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segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5464: O Nosso Livro de Visitas (74): O blogue não deve ser a Praça da Figueira (Salvador Nogueira, BCP 12, BA 12, Bissalanca, 1969)


«Guiné > Teixeira Pinto (ou Canchungo) > CAOP 1 > Talvez a única foto que temos, no nosso blogue, embora de má qualidade, do Cor Pára Rafael Ferreira Durão. "A caminho do almoço de Natal de 1971. Da esquerda para a direita respectivamente, Cmdt do BCaç 3863 (?), Cmdt do CAOP [1] Cor Pára Rafael Durão e Ten Pára da CCP 122". (*)

Foto e legenda:  © Jorge Picado (2008). Direitos reservados


1. Mensagem de Salvador  Nogueira, antigo oficial pára-quedista (Guiné, 1969 - estivemos juntos pelo menos numa operação em que foi aprisionado o roqueteiro do PAIGC, Malan Mané, em Agosto de 1969) (**).    Esteve também em Angola (BCP 21, com o meu amigo e conterrâneo Jaime Bonifácio Marques da Silva, em 1970/1972) e Moçambique, Nacala (BCP 32, onde esteve um ano e meio). É  assíduo leitor do nosso blogue.

Teve a gentileza, há tempos de mandar um livro seu, de short stories, com o irónico título de Notícias da Guerra Pitoresca (edição de autor, 2009), e com a sibilina dedicatória: " De um ponto  [?] algures entre os heróis do mato e os post-traumáticos. Para o Luís  em troca do 'Blogueforanada'. Com um abraço do Salvador". 

Para S. Nogueira,  que passou pelos três TO da guerra colonial (Angola, Guiné, Moçambique), "a guerra não é coisa delicada; falar dela também não"... Talvez por essa razão, ele nunca tenha até hoje aceite o meu  convite para ingressar na Tabanca Grande, preferindo o estatuto, mais independente, de leitor e comentador dos nossos postes...

Amigo Luís

Peço-te que faças um esforço para que o blog (uma notável iniciativa de que decorre a minha consideração por ti) não se converta num bastião de merdas post-seja-o-que-for (desculpa a rudeza da linguagem) ou num coio de heróico-desgraçados que levaram muita porrada e por conseguinte acham ter direito a opinião firmada. A distância no espaço e no tempo não apaga o enquadramento e cada soldado que esteve em África foi-o naquele período de que saca agora recordações, permitindo-se alguns um exacerbamento ou alastramento de opinião para a qual não se adivinham dimensão ou competência, pessoal ou militar, lá! naquele tempo, com as características pessoais de então e no ambiente condicionante de que será bom não abstrair.

É bom também lembrar, tentando evitar a subestima ou escamotear a competência de cada um in locu ou hoje, o que era então cada função, cada posto, cada unidade e cada zona de acção. É também bom reencaminhar os que não têm a noção do escasso significado do testemunho pessoal, subjectivo ou grosseiro, num processo que, como tens dado a entender, se pretende com algum alcance hsitórico, para além da dimensão que possa ter no apoio social e individual a dar aos combatentes da Guiné.

Um abraço

Que se me desculpe alguma insistência, em alguns casos.

PS - O Cor Durão foi meu comandante em Angola e por vezes andava a passear comigo na parada do BCP21, à noite, quando eu estava de serviço, reflectindo sobre a nossa acção em geral e, em particular, sobre a do Batalhão de Angola.

Não me considero apto a comentar a sua conduta e postura nem a sua acção de comando. Interrogo-me como é possível que um qualquer obscuro militar, sem conhecimento alargado visível, possa permitir-se tecer considerações e emitir juízos valorativos sobre um militar muito mais graduado, muito mais experiente e muito mais habilitado.

Se a questão fulcral tem a ver com a ameaça de chapada na cara ou de murro na tromba, então é simples - a ter acontecido, o Regulamento permitia que o militar comunicasse o facto. Lembro que actos de indisciplina, rebeldia, recusa do combate ou colaboração com o inimigo, etc. em campanha eram passíveis de procedimento muito mais expressivo que o tão malfadado murro nas trombas, o qual, ainda assim, era raro.

O blog não deveria ser a praça da figueira podendo ser todavia praça pública - é uma questão de nível e de qualidade da colaboração.

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Salvador:

Embora a gente não se conheça (físicamente falando), já trocámos suficientes mails para ficarmos com um certa  ideia, virtual,  um sobre o outro. Inclusive, devo-te um almoço no bar do meu local de trabalho, a agendar para um dia destes em que venhas a Lisboa, no interregno do teu auto-exílio ribatejano.

Em contrapartida, tu tens a ligeira vantagem de me ver exposto, na montra do blogue de que és visita regular mas não membro, por razões que eu  não descortino mas que respeito. Como leitor, mereces a consideração de qualquer leitor, a que acresce o teu estatuto de camarada da Guiné. O nosso blogue, mal ou bem, é hoje mais do que o somatório de todos os seus membros (inscritos, os que pagaram simbolicamente a jóia de inscrição, e que o alimentam e mantêm vivo, todos os dias)...

Apercebo-me que há muita gente a ler-nos, uns que estiveram na guerra colonial (ou do UItramar, como queiras), outros que estiveram noutros TO que não a Guiné, ou que, tendo estado na Guiné,  optam pelo low profile ou não querem mesmo dar a cara (ou esperam a melhor oportuniddae para o fazer), e ainda outros (e outras), enfim, que por razões várias, afectivas, profissionais, circunstanciais ou outras,  acompanham a nossa produção bloguística...

Ao fim de quase seis anos de blogue (a festejar em Abril de 2010, se lá conseguirmos chegar), verificamos que muita gente, muita e desvairada gente nos lê, uns com alegria, outros com humor, com ironia, com afecto, com empatia (e outros nem tanto, invectivando-nos possivelemente por não fazermos o blogue dos seus, deles, sonhos, pesadelos, ideais, expectativas, causas, projectos, etc).

Também não gostaria, meu caro Salvador, que este blogue onde já "queimei"  7,5% da minha esperança média de vida (que é de 73 anos, para os homens da minha/nossa geração), se transformasse num "coio" [abrigo de malfeitores, esconderijo...] de quem quer que  seja, muito menos dos tais "heróico-desgraçados que levaram muita porrada e por conseguinte acham ter direito a opinião firmada"...

Em teoria (e, espero, na prática), aqui ninguém tem "opinião firmada" [leis-se: assinada, catedrática, definitiva...] sobre nada, no que diz respeito à guerra colonial na Guiné: causas, antecedentes, consequências,  protagonistas, heróis, vilões, grandes batalhas, datas-chave, etc.... Em rigor, ninguém deve (nem pode) impor o seu ponto de vista, muito menos a sua verdade ex-cathedra (leia-se: da cadeira de S. Pedro, da cadeira de catedrático, ou seja, valendo-se do cargo, função ou estatuto no antigamente da guerra...). Tu mesmo me chamaste a atenção, um dia,  para a aparente contradição entre o tratamento romano (tu-cá-tu-lá) entre "camaradas", mantido no blogue,  e o desfile de títulos, antigos ou actuais, militares, profissionais e académicos, com que adjectivamos os membros da Tabanca Grande, que em princípio são todos "amigos e camaradas da Guiné" (e ponto final)...

Por outro lado, sempre procurámos incentivar a criação, entre nós, de uma cultura de liberdade, verdade, rigor, frontalidade, responsabilidade... Há abusos, picardias, excessos verbais, insultos, tretas, comportamentos de bravata, fanfarronice, gente que faz bluff, gente que é menos séria (intelectualmente falando), gente que conta um conto e acrescenta um ponto, gente que não sabe discordar sem puxar pela G3, gente que se põe em bicos de pés, gente da Praça da Figueira (onde até aos anos 50 existiu o principal mercado da cidade de Lisboa...), gente da língua afiada e do argumento curto, gente que não dá a cara e se esconde atrás do baga-baga... ? 

Há, com certeza, pontualmente... Há, com certeza, mais até do que gostaríamos... Mas, ao fim destes anos eu tenho algum orgulho por o nosso blogue não se  ter tornado uma blogopeixarada... Muito menos, ainda a praça dos autos de fé, o muro das execuções sumárias, o palanque dos assassínios de carácter, a arena do combate político-ideológico, o megafone do pensamento único e do unanimismo,  a esponja da história dos vencedores, o muro de lamentações dos vencidos, e por aí fora...

Por isso é importante receber, periodicamente, sinais de aviso à navegação como os teus (e dos demais leitores)...  Sinais que são sempre bem acolhidos pelo timoneiro , espero, também pelo resto da equipagem...

Obrigado. Em contrapartida, ficas-me a dever a história do Malan Mané...  Um Alfa Bravo do paisano... Luís Graça.

