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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17918: Dossiê Guileje / Gadamael (29): O Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné e a Retirada de Guileje (1) (Coutinho e Lima)


Guiné - Região de Tombali - Guileje - Foto n.º 42 do Álbum fotográfico do Cor Inf Ref Jorge Parracho. Vista aérea, geral, do aquartelamento e tabanca.


1. Em mensagem do dia 27 de Outubro de 2017, o nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª Ref (ex-Cap Art.ª, CMDT da CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné entre 1968 e 1970 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73), enviou-nos mais um trabalho seu subordinado ao nunca esgotado dossiê Guileje/Gadamael, desta feita com uns considerandos sobre o Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné e a Retirada de Guileje, que devido a ser um pouco extenso vamos desenvolver em dois postes.


O Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné e a Retirada de Guileje 

1 . Antecedentes remotos 

O Sr. General António de Spínola iniciou as suas funções de Governador e Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné em 20 MAI 68. Sucedeu ao Sr. General Arnaldo Schulz, na mesma função.

O Sr. General Spínola encontrou, na fronteira Sul com a Rep. da Guiné Conacry, o seguinte dispositivo, ocupado por tropas do Exército Português:

Aldeia Formosa - uma Companhia
Gandembel - uma Companhia (destacamento em Ponte Balana)
Gadamael - uma Companhia (destacamento em Ganturé)
Sangonhá - uma Companhia (destacamento em Cacoca)
Mejo - uma Companhia
Cacine - uma Companhia (destacamento em Cameconde)

Desta forma, a fronteira Sul estava ocupada com aquartelamentos, desde Aldeia Formosa até Cacine; destes destaca-se o estacionamento de Gandembel/Ponte Balana, mesmo em cima do chamado “corredor de Guileje”, que o Sr. General Arnaldo Schulz, então Comandante-Chefe, determinara a sua ocupação em 08Abr68. 

Em minha opinião, esta decisão fora acertada, porquanto pelo dito corredor, o PAIGC introduzia cerca de 70% dos abastecimentos para toda a província. A Companhia que guarnecia essa posição é que sofreu as respectivas consequências, pois o PAIGC reagiu fortemente, desde o início, deslocando para a zona vário bigrupos, para permitir a circulação das suas colunas de reabastecimento.

Seis dias depois de ter iniciado as suas funções, o Sr. General Spínola fez uma primeira visita a Gandembel, determinando de imediato o reforço da Companhia com um Pelotão de Artilharia e outras Armas Pesadas, o que deveria ter sido accionado desde a ocupação. Mais tarde, ordenou o reforço temporário com Paraquedistas, o que aliviou, de certa maneira, a grande pressão a que estava sujeita a Companhia.

Em 28Jul68, foi publicada Directiva 20/68, em que o Sr. Comandante-Chefe determinava:
“Transferir em fase ulterior os estacionamentos de Guileje e Gandembel para Salancaur e Nhacobá, devendo proceder-se, desde já, ao estudo da localização e das vias de comunicação”.

Desta forma, o esforço de contra-penetração passava mais para Oeste, sendo constituído pelos aquartelamentos de Mejo, Salancaur (6 Kms a Norte) e Nhacobá (4 kms a Norte de Salancaur).

A intenção constante na Directiva indicada não foi concretizada e, mais tarde, o Sr. General Spínola fez uma remodelação do dispositivo militar, determinando o abandono dos seguintes aquartelamentos:

Gandembel /Ponte Balana
Ganturé (destacamento de Gadamael)
Sangonhá/Cacoca
Mejo
Madina do Boé e Beli (únicos estacionamentos da região do Boé - Leste da Província)

O Sr. Comandante-Chefe tinha toda a legitimidade para determinar a remodelação do dispositivo que entendeu, como também, obviamente, assumia a responsabilidade dessa remodelação.

No que se refere ao abandono de Gandembel/Ponte Balana, sem concretizar o que determinara na Directiva 20/68 de 28Jul68, diminuiu drasticamente o esforço de contra-penetração no “corredor de Guileje”, assim “facilitando” a vida ao PAIGC, o que, seguramente, não era essa a intenção do Sr. Comandante-Chefe. 

