terça-feira, 28 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3365: O meu baptismo de fogo (18): Cufar Nalu, 15 Maio de 1965 (Mário Fitas, CCaç 763, Cufar)

O meu baptismo de fogo
Mário Fitas
ex-Fur Mil
CCaç 763, Cufar, 1965/66

Um tema aliciante, que em termos psicológicos daria um óptimo estudo. Não só as reacções individuais, mas também aquelas que por vezes se tornavam em cadeia e que geravam situações dignas de um estudo aprofundado por técnicos na matéria.

Baseado na História da CCaç 763 e no meu livro Putos, Gândulos e Guerra, aí envio o meu testemunho, com descrições preparatórias, que julguei convenientes.

A 2 de Março de 1965, quando o 2º Gr Comb da CCaç 763 aporta ao cais de Cufar, no Rio Manterunga, afluente do Cumbijã, as Forças do PAIGC controlavam totalmente o sector, dispondo de um forte acampamento na Mata de Cufar Nalu, a mil e quinhentos metros do aquartelamento de Cufar, onde íamos render a CCav 703, que se encontrava acantonada em abrigos cavados no chão, - cuja temperatura mínima era atingida de madrugada nunca baixando dos trinta graus - ligados por trincheiras, em volta da antiga fábrica de descasque de arroz do madeirense Sr. Camacho.

Abrigos em Cufar. Da esquerda para a direita: Fur Mil Trms Tomás Afonso, Fur Mil Bernardino Pinto, Fur Mil Op Esp Mário Fitas
Fotos (e legendas): © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.


Só em Maio, que será para mim o verdadeiro Baptismo de Fogo, e que à frente descreverei, descobrimos como as Forças do PAIGC, descendo a mata, chegavam à ponta do Manterunga e aí faziam a sua carreira de tiro sobre as Nossas Forças com metralhadoras pesadas e armas ligeiras, precisamente às horas das refeições e quando o corneteiro tocava ao içar da Bandeira. Não dava resultado responder com armas ligeiras. Eles só se calavam, quando o Fernando Santos Oliveira (1) punha a sua malta a bater a zona com os seus morteiros 81.

Mário Fitas na psico e controlo das populações das tabancas a Sul.


O PAIGC controlava as Tabancas a sul de Cufar. A acção subversiva na zona já tinha atingido a fase de criação de Bases e Forças Regulares. Prolongamento do corredor de Guileje, eram comandantes e responsáveis pela Zona 11 João Bernardo Vieira Nino e Joãozinho Guade, encontrando-se este comando na Base Central, entre os rios Cacine e Cumbijã no Cafal Cantanhez.

A 18 de Março, com a chegada do Comando a Cufar a CCaç 763 assume definitivamente a responsabilidade do sector. Recebendo como reforço 2 A/M Daimler, 1 Pelotão de Sapadores, a Secção de morteiros 81 do Fernando Santos Oliveira e 10 guias nativos da Companhia Milícia nº 13, do João Bacar Jaló, Alferes de 2ª. Linha, impôs-se a necessidade do alargamento do aquartelamento, abrangendo toda a antiga quinta incluindo a área residencial.

A par desta actividade, há uma preocupação essencial, de combate à guerrilha: reconquistar as populações a sul, através de uma acção psicossocial avançada.
A preparação operacional continua. Verifica-se um estudo mútuo das forças no terreno, alguns contactos, mas sem significado, como disse, essencialmente de estudo.

A 2 de Abril, a CCaç 763, procura o contacto directo, entrando na Mata de Cufar Nalu e instalando–se emboscada até às 14HOO, sem contacto.


Entrada da mata de Cufar Nalu.

Sabíamos as técnicas e as formas como as forças do PAIGC funcionavam e revelavam na zona. Em Fevereiro, os Comandos tinham andado em Cufar Nalu, e o PAIGC não se tinha revelado. Era necessário conhecer a forma como eles se revelariam.

Continuam os reconhecimentos, batidas, patrulhamentos e golpes de mão nas Tabancas a sul e rios Manterunga e Cumbijã. Mas eles estão lá, nós sabemos que o acampamento de Cufar Nalu é de grande importância para o PAIGC manter a zona de Cabolol e o seguimento do Corredor de Guiledge sem ser molestado.

Começámos a aprisionar os controleiros e controleiras das Tabancas de Iusse, Impungueda, Mato Farroba e Cantone. Agora sim, temos condições para avançar para Cufar Nalu. E agora sim, também será o meu Baptismo de Fogo a sério.

Já tinha feito muito fogo em Lamego, alguns tiritos aqui à volta, mas agora vamos lá e é a sério. Fica registada como a Operação Razia.

A 15 de Maio de 1965 ao romper da madrugada, o 3º Gr Comb em primeiro escalão, com o 2º em segundo escalão, inicia-se uma batida tendo como eixo o caminho que dava acesso da orla à antiga Tabanca de Cufar Nalu.

Ouvem-se vozes na mata. A CCaç pára, em silêncio absoluto. Momentaneamente começa um tiroteio ensurdecedor. Um grupo de reconhecimento do PAIGC foi detectado!

A minha primeira reacção foi deitar e orientar a secção, conforme os acontecimentos. Tudo muito bonito! Só que o meu corpo deitado dava saltos de meio metro de altura.
Não conseguia deitar-me, tinha de estar de pé e tentar ver tudo. Perigoso! Mas era a reacção incontrolável do corpo.

Sofro aqui a maior decepção como comandante de uma secção de homens, que a seguir narrarei.

Continuando a progressão, abatemos um elemento do PAIGC, sendo capturada uma PM 9mm M-25 com carregador e munições.

A partir deste momento, o contacto foi intenso e permanente até às proximidades do acampamento que se deu pelo meio da tarde. Derivado da fortíssima resistência, foi pedido apoio da Força Aérea e da Artilharia.

Agora, sim, com os rebentamentos dos obuses e roquetes parece estarmos envolvidos por enorme tornado com o estrondo dos rebentamentos por cima dos altos poilões. Apercebemo-nos que o efeito prático será mais psíquico do que físico.

Estamos a cem metros do acampamento, e a sua situação está bem definida. Como acontece em África, começa a escurecer, e a noite cairá rapidamente. Ordens para ocupar posições, e evitar o assalto de noite. Mas já nos apercebemos bem da fortaleza que temos pela frente. Mando o Maçarico preparar um local para os dois passarmos a noite, junto a um poilão que teria aproximadamente quatro metros de diâmetro e vou posicionar o restante pessoal, ao regressar o Maçarico olha para mim apavorado e diz-me:
- Meu furriel esta árvore está bichosa!

Nem um obus rebentaria aquela fortaleza e, durante o resto da comissão, o Maçarico foi gozado com a árvore bichosa.

Como irá ser o assalto? De madrugada, com a primeira claridade é dada a ordem de assalto.
Diabólico!

Não sei como aconteceu, uma companhia inteira a gritar e a avançar, fazendo rajadas e lançando granadas defensivas, o pessoal das bazucas esgaçava os altos poilões. Entramos dentro do acampamento. Desilusão!

Durante a noite o pessoal do PAIGC tinha-se escapulido. O barulho que durante a noite ouvíramos não era a reorganização, nem a chegada de reforços, era o abandono do acampamento, levando o que podiam. Destruído e recuperado o material abandonado, esperámos pela chegada de um grupo de combate da 4ª Companhia (4ªCompanhia de Caçadores Nativos de Bedanda) que ficou emboscado no acampamento até ao dia seguinte para não haver reocupação.

Descemos pelo lado onde tinha sido efectuada a fuga do pessoal do PAIGC e onde se verificou a força, a vontade e a forma como seria bastante difícil chegar àquele acampamento. O carreiro era um labirinto em zigzag onde se poderia ver a aproximação de qualquer pessoa sem sermos vistos. Notavam-se os rodados de mais de uma metralhadora pesada. Roupa e material de enfermagem ensanguentada abandonada, mas nem um único corpo. Nisso eles eram extraordinários, não deixavam ninguém para trás.

O carreiro no fim da mata de Cufar Nalu divergia para a orla desta mata junto ao rio Manterunga de onde era feita a carreira de tiro e para a mata de Cmaiupa/Afiá.

Não recordo as vezes que voltei a passar por aquele acampamento, até Novembro de 1966, mas nunca mais vimos indícios do PAIGC, parece ter ficado assombrado aquele acampamento.

Estava o Baptismo de Fogo a sério efectuado.

Tomaram parte nesta operação de apoio à CCaç 763 a 728 e a 764.



2º. Grupo de combate da CCaç 763. O Mário Fitas é o 1º da esquerda.

a) Desilusão do comportamento de alguns homens da minha secção. Como era de Operações Especiais, tinham ido parar à secção os problemáticos e valentões dentro do arame farpado. Só que cá fora no duro, tudo mudou:

(i) O Velhinho, refractário com trinta e poucos anos já, gordo suando gordura por todos os poros, nem para a frente nem para trás, foi parar à cozinha por troca com o Orlando;

(ii) O homem da bazuca ficou, mas tinha de ser seguro até acalmar, pois sempre que havia tiroteio, atirava com o cano para o lado e fugia para a frente ou para trás, um perigo. Depois de calmo metia uma granada de bazuca no raminho que lhe indicasse;

(iii) O Matacanha, vindo do Forte da Graça em Elvas, por utilização de arma branca que ficava estático como o Velhinho, foi para padeiro e veio o Amadu Baldé do recrutamento da província;

(iv) O Vendedor de jornais, ali do Chile, o terror dos sete mares dentro do Aquartelamento, atirou com a G3 para o lado e tentou esconder-se debaixo dos camaradas. Começou a andar sempre bêbedo e agora a ser espancado por todos. Foi evacuado para o Júlio de Matos. Foi substituído pelo Mamadu do recrutamento da Província;

(v) O Maçarico ficou, mas para ser utilizado como carregador, derivado do forte físico.

(vi) Os restantes eram bons, e ajudaram-me muito. Vieram todos, o Ferreira que nas emboscadas fazia uma fita da MG-42 de pé em tiro instintivo, veio mais cedo com uma hepatite, fez falta.