___________

Notas de L.G.:
 
(*) 11 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3597: O meu Natal no mato (13): De Cutia (1970) ao CAOP1, em Teixeira Pinto (1971) (Jorge Picado, ex-Cap Mil)

(**) Op Nada Consta, vd. post de 30 de Julho de 2005, I Série do Blogue  > Guiné 63/74 - CXXX: A CAÇ 12 em operação conjunta com a CART 2339 e os paraquedistas (Agosto de 1969)  (Luís Graça)

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Guiné 63/74 - P5444: Dossiê Guileje / Gadamael (17): Depois do que ouvimos da boca do Sr. Cor Pára Durão, tudo o que vier a ser dito, soa a elogio (Victor Alfaiate)

1. Mensagem do Victor Alfaiate, com data de 30 de Outubro, e em princípio privada, mas que entendi dever divulgar como complemento do poste P5415 (*) e como contributo para um melhor conhecimento do seu autor, que foi  Fur Mil Trms, CCAV 8350 (Guileje, 1972/73), e é um dos novos membros da nossa Tabanca Grande. Permitam-me apelar, mais uma vez, para a elevação, intelectual e ética, que devemos manter na discussão, franca e aberta, deste dossiê difícil, fracturante, doloroso... (LG)

Olá,  Luís, Boa Noite

Li com a máxima atenção o mail que me remeteste e antes de mais quero esclarecer que não é nem foi nunca minha intenção melindrar ou ofender quem quer que seja.

Aliás se contactares os meus camaradas Reis, Seabra, Zé Carvalho ou Major Coutinho e Lima,  eles confirmarão certamente que sou incapaz de ofender quem quer que seja, mais que não seja porque me considero suficientemente educado para o não fazer.

No entanto e relendo o meu mail, confesso não ter encontrado nada que possa ofender os Srs. Tenentes Pessoa e Martins de Matos,  salvo a alusão às loirinhas e ao ar condicionado, mas se analisares com atenção é o Sr. tenente Martins de Matos que, no P3737,  diz que dormia todas as noites no ar condicionado, as palavras são dele não minhas.

Quanto a utilização do tratamento por Senhores, dou-te a minha palavra de honra que não há no mesmo qualquer sentido depreciativo, antes uma questão de respeito. Se reparares, trato todos por Senhores (Sr. Major; Sr. General; Sr. Alferes), aliás na Força Aérea todos se tratavam por Senhores, enquanto no exército era (Meu Capitão; Meu Alferes; Nosso Cabo),  na Força Aérea era (Sr. Capitão; Sr. Alferes).

Quanto ao termo "desculpa esfarrapada", não vejo qualquer mal, trata-se de uma desculpa que todos vêem ser falsa (Ex. Empresta-me o teu carro - Não posso porque acabei de o pintar e ainda não secou). Não vejo em que tal termo possa ser ofensivo.

No que diz respeito à ineficácia da Força Aérea no que toca ao apoio a Guileje, tive o cuidado de referir no início que era a minha opinião pessoal, correndo até o risco de poder ser injusto, mas sinceramente é e continua a ser a minha opinião pessoal, e aliás deixo bem explícitos os motivos conducentes a tal opinião.

No que respeita ao diálogo com o Sr. Tenente Martins de Matos, penso não poder fazer qualquer alteração uma vez que o mesmo reproduz na verdade o que realmente se passou.

Entendo perfeitamente que tentes evitar picardias, mas sinceramente não foi meu intuito provocá-las, aliás se vires bem no meu mail digo claramente que não era minha intenção participar numa discussão que, julgo, nunca conduzirá a qualquer conclusão, pelo que se achares que não deves publicar o meu mail, estás  à vontade para o fazer, considera-o se assim o entenderes sem efeito mas não me peças para fazer alterações porque isso seria desvirtuar o que sinto e penso na realidade, e já me basta viver num país onde os que fugiram a cumprir um dever que bem ou mal era servir a pátria, são considerados patriotas e democratas e nós, que andamos lá a bater com os costados, somos tratados nalguns casos abaixo de cão.

Este mail é pessoal, pelo que só para ti e, confirmando o que atrás deixo referido, se quisesse provocar picardias,  o P3737 do Sr. Tenente Martins de Matos dava pano para mangas, a saber:

- Sr. Major Coutinho e Lima sem perfil para comandar o Cop 5;
- O Homem do rádio, isto sim dito com sentido depreciativo;
- Guileje para os corrécios;
- B-52 - Resposta com raiva;
- Terem fugido 600 pessoas;
- Transformar o Sr. Major Coutinho e Lima num herói, que não foi.

Como vês,  a haver alguém que se deveria sentir melindrado e ofendido eramos nós, mas como já estamos habituados, nem ligamos, são bocas que esbarram na couraça da nossa indiferença. Depois do que ouvimos da boca do Sr. Coronel Durão quando chegámos a Gadamael, tudo o que vier a ser dito nos soa quase como elogios.

Não te vou chatear mais, como disse estás a vontade para dares ao mail o destino que quiseres.

Quanto a fazer parte do Blogue, como já disse terei muito gosto nisso, mas as fotografias só as poderei enviar quando for a Portugal.

Um Abraço.
Victor Alfaiate
_____________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de :

7 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5417: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (15): Ainda e Sempre Guileje (Victor Alfaiate, ex-Fur Mil Trms, CCAV 8350, 1972/74)

Vd. também: 9 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5432: FAP (39): Guileje, outra vez?!... (António Martins de Matos)

(**) Vd. poste de 14 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3737: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (11): Um erro de 'casting', o comandante do COP 5 (António Martins de Matos)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3597: O meu Natal no mato (13): De Cutia (1970) ao CAOP1, em Teixeira Pinto (1971) (Jorge Picado, ex-Cap Mil)

Foto 1 > CAOP 1. Teixeira Pinto. A caminho do almoço de Natal de 1971. Da esquerda para a direita respectivamente, Cmdt do BCaç 3863 (?), Cmdt do CAOP Cor Pára Rafael Durão e Ten Pára da CCP 122.


Foto nº 2 > CAOP 1. Teixeira Pinto. Alguns oficiais do CAOP dirigindo-se para o almoço de Natal de 71. Cap Art Borges, meu camarada de quarto; Maj Barroco, de camuflado; Maj Santos Costa, com a sua inseparável bengala e de quem era adjunto; eu próprio, já bem lavadinho, de barbinha feita e bem vestidinho.


Foto nº 3 > CAOP 1. Teixeira Pinto. Na mesa da presidência distinguem-se: Cor Rafael Durão, de pé; um soldado Pára servindo o Maj Santos Costa; creio que o Maj que substituiu o Maj Inocentes (será o Maj Pára citado por Graça de Abreu no seu livro a pág 18?); o autor. De costas distingue-se um 1.º Sarg Pára.

Fotos e legendas: : © Jorge Picado (2008). Direitos reservados



1. Mensagem de Jorge Picado, ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, com data de 7 de Dezembro de 2008:

Caros Luis, Carlos e Briote

Seguem-se umas simples palavras sobre o tema do Natal e Final do Ano que, de tão repetidas, nada têm de extraordinário.

A novidade está apenas no aproveitar para enviar 3 fotografias da passagem pelo CAOP 1, retratando-se mais alguns rostos de militares que igualmente por lá andavam.

Abraços
Jorge Picado



2. O meu Natal no mato (13) > De Cutía (1970) ao CAOP1, em Teixeira Pinto (1971)
por Jorge Picado

Aproximando-se uma das épocas mais festejadas da Humanidade, Natal (principalmente para o Mundo Católico) e Mudança de Ano (para todos) (1) (2), sempre com o sentimento de que a celebração dum Nascimento e o terminar de Ano Velho sempre cheio do mesmo – miséria, fome, guerra, desnivelamento económico cada vez mais acentuado, apesar dos enormes avanços científicos que quando verdadeiramente se deu o grande salto (pós II Guerra Mundial) diziam ser para beneficio de Toda a Gente, mas que tem sido apenas para os bolsos sempre dos mesmos – em que todos manifestam a esperança dum Renascimento e dum Novo Ano que augure o início do fim de todas as misérias, guerras, mais solidariedade e se entre, já não digo no Éden (porque não sou crente), mas pelo menos num reino de Harmonia e Bem Estar, em primeiro lugar quero desejar a todo o Pessoal da Nossa Tabanca um Bom Natal e que pelo menos o 2009 não seja pior do que este 2008, pois a esperança anda pelas ruas da amargura.

De seguida, contribuir para as memórias das mesmas épocas passadas naqueles tempos da Guiné.

Essas recordações são muito vagas e ao fim e ao cabo iguais hás de tantos outros, ainda que as minhas não fossem tão sofredoras quando comparadas com a daqueles que tiveram de passar longas horas no mato a fazer segurança ou dos que sofreram ataques.

