sábado, 9 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4307: Humor de caserna (11): Amizades muito especiais (António M. Conceição Santos / Magalhães Ribeiro)


Amigos, tenho andado aqui atrapalhado a arranjar uns minutos, para escrever estas palavras que se seguem.  
São palavras que demoram sempre muito tempo a delinear no pensamento e depois, outro tanto ou mais, a teclar no PC.  
Os meus professores - Luís e Vinhal -, lá me vão explicando como se trabalha com o blogue, que tipos de letra se devem usar, os tamanhos ideais e correctos para as fotos, etc.  
Podem crer que não tem sido nada fácil. Escrevo, apago, volto a escrever e volto a apagar.  
Depois é a colocação do material no blogue... XIÇA!  
É a foto que se introduz mal e, ou, não está formatada e, ou desapareceu! É o texto que se encavalita nas fotos, ou as fotos que se desenquadram... APRE!  
Só vos digo que isto, de "trabalhar" no blogue apostando-se na qualidade da disposição e apresentação de cada um dos "posts" custa... MUITO TEMPO.  
Bom, desde que comecei a dar uma mãozinha no blogue, quase ainda nem tive tempo para ver sequer os meus e-mails "culturais", que se vão acumulando nas "caixas".  
Mas agora que consegui uns minutos vou-vos contar que, para se apresentar aquilo que vos é dado ver no blogue, tem que haver outro tanto "trabalho" nos "bastidores", coisa que, como facilmente se pode deduzir, é indispensável à equipa Luís Graça, Virgínio Briote e Carlos Vinhal, agora com a minha ainda muito recente colaboração.  
Sosseguem não vos vou martirizar com a descrição dos tais "trabalhos" mas, tão simplesmente, contar-vos uma das diversas trocas de e-mails, que se tornou hilariante entre os envolvidos no passado dia 27 de Abril.  
A ver:  
1- Recebi um e-mail do António Manuel da Conceição Santos, de Faro  
Dizia assim:  
"Parabéns, já te vi no blogue de Luís Graça & Camaradas da Guiné. Agora é só ocupares o teu tempo, pois segundo penso, estás disponível para estas coisas. Dou-te a maior força deste mundo.  
Um abração para ti e para todos os membros do respectivo Blogue.  
Louvo-vos e ergo a minha voz aos céus com um só pensamento comum: 

  • Ao Luís Graça, com toda a justiça te digo, parabéns por continuares com esta tarefa inacabada;
  • Ao Carlos Vinhal, com toda a justiça te digo, parabéns por continuares com esta tarefa inabalável;
  • Ao Virgílio Briote, com toda a justiça te digo, parabéns por continuares com esta tarefa sem fim;
  • Ao Humberto Reis, com toda a justiça te digo, parabéns por continuares com esta tarefa indestrutível;
  • Ao Magalhães Ribeiro, com toda a justiça te digo, parabéns por continuares com esta tarefa imperdível.  
É que, este trabalho só terá fim, quando todos os camaradas que passaram pela Guiné entre 1963 e 1974, tenham contado as suas histórias. Muitos, mas muitos já contaram as suas, mas ainda faltam muitos, mais que ainda não as contaram.  
Histórias de recordações, boas ou más. Histórias de angústia. Histórias de dor, de amor e de saudades.  
São as nossas histórias, memórias do passado, que neste singelo blogue nos é permitido escrever.  
Um grande alfa-bravo para a equipa.  
De um leitor que faz parte da lista do vosso/nosso blogue.  
António Manuel da Conceição Santos - Faro 
Ex-Furriel de Operações Especiais - Ranger 
Guiné (Cadique) 1972 a 1974 - CCAÇ 4540  
2- Logo de seguida reenviei-o para o L. Graça, C. Vinhal e B. Vriote 
Amigos Luís, Vinhal e Briote,
Reenvio-vos o e-mail abaixo, que me foi enviado, para vosso conhecimento. 
Já estou a receber parabéns e ainda não fiz nada... eheheheheheheh... 
Estas palavras são 100% para vós! Merecidas sem qualquer dúvida.  
Um abraço para todos vós do MR  
3- Respondi então ao Santos
Boa noite Amigo Santos,
Vamos a ver se eu consigo dar conta do recado. 
Eu, na EDP, estou só c/ mais 4 engenheiros mecânicos para a manutenção de cerca de 30 grandes barragens e quase 50 mini-hídricas.  
Além de ter que "alimentar" o meu blogue... eheheheheheh... ainda dou algum contributo, para 4 Associações, pois neste momento, sou Vice-Presidente da Delegação do Porto, da A.P.V.G. (Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra), Membro da Assembleia Geral da A.O.E. (Associação de Operações Especiais), Membro da Assembleia Geral da L.A.M.M.P. (Liga dos Amigos de Museu Militar do Porto) e Membro da Assembleia Geral da Beneficiência do Porto. 
Tenho a meu favor o método e a organização, senão estava lixado.  
Tempo precisava 27 ou 28 horas por dia... eheheheheheheh... 
São assim os RANGERS.  
Grande abraço para ti e até 10 de Junho se Deus quiser. 
MR  
4- Passados uns minutos recebi do Santos
Desculpa a minha intromissão: "como é que tens tempo para trik e trik?" heheheheheheh.   
5- A minha resposta 
Ó pá a mulher ainda não se queixou... palavra de honra!
Quando saio para as barragens, por muitos dias e durmo fora, ela vai comigo... eheheheheheheheh...  
Abraço Amigo do MR 


A Barragem de Belver situada no Rio Tejo, a cerca de 7 kms a montante da cidade Abrantes, está equipada com 6 grupos geradores
_________
Nota de MR:
Vd. último poste da série de:


Guiné 63/74 - P4306: Blogpoesia (46): O sexo em tempo de guerra (Luís Graça)

Bajuda no Cais de Bambadinca. Quadro a óleo pintado, em 2007, por Jaime Machado, ex-Alf Mil Cav do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70, e membro da nossa Tabanca Grande (*). Edição e reprodução, com a devida vénia.

Foto: © Jaime Machado (2008). Direitos reservados.


Guiné > Zona Leste > Bafatá > "O Bataclã, um dos pontos de lazer e divertimento da rapaziada" (Manuel Mata, ex-1º cabo apontador de Carros de Combate M 47, Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640, Bafatá e Piche, 1969/71)...

"Quando se chegava a Bafatá, para retemperar forças lá vinha um fim-de-semana, uma folga, que era reconfortante, com uma ida ao cinema, ao café da D. Rosa, do Teófilo, da Trasmontana, ao Bataclã, à piscina da nossa bela Bafatá que, em 12 e 13 de Março de 1970, teve as cerimónias de elevação a cidade, onde esteve presente o Ministro do Ultramar" (**)...

Foto: © Manuel Mata (2006). Direitos reservados.