Ao determinar o abandono de Mejo, deixou o aquartelamento de Guileje sem qualquer apoio, dependendo exclusivamente da ligação por estrada a Gadamael. Foi pena que, enquanto esteve ocupado o quartel de Mejo, não tivesse sido explorada a ligação fluvial a Cacine, quanto mais não fosse como alternativa à ligação terrestre Guileje/Gadamael. E isso podia ser apoiado por um Destacamento de Fuzileiros, sediado em Cacine.

O abandono de Ganturé, e principalmente Sangonhá/Cacoca, deixou uma grande área sem controlo pelas Nossas Tropas, o que, mais uma vez, “facilitou” a vida ao Inimigo, permitindo se assim entendesse, o acesso directo ao Cantanhez.

Abandonando Madina do Boé e Beli, deixou a região do Boé sem qualquer presença militar portuguesa, o que foi aproveitado mais tarde, pelo PAIGC, para ali proclamar a independência, antes do final da guerra.


2. Antecedentes próximos

2.1. Aparecimento dos mísseis terra-ar 

No dia 25MAR73(Domingo), o aquartelamento de Guileje foi flagelado pelo In em pleno dia, das 13.00 às 14.30 horas, contrariamente ao que sucedera até essa data, em que as flagelações decorriam durante a noite. Tal como estava determinado, foi pedido, de imediato, Apoio Aéreo (AE) à Base Aérea n.º 12, sediada em Bissau. 

Passado pouco tempo, apareceu um Avião FIAT G-91 (de ataque ao solo); o Piloto entrou em contacto rádio e foi informado da direcção e distância estimada donde partira a flagelação, voando de seguida nesse rumo, não tendo estabelecido nenhuma ligação rádio posterior, nem tão pouco se tenha notado algo de anormal. Passados cerca de 15 minutos, apareceu o 2.º avião (a normalidade o AE era feito por dois aviões, voando em parelha), cujo Piloto foi informado do que havia sucedido com o 1.º; este 2.º avião sobrevoou a área indicada e após algum tempo, verificou que o 1.º tinha sido abatido; mais tarde constatou-se que fora atingido por um míssil terra-ar; o Piloto, apercebendo-se da situação conseguiu ejectar-se e o avião despenhou-se no meio do arvoredo. Ao ser sobrevoado pelo 2.º avião, conseguiu lançar um “very- light” , assinalando assim a sua presença. Devido ao facto de já ser quase noite, só foi possível recuperar o Ten. Pil. Av. MIGUEL PESSOA, que além do mais tinha um pé partido, devido à queda, feita a pouca altitude, no meio do denso arvoredo.

Foi este o 1.º avião FIAT G-91 abatido, como se veio a verificar por um míssil terra-ar, de fabrico soviético, fornecido pela Rússia ao PAIGC. A flagelação, em pleno dia, foi o chamariz que provocou a vinda dos aviões, que o In sabia que iria acontecer e que foi um êxito para o In.


2.2. Restrições ao Apoio Aéreo 

Face ao aparecimento dos mísseis terra-ar, o Apoio Aéreo sofreu várias restrições, como não podia deixar de ser. As Forças Terrestres passaram assim a não poder contar com a preciosa colaboração da Força Aérea, (FA) que passou a ser feita de maneira diferente, voando os aviões a uma altitude maior, empregando no ataque ao solo bombas com maior potência.

No que respeita a Guileje, a FA deixou de fazer evacuações e de prestar outros apoios, como o acompanhamento das colunas de reabastecimento Guileje/Gadamael, com um avião no ar. Resumindo, Guileje não mais viu os aviões aterrarem na sua “pista”, nem tão pouco sobrevoarem o aquartelamento, a não ser em circunstâncias especiais.


2.3. Deserção do Milícia ALIU BARI 

Em 10MAI73, o Soldado Milícia ALIU BARI saiu do quartel, sem autorização, levando a Espingarda Mauser, que lhe estava atribuída; disse a um outro Milícia que ia à caça. Quando se verificou que não voltara, o Pelotão de Milícia de Guileje saiu em patrulhamento pela estrada para Mejo, com a finalidade de encontrar o referido Milícia, por se pensar que lhe teria acontecido algo de anormal. Nesse patrulhamento, foi detectada uma mina anti-carro, com o invólucro de madeira e de modelo desconhecido, implantada pelo In; quando procediam ao despoletamento da mina, esta rebentou, provocando a morte imediata de dois elementos da Milícia - CAMISA CONTÉ e SATALA COLUBALI, dois Comandantes de Secção e dos mais válidos milicianos. 