Dobrei dois Anos.

No que diz respeito ao primeiro, finais de 1970, fi-lo numa estância de veraneio , a Pousada de CUTIA.

A ceia de 24, comida como sempre sob a protecção das frondosas (e seculares?) árvores que ladeavam a estrada (era aí a messe e bar desta Pousada), foi naturalmente melhor do que nos outros dias, pois na véspera tínhamos feito coluna a MANSOA para reabastecimento de géneros mais frescos.

Só não recordo se foi uma ceia madrugadora por causa dos que foram emboscar, pois a indicação que tenho na Agenda sucintamente refere para este dia, tal como para o seguinte, [Grupo no Mato (18-24)]. Quer dizer que esteve um grupo fora das 18H até 24H.

É muito mais provável que para equilibrar os serviços, o grupo que foi fazer a segurança externa fosse dos efectivos africanos, já que estes comiam nas suas tabancas e a 25 foram os metropolitanos.

O almoço de 25 foi igualmente melhorado e possivelmente com algum excesso, pelo menos de cerveja. Existe aquela foto que enviei em que algumas mulheres de militares do Pel Caç Nat 61, me cercam contra uma das tais árvores, apadrinhadas pelo Simeão, procurando sacar-me mais alguns pesos para os festejos deles…

O que posso dizer é que não tivemos prendas oferecidas pelos nossos vizinhos do MORÉS, quer a 24 quer a 25.´

Julgava eu que esta falta de prendas tinha por origem o que se passou a 28 e que era para ser a 27, como já contei, mas perante as informações que o Senador Vítor Junqueira fez o favor de nos transmitir, num dos seus saborosos e brilhantes testemunhos, já fico na dúvida se foi afinal devido à boa Actividade Psicológica do Alf Simeão!

A primeira Passagem de Ano e o Dia de Ano Novo, passados igualmente no mesmo local também nada teve de especial, a não ser algum champanhe, para intervalar com as bazucas de cerveja, misturadas com cânticos de saudade e felizmente sem qualquer fogo de artificio, acabando por se recolher cada um ao escuro do bunquer e na solidão da noite carpir as respectivas mágoas. As esperanças eram apenas para aqueles que visionavam o fim do inferno daí a 45 dias.

Na segunda época só me recordo das Festas Natalícias.

A noite da Consoada passei-a, em representação do CAOP 1, no Destacamento do BACHILE, situado um pouco a Norte de TEIXEIRA PINTO na estrada para o CACHEU cujos trabalhos de reabertura e pavimentação decorriam nessa altura um pouco mais a Norte.

Neste aquartelamento estava pelo menos (não tenho a certeza se havia igualmente uma CCaç Africana) uma CCaç cujo Cmdt era o Cap Mil do QC Branco (em 1974, antes do 25ABRIL, vim a reencontrá-lo na minha terra onde veio morar, enquanto esteve colocado no RI de Aveiro onde apanhou a revolução, na qual esteve enquadrado) e que não tenho a certeza se seria a 3461, mas pertencia ao BCaç 3863 que tinha chegado ao Chão Manjaco em 20H30 do dia 24 de Outubro de 1971.

Não resisto a transcrever o que o camarada António Graça Abreu, que chegou ao CAOP 1 cerca de 5 meses depois de eu o ter deixado, escreveu no seu DIÁRIO DA GUINÉ sobre o BACHILE que visitou ao fim de 6 dias.

“O Bachile, um aquartelamento pequeno rodeado por fileiras duplas de arame farpado. Ao lado um reordenamento, isto é, umas dezenas de casas pintadas de branco com telhados de zinco destinadas aos negros que, vindos das zonas libertadas, se apresentam à tropa portuguesa. As casas não estão habitadas.

"O aquartelamento é deplorável. Logo atrás do arame farpado há dezenas e dezenas de bidões cheios de areia rodeando umas tantas tabancas. Depois há telhados em cimento armado cobrindo os tegúrios semi-afundados na terra habitados pelos nossos soldados, uns setenta a oitenta. É a protecção possível contra flagelações e bombardeamentos. E dão uma certa segurança aos homens brancos expatriados na terra dos negros comandados pelo alferes Rocha, …creio ser uma miniatura exemplar de dezenas e dezenas de aquartelamentos portugueses espalhados pela Guiné... ”.


Bem, como estas forças tinham, entre outras missões, efectuar a segurança aos trabalhos de reconstrução da estrada, é muito possível que, naquela data, 5 de Julho de 1972, parte dos efectivos tivesse avançado para a zona mais a N onde andaria já a frente de trabalhos e se aqui estava o Alf Rocha a comandar, das duas uma, ou o Cap Branco estava de férias ou estava na frente dos trabalhos.

Quanto às condições do aquartelamento, havia-os muito bem piores, como de certo ele posteriormente encontrou, nas suas deambulações por MANSOA e CUFAR.

Voltando ao meu percurso direi que era mais uma deslocação a esta povoação, deslocação essa que em regra não oferecia, naquela época de 71, grande perigo.
Entretanto quanto à pernoita e, numa noite daquelas, é que já a desconfiança era maior.

Lembro-me perfeitamente que, embora não manifestando, senti sempre uma sensação de desconforto durante tal permanência. Era talvez um certo nervoso miudinho, que não me deixava gozar o prazer de saborear uma refeição de certo modo melhorada, nem uma estadia tranquila. Dormitei em cima dum colchão de camuflado vestido, sempre com os ouvidos abertos, à espera do rebentar da bernarda.

Felizmente nada aconteceu e bem cedo pela manhã de 25, abalei para a sede onde o almoço de Natal me esperava na messe da CCP 122.

Junto 3 fotografias referentes a este evento:

1.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. A caminho do almoço de Natal de 1971. Da esquerda para a direita respectivamente, Cmdt do BCaç 3863 (?), Cmdt do CAOP, Cor Pára Rafael Durão, e Ten Pára da CCP 122.

2.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. Alguns oficiais do CAOP dirigindo-se para o almoço de Natal de 71. Cap Art Borges, meu camarada de quarto; Maj Barroco, de camuflado; Maj Santos Costa, com a sua inseparável bengala e de quem era adjunto; eu próprio, já bem lavadinho, de barbinha feita e bem vestidinho.

3.ª CAOP 1, Teixeira Pinto. Na mesa da presidência distinguem-se: Cor Rafael Durão, de pé; um soldado Pára servindo o Maj Santos Costa; creio que o Maj que substituiu o Maj Inocentes (será o Maj Pára citado por Graça de Abreu no seu livro a pág 18?); o autor. De costas distingue-se um 1.º Sarg Pára.

Nestas fotografias apresento um visual mais risonho, fruto talvez de me encontrar a menos de 2 meses do termo da comissão.

É tudo por hoje.
Jorge Picado

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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes desta série

24 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2379: O meu Natal no mato (12): Mansoa, 1971: Uma de caixão à cova... para esquecer o horror (Germano Santos)

24 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2378: O meu Natal no mato (11): Saltinho, 1972: O melhor bolo rei que comi até hoje, o da avó Clementina (Paulo Santiago)

22 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2374: O meu Natal no mato (10): Bissau, 1968: Nosso Cabo, não, meu alferes, sou o Marco Paulo (Hugo Guerra)

22 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2373: O meu Natal no mato (9): Embarquei no N/M Niassa a 21 de Dezembro de 1971... Que maldade! (João Lima Rodrigues)

21 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - 2372: O meu Natal no mato (8): Bissorã, 1964 (João Parreira, CART 730)

21 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2370: O meu Natal no mato (7): Destacamento do Rio Udunduma, 1969, Pel Caç Nat 52 (Beja Santos)

19 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2366: O meu Natal no Mato (6): Peluda, 1969: a Fátria, Manel (Torcato Mendonça)

19 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2364: O meu Natal no mato (5): Mato Cão, 1972: Com calor, muito calor, e longe, muito longe do meu clã (Joaquim Mexia Alves)

18 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2361: O meu Natal no mato (4): Cachil, 1966: A morte do Condeço e do Boneca, CCAÇ 1423 (Hugo Moura Ferreira / Guimarães do Carmo )

17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2357: O meu Natal no mato (3): Banjara, 1965 e 1966: um sítio aonde não chegavam as senhoras da Cruz Vermelha (Fernando Chapouto)

17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2356: O meu Natal no mato (2): Bissorã, 1973: O Milagre (Henrique Cerqueira, CCAÇ 13)

16 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2355: O meu Natal no mato (1): Jumbembem, 1965: Os homens às vezes também choram... (Artur Conceição)


(2) Vd. outros posts sobre o nosso Natal em tempo de guerra, série Feliz Natal, Próspero Ano Novo e Até ao Meu Regresso:

17 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1373: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (1): As Nossas Festas... Quentes e Boas (Luís Graça / José Martins)

17 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1374: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (2): Seguindo a Estrela, de Missirá a Belém (Beja Santos)

18 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1375: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (3): A LFG Sagitário no Rio Cacheu (Manuel Lema Santos)

19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1379: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (4): Mansambá, 1970 (Carlos Vinhal, CART 2732)

19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1380: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (5): Poema: Missirá, 1970 (Jorge Cabral)

19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1381: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu regresso (6): comandos de Brá em 1965, crime e castigo (João S. Parreira)

19 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1382: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (7): No longínquo ano de 1968 em Gandembel/Ponte Balana (Idálio Reis)

20 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1383: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (8): CART 2732, Mansabá, 1971 (Carlos Vinhal)

21 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1387: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (9): Catió, 1967 (Victor Condeço)

22 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1390: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (10): Os Maiorais de Empada, 1969 (Zé Teixeira)

2 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1396: Feliz Natal, Próspero Ano Novo, Adeus e Até ao Meu Regresso (11): 1969, na Missão do Sono, em Bambadincazinho (Luís Graça)

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3527: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (1): Lançamento do livro, 13/12/08, 17h, na Academia Militar, Amadora



Convite > "A Academia Militar e a DG - Edições têm o prazer de convidar V.Ex* para o lançamento do livro A Retirada de Guileje, do Coronel Coutinho e Lima. O livro será apresentado pelos jornalista Eduardo Dâmaso e General Loureiro dos Santos. 13 de Dezembro de 2008 - 17h00. Auditório da Academia Militar. Amadora. Será servido um Alvarinho de Honra, oferta especial das Câmara Municipal de Melgaço e Câmara Mnuicipal de Monção"

O blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (*) associa-se a esta iniciativa, dá os parabéns ao autor, membro da nossa Tabanca Grande, e espera poder encontrar muitos amigos e camaradas da Guiné, no dia 13 de Dezembro de 2008, às 17h, no auditório da Academia Militar, na Amadora.

A RETIRADA DE GUILEJE

Brevíssimo Resumo:

(i) Em 4 SET 72, com o Posto de Major, iniciei a 3ª. Comissão por imposição, na GUINÉ.

(ii Em 8 JAN 73 fui nomeado, pelo Sr. Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Sr. General ANTÓNIO DE SPÍNOLA, Comandante do Comando Operacional nº. 5 (COP 5), com sede em GUILEJE. Na Zona de Acção do COP 5 passava o “ Corredor de GUILEJE”, através do qual o PAIGC introduzia 70 a 80% dos abastecimentos (armas, munições e outros), para todo o território da GUINÉ.

(iii) Em 25 MAR73, foi abatido na região de GUILEJE, o 1º. Avião a jacto FIAT G – 91, atingido por um míssil terra-ar STRELA; o Piloto foi recuperado, com um pé partido. O aparecimento destes mísseis provocou grandes alterações e limitações no emprego da nossa Força Aérea.

(iv) Em 18 MAI73 pelas 7:00 horas, 2 Grupos de Combate e 1 Pelotão de Milícia, saídos de GUILEJE, foram emboscados por um grupo Inimigo (IN) estimado em 100 elementos; as Nossas Tropas (NT) sofreram 1 Morto, 7 Feridos graves (um dos quais veio a falecer 4 horas mais tarde por falta de evacuação) e 4 Feridos ligeiros.

(v) Em 11 MAI 73, o Sr. General SPÍNOLA, na sua última visita a GUILEJE, afirmara, perante formatura geral de todos os militares que, não obstante os condicionamentos de actuação da Força Aérea, esta faria a evacuação dos feridos graves; esta promessa não foi cumprida.

(vi) Face à situação, solicitei a ida a GUILEJE de Delegados da Repartição de Operações e da Força Aérea; porque estes não apareceram, desloquei-me no dia seguinte (19 MAI) a CACINE, comandando a evacuação das baixas da emboscada, através do rio; esperava lá encontrar os Delegados referidos.

(vii) No dia 20 MAI, ao fim da tarde, fui transportado de helicóptero a BISSAU, onde apresentei ao Sr. General SPÍNOLA a necessidade de reforços, já solicitada antes por mensagem; respondeu-me que não me dava qualquer reforço, que devia regressar na manhã seguinte a GUILEJE e que ia mandar para lá o Sr. Coronel Paraquedista RAFAEL DURÃO, passando eu a 2º. Comandante.

(viii) Cheguei a GUILEJE ao fim do dia 21 MAI, depois me ter deslocado de sintex (barco com motor fora de borda) de CACINE (onde a Força Aérea me deixou) para GADAMAEL; o percurso de GADAMAEL para GUILEJE foi feito em coluna apeada, utilizando um trilho da população; durante o trajecto, ouvimos a flagelação que GUILEJE estava a sofrer, a mais violenta de todas, que provocou a morte de um Furriel Miliciano e vários estragos materiais, entre os quais a destruição total do Centro de Comunicações, incluindo as antenas, o que impedia a ligação rádio com qualquer entidade.

(ix) Face à forte pressão do IN, à não atribuição de reforços e a outros factores (falta de água no quartel, escassez de munições de Artilharia, não evacuação de feridos, etc), decidi retirar para GADAMAEL, no dia seguinte ao romper do dia, todos os militares (cerca de 200) e toda a população (cerca de 500 elementos), por considerar a posição insustentável.

(x) A alternativa era aguardar a chegada do Sr. Coronel DURÃO, que eu não sabia quando se iria verificar e que, em minha opinião, não resolveria a situação, porque, seguramente, não viria acompanhado de reforços, nem tão pouco tinha condições para solucionar vários problemas, tais como: a falta de água, a evacuação de feridos, o reabastecimento de munições de Artilharia e das Armas Pesadas e, principalmente, a forte pressão do IN, que cada vez era mais acentuada.

(xi) Desde as 20:00 horas do dia 18 MAI até às 4:00 horas do dia 22MAI (80 horas), GUILEJE sofreu 37 flagelações. A retirada efectuou-se, em coluna apeada, com pleno êxito, tendo surpreendido totalmente o IN, que continuou a bombardear GUILEJE, onde só entrou em 25 MAI 73.

(xii) O Sr. General SPÍNOLA não sancionou a decisão, ordenando a minha prisão preventiva e a instauração de um Auto de Corpo de Delito; estive preso, em BISSAU, desde 27 MAI 73 até 12 MAI 74.

(xiii) Como consequência do 25 ABR 74, os “crimes” que supostamente me eram imputados, foram amnistiados por Decreto-Lei da Junta de Salvação Nacional e o processo foi arquivado.

Os factos descritos são relatados, no livro que agora publico; o processo é, também, analisado e criticado, com pormenor.

O livro A RETIRADA DE GUILEJE não estará à venda nas livrarias; estou disponível para o enviar, pelo correio, para qualquer parte do Mundo. Os meus contactos são:

- Rua TOMÁS FIGUEIREDO, nº. 2 - 2º. Esq. 1500 – 599 LISBOA
- Telefone: 217608243
- Telemóvel: 917931226
- Email: icoutinholima@gmail.com

O Autor
Alexandre da Costa Coutinho e Lima
(Coronel de Art)

__________

Nota de L.G.:

(*) Vd. alguns dos nossos muitos postes relacionados com Guileje e a retirada de Guileje:

7 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3277: Memórias literárias da guerra colonial (4): A retirada de Guileje - 22 de Maio de 1973 (Coutinho e Lima, Cor Art Ref)

10 de Abril de 2008 > 10 de Abril de 2008 >Guiné 63/74 - P2744: Fórum Guileje (14): Folclore (Cap Inf José Belo) ou Gratidão (Cor Art Coutinho e Lima) ? A homenagem da população local

16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje

17 de Março de 2008 > Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)

17 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)

19 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2667: Uma semana memorável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (9): O grande ronco de Guiledje

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima

domingo, 23 de março de 2008

Guiné 63/74 - P2678: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (2): A dolorosa decisão da retirada de Guileje









Guiné-Bissau > Região de Tombali > Antigo aquartelamento de Guileje > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > 1 de Março de 2008 > Dia de homenagem da população de Guileje ao "grande homem que nos salvou"... Um homem e a sua solidão: Coutinho e Lima... Três homens de Guileje: por ordem de antiguidade, Nuno Rubim Abílio Delgado e Coutinho e Lima... Um beijo de reconhecimento, homenagem e gratidão de um feminista guineense, a viver no Brasil, a Prof Doutora Fernanda de Barros, participante do Simpósio e nossa amável companheira de uma semana inesquecível.... 