Guiné > Zona Leste > Gabu > Canjadude > CCAÇ 5 (1973/74) > Canjadude, a Ilha dos Amores. Ou: os tugas e a psico... E no meio, uma bajuda fula, linda de morrer, objecto de desejo... Sob o olhar vigilante da mamã, e rodeada dos manos mais pequenos... Repare-se como os tugas, passada a primeira surpresa da exposição ao nu étnico, se apoderaram rapidamente do termo psico e deram-lhe uma outra conotação... mais épica, mais erótica, mais camoniana... (Espero que o nosso Big Brother não caia na tentação de considerar este material como pornográfico e pedófilo...). (***)
Foto: © João Carvalho (2006). Direitos reservados


























Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (Junho 69 / Mar 71) > O Fur Mil At Armas Pesadas Henriques, com o Sold Apont Mort 60 Umaru Baldé, o puto (já falecido), e o 1º Cabo José Carlos Suleimane (que hoije vive em Amedalai), do 4º Gr Comb, em Finete, no Cuor (à esquerda); e no cais de Bambadinca (à direita), com os seus papéis debaixo do braço, e a pulseira de missangas vermelhas no pulso esquerdo...

Não tendo a especialidade de atirador de infantaria, o Henriques era o pião de Nicas do Capitão Inf QP Carlos Brito (hoje Cor Ref), tendo com isso percorrido todos os 4 Gr Comb da CCAÇ 12, e apanhado, no mato, a porrada suficiente para um dia poder contar aos netos, se os tiver, que a morte é certa mas que a vida é bela e vale a pena ser vivida...

Fotos: © Luís Graça (2005). Direitos reservados





Deixa soltar as tuas gargalhadas (****)...

Amorosa Helena,
pequena fula dengosa,
salva das garras do Islão
por zelosos missionários,
católicos,
apostólicos,
romanos,
mas não da faca da fanateca,
que te extirpou,
na festa do fanado,
o teu belo clitóris,
para te tornares o colchão de todas as camas,
a Vénus negra de batalhões inteiros,
a iniciadora sexual de tugas,
mancebos
que as sortes vieram arrancar às saias das mamãs,
a alegre,
a divertida,
a traquinas companheira de muitas farras de caserna,
correndo, nua e lasciva,
do regaço de tropas bêbedos que nem cachos,
para o abrigo mais próximo
quando às tantas da madrugada
soava o canhão sem recuo,
estoirava o morteiro 82,
disparavam os RPG
e silvavam as balas das Kalash!...

Bela Helena de Bafatá,
que sabias pôr na ordem
os arruaceiros paraquedistas de Galomaro
que te batiam à porta a pontapé,
quando eu estava contigo,
deitado na tua liteira,
e me dispensavas pequenas gentilezas
- um ronco de missangas, vermelhas,
uma noz de cola,
uma cantilena da tua infância,
um punhado de mancarra seca ao sol,
uma talhada de papaia que trazias do mercado -,
sempre que eu ia a Bafatá
e procurava a tua companhia,
na melhor das hipóteses,
uma vez por mês,
no dia de folga dos guerreiros de Bambadinca…
Tu e as tuas amigas de Bafatá,
do Bataclã,
que tanto trabalho deram
ao competentíssimo furriel enfermeiro Martins,
que nunca punha os pés fora da sua morança,
e que eu duvido que alguma vez tenha ido a Bafatá,
o nosso querido Pastilhas (*****),
que vivia 24 horas dentro do arame farpado,
no perímetro militar de Bambadinca,
trabalhando incansavelmente,
de bata branca,
em prol de uma Guiné Melhor,
que nos aturou mil e um travessuras,
bravatas,
praxes,
esperas,
serenatas,
tainadas,
emboscadas,
partidas de mau gosto,
brincadeiras estúpidas e perigosas,
bebedeiras de caixão à cova
e que sobretudo nos curou
de alguns valentes esquentamentos

Destes e doutros males de amores,
dos milhões de unidades de penicilina
com que tu subtilmente te vingaste dos machos,
estás perdoada, Helena,
abelha do mel e do ferrão.
Afinal, quem vai à guerra,
dá e leva…
Tu curavas-nos dos males da alma,
o Pastilhas das mazelas do corpo…
Entretanto, quando a guerra acabou,
para mim
e para os demais tugas da CCAÇ 12,
por volta do mês de Março de 1971,
não tive tempo de te devolver
a pulseira de missangas vermelhas,
nem sequer de te dizer uma palavra,
um Adeus, até sempre,
um adeus, triste,
com saudade,
essa coisa que os tugas nunca te souberam explicar,
mas sem regresso,
e sem lágrimas,
que Lisboa estava ali,
tão longe e tão perto...
Prometi guardar de ti
a doce lembrança,
das tuas estridentes e saudáveis gargalhadas,
da tua voz rouca e sensual,
da tua fala encantatória,
do cheiro exótico do teu corpo,
das tuas sagradas funções de sacerdotiza
do amor em tempo de guerra…

Imagino que a tua vida não tenha sido fácil
depois da independência,
se é que lá chegaste,
com vida e saúde…
Se sim, não sei como viveste esse dia,
24 de Setembro de 1974,
não sei te raparam o cabelo,
ou se te apedrejaram, amarrada a um poilão,
ou se te violaram
ou se te renegaram para sempre,
que a pior das mortes
é a morte social.
Nunca mais tive notícias tuas,
mas, dez anos,
revendo mentalmente
a minha primeira viagem,
por terra,
em pleno chão fula,
do Xime até Contuboel,
onde os esperavam os nossos queridos nharros,
ao longo do interminável dia 2 de Junho de 1969,
o teu nome,
o teu rosto,
a tua voz,
o teu odor,
o teu corpo,
a tua púbis,
e as tuas gargalhadas, quiçá magoadas,
vieram-me à lembrança…
E essa lembrança tocou-me.

Lembrei-te de ti,
da história que se contava sobre ti,
passada em Ponta Coli,
entre o Geba e o Udunduma,
frente à vasta bolanha de Samba Silate,
agora seara inútil de capim alto,
com o cadáver do furriel vagomestre do Xime nos braços.
Lembrei-te de ti
e das minhas escapadelas a Bafatá…
Ia-se a Bafatá,
a bonita e alegre Bafatá colonial,
para limpar a vista,
entrar no café da Dona Rosa,
ver as manas libanesas,
comprar umas bugigangas da civilização,
comer o bife com ovo a cavalo na Trasmontana,
dar um salto ao Bataclã
e passar pelo Teófilo,
para o copo de despedida,
antes de apanhar o último Unimog,
de regresso a Bambadinca...

Eram os únicos momentos do mês
em que eramos donos do nosso tempo,
em que a nossa liberdade não estava cercada
de arame farpado e minas,
nem pensávamos na emboscada de ontem
nem na operação de amanhã.
Também foste, à tua maneira,
uma heroína daquela guerra,
minha impossível amiga colorida,
separada pelos papéis
que nos obrigaram a representar
no teatro da tragicomédia daquela guerra…
Daí figurares,
contra toda a ortodoxia
(do teu povo, fula,
dos teus missionários, cristãos, que te queriam a alma,
dos tugas, putos de vinte anos,
que apenas te queriam o corpo,
dos revolucionários do PAIGC
que não te terão perdoado
o teu colaboracionismo com os tugas,
para mais sendo tu conterrânea do pai da Pátria,
o pobre do Amílcar Cabral
tantas vezes morto e remorto
ao longo destes anos todos),
daí figurares, dizia eu,
na minha galeria de heróis
e de heroínas…
Por direito próprio,
com todo o direito,
com o direito que ganharam as mulheres do teu país,
pobres,
as mais pobres dos mais pobres,
mas sempre dignas e corajosas,
apesar de ofendidas e humilhadas,
exploradas,
violentadas pelo sistema,
pela guerra,
pela dominância dos machos,
pelo imperativo da sobrevivência,
pela lotaria da geografia e da história…
Aceita esta pequena homenagem da minha parte.
Em contraparida,
dá-me o derradeiro prazer,
esse prazer tão terno,
de te ouvir soltar as tuas gargalhadas,
minha safada Helena de Bafatá,
onde quer que estejas,
...na terra,
no céu
ou no inferno!