Mário Fitas

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Notas de vb:

1. Fernando Santos Oliveira, ex-2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf do Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66.

2. artigos da série em

24 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3352: O meu baptismo de fogo (17): Morés, 8 Agosto de 1972 (Amílcar Mendes, 38ª CCmds)

Guiné 63/74 - P3364: Blogoterapia (66): Amargos de boca (J. Mexia Alves)

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp da CART 3492/BART 3873 (Xitole / Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52 (Bambadinca, Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) ; e CCAÇ 15 (Mansoa), com data de 25 de Outubro de 2008:


Meus caros Luis, Virginio e Carlos

Nalgumas das coisas que faço na minha vida, conta-se uma colaboração semanal que tenho num espaço da Net em que escrevo, ao Sábado e Terça Feira, textos que fazem parte do nosso dia a dia, política, sociedade, etc.

Neste Sábado, 25 de Outubro, vamos ter o almoço da CART 3492, do Xitole, à qual pertenci de origem.

Ao pensar no texto que havia de escrever para este Sábado cumprir o meu compromisso, não pude deixar de pensar no que ia viver dentro de horas e saiu este escrito que aqui vos deixo à vossa disposição, para publicação, ou apenas para vosso conhecimento, como melhor entenderdes.

Deixo-vos também o meu abraço camarigo e emocionado
Joaquim Mexia Alves



2. PARA ALÉM DA AMIZADE

Este texto que hoje escrevo provavelmente poderá dizer pouco a muitos daqueles que visitam este espaço, não só porque a sua idade, (julgo que mais nova do que a minha), os distancia dos factos que provocam esta escrita, como também por ser assunto que normalmente não ocorre ao pensamento das pessoas, por dele estarem afastadas, por não o terem vivido.

Hoje tenho um almoço que reúne cerca de 40 homens que juntos, integrados na mesma Companhia, partiram no dia 21 de Dezembro de 1971, a bordo do navio Niassa, para uma comissão militar na Guiné.

Irei, já sei, rever alguns que já não vejo há 36 anos e que no entanto estão indelevelmente marcados na minha memória, na minha vida.

Enquanto escrevo este texto, sinto uma emoção profunda, um quase sentimento de saudade inexplicável, que, julgo eu, vem daquilo que nos une e está muitas vezes para além da compreensão humana.

Nunca, em momento algum, atrevo-me a dizê-lo, se formam ligações tão profundas, tão enraizadas, que vão para além da amizade como normalmente a concebemos, como nos tempos de provação, de dificuldade, de medo, (sim de medo), por que passam aqueles que juntos fazem ou têm de fazer uma guerra.

Não é logicamente isso que faz da guerra uma coisa boa, porque a guerra é sempre um mal que deve ser evitado a todo o custo.

Mas a verdade é que aqueles que estão juntos numa guerra, longe de casa e dos seus, percebem que a sua ligação vai muito para além da normal camaradagem, da sã amizade, pois implica uma entrega constante da vida de cada um, nas mãos do outro, dos outros, que estão ao nosso lado e vivem connosco as dores, os sofrimentos, que cheiram em nós o suor do medo, que também a eles lhes sai dos poros e sabem que nós o sentimos.

E é assim que passados muitos anos, às vezes sem nos vermos, o abraço é sincero, forte, acolhedor de parte a parte, como se disséssemos uns aos outros:
- Tu é que me percebes. Achega-te a mim que eu é que te entendo!

Mas tem mais um sentimento ainda, pelo menos nesta guerra que vivemos em África.

É que aqueles que combateram dignamente contra nós, são agora também nossos camaradas de armas e não lhes guardamos qualquer rancor, mas pelo contrário, irmanamo-nos nos sentimentos e encontramos até em nós uma vontade de ajudar a construir os países por que lutaram e onde lutámos.

Mas há sempre um amargo de boca, para ser benigno na expressão!

E este amargo de boca vem do facto do nosso país não ter um comportamento digno para com aqueles que por ele combateram, com ou sem razão, obrigados ou não.

Não me refiro obviamente tanto àqueles que graças a Deus estão bem, mas a tantos que continuam a viver no dia a dia os reflexos da guerra, que não dormem como os outros, que não têm estabilidade emocional, que foram desestruturados pela guerra, e a quem ninguém acode a não ser os familiares e amigos.

E há bastantes, sabemo-lo bem, que vivem sem abrigo e o Estado nada faz.

Conheço deles que têm processos há dezenas de anos para obterem um qualquer subsídio que lhes permita fazer face à instabilidade emocional, que não lhes permite ter um emprego estável, e continuam a fazer-se perguntas burocráticas para que nada se resolva.

Outro amargo de boca, que me toca especialmente porque também os comandei, foi o abandono a que Portugal votou aqueles que, naturais desses novos países, pertenceram às Forças Armadas Portuguesas.

Abandonados à sua sorte, muitos foram fuzilados sem qualquer justificação, e outros vivem ao Deus dará.

Também os nossos mortos que por lá continuam, se exige ao nosso país que os traga de volta à terra que os viu partir, e às famílias que querem finalmente encerrar esse doloroso capítulo das suas vidas.

Perdoem-me o desabafo, mas hoje tinha de escrever sobre eles, cidadãos anónimos que deram parte das suas vidas por Portugal, e se sentem hoje e ainda tão desprezados e ostracizados.

Mas eu orgulho-me deles, e orgulho-me com eles, e hoje vamos abraçarmo-nos, vamos rir e cantar, vamos olharmo-nos nos olhos e dizermos uns aos outros:
- Tu é que me percebes. Achega-te a mim que eu é que te entendo!
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Nota de CV

Vd. último poste desta série > 21 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3337: Blogoterapia (65): 800 mil páginas visitadas em 21 de Outubro de 2008 (Carlos Vinhal)

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3363: Memórias literárias da Guerra Colonial (9): Braço Tatuado, de Cristóvão de Aguiar (José Martins)

  

Braço Tatuado: Conferência de Cristóvão de Aguiar, a realizar na Biblioteca-Museu República e Resistência / Espaço Grandella, na próxima 5ª feira, 30 de Outubro de 2008, às 19h00.
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Foi um acaso que me trouxe ao conhecimento o livro Braço Tatuado, quando, em 14 de Fevereiro de 2008, navegava na Net em busca de uma outra publicação. Tudo ficou decidido nesse momento. Pouco tempo depois era retirado da estante da Livraria Bertrand no Loures-Shoping, o livro que, quase de imediato, comecei a ler.

Título: Braço Tatuado - Retalhos da Guerra Colonial 
Editora: Dom Quixote, Lisboa
Páginas: 136 
Colecção: Autores de Língua Portugues 
Edição: 2008 
Preço com IVA: 12,00 €

Na capa, no texto biográfico, é referida uma passagem por Leiria, como professor. Ora foi nessa cidade que nasci e iniciei os meus estudos. Brinquei e passeei no Jardim Público, bebi água na Fonte Grande, tomei café no Arcádia, comi Brisas do Lis… Bons tempos, de jovem e estudante. 

No livro é relatada uma passagem por Nova Lamego (Gabú Sara), onde também estive como elemento da Companhia dos Gatos Pretos [CCaç 5], que mais tarde, em Agosto de 1968, rumou a Canjadude onde permaneceu até à sua extinção, em Agosto de 1974. 

Esta companhia era herdeira da 3ª Companhia de Caçadores Indígenas, e teve o seu quartel no local onde, com a criação do Sector Leste, ficou instalada a sede do Batalhão. No meu livro, não editado, que intitulei de Refrega, há algumas impressões pessoais e relatos sobre estas duas localidades terra.

Na leitura do livro de Cristóvão Aguiar, estranhei o número “666”, que, como diz o autor, está em Apocalipse (13,18). Nos elementos de que dispunha e que de imediato consultei, esse número não pertence a nenhuma das unidades que serviram na Guiné.

Consultando o 8º Volume – Tomo II da CECA – Fichas História das Unidades – Guiné (página 342) e com base nas datas constantes do texto, assim como dos locais onde se desenrolaram as acções, foi fácil localizar a “Companhia nº 666” [texto em negrito]. Mas não me contentei com hipóteses. No dia 26/02/08, desloquei-me ao Arquivo Histórico Militar, em Lisboa, e pude ler e tomar notas (caixa nº 70 – 2ª Divisão/4ª Secção), com a calma que o pouco tempo de que dispunha me permitiu, da história da “666” [texto em itálico].

Companhia de Caçadores nº 800 
Unidade Mobilizadora: RI 15 – Tomar 

A subunidade foi formada com data de 1 de Janeiro de 1965, conforme Ordem de Serviço nº 2 de 4 de Janeiro de 1965 do Regimento de Infantaria 15 de Tomar. Destinava-se, inicialmente, ao arquipélago de Cabo Verde, tendo a partida prevista para a data de 13 de Abril de 1965. 

Comandante: Capitão Inf Carlos Alberto Gonçalves da Costa, sustituído em Setembro de 1965 pelo Capitão Miliciano de Cavalaria António Tavares Martins (que tinha vindo da CCav 489/Bcav 490. 

Nota do editor vb). Constituíam o quadro de Oficiais subalternos os Alferes Milicianos: 
João Belchurrinho Baptista,
Luís Cristóvão Dias Aguiar,
 João Faria Cortesão Casimiro 
e João Baptista Alves Partida: 

Embarque em 17 de Abril de 1965; desembarque em 23 de Abril de 1965 Regresso: Embarque em 20 de Janeiro de 1967. 

Alterado o destino, a subunidade partiu do cais de Alcântara, em Lisboa, a bordo do N/M Mafalda, desembarcando em Bissau em 23 de Abril de 1967. 

Síntese da Actividade Operacional 

Foi-lhe inicialmente atribuída a missão de subunidade de intervenção e reserva do Comando-Chefe, tendo colaborado com a unidade de guarnição de Bissau na segurança e protecção das instalações e das populações da área e tomado parte em operações na região de Jugudul e Olom, de 10 a 24 de Maio de 1965, em reforço do BArt 645. 