Vídeo (1' 29''), fotos e legendas: ©
Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojados em: You Tube >Nhabijoes

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Palace > Simpósio Internacional de Guileje (1 a 7 de Março de 2008) Continuação da comunicação do Cor Art Coutinho e Lima sobre a sua decisão de retirar Guileje, em 22 de Maio de 1973 (1):


5. Situação encontrada em GUILEJE

Após 3 dias e 2 noites de ausência, quando cheguei a GUILEJE, pelas 18.00 horas de 21 MAI, a situação que encontrei foi a seguinte:

- destruição total do Centro de Comunicações, incluindo todas as antenas, o que impedia o estabelecimento de ligação rádio com qualquer entidade;

- na flagelação dessa tarde , as NT tinham tido um morto (Furriel); o graduado fora atingido por uma granada, dentro de um abrigo de fraca protecção;

- tinham sido atingidos, em consequência das várias flagelações:

. dois depósitos de géneros;
. depósito de artigos de cantina;
. cozinha;
. forno da cozinha;
. celeiros de arroz da população (ainda estavam a arder);
. grande parte das casas da população;
. vários abrigos, parcialmente danificados;
. vários impactos nas valas;
. variadíssimos rebentamentos (talvez centenas) dentro do aquartelamento;

- falta de água potável, por não ter sido feito o respectivo reabastecimento; refere-se que a água era recolhida junto ao Rio AFIÁ, através do qual se fez a evacuação, em 19 de manhã, das baixas da emboscada do dia anterior; o último reabastecimento foi feito precisamente neste dia, após o embarque das baixas;

- escassez de munições de Artilharia e de Armas Pesadas;

- escassez de medicamentos;

- presença do IN nas proximidades do quartel, seguramente do lado de MEJO; alguns elementos da população que tentaram ir recolher água à bolanha, a cerca de 500 metros nessa direcção, tinham sido flagelados na tarde do dia 21 e imediatamente recolhidos pelas NT, que foram em seu socorro;

- desde o início das flagelações, toda a população (umas centenas de pessoas), recolheram às casernas abrigo das NT, aumentando cerca de 3 vezes a sua lotação; a estadia dentro dos abrigos era praticamente insuportável; além do imenso calor, o cheiro era nauseabundo, também porque as crianças acabavam por fazer as suas necessidades fisiológicas no interior dos mesmos;

- nas últimas flagelações, tinha-se verificado a “presença” de uma nova arma do PAIGC; os rebentamentos demoravam cerca de 3/4 segundos, após a audição do disparo;

- verificaram-se vários rebentamentos no ar e também havia algumas granadas perfurantes, tendo sido, eventualmente, uma destas que provocou o morto às NT:

- desde o dia 19 MAI, deixou de ser confeccionado o rancho, em virtude das flagelações e das destruições provocadas na cozinha; todo o pessoal passou a alimentar-se de ração de combate;

- todo o pessoal estava arrasadíssimo, quer física quer psicologicamente, pois as flagelações tinham começado na noite de 18/19 e continuado durante todo o período;

- a população estava preocupadíssima, principalmente pela forte pressão do IN, mas também devido ao desaparecimento do milícia ALIU BARI, verificado em 10 MAI que, poderia ter dado informações muito importantes ao IN, não só relativamente às NT, como também aos hábitos da população, incluindo a localização dos campos de cultivo;

- garantia da não evacuação dos feridos, se os houvesse; de facto, a evacuação dos feridos da emboscada de 18 MAI, não fora feita de GUILEJE, contrariamente ao que o Sr. Comandante-Chefe dissera na sua visita de 11 MAI; a possível evacuação por barco, à semelhança da que fora feita em 19 MAI não mais era exequível, não só devido à presença do 3º CE do PAIGC na mata de MEJO, como devido à falta de barcos, pois que os utilizados em 19 MAI não regressaram a GUILEJE.

6. Factores considerados para tomar a decisão de efectuar a retirada

Imediatamente após ter chegado a GUILEJE e depois de uma breve inspecção ao aquartelamento, fiz uma reunião informal com o Sr. Comandante da CCAV 8350 (que me substituíra na minha ausência) e outros Oficiais; o Sr. Capitão QUINTAS relatou-me, resumidamente, o que se havia passado desde a minha saída na manhã do dia 19 MAI.
No fim deste relato, tive uns minutos de reflexão, considerando os seguintes factores, tendo em vista uma tomada de decisão:

(1). Forte pressão do Inimigo

O aquartelamento de GUILEJE, no período de 182000 MAI73 a 220400 MAI 73 (80 horas) sofreu 37 flagelações, com um total estimado de 795 rebentamentos; esta estimativa foi feita empiricamente e dava uma ideia, porventura calculada por defeito, do volume do fogo inimigo.

Esta acção em força do PAIGC sobre GUILEJE foi planeada pormenorizadamente e com muita antecedência, de acordo com as informações que o Comando-Chefe difundira oportunamente; a fase de execução iniciou-se em 180700 MAI 73, com a emboscada no cruzamento de GUILEJE, já referida atrás.

Com a presença do 3º CE do PAIGC nas matas de MEJO, cuja actuação se verificara na tarde do dia 21 MAI, sobre a população quando esta procedia à recolha de água, o cerco do IN apertava-se; tudo indicava que a sua pressão fosse cada vez mais intensa, com frequentes flagelações diurnas e nocturnas.

(2). Não atribuição de reforços

Desde o início dos acontecimentos (emboscada de 18 MAI), tive a premonição de que se tratava de uma situação muito grave, tanto mais que as informações que do Comando-Chefe nos chegavam, indiciavam que esta acção em força ia acontecer.

E não sabia eu, nessa altura, o que estava a suceder em GUIDAGE (na fronteira Norte com o SENEGAL), desde o dia 8 MAI; à semelhança do que ocorrera em GUILEJE, a acção do IN foi iniciada com uma emboscada a uma coluna de reabastecimento, que também não se realizou, seguida de fortes e intensas flagelações ao quartel de GUIDAGE.

Só posteriormente vim a ter conhecimento que, em 19 MAI, grande parte das reservas do Comando-Chefe estavam hipotecadas no reforço a GUIDAGE, nomeadamente o Batalhão de Comandos Africanos que, nesse mesmo dia, efectuou a Operação AMETISTA REAL, sobre a base inimiga de CUMBAMORI.

O Sr. Comandante-Chefe entendeu não me atribuir o reforço que eu solicitara (uma companhia de tropa especial) e, sem qualquer justificação, comunicou-me esta sua decisão, ordenando-me que devia regressar na manhã do dia 21 MAI a GUILEJE e que ia nomear o Sr. Coronel Paraquedista RAFAEL DURÃO para assumir o Comando do COP 5, passando eu para 2º Comandante.

Nestas condições, foi para mim muito claro que, nos tempos mais próximos, não chegariam quaisquer reforços a GUILEJE.

(3). Defesa da população

Na MISSÃO atribuída ao COP 5, pode ler-se:

“(5) Assegura a defesa eficiente dos aglomerados operacionais ocupados pelas NT e o socorro em tempo oportuno dos reordenamentos da sua ZA.”

Nas circunstâncias concretas existentes em 21 MAI 73, não estava em condições de garantir a defesa eficiente da população de GUILEJE.

Sendo certo que a existência da população civil era um factor importante para que GUILEJE estivesse ocupado militarmente, não é menos certo que nas condições vividas nessa altura, a presença dessa população era um elemento que condicionava a acção das NT.

(4). Não evacuação de feridos

Face à não evacuação das baixas resultantes da emboscada de 18 MAI, fiquei ciente que nenhuma evacuação seria feita, pela Força Aérea, a partir de GUILEJE; até então, estava seguro que, em situação de emergência como esta, seriam satisfeitos os pedidos de evacuação de feridos graves, de acordo com o que o Sr. Comandante-Chefe afirmara na sua última visita de 11 MAI; recordo que a mensagem recebida em 27 ABR, já referida atrás, determinava que as evacuações por helicóptero eram condicionadas ao estudo prévio da Força Aérea, o que significava que seriam consideradas.

Ora, verificou-se que, por falta de evacuação, um Cabo da Companhia de GUILEJE, gravemente ferido na emboscada, acabou por falecer cerca de 4 horas após ter sido ferido; este facto teve um forte impacto negativo no moral das NT e da população.

Este aspecto da não satisfação dos pedidos de evacuação era da maior gravidade e, nestas circunstâncias, formulo a seguinte pergunta: com que autoridade se podia mandar sair a tropa, com fortíssima probabilidade de haver contacto com o IN, tendo a certeza que os feridos, se os houvesse, não seriam evacuados?

A evacuação, via fluvial, já não era possível, além do mais por falta de barcos para esse efeito.

(5). Falta de água no aquartelamento

O abastecimento de água era feito a cerca de 4 kms na direcção de MEJO; o último fora realizado na manhã de 19 MAI e não mais foi feita nenhuma tentativa, devido à presença muito provável do IN na área e igualmente ao facto da não evacuação das previsíveis baixas, se as houvesse, o que poderia acontecer, com alto grau de probabilidade.