Luís Graça (*******)
_____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 24 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3092: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (1): Pinturas, de Jaime Machado; As Capelas de Leça, de José Oliveira

(**) Vd. poste da I Série > 25 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLII: Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71) (Manuel Mata) (3)

(...) Café do Teófilo: À saída de Bafatá, na estrada para Bambadinca. Este homem era sobrevivente de um grupo desterrado para a Guiné nos anos 30. No período da guerra era apontado como sendo informador do IN. Foi pessoa com quem me dei particularmente bem, pois tinha pelos alentejanos (em especial de Portalegre) um carinho especial. Era sítio que eu visitava com alguma regularidade, tomava-se uma cerveja gelada, com alguma descrição, acompanhada de uma breve conversa. Era uma pessoa de parcas palavras. (...)

(***) Vd. poste da I Série > 17 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - DCXXXVII: Mais fotos de Canjadude (CCAÇ 5, 1973/74) (João Carvalho)

(****) Vd. poste de

12 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLIV: A galeria dos meus heróis (3): A Helena de Bafatá (Luís Graça)

(*****) Vd. postes de:

13 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1366: A galeria dos meus heróis (6): Por este rio acima, com o Bolha d'Água, o Furriel Enfermeiro Martins (Luís Graça)

5 de Dezembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3567: Humor de caserna (7): O Pastilhas e a bajuda (Gabriel Gonçalves, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71)

(******) Vd. restantes postes da série A galeria dos meus heróis:

1 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1014: A galeria dos meus heróis (5): Ó Pimbas, não tenhas medo! (Luís Graça)

1 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1011: A galeria dos meus heróis (4): o infortunado 'turra' Malan Mané (Luís Graça)

14 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLII: A galeria dos meus heróis (2): Iero Jau (Luís Graça)

13 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXXVIII: A galeria dos meus heróis (1): o Campanhã (Luís Graça)


(*******) Convenhamos que o tema (o sexo em tempo em tempo de guerra...), se não é tabu (porra, já somos crescidinhos!), também não se presta muito a inconfidências na praça pública (incluindo a blogosfera)... (Estou a repetir o que já disse, por outras palavras, noutra ocasião).

Por pudor (?), no bando dos machos que já foram dominantes, não se fala muito das velhas proezas amorosas ou simplesmente sexuais... Mesmo assim, o tema já inspirou alguns dos nossos melhores prosadores (e poetas)... E até temos um mão cheia de textos de antologia sobre as nossas bravatas sexuais e os nossos (des)amores. Não cito nomes, por que não quero correr o risco de ser injusto nem muito menos tirar o prazer da leitura e da descoberta, em primeira mão...

Falo aqui, não como editor, mas simples leitor do blogue (se me for permitido, de quando em quando, esse privilégio de poder mudar de papel como quem muda de camisa, violando a regra da isenção e da equidade)... Eis uma lista (incompleta, provisória, quiçá arbitrária) de postes sobre este tópico, que tem os seus defensores e os seus críticos:

21 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4065: As Nossas Queridas Enfermeiras Pára-Quedistas (7): Os tomates do Capelão da BA 12, Bissalanca... e outras frutas (Miguel Pessoa)

5 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3025: Os nossos regressos (7): Perdido, com um sentimento de orfandade, pelos Ritz Club, Fontória, Maxime, Nina... (Jorge Cabral)

1 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3546: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (14): Em Junho de 69 havia bajudas a alternar no Tosco, na Conde Redondo (Jorge Félix)

19 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2556: Estórias de Bissau (16) : O Furriel Pechincha: apanhado ma non troppo (Hélder Sousa)

21 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2290: Estórias de Bissau (14) : O Pilão, a menina, o Jesus e os pesos que tinha esquecido (Virgínio Briote)

19 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2281: Estórias de Bissau (13) : O Pilão, a Nônô e o chulo da Nônô (Torcato Mendonça)

17 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2272: As nossas (in)confidências sobre o Cupelom, Cupilão ou Pilão (Helder Sousa / Luís Graça)

14 de Novembro de 2007 >Guiné 63/74 - P2264: Blogue-fora-nada: O melhor de... (3): Carta de Bissau, longe do Vietname: talvez apanhe o barco da Gouveia amanhã (Luís Graça)

28 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1554: As mulheres que ficaram na rectaguarda (Luís Graça /Paulo Raposo / Paulo Salgado / Torcato Mendonça)

3 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1490: Favores sexuais furtivos em Mampatá (Paulo Santiago)

2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1484: Estórias de Bissau (10): do Pilão a Guidaje... ou as (des)venturas de um periquito (Albano Costa)

1 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1483: Blogoterapia (16): Males de amores ou... Tenho um lenço da minha lavadeira ali guardado na gaveta (David Guimarães et al)

31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1476: Blogoterapia (15) : Mulher tua (Torcato Mendonça)

31 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1475: A chacun, sa putain... Ou Fanta Baldé, a minha puta de estimação (Vitor Junqueira)

24 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1314: Estórias de Bissau (8): Roteiro da noite: Orion, Chez Toi, Pilão (Paulo Santiago)

18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1290: Estórias de Bissau (7): Pilão, os dez quartos (Jorge Cabral)

18 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1289: Estórias de Bissau (6): os prazeres... da memória (Torcato Mendonça)

11 Novembro 2006 > Guiné 63/74 - P1267: Estórias de Bissau (2): A minha primeira máquina fotográfica (Humberto Reis); as minhas tainadas (A. Marques Lopes)

20 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P974: Estórias cabralianas (12): A lavadeira, o sobretudo e uma carta de amor

4 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P936: Estórias cabralianas (11): a atribulada iniciação sexual do Soldado Casto

18 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLV: Teresa: amores e desamores (Virgínio Briote)

17 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 -DXLVI: Estórias cabralianas (5): o Amoroso Bando das Quatro em Missirá

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4305: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (3): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (II Parte)

1. Mensagem de Fernando Gouveia, ex-Alf Mil Rec Inf, Bafatá, 1968/70, com data de 2 de Maio de 2009:

Porto: 02MAI09

Caro Luís/Caro Carlos:

Com as agulhas acertadas e já em velocidade de cruzeiro, junto envio em anexo a 3.ª estória, 2.ª sobre Madina Xaquili - Parte 2.

ab
Fernando Gouveia



A GUERRA VISTA DE BAFATÁ

3 - UM ALFERES DESTACADO (DESTERRADO) EM MADINA XAQUILI COM UM CANO (SÓ O CANO) DUM MORTEIRO 60 - Parte 2.

Preâmbulo

Como referi anteriormente, na sequência do agravamento da situação no Cossé, fui destacado para Madina Xaquili, onde vivi uma experiência verdadeiramente inesquecível.