Maio de 1965: Dia 17 – Operação na região de Olom; Dia 21 - Operação Perdigueiro – Durante uma patrulha de combate na área de Encheia, sob o comando do Capitão de Infantaria Gonçalves da Costa, este foi ferido no tórax e pescoço com estilhaços de uma granada de mão, assim como os soldados José Francisco Pereira da Silva (nº 3788/64) e Custódio José Caetano (nº 54/64 da CArt 732). 

Em 28 de Maio de 1965, como subunidade de reserva do Comando-Chefe, foi colocada em Contuboel em reforço do BCav 757, em substituição da CCaç 702, com vista à execução de patrulhamentos, reconhecimentos, protecção e segurança das populações da área, guarnecendo com um pelotão a povoação de Sonaco. 

A partir de 15 de Julho de 1965, cedeu ainda um pelotão ao BCav 705, o qual passou a guarnecer a povoação de Dunane, onde se manteve até 1 de Abril de 1966.

Maio de 1965, Dia 23 – Partida de Bissau para Contuboel; Dia 29 – Chegada a Contuboel Junho de 1965; Dia 27 – Operação Jagudi.

 Julho de 1965, Dia 08 - Partida de 1 Grupo de Combate para Dunane. 

Agosto de 1965, Dia 10 - Operação Onça 

Em 22 de Novembro de 1965, deixou de ser subunidade de intervenção do sector e assumiu a responsabilidade do subsector de Contuboel, então criado na zona de acção do BCav 757, mantendo um pelotão do antecedente destacado em Sonaco, até 1 de Novembro de 1966 e destacando outros pelotões para guarnecer as povoações de Sara Bacar, a partir de 10Maio de 1966 e de Sumbundo, a partir de 3 de Novembro de 19 de 66. 

Novembro de 1965, Dia 23 - A Companhia deixou a intervenção às ordens do Comando-Chefe. 

Dezembro de 1965, Dia 17 - Operação Zig-zag.

Fevereiro de 1966, Dia 26- Operação Jota. 

Março de 1966, Dia 11 - Operação Jota II.

Abril de 1966, Dia 04 – A Companhia deixou um grupo de combate em Dunane e passou a ocupar o destacamento de Sare Bacar; Dia 16 - Operação Jota III.

Maio de 1966, Dia 07- Operação Intriga. Dia 10 - Operação Ibis. Dia 25 - Operação Ianque, Dia 29 - Destaca um grupo de combate para reforçar o sector de Piche.

Junho de 1966, Dia 04 - Cessa o reforço ao sector de Piche. Dia 06 - Operação Isco. Dia 15 - Operação Ivan. Dia 21 - Operação Intervenção. Dia 30 - Operação Interesse.

 Julho de 1966, Dia 07 - Operação Insurrecto Dia 21 – Inauguração da ponte de Contuboel sobre o rio Geba Dia 27 – Operação Intelecto.

Agosto de 1966, Dia 03 – Operação Imune. Dia 11 – Operação Intemerato, Dia 23 – Operação Japão 

Setembro de 1966, Dia 05 – Operação Interlúdio. Dia 22 – Operação Intervalo.

 Outubro de 1966, Dia 09 – Operação Intimação. Dia 16 – Operação Impar. Dia 21 – Operação Introito.

 Novembro de 1966, Dia 02 – 1 grupo de combate ocupou a tabanca de Sumbundo, atacada pelo IN no dia anterior. Dia 17 – Operação Istambul. Dia 30 – Chegada, de Contuboel, da CCaç 1588, que veio reforçar o sector.

Dezembro de 1966, Dia 19 – O IN flagelou com metralhadoras e espingardas automáticas, pistolas e granadas de mão, uma força de CCaç 802, que dava protecção aos trabalhos agrículas na bolanha entre Sumbundo e Ualicunda, causando 1 ferido à população.

Janeiro de 1967, Dia 02 – Chegada a Contuboel da Secção de Quarteis da CCaç 1500, que os rendeu no sector. Em 9 de Janeiro de 1967, foi rendida no subsector de Contuboel pela CCaç 1500, recolhendo em 14 de Janeiro de 1967 a Bissau, a fim de aguardar o embarque.

A Companhia de Caçadores teve duas baixas por ferimentos em combate, o Capitão Gonçalves da Costa e o Soldado Pereira da Silva. Dos seus militares foram louvados 1 Oficial, 1 Sargento, 6 Furrieis, 9 Cabos e 16 Soldados, tendo os louvores sido atribuídos pelo Comandante da CCaç 800, do BCav 757, BCav 705 e Agrupamento 24. 

No final da leitura do livro Braço Tatuado ficou-me na memória a frase atribuída, na página 20( 1ª edição na D. Quixote) ao homem grande de Jabicunda, quando, o Alferes Miliciano de Infantaria Arquelau de Mendonça, insistia para ser tratado por alferes: “…alfero é um, alferes é manga deles, nosso alfero...”

Na realidade, e para mim, o Cristóvão Aguiar é alfero, é um óptimo contador de histórias que, com base numa unidade, acaba por englobar as estórias que fazem parte da história de um povo. J

José Martins 

Fur Mil Trms Inf Companhia de Caçadores nº 5, Gatos Pretos CTIGuiné/Nova Lamego e Canjadude 02/06/1968 a 02/06/1970 

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Notas de vb:

1. Postes relacionados em

25 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2582: Notas de leitura (9): Cristóvão Aguiar, um escritor marcado pela guerra colonial (Beja Santos)

25 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2580: Notas de leitura (8): Braço Tatuado-Retalhos da Guerra Colonial, de Cristóvão Aguiar (Victor Dores / Amaro Rodrigues)

2. Cristóvão de Aguiar nasceu na ilha de São Miguel em 1940. Frequentou Filologia Germânica, em Coimbra, curso que interrompeu para tirar o Curso de Oficiais Milicianos (COM).

Em 1965 partiu para a Guiné, deixando publicado o livro de poemas, Mãos Vazias. Regressado em 1967, concluiu o curso, leccionou em Leiria e regressou a Coimbra para apresentar a sua tese de licenciatura, O Puritanismo e a Letra Escarlate.

Foi redactor da revista Vértice e colaborador, depois do 25 de Abril, da Emissora Nacional com a rubrica "Revista da Imprensa Regional" e leitor de Língua Inglesa na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de Coimbra.

A experiência da guerra forneceu-lhe material para um livro, incluído inicialmente em Ciclone de Setembro (1985), de que era uma das partes, e autonomizado mais tarde com o título O Braço Tatuado (1990) e que reeditou em nova versão.

Da sua obra, por diversas vezes premiada destacamos: 

Raiz Comovida I - A Semente e a Seiva (1978), Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências de Lisboa, 

Relação de Bordo I - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (1964-1988), Grande Prémio de Literatura Biográfica da APE/CMP, 

Raiz Comovida: Trilogia Romanesca (2003), Trasfega - Casos e Contos (2003), Prémio Literário Miguel Torga/Cidade de Coimbra;

 e Nova Relação de Bordo - Diário ou nem Tanto ou talvez Muito Mais (2004) e Marilha (2005), os quatro últimos publicados na Dom Quixote.

Em Setembro de 2001 foi agraciado pelo presidente da República com o grau de Comendador da Ordem Infante Dom Henrique.

Texto extraído das Publicações D. Quixote. Com a devida vénia.

Guiné 63/74 - P3362: História da CCAÇ 2679 (5): Canquelifá, duas histórias e um ataque frustrado (José Manuel Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José M. Matos Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 22 de Outubro de 2008, com mais uma colaboração para a História da sua Companhia (*).

Camarada Carlos
Antes do mais felicito a magnifica equipe que mantém o blogue. Não tenham pressa, pois, parece-me, ainda haverá muito para contar, novos tertulianos a apresentar-se na Tabanca Grande, já que este despertar de recordações e permuta de experiências, será diferentemente revelado por cada um dos que passaram pela terra guineense.

Parabéns pela vossa vontade em prosseguir.

Por último, solicito a indicação da localização do espaço Grandela (**).

Para essa equipe, e para todos os tertulianos, segue um grande abraço.
José Dinis


Aeroporto Internacional das Termas de Canquelifá. Distinguem-se, da esquerda para a direita: Morais, Dinis, Gonçalves (Corvo) e Azevedo, a furrielada dos 1.º e 2.º Pelotões.


2. Canquelifá - duas histórias e um ataque frustrado

Em Canquelifá, a localidade mais distante relativamente a Bissau, permanecemos com o 1.º Pelotão durante alguns dias. A estadia ali era muito agradável, apesar das fracas condições físicas do aquartelamento, em virtude da boa camaradagem com a Companhia local, participando o nosso pessoal nos serviços, e a divisão de tarefas incluía as actividades operacionais. Dormia-se bastante. As refeições tinham horas certas. O à-vontade era notório.

Contavam-se duas hitórias ali ocorridas, uma de desfecho trágico e ainda evidente, outra, verdadeiramente incrível.

A primeira, relacionava-se com um jovem furriel piloto aviador que ali se deslocou, aos comandos de um T-6, para eventual apoio aéreo, como era usual quando fazíamos determinadas saídas para o mato. Por vezes, até se prescindia da sua presença e o avião ia a Nova Lamego buscar géneros em falta. Havia, portanto, uma relação de amizade e cumplicidade com os pilotos. Pois nesse dia fatídico, serviu-se na messe um rancho melhorado, onde também afluiram wwiskies e cognaques, para festejar a condição aniversariante do piloto. Festa é festa e nos verdes vinte anos as festas costumam ser rijas. Com o fim da tarde a aproximar-se, o jovem foi acompanhado à pista pelos camaradas alegres e compinchas. Aos comandos da aeronave, deslizou, descolou do solo, fez movimentos de asas como quem acena na despedida e ainda quis brindar os amigos com um looping que, mal avaliado, acabou a trajectória contra uma árvore imensa dentro da localidade, do que resultou a fragmentação do aparelho e a morte do piloto.