É do conhecimento geral que se pode viver durante algum tempo sem comida (esta estava assegurada pelas rações de combate), mas sem água, o tempo de sobrevivência é reduzido.

(6). Escassez de munições, especialmente de Artilharia

Por não ter sido possível realizar a coluna de reabastecimento do dia 18 MAI, só podíamos contar com as munições existentes em GUILEJE.

Desde o início das flagelações, a reacção pelo fogo foi feita com um consumo parcimonioso de munições, especialmente no que respeita a Morteiros e Artilharia, em virtude de o nível das mesmas não ser elevado.

Passados 3 dias após a minha chegada inicial a GUILEJE, que se tinha verificado em 22 JAN 73, fiz uma proposta de substituição das Peças de 11,4 cm (o material de Artilharia presente) por Obuses de 14 cm, porque tinha conhecimento que a reserva de munições das primeiras era pequena. Nesta proposta, sugeria que, se houvesse ainda munições de 11,4 em GUILEJE, as Peças lá continuassem mesmo depois de substituídas pelos Obuses de 14 cm, só recolhendo a BISSAU no final da época das chuvas, quando se reiniciassem as colunas, que naquela época não era possível realizar.

Esta minha proposta demorou bastante tempo a ser aprovada, de modo que, em 18 MAI estavam em GUILEJE 2 Obuses (o terceiro ainda se encontrava em GADAMAEL) e já tinham recolhido as 3 Peças, contrariamente ao que tinha sido proposto, pois que estas saíram de GUILEJE antes de se completar a substituição proposta. Acrescenta-se que igualmente parte das munições de 14 cm ainda se encontravam em GADAMAEL, à espera de transporte para o seu destino.

Em 18 MAI, estavam em GUILEJE apenas 2 Obuses de 14 cm (um chegara avariado); o tiro deste material não foi regulado, por falta de meio aéreo para esse efeito; nestas condições, a eficácia do apoio de Artilharia não era muito grande, enquanto que o tiro das Peças de 11,4 estava perfeitamente ajustado, o que tinha sido feito por observação aérea, antes das restrições do Apoio Aéreo, impostas pelo aparecimento dos mísseis terra-ar inimigos.

(7). Destruição do Centro de Comunicações

A destruição do Centro de Comunicações, que ocorrera na tarde de 21 MAI, por acção da flagelação inimiga, deixou GUILEJE impossibilitado de estabelecer ligação rádio com qualquer entidade.

Nestas condições, a única maneira de contacto com o exterior era através de aviões que sobrevoassem a região; foi por isso que foi pedido à patrulha de FIAT G 91, que nessa tarde de 21 MAI fez o apoio de fogo, o envio de um avião durante a noite, para servir de elemento de ligação, face à destruição do Centro de Comunicações; o Comandante da patrulha informou que iria ser feito o que fosse possível.

(8). Novo Comandante do COP 5

A única medida que o Sr. Comandante-Chefe tomou (desconheço se foram tomadas outras), para resolver a situação de GUILEJE, foi a nomeação do Sr. Coronel Paraquedista RAFAEL DURÃO novo Comandante do COP 5, passando eu para 2º Comandante; esta nomeação, que me foi comunicada na reunião de 20 MAI em BISSAU, significava uma falta de confiança na minha acção de Comando. Não fui informado acerca da data em que o Sr. Coronel DURÃO chegaria a GUILEJE (este estava a comandar o CAOP 1, com sede em MANSOA).

A nomeação do novo Comandante, em minha opinião, não resolveria a situação, porque:

. não viria acompanhado de reforços; era minha convicção que estes ser-lhe-iam atribuídos, mas demorariam vários dias a chegar a GUILEJE;
. não solucionaria a falta de água;
. não estava em condições de fazer chegar a GUILEJE, em tempo oportuno, as munições de Artilharia e outros materiais críticos;
. não garantiria as evacuações, a partir de GUILEJE.

(9). Existência de um morto

Infelizmente as NT tinham um morto, provocado pela flagelação da tarde de 21 MAI.
Poderá perguntar-se, legitimamente, como é que tantas e tão intensas flagelações e com muitos rebentamentos dentro do quartel, só provocaram um morto. Isto aconteceu porque os abrigos existentes eram de betão armado e supostamente à prova de Morteiro 120, o que não foi comprovado porque não se verificou nenhum impacto directo.

Pode parecer estranho que um dos factores a considerar para tomar a minha decisão tenha sido a existência de um morto; de facto, se houvesse uns três ou quatro feridos, quer militares, quer civis, isso obrigaria a permanecer em GUIEJE, por impossibilidade de os transportar em coluna apeada.

(10). Efeito de surpresa

A coluna apeada, que na tarde de 21 MAI me escoltou de GADAMAEL para GUILEJE, não teve nenhum incidente; como não tinha sido detectada pelo IN (e a chegada ocorreu no final do dia), este durante a noite não tinha possibilidade de verificar o movimento no trilho utilizado, sendo muito provável que, se a possível retirada se realizasse na manhã do dia seguinte, constituísse uma verdadeira surpresa.

(11). Previsão dos acontecimentos, a curto prazo

Ao nomear o Sr. Coronel DURÃO para novo Comandante do COP 5, era minha convicção que o Sr. Comandante-Chefe lhe iria atribuir os reforços que ele solicitasse. Só que esses reforços, após a sua atribuição, demorariam vários dias a chegar a GUILEJE.

A pressão do IN não abrandaria, pelo contrário, era altamente provável que se intensificaria; poderia haver, com fortes probabilidades, mais mortos e feridos e um previsível assalto pelo IN, bem como a tomada de prisioneiros pelo PAIGC, incluindo elementos da população, se isso fosse do seu interesse.

Em função de todos os factores indicados e face às condições descritas, relativamente à situação específica em GUILEJE, só considerei duas modalidades de acção:

. permanecer em GUILEJE, esperando a chegada do novo Comandante, com todas as consequências daí resultantes;
. retirar na manhã seguinte, aproveitando o efeito de surpresa; adiar, nem que fosse por um dia, poderia inviabilizar a operação.

Depois de pesar os prós e os contras das duas possíveis soluções, optei pela segunda:

RETIRAR, DO AQUARTELAMENTO DE GUILEJE, NA MANHÃ DO DIA SEGUINTE – 22 MAI – TODA A POPULAÇÃO, BEM COMO OS MILITARES E MILÍCIA, ATRAVÈS DO TRILHO GUILEJE – GADAMAEL, EM COLUNA APEADA.

Tomada a decisão, elaborei uma mensagem a comunicá-la ao Comando-Chefe, na esperança de que fosse possível, embora com dificuldade, transmiti-la durante a noite, o que não foi conseguido.

Comunicada esta decisão aos Oficiais presentes na reunião informal, com a qual todos concordaram, dei ordens para serem executadas destruições e inutilizações do material que não podia ser transportado, no sentido de impedir a sua utilização pelo IN.

As destruições que mandei fazer foram: minas, material cripto (incluindo as máquinas de cifra), toda a documentação (classificada e não classificada), que foi destruída pelo fogo e material de transmissões.

Mandei inutilizar ou tornar inoperacionais: os 2 Obuses de 14 cm, as viaturas e o armamento pesado: Metralhadoras e Morteiros.

Dadas as circunstâncias e atendendo a que o IN, nessa noite de 21/22 MAI, flagelou o aquartelamento 3 vezes (20.25 /22.00 horas - cerca de 30 impactos; 01.05/03.00 horas - cerca de 40 impactos e 04.00/05.00 horas – cerca de 60 impactos), as destruições e inutilizações não puderam ser feitas com a profundidade e extensão que o seriam, se as condições fossem outras.

Durante a noite foi intensificada a acção da Artilharia, em resposta às flagelações, gastando todas as munições completas existentes, antes de tornar inoperacionais os 2 Obuses e também com a intenção de mostrar ao IN que continuávamos com boa capacidade de reacção.

Mandei, igualmente, informar a população, através do Régulo em exercício, da partida nas primeiras horas do dia seguinte, informando que sairíamos em coluna apeada.

7. Execução da retirada

A Operação de retirada foi organizada da seguinte maneira: em primeiro escalão, saiu o Sr. Comandante da CCAÇ 4743 (GADAMAEL) com os seus dois grupos de combate, seguidos de parte da população; em segundo escalão, o Sr. Comandante da CCAV 8350 (GUILEJE), com a sua Companhia, milícia e restante população; em último lugar, o pessoal militar sobrante, incluindo os elementos do Comando do COP 5, tendo sido eu o último a sair do quartel.

A retirada iniciou-se cerca das 05.30 horas, tendo-se verificado a chegada a GADAMAEL por volta do meio-dia; não houve qualquer contacto com o IN.