Este triste acontecimento provocou um forte impacto negativo no moral de todo o pessoal. O desaparecimento do ALIU BARI (mais tarde soube-se que tinha sido aprisionado pelo In, junto à fonte onde se fazia o reabastecimento de água para o quartel) foi sentido pela população, porque ele podia indicar ao In o local das suas lavras, o que aumentava as suas preocupações. Para os militares também causou grande desconforto, porquanto podia fornecer informações ao In, relativamente ao dispositivo existente no quartel, bem como outras, tal como as relativas à actividade operacional.


2.4. Visita do Sr. General Comandante-Chefe, em 11Mai73 

Em 11MAI73, o Sr. General SPÍNOLA fez uma visita a Guileje. Falou às tropas, em formatura geral na pista, dizendo que se esperava um agravamento da situação, que a Força Aérea não podia executar as missões de rotina como até então mas que, numa situação difícil, apoiaria as Nossas Tropas voando mais alto e utilizando bombas mais potentes; referiu também que, no caso de feridos muito graves, seria feita a sua evacuação a partir de Guileje


3. O que o Comando-Chefe sabia sobre as intenções do Inimigo 

Na folha 608 do auto de corpo de delito que me foi instaurado (tenho uma cópia integral), pode ler-se :

EXTRACTO DO RELATÓRIO DE INTERROGATÓRIO N.º 108 271800DEC72

De: MÁRIO MAMADU BALDÉ - Sexo: MASCULINO - Idade: 25 ANOS Grupo Étnico: FULA  -Naturalidade: CACINE - Estado: Solteiro
(...)

INTENÇÕES DO IN 
(...)

a. NA FRONTEIRA: 

Refere que o IN pretende fazer um ataque com bastante força a GUILEJE, porque pretende obter uma maior liberdade de movimentos logísticos e de pessoal no corredor de GUILEJE. Para isso, ficaram em KANDIAFARA alguns elementos que vieram recentemente dum estágio de artilharia na Rússia, para fazerem reconhecimentos na área de GUILEJE e preparar esta acção.

MODOS DE ACTUAÇÃO

Os chefes sabem que as flagelações aos aquartelamentos não têm obtido resultados compensadores e por isso resolveram mandar vários elementos ao estrangeiro receber uma instrução mais adiantada de Artilharia.

Esses elementos ficam a saber trabalhar com cartas topográficas, para poderem determinar com precisão as distâncias de tiro. Aprendem também a trabalhar com goniómetros-bússolas e outros aparelhos, assim como ficam a saber através da regra do milésimo converter as correcções métricas em direcção, em correcções angulares. Estes elementos ficarão normalmente em observadores avançados durante as flagelações, ligados por telefone às bocas de fogos, dirigindo a acção e regulando o tiro. (...)”

Este documento merece-me os seguintes comentários:

- Ao que se sabe, o Estado-Maior do Comando-Chefe (nomeadamente a Repartição de Informações -(REP/INFO), não lhe “ligou nenhuma importância”, esquecendo uma regra básica das Informações, que é não desprezar nada, por mais inverosímil que pareça. A REP/INFO tinha a obrigação de confirmar ou informar o seu conteúdo, tanto mais porque, os “modos de actuação” faziam todo o sentido, nomeadamente para os Artilheiros (que não era o caso do Sr. Chefe da REP/INFO, que era oriundo da Arma de Infantaria, mas que poderia e deveria, se tivesse dúvidas (que não deve ter tido), consultar os seus camaradas sobre o assunto.

- O Comando-Chefe e o seu Estado-Maior, nada fizeram para impedir, ou no mínimo dificultar, que o IN fizesse os reconhecimentos no sentido de preparar a acção de concretizar “um ataque com bastante força a GUILEJE”.

- A REP/INFO não informou o Comandante do COP 5, que era eu, sobre o conteúdo do documento transcrito atrás, o que foi inconcebível, para não utilizar um adjectivo mais violento. Se eu tivesse sido informado, como deveria ter sido, seguramente afirmaria, junto do Sr. Comandante-Chefe, que o COP 5 não tinha meios para contrariar a intenção do In, pelo que necessitava de ser convenientemente reforçado; mesmo que não me fosse atribuído qualquer reforço, não me esqueceria do que me esperava e, com os parcos meios de que dispunha, tudo faria para contrariar o que o IN preparava, nomeadamente através de patrulhamentos adequados.

