais "ausente".

Como alternativa posso comprar uns litros de gasolina e pedir à Satu que ligue o gerador do restaurante para carregar os aparelhos. Mas o dinheiro também se acabou - está em Bissau à espera de transporte para cá chegar. Não sei quando vem o carro, era para ter vindo na 6ª feira, mas com os problemas em Bissau ..... aguardamos. Bem, esta do dinheiro é um bocadinho brincadeira pois a Satu certamente me emprestará dinheiro se eu precisar! (,,,)


12 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9346: Tabanca Grande (317): Anabela Pires, voluntária no projeto Ecoturismo do Cantanhez, nossa tabanqueira nº 536, aqui saudada pelo Hélder Sousa

(...) Esta notícia que o JERO [, José Eduardo Oliveira, amigo da irmã da Anabela, que vive em Alcobaça, ] nos enviou, com todos os ingredientes que a compõem, bem assim como as achegas que vieram dos comentários, tem várias coisas que são notáveis.

A primeira é, obviamente, a decisão de Anabela Pires em ocupar a sua reforma em algo que lhe é útil (também) mas em que dirige os seus conhecimentos, saberes e força de vontade em algo que enriquece quem toma esse tipo de atitudes e que é o de 'ajudar os outros'. Provavelmente o seu nascimento em África pode ter contribuído para o 'apelo' mas acho que o 'contágio' com a Guiné explica-se através do que foi referido sobre os contactos e os conhecimentos. (...)


7 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9328: O Nosso Livro de Visitas (120): Anabela Pires, em vias de ir para Iemberém, no Cantanhez, trabalhar como voluntário na AD - Acção para o Desenvolvimento, procura cartas da região de Tombali e elogia o nosso blogue

(...) Olá, Luís! Desculpe antes demais o tratamento informal mas visitando frequentemente o blogue Luís Graça e camaradas da Guiné, conhecendo a Alice e estando a pensar partir para a Guiné-Bissau em Janeiro [de 2012], onde vou trabalhar com a AD [- Acção para o Desenvolvimento], quase me sinto como membro da Tabanca Grande.

Realmente o Mundo é Pequeno mas a vossa Tabanca... é Grande! Certamente a Alice já lhe contou como fui ter ao blogue e como descobri que o seu fundador é casado com a Alice Carneiro! Bom, tudo começou por eu andar à procura de cartas/mapas da Guiné-Bissau. Situar-me geograficamente é sempre um ponto de partida.  (...)


7 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9325: Ser solidário (119): Anabela Pires: A caminho de Iemberém como voluntária da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento (JERO)

(...) Conheci a Anabela Pires, em Coimbra, no dia do falecimento de sua Mãe.Já lá vão um bom par de meses. A conversa foi de circunstância e a minha presença na cerimónia religiosa, no dia do funeral, deveu-se à minha relação fraterna com a sua irmã Margarida Pires, professora em Alcobaça e camarada de boas causas (Defesa de Património Cultural e outras).

No último Verão soube pela Margarida que a sua irmã Anabela queria fazer serviço voluntário na Guiné. Falei-lhe do nosso Pepito (nickname do Engenheiro Agrícola Carlos Schwarz da Silva), que vive e trabalha em Bissau desde 1975, sendo um dos fundadores da AD - Acção para o Desenvolvimento.  O mundo é pequeno e a Anabela Pires tinha sido colega e amiga da Alice Carneiro, mulher do nosso Editor Luís Graça. (...)





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segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10621: Notas de leitura (426): O meu serviço cívico na Guiné, em 1991 (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Agosto de 2012:

Queridos amigos,
Aqui se põe termo à narrativa do meu serviço cívico na Guiné, nos idos de 1991.
Ao acabar este relato sinto que o meu entusiasmo não foi em vão, mesmo com resultados totalmente inúteis. A ascensão do multipartidarismo parecia uma embriaguez social, refazia-se o imaginário dos dias melhores à volta de slogans; muitos daqueles técnicos e dirigentes com quem eu privava, anunciavam a saída do PAIGC, na esperança de que novas propostas trouxessem paz e dignidade à Guiné. A visita a Bolama encheu-me de uma tristeza sem limites, com a agravante de estar ali bem registada a presença portuguesa, mas era como esta acompanhasse a derrocada da velha capital.

Agora rasgo os últimos papéis desse serviço cívico, o filtro da memória foi passado a escrito, aqui no blogue.