A outra história teve origem durante uma flagelação. Uma mulher da população, seguramente de proeminente bunda, deslocava-se em busca de abrigo, quando foi apanhada por uma granada de morteiro que a atingiu sem rebentar e penetrou, alojando-se numa nádega. Foi evacuada e tratada em Bissau, cicatrizou a ferida e continuou a sua vida normal, milagrosamente conservada.

Mas não há duas sem três:

O Furriel Mecânico Auto-rodas de Canquelifá, gostava de fazer ralis, um tipo corpulento de S. Domingos de Rana cuja identidade não recordo. Essa veia para os carros transformados sublimou-a nos Unimogs da Companhia, que punha a preceito, montando as rodas com as jantes ao contrário, do que resultava um aumento da distância entre elas, tornando-se salientes em relação à carroceria e transformava os sistemas de escape nos chamados escapes livres, para que as fisionomias e os roncares dos motores fossem comparáveis com os dos cooper esses. Na picada era sempre a competir.

Uma ocasião, o 1.º Pelotão saíu para uma acção que terminava numa antiga morança a nordeste, onde foram recolhidos por viaturas expressamente deslocadas. Nós, do Foxtrot, ficámos no ripanço. Até que o capitão me chamou, explicou que uma viatura não tinha regressado, para eu reunir alguns homens e seguir para o local com um mecânico.

Lá chegados, deparei com uma GMC parada no meio das árvores, sem ter saído do local da recolha e, do meio do pessoal, surgiu o Corvo, com maus modos que só a ele é que aconteciam azares daqueles e nunca mais tomava o merecido banho. Rapidamente avaliou-se a situação. O semi-eixo da GMC partira. Disse então ao Corvo que mandasse o resto do meu pessoal, pois passaríamos a noite junto da viatura. E lá foi todo raivoso para o banho tardio.

Alguns minutos depois anunciava-se a chegada dos restantes elementos do Foxtrot, tal o banzé que as viaturas faziam através da savana densa. Com eles vinham os mecânicos que avaliaram a maleita, resolveram voltar a Canquelifá para desmontar a peça equivalente de outra viatura e, voltando ali, procederiam à substituição com facilidade. Que ainda iria dormir no aquartelamento, prometeram.

E seguiram, picada fora, ron-ron, derrapando, com as luzes acesas, que entretanto anoitecia.

Mais um bocado e... vrooom, a ruideira e as luzes que dançavam conforme os obstáculos da mata, anunciavam a aproximação dos técnicos. Montou-se o macaco, com os faróis de uma viatura iluminou-se o local de trabalho, ainda voltou a Canquelifá uma secção que troava na picada, para um lado como para o outro, em busca de qualquer coisa indispensável, até que a velha GMC, tratada da ferida, logrou deslocar-se pelos seus meios. Contentes da vida regressámos todos com a descontração da missão cumprida.

No dia seguinte recebemos a informação de que um bi-grupo IN preparava-se para atacar, mas desistiu da intenção, provavelmente, dissuadido por tanto movimento de viaturas, a indiciar deslocação de homens, cuja causa eles ignoravam ou ter-nos-iam apanhado à mão.

Alguns elementos do 2.º Pelotão - Foxtrot, de pé, da esquerda para a direita: Dinis, Abreu, Teresa e França. Em baixo: Lamarão (condutor), Rodrigues, Martins e Virgílio Sousa

O Abreu

Falar do Abreu não é tarefa fácil, porque o rapaz, quando arregimentado, apareceu no quartel como se não tivesse passado, vindo de nenhures, como um bébé, de tal modo se mostrava desenraízado e inadaptado às novidades. De facto, durante a recruta integrou outro pelotão e o António Abreu, um dos seus instrutores, referia-me a dificuldade que sentia relativamente ao instruendo. Dizia-me que o rapaz ouvia tudo, tentava proceder como os restantes, mas os seus movimentos eram tão desordenados, que geravam rizadas e chacota.E o pobre militar, que não falava com ninguém, numa mudez persistente, mesmo com os instrutores, mais se acabrunhava e metia-se consigo.

Era um problema, que, parecia-me, resultava de sempre ter vivido nos recônditos da Madeira, em alguma vala ou encosta perdida, num seio familiar restrito, humilde que trabalhava no campo e de alguma maneira isolado, dias e dias entregues a si próprios, tarefas a que o pequeno Abreu começou a ajudar desde que se conhecia. Não frequentou a escola que, embora vulgar na época, acentuou essa manifestação de bicho do mato, com um relacionamento tímido e muito limitado. Não saíra do lugar onde nascera, porque naquele tempo até as maleitas eram tratadas com mezinhas naturais.

Era uma fraca figura, mas rijo. Podiam dar-lhe pesos a carregar. A nada virava a cara. Sempre calado. Mas a ordem unida, essa era infinitamente mais difícil de articular do que pegar em pesos e carregá-los.

Às perguntas que lhe dirigiam, acenava com a cabeça em sinal negativo ou afirmativo e a cabeça baixa, revelava o seu desentendimento do que o envolvia. Nunca esboçou um sorriso. Assentava-lhe mal a farda por ser de baixa estatura, mas isso não o preocupava, nem ele queria usá-la assim para ridicularizar a tropa. Simplesmente não compreendia.

Pois bem, foi neste estado e com as dificuldades referidas que fez a recruta e a especialidade, jurou bandeira e integrou o 2.º Pelotão, mais tarde o Foxtrot.

Aprendeu rudimentos de ordem unida, nem sempre atinando com a apresentação de armas. Também aprendeu rudimentos na utilização da G-3, mas era manifestamente imprevisivel. No entanto a sua atitude era de constante disponibilidade. A sua expressão de jovem imberbe não se alterava, nem por alegria, nem por tristeza.

Durante a primeira deslocação para Canquelifá tomou contacto com as primeiras letras que, esforçadamente, alguns cabos tentavam transmitir aos companheiros analfabetos, durante as horas de repouso que ali desfrutávamos. E foi carregador de muita granada e pesos que os mais espertos lhe impingiam. Deixei que assim fosse, mas estimulava-o à revolta e raras vezes intervim, pois se por um lado abusavam, com limites claro, também o estimavam, puxavam por ele e eu esperava que se desinibisse e viesse a marcar posição.

Durante o período que passámos na Guiné, o Foxtrot tornou-se uma família e o Abreu passou a participar nas conversas, a ganhar um lugar e no final já sorria de gozo, quando rejeitava carga durante as saídas para o mato e rematava que já tinha carregado o sufuciente, agora, os restantes que trabalhassem para ele. Nada de mais justo e dava alegria geral verificar a sua evolução.

O Abreu bateu-se e venceu o desenraizamento. Por isso foi herói. E foi um bom produto do Foxtrot.

Fotos e legendas: © José M. Matos Dinis (2008). Direitos reservados
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Notas de CV:

(*) - Vd. postes da série de

31 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3157: História da CCAÇ 2679 (1): Apresentação (José Manuel Dinis)

13 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3203: História da CCAÇ 2679 (2): A caminho de Piche (José Manuel Dinis)

5 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3271: História da CCAÇ 2679 (3): Início da actividade operacional (José Manuel Dinis)

15 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3319: História da CCAÇ 2679 (4): 5.º dia, o meu baptismo de fogo (José Manuel Dinis)

(**) - Não só para o Matos Dinis, mas para quem interessar, o Espaço Grandela fica na Estrada de Benfica, 419, em São Domingos de Benfica, Lisboa.

domingo, 26 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3361: Liga dos Combatentes inaugurou CEAMPS (José Martins)

1. Em mensagem do dia 17 de Outubro de 2008, o nosso camarada José Martins, deu-nos conta da seguinte notícia, que se pode ler também na edição de fim de semana, 20 de Outubro de 2008, do jornal Destak, em PDF:



DEFESA

Liga dos Combatentes inaugura Centro de Estudos e Apoio Médico para antigos militares com problemas

Antigos militares sem-abrigo, com problemas de toxicodependência, alcoolismo ou stress-pós traumático têm, a partir de hoje, uma nova estrutura de apoio. O Centro de Estudos e Apoio Médico, Psicológico e Social (CEAMPS) criado pela Liga dos Combatentes.
Lusa

No dia em que assinala o 85.º aniversário, a Liga dos Combatentes (LC) inaugurou o CEAMPS para “aprofundar o apoio médico, psicológico e social aos antigos combatentes quer da Guerra do Ultramar, quer das operações de paz”, disse à agência Lusa o presidente da Direcção Central da LC, general Joaquim Chito Rodrigues.

“A solidariedade tem sido uma acção permanente da Liga, que foi a misericórdia de muitos combatentes e famílias, e que irá ser reforçada com o desenvolvimento deste programa”, sublinhou o Chito Rodrigues, à margem da cerimónia de inauguração do centro que contou com a presença do secretário de Estado da Defesa e Assuntos do Mar, Mira Gomes.

Os alvos deste programa são os combatentes em risco de exclusão social. "São nichos de exclusão, mas não podemos esquecê-los e é aí que temos de trabalhar", disse o responsável, sublinhando que para promover a inclusão social é preciso conhecer “a pobreza real dos antigos combatentes”.

Para isso, a LC lançou o primeiro estudo para a recolha de dados sócio-demográficos para saber o tipo de população que vai apoiar.
O general Chito Rodrigues adiantou que há já um grupo de 10 voluntários que estão a trabalhar no terreno e que têm como objectivo chegar aos antigos combatentes que estão na rua.

A Liga está já a trabalhar com alguns antigos combatentes sem-abrigo e outros, com problemas de toxicodependência e alcoolismo, já estão sinalizados.

“Já sinalizámos 60 antigos combatentes, metade estão a ser acompanhados pela Liga de Combatentes e os restantes foram encaminhados para os serviços competentes do Serviço Nacional de Saúde”, afirmou Chito Rodrigues durante a cerimónia de inauguração do centro.