No Poste anterior – 4256 (1.º e 2.º dias dessa minha experiência), passei por Bambadinca, onde tive que ir para cima dum abrigo até à uma da manhã, por se estar à espera de um ataque (que por acaso foi no dia seguinte) e também por Galomaro onde não consegui dormir por causa das rãs.



Relato do 3.º dia – 14JUN69:

Nesse dia, bem cedo, lá seguiu uma coluna de uns três ou quatro Unimogs para nos colocar no último buraco habitado em direcção ao Corubal e a Madina do Boé, então já abandonada [, cinco meses antes, em 6 de Fevereiro de 1969].

Pelo caminho e, por indicação dos meus camaradas, tivemos que ir a uma tabanca, suponho que Umaro Cossé, encher uns garrafões com água, pois não se sabia com o que se contava em Madina Xaquili. Lá fui entabular conversações com o chefe da tabanca no sentido de nos fornecer o precioso líquido.

Cabe referir que duma maneira geral achei os nativos na Guiné sempre muito simpáticos e corteses. Não foi o que aconteceu em Umaro Cossé. Fiquei com a ideia que teriam água boa, mas a do poço que nos indicaram parecia leite, cal de pintar ou coisa assim. Dava a ideia que nos queriam despachar. Foi a água que levámos. Mais tarde, já em Madina e porque dispúnhamos de um filtro, essa água até se bebia. Mas era preciso limpá-lo constantemente.

Madina Xaquili vista de Sul (direcção de Padada). Em 1.º plano a lavra de mancarra do João

Chegámos a Madina Xaquili a meio da manhã. Era uma tabanca com umas 20 palhotas. Estava em auto-defesa, com cerca de 40 milícias, comandados pelo também africano João Vieira (sem Bernardo). Havia uma razoável cerca de arame farpado e abrigos construídos recentemente. A população civil (2 ou 3 famílias) e as mulheres dos milícias não tinham abrigos.

Um dos abrigos. Em segundo plano vê-se parte da antena dipolo que montámos

A coluna regressou a Galomaro e ali ficámos sós e isolados. O princípio da época das chuvas estava a deixar impraticáveis as picadas e, como não tardámos a verificar, o rádio que levámos, um daqueles que tinham um gerador manual e com os quais até se conseguia ligar de Bissau para Lisboa, só de dia conseguia contactar Galomaro e apenas em morse. À noite nem isso. Coisa estranhíssima, mas real, tendo em conta uma distância de uns 25 Km.

Estava a chegar o fim da manhã e havia muito a fazer.

Comecei por perguntar ao João Vieira que munições tinham para as suas armas, metade Mausers, metade G3. A resposta foi zero, zero. Tinham gasto tudo na caça e não podiam justificar um novo pedido pois nunca tinha havido contacto com o IN. Insólito… Peguei numa das suas armas e espreitei pelo cano. Estava completamente entupido. De acordo com o João, como aliás sempre aconteceu com as decisões a tomar sobre os problemas da tabanca, lá foram limpar as armas e municiarem-se.

Como havia palhotas vazias, o João indicou-no-las e instalámo-nos. O cozinheiro já sabia que tinha que fazer o almoço e o rádio-telegrafista andava às voltas com a instalação de uma antena.

A minha casa. Ao meu lado o Sajuma, que se viria a oferecer para ajudante de padeiro

A primeira refeição foi com o prato nos joelhos (ver foto) mas ao jantar, com umas tábuas, já se tinham improvisado, uma mesa, dois bancos e um coberto com folhas de palmeira.

A 1.ª refeição, ainda sem refeitório

Depois do almoço, acompanhado com cervejas a uns 30 ou 40 graus, dei as primeiras instruções:

1 – (só aos metropolitanos) Não iria tolerar problemas relacionados com sexo, até porque na tabanca só havia as mulheres dos milícias e nada de bajudas. Que fossem criativos, e foram, como mais tarde descreverei.

2 – (para todos) Quando se sentisse o ruído de viaturas ou de helis, toda a tropa se devia apresentar minimamente fardada e em passo de corrida. Imaginava que lá aparecesse o Caco, mas só apareceu o Cor Hélio Felgas, de heli.

3 – Enquanto não se construíssem latrinas dentro do arame, todo o militar que fosse à orla da mata levaria um camarada armado para lhe fazer a segurança.

A par disso, formei um grupo para fazer uma mesa e uns bancos e outro para começar a abrir o abrigo para o nosso precioso cano de morteiro 60 e suas 16 granadas. Ficou perto da minha palhota pois seria eu que o manobraria (em Mafra tinha tido a oportunidade de fazer bastantes disparos para um velho blindado que existia lá na Tapada).

Por mim, decidi, com a companhia do João, ir ver as cercanias e nomeadamente o local, fora do arame, onde as mulheres se abasteciam de água e lavavam a roupa, pois era urgente arranjar água de melhor qualidade.

A nascente de água onde as mulheres também lavavam a roupa

Fotos e legendas: © Fernando Gouveia (2009). Direitos reservados


Já com o fim do 1.º dia a chegar, havia um turbilhão de ideias na minha cabeça sobre as medidas a tomar urgentemente, tanto mais que o rádio-telegrafista me veio informar que não conseguia estabelecer ligação com a sede da Companhia. Sabia, já do Agrupamento, que o IN estava a uns escassos 10 Km, que vim a confirmar mais tarde quando fiz uma operação na zona de Padada.

Antes do pôr-do-sol tomámos a 2.ª refeição preparada pelo nosso cozinheiro, um rapaz atestado, que já tinha estado na Legião Estrangeira. Já jantámos sentados à mesa improvisada, estando eu de calções. Só depois verifiquei que tinha sido massacrado pelos mosquitos. As minhas pernas tinham muitas dezenas de picadas. Passei um pouco mal.

Ver relampejar ao longe e a conversar com alguns milícias, sentado num tronco constituiu o prelúdio da minha 1.ª noite em Madina Xaquili.

Como era sabido, quase todos os ataques e flagelações na zona Leste, eram feitos invariavelmente ao princípio da noite por causa da retirada IN, como aliás aconteceria no 1.º ataque à tabanca, em 24JUL69. Bambadinca constituiu uma excepção pois a aproximação IN não podia ser feita de dia por causa da população Civil das imediações, afecta às NT. Assim sendo, este alferes, sabendo disso, às nove dez horas da noite, enfiava um pijama e dormia que nem um justo. Acho que nessa altura já estava apanhado pelo clima. Se fosse hoje dormiria de camuflado. Não me estou agora a ver ir operar o morteiro em pijama ou muito menos aparecer em Galomaro na mesma figura, o que poderia ter acontecido, como descreverei no último episódio desta estória.

Nos dois dias seguintes, iriam ser levadas à prática as medidas que não deixavam de fervilhar na minha cabeça, mas isso será tema para o próximo poste onde também contarei que desisti de construir latrinas por causa do meu poio que desapareceu.

