Foto nº 2 > Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > CCAV 8351 (1972/74) >. Visita do General Spínola - Está a ver ali General? É Nhacobá!!!.. - Em primeiro plano da esquerda para a direita: Comandante de Aldeia Formosa; General Spínola e o comandante da companhia o Capitão Vasco da Gama. Em segundo plano 2 ajudantes de campo de Spínola
Foto nº 3 > Guiné > Região de Tombali > Cumbijã > CCAV 8351 (1972/74) > O regresso do General Spínola a Bissau... antes que “elas” comecem a caír !
Paz & Guerra: memórias de um Tigre
do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) -
Parte IX (#)
A cruel
confirmação do discurso agoirento do srgt Redondeiro: “o primeiro murro no estômago”
Estávamos nós nesta azafama diária de: (i) patrulhamentos na mata; (ii) segurança aos trabalhos de engenharia; (iii) coluna diária a Aldeia Formosa para reabastecimento, particularmente de água (razão pela qual esta coluna era conhecida pela coluna da água), quando voltamos a levar mais um murro no estômago. Desta vez com contornos dramáticos já que sofremos a primeira morte em combate.
A coluna da água que regressava ao Cumbijã ao fim da tarde (*), quando já todo o pessoal de proteção dos trabalhos tinha abandonado o local, perto de Colibuia, é emboscada por um grupo IN que fazia proteção a um outro grupo que minava, uma vez mais, um pontão.
Como já era muito perto do Cumbijã ouvimos claramente os rebentamentos e as rajadas de armas ligeiros, pelo que logo deduzimos ser uma emboscada do IN ao nosso grupo que regressava a casa. Em segundos se formou um grupo, uns em chinelos, outros descalços e quase todos em calções e tronco nu, montando em duas berliets com a G3 aos ombros em socorro dos nossos camaradas.
Chegados ao local da emboscada depara-mo-nos já com o IN em fuga e o desespero do nosso grupo perante a morte de um camarada no asfalto e ferimentos em quase todos os restantes (já que a maioria saltou das viaturas ainda em andamento).
Cruel confirmação do discurso do Sargento Redondeiro ainda em Portalegre (**).
Inimaginável a nossa revolta, com a insistência de alguns em se fazer a perseguição a quem provocou todo aquele horror não obstante o cair da noite. Com o ranger dos dentes de raiva (... a resvalar para o ódio!) e lágrimas nos olhos, não foi fácil resignarmo-nos ao facto de nada podermos fazer perante a morte do nosso camarada.
Foi com estrondo que tomamos consciência da violência e crueldade da guerra. Ainda hoje, a esta distância, tenho dificuldade em descrever a forma como esta perda afetou todo o grupo. Tudo mudou a partir deste fatídico dia.
Os dias seguintes foram muito difíceis. Os ferimentos graves em três camaradas da companhia, ao acionaram 3 minas, foi vivido por todos nós com muito dramatismo (ver dois amigos perderem uma perna e outro uma mão, em plena juventude, são coisas que só vividas, não há palavras que possam descrever o que nos vai na alma), mas nada se compara à morte de um companheiro. Mais do que nunca nos consciencializamos que vivíamos diariamente com o IN, pisando os mesmos caminhos e sentindo a sua respiração.
Não obstante este conflito se caracterizar como uma guerra de guerrilha, dada a proximidade dos beligerantes mais parecia estarmos numa guerra de trincheiras como na 1ª guerra mundial em que as trincheira eram separadas apenas por uma pequena mata densa. No silêncio da noite, em Cumbijã, eram audíveis os sons próprios da vida de uma aldeia na base do PAIGC em Nhacobá.
Com o tempo e o efeito do ”cacimbo”, os incidentes que eram recorrentes (quer na coluna diária da água quer na do transporte da engenharia para a frente de trabalhos), davam lugar ao batismo, pelos soldados, desses mesmos lugares, particularmente em três bolanhas (que eram os locais mais abertos e perigosos) cuja minha memória já só regista a “bolanha das touradas”.
O comando desta coluna diária a Aldeia Formosa era rotativo por todos os graduados da companhia, cabendo-me a mim (se a memória não me falha) o comando desta. Por insistência de um camarada, que, segundo ele, tinha assuntos a tratar em Aldeia Formosa (não obstante os perigos todos gostávamos de ir à “civilização”!!!...) cedi-lhe o lugar. O destino é como as bruxas: não acredito nelas mas que as há, há !!!
Para levantar a moral das tropas, tivemos a visita, ao Cumbijã (a nossa modesta casinha) do comandante em chefe da Guiné o General Spínola, em 14 de abril de 1973 (##)...
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(*) Esta coluna da água, neste dia, atirou mais para tarde para levar o sargento Redondeiro (que julgo nunca ter pernoitado em Cumbijã, permanecendo em Aldeoa Formosa a tratar da “burocracia” da companhia) que se deslocou a Cumbijã para uma reunião com o Capitão.
(**) … Foi aqui (Portalegre) que o mesmo sargento (Redondeiro), de fisionomia a condizer com a patente, grande e gordo, com uma avantajada barriguinha, e que, dada a sua experiência feita de outras comissões em África, resolveu fazer aos soldados, formados em parada, o discurso de despedida. Era suposto um discurso a chamar ao patriotismo mas ao mesmo tempo de ânimo e de tranquilidade e de que tudo iria correr pelo melhor. Contudo o discurso saiu completamente ao lado ao começar logo por dizer:
- Caros militares, infelizmente, alguns de vocês não voltarão a casa…
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(#) Último poste da série > 1 de maio de 2021 > Guiné 61/74 - P22159: Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-Furriel mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74) - Parte VIII: A primeira visita... dos "vizinhos", com ataque ao arame!