O que é certo é que, tudo o que consta no Relatório de Interrogatório n.º 108 de 27 de Dezembro de 1972 (antes da criação do COP 5), se veio a confirmar mais tarde, pelo Comandante do PAIGC, Sr. OSVALDO LOPES DA SILVA, em artigo publicado no jornal Público em 26 de Julho de 2004, (pág. 358 a 361 do meu livro), em que descreve, com pormenor, o trabalho de reconhecimento e levantamento topográfico realizado durante vários meses, iniciado no final de 1972 e que culminou com o ataque em força sobre Guileje, a partir de 18MAI73, com total surpresa da minha parte, por falta de informação, INEXPLICÁVEL, da parte do Comando-Chefe.

Ainda acerca do documento transcrito atrás, pode perguntar-se porque foi incluído no processo que me foi instaurado.

Durante o tempo em que estive preso preventivamente, fiz vários requerimentos.

Em 30 de Julho de 1973, enviei um requerimento dirigido ao Senhor General Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, solicitando, nos termos da Art.º 411.º do Código de Justiça Militar, o fornecimento de cópias de diversos documentos, constantes de uma grande lista, também incluída no citado requerimento. A consulta dos documentos destinava-se à organização e devida fundamentação da defesa e desde já das novas declarações que for autorizado a prestar no corpo de delito e era essencial para o exercício do direito de defesa.

O despacho de 2 de Agosto de 1973, do Sr. General Comandante-Chefe, foi do seguinte teor:

“Forneçam-se os elementos solicitados com os seguintes condicionamentos:
- Os documentos classificados devem ser entregues ao oficial de polícia judiciária militar para serem apensos ao auto de corpo de delito, devendo o Major Coutinho e Lima deles tomar conhecimento através daquele oficial.

- O relatório e elementos relativos à operação “Ametista Real”, não devem ser fornecidos por não dizerem respeito aos factos que estão na origem do auto de corpo de delito.

- A documentação solicitada que não se encontre já elaborada ou não tenha sido difundida pelas repartições, não deve ser fornecida por estar fora das atribuições das repartições a sua elaboração, mormente numa situação de manifesta carência de pessoal.

- Os documentos classificados já apensos ao corpo de delito, como é óbvio, não devem ser fornecidos.”

Em 08AGO73, o Sr. Chefe de Estado-Maior do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, através de uma Guia de entrega, enviou ao Sr. Oficial da Polícia Judiciária Militar (PJM), Sr. Brigadeiro Leitão Marques, 124 documentos, para serem juntos ao auto do corpo de delito, o que aconteceu em 10AGO73.

O Sr. Oficial da PJM - Sr. Brigadeiro Leitão Marques, nem sequer cumpriu o que o Sr. General Comandante-Chefe determinara: “...Os documentos classificados... devendo o Major Coutinho e Lima deles tomar conhecimento através daquele oficial”. Foi mais uma prepotência que o Sr. Brigadeiro entendeu tomar. De facto, não me foi dado conhecimento do documento referido (só o li quando tive acesso ao processo), pois se o tivesse conhecido, nessa altura, não deixaria de fazer mais um requerimento, em termos contundentes, como se impunha, a solicitar explicações sobre o assunto.

O Extracto do Relatório de Interrogatório n.º 108, transcrito atrás, era o n.º 105 lista de entrega referida. Não se percebe que, tal documento, altamente comprometedor para o Comando-Chefe e seu Estado-Maior, pelas razões indicadas nos comentários que fiz sobre o seu conteúdo, tenha sido junto ao processo. Em minha opinião isso aconteceu, pela forma negligente como foi elaborado o auto o corpo de delito, pois nem o Sr. Chefe do Estado-Maior, Int.º, Sr. Tenente Coronel do CEM do CTIG, António Hermínio de Sousa Monteny, (que autenticou a cópia daquele documento), nem o Sr. Chefe do Estado-Maior do Comando-Chefe (que assinou a guia de entrega), nem o Sr. Oficial da PJM (que ordenou a sua junção após autos), se devem ter apercebido do seu conteúdo; se alguma das entidades indicadas o tivesse feito, seguramente teria sido retirado daquela lista de 124 documentos: Com efeito, se eu tivesse sido julgado (e isso não aconteceu, apenas por ter sucedido o 25 de Abril de 1974), o meu Advogado, Sr. Dr. Manuel João da Palma Carlos, (que se deslocou a Bissau), requereu em 18 de Fevereiro de 1973 autorização para consultar o processo (o que foi autorizado), seguramente tomou conhecimento do já referido “Relatório de Interrogatório” e no julgamento não deixaria de exigir explicações sobre o conteúdo do mesmo, o que causaria grande desconforto ao Comando-Chefe e seu Estado-Maior, que seriam responsabilizados pelo que não fizeram (e deviam ter feito), no que ao tal documento dizia respeito.