Até para a semana, camaradas.
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Nota de CV:

Vd. os dois postes anteriores desta série>

28 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4256: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia (2): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60
27 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4254: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (1): Três oficiais: um General, um Coronel, um Alferes - suas personalidades

Guiné 63/74 - P4304: (Ex)citações (27): Lembrando a memória de meu tio Manuel Sobreiro, morto por uma mina (Nelson Domingues)

1. Nelson Domingues deixou um novo comentário no poste "Guiné 63/74 - P4296: Espelho meu, diz-me quem sou..." (*):

O texto de António Garcia de Matos, Alf Mil CCAÇ 2790 trouxe-me à memória as peripécias que o meu tio deve ter tido aquando da sua comissão na Guiné, o tal que montava, desmontava, cavilhava, descavilhava (**).

Infelizmente o meu tio perdeu o jogo das minas e armadilhas, porque nesse jogo do montar, desmontar, cavilhar e descavilhar, as formigas decidiram participar nele… e com isso não poderei ouvir histórias como esta.

Texto emblemático sobre a frieza e coragem de quem tinha a especialidade de minas e armadilhas, e ficou-me na retina a frase "O homem é um animal de hábitos e cai frequentemente no erro das rotinas."

Bem-haja António Matos

Guiné > Guileje > BART 1896 > CART 1612 (1967/69) > O Alf Mil de Minas e Armadilhas, Manuel Sobreiro, natural de Leiria, morto numa acidente com um granada defensiva, em Mampatá, em Fevereiro de 1968.

Em tempo

Pelas 22h e 11m de hoje, chegou mais este comentário de Nelson Domingues:

Caro António Matos,
Sou da geração pós guerra, e tive um tio que faleceu ao manusear uma mina, em 24 Fevereiro de 1968 na Guiné, ele era Alferes Miliciano com a especialidade minas e armadilhas, e criei um blogue em sua homenagem, onde descrevo a sua passagem na guerra, com o título As Verdades do Sobreirito, http://sobreirito.blogspot.com/.

Verdades, porque existiram muitas versões (verdades) sobre a morte do meu tio, e o sobreirito, porque era assim que o saudoso Zé Neto o tratava, e assim ficou, as verdades do sobreirito.

Respondendo às suas perguntas:

Interessa-lhe o tema da guerra do ultramar?
Que opinião formou já sobre o assunto ?
De que maneira lhe marcou a vida ?
Quantos familiares seus por lá passaram ? E onde ?


O tema sobre a guerra interessa-me porque permite conhecer o meu tio, a minha gente, o meu País que nunca conheci. Nada dou, e recebo muito….

Mas o que me marca a mim de uma geração que pertence ao pós guerra, é ter o privilégio de poder contactar seres humanos fantásticos como os senhores.

Não me esqueço que ao iniciar o meu blogue em 2007, pedi ajuda na descoberta das verdades do sobreirito, e o Sr. Luís Graça, abriu-me a porta e disponibilizou-me a informação, publicou um post e deu-me palavras de incentivo, foi a arte de bem RECEBER, confesso que pensei o oposto, pensei que as pessoas que lutaram na guerra, fossem pessoas corporativistas, egocêntricas… puro engano os senhores são amáveis, solidários, um património a homenagear.

Venho quase todos os dias espreitar o blogue, a vossa história, é minha história, e desde já agradeço o post do amável Carlos Vinhal, hoje publicado.

Um abraço amigo!
Nelson Sobreira Domingues

Comentário de CV:

Porque não tenho palavras para o qualificar, caro Nelson, deixo-lhe um bem haja e um obrigado pelas suas palavras.
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(*) Vd. poste de 7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4296: Espelho meu, diz-me quem sou eu (2): António Matos

(**) Sobre a morte do Alf Mil Manuel Sobreiro, vd. postes de:

14 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1849: Quero prestar a devida homenagem ao meu tio, o Alf Mil Manuel Sobreiro, da CART 1612, morto em Mampatá em 1968 (Nelson Domingues)

20 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1861: Homenagem ao meu tio, Alf Mil Minas e Armadilhas, Manuel Sobreiro, do BART 1896 / CART 1612 (Nelson Domingues)

6 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2160: Militares mortos em campanha, no sul, entre Fevereiro de 1968 e Janeiro de 1969 (J. C. Abreu dos Santos), onde se pode ler:

Resumo de baixas mortais ocorridas em 24Fev68-27Jan69 no sul da Guiné (Mampatá, Mejo, Quebo, Guileje, Gandembel, Ponte Balana)– sábado 24Fev68 † MANUEL DE JESUS RODRIGUES SOBREIRO nascido em 1942, na freguesia de Souto da Carpalhosa, concelho de Leiria Alf Mil Art M/A, 2ºCmdt da CART 1612/BART 1896-RAP2 (a 6 meses do final da comissão); morre em «acidente» com deflagração de granada defensiva, na região de Mampatá.

5 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3174: Em busca de... (38): Causas da morte do Alf Mil Manuel Sobreiro (Mampatá, 1968) Parte I (José Martins)

7 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3182: Em busca de... (38): Causas da morte do Alf Mil Manuel Sobreiro (Mampatá, 1968) Parte II (José Martins)

Vd. último poste da série de 7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4297: Comentários que merecem ser postes (5): Falando da condição feminina e das enfermeiras pára-quedistas (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P4303: Convívios (123): 20º Almoço Convívio da 1ª Cia. do BCAV 8323, no dia 30 de Maio de 2009, em Anadia (Amilcar Ventura)


O 20º Almoço Convívio da 1ª Companhia do Batalhão de Cavalaria 8323 vai decorrer no dia 30 Maio 2009, em Anadia, nas Caves Aliança.
O local de reunião será junto às Caves Aliança, na Rua do Comércio, nº 444 – Sangalhos -, pelas 10,30h.
A confirmação deve ser feita até o dia 22 de Maio de 2009, para o José Tomás Fernandes, Rua N.ª Srª Misericordia, nº 10 - Ferreiros, 4705 -315 Braga.
Contactos: 253 672 374 (das 9.00 às 18.00 Horas), 964 241 854 (Paula), ou 253 673 929 (a partir das 21.00 horas).
Amilcar José das Neves Ventura
__________
Nota de MR:

Vd. último poste da série de:

7 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4302: Convívios (120): Pessoal da CCS DO BCAÇ 3872, Confraternizou no dia 3 de Maio de 2009, no Cartaxo (Juvenal Amado)


Guiné 63/74 - P4302: Convívios (122): Pessoal da CCS DO BCAÇ 3872, Confraternizou no dia 3 de Maio de 2009, no Cartaxo (Juvenal Amado)


Almoço da CCS do BCAÇ 3872 no Cartaxo
A CCS do BCAÇ 3872 levou a efeito no passado dia 03.05. 009 o seu almoço e convívio no Cartaxo.
Um belíssimo dia de sol contribuiu, sobremodo, para que a festa fosse óptima.
Apareceram camaradas, que nunca tinham participado, tais como o ex- Alferes Médico Rui Vieira Coelho (que substituíu o médico Pereira Coelho) e o também ex-Alferes de Transmissões Mário Vasconcelos, (que substituiu o Alferes Mota após a morte deste).
Na classe dos ex-sargentos o furriel Adão também participou pela primeira vez.
Estes camaradas levaram um largo espólio fotográfico, que na devida altura porei à disposição do blogue.












Caramba, esposa e a minha mãe - Dois camaradas do Dulombi












De pera o ex-Alferes Médico Vieira Coelho, à sua esquerda o ex-Alferes de Transmissões Vasconcelos e, de bigode, o ex-Furriel de Transmissões Marques - A partir da esquerda: o pessoal das Transmissões - Sousa, Vasconcelos e Silva, e o Sardeira que foi condutor da água.