A instituição está ainda a acompanhar cerca de 140 famílias de combatentes em situação de pobreza extrema e com manifesto risco de exclusão social.
Até ao final do ano, e em conjunto com o Exército, Marinha e Força Aérea, a Liga irá começar a trabalhar com os militares que participaram e participam em Operações de Apoio à Paz, cerca de 30 mil, não só a nível do stress pós-traumático, mas sobretudo na dimensão psicossocial, uma das vertentes do modelo das Nações Unidas para as Operações de Paz e reconstrução pós-conflito, anunciou o responsável.
A direcção Central da LC, os 71 núcleos espalhados pelo país, e o Lar dos Filhos dos Combatentes no Porto, são a estrutura base onde se irá inserir a estrutura de apoio médico, psicológico e social do CEAMPS.
Estas estruturas estão a ser dotadas com meios humanos, nomeadamente médicos, psicólogo, assistente social ou técnico de reabilitação para identificar, apoiar e reencaminhar para o Serviço Nacional de Saúde ou para a rede nacional de apoio os combatentes e suas famílias.

Para o secretário de Estado da Defesa e Assunto do Mar, João Mira Gomes, este projecto reveste-te de “grande importância” porque se enquadra no trabalho que a Liga dos Combatentes tem vindo a realizar e nos objectivos do Ministério da Defesa nacional.

“Nós temos estado a trabalhar com várias associações para apoiar mais os antigos combatentes em várias vertentes, designadamente a sua integração social e o apoio a problemas de saúde, que começam a evidenciar-se”, disse Mira Gomes à agência Lusa. Para o governante, a existência de combatentes em risco de exclusão social “é um problema”.
“Um dos desafios com que nós nos confrontamos é ter um retrato tão exacto quanto possível dessas situações, por isso é muito importante ter uma rede que só se consegue através destas associações e do espírito de voluntariado e entreajuda”, salientou. É através dessa rede, acrescentou, que se consegue identificar os casos e apoiá-los.

Um alfa bravo
José Martins

2. Comentário de CV

Mais uma vez sensibilizamos os nossos camaradas, e as respectivas famílias, que se julguem portadores de algum distúrbio com origem na sua passagem pela guerra do ultramar, para se dirigirem ou à ADFA ou à Liga dos Combatentes, que têm delegações em todo o País, a fim de receberem encaminhamento adequado e acederem ao tratatamento a que têm direito.

Deixámos mais este alerta e mais uma saída.

Guiné 63/74 - P3360: Em busca de... (47): Referências a meu pai, António Andrade Júnior, Cameconde, 1967/69 (Gonçalo Andrade)







Guiné > Região de Tombali > Cameconde, 1967/69 > O nosso já falecido camarada António Andrade Jr, posando para a fotografia junto a um monumento erigido, possivelmente em Cacoca, junto à fronteira sul, pela CART 640: "Quartel de Cacoca, ocupado e construído pela CART 640, desde 24-6-64"... Não sabemos se o António estava na altura em Cacoca, ou apenas de passagem.


Fotos: © Gonçalo Anadtrade (2008). Direitos reservados



1. Mensagem de hoje, do nosso amigo Gonçalo Andrade, filho do nosso camarada António Andrade Júnior, em busca de companheiros de seu pai.


Amigo Luis Graça,

O meu pai foi combatente na Guiné (Cameconde), aproximadamente entre 03/1967 e 03/1969.

Infelizmente, o mesmo faleceu, vítima de acidente de viação em 1979 (tinha eu 8 anos) e a minha mãe também faleceu em 1983 (eu com 12 anos) igualmente de acidente automóvel. Desta forma, não tenho quem me dê informações ou referências e ando em busca das origens.

Pelo referido, excepto as datas e algumas fotografias, nada mais sei, nem nome/número da Companhia, nem ramo das forças armadas a que pertenceu.

Gostava de obter informações a seu respeito, fotografias e filmes onde aparecesse e de saber se a sua Companhia se organiza em confraternizações.

O seu nome era António Andrade Júnior e era natural de Estremoz, nascido em 1945.

Em busca que fiz na Net dei com o seu blogue. Assim pergunto se me pode auxiliar com informações ou indicando a quem me possa dirigir (particular ou entidade oficial).

Anexo 9 fotos do meu pai e camaradas, no sentido de auxiliar a identificar.

Um abraço
gonçalo andrade
goncalo.andrade@netcabo.pt

2. Comentário de CV:



Aqui ficam algumas fotos que o Gonçalo nos enviou na esperança de que alguém reconheça o seu pai, se reconheça a si próprio ou reconheça algum amigo e assim criar uma corrente que leve ao passado do nosso malogrado camarada. Contamos com a colaboração dos nossos leitores. As duas ou três últimas fotos parece terem sido tiradas na Metrópole, na altura da instrução militar.






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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3359: Em busca de ... (46): Inácio Semedo, agricultor de Bambadinca, um histórico do nacionalismo guineense (Pepito)

Guiné 63/74 - P3359: Em busca de ... (46): Inácio Semedo, agricultor de Bambadinca, um histórico do nacionalismo guineense (Pepito)

Guiné-Bissau > Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 19 de Outubro de 2008 > "Pegadas de hipopótamos neste campo de arroz na tabanca de Cubampor junto a um afluente do rio Cacheu, mostram o apetite destes animais pelas culturas agrícolas.

"Tem sido um verdadeiro problema, para o qual ainda não encontrámos resposta técnica eficaz, conciliar as necessidades alimentares dos hipopótamos que vivem no seu habitat natural, com os naturais anseios das populações ribeirinhas que procuram desesperadamente a sua própria segurança alimentar.

"Eis aqui um grande e clássico conflito entre o Ambiente e Desenvolvimento, cada um apresentando as suas legítimas razões".


Foto: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados

1. Mensagem, de hoje, do Pepito, membro da nossa Tabanca Grande, engenheiro agrónomo, co-fundador e actual director executivo da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento:

Luís:

Conheço muito bem o Inácio Semedo Jr.. É um bom amigo meu e pessoa por quem tenho muita consideração. Combatente da Libertação da Guiné-Bissau, sempre foi um Homem de Estado, com uma postura digna (*).

Nada de estranho quando se é filho do já falecido Inácio Semedo, agricultor que, com o meu pai[ Artur Augusto Silva,] (**), fez parte de um grupo que nos idos de 50 pugnou pelo desenvolvimento do associativismo rural na então Guiné Portuguesa.

Quase 40 anos depois, tive a honra de o convidar a presidir às primeiras jornadas sobre o Associativismo Agricola na Guiné-Bissau. Fui a casa dele em Bambadinca para o efeito. Não estava lá, mas antes na sua propriedade agrícola onde o fui encontrar já muito velhote, numa cadeira de rodas, a orientar os trabalhos. Uma verdadeira lição que nunca esquecerei.
Quando contactares o filho, ficarás rendido à sua simplicidade e maneira de ser.

abraço

Pepito (***)

_________


Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 15 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3317: Em busca de ... (45): Inácio Semedo Jr, ex-guerrilheiro e quadro do PAIGC, de Bambadinca (Berry Lusher / L. Amado / L. Graça)

(**) Vd. I Série do blogue > Poste de 20 de Maio de 2006 >
Guiné 63/74 - DCCLXXV: Antologia (38): O cativeiro dos bichos (Artur Augusto Silva)


(***) Pepito: Pensei em ti e na Isabel. Vamos agora assitir à exibição do filme documental que acaba de ganhar o Grande Prémio da Cidade de Lisboa para a melhor longa metragem no âmbito da 6ª edição do Festival Internacional de Cinema Documental (Lisboa, 16 a 26 de Outubro de 2008).

O filme premiado passa-se aí na tua vizinha Guiné-Conacri, e tem muito a ver com o teu 'core business' que é o desenvolvimento sustentado e integrado. Obrigado pelo teu mail. Já falei, uma vez, ao telefone com o Doutor Inácio Semedo Jr. Prometemo-nos voltar a falar "depois das eleições"... Pareceu-me uma pessoa afável, com muito nível, cultura e sensilidade.

The execution, de Yue Minjun. Esta imagem, fortíssima, serviu de fundo ao logótipo do VI Festival Internacional de Cinema Documental. 175 filmes passaram por Lisboa em 10 dias. O cinema documental está conquistar cada vez mais adeptos entre o público português.


Grande Prémio Cidade de Lisboa para a melhor longa-metragem - 15.000€

End of the Rainbow, de Robert Nugent
83´ França 2007

Sinopse > "Uma grande companhia mineira multinacional transfere uma imponente unidade de prospecção de ouro da Indonésia para uma região remota da Guiné Conacry, em África. Nesta zona rural extremamente pobre, a presença da mina acaba por criar um clima de mudança e vários conflitos entre os habitantes locais. Quais as vantagens do proclamado progresso para uma aldeia africana? A transformação do mundo imposta pelo poder do dinheiro não garante necessariamente felicidade nem melhores condições de vida".

Guiné 63/74 - P3358: Cancioneiro de Mansoa (11): Zé, um rapaz castiço (Magalhães RIbeiro)

Marca de cigarros, de fabrico soviético, que eram distribuídos aos guerrilheiros do PAIGC, durante a guerra colonial / luta de libertação. "Nô pintcha", em crioulo, quer dizer Avante!

Anti-repelente, de marca Hunter (caçador) usado para para afugentar os mosquitos, uma das medidas de protecção contra o paludismo usadas pelos tugas na Guíné...

Fotos: ©
Magalhães Ribeiro (2008). Direitos reservados.


1. Duas mensagens do nosso prezado amigo e camarada, Magalhães Ribeiro, mais conhecido por pira de Mansoa (O Eduardo Magalhães Ribeiro foi Fur Mil de Operações Especiais, CCS do BCAÇ 4612, 1974; é autor e animador do blogue Coisas do MR (Operações especiais, rangers de Portugal, guerra do ultramar...).

(i) Amigos Vinhal, Luís e Briote

Envio aqui anexo mais algum material que poderá ficar bem no blogue.

Um abraço amigo do Pira de Mansoa,
M.R.