Um abraço do
Mário


O meu serviço cívico na Guiné, em 1991 (3) 

Beja Santos 

As últimas três semanas deste serviço cívico irão estender-se até 21 de Dezembro, o projeto da criação da unidade de defesa do consumidor foi debatido a nível de vários ministérios, todos concordaram com o esquema proposto. Havia que tomar decisões quanto à coordenadora, a minha escolha recaiu em definitivo na Dr.ª Ana Pereira. Fui apresentá-la aos diferentes serviços, na maioria dos casos, fosse de manhã fosse de tarde, não era possível encontrar o técnico ou o dirigente em apreço porque não estava e não se sabia a hora que vinha, porque tinha seguido em viagem, e não se sabia a dimensão da viagem, ausentara-se para ir a um choro, ou fora às finanças, esteja descansado que ele entra em contacto consigo imediatamente… e o imediatamente eternizava-se, seja como for, deixavam-se os documentos para a análise do técnico ou dirigente e pedia-se a sua tramitação para o decisor político. No papel e nas intenções, em meados de Dezembro, quando chegou o ministro do Ambiente de Portugal, já existia a defesa do consumidor da Guiné. O ministro chegou e teve a deferência de me ouvir ou particular. Depois partiu para Bubaque mas com encontro marcado para no dia do regresso, ao fim da tarde, ajustar com o ministro do Ambiente e dos Recursos Naturais e da Indústria a oferta de cooperação: o governo da Guiné-Bissau daria um sinal de querer ver institucionalizada uma política defesa do consumidor, bastava um despacho governamental; em segundo lugar, havia que mostrar interesse pela legislação elementar, o controlo e inspeção de alimentos era um bom pretexto, era mesmo uma exigência da FAO que subordinava tal medida à continuação de apoios; subscrever-se-ia até final de Janeiro um protocolo de cooperação com financiamento garantido para o funcionamento da Comissão Interministerial de Defesa do Consumidor, duas bolsas de estudo para investigadores do INEP terem condições de estudarem a fundo duas problemáticas com interesse relevante para o consumidor guineense; e abria-se os cordões à bolsa para apoiar uma campanha na comunicação social, contribuir para os programas televisivos e, não menos importante, a realização de dois seminários em Bissau, para formadores. Quando a reunião acabou entre os dois ministros, a que também assisti, havia um estado de anuência absoluta ao que a parte portuguesa sugeria, o senhor ministro de Portugal que não tivesse mais cuidados. Eu desconfiava da fartura, havia para ali descontração a mais. Numa reunião com a representante da FAO vi esta esbaforida a gritar com o diretor com o Laboratório Nacional de Saúde Pública, há dois anos que estava prometido um projeto-lei para o controlo e inspeção dos géneros alimentícios, a representante parecia apoplética, ameaçava mesmo em ir-se embora e pedir à FAO para negar doravante qualquer tipo de apoio. Outro sinal lastimável foi da suspensão do programa televisivo, o senhor secretário de Estado dos Recursos Naturais prometera à tv local um qualquer patrocínio para “1 Milhão de Consumidores”, os programas eram exibidos e o patrocínio não chegava, a tv local não esteve para meias medidas, suspendeu o programa até haver apoio financeiro, este nunca mais apareceu, morria à nascença este projeto que eu tanto acalentara.

O tempo estava mais ameno, chegara a época seca com um calor de 26 a 27 graus, com uma aragem benfazeja ao fim da tarde. Os meus serões eram passados invariavelmente à secretária, no espaço que a CICER me reservara, a papelada lá seguia meticulosamente para o trabalho e para os jornais onde eu colaborava. Já tinha na cabeça os voos, para orientar o meu correio: os voos Bissau – Lisboa partiam na manhã de terça-feira e na madrugada de sábado, portanto, e a título exemplificativo eu metia a carta no correio, durante a manhã de sábado com a quase garantia de que as cartas podiam chegar ao destinatário a partir de quarta-feira à tarde. Eu dependia, em termos logísticos de uma unidade denominada CITA – Centro de Investigação e Tecnologia Aplicada, um serviço realista que respondia pelos pesos e medidas, pela normalização e outras áreas de grande importância, passeava-me por aquelas salas, tudo me parecia surrealista, não havia instrumentos, não havia laboratórios, ou o que havia eram equipamentos do tempo da Maria Cachucha, os próprios técnicos se queixavam amargamente daquele logro, o pior de tudo eram os salários permanentemente em atraso.