O efeito de surpresa foi total; tendo-se efectuado a retirada na manhã do dia 22 MAI, o PAIGC só entrou em GUILEJE em 25 MAI, isto é, 3 dias depois; durante o período 22/25 MAI continuou a bombardear a posição que tinha sido ocupada pelas NT.
A chegada a GADAMAEL, sem qualquer incidente, foi um sucesso, comprovando que a decisão que tomei, ao meu nível de Comando, foi adequada à situação.


8. Consequências da retirada


Quando a coluna chegou a GADAMAEL, já lá se encontrava o Sr. Coronel Paraquedista RAFAEL DURÃO, o novo Comandante designado pelo Sr. Comandante-Chefe, a quem comuniquei o que se tinha passado; o novo Comandante mandou formar as tropas recém-chegadas de GUILEJE, proferiu algumas palavras que não recordo, referindo que os militares não tinham culpa do que acontecera, atribuindo-me, implicitamente, a responsabilidade da decisão, o que correspondia inteiramente à verdade.

O Sr. Coronel DURÃO enviou então uma mensagem para o Comando-Chefe, que terminava assim:

“…QUANDO CHEGADA GADAMAEL PORTO FACE DESTRUIÇÕES HAVIDAS VERIFICO SER IMPOSSÍVEL REOCUPAÇÃO TEMPOS MAIS PRÓXIMOS. AGUARDO INSTRUÇÕES”.

Passado pouco tempo, enviou nova mensagem, do seguinte teor:

“…SUGIRO DESTRUIÇÃO COMPLEMENTAR GUILEJE POR MEIOS AÉREOS”

A resposta a esta última mensagem foi:

“REF…SEXA JULGA PREMATURO BOMBARDEAMENTO GUILEJE. COAT EXECUTA BOMBARDEAMENTO AREA CIRCUNDANTE. INFORME CAOP 3 COR FERREIRA DURÃO”.
O não bombardeamento de GUILEJE permitiu que o PAIGC fizesse uma grande propaganda, relativamente aos materiais apreendidos, amplamente difundida, com manifesto exagero.
O PAIGC, contrariamente à decisão do Sr. Comandante-Chefe, achou por bem continuar as flagelações, o que fez até ao dia 25 MAI.

Não consegui obter elementos sobre os bombardeamentos efectuados pela Força Aérea, na área circundante de GUILEJE, no período de 22/25 MAI.

Após ter tomado conhecimento da retirada de GUILEJE, o Sr. Comandante-Chefe, enviou, em 221800 MAI, a seguinte mensagem, para GADAMAEL:

“…INFORME CMDT CAOP 3 COR PARA FERREIRA DURÃO QUE SEXA GENERAL COMANDANTE-CHEFE DETERMINOU SEJA RETIRADO IMEDIATIAMENTE DO COMANDO COP 5 MAJ ART ALEXANDRE DA COSTA COUTINHO E LIMA E MANDADO APRESENTAR QG/CCFAG PARA EFEITO AUTO CORPO DELITO”.

Em 24 MAI, foi recebida em GADAMAEL nova mensagem:

“SEXA GENERAL DETERMINA RETIRADO COMANDO MAJOR COUTINHO E LIMA…DEVENDO SEGUIR VIA CACINE EM SINTEX. TARDE DE 25 MAI NÃO DEVE JÁ ESTAR GADAMAEL”

Parti de CACINE, a bordo de um navio da Armada em 26 MAI, pelas 06.00 horas, tendo chegado a BISSAU no dia seguinte; apresentei-me no QG/CCFAG, tendo-me sido comunicado que passava à situação de prisão preventiva, à guarda da Companhia de Polícia Militar, sedeada no forte da Amura, onde também se encontrava instalado o Comando-Chefe; recebi ordem expressa de que não podia estabelecer contacto com as Repartições do Comando-Chefe.

Em 22 MAI 73, o Sr. Comandante-Chefe emitiu o seguinte despacho:

“Considerando que o Comandante do COP 5, Major de Artilharia, ALEXANDRE DA COSTA COUTINHO E LIMA:
- Ordenou a retirada das forças sob o seu comando do quartel de Guileje para Gadamael, sem que para isso estivesse autorizado;
- Mandou destruir edifícios e inutilizar obras de defesa do referido quartel, bem como material de guerra e munições;
- Não cumpriu a missão que lhe foi atribuída;

Determino, que o Exmº. Brigadeiro MANUEL LEITÃO PEREIRA MARQUES proceda a auto corpo de delito contra o mencionado oficial e, atendendo à gravidade e natureza dos delitos, o arguido seja desde já recluso em prisão fechada.”


Comecei a ser ouvido pelo Sr. Brigadeiro LEITÃO MARQUES em 28 MAI 73; o processo ficou concluído em 10 ABR 74 e constou de 4 volumes, com o total de 903 folhas. Foi transferido do Tribunal Militar Territorial da Guiné para o 1º Tribunal Militar de Lisboa (1º TMTL), onde se processaria o julgamento.

A pena prevista para os crimes supostamente cometidos e de que fui acusado, era de 6 meses a 4 anos de presídio militar.

O processo foi amnistiado pelo Decreto-Lei nº 194/74 da Junta de Salvação Nacional e, por decisão unânime dos Juízes do mesmo 1º TMTL, ARQUIVADO, em 17 MAI 73.

A minha carreira militar prosseguiu, aparentemente sem ter sido prejudicada.
No livro que estou a escrever, abordarei todos os assuntos relativos à minha 3ª Comissão na Guiné, com destaque para “A retirada de GUILEDJE”, que será o próprio título desse livro e uma análise do processo que me foi instaurado.

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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2677: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (1): Comandante do COP 5, com 3 comissões no CTIG

domingo, 27 de janeiro de 2008

Guiné 63/74 - P2484: Guileje, 22 de Maio de 1973 (1): Pontos (polémicos) por esclarecer (Amaro Samúdio / Nuno Rubim / Manuel Rebocho)

Guiné > Região de Tombali > Guileje > 1971 > Vista aérea, obtida de DO > Foto do então Cap (hoje Cor) Jorge Parracho, da CCAÇ 3325 (Jan 1971/Dez 1971). Esta unidade foi substituída pela açoriana CCAÇ 3477, Os Gringos de Guileje (Nov 1971 / Dez 1972) (contacto: Amaro Munhoz Samúdio) que, por sua vez, foi rendida pela CCAV 8350, Os Piratas de Guileje(Dez 1972/Mai 1973) (contacto: José Casimiro Carvalho).

Foto: © Jorge Parracho / AD - Acção para o Desenvolvimento (2007). Direitos reservados.


Guiné > Região de Tombali > Catió > Álbum fotográfico de Benito Neves, bancário, reformado, residente em Abrantes, ex-Fur Mil da CCAV 1484 (Nhacra e Catió, 1965/67) > Foto 28: "Cufar, 1966 - Artilharia no quartel de Cufar, Obus 8.8 cm".


Foto e legenda: © Benito Neves (2007). Direitos reservados.

Guiné > Região de Tombali > Guileje > CART 2410 (Junho de 1969 a Março de 1970) > O Alf Mil José Barros Rocha posando sobre a roda de uma peça de artilharia 11,4... Os Dráculas da CART 2410 estiveram em Guileje, de Junho de 1969 a Maio de 1970. Sobre a questão dos calibres 11.4 (peça de artilharia) e 14 (obus), já se aqui publicaram vários postes ( ).

Foto: © José Barros Rocha (2007). Direitos reservados.


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3477 (Novembro de 1971/ Dezembro de 1972) - Os Gringos de Guileje > O Munoz Samúdio, que era 1º cabo enfermeiro, junto à peça de artilharia 11.4, do 15º PELART.

Foto: © Amaro Samúdio (2006). Direitos reservados.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Mansambo > CART 2339 (1968/69) > O Alf Mil Torcato Mendonça junto ao velho obus 10.5, possivelmente de marca Krupp, uma temível arma que vinha da II Guerra Mundial... O obus é, por excelência, uma boca de fogo especializada em tiro curvo, de longo alcance... O seu alcance era, porém, limitado: 10/12 km, no máximo, creio eu, com uma cadência de dois a quatro tiros por minuto, na melhor das hipóteses ... (LG)

Foto: © Torcato Mendonça (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem enviada pelo editor do blogue ao Nuno Rubim, ao Casimiro Carvalho e ao Amaro Munhoz Samúdio:

Leiam com atenção esta mensagem... Só sabemos que se chama Paiva, e foi furriel de artilharia no pelotão de artilharia, que estava em Guileje, quando esta unidade foi abandonada por decisão do comandante do COP 5, Major Coutinho e Lima... É um testemunho dramático, de um homem que atravessou a nada o Rio Cacine, já na fuga de Gadamael, e foi salvo por um milícia de que não se lembra o nome...