(ii) Boa noite amigos Vinhal, Briote e Luís

Entre as coisas e loisas do meu espólio da Guiné, que de vez em quando vou limpando e conservando, encontrei mais três peças que me lembrei de vos enviar, para eventual colocação no blogue, um pela sua graça escrito numa folha de papel quando me encontrava no Cumeré (que vou integrar no Cancioneiro de Mansoa), outro pela recordação que nos traz, uma caixa do famoso HUNTER (com as dimensões C x L x H = 120 x 120 x 30 mm), com que matávamos os mosquitos à noite nas camaratas e um terceiro pela sua curiosidade, um maço de tabaco NOPINTCHA (com as dimensões C x L x H = 70 x 55 x 20 mm), fabricado na ex-USSR e utilizado pelos homens do PAIGC.


2. Cancioneiro de Mansoa > Um rapaz castiço
por Magalhães Ribeiro

Rapaz castiço... o Zé?
Ninguém sabe dizer como é!
O que confundia a cabeça do moço
Que se dava pelo nome de Zé.

Um pouco arisco e quezilento,
Só tinha como amigo o Barnabé.
Não gostava da boina nem do quico,
Na cabeça só um pequeno boné.
E ocupava os seus momentos livres
Entretido num improvisado balancé.
Uns dias antes de embarcar… irritado
Trepou p’ra cima da chaminé,
Repetindo em altíssimos berros:
- Não quero ir para a Guinééééé!

Valeu-lhe então, coisa incrível,
Jamais ter faltado ao pré,
Ficou conhecido além disto
Por sempre caminhar a pé,
E um vício agora pouco usual
Cheirar uma caixinha de rapé!

Tinha uma "alergia" muito comum,
O horror ao cheiro a chulé
E outros “aromas” mal cheirosos…
Não era o caso do verniz do rodapé…
Nem do agressivo diluente…
Nem tão pouco do café.
Um gosto porém ele denunciava,
Comer um bom bife, com ovo e puré.

Diz um dia o comandante desconfiado:
- Este gajo gosta de fazer croché?
O moço reguila e lesto respondeu:
- Eu não gosto imenso é do lamiré!

Ninguém percebeu tal dica ,
Muitos soldados riram-se até,
Também eu sorri, baralhado.
Deixei-me ir nesta maré
E respondi em sua defesa:
- Tem crer em Deus e… muita fé.
- Como sabe isso, Ribeiro?
- Vejo-o ir às missas à Sé...
- Chegue-se à frente, seu maçarico.

Ele aproximou-se, pé ante pé:
- Vinte completas para ganhar juízo!
- Quere-as em silêncio ou grito… olé!
Diz o capitão com ar conclusivo:
- Este desgraçado está meio cheché!
Era assim um dos nossos "rapazes"
Que reencontrei no quartel do Cumeré.
Nesse dia de calor... mergulhou no rio...
E quase foi engolido por um jacaré:
- Juro, nunca mais me atiro para a água...
Daqui p'rá frente só se for num bidé!

Magalhães Ribeiro

PS - Em anexo a caixa do famoso HUNTER e do maço de tabaco NÔ PINTCHA.
___________

Nota de L. G.:

(*) Vd. postes desta série:

1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVI: Cancioneiro de Mansoa (1): o esplendor de Portugal

1 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVII: Cancioneiro de Mansoa (2): Guiné, do Cumeré a Brá

7 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXLVI: Cancioneiro de Mansoa (3): um mosquiteiro barato para um pira...

10 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLIV: Cancioneiro de Mansoa (4): a arte de ser 'ranger'

1 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDIX: Cancioneiro de Mansoa (5): Para além do paludismo

19 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDLIX: Cancioneiro de Mansoa (6): O pesadelo das minas15 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXVIII: Cancioneiro de Mansoa (7): Os periquitos do pós-guerra

31 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCCXXI: Cancioneiro de Mansoa (8): a amizade e a camaradagem ou o comando da 38ª

3 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P837: Cancioneiro de Mansoa (9): A mais alta de todas as traições

25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1698: Cancioneiro de Mansoa (10): O 25 de Abril, a Barragem de Castelo de Bode e a descoberta da palavra solidariedade

Guiné 63/74 - P3357: Os nossos camaradas guineenses (2): Foram votados ao esquecimento e abandono (Jorge Picado, ex-Cap Mil, CCAÇ 2589, 1970/72)

1. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado, ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, com data de 23 de Outubro de 2008:

Amigos

Ao visitar hoje a nossa Tabanca Grande depois de 3 dias de ausência, para colocar a leitura em dia, deparo com o P3340 do nosso camarada José Martins, que tem desenvolvido um grande e valioso trabalho na pesquisa e transcrição para os Tertulianos, e não só, da vasta documentação existente nos Arquivos Histórico-Militares.

De facto, e ideologias à parte, Os Nossos Camaradas Guineenses que combateram no Exército Português, não têm culpa de terem acabado do lado errado da refrega.

Conheci muitos, pois em Mansoa tinha, pelo menos, 2 Pel Caç Nat [58 e 61] adstritos à minha Companhia, da CCaç 15 (Balanta) à ordem do BCaç, naquela altura comandada pelo Cap Manuel José Nascimento [evacuado para o HM 241 de Bissau, e posteriormente para o HMP, juntamente com o Alf Mil Massano em 14 de Julho de 1970] e depois pelo Cap Inf QP Luís da Piedade Faria que transitou da CCaç 2588 (chegado a Mansoa depois de mim, em Maio de 1970) e tantos outro Milícias e guias.

Posso, portanto, também com conhecimento de causa, corroborar que foram exemplares na sua entrega à causa, dando-se de alma e coração pelo que julgavam ser o melhor para eles. E como protegeram tão bem as nossas costas? Tantas vezes à custa da própria vida? Quem é que não pode ter, pelo menos, gratidão por tal apego?

Mas afinal estas palavras não refletem mais do que sinceros lamentos chorados no muro das lamentações de todos os que sobreviveram às Guerras. Sim, porque queiramos ou não, o esquecimento e o abandono a que foram votados - eles e igualmente os Metropolitanos mais desfavorecidos - pelos Responsáveis, não acontece só em Portugal. Se analisarmos a História Mundial (e mesmo a mais recente em Países tão importantes) os exemplos são iguais. Depois de usados pelos Responsáveis, são descartados, como meros lenços de papel...

É TRISTE, MAS É ESTE O HUMANISMO QUE NOS PREGAM.

Desculpem esta catarse... e hoje até nem estou com azia, porque o Sporting lá ganhou.

Abraços camarigos (desculpas ao Mexia Alves também da CCaç 15, mas já depois do meu regresso, por roubar a sua marca)

Jorge Picado

P.S. Um obrigado ao Mansabanho (ou será Mansabense?) Carlos, por me ter embelezado a desenxabida escrita com umas boas fotos, não faltando o seu Porto de Leixões que , visto assim do ar, é bem bonito [mas não se compara com o de Aveiro!]. Julgo que a foto da Zona Portuária de Bissau é posterior à nossa estadia naquelas terras, pois tenho uma ideia diferente, para pior, daquele cais.
_______________

Notas de CV

Uma pequena resposta à provocação do Jorge Picado.

i - Caro Jorge, a tua escrita não é de modo nenhum desenxabida nem precisa de floreados.

ii - O Porto de Aveiro será mais bonito que o de Leixões, mas como neste caso, o tamanho conta, Leixões é muito mais importante para a economia Nacional.

Vd. último poste da série de 21 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3340: Os nossos camaradas guineenses (1): O meu tributo (José Martins, ex-Fur Trms, Nova Lamego e Canjadude, CCAÇ 5, 1968/70)

sábado, 25 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3356: Em bom português nos entendemos (3): Termos informáticos e seu significado em português (Ferreira Neto)




1. Mensagem do nosso atento camarada Ferreira Neto (*), ex-Cap Mil da CART 2340, (Canjabari, Jumbembem e Nhacra, 1968/69), com data de 24 de Setembro passado, falando-nos de alguns termos usados na informática, que poderiam ser substituídos facilmente por palavras portuguesas, se nos habituássemos a aplicá-las com mais frequência.


Caro Vinhal:

BLOG nem sequer é uma palavra inglesa. É resultado da contracção do termo WEB LOG, julgo absolutamente aceitável como neologismo no nosso léxico, o termo traduz de uma forma simples um montão de coisas.

O termo LINK pode ser substituido pelo português hiperligação (termo usado na informática com o mesmo significado).

BROWSER, e porque não navegador, que felizmente já se vai usando?

Porque não deixamos por uma vez de utilizar termos ingleses, quando podemos substituí-los pelos nossos equivalentes. Confesso que muitas vezes recorro ao dicionário, como agora estou a fazer. Não sei se neste programa da introdução dos computadores nas escolas, estará previsto a introdução dos termos portugueses. Creio que seria uma boa ideia. Na China como farão?

A blog (a contraction of the term "Web log") is a Web site, usually maintained by an individual [1], with regular entries of commentary, descriptions of events, or other material such as graphics or video. Entries are commonly displayed in reverse-chronological order. "Blog" can also be used as a verb, meaning to maintain or add content to a blog. Many blogs provide commentary or news on a particular subject; others function as more personal online diaries. A typical blog combines text, images, and links to other blogs, Web pages, and other media related to its topic. The ability for readers to leave comments in an interactive format is an important part of many blogs. Most blogs are primarily textual, although some focus on art (artlog), photographs (photoblog), sketches (sketchblog), videos (vlog), music (MP3 blog), audio (podcasting), which are part of a wider network of social media. Micro-blogging is another type of blogging, one which consists of blogs with very short posts. As of December 2007, blog search engine Technorati was tracking more than 112 million blogs.[2] With the advent of video blogging, the word blog has taken on an even looser meaning — that of any bit of media wherein the subject expresses his opinion or simply talks about something.

Abraço
Neto
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Tradução (rápida) de LG, a pedido do co-editor CV

Um blogue (, do inglês blog, contracção da expressão "Web log") é um sítio da Web, normalmente mantido por um indivíduo, com entradas regulares de comentários, descrições de acontecimentos, ou outros materiais, tais como gráficos ou vídeo.
As entradas aparecem geralmente por ordem cronológica, do mais recente para o mais antigo.