Silvestre, Costinha e Alfredo Estufa - A partir da esquerda: o ex-Alferes Vasconcelos e os Furriéis Marques, Adão (Escriturário) e o Aurélio (Sapador).
O MENU, muito variado, contou com a seguinte ementa:
1º Prato de..................................................reencontro
2º Prato de..................................................emoção
3º Prato........................................................convívio
Bebeu-se o vinho.........................................da alegria
Teve-se como sobremesa um....................brilho nos olhos
O café.............................................................já saudade
Na despedida, foi servido um licor amargo e doce de: até para o ano.
Foi com esta variedade de pratos, todos superiormente confeccionados, que decorreu o nosso almoço onde participaram alguns camaradas do Dulombi, Saltinho e outros convidados.
As fotos deixam bem expressa a alegria que reinou neste repasto.
Um abraço,
Juvenal Amado

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4301: In Memoriam (22): Carlos Rebelo, a última batalha (Abilio Machado, ex-Alf Mil, CCS / BART 2917, Bambadinca, 1970/72)


Viseu > 16 de Abril de 2008 > O Carlos Rebelo no último convívio do pessoal da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72). Na mesma mesa, assinalado com um rectângulo a verde, o Abílio Machado (*).

Fotos:© Benjamim Durães (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do Abílio Machado, ex-Alf Mil, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72):


Caros amigos:

O Carlos Rebelo jaz agora em descanso (**).
Finalmente.
O seu rosto sereno diz a quem o vê
que ele precisava de descansar.
O filho, Carlos Filipe, disse-me ontem
que esta foi uma guerra dura.
A segunda da vida.
Não a perdeu.
Foi descansar.
O Rebelo foi sempre um homem inquieto,
curioso,
informado,
interventivo.
Assim foi até ao fim.
Não o esqueceremos .

Um abraço a todos,
Abílio Machado (***)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste do 16 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2847: Convívios (57): CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72): Viseu, 26 de Abril (Jorge Cabral)

(**) Vd. poste de 6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4291: In Memoriam (21): Faleceu hoje o nosso camarada Carlos Rebelo, ex-Fur Mil, CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) (Benjamim Durães)

(***) Vd. postes de:

7 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3579: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (7): A Toque de Caixa, com o Abílio Machado, ex-baladeiro de Bambadinca (Luís Graça)

17 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1763: Quando a PIDE/DGS levou o Padre Puim, por causa da homília da paz (Bambadinca, 1 de Janeiro de 1971) (Abílio Machado)

29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1635: Amigos, enquando vos escrevo, bebo um Porto velho à nossa saúde (Abílio Machado, CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72)

28 de Março de 2007> Guiné 63/74 - P1631: À amizade (Abílio Machado, CCS do BART 2917/ Humberto Reis, CCAÇ 12)

13 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1520: Bambadinca, CCS do BART 2917: Alferes Abílo Ferreira Machado, o Bilocas da Cooperativa (Humberto Reis)

Guiné 63/74 - P4300: Ser solidário (35): Criação da Associação Portuguesa de Apoio Cultural e Económico à Guiné-Bissau (Zé Carioca)

1. Mensagem de José António Carioca, ex-Fur Mil da CCAÇ 3477, Guileje, Nov 1971/Dez 1972, com data de 7 de Maio de 2009: 

Caro Luis 
Tenho contactado com o Zé Teixeira sobre o assunto em referência. Antigamente usava o meu número de conta para a recolha de verbas enquanto a Associação (APAG) não estava devidamente regularizada. Entretanto fui dando mais importância ao trabalho de desenvolvimento dos projectos que tinha em mente, por vezes havia dificuldade em juntar as pessoas no mesmo dia para registar a dita Associação, até os documentos já tratados, por serem provisórios, perdiam a validade. Agora sim, isto está no rumo certo e, mais uns dias, já te posso enviar o número de conta da Associação que se passa a chamar APACEG (Associação Portuguesa de Apoio Cultural e Económico à Guiné-Bissau). 

Obviamente que agradeço àqueles que depositaram confiança em mim quando no ano passado depositaram dinheiro na minha conta particular para que pudesse comprar as sementes (*). Com a APACEG toda a gente pode contribuir com uma cota mensal ou de qualquer outra maneira, e a responsabilidade é de várias pessoas. 

Estou neste momento também a desenvolver um peditório de livros pelas escolas da minha zona, roupas e outros artigos que possam ser úteis para ajudar o povo da Guiné, brevemente te darei mais notícias e todos os dados para que se quiseres divulgar no blogue. 

Um abraço 
José Carioca

  Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > 2 de Março de 2008 > Três homens com um ar de felicidade... Ei-los aqui fotografados com um tesouro, a estatueta, em metal, da santa protectora dos Gringos de Guileje, encontrada nas escavações arqueológicas do antigo aquartelamento de Guileje... Da esquerda para a direita os valorosos representantes da penúltima unidade quadrícula de Guileje, a CCAÇ 3477 (Nov 1971 / Dez 1972): José Carioca, Abílio Delgado e Sérgio Sousa... O Zé Carioca é actor de teatro (amador?) e sei que vive em Cascais.
 __________ 

Notas de CV: (*) 

Guiné 63/74 - P4299: Histórias de Juvenal Candeias (1): Pirofobia ou a mina que não rebentou por simpatia


Mina antipessoal PMD-6



Mina anticarro TM-46 

 Fotos de David Guimarães e Carlos Vinhal (editadas por Carlos Vinhal)

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 Nota de CV: 



1. Mensagem de Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cameconde, 1971/74, com data de 7 de Abril de 2009: 

 Caro Luís Graça, 

Espero que estejas bem! Não sei se ainda te lembras de mim, mas trocámos mails aqui há algum tempo, a propósito de alguém que o Nuno Rubim procurava! Na altura pediste-me para escrever alguma coisa sobre a minha experiência na Guiné! Acho que já tanta gente escreveu sobre a Guiné, com mais conhecimento do que eu, que não tive coragem!... 

Contudo, os meus filhos insistem há algum tempo, para que escreva algumas historietas, daquelas que eles sempre gostaram!... Comecei, então, a escrever, para eles... Não sei se vês algum interesse neste estilo, mas envio-te um dos textos para analisares! Se tiveres interesse, depois mando mais! Se não... não deixo de ser teu amigo! 

 Um grande abraço. Juvenal Candeias 

  PIROFOBIA 9 Março 1972 

 Cacine: derradeira povoação importante a Sul da Guiné, situada na margem esquerda do rio com o mesmo nome. Predomínio da população de etnia Nalú, convivendo com minorias Sossas e Fulas. Os Sossos, embora minoritários, tinham levado à Sossização dos Nalús, processo de aculturação que consistiu na adopção do dialecto Sosso e na conversão ao Islamismo da quase totalidade da população Nalú, que era feiticista. 

Daqui derivou a instituição do casamento por compensação e a abolição do casamento por troca. A repressão na arte Nálu, fez-se igualmente sentir, dado que o Islamismo proibia qualquer representação figurativa. À época, Mussé Camará era o único artista de arte Nalú existente em toda a Guiné e alguns dos seus maravilhosos exemplares de estatuária de madeira podiam ainda ser apreciados em Cacine, com procura elevada, mesmo do estrangeiro! 