É também um tempo de recordações indeléveis. Benício Costa tinha conseguido que um dirigente me desse guarida em Bolama, na ausência de qualquer unidade hoteleira, nem uma pensão existia. Parti sexta-feira ao fim da manhã, a aproximação à ilha de Bolama permite ver toda a sua beleza, pus pé em terra e dei com aquele pedregulho monumental que Benito Mussolini ofereceu à cidade de Bolama em memória de uns pilotos que ali morreram num acidente aéreo; era já uma cidade em escombros, parei em frente do Hotel do Turismo, já só restava parte da fachada, vai-se deambulando por um cenário fantasmagórico, fica a percepção que terá sido uma capital com certo espírito cosmopolita, mas a indiferença levara à ruína de tudo, mesmo assim era o Palácio do Governador o edifício mais apresentável. Só tinha direito a guarida, andei errante à procura de um local onde pudesse comer, tive sorte com uma organização que andava a fazer reparações navais, propuseram-me que eu fizesse ali as refeições, incluindo o pequeno-almoço. Aliviado por ter resolvido esta necessidade fundamental, pedi ajuda para percorrer Bolama. Encontrei um voluntário que de bom grado tudo me mostrou: as antigas praias onde os equipamentos jaziam desfeitos; visitei a tipografia de Bolama que tanto me comoveu, tanto ou mais que calcorrear aquelas ruas com nomes sonantes da I República. Regressei domingo à tarde, fomo-nos afastando lentamente porque toda a baia está assoreada, a embarcação anda por ali a vaguear para evitar ficar metida na areia, é uma vista esplêndida, Bolama à distância tem imponência em todas aquelas manchas esbranquiçadas, últimos vestígios da velha capital que nunca mais recuperou do abandono, quando em 1941 Bissau se tornou na metrópole.

Fui visitado na CICER por um jovem que tinha uma juba como cabeleira e me chamou paizinho, era tão hermético no seu crioulo que precisei de ir chamar um intérprete. Fiquei siderado, era Abudu Cassamá, o menino que conheci em Finete, em 1968, tinha as costas retalhadas devido à explosão de uma granada de fósforo. Tratei-o sempre com muito afeto, no meu tempo nunca se conseguiu fazer reparação aos danos que sofria no seu físico, tanto ele como a mãe. O intérprete disse-me que o Abudu vinha ali buscar um saco de arroz, um relógio e um rádio, era o mínimo que esperava do paizinho. É verdade que em Bissau, sempre que encontrava alguém do Cuor eu perguntava por Abudu, ele vinha cobrar tanta pergunta que eu andava a fazer. Encontrei igualmente no bairro de Missirá Mufali Iafai, o nosso canoeiro no rio Geba, foi uma grande alegria. Cherno Suane também aparecia regularmente era o meu companheiro de canja de ostra numa locanda onde me levou, o aparato higiénico era intimidador mas o que caiu no estômago era mesmo manjar de deuses.

Nos últimos dias, conversei longamente com a senhora coordenadora em expectativa: falámos das obras naquele 1º andar do Quartel-General, nas campanhas de sensibilização, nas reuniões com os juristas para o mais rapidamente possível os projetos de diploma irem a conselho de ministros. Embarquei na madruga de 21 com negros presságios. Nenhum despacho fora assinado pelo presidente do Conselho de Estado, tudo se movia em areias movediças. Cheguei, elaborei relatório, enviei cópia ao ministro dos Recursos Naturais e Indústria. E caiu um silêncio espesso, parece que não tinha havido qualquer missão. Em Fevereiro, fui alertado que ou se cabimentava as verbas para o projeto de cooperação até ao final do mês ou o dinheiro seria transferido para outra rubrica. Alertei Bissau, os membros do Governo e a senhora coordenadora em expectativa. E caiu o pano, entreguei-me às minhas obrigações profissionais, a Guiné ficou no fundo do túnel. Aí para Setembro ou Outubro de 1992, a Dr.ª Ana Pereira informou-me num tom como se eu soubesse de tudo, que já havia despacho governamental e que pretendia receber instruções. O desleixo de alguém em Bissau não mereceu qualquer complementação em Lisboa. O meu serviço cívico terminara ingloriamente.

O Pidjiquiti, local mágico de todo o antigo combatente. Era por aquele cais de cimento que, regra-geral, chegávamos a terra firme. As palmeiras da Marginal estavam cuidadas e era agradável estar sentado a ver o porto e o Ilhéu do Rei ao fundo. Está tudo escalavrado, o cimento esfarela-se com a falta de manutenção. Mas é o nosso Pidjiquiiti, ninguém esqueceu a alegria na hora do embarque.

A Associação Comercial e Industrial de Bissau era um edifício com algum arrojo arquitectónico, era uma estrutura moderna que contrastava da imponência do Palácio do Governador e da estrutura ao nível do rés-do-chão do museu da Guiné, com o seu lanternim peculiar. Em 1991, era a sede do PAIGC. Continua a ser, mas não esconde os maus tratos da falta de manutenção. 
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Notas de CV:

Vd. postes anteriores da série de:

29 de Outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10589: Notas de leitura (423): O meu serviço cívico na Guiné, em 1991 (1) (Mário Beja Santos)
e
2 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10607: Notas de leitura (424): O meu serviço cívico na Guiné, em 1991 (2) (Mário Beja Santos)

2 de Novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10609: Notas de leitura (425): A Guiné na História de Portugal, de Rui Ramos (António Graça de Abreu)