Do mesmo modo se pode entender a amnistia, que permitiu o arquivo do processo e poderia não ter sido, bastando por exemplo limitar a sua aplicação a crimes cuja moldura penal não excedesse 2 anos de prisão.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 20 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16218: Dossiê Guileje / Gadamael (28): A situação de Gadamel, ao tempo da CCÇ 2796 (1970/72), que teve dois grandes comandantes, Cap Op Esp Fernando Assunção Silva e Cap Art António Carlos Morais Silva (Vasco Pires, (ex-Alf Mil Art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72)

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16218: Dossiê Guileje / Gadamael (28): A situação de Gadamel, ao tempo da CCÇ 2796 (1970/72), que teve dois grandes comandantes, Cap Op Esp Fernando Assunção Silva e Cap Art António Carlos Morais Silva (Vasco Pires, (ex-Alf Mil Art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72)

1. Mensagem de 4 do corrente do nosso camarada da diáspora, Vasco Pires (ex-Alf Mil Art, cmdt do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72):

Assunto - Tempo de antena

Boa tarde Padrinho, Carlos Vinhal, Cordiais saudações. 
Tendo lido os rasgados (e acredito merecidos) elogios ao Senhor Tenente-General  [António Martins de Matos] (*), escrevo este, para dar uma modesta sugestão: publicar como post os meus últimos comentários sobre o Senhor Coronel Morais Silva, até para os Camaradas que não o conheceram, saberem que não se trata de qualquer um que andou passeando os galões pelos trópicos, mas sim de um Oficial com "obra feita" como Comandante operacional, e se isso não fosse suficiente, Professor da Academia Militar e Capitão de Abril. 
Esse é o meu pedido, que submeto à avalizada decisão dos editores.

Forte abraço.
VP


2. Segunda mensagem com data de 12 do corrente:

Assunto - Situação de Gadamael 1970/72
Bom dia Carlos /Luís,
Cordiais saudações,

Nestes tempos de comunicação em rede, quando alguém publica uma informação, verdadeira ou falsa, logo uma "multidão" a repete, muitas vezes, sem qualquer verificação.

Quando alguém fez o relato dos acontecimentos de 73, ajuntou a afirmação de que raramente Gadamael era atacada, provavelmente comparando. Então, quando alguém quer discorrer sobre Gadamael, repete a mesma afirmação.

É direito e obrigação dos intervenientes, restaurarem a realidade dos factos. Foi o que fez recentemente o senhor Coronel A. C. Morais Silva, à época Comandante Operacional do aquartelamento de Gadamael, que passo a citar:  

"...em dezembro 70, a CCAÇ Ind 2796 (em início de comissão) foi flagelada em 16, atacado o aquartelamento em 20 (uma hora), e flagelada no dia 30. ~

"Destas ações resultaram 2 baixas nas NT e 16 na POP. Em janeiro de 71, ataques em 8, 10, 11 e 28. Combate próximo em 5 e 24 ( morte do cmdt comp.capitão inf. Assunção Silva). (**)

Em 6/7 de fevereiro de 71 o aquartelamento é flagelado durante 3 (três!) horas repetindo em 28 de fev. Neste período a companhia teve 9 baixas (ver no P7756 o estado da companhia em fins de janeiro de 71...).(**)

"Nos treze meses de estadia em Gadamael, a CCaç 2796, teve 5 mortos e 26 feridos, foi flagelada 25 vezes e teve 5 contactos com o IN."

"Reafirmo que a pressão exercida pelo PAIGC de Dez de 70 a Mar 71, buscava a queda de Gadamael e a consequente queda de Guileje. Não o conseguiu, porque a guarnição de Gadamael, apesar dos momentos difíceis que viveu, manteve a posse da posição, a segurança da população, o apoio logístico a Guileje, e a liberdade de movimentos do setor. "

Solicito