 Cacine constituiu a base da Companhia de Caçadores 3520, um agradável aquartelamento à beira-rio, onde as casernas se distribuíam entre coqueiros, mangueiros e laranjeiras. Daqui saiu em 9 de Março de 1972, numa manhã fresca da época seca, em que, parece impensável, o frio entrava pelos ossos, um Gr Comb reforçado com uma Secção de milícias,  nativa! 

 A missão era simples, uma patrulha de rotina, ao antigo quartel de Cacoca, mesmo na fronteira com a República da Guiné-Conacri. O aquartelamento de Cacoca tinha sido desactivado há anos, dado o seu isolamento e provável ausência de interesse estratégico, mas as construções não tinham sido destruídas, não voltasse o interesse em reactivá-lo! 

 Pelas 7,30h iniciou-se a coluna auto até ao destacamento de Cameconde, donde a patrulha continuou a pé, por picadas e trilhos – a floresta era inexpugnável, salvo à força de catana, mas a uma velocidade que não ultrapassava alguns (poucos!) metros por hora! 

 O caminho foi lento, seguro e silencioso, interrompido, aqui e ali, pela algazarra dos macacos, em especial a ladração dos macacos-cão, o cantar dos periquitos e outra passarada, a rastolhada de javalis e porcos-espinho ou a corrida furtiva das gazelas! 

 Por volta do meio-dia, com o calor equatorial a fazer-se já sentir com intensidade, a segurança é montada para dar lugar ao almoço! Almoço? Que exagero! Quem pode chamar almoço ao conteúdo de uma ração de combate? Se bem me lembro… uma lata de chouriço, uma bisnaga com creme de sabor indefinido para barrar no pão, uma sobremesa constituída por gomas açucaradas e saborosas, um comprimido de café… e algo mais que a memória (oh! que tristeza, para onde foste?) já não me permite recuperar! 

 De novo a caminho, que Cacoca já não estava longe, sendo atingida por volta das 14 horas! A paisagem era desoladora! Qual farwest! Ao fundo os edifícios em completa ruína, antes deles a pista de aviação, de terra batida e completamente esburacada, o capim a crescer por todo o lado!... O tempo de observação foi curto… alguém clamou… miiiiiina! 

 A mensagem passou rápido, da frente para trás, e toda a gente parou, instalando-se em posição de defesa! Os especialistas na matéria, entre os quais o graduado dos milícias, Sarifo de seu nome, mas popularmente conhecido por “Xerife”, para quem as minas eram como ratoeiras, tal a facilidade com que as levantava, avançaram, de pica em riste, pesquisando o terreno que iam pisar! 

 O prémio era tentador! O Estado pagava 1000 pesos (o escudo da Guiné!) por mina anti-pessoal levantada, 3000 por mina anti-carro. Boa oportunidade para aumentar os parcos rendimentos! E afinal… não era apenas uma mina, havia mais, tratava-se de um campo de minas, instalado na pista de aviação, ao que consta por rumores chegados ao PAIGC de que os tugas iam reactivar o aquartelamento de Cacoca! Ai! A contra-informação a funcionar!... 

 Tratava-se, pois, de trabalho mais exigente a que, de imediato, deitámos mão!... As minas, a maioria antipessoal PMD6, foram progressivamente levantadas, mas algumas tinham surpresa, isto é, uma anticarro TM46 por baixo da antipessoal, o que, naturalmente, demorou a acção! 

 Numa destas situações, depois de levantada a antipessoal, pareceu que a anticarro estaria armadilhada, pelo que o seu levantamento provocaria o rebentamento imediato! Optou-se por não a levantar e proceder ao seu rebentamento no local! Espetou-se um pau no chão, junto à mina, no qual seria presa uma granada ofensiva, cuja cavilha seria puxada à distância, com uma corda… que ninguém tinha levado! 

 Nada estava perdido! Há sempre um mestre na arte da improvisação e alguém se lembrou que para o efeito seriam suficientes as ligaduras do cabo enfermeiro, que rapidamente chegou ao local! Presa a ligadura à cavilha da granada e escondido o mestre da improvisação atrás de um bagabaga (forte construção de terra feita por formigas), foi só puxar a ligadura e… só rebentou a granada! A mina tinha apenas o sistema de detonação danificado, pelo que se exigia uma segunda tentativa!... Não se consumou! O barulho da granada atraíra duas sentinelas avançadas do PAIGC, que foram vistas nas ruínas do quartel – atrás do quartel era a República da Guiné – o que nos obrigou a abandonar o campo de minas e a tomar posição defensiva e segura!  Tratava-se apenas de sentinelas avançadas que fugiram, não havendo qualquer contacto! 

 O caminho de regresso foi tranquilo, com alguns sorrisos irónicos em relação ao Xerife, que transportava as minas em pilha, à cabeça, como se transporta em África qualquer produto! Voltaríamos a Cacoca, mas isso é história para outra oportunidade! 

 O final foi feliz, com os milícias a aumentarem os seus rendimentos e o pessoal da companhia a beber algumas Sagres suplementares! A patrulha dava pelo nome de código PIROFOBIA! Para que conste… ninguém teve medo do fogo!

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Nota de CV:

Vd. poste de 6 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4294: Tabanca Grande (136): Juvenal Candeias, ex-Alf Mil da CCAÇ 3520, Cameconde (1972/74)

Guiné 63/74 - P4298: História da CCAÇ 2679 (17): A última partida e Unimog sublimador (José Manuel Dinis)

1. Mensagem de José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 29 de Abril de 2009:

Caros Editores, Carlos em especial.
Aproxima-se a partida de um Corpo expedicionário, com a ilha da Madeira por destino, onde terá como missão, a consolidação das relações entre aquelas gentes autóctones e os continentais. Trata-se de um Corpo bem preparado, com afinada pontaria aos pratos, e sobejas provas dadas na actividade decilítrica, com cursos, estágios e farta experiência em diferentes redutos. Espera-se, legitimamente, o reforço dos laços de solidariedade entre os participantes, oriundos daquela CCaç dignos de Cabrais e quejandos, que cimentaram as boas práticas, partilhando a água da bolanha.

Assim, dia um, pelas catorze horas, ficam informados os indefectíveis admiradores e admiradoras, de que o ponto de encontro é na nova gare de embarque do aeroporto da Portela. Se entre os bloguistas alguém quiser enviar queijos, paios ou presuntos para algum destino daquela Pérola, ofereço-me como portador.

Carlos, sei que ficas triste, mas a tua ocasião há-de chegar. E vamos à História.
Abraços fraternos


A Última Partida

De regresso a Piche, pensava voltar ao quotidiano, à vida alternativa que me impunha, noite sim, noite não, passar no mato ou no aquartelamento. As noites no aquartelamento significavam grande descontração, mau grado aquela pequena possibilidade de termos que sair inopinadamente. Depois de jantar, aproveitava-as para debicar uns gins até à ceia, enquanto lia ou conversava com os camaradas que aportavam à suite três, ou escrevia à namorada se me sentia de imaginação fértil, ou tomava apontamentos no meu diário, quando não me estendia na cama em busca de sonhos que me alimentassem a vida. Nada de especial, portanto.

Já aperitivado de gins chegava a ceia, composta, como usualmente, pelo cabritinho mais as batatinhas assadas no forno, que regávamos copiosamente com vinho branco-sêco do Rêno, cerveja Super-Bock ou dois-éme, até que, por fim, era a vez da parafernália de digestivos, bebidas para aconchegar o estômago, mas, também, para espairecer, como quem levita sobre um ninho de cucos.

Dos Antiquary e Monks, até aos Courvoisier e Napoleão, a sêco, ou com Perrier, negócio estranho que dispensava a nacional água Castelo, tudo bebidas que tinham o magnífico efeito de estimular raciocínios e conversas, porque nessas ocasiões não há matéria que não sirva uma boa discussão, ou estimulavam o sono retemperador do quebranto.

As paredes forradas de coelhinhas da Plyboy, convidavam aos brindes que, às vezes, traduziam-se em distintas bebedeiras, com o paradoxal efeito da aumentar a sede à medida que mais se bebia.

Uma destas noites aconteceu uma flegelação ao destacamento de Cambor, e nós colocámo-nos nas traseiras do edificio dos quartos, de onde assistíamos aos relâmpagos dos rebentamentos e ouvíamos distintamente a balbúrdia de tiros e deflagrações. Tinha bebido uns copos, não estaria muito católico, e o Branco da Silva referiu-se-me assim:

- Aqueles gajos já têm um morto, e tu estás tão bêbado que não podes lá ir ajudá-los.

Mas quero referir-me à última noite de pocker.

Reunimo-nos no quarto do capelão, homem prudente, que encavava cem paus em cada jogada, raramente ganhava, mas permitia-lhe estar sempre pronto para a jogada seguinte. A coisa corria com normalidade. Por entre o fumo espesso e a bebida toldante, cada um prestava atenção à sucessão de cartas, às alterações faciais de cada parceiro, à projecção de cartas que detinham, e estudavam-se pequenas alterações de expressão, que denunciassem o bluff como a confiança. Passadas algumas jogadas, já tinha um peculiozinho.
Até que numa jogada, baldados os parceiros a jogo, resto eu e o Zé Tito. Sobre a mesa estaria qualquer coisa como dois contitos, verba interessante para premiar quem tinha um fullen de ases por reis. Fazíamos as caves de cem paus, e apostávamos mais cem. Já sentia o dinheiro no bolso. O Zé, também igualava e aumentava, algo indiferente, como quem faz bluff, enquanto eu regozijava.

Este maluco vai ficar em cuecas, pensava para comigo. A minha confiança aumentava. Ele não podia ter pócker, a avaliar pelas cartas já vistas, nem o royal street. O gajo está doido, cogitava. Debicava no whisky e aumentava a aposta. Em redor era a espectativa. Estariam, entretanto, uns cinco contos em jogo (na moeda de hoje, cerca de vinte e cinco euros), quando o Zé pagou para ver. Alarve, atirei com as cartas referindo vitoriosamente azes-por-reis. Bom jogo o meu. O Tito, por cima dos óculos, ainda voltou a olhar e a identificar as cartas e, quando me preparava para arrecadar a massa, quase timidamente, ele anunciou que tinha uma sequência. Não podia ser! Mas era.

Fiquei muito envergonhado comigo mesmo, porque tinha identificado o poder da alienação que o jogo exerce. Eu não queria só ganhar. Também queria deixá-lo na penúria.

O Zé Tito aos comandos e eu no lugar do pisteiro, levamos o Unimog por caminhos indizíveis.

O Unimog sublimador

1 -
Com a nossa energia levávamos o Unimog para todas as direcções, em viagens delirantes de sonho e libertação. Facilmente passávamos os obstáculos, tanto na floresta, como na savana. A paisagem passava sem lhe atribuir grande importância. Era a transição. Um dia chegámos ao principado do Mónaco, onde fomos recebidos pelan princesa Grace e as suas lindíssimas filhas. O ambiente esplendoroso foi cortado pela voz macia e delicada da princesa:

- Tomem-nas e partilhem, que elas são boas para partilhar e vão sentir-se muito recompensadas pela satisfação que vos derem.

Em redor, as graciosas cortesãs pareciam suspirar, e contribuíam para ganharmos o céu.
No dia seguinte levantei-me com um sol radioso. Fui à varanda do palácio, e deparei-me com as soberbas montanhas a deslizar como um reposteiro, suavemente, sobre as águas claras do mar. O jardim conferia uma atmosfera cheia de romantismo, e fazia-me pujante. Abaixo da varanda, o casario do principado, pigmentado por árvores e jardins, onde se destacavam construções de elevado recorte arquitectónico, bordejava o litoral até às docas, onde a alvura dos iates pontilhava com estrelas flutuantes.
A terra imponente abraçava o Mediterrâneo, de onde ouvíamos cânticos de apelo ao regresso a África. Por entre os aplausos de esbeltas criaturas, atingimos a costa do outro lado, atravessàmos o deserto até à Guiné, sempre acompanhados de ossanas amorosas.
À chegada corri para o duche, e lavei-me da pomada de poeira levantada da picada, qual creme nas faces transpiradas.

2 - Outra vez, o Unimog deu-nos asas para irmos buscar duas jornalistas italianas, que tinham por objecto reportar a nossa guerra. Eram jovens, em princípio de carreira, uma loira, outra morena, muito bonitas e comunicativas. Entendiamo-nos num misto de franciulano e portonhol. Por momentos sentia comichão na cara, provocada pelo roçar suave dos seus cabelos finos e perfumados. Era o céu no chão fula. Sentia-me nas nuvens.

No caminho, pela picada, fomos emboscados e atirámo-nos para o chão arenoso, como primeira medida de defesa. Sob o cantar ameaçador da metralhalha, as delicadas repórteres agarravam-se-me na procura de protecção. Com alguma dificuldade a manusear a arma, consegui repelir o ataque, do que resultou uma grande alegria. Ali estávamos os três abraçados, e elas abriram-se com beijos e carinhos de sonho.

Mais tarde, depois de nos despedirmos, relatei à minha namorada esta acção humanitária, gloriosa e fantasiosa, e o tiro quase me saíu pela culatra, ruída que ficou pelo ciúme, reforçado pela distância de milhares de quilómetros, e pela relativa ignorância das oportunidades que tínhamos na terra fula, onde, parecia, eu levava uma vida de deleite e facilidades.


3. Comentário de CV:

Caro José Manuel, só um pequeno aparte para te dizer que não está descartada a hipótese de festejarmos no próximo ano, na Pérola do Atlântico, os 40 anos da saída da CART 2732 do Cais do Funchal, com destino à Guiné. Também irá daqui uma delegação bem representativa dos Continentais para confraternizar com aqueles excelentes e inesquecíveis camaradas de armas.
Oxalá se concretize.
Já agora, uma pergunta. Vocês organizaram-se, de algum modo, quanto à viagem de avião?

Parabéns pelas tuas histórias de hoje, tanto a do jogo de Poker, como as do Unimog sublimador são fantásticas.

Um abraço
CV
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 9 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4167: História da CCAÇ 2679 (16): Casais fiéis e solidários (José Manuel Dinis)