Vou pedir ao Paiva que nos contacte de novo e nos dê as suas coordenadas, sobretudo para o ajudar a reencontrar os seus camaradas (e a reorganziar as suas memórias, doridas, daquele tempo)... Seria uma pena que este pungente testemunho ficasse escondido sob a forma de comentário a um dos nossos postes ...

Nuno, Casimiro: Vocês sabem qual era o nº do pelotão de artilharia que estava em Guileje, no dia 22 de Maio de 1973 ? Amaro, este camarada, o Paiva, ainda é do teu tempo ? Há contactos com esta malta, os artilheiros ? Digam alguma coisa antes de eu poder publicar este texto (que já saiu, anonimamente, como comentário...)... Acrescentem os vossos comentários... Um abraço. Luís


2. Mensagem do Amaro Samúdio (dos Gringos de Guileje, a CCAÇ 3477, Guileje, 1971/72):

Luís Graça:

Naturalmente que vou fazer esforços no sentido de obter informações exactas, que possam ajudar o Paiva a encontrar os seus camaradas.

Exacto é que em 21 de Novembro de 1971,quando a CCAÇ 3477 chegou a Guileje, a Unidade de Apoio era o 15º PELART [Pelotão de Artilharia].

Não foram, nunca o foi dito, os Gringos [da CCAÇ 3477] a viverem os dramáticos acontecimentos do abandono de Guileje [, em 22 de Maio de 1973].

Tenho em mente que os obuses 14 chegaram a Guileje pouco antes de lá sairmos em 15 de Dezembro de 1972 [, sendo substituídos pelo BCAV 8350]. E aqui fica a grande questão
do abandono que já tenho tentado abordar.

Para parar qualquer ataque mais violento ao quartel, os 11.4 sabiam ... Kandiafara.
Qualquer nova base de ataque tinha que ser descoberta e eram as DO, posteriormente, a sobrevoar, que diziam se as coordenadas estavam a acertar no local.

Como é possível, e o Nuno Rubim tem toda a razão, que os [obuses 14] cumprissem a sua missão. Para onde iam actuar... Crime puro e simples.

Um Abraço


3. Resposta do Nuno Rubim (Cor Art, na reforma, especialista em história da artilharia):

Caro Luís

Será de facto um testemunho muito importante. O Pel Art que lá estava, era, segundo os dados que tenho, o 15º. Estava equipado com três 11.4 cm e por terem acabado na Guiné (e cá também ... ) as munições, foi substituído em 16 de Maio [de 1973], dois dias antes do início do ataque do PAIGC, por dois obuses de 14 cm.

Terão vindo de Bissau 3, mas um terá caído pela borda fora ( será possível ??? ) em Cacine ! ( Documentos que encontrei no Arquivo Histórico-Militar).

Ora esse nosso camarada, o Paiva, poderá dar importantes achegas, nomeadamente como foi feita a regulação do tiro ( só veio um aparelho de pontaria e nenhuma tábua de tiro !!!). [não há palavras ... !!! ]

Tenho também notícia que o Alf Cmdt do Pel foi morto num bombardeamento do PAIGC por esses dias.

Há pois várias questões que eu gostaria de lhe perguntar e que podem resolver alguns dos mistérios ainda em aberto.

Um abraço

Nuno Rubim


4. Comentário do Nuno Rebocho (ex-sargento da CCP 123 / BCP 12, Guiné 1972/74, sargento-mor pára-quedista, na reforma, doutorado em Sociologia pela Universidade de Évora):

Só dois ajustamentos:

(i) As peças que estavam em Guiledje eram de calibre 10.6, e mais nenhum outro. Desloquei-me ao Porto, onde vive o Capitão miliciano (claro) que comandava a companhia que fugiu de Guiledje. Ele próprio da arma de Artilharia, conhecedor do assunto, com quem troco frequentes telefonemas e e-mails, e que não me deixa enganar no calibre das peças. Está-me frequentemente a corrigir.

(ii) O Major Coutinho e Lima, no momento em que ordenou o abandono de Guiledje, já não era comandante do COP 5, pois havia sido substituído no dia anterior. O Comandante era agora o Coronel Pára-Quedista (hoje Major-General) Rafael Ferreira Durão, o mais prestigiado Oficial Pára-Quedista de todos os tempos, por quem tenho elevada consideração e amizade. Coutinho e Lima era, no dia 22 de Maio de 1973, segundo comandante do COP 5, razão pela qual não tinha competência orgânica para dar a ordem que deu.

Por esta razão não se pode considerar que a retirada de Guiledje tenha obedecido a qualquer estratégia, porque a estratégia não era da competência de Coutinho e Lima. Então, a retirada de Guiledje só pode ser apelidada de fuga.

Coutinho e Lima (4) foi demitido de Comandante do COP 5, no dia 21 de Maio de 1973, porque Spínola o encontrou no Bar de Oficiais em Bissau, e não lhe perdoou, naturalmente.

Bom. Ficamos por aqui.

Um grande abraço, amigo Luis Graça

Manuel Rebocho
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Notas dos editores:

(1) Vd. poste de 27 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2483: Estórias de Guileje (3): Devo a vida a um milícia que me salvou no Rio Cacine, quando fugia de Gandembel (ex-Fur Mil Art Paiva)

(2) O nosso especialista em artilharia, o coronel na reforma, Nuno Rubim, diz que o 11.4 é uma peça (de artilharia) e o 14 é que é o obus... Alguns de nós, como eu, fazem confusão sobre os calibres: havia, na Guiné, vãrios calibres de peça de artilharia. Vd. os seguintes postes:

18 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1443: Contributo para a história da construção do aquartelamento de Guileje (José Barros Rocha, CART 2410, Os Dráculas, 1969/70)

15 de Janeiro de 2007 >Guiné 6/74 - P1434: Artilharia em Guileje: a peça 11.4 e o obus 14 (Nuno Rubim)

6 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1407: Tertúlia: apresenta-se o Coronel de Cavalaria Carlos Ayala Botto, ajudante de campo do General Spínola

8 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1159: Álbum fotográfico (Hugo Moura Ferreira) (2): Bedanda, ontem (CCAÇ 6, 1970) e hoje

6 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1155: Álbum fotográfico (Hugo Moura Ferreira) (1): Bedanda, CCAÇ 6, 1970: O Obus 14 contra o foguete Katiusha

(3) Vd. postes de:

27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

5 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2083: Em busca de... (10): Coutinho e Lima, o comandante do COP5 que decidiu abandonar Guileje e foi acusado de deserção (Beja Santos)

(4) Vd. curriculum vitae do Cor , na reforma, Coutinho e Lima, um dos oradores do Simpósio Internacional de Guiledje (1 a 7 de Março de 2008):

(...) Ingressou na Escola do Exército a 15 de Outubro de 1953:- Promoção a Alferes a 10 de Setembro de 1957; Passagem à situação de reforma em 1982, como Coronel.- Comissões nas antigas Províncias Ultramarinas: 3, todas por imposição, na Guiné:
1ª – Capitão, Comandante da Companhia de Artilharia nº 494. A CART 494 ocupou as seguintes posições: Ganjola (de Setembro a Dezembro de 1963); Gadamael Porto – (de 17 de Setembro de 1963 a Maio de 1965);
2ª - Capitão, Adjunto de Repartição de Operações de Comando - Chefe das Forças Armadas da Guiné, em Bissau (de 24 de Julho de 1968 a 23 de Julho de 1970);
3ª – Major, em Bolama (de Setembro de 1972 a Janeiro de 1973); em Guiledje, Comandante do COP 5, de 21 de Janeiro de 1973 até 22 de Maio de 1973 (Data da retirada de Guiledje).

Prisão preventiva em Bissau, de 22 de Maio de 1973 até 12 de Maio de 1974. Auto de corpo de delito, por despacho do Sr. General António de Spínola, de 22 de Maio de 1973, com a seguinte justificação:

- Ordenou a retirada das forças sob o seu comando do quartel de Guiledje para Gadamael, sem que para tal estivesse autorizado;
- Mandou destruir edifícios e inutilizar obras de defesa do referido quartel, bem como material de guerra e munições;
- Não cumpriu a missão que lhe foi atribuída.

O processo foi concluído em 10 de Abril de 1974, no Tribunal Militar Territorial da Guiné e transferido em 2 de Maio de 1974 para o 1º Tribunal Militar de Lisboa, onde se processaria o julgamento. A pena prevista para os crimes supostamente cometidos era de 6 meses a 4 anos de presídio militar. O processo foi amnistiado pelo Decreto-Lei nº 194/74 da Junta de Salvação Nacional e, por decisão unânime dos Juízes do mesmo, foi ARQUIVADO (...).