O termo blog também pode ser usado, em inglês como um verbo, significando manter (ou acrescentar conteúdos a) um blog. (Blogar, na gíria portuguesa). Muitos blogues apresentam comentários ou notícias sobre um assunto específico, enquanto outros funcionam mais como diários pessoais em linha. Um blogue típico combina texto, imagens e hiperligações para outros blogues, páginas da Web e outras fontes relacionadas com o seu tópico. A possibilidade para os leitores de deixar comentários num formato interactivo é uma funcionalidade importante de muitos blogues.

A maioria dos blogues são principalmente de texto, embora alguns tenham tenham um enfoque na arte (artlog), na fotografia (photoblog), no desenho (sketchblog), no vídeo (vlog), na música (MP3 blog), no áudio (podcasting), todos eles parte integrante de uma vasta rede de meios sociais de comunicação. ‘Micro-blogging’ é um outra forma de blogar, consistindo em blogues com postes (ou postagens) curtíssimos.

Em Dezembro de 2007, o motor de pesquisa de blogues Technorati estava a monitorizar o mais de 112 milhões de blogues. Com o advento dos blogues de vídeo, a palavra ‘blog’ tem assumido um significado ainda mais flexível - qualquer bocado de bit de media em que um indivíduo expressa sua opinião ou simplesmente fala sobre algo.
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Nota de CV

(*) Vd. poste de 23 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3227: Em bom português nos entendemos (2): Estória ou História (Ferreira Neto e Carlos Vinhal)

Guiné 63/74 - P3355: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (9): Ainda falando do Sarg Pil Av Honório (Rui Silva)


Mensagem do nosso camarada Rui Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67, com data de 1 de Outubro de 2008:

Caros Luís Graça, Carlos Vinhal e Virgínio Briote:

Cumprimentos e um abraço.

Tenho lido, como é habitual todos os dias, o nosso Blogue e tenho ultimamente visto várias referências ao piloto cabo-verdiano Honório. Por achar alguma controvérsia e também por ver indicações que julgo não serem as mais correctas, vi-me em consciência e na parte que me toca, dizer o seguinte.

Fui, como sabem (estou na Tertúlia) Fur Mil da CCAÇ 816 que operou sempre no Oio, no triângulo Bissorã-Olossato-Mansoa, no biénio 1965/67, sempre em campanha, isto é, sempre no mato e conheci pessoalmente o Honório no Café Bento e conheci-o no seu melhor: a pilotar os bombardeiros T6 (os Fiat vieram mais tarde e não sei se ele pilotou algum) e devo dizer que a 816 tinha a melhor impressão deste destemido e insuperável piloto.

Fizemos várias operações com ele a pilotar um dos bombardeiros (normalmente o apoio era de 2) e quando sabíamos que ele estava connosco, nascia-nos outra alma, pois sabíamos que tínhamos uma protecção aérea superior. Quando víamos um T6 picar até às copas das palmeiras nem precisávamos de saber quem era o piloto. Se não era ele que resolvia muitas vezes uma operação lá que ele dava uma grande ajuda isso dava.

Sem desprimor para outros pilotos que por lá andaram, e que concerteza eram também audazes. Conhecíamos também um piloto Tenente Coronel que agora não me ocorre o nome, que também era muito bom, operacionalmente falando. Chamávamo-lo de voz de aguardente, devido à sua voz rouquenha.

Apenas é meu intuito e só (no que me toca), ajudar a um possível melhor esclarecimento dos factos.

Lembro-me ainda do meu querido amigo e camarada também Fur Mil da 816, José Baião, falecido há pouco tempo, ter tido uma boleia dele numa DO e jurar para nunca mais, pois fez com ele uma viagem Bissau-Mansoa e o Honório pilotou sempre sobre a estrada (Bissau-Mansoa), como ele gostava, fazendo gincana com as asas do aparelho a passar por entre os postes que marginavam a estrada que, no dizer do Baião, não tocava nestes por milagre. O Baião disse que viu a morte várias vezes à frente dele.

Um abraço para todos os tertulianos.
Rui Silva
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Nota de CV

Vd. último poste da série de 24 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3351: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (8): Homenagem à memória do Honório e do Manso (Victor Barata)

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3354: Documentos (6): PAIGC - Docs (1): Comunicado de 27 de Abril de 1964 sobre a vitória na batalha do Como (Amílcar Cabral)

PAIGC > Documentos > "Amílcar Cabral e outros companheiros, a bordo de uma canoa, a caminho do I Congresso do PAIGC, Cassacá, 1964. Fotografia de Luís Cabral. [05359.000.020] · Documentos Amílcar Cabral (12/23)"

Foto (e legenda): © Fundação Mário Soares > Dossiers > Guiledje · Simpósio Internacional · Bissau, Guiné-Bissau · 1 a 7 de Março de 2008 > Fotografias (com a devida vénia...) (*)



Comunicado do PAIGC, datado de 27 de Abril de 1964, e assinado por Amílcar Cabral, regozijando-se com a "vitória" dos seus combatentes sobre as forças coloniais portuguesas na Ilha do Como (Janeiro a Março de 1964).

Fonte: Fundação Mário Soares > Dossiers > Guiledje · Simpósio Internacional · Bissau, Guiné-Bissau · 1 a 7 de Março de 2008 > Documentos

Pasta: 04602.110 Assunto: Comunicado do PAIGC sobre a vitória de Como

Termos de referência: Comunicado assinado por Amílcar Cabral, Secretário Geral do PAIGC, sobre a vitória na ilha de Como, com o relatório das acções militares ofensivas levadas a cabo pelos combatentes do PAIGC em Bula, S. Domingos e Catió.

Data: 27.ABR.1964

Nível 2:
04.PAI/PAIGC Nível 3: Comunicados/Mensagens Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral - Iva Cabral formato .pdf

Tradução do francês. L.G.

PAIGC – Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde

Secretariado Geral

Caixa Postal 298

Conacri – República da Guiné


Comunicado:

Em toda região sul do país, assim como noutras regiões onde chegou a notícia da expulsão das forças portuguesas da heróica Ilha do Como, o nosso povo manifesta a sua alegria perante esta vitória importante das nossas forças armadas. Através de mensagens entusiásticas, o nosso povo faz prova da sua consciência: a vitória do Como reforçou nele a certeza de que, com o heroísmo e o espírito de sacrifício dos nossos combatentes e das nossas populações, nós podemos, sob a direcção do nosso Partido, vencer a superioridade, numérica e em material, das forças portuguesas, e expulsá-las definitivamente do nosso país.

Se, por um lado, a vitória obtida pelas nossas forças na batalha do Como galvanizou a determinação do povo na luta, por outro lado ela contriuiu para aumentar a desmoralização tanto das tropas portuguesas destacadas no nosso pai como os próprios meios dirigentes portugueses.

Com efeito, notícias provenientes de Lisboa assinalam que uma onde de pessimismo e descontentamento invadiu os meios oficiais portugueses, sobretudo os militares, na sequência da derrota das forças portuguesas, aliás previsível desde há algum tempo. A censura não conseguiu esconder a irrupção de conflitos escaldantes à volta de Salazar, que começou a mandar regressar a Portugal certos elementos de confiança que se encontravam em missão no exterior.

Face à situação no nosso país, a pesada lembrança do caso de Goa pesa cada dia mais na memória dos chefes militares e políticos portugueses. E isto de uma maneira mais vergonhosa, por que são as nossas próprias forças armadas que estão em vias de bater as tropas coloniais portuguesas.

Por outro lado, enquanto centenas de famílias portuguesas procuram em vão conhecer a sorte dos seus filhos que fazem parte do contingentes enviados para o nosso país, dezenas de oficiais e sargentos – sem contar os soldados – acabam de ser presos nos quartéis, tanto em Portugal como na Guiné, por se terem recusado fazer a guerra colonial.

Reforçados pelas vitórias obtidas contra o inimigo, os nossos combatentes intensificam as suas acções, inspirados doravante pelo heroísmo e audácia dos combatentes do Como.

É assim que:

- No decurso de diversas emboscadas montadas nos últimos dias na região de Bula, 3 veículos foram destruídos, rendo sido mortos 12 soldados;

- Grupos de combatentes, depois de obrigar o inimigo a retirar, progridem em direcção à pequena cidade de São Domingos, situada no noroeste do país, perto da fronteira do Senegal;

- Em plena cidade de Catió, principal centro do sul do país, onde se encontra ainda uma guarnição portuguesa, um grupo móvel conseguiu fazer saltar um veículo blindado, cujos ocupantes foram todos mortos.

Redigido em 27 de Abril de 1964.

a) Amílcar Cabral, Secretário Geral.


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 Nota de L.G.:

(*) A Fundação Mário Soares participou e apoiou o Simpósio Internacional "Guiledje: Na rota da Independência da Guiné-Bissau", que se realizou em Bissau, de 1 a 7 de Março de 2008.

Neste âmbito, o Arquivo & Biblioteca da Fundação Mário Soares preparou um conjunto de documentos e fotografias relacionadas com Guiledje, com recurso, designadamente, ao Arquivo Amílcar Cabral. Contou igualmente com o apoio do nosso blogue, que disponibilizou alguns documentos e imagens.

Guiné 63/74 - P3353: Tabanca de Matosinhos (4): O novo abrigo, o Restaurante Milho Rei, Rua Heróis de França, 721, Matosinhos (José Teixeira)

1. Mensagem do dia 15 de Outubro de 2008, do nosso camarada José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, membro da Tabanca de Matosinhos, dando-nos notícias desta tertúlia:

Caros editores:
Seguem mais notícias da Tabanca de Matosinhos.
Fraternal abraço do
José Teixeira


É sempre assim à chegada. Mais um abraço !

Matosinhos > 8 de Outubro de 2008 > A porta do Milho Rei reina a boa disposição, apesar de os estômagos ainda estarem vazios.

Matosinhos > 8 de Outubro de 2008 > Restaurante Milho Rei > O Zé Manel , da Régua, com o seu inseparável boné, o Zé Teixeira e o Jorge Félix.

O Almeida de Gandembel cantando para nós o "hino de Gandembel”.

O Leonel Tavares cantando o fado, ou mehor, o Fado do Combatente, da sua autoria.

Vista geral dos convivas presentes no dia 8 de Outubro último, no Milho Rei, Matosinhos.

Fotos: © Jorge Félix (2008). Direitos reservados. Legendas de José Teixeira


2. O novo abrigo da Tabanca de Matosinhos

Em boa hora, mercê da circunstância da Casa Teresa, com pesar para alguns de nós, se tornar pequena para acolher tantos nharros, mudamos de abrigo para o Restaurante Milho Rei, na Rua Heróis de França, 721 – Matosinhos.

A gerência do restaurante acolheu-nos prazenteiramente e reservou-nos uma espaçosa e acolhedora sala. Um serviço de qualidade e um pessoal estupendo, que mais queremos !

Na guerra que todos nós de uma forma ou de outra vivenciámos, quando um camarada caía varado por uma bala assassina, logo dois ou três se levantavam com mais garra ainda. A raiva de ver um colega tombar, como que duplicava as forças e afastava o medo. Agora, quando um ou outro camarada não responde à chamada para o rancho, porque os afazeres da vida o tramaram, logo aparecem dois ou três, com a mesma vontade de partilhar vivências, conhecer outros camaradas e suas histórias e dar o gosto à faca e garfo, regando o estômago com o excelente vinho do Zé Manel que nunca se esquece de aparecer bem acompanhado com umas caixitas do seu melhor néctar. Obrigado, Zé Manel !

Este mês de Outubro começamos com 19 convivas para nas duas semanas seguintes passarmos para vinte e quatro. É caso para perguntar, onde vamos parar ?

Desta vez deram-nos a honra de estar presentes velhos amigos como o Casimiro Carvalho, o Magalhães Ribeiro e o Almeida (de Gandembel). O Leonel Tavares é uma nova aquisição.

O Almeida (Gandembel) voltou para cantar para nós, como só ele sabe cantar, o Hino de Gandembel, que tanto deliciou os participantes no Simpósio de Guiledje em Fevereiro passado. Deliciou-nos ainda com outras canções que nos eram tão queridas e ouvidas com tanta saudade nas bolanhas da Guiné. Completou a sua actuação com uns acordes de clarinete. O Leonel Tavares não ficou atrás e cantou um lindo fado com letra e música de sua autoria – o Fado do Combatente.

O Almeida, de Gandembel (CCAÇ 2317, 1968/69)

O Almeida de Gandembel ao colo de sua mãe. Ainda não sabia o que o esperava ...

Zé Teixeira
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Nota de CV

Vd. último poste desta série > 7 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3278: Tabanca de Matosinhos (3): Convite do Fernando Moita para uma incursão a Felgar, concelho de Torre de Moncorvo (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P3352: O meu baptismo de fogo (17): Morés, 8 Agosto de 1972 (Amílcar Mendes, 38ª CCmds)

1º Cabo Amílcar Mendes, 38ª CCmds. Mata de Morés. 1972.

(...) embora à distância de um clicar continuo a acompanhar o nosso blogue diariamente. Porque me emocionei com alguns relatos da "primeira vez" decidi, e por homenagem a um grande amigo, de quem irei falar mais tarde, partilhar convosco a minha primeira vez. Desta vez, e porque não quero melindrar ninguém, alguns nomes serão alterados.

Acho que a partir do momento em que me ofereci voluntário para os Comandos no já longínquo ano de 1969 fiquei a sonhar como seria a minha primeira vez.

Sonhava de olhos abertos e revia-me em todos os filmes de guerra. Imaginava-me o tipo duro que debaixo de fogo iria estar a rir-se e a desdenhar sem nenhum respeito pelo inimigo. Sonhava ser o tipo Mata todos e volta só!

Isto claro na minha ingenuidade dos 18 anos cheirava a bravata, e contagiado pelos relatos que ia lendo das tropas especiais que lutavam no Vietname e que me enchiam a cabeça de fantasia. Ser dos Comandos antes do 25 de Abril, no continente era tabu, era mistério e sedução para os meus 18 anos.Nem eu imaginava como ira ser diferente essa realidade.

Tenho que elucidar que, naqueles anos de guerra colonial, ir para os Comandos e conseguir sê-lo, obrigava a ter que passar por muitas etapas. Uma delas era de que mesmo com o curso de Comandos concluído e já na fase operacional, a especialidade Comando só era averbada depois de termos tido contacto com o Inimigo em teatro de guerra e nem que isso demorasse um ano tínhamos de aguentar para só depois em parada recebermos o Crachá.

A sua entrega em parada tinha um cerimonial e onde um graduado Comando nos perguntava a berrar:
- Queres ser Comando? - e se a nossa resposta era Sim, ele respondia:
- Então vai e cumpre o teu dever!

E era nesse momento que nós passávamos a pertencer a uma Família de quem nos iríamos orgulhar pela vida fora e até a morte. Bem, isto tem muito a ver com a vontade que tínhamos em ter contacto com o IN para nos armarmos em vaidosos com o crachá.

Cheguei à Guiné no dia 29 de Junho de 1972 e depois de uns dias de folga em Bissau onde a CCmds esteve a receber o armamento, no dia 10 de Julho 1972 seguimos em coluna com destino a Mansoa. Nesse mesmo dia encontrei o meu amigo Germano, 1ªcabo cripto e um velho amigo de família com quem eu passei muitos dos serões em Mansoa nos intervalos da fase operacional.

Lembras-te, Germano, como aquilo foi duro para mim? Lembras-te de eu regressar das operações do Morés e como desabafava contigo?

Antes de passar ao debaixo de fogo quero aqui recordar, e tu lembras-te, Germano, pois estavas ao pé de mim, dizia eu recordar o meu primeiro contacto nu e cru com essa malvada chamada morte e que se me apresentou da forma mais cruel que se possa imaginar. Para o contar vou relembrar o que na altura escrevi no meu diário de guerra.

15 Julho de 1972

Estava à conversa com o Germano junto à nossa caserna quando ouvimos um tiro vindo do interior. Corri para lá e de repente nesse minuto ao olhar um corpo no chão vítima de um disparo acidental perdi toda a minha inocência guerreira e acho que um mundo de responsabilidade e verdade se abateu sobre os meu ombros. Foi a primeira baixa da companhia. O soldado Ilídio da Costa Moreira.

Depois de sair para fora da caserna senti-me agoniado e vomitei e senti que tudo o que me foi ensinado no curso foi pouco para lidar de frente com a morte.

8 Agosto de 1972

Saí ontem para uma operação heli-transportada, a partir de Mansoa e até ao local da largada. O Germano foi dar-me um abraço.

Desembarcámos na mata do Morés na região DANDO -QUENHAQUE-SINRE. A operação foi um golpe de mão num aldeamento onde as populações estavam sob controlo IN e o objectivo foi atacar e destruir as instalações para criar um clima de instabilidade.

Entrámos no aldeamento e estava vazio. O silêncio era impressionante, notava-se que o IN à nossa aproximação fugiu do aldeamento. Começámos a passar revista ás tabancas a de repente ouve-se um tiro. Um furriel do meu grupo detecta um turra emboscado e mata-o. Durante a revista apanhámos diverso material de guerra e documentos. Destruímos 10 palhotas e 2 grandes celeiros.

Saímos do aldeamento e mesmo na saída caímos na primeira emboscada em guerra.

Sofremos fogo concentrado de flgelação. Foi um momento de excitação para mim. É a primeira vez que estou debaixo de fogo do IN. Reagimos à emboscada, fomos para cima deles e saímos do local.

Nesse mesmo momento outros dois grupos da Companhia são emboscados perto de nós e têm um morto. Foi o nosso primeiro morto em combate. O camarada Francisco José, natural de Évora.

Começámos a andar em direcção ao local de recuperação que já não era em heli. Tivemos que andar dúzias de km em direcção a Infandra. A um dado momento desfaleci. Valeu-me uma coramina para me recompor. Pelo caminho entrámos noutro aldeamento onde fomos recebidos com rajadas de kalash.

Nessa aldeia levei um banco que o meu amigo Germano (lembras-te?) trouxe para a metrópole. Chegámos à estrada, perto de Infandra, já muito tarde e a recuperação ficou para de manhã.

Durante a noite os mosquitos iam-me bebendo o sangue todo.

Duração da operação: 24 horas

Resultados:

- IN: 1 morto e vários feridos, visto terem sido encontrados vários rastos de sangue;
- NT: 1 morto e 1 ferido ligeiro
- Destruído um acampamento de 10 palhotas e vários celeiros
- Material capturado:

2 Granadas defensivas F-1
1 anadas defensivas modm 63
Documentos e material diverso

E esta foi a minha primeira vez, Amigo Luís, e como vez foi um bocadito para o duro.

Quero agradecer ao Germano toda a disponibilidade que nesse tempo para me apoiar. Obrigado AMIGO.


Amilcar Mendes
ex-1ªcabo COMANDO
38ºCCmds
Guiné
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Notas de vb:

1. O Amílcar Mendes, em 2 Novembro de 2005, apresentou-se assim na nossa Tabanca Grande:

"assentei praça em Outubro de 1971 no antigo RAL1. Ofereci-me para os Comandos onde cheguei em Dezembro de 1971 (CIOE/ Lamego). Completei o curso em Junho de 1972, mês a que cheguei à Guiné, a 26. Iniciei a 2ª parte do curso em Mansoa, na mata do Morés, onde tive o primeiro contacto com o IN. Recebi o crachá de Comando em Agosto, com o posto de 1º cabo.

Em Fevereiro de 1974 terminei a comissão mas só regressei a Portugal em Julho de 1974."

2. Artigos da série e relacionados em´


24 Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3350: O meu baptismo de fogo (16): Catió, 10 de Março de 1969 (António Varela)

1 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3009: Com sangue na guelra: Nós e a mística dos comandos da 38.ª, em Mansoa (Belarmino Sardinha)