Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Fá Mandinga > Pel Caç Nat 63 (1969/71) > Um bando de estômagos esfomeadas e sedentos para saciar...
Foto: © Jorge Cabral (2006) . Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]
E em vez de ser eu a dar-lhe uma prenda, foi ele quem, antecipando-se, ma deu a mim e a todos os demais leitores, seus fãs. E sempre foi a assim, desde que o conheço: generoso, desmedido perdulário, capaz de dar o corpinho a uma bajuda e ficar de tanga [, como se comprova na foto à direita, retirada do seu álbum de recordações da vida castrense].
E já que faz anos, espero bem que este não seja mais um annus horribilis, que é coisa que ele deveras não merece de todo... E que no próximo, finalmente, ele (e com ele todos nós) possa ver a famigerada luz ao fundo do tonel (ou, melhor, da garrafa)... Sim, por que quem viveu em Finete e em Missirá, a medida de todas coisas só podia a ser a garrafa (ou o bidão): a garrafa de uísque com água de Vichy ou de Perrier (nos bares seletos de Bambadinca) ou com a água do Geba em bidão (nas tascas do Cuor)... E quem não bebeu a água do Geba, nunca poderá entender a vida, o conteúdo e o continente das estórias cabralianas.
Pela minha parte, já tenho um prefácio, escrito há quatro anos, à espera que saia o livro das Estórias Cabralianas, tão ou mais desejado que El-Rei Nosso Senhor Dom Sebastião... Percebe-se a ansiedade dos seus fãs: afinal, na Guiné, Cabral só havia um, o de Missirá e mais nenhum!... (LG)
Pela minha parte, já tenho um prefácio, escrito há quatro anos, à espera que saia o livro das Estórias Cabralianas, tão ou mais desejado que El-Rei Nosso Senhor Dom Sebastião... Percebe-se a ansiedade dos seus fãs: afinal, na Guiné, Cabral só havia um, o de Missirá e mais nenhum!... (LG)
2. Estórias cabralianas > O Sitafá, as Fracções e as Sardinhas
(...) Também houve Natal em Missirá naquele ano de 1970. Na consoada, os onze brancos e o puto Sitafá, que vivia connosco. Todos iam lembrando outros Natais.
Dizia um:
– Na minha terra…
E acrescentava outro:
– A minha Mãe fazia… (...)
por Jorge Cabral
Em Missirá durante dois meses, estivemos sem abastecimentos. Época das chuvas, o sintex e os dois unimogues avariados .Ainda tínhamos conservas,mas faltavam as batatas, o vinho e o arroz para os africanos.
O Alfero explicou, frisando que deixasse o Sitafá distribuir as sardinhas. Depois adormeceu. Após duas horas de sono, dirigiu-se ao pequeno refeitório, não tendo já encontrado ninguém, salvo o Sitafá a chorar;
Em Missirá durante dois meses, estivemos sem abastecimentos. Época das chuvas, o sintex e os dois unimogues avariados .Ainda tínhamos conservas,mas faltavam as batatas, o vinho e o arroz para os africanos.
Um dia porém, o Pechincha (**) conseguiu fazer dos dois burrinhos, um, que andava. Fomos a Bambadinca, deixando a viatura, à beira da bolanha de Finete, que atravessámos até ao rio, o qual cambámos na piroga do Fodé.
No Batalhão, lá nos abastecemos do essencial, tendo como de costume o Alfero matado a sede, no Bar dos Soldados, no Bar dos Sargentos e no Bar dos Oficiais…
Pelo fim da tarde quando nos preparávamos para o regresso, apareceu o vaguemestre da CCS com uma oferta para o Alfero. Um petisco, seis sardinhas... Chegados a Missirá, o Alfero chamou o Sitafá (**), puto que vivia connosco desde Fá, entregou-lhe as sardinhas e disse-lhe:
– Agora é que vou ver se aprendeste as fracções. Somos nove. Quero que todos comam a mesma quantidade. Depois de assadas, repartes pelos pratos. Mas diz ao Teixeirinha (o cozinheiro), que as sardinhas são um aperitivo, uma entrada. Ele que coza batatas para comer com atum.
Dito isto, o Alfero retirou-se para o seu abrigo, deitando-se na cama a ver se dissipava “alguns vapores”. Nem cinco minutos passados, surgiu o Teixeirinha, pois não percebera o recado do Sitafá.
– As sardinhas eram um aprovativo para comer na entrada? Mas em que entrada?
O Alfero explicou, frisando que deixasse o Sitafá distribuir as sardinhas. Depois adormeceu. Após duas horas de sono, dirigiu-se ao pequeno refeitório, não tendo já encontrado ninguém, salvo o Sitafá a chorar;
– Que aconteceu ? – perguntou o Alfero.
– Eu acertei, mas os Cabos começaram a discutir. Disseram que não podia ser, que duas cabeças não eram iguais a duas barrigas, nem a dois rabos. Estragaram as contas, Alfero! (Ele dividira cada sardinha em três partes, cabeça, barriga e rabo, cabendo duas a cada um).
– Deixa lá, Sitafá! Passaste a prova das fracções. Mas olha que eles também tinham razão. Cabeças e rabos não são bem a mesma coisa…
Jorge Cabral
________________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 30 de outubro de 2013 > Guiné 63/74 - P12222: Estórias cabralianas (81): Em Vendas Novas, de ronda, na Tasca das Peidocas (Jorge Cabral)
(...) Em Janeiro de 1969, eis-me garboso aspirante na E.P.A. [Escola Prática de Artilharia], em Vendas Novas. Ao contrário dos outros aspirantes, encarregados da instrução no C.S.M. [, Curso de Sargentos Milicianos], eu fui colocado na Secção de Justiça e na Acção Psicológica, sendo ainda nomeado árbitro de andebol da Região Militar. (...)
(**) Vd. postes de:
18 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9223: Estórias cabralianas (69): Onde mora o Natal, alfero ? (Jorge Cabral)
Jorge Cabral
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Notas do editor:
(*) Último poste da série > 30 de outubro de 2013 > Guiné 63/74 - P12222: Estórias cabralianas (81): Em Vendas Novas, de ronda, na Tasca das Peidocas (Jorge Cabral)
(...) Em Janeiro de 1969, eis-me garboso aspirante na E.P.A. [Escola Prática de Artilharia], em Vendas Novas. Ao contrário dos outros aspirantes, encarregados da instrução no C.S.M. [, Curso de Sargentos Milicianos], eu fui colocado na Secção de Justiça e na Acção Psicológica, sendo ainda nomeado árbitro de andebol da Região Militar. (...)
(**) Vd. postes de:
18 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9223: Estórias cabralianas (69): Onde mora o Natal, alfero ? (Jorge Cabral)
Dizia um:
– Na minha terra…
E acrescentava outro:
– A minha Mãe fazia… (...)
5 de junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1816: Estórias cabralianas (23): Areia fina ou as conversas de Missirá (Jorge Cabral)
No alto da Vela
Fui Sentinela
de coisa nenhuma
Quem hei-de guardar
Quem irei matar…(...)
Fui Sentinela
de coisa nenhuma
Quem hei-de guardar
Quem irei matar…(...)