quinta-feira, 7 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14580: Convívios (675): X Encontro da CCAÇ 1426, Pinhal do General "Quinta do Conde" FERNÃO FERRO, 11/07/2015 (Fernando Chapouto)


1. O nosso Camarada Fernando Chapouto, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 1426, que entre 1965 e 1967, esteve em Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda, enviou-nos, com pedido de divulgação, o seguinte programa da festa da sua Companhia.



A Companhia de Caç 1426 vai organizar o seu 10º convívio na localidade de Pinhal do General "Quinta do Conde" FERNÃO FERRO, organizado pelo ex Soldado Armindo Monteiro com a colaboração do ex Fur Miliç Fernando Chapouto no dia 11 de Julho (Sábado).

Um grande abraço

X ENCONTRO DOS EX COMBATENTES DA
COMPANHIA DE CAÇADORES 1426 – GUINÉ 65/67
11 DE JULHO DE 2015 - SÁBADO

Venho informar que o nosso encontro se realiza em PINHAL DO GENERAL-QUINTA DO CONDE Avenida Associação Amigos do Pinhal do General “RESTAURANTE PIC-NIC ”lote 839 

Contamos com a vossa presença.

GPS: 38.559344, -9.058300

JUNTO ITINERÁRIO 

A2

DE LISBOA: pela ponte 25 de Abril

Saída para Sesimbra encostar á direita para Setúbal continuar sempre até COINA, virara a direita em direção a estação do comboio de COINA na rotunda da estação seguir em frente até outra rotunda sair na 2ª. Seguir pela Rua Luis Dourdil até a uma mini rotunda sair na 1ª. Seguir pela Av Almirante Réis segunda rua a direita Alameda do Poder Local até a rotunda sair na 3ª. Sempre em frente até ao restaurante. 

Pela ponte Vasco da Gama

Saída para Barreiro Setúbal encostar à direita seguir sempre em frente direção Barreiro-Setúbal, depois de passar o cruzamento do Barreiro encostar à direita saída para Auto Europa a seguir aparece uma rotunda sair na 2ª. até ao entroncamento virar à direita, continuar em frente ,em direção Quinta do Conde atravessar a rotunda por cima da EN 10 sempre em frente passar três rotundas até encontrarem uma mini rotunda saída na 2ª. Seguir pela Av Almirante Réis segunda rua a direita Alameda do Poder Local até a rotunda sair na 3ª. Sempre em frente até ao restaurante. 

Do sul

Auto -Estrada: saída na portagem de Coina direção Barreiro até a rotunda contornar toda a rotunda voltar para traz até à rotunda, sair na 2ª. até ao entroncamento virar à direita, continuar em frente ,em direção Quinta do Conde atravessar a rotunda por cima da EN 10 sempre em frente passar três rotundas até encontrarem uma mini rotunda saída na 2ª. Seguir pela Av Almirante Réis segunda rua a direita Alameda do Poder Local até a rotunda sair na 3ª. Sempre em frente até ao restaurante. 
___________ 
Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

6 DE MAIO DE 2015 > Guiné 63/74 - P14575: Convívios (675): 38º Encontro da CCaç 3547/BCAÇ 3884, “Os Répteis de Contuboel”... Leiria, 31/05/2015 

Guiné 63/74 - P14579: Agenda cultural (396): no 70º aniversário do final da II Guerra Mundial, uma sugestão iimperdível: três obras-primas do realizador de cinema italiano Roberto Rossellini: Roma, Cidade Aberta (1945), Paisá-Libertação (1946) e Alemanha, Ano Zero (1948)...Em cartaz, em cópias restauradas, em Lisboa (Espaço Nimas) e no Porto (Teatro do Campo Alegre)

1. Na comemoração dos 70 anos do fim da II Guerra Mundial (a 2 de maio de 1945, Berlim capitulava e, a 8 de maio, a Alemanha rendia-se incondicionalmente aos Aliados), é importante conhecer ou rever um dos grandes cineastas europeus, o italiano Roberto Rosselini (Roma, 1906- Roma, 1977) que, de algum modo, nos ajudou a reconciliarmo-nos,  a nós, homens e europeus.

Dez filmes do seu período mais célebre (grosso modo, os treze anos que medeiam entre 1945, ano de Roma, Cidade Aberta, e 1958, ano de Índia, com a exceção de A Força e a Razão, filme de 1971), estão em exibição no Espaço Nimas, em Lisboa – desde 26 de abril –´e no Teatro do Campo Alegre, no Porto – desde 9 de Abril.

Neste lote estão pelo menos três filmes que ainda não conheço e não quero perder: (i) Roma, Cidade Aberta (1945); (ii)  Paisá - Libertação (1946); e (iii)  Alemanha, Ano Zero (1948), todos tendo a ver com a guerra e o fim da guerra. E naturalmente com a nossa geração do pós-guerra...Mas também recomendo Stromboli (1950) e Viagem em Itália (1954), filmes que já vi em devido tempo. REcorde.se que Rossellini foi casado com a grandes atriz sueca Ingrid Bergmam (1915-1982), a inesquecível Ilsa Lund do filme Casablanca (1942).

Com a devida vénia, e sobre esta programação, transcrevo aqui  um oexcerto do artigo do Público, de 20/3/2105, assinado pelo crítico de cinema Luís Miguel Oliveira;

(...) “Roma, Cidade Aberta” não foi o primeiro filme de Rossellini, que já assinara, durante o regime mussoliniano, alguns filmes, pelo menos teoricamente, de “propaganda”. Mas “Roma” foi uma bomba, o pontapé de saída para as gloriosas décadas do cinema italiano que vieram a seguir. Não é tanto a questão do “neo-realismo” enquanto corrente estética e ideológica (que já tinha precedentes antes de Rossellini e teria no futuro apóstolos muito mais convictos do que ele próprio); é antes a questão do compromisso com a realidade, o cinema a fazer “corpo” com o quotidiano e as circunstâncias históricas. Nunca se tinha visto nada assim: alguém escreveu – salvo erro Godard, para variar – que com “Roma”, rodado ainda durante a guerra, Rossellini redimiu a Itália, e como medida da dimensão do gesto do cineasta, não é expressão exagerada. Tanto assim que, depois de redimir os italianos, Rossellini foi redimir os alemães, nesse absolutamente fulcral filme que foi “Alemanha, Ano Zero”, rodado nas ruínas de Berlim, onde de cada buraco saltam fantasmas e persistências nazis. O destino do miúdo protagonista – e o que ele “simboliza” – deve ser das coisas mais discutidas em toda a história do cinema, sendo certo que ele representa algo de profundamente importante para Rossellini: a tragédia de uma educação “falsa” (o nazismo), o drama de um condicionamento contra o homem em vez de a favor dele. 

Veremos também o sofrimento, quase Sado-masoquista, que Rossellini infligiu a Ingrid Bergman, ao transplantá-la do luxo de Hollywood para as agruras da vida numa desolada e vulcânica ilha de pescadores: “Stromboli”, outro filme essencial, que ganha em ser visto tendo presente esse “moralismo” rosselliniano, castigando o “espectáculo” (Bergman, Hollywood) que entrou pelo seu cinema adentro e castigando-se a si próprio. Ou o mais generoso – e “milagroso” – mas nem por isso menos castigador “Viagem em Itália”, doce e violenta anatomia de um casamento, porventura a mais contundente incursão de Rossellini na introspecção autobiográfica. E mais “Europa 51”, “O Medo” (ambos com Bergman), “Paisá”, “O Amor”, “A Máquina de Matar Pessoas Más”, “Ìndia”. Que sentido se encontrará ainda, hoje, na ética humanista de Rossellini? (...)



Libertação
Título original:Paisà
Classificação:M/12
Outros dados: ITA, 1946, Preto e Branco, 128 min.

Um dos mais míticos filmes realizados em Itália no período que se seguiu ao fim da guerra. "Paisà" retrata, em seis episódios, a progressão das tropas americanas de libertação, desde o desembarque na Sicília até aos pântanos do vale do Pó. A descrição da realidade imediata, na linha de "Roma Città Aperta", a utilização de não profissionais, o aspecto de documentário da fotografia, tudo faz de "Paisà" uma obra em completa ruptura com o cinema italiano da década anterior.

Texto: Cinemateca Portuguesa.  [Fonte: Cortesia de Público, Cinecartaz]


Alemanha, Ano Zero
Título original:Germania anno Zero
Género:Drama
Classificação:M/12
Outros dados: ALE/ITA, 1948, Cores, 75 min.

O mais pungente e desesperado filme sobre o pós-guerra. A crise económica e moral na Alemanha, através do drama de uma criança sobrevivendo de pequenos tráficos e expedientes, sustentando um pai doente, e que acabará por envenenar por influência de um seu professor nazi. Texto: Cinemateca Portuguesa. [Fonte: Cortesia de Público, Cinecartaz]


Roma, Cidade Aberta
Título original:Roma, Citta Aperta
Género:Drama, Guerra
Outros dados: ITA, 1945, Cores, 100 min.

Quando Roberto Rosselini começou a rodar "Roma, Cidade Aberta", os Aliados tinham acabado de expulsar os nazis da cidade de Roma, perto do final da II Guerra Mundial. Considerado como uma das suas melhores obras, o filme que Rosselini filmou em pequenas partes de película danificada ajudou a definir o neorealismo italiano. 

A história é narrada num estilo semi-documental, usando cenários reais, e envolve membros da resistência italiana em plena acção contra a ocupação nazi. Giorgio Manfredi (Marcello Pagliero), líder da Resistência italiana, é descoberto pelos nazis. Procura ajuda em casa do amigo Francesco (Francesco Grandjacquet), mas é a noiva Pina (Anna Magnani) que o vai ajudar, avisando o padre Don Pietro Pellegrini (Aldo Fabrizi) que Giorgio tem de deixar a cidade imediatamente. 

Anna Magnani tornou-se uma estrela de cinema internacional com esta interpretação de uma mulher grávida e solteira que é apanhada pelos acontecimentos no dia do seu casamento. "Roma, Cidade Aberta" recebeu o Grande Prémio do Festival de Cannes de 1946. Sergio Amidei e Federico Fellini foram nomeados para o Óscar de melhor argumento de 1947. Pùblico .[ Fonte: Cortesia de Público, Cinecartaz],

2. Lisboa > Espaço Nimas > 10 obras restauradas, imperdíveis, de Roberto Rossellini

Do portal da Medeia Filmas, com a devida vénia, transcreve-se o seguinte... 

(...) Face ao sucesso da exibição das obras restauradas de Roberto Rossellini no Espaço Nimas em Lisboa, os Cinemas Medeia prolongam a exibição destes filmes, que contarão com uma nova programação durante quatro semanas, entre 30 de abril e 27 de maio.

Todos estes filmes serão exibidos em versões restauradas digitais, resultado de um trabalho audaz de restauro levado a cabo por várias prestigiadas entidades: Cinecitta Luce, CSC – Cineteca Nazionale, Cineteca di Bologna e Coproduction Office.

(...)

Nova Programação das dez obras restauradas:

 (,,,) Quinta - 7 Maio- Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
O MEDO (1954)

Sexta - 8 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
O MEDO (1954)

Sábado - 9 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
STROMBOLI (1950)

Domingo - 10 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
VIAGEM EM ITÁLIA (1954)

Segunda - 11 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
EUROPA 51 (1952)

Terça - 12 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
O AMOR (1948) + A FORÇA E A RAZÃO (1971)

Quarta - 13 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
O AMOR (1948) + A FORÇA E A RAZÃO (1971)

Quinta - 14 Maio- Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
ALEMANHA, ANO ZERO (1948)

Sexta - 15 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
ALEMANHA, ANO ZERO (1948)

Sábado - 16 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
ÍNDIA (1958)

Domingo - 17 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
ROMA, CIDADE ABERTA (1945)

Segunda - 18 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
PAISÀ – LIBERTAÇÃO (1946)

Terça - 19 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
MÁQUINA DE MATAR PESSOAS MÁS (1952)

Quarta - 20 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
MÁQUINA DE MATAR PESSOAS MÁS (1952)

Quinta - 21 Maio- Horários: 16h30, 19h, 21h30
STROMBOLI (1950)

Sexta - 22 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
STROMBOLI (1950)

Sábado - 23 Maio - 16h30, 19h, 21h30
EUROPA 51 (1952)

Domingo - 24 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
O MEDO (1954)

Segunda - 25 Maio - Horários: 16h30, 19h, 21h30
O AMOR (1948) + A FORÇA E A RAZÃO (1971)

Terça - 26 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
VIAGEM EM ITÁLIA (1954)

Quarta - 27 Maio - Horários: 16h, 18h, 20h, 22h
VIAGEM EM ITÁLIA (1954)

 (...) Todos os filmes em projecção digital. (...) Consultar esta programação aqui.

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Nota do editor:

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14578: Memória dos lugares (292): Gampará, região de Quínara (Joviano Teixeira, sold cozinheiro, CCAÇ 4142, 1972/74)


Foto nº  15 > O Joviano Teixeira



Foto nº 16 > O Joviano Teixeira junto ao obus 10.5... Esta foto é fundamental para deitar pro terra a suspeita que recaía sobre Gampará e o seu pelotão de artilharia... Em 1/12/1973, uma família inteira,  mandinga, de 7 pessoas, vizinha do nosso "menino do Xime", o José Carlos Mussá Biai,  morreu na explosão de uma granada, na tabanca do Xime...Flagelação do PAIGC com foguetões de 122 mm ou "fogo amigo" (, oriundo de Gampará) ? (*)... Só o obus 14 tinha alcance para atingir o Xime, a partir de Gampará (c. 14/15 quilómetros de distância em linha reta)... Ora em 1972/74, ao tempo da CCAÇ 4142,  o que havia em Gampará era o obus 10.5 e não o obus 14, como se comprove por esta foto... (LG)



Foto nº 17 > > Espaldão do obus (?)


Foto nº 18 > O Joviano Teixeira, à esquerda...


Foto nº 14 >  O Joviano Teixeira, na cozinhas, mais dois ajudantes


Foto nº 19 > O Joviano Teixeira junto ao monumento às forças do COP 7 que, em 1972, ocuparam e construiram Gampará,e ntre elas a CART 3417



Foto nº 20 > O fogão de campanha


Foto nº 21 > Foto de grupo...


Foto nº 22 > O Joviano e o seu protegido, provavelmente o mesmo menino de fotos anteriores (**) que procurava a proteção dos cozinheiros, como acontecia em todos os nossos aquartelamentos...


Guiné > Região de Quínara > Gampará > CCAÇ 4142 (1972/74) > O sold cozinheiro Joviano Teixeira

Fotos: © Joviano Teixeira (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]


Mais fotos do álbum do novo membro da Tabanca Grande, Joviano Teixeira (**), que vive em Luz de Tavira, e que procura camaradas da sua antiga companhia, a CCAÇ 4142, a maior deles sendo originários do norte (Lamego, Mondim de Basto, Viana do Castelo, Porto, etc.). (***)

Aguardamos a entrada na Tabanca Grande, com pompa e circunstâncuia, de outro camarada da CCAÇ 4142 (Gampará, 1942/74), o Virgílio Valente, há duas décadas em Macau, e que é leitor habitual do nosso blogue. Prometemso mandar, em pdf, a história da unidade.
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Guiné 63/74 - P14577: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (20): Acidente de percurso

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67), com data de 15 de Abril de 2015, trazendo o episódio 20 das suas Cartas de Amor e Guerra:

Meus caros Luís, Carlos e Eduardo: 
Junto envio mais um item de "Cartas de Amor e Guerra", o n.º 20. 
Votos de saúde e alegria e ... até sábado! 
Abraço-vos com amizade e camaradagem
Manuel Joaquim


Cartas de Amor e Guerra

20. Acidente de percurso

Em meados de Outubro de 1966, o fim das minhas férias em Portugal aproximava-se e ainda me faltava contactar uma colega de profissão e minha correspondente assídua, pessoa que eu não conhecia pessoalmente mas que considerava ser uma boa amiga. Tínhamo-nos “encontrado” quando ela respondeu afirmativamente a um meu anúncio a pedir correspondentes e inserido nas páginas da revista “Plateia”. Entre muitas respostas, só três me satisfizeram e uma delas era a sua. Mulher atenta e dedicada, correspondente assídua, acompanhava devotadamente a minha vida na Guiné.

Os dias de férias foram correndo, os meus compromissos de encontros com outro(a)s amigo(a)s eram muitos e, quando dei por isso, estavam as férias a chegar ao fim e o nosso encontro por realizar.
Encontro que só aconteceu na antevéspera do dia do meu regresso à Guiné, o que me obrigou a escolher entre a namorada e a amiga, “beneficiando” esta com a minha presença durante todo o dia.

A namorada sabia do encontro e a sua realização não teve oposição declarada da sua parte, para lá de mostrar alguma insatisfação. Nunca imaginei o grau real que essa insatisfação atingia. Nem mesmo na despedida, quando a senti triste e dispersa nas conversas e na afectividade. Pensava eu que tais tristeza e nervosismo eram provocados pela separação e pela minha partida para a guerra. Mas não, como se pode ver pelas cartas trocadas entre nós.


Cacém, 7-Novembro-1966

“… nunca um acto teu me feriu e influiu tanto nas nossas relações …”

(…).
É preciso que eu afirme, até para mim, que te quero muito pois, por vezes, fico a balançar na dúvida. Agora, depois de um período de lua-de-mel, depois de dificilmente ter aceitado umas partidinhas que tu, mui gostosa e divertidamente, me quiseste ofertar, a dúvida nasceu. E germinou, não me engano, por ter duvidado dos teus sentimentos, por me sentir traída. Mais, talvez por um desejo íntimo de vingança, não sei. (…).

Algum esmorecimento no amor que te dedico rondou-me o coração neste curto período de separação. Consequência ainda do teu comportamento nos dias que a precederam.
Já que abordei o assunto, é oportuno também dar-te a conhecer que nunca um acto teu, dos mais levianos que cometeste, me feriu e influiu tanto nas nossas relações como o teu abandono nos dias que precederam a tua partida. E não o expresso facilmente, embora querendo fazê-lo. Cheguei a desejar-te que no último dia não aparecesses, que embarcasses e nunca mais desses notícias.

Meu M. querido, desculpa se te ofendo mas a verdade creio que jamais te ofenderá, até porque era o despeito que assim me levava a proceder. O resto, o que existe, é ainda e cada vez mais o muito amor e o medo de te perder. (…).

O domínio que ainda consegui adquirir nos momentos últimos das nossas férias pôde amenizar e salvar a despedida mas, mesmo assim, eu senti-o, ela foi fria e vazia porque eu continuava amachucada e ferida na minha sensibilidade que é demasiado acentuada. Disso, ainda tu não quiseste saber ou ainda te não apercebeste.

Não, meu Amor, não classifiques essa minha irritação como obra de ciúmes. Porque não o foi, tenho a certeza. O que senti foi ser demasiado o teu abandono quando mais desejava a tua presença e achava que também devias preferir a minha a qualquer outra.

Bem, meu M. querido, quero que o assunto fique arrumado por agora. Uma certeza existe, neste momento em que te escrevo: AMO-TE.
(…).

Beijo-te saudosamente
Sempre contigo, a tua
N.

************
Mansabá, Nov – 14/66

Mansabá, final de 1966 > no interior do quartel
Foto: © G. Passeiro

Alguma coisa terei hoje a dizer-te, minha querida. (…). Fiquei surpreendido com esta tua última carta, não por ela em si mas pela sua dissonância com as anteriores. (…). E fiquei perplexo com a tua atitude nesta altura, depois de duas cartas sem sombras e parecendo firmes na certeza das palavras que encerravam. (…). Pergunto-me como puderam surgir as duas anteriores, com esta última dentro de ti.

Com que então, muitas partidinhas te fiz nas minhas férias? Bem, começo por dizer que nunca actuei com o intuito de te pregar qualquer espécie de partidas. Fui natural com o meu comportamento. Acho que é preciso dizer-te isto. (…). Há quem tivesse ficado triste pela minha não visita. (…). Devia tê-la feito. Disto é que estou arrependido.

Mas, afinal, que amor é esse que me dedicas, minha querida? Que amor é esse, que sentes vacilar ao meu mínimo acto que te dê a sensação de que te pretiro? Surge-te assim tão repentinamente a dúvida? (…).

Não, não dei por essa tua frieza, por esse teu vazio na nossa despedida. (…). É espantoso, é inacreditável esse teu estado de espírito. Doeu-me, sem dúvida, essa tua revelação.
Pergunto a mim mesmo como é possível a duas pessoas que SE AMAM separarem-se com frio e vazio no coração, principalmente dando-se o caso de uma separação do género desta agora. (…).

Liberalidade, “fair-play”, condescendência e compreensão, qualidades estas que te atribuí, onde estão? Tu és tremendamente egoísta. Não pensas nos outros que também têm coração. Nos outros que, por uma razão ou outra, estão ligados a mim. (…). Bem, mas não interessa falar nisto porque não queres compreender. Tu, simplesmente, oprimes com a tua intransigência obsoleta no tema que estamos a focar.

Está na altura de te dizer que nem hoje nem NUNCA me terás como objecto teu. Eu amo-te, mas não existes só tu na minha vida. Há pessoas, não-pessoas, ideias e factos que eu amo. (…). Não vou renunciar para me entregar TOTALMENTE a ti. Aceita-me com todos os meus outros sentimentos. Caso contrário, deixa-me. Julgo que conheces o meu ódio à subserviência.

Não estou zangado contigo, friso bem. Julgo ainda que tudo isso foi criancice, arrufo de menina mimada. (…). Sentiu-se traída porque o seu querido a deixou uns momentos para ir ter com outra. (…).

Mais uma vez te digo que não vou prescindir dos meus amigos para “ser sempre juntinho a ti”. Cultivo a Amizade. Continuarei pela vida fora a cultivá-la. Preciso muito dela. Não vou, não irei cortar relações (…) só porque tu tens despeito ou ciúme ou sei lá que porcaria é essa. Está entendido? (…).

Julgo que não estou a ser duro. Aliás, como atrás disse, não estou zangado contigo. (…). Simplesmente, acho incrível como é que foste capaz de escrever duas cartas, quase “à época romântica”, com esta última por trás a fervilhar. Isto leva-me a não acreditar nas duas primeiras cartas. São falsas porque tu não podias sentir o que me disseste. Estavas a mentir a ti própria, estavas a forçar as palavras a saírem para o papel. E isto é que eu não tolero. Eu quero a verdade, sempre a verdade, mesmo que ela doa, mesmo que ela faça sangrar. (…). Com medo de dizeres a verdade, resolves falsificar-te!
Uma minha ausência pontual, anunciada já há um mês a sua hipótese de existir, é o bastante para sentires dúvidas no Amor, (…), que me dedicas! (…).
Numa despedida como esta minha, consegues estar “fria e vazia”! É inacreditável! Ainda me não conheces ou não me queres conhecer ou não acreditas em mim! (…).

APESAR DE TUDO, muitos e muitos beijos do teu M.
Saudades

************
Cacém, 21.11.1966

Há algo a acrescentar e a objectar ao que hoje me expuseste. Alguma coisa precisa de ser rectificada. (…).
Embora afirmes o contrário, eu contesto frisando bem que sempre preferi a verdade, meu M. querido. (…). Sou defensora intransigente dela, embora em algumas circunstâncias fosse preferível ocultá-la para evitar discórdias e acusações inadequadas. (…). Abomino a mentira, o sofisma. (…). Não posso imaginar sequer que pudesse ocultar, que tivesse a fraqueza de ocultar qualquer coisa que nos dissesse respeito. (…). Interessa-me é que te apercebas e que vás tomando conhecimento das minhas reacções, do modo como me comporto, das fases que atravesso. (…).

O motivo que aleguei e que originou aquele estado de frieza foi o único factor que existiu para aquela reacção, encimado pelo nervosismo psíquico que sempre origina uma tal despedida. Não há outro, meu querido. (…). Foram de certo modo depressivos e amargurados os dias que decorreram até à altura em que me confessei e te expus o que me oprimia, por não ter aproveitado os breves momentos que precederam a nossa despedida. (…).
Acredita que, depois de teres partido, senti-me tão certa de continuar a pertencer-te como tu com a certeza com que partiste de que não ficávamos separados (…).

Escrevi-te as duas primeiras cartas em cujo conteúdo tu não crês bem, lamento-o, e todo esse conteúdo era o testemunho do quanto continuo unida a ti. Operava, porém, por detrás de tudo isso, esta espécie de culpa motivada pela ocultação duma fase em que tu, sem o notares, estiveste embrulhado. Urgia, para não falsear a verdade e a sinceridade que sempre tenho posto nos nossos contactos, que pusesse o meu Amor ao corrente do que se tinha desenrolado no íntimo da sua D. Assim enveredei pelo caminho dessa verdade e clareza. (…).
Acaso não me poderia ter enganado no caminho e este episódio tivesse acelerado o desenlace da nossa união? Indubitavelmente, não foi isso que aconteceu. Continuo a amar-te sem peias de o afirmar e gritar abertamente, meu querido. Expondo-te o que me tinha afligido, esperava encontrar uma fuga à saudade e à culpa que me pesa por não poder recordar agradavelmente aquela despedida.
O amor que te dedico, (…), radicou-se e frutificou. Não fui eu que o criei. Aceitei-o e alimentei-o. Não é por capricho que ele existe, só porque a “menina mimada” quer ter um Amor porque está na idade de ter um namorico. (…).

Outro ponto a esclarecer:
Quando me referi a umas partidas que me pregaste, (…), apenas estava incluso o teu procedimento na antevéspera da tua partida, o qual me chocou profundamente. Que queres? Então essa minha confissão é prova evidente para concluíres e afirmares que foi erradamente que me atribuíste as qualidades que enumeraste? Conclusão precipitada como absurda, acrescento.
Foi um problema íntimo que te expus com o intuito de encontrar solução. (…). Acaso a minha reacção foi de molde a prejudicar a minha liberalidade? Puro engano, meu querido. Amo a liberdade e, dentro dos moldes apreciativos em que ela deve conceder-se, eu concedo-ta. Não terá sido este o meu comportamento? Diz-me a consciência que sim.
“Fair-play”? Caber-te-á a ti reconhecer se existe e apreciá-lo nessa medida. No entanto, sem intenção de me elevar, afirmo que possuo essa qualidade. Condescendência e compreensão não farão parte dos meus dotes?! Será que não crês nelas? (…).

Acaso alguma vez te recriminei por causa das tuas amizades femininas, (…)?! Já tive oportunidade de te afirmar que não me molesta o facto de conservares essas amizades. Respeito e corroboro até para que as mantenhas numa boa e sã camaradagem. Também quero conservar as minhas amizades masculinas e, perante o facto de as apoiares, estamos de acordo, não há incompatibilidades entre nós, neste tema.

Vem toda esta explicação a respeito do teu encontro com a tua correspondente. Ora, sê razoável, vê lá se não tive a iniciativa de te dizer que fosses encontrá-la? Nunca te dissuadi de ires visitá-la. Evidentemente que poderias tê-la visitado antes. Devias tê-lo feito e, assim, já a despedida seria mais breve e não originaria agora este vendaval.

TREMENDAMENTE EGOÍSTA. Que cretinice. Dizerem isso de mim, eu que me considero uma moça tão liberal, tão condescendente! Posso estar enganada? Não estou, não sou tão inconsciente que não me aperceba de tal defeito.
Não há também em mim, ao contrário do que afirmas, intransigência obsoleta na não aceitação e na incompreensão das tuas amizades, do amor que dedicas a muita coisa para além das pessoas. (…). Como fruto do meu conhecimento sobre os teus sentimentos, ideais e aspirações nasceram a certeza, a confiança, a credulidade que tenho em ti e que, intimamente, nunca sofreram alterações.

Não te dou liberdade, meu amor, porque ela não se reparte como o pão. O nosso namoro tem esta característica única de assentar em completa liberalidade, (…).

Aparte tudo isto, (…), eu creio na nossa compreensão mútua e na comunhão de sentimentos que têm instado a que prossigamos caminhando descobrindo beleza, sentido de viver, em paz e esperança no nosso futuro.

Meu M. querido, parece-me (…) que respondi claramente ao que se me impunha.
Saudosamente, me despeço.
Beijos e abraços da tua
N

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Não consigo perceber a carta que se segue. Foi uma surpresa para mim, a sua leitura. O tom do discurso, a manipulação de certas palavras, a agressividade pessoal contra alguém que é me era querido, a desorientação, o derrotismo … Não consigo ver-me a ter este comportamento naquela altura. Causas?

Talvez uma junção de várias novas situações: regresso à guerra, após férias; saída de Bissorã para Mansabá com perda de convívio social e de qualidade de vida fora das ocupações estritamente militares; acumulação a 100% das actividades operacionais e da escola regimental, com o trabalho lectivo a aumentar com a aproximação dos exames; medo e cansaço a pesar na vivência diária, agravados perante a perspectiva próxima do fim da comissão; a decisão recentemente tomada de trazer o menino Sarrico comigo e as responsabilidades daí resultantes …
Mesmo assim, continuo surpreendido com esta carta. E pesam-me, ainda hoje, o sofrimento e as lágrimas que causei a alguém que durante todos estes anos, desde então, tem sido a minha querida companheira de vida.

“Se tiveres lágrimas nos olhos, bebo essas tuas lágrimas”
Marcas de sofrimento - Carta de Mansabá, 29/11/1966, amarrotada e manchada por lágrimas.

Mansabá, Nov. 29/66

Por vezes, ao pensar na vida e principalmente ao analisar os outros, tenho uma sensação de caos e chego a ver-me estranho, tanto com os outros como comigo próprio. Nessas alturas, esteja onde estiver, tenho frequentemente a sensação de que tudo se move impelido por derrocada desconexa de uma ladeira enorme, (…). E chego a pensar que o caos existe em mim.

Defende-te, desculpa-te, acusa-te. Eu já nada mais sou que um observador interessado, pacato ou vibrátil, triste ou satisfeito. Unido estava a ti. Junto de ti estou, já que continuo a amar-te embora muitas vezes chegue a pensar que não sei porquê. (…). Talvez para viver na minha cretinice. Aconselho-te é a não viveres com um cretino. Seria cretinice demasiada para ti. E já que sou cretino… 

Bem, tu com toda a tua independência crítica saberás o que tens a fazer, que eu cá fico com a minha cretinice. Mas que cretino eu sou! Cretino, cretinas, cretina, cretinamos, cret… Parvo. Guerra.
Parvo na guerra. Guerra parva. Guerra cretina. Cretino na guerra. Guerra, guerra, guerra. A vida? Caos.

Dói-me ver os teus olhos de espanto ao ler esta carta. Amo esses teus olhos de espanto. (…). Estou a gostar da barafunda, de “bafarunda” como diz um soldado que anda sempre com o “VIVA A GUERRA” na boca. Para ele é tudo “bafarunda”. O que é preciso é confusão. Bem, ele diria: o que é preciso é “bafarunda”! Ah, desculpa. Não te avisei: estou “charola”. “Charola”, parvo, cretino. Rima tudo com maluqueira.

Se tiveres lágrimas nos olhos, bebo essas tuas lágrimas; se estiveres furiosa, de rictus nos lábios, dura, eu beijo-te, eu acaricio-te, eu mordo-te porque quero ver-te gritar, ver-te gritar de dor e prazer, ver-te gritar de indignação e alegria. Ver-te no caos. Ver-te VIVER. Porque isto de dar cabeçadas sabe bem. (…).

Alto lá, que estás a pensar? Não penses sequer em fazer desaparecer a carta, esta cartinha maravilhosa. Duvidas? Duvida! DÚVIDA. É na dúvida que te quero deixar, não duvides. Ou, se quiseres, duvida mas não rasgues a carta!

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“Duvidas? (…). Mas não rasgues a carta! “
Marcas do sofrimento - Carta de Mansabá, em 29/11/1966, manchada por lágrimas e com sinais de amarrotamento.

Minha N. querida, como estás? Eu estou bem, felizmente. Por cá tudo bem. Espero que esta minha carta te vá encontrar de perfeita e feliz saúde na companhia de tod…. Os lugares comuns ainda existem. Em tudo? (…).
(Deixa-me rir, D. Está bem?).

“Que baixo poder de chacota o teu!”. Não foi isto o que agora pensaste? (…).

Um grande abraço aos teus pais.
Beijo-te toda, meu amor. Saudades.
M.

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Nota: Não encontro qualquer reacção ao texto desta carta. A primeira carta que recebi, após a escrita e envio desta, tem data de 18-Dezembro-1966 e não faz qualquer referência a este “conflito”.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14543: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (19): Sem nada para dizer

Guiné 63/74 - P14576: Os nossos seres, saberes e lazeres (92): Bruxelles, mon village (Parte 4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 7 de Abril de 2015:

Queridos amigos,
Aqui vai mais uma dose comprimida de uma viagem a Bruxelas e arredores.
Fui a Lovaina, lindíssima cidade, aqui ficam uns disparos. Percebo aqueles que me dizem que aqui tudo é sombrio e o que se salva é a boa comida, não têm razão, nem sempre é sombrio, Bruxelas tem uma atividade cultural turbilhonante, é só escolher entre o étnico e o clássico, há imensos concertos gratuitos, exposições gratuitas também não faltam. E os parques são encantadores. E gostos não se discutem, também é verdade.

Um abraço do
Mário


Bruxelles, mon village (4)

Beja Santos


Hoje o dia é passado em Lovaina, estamos a falar da velha Lovaina, com universidade prestigiada desde a Idade Média, rica em património, venho também visitar gente conhecida, vou começar pela beguinage, uma relíquia consagrada como património da Humanidade, aqui viviam velhos solteiros ou viúvos e, como se pode ver pelas imagens, devem ter vivido com o conforto possível da época, são tempos de uma Flandres próspera.


Hoje a beguinage é exclusivamente habitada por professores e alunos, a manutenção é irrepreensível, a imagem também não é muito boa mas permite ver o tamanho de uma das muitas ruas deste conjunto habitacional de que restam poucos exemplares de toda a Europa.


Para mais informações, o prezado leitor tem esta inscrição em francês e inglês, com um bocadinho de esforço pode aumentar-se e fica-se com dados elementares sobre estes complexos habitacionais flamengos.


Temos aqui uma reabilitação à maneira, é bem possível que as casas medievais fossem assim, achei este edifício uma beleza, toca de o mostrar, pode muito bem acontecer que futuros visitantes da Bélgica se sintam atraídos por uma vida doméstica que foi recuperada e tem verdadeira ocupação, cheguei numa altura em que professores e estudantes regressavam a penates, por volta do meio-dia almoça-se. Tive sorte, era um dia friorento mas havia claridade, estas cores existem realmente.


Um dos desfrutes deste “condomínio” são os canais murmurantes, as árvores a florir, vi as magnólias já em botão, nesta altura devem ser um espetáculo de garridice, a contrariar céus tão tristonhos.


Esta gente não brincou com o restauro, veja-se esta fonte, parecem-me figuras do Renascimento, é um primor, sentei-me em frente, gosto cada vez mais das gentes que não enjeitam o seu passado e sabem aproveitar as técnicas de hoje para zelar pelo seu património. Isto não é só dinheiro, é respeito pelo pretérito, não se deita fora o trabalho desvelado dos ancestrais. Ponto final.


Lá vou vagarosamente a caminho da saída da beguinage, tudo cuidado à entrada e à saída, o que a UNESCO consagrou é motivo de zelo. Pois bem, passado o portão, tenho direito a nova surpresa, o “parque automóvel” está cheio…


Palavras para quê? Enquanto deambulava pela beguinage ouvia as campainhas, ciclistas a anunciar-se, tudo em grande correção. Está na hora de sentar à mesa, esta Lovaina é plana, vamos saboreá-la, a visita continua.


Este aparatoso Hotel de Ville não cabe todo na maquineta do fotógrafo amador, disparei várias vezes, é imagem que me parece mais elucidativa para dar as dimensões de altura e largura. Construção de muito bom gosto, luxo e aparato para que nunca ninguém dissesse que por aqui não passou a grandeza, o sentido do fausto.


Em frente ao Hotel de Villes está a Igreja de S. Pedro, outra desmesura, o fotógrafo amador bem se esforçou por captar uma imagem compatível, nada feito, o que se apanhava em altura perdia-se nos detalhes da pedra. Assunto de pouca importância, há muita riqueza no interior, olhem só para esta imagem, um exemplo carinhoso do tardo-gótico, o recamado do manto é de excecional beleza e vê-se que o menino está radiante de contente ao colo de sua mãe.


Outra desmesura, este púlpito é deslumbrante, nunca vi coisa assim, juro. Mas é impossível captar o todo, ao menos aqui fica o registo da base, é um trabalho escultórico extraordinário, tive um raio de sorte porque a igreja subitamente encheu-se de luz, é assim o tempo belga, escurece e depois temos umas nesgas de luminosidade. Cortou-se me o fôlego, nem acreditei no que estava a ver, estes tons acastanhados criam ainda mais a ilusão do movimento, tenho a impressão que se trata de S. Paulo quando caiu do cavalo, na estrada de Damasco.


Está na hora de ir visitar Christiane Zeghers e Hein Severijns, ela ceramista ele modelador de porcelana, ambos exímios, deles falarei mais tarde, já chega de inflação de imagens. Vim à procura de ranúnculos, margaridas e algumas tulipas. Gosto muito desta orgia de cores, pedi licença ao florista, ele respondeu que tinha muito orgulho em que mostrasse o colorido do seu estaminé. Aqui fica.


Faz de conta que já voltei a Bruxelas. Em passeata anterior esqueci esta imagem, com a câmara do Luís Graça, era certo e seguro que teríamos aqui a melhor panorâmica de Bruxelas. O sítio chama-se Mons des Arts, é uma escadaria soberba, vê-se a agulha do Hotel de Ville, o que se perde em amplitude dá-me a consolação de um céu tranquilo, azul, indiferente às nuvens sombrias que tenho por trás e que escurecem a imagem. No momento em que captei, e mal, a Bruxelas antiga, estava regalado porque tinha isto a portentosa retrospetiva Chagall. Mais tarde poremos a escrita em dia.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14542: Os nossos seres, saberes e lazeres (91): Bruxelles, mon village (Parte 3) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P14575: Convívios (675): 38º Encontro da CCaç 3547/BCAÇ 3884, “Os Répteis de Contuboel”... Leiria, 31/05/2015

1. O nosso Camarada Manuel Oliveira Pereira, da CCAÇ 3547/BCAÇ 3884 (Contuboel, 1972/74), solicitou-nos a publicação do seguinte convite para o convívio anual da sua Unidade:

Agradecemos a divulgação no nosso 38.º Encontro/Convívio que terá lugar no próximo dia 30 (último sábado) de Maio, em Leiria.

Gratos pela atenção,
Atentamente,
Manuel OLIVEIRA PEREIRA 

38º Encontro/Convívio CCAÇ 3547/BCAÇ 3884

2. A História da CCAÇ 3547, transcrita, com a devida vénia da sua página no Facebook [Companhia de Caçadores Répteis].

CCAÇ 3547: Chaves (Portugal) e Guiné (Contuboel, Sonaco, Bambadinca Tabanca, Sare Bacar, Nova Lamego, Madina Mandinga; Galomaro e Dulombi).

A CCaç.3547) era uma subunidade do BCAÇ 3884, com origem no BC10, unidade militar sediada na cidade de Chaves (Portugal).

A mobilização e a missão das novas unidades operacionais tinham por destino o teatro de guerra na então província ultramarina da Guiné. Quase em simultâneo também Angola e Moçambique combatiam a política colonial portuguesa na busca das respectivas independências, o que viria a acontecer, não sem antes deixar um rasto de morte e muitas outras sequelas (...).

O Batalhão partiu para a Guiné no fim de Março de 72. Aí chegado, foi aquartelado no Cumeré para fazer a IAO que durou cerca de um mês. 

Terminada a formação, as unidades partiram para os “seus perímetros de acção”, o Leste da Guiné, a saber: (i) CCS e Comando Operacional do BCaç 3884 em Bafatá; (ii) a CCaç 3547 em Contuboel; (iii) a CCaç 3548 em Geba; e (iv) a CCaç.3549 em Fajonquito.

A CCaç 3547 foi logo rebatizada pelos seus membros de “Os Répteis de Contuboel” e pela rádio do PAIGC como “As Almas Brancas”. Para além da sua sede – Contuboel – , tinha na vila de Sonaco um “destacamento”, composto por um Grupo de Combate e um pelotão de Milícias.

Por força (?) da sua boa localização (um subsetor sem guerra), a Companhia ficou, logo no iníci, e até ao fim da comissão, mutilada nos seus efectivos, por ausência quase permanente, de dois dos seus "grupos de combate", em destacamento/reforço de outras Companhias, nomeadamente Bafatá, Bambadinca Tabanca, Sare Bacar, Nova Lamego, Madina Mandinga, Galomaro e Dulombi.

Cedeu igualmente alguns dos seus graduados para as Companhias de Caçadores Africanas e Delegado/Agente de ligação para, em representação de todo o Batalhão junto das Direcções de Serviços e Quartel Mestre General, providenciar toda a logistica necessária à actividade do Batalhão.

A Companhia, na sua sede, funcionou como Centro de Instrução de Milícias (forças paramilitares), cujos formandos tinham por missão dar apoio e defesa local às populações nativas.

Ao longo da sua Missão e, apesar de teoricamente a área de actuação ser um paraíso, a Companhia, não conseguiu sair incólume aos efeitos da Guerra. Logo no início, num estúpido acidente de viação um dos seus homens ficou gravemente ferido, de que resultou numa paraplegia. Outras mazelas surgiram mas sem consequências de maior, porém, se a "missão" começou mal, terminou ainda da pior maneira; mesmo na recta final e a escassos dias de completarmos 24 meses, uma traiçoeira mina “rouba”, na plenitude da juventude, a vida a um dos nossos melhores!...

A Companhia regressa em fins de Junho de 1974 e termina a sua “missão”. A desmobilização vem a acontecer no dia 30 de Julho de 1974
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

terça-feira, 5 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14574: A bianda nossa de cada dia (1): histórias do pão e do vinho... precisam-se!



Guiné > Região de Quínara > Gampará > CCAÇ 4142 (1972/74) > O sold cozinheiro Soviano Teixeira, com mais dois camaradas (ajudantes), à volta do tacho...

Foto: © Joviano Teixeira (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]


1. Camaradas:

Acaba de entrar para a Tabanca Grande um camarada cozinheiro... Não é um acontecimento vulgar...Por isso o Joviano Teixeirra merece as nossas palmas. E para mais é o primeiro representante da CCAÇ 4142 (Gampará, 1972/74).

Recorde-se que na tropa (e na guerra) também havia o "front office" e o "back office", como se diz hoje nas empresas (banca, seguros, saúde...). Havia os operacionais e os serviços de apoio... Temos falado pouco dos que trabalhavam para alimentar o "ventre da guerra" (intendência, reabastecimentos, vaguemestria, cozinha...). Temos falado pouco dos nossos cozinheiros que trabalhavam em duras condições físicas, em cozinhas (?) improvisadas ou atamancadas, e a quem era pedido que fizessem milagres todos os dias... Em suma, temos falado pouco da "bianda nossa de cada dia"...

Dar de comer, no TO da Guiné, todos os dias, a 150/200 homens, numa unidade de quadrícula, isolada no mato, com problemas sérios de reabastecimento... era obra! Em geral, havia dois cozinheiros (um 1º cabo e um soldado) e dois auxiliares de cozinheiro (soldados).

Temos falado aqui dos nossos crónicos problemas de alimentação mas não tanto dos nossos camaradas que trabalhavam nas cozinhas... Ora, eles bem merecem uma palavra de apreço!... Eles também eram filhos de Deus, de Alá e dos bons irãs!

Fotos e histórias à volta da nossa bianda de cada dia, precisam-se!... E quanto ao Joviano, já lhe dei as boas vindas. Um alfabarvo para todos/as...


2. Por outro lado, o nosso camarada António José Pereira da Costa também nos acaba de contar hoje uma história que eu achei deliciosa, à volta do vinho que bebíamos e que dá pano para mangas (**)... Estou interessado em desenvolver este outro tema no nosso blogue... De resto, relacionado com a bianda... O casqueiro e o tintol, a par do correio, eram elementos importantes para manter o moral da tropa...

A questão que se pode pôr é a seguinte: Afinal, o vinho que nos chegava à mesa, no mato, era ou não uma variante do "vinho pró preto" ?...

O mercado ultramarino teve um papel importante no escoamento da nossa produção vinícola... Recorde-se que havia, ao tempo da guerra colonial, um problema de excesso de produção e falta de qualidade...

Dizia-se que Salazar dizia que beber vinho era dar de comer a um milhão de portugueses... O que em parte era verdade: antes do êxodo rural nos anos 60, a vitivinicultura dava trabalho a um exército de mão de obra barata nas aldeias...  Em 1940, a vinha ocupava mais de 320 mil hectares e havia cerca de 337 mil produtores!... (Em termos de exportação de produtos agrícolas, só a cortiça ultrapava o vinho).

De facto, o trabalho na vinha ocupava muitos trabalhadores ao longo do ano... Recordo-me quando era puto, em meados dos anos 50,  de assistir à vinda de enormes ranchos de trabalhadores sazonais, homens e mulheres, para a minha zona (Lourinhã, Estremadura), na altura das vindimas... Eram os "ratinhos", vinham da Beira!... Tempos de miséria!...

Em resumo, seria interessante saber mais sobre o vinho que a metrópole (Lisboa() nos mandava dava... A tropa era um segmento de mercado precioso... O que é que a malta  sabe mais sobre isto ?

Em boa verdade,  a generalidade dos nossos camaradas, no TO da Guiné, não se podia dar ao luxo de dizer o provérbio popular: "pão que sobre, carne que baste e vinho que farte"... Muitas vezes, faltava o pão, a carne e o vinho... Em quantidade e qualidade... Mas também se diz que "a fome é a melhor cozinheira"...

PS - Que fique claro: não estão aqui em causa os nossos camaradas da Intendência que deram o seu melhor (e alguns morreram) no cumprimento da missão que lhes cabia no TO da Guiné...

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14568: Tabanca Grande (463): Joviano Teixeira, grã-tabanqueiro nº 687... É natural de Tavira, e pertenceu à CCAÇ 4142 (Gampará, 1972/74)

(**) Vd. poste de 5 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14572: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (13): Uma da nossa Intendência

Guiné 63/74 - P14573: Agenda cultural (395): Estórias Abensonhadas, exposição de Joana Graça, Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, Telheiras, Lisboa, até 19 de maio


Joana Graça é: (i) contadora de estórias na associação  Estórias de se Tirar do Chapéu; e (ii) ilustradora e artista plástica na empresa A Lua Mora Aqui.

Contactos: 

joana_graca@yahoo.com
https://joanagraca.carbonmade.com
www.facebook.com/aluamoraaqui

A Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro fica em Telheiras,  Lisboa, com metro à porta,

"Desde cedo que as estórias a fascinaram... Depois do curso de piscologia, imaginou personagens que ganharam vida nos seus cadernos, quadros e agendas e, depois,  como contadora de estórias (atualmente na Associação Estórias de se Tirar do Chapéu).

"Foi autodidata durante alguns anos, mas depois o seu interesse pela ilustração fê-la procurtar mais estímulos e aprendizagens na FBAUL - CIEAM e na SNBA.

"Também descobriu a pintura, motivada pelo seu impulso mais inconsciente e transcendente.

"São linguagens diversas, mas em tudo gosta de colocar o seu traço: em caixas de estórias, objetos tridimensionais, quartos e paredes, cadeiras e mobiliário, pintura de murais.

"Bem vindos à Lua Mora Aqui... desejo que este mundo vos abensonhe!"

(Do catálogo, com a devida vénia)

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Nota do editor:

Último poste da série > 2 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14553: Agenda cultural (394): Apresentação do livro "Guerra na Bolanha - De Estudante, a Militar e Diplomata", de Francisco Henriques da Silva, dia 5 de Maio de 2015, pelas 18h00, no Palácio da Independência, Largo de São Domingos, Lisboa (Francisco Henriques da Silva)

Guiné 63/74 - P14572: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (13): Uma da nossa Intendência

 1. Em mensagem do dia 28 de Abril de 2015, o nosso camarada António José Pereira da Costa (Coronel de Art.ª Ref, ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), enviou-nos mais um texto para publicarmos na sua série "A minha guerra a petróleo:



A MINHA GUERRA A PETRÓLEO

13 - Uma da Nossa Intendência

Vou contar esta história tal como me foi contada no longínquo ano de 1968. Não tive possibilidade de verificar se foi assim que tudo se passou, embora tivesse sido contemporâneo, em Cacine, da CART 1659. Por isso corro o risco de exagerar um ou outro pormenor ou, talvez pelo contrário, de deixar para trás algo que foi importante.

A CArt ocupava Gadamael e era comandada pelo Cap. Mil.º Art.ª Mansilha, advogado de profissão, mas que, pelas vicissitudes a tantos outros sucedidas, ali fora parar. Nesse tempo a Intendência fornecia vinho às unidades em dois tipos de embalagens: barris de 50 litros ou garrafões de vidro – transparentes, para o branco, e verdes-escuros, para o tinto – com 10 litros de capacidade, rolhados com uma tampa de plástico, e protegidos por uma espécie de grandes aparas de madeira muito fina e ligadas por arames. Depois de vazios, estes invólucros não eram devolvidos e, por isso, eram frequentemente usados em funções decorativas. Os barris, desmontados e devidamente serradas as suas aduelas, serviam para a construção de pequenas mesas, cadeiras (por vezes de braços), bancos e outros “móveis” que embelezavam e tornavam mais cómodas as “salas de convívio”, “quartos”, “refeitórios”, etc.. Aos garrafões estava consignado um papel mais decorativo, especialmente aos transparentes que, depois de pintados por dentro, serviam de jarrões com pinturas “modernistas”. Quer uns, quer outros, podiam depois receber na estreita boca, folhas de palmeira ou outros arranjos de flores secas e constituir motivos de decoração. A técnica de pintura era, como é de calcular improvisadamente engenhosa. As tintas eram cuidadosamente introduzidas na boca do garrafão e ficavam a escorrer lentamente na parede interior deste e, consoante a posição em que o garrafão fosse posto, surgia uma decoração a várias cores e com formatos que o “pintor” não controlava, mas que lhe permitia obter um efeito muito original.

Ao que parece o vinho de garrafão era debitado a um preço mais elevado que o do barril, mas tenho para mim que a qualidade de ambos os produtos se equivalia e não era possível detectar pelo paladar a embalagem de origem do néctar em apreço.
Por razões que não consegui determinar a CArt 1659 não consumia vinho de barril.

Era frequente surgirem pequenas falcatruas com o vinho durante o transporte, muitas vezes só detectáveis já no momento da distribuição. Quem observasse o interior de um pipo podia, às vezes encontrar pequenos pauzitos, espécie de palitos, cravados em locais “estratégicos” entre as aduelas dos barris que tinham permitido a saída de algum líquido para uma ou outra garganta mais sequiosa.

A violação dos garrafões era mais difícil. Só pela cápsula de plástico que cobria a rolha e uma boa parte do gargalo. Era, porém possível abri-lo, consumi-lo na totalidade e voltar a rolhá-lo com engenho e entregá-lo como genuíno chá de parreira. Era uma técnica mais difícil de aplicar e daí talvez a opção de fornecimento da unidade de Gadamael/Ganturé.

Porém, um dia aconteceu o impensável. Alguns garrafões apareceram rigorosamente atestados… de água. Que fazer neste caso? Havia a possibilidade de se realizar um auto que já não seria de recepção e que, portanto, a Intendência dificilmente aprovaria. No fundo, era a palavra da Unidade contra a do Órgão Logístico distribuidor, cuja palavra, à partida, faria fé.

Mas a CArt não terá seguido apenas esse caminho.
O capitão Mansilha ordenou o envio dos garrafões com a água para a delegação do Laboratório Militar, em Bissau, pedindo uma análise ao respectivo conteúdo. O laboratório, não sabendo a origem do produto remetido, deverá ter pensado que se tratava de água proveniente de alguma fonte ou poço situado na zona de acção da companhia e, pouco tempo depois, respondeu que se tratava de água imprópria para consumo e com matérias orgânicas pútridas em suspensão.

O capitão Mansilha escrevia bem, ou não fosse advogado, e redigiu uma nota a reclamar junto da Intendência contra o fornecimento que esta fizera, nomeadamente informando que o estômago do seu pessoal não era propriamente um tubo de ensaio.
Claro que a “insolência” teve resposta através da ameaça de que, se se voltasse a repetir uma situação idêntica, seria dado conhecimento superior, para o correspondente procedimento disciplinar.

De novo a clarividência e a argúcia do advogado brilhou com uma resposta que, em linhas gerais, podemos sintetizar assim:
- Não há necessidade de incómodo para apresentação do assunto a instâncias superiores pois, da próxima vez – se tal se verificar – será a própria companhia que o fará.

Volto a dizer que não tenho qualquer elemento que me prove que as coisas se passaram exactamente assim. Todavia, algo de parecido terá sucedido, uma vez que o “Jornal da Caserna” publicação satírica que se publica em todas as guerras e mais ainda nas “guerras a petróleo”, registou o evento, o que dá um certo fundamento à notícia que nunca terá chegado a ser uma informação de boa classificação.

Mem-Martins 28 de Abril de 2015
JAPC
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Nota do editor

Último poste da série de 13 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13493: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (12): Como vejo o 10 de Agosto de 1972

Guiné 63/74 - P14571: Convívios (674): XIII Encontro do pessoal da CART 2520 (Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71), dia 30 de Maio de 2015 em Mira de Aire (José Nascimento)

1. O nosso camarada José Nascimento (ex-Fur Mil Art da CART 2520, Xime, Enxalé, Mansambo e Quinhamel, 1969/71) pede-nos para publicitar o XIII Encontro do pessoal da sua Unidade a levar a efeito no próximo dia 30 de Maio de 2015 em Mira de Aire:

Caro Amigo Carlos Vinhal,
Agradeço a publicação no blogue, do 13º. convívio da Cart 2520, que esteve no Xime e Quinhamel e que irá realizar-se no dia 30 de Maio de 2015, em Mira de Aire.
As honras da casa serão realizadas pelo grande operacional e excelente apontador de morteiro 60, o 1.º Cabo José Manuel Vitória Cordeiro.

Com um grande abraço
José Nascimento


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Nota do editor

Último poste da série de 5 DE mAIO DE 2015 > Guiné 63/74 - P14569: Convívios (673): XI Encontro do pessoal da CART 1742 (Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), no próximo dia 30 de Maio de 2015, em Viana do Castelo (Abel Santos)

Guiné 63/74 - P14570: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (3): Reunião com o Gen Spínola e início do IAO em Bolama

1. Mensagem do nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), com data de 28 de Abril de 2015:

Luís Graça e Carlos Vinhal, Camaradas amigos.
Antes de mais, quero felicitar-vos pelo sucesso do X Encontro em Monte Real. Com muito mérito vosso e dos demais organizadores, acho que esteve à altura da dimensão e prestígio da Tabanca Grande. Então, pode dizer-se que todos estamos de parabéns.
Junto em anexo mais um texto das minhas memórias. Noutro mail que enviarei já de seguida, segue novo texto.

Um abraço fraterno para ambos,
A. Murta


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74

[Recapitulando o anterior poste: 23-03-1973 – Chegada a Bolama; 1ªs impressões; Início da IAO; Boas vindas do Gen. Spínola ao Batalhão 4513; Desfile das tropas perante o CMDT-Chefe e demais individualidades].


3 - REUNIÃO DE GRADUADOS COM O GEN. SPÍNOLA

Concluídas as cerimónias, enquanto a maioria debandava, todos os oficiais e sargentos estavam convocados para uma reunião com o General num salão do Hotel Turismo, actual messe de oficiais. Durou duas horas, esta reunião.

(Do que se passou naquela sala soturna e constrangida, creio que já em tempos aflorei (ou dei mesmo conta?) no nosso blogue. Na dúvida, e por uma questão prática transcrevo do meu diário):
Acomodados todos os presentes, fixaram-se as atenções na mesa presidida pelo Gen. Spínola, ladeado por todo o Comando do Batalhão e outros oficiais da sua comitiva. Era notória a frieza do General para com o Comandante do Batalhão, votado ao ostracismo e visivelmente incomodado.

O General, depois de palestrar para todos sobre o retrato da situação na Guiné e do papel que nos cabia a nós no evoluir dessa situação, deu por encerrada a primeira parte da reunião e convidou os sargentos e furriéis a saírem. Prosseguiu de imediato a reunião apenas com os oficiais. Estava muito interessado em saber o que pensávamos nós sobre aquela guerra e sobre a nossa acção nela e junto das populações.

Para meu azar, aponta-me o dedo e diz:
- O nosso alferes que pensa de tudo o que já aqui foi exposto?

Surpreso, levantei-me com todas as atenções concentradas em mim e, num ápice, percebi que não iria falar apenas para ele, tendo de decidir rapidamente que versão escolheria entre várias hipóteses a considerar. Então, muito contrafeito e cobardemente, (sensatamente?), recitei-lhe a cartilha oficial, a que me ensinaram, sem introduzir originalidades nem virtuosismos, enfim, pensando que era o que ele queria ouvir (e não era), mesmo se o meu pensamento estava nos antípodas do que lhe dizia, devido à minha formação política, muito anterior à entrada para o Exército. O General ouviu-me em silêncio e depois mandou-me sentar. E eu a ler-lhe o pensamento: Mais um idiota!
Depois interpelou o Alf. Capelão com a mesma questão.

Quando este começou a falar, sem tibiezas e com uma audácia a roçar o desaforo, para as circunstâncias e para a época, eu não sabia onde me havia de enfiar... Foi então que o Gen. Spínola o interrompeu para o pôr à vontade, dizendo-lhe:
- O nosso Alferes pode falar à vontade, dizer o que pensa, porque daquela porta - e apontou - não sairá uma palavra. (O Comandante do Batalhão, enfiado, transpirava e bufava...).

E ele continuou, pondo em dúvida o colonialismo e a legitimidade de tudo aquilo que a maioria entende por legítimo, natural, a ordem das coisas..., mas também questionando o estado social da colónia, em pleno século XX, depois de 500 anos de colonização. Falou bastante tempo sem ser interrompido. Era um valente. (E não apenas intelectualmente: vi-lhe dar um murro nos queixos a um soldado que apalpou o rabo a uma adolescente estudante de Bolama que seguia à nossa frente no passeio, que ele até voou! Éramos amigos e com muito respeito mútuo: ele era padre católico e eu ateu empedernido. Desapareceu depois de uma distribuição clandestina de panfletos à tropa sobre, creio, a má alimentação que era distribuída aos soldados, - ou a toda a tropa?).

O General pareceu ter gostado do que ouviu ao Alferes Capelão e disse para o seu Ajudante-de-Campo tomar nota de que lhe devia enviar, de oferta, o seu livro “Portugal e o Futuro”, ainda não publicado. (Só mais tarde, quando o livro saiu, e com a polémica à sua volta, percebi o seu interesse em auscultar os militares a propósito da situação na Guiné e do seu desfecho político e militar, pois que ele preconizava uma solução diferente para a colónia. Adquiri o livro muitos anos depois).


9 de Abril de 1973 – (segunda-feira) – Início da 1ª semana de campo no interior de Bolama

Deslocámo-nos muito para o interior da ilha e acampámos numa zona elevada e, de certo modo, aprazível. Na nossa frente e em baixo podia ver-se o mar, ainda que a grande distância. Na verdade é o canal marítimo entre a ilha de Bolama e o continente. Próximo deste local fica uma pequena tabanca de etnia Mancanha ou Brames, não recordo, mas são as etnias maioritárias em Bolama. Da Guiné que eu conheci, foi o único local em que vi as mulheres usarem uma tanguinha de palha de arroz sem mais nada sobre o corpo. Excepção para a cidade de Bolama e, aqui na tabanca, num caso ou outro. Parece que é comum esta forma de “vestir” em todo o arquipélago dos Bijagós.

Pouco depois da nossa chegada fiz uma visita à tabanca e fiquei encantado, embora visse nos homens-grandes alguma desconfiança e agressividade. Talvez tenham razões para isso: já por aqui passaram muitos tropas e, por certo, nem todos respeitadores. Mas as bajudas e as crianças são adoráveis: à noite, quando acendemos fogueiras no acampamento para afastar os mosquitos e a horrível – e chata! – mosquinha do capim, aparecem de mansinho algumas bajudas e, pasme-se!, sentam-se no chão como nós, no meio das nossas pernas, encostadas a nós e viradas para a fogueira. Imagine-se, vestidas só de tanguinha e de um sorriso doce..., mas sem qualquer maldade. Perante este afecto e inocência, também da nossa parte estava fora de questão qualquer maldade. São miúdas com idades, talvez, a partir dos 13, 14 e 17 no máximo. Falam um português razoável, mercê, talvez, da proximidade da cidade de Bolama e, quem sabe, do já longo contacto com a tropa.

As mais velhitas não costumam aparecer à noite mas vamos encontrá-las de dia na fonte. Eu e o meu amigo J. R. já tínhamos bajudas “dedicadas”... A fonte era uma espécie de centro de convívio, (felizmente não era hábito aparecerem outros camaradas), para onde nos escapávamos nos tempos livres e aí íamos encontrar também as mulheres-grandes, sisudas e desconfiadas.

Quando abalavam, carregadas de cabaças e alguidares com água à cabeça, as bajudas mais velhitas começavam as suas higienes, largavam as tangas e pegavam no sabão e nas “esponjas” feitas de raízes secas e muito finas. Ensaboavam-se até onde chegavam e depois estendiam-nos as “esponjas” para que as lavássemos por trás. Aí, a nossa lascívia misturava-se com a falsa naturalidade e, era certo, com uma grande dose de maldade. Elas correspondiam com risadas e sensualidade, mas não se passava dali. Até que um dia... (talvez, de caminho, venha a contar um episódio lamentável, fruto da nossa ousadia e irresponsabilidade, mas que agora não cabe aqui).

Fiz junto desta população amizades fortes, especialmente com as crianças: um rapazito e três bajudinhas de uma doçura enorme. Quando chegou a hora de os deixarmos de vez, no momento da despedida até me beijaram. Só tive um caso em que me zanguei deveras: foi com um velho que não falava bem o português e que embeiçou com a minha faca de mato. Só quando lha passei para as mãos percebi que queria ficar com ela. Foi um problema para a reaver e receei ter que usar a força.

Havia na ilha, (na pequena parcela que me foi dado conhecer), outros encantos e outros prazeres. Um deles, era cruzar-me a meio da manhã, numa picada exuberante, com um vendedor de vinho de palma em marcha acelerada rumo à cidade. Distinguia-se ao longe, bamboleante, com a sua carga suspensa da vara que carregava ao ombro: de cada extremidade da vara pendia um grande garrafão. Parava, satisfeito, e nós enchíamos os cantis daquele líquido aromático e fresco, que se bebia de um fôlego, até se aprender como era enganadora aquela suave frescura... O homenzinho partia de novo na sua marcha, mais aliviado da carga que, a partir de agora, carregaria a nossa cabeça... Cabeça-grande, já se vê.

O treino militar propriamente dito, e era para isso que ali estávamos, foi muito desagradável. Não se esperava que fosse agradável, mas foi difícil a adaptação àquelas condições: manhãs muito frias, zonas de capim orvalhado e muito alto, (mais alto que um homem), e infestado de uma mosquinha minúscula que nos envolvia, metendo-se nas narinas, nos ouvidos, enfim... era com este incómodo e com os camuflados encharcados que fazíamos as emboscadas, os golpes de mão e as restantes peripécias do treino, incluindo ser-mos abatidos pelo “IN” num meio tão adverso. Mas já dava para antecipar o que nos esperava no cenário real da nossa futura actividade. Se este treino tinha como objectivo preparar-nos melhor para ela e compensar a deficiente preparação da Metrópole, então havia que aguentar e aproveitar ao máximo, sendo certo que não iria resolver o desnível da preparação dos graduados em relação aos soldados. Imaginava já os custos altos com que, gradualmente no mato ganhariam a prática que agora lhes faltava, frente a um inimigo experimentado e motivado. Não devia valer. Estava a chegar ao fim a primeira semana de campo.


15 de Abril de 1973 (Domingo) – Fim-de-semana em Bolama

Fomos passar o fim-de-semana a Bolama. Nesta data já sabia que em 24 de Abril partiria para Nhala, uma pequena povoação no interior e a sul da Guiné. Sem mais pormenores. Será aí que, finalmente, ficaremos a cumprir a comissão.

Foi um fim-de-semana em cheio. Retemperar forças, fazer higienes adequadas mas, principalmente, comer bem. Havia que aproveitar os derradeiros dias de relativa tranquilidade. Avizinhavam-se tempos difíceis e incertos. Nesta quase noite de domingo, foi um “fartar vilanagem”! Fomos à Pensão do Zeca, um tipo de Coimbra aqui radicado há 25 anos. Ostras! Queríamos ostras! Era uma mesa enorme bem composta de comensais. Eu estava sentado ao lado Alferes Capelão que, enquanto esperávamos pelo pitéu, se pegou com o camarada da frente por este, com simulacros de mau gosto, o ter provocado. Acho que era o Alferes M., sempre muito divertido mas que teve a ideia peregrina de fazer hóstias com miolo de pão e pôr-se para lá a benzê-las à frente do Capelão. A coisa esteve mesmo para azedar... Comemos, pois, muitas ostras. Mas no fim o estômago ainda reclamava. Mandaram-se fazer omeletes de carne com batatas fritas e, parecia, tudo se recompunha em definitivo. Mas, aproximava-se a hora do jantar (!) e já dali não saímos: aguardava-nos um leitão que havíamos encomendado com antecedência e ele chegou mesmo na hora.

(continua)

Texto: © António Murta
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Nota do editor

Poste anterior da série de 8 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14446: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (2): Partida para Bolama, IAO e visita do General Spínola

Guiné 63/74 - P14569: Convívios (673): XI Encontro do pessoal da CART 1742 (Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), no próximo dia 30 de Maio de 2015, em Viana do Castelo (Abel Santos)

1. Conforme foi solicitado pelo nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), estamos a dar conhecimento do XI Encontro do pessoal da sua Unidade, a levar a efeito no próximo dia 30 de Maio de 2015, em Viana do Castelo.


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Nota do editor

Último poste da série de 3 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14562: Convívios (672): Almoço Convívio do CART 2479, no Vimeiro, Lourinhã, no dia 30 de Maio (Valdemar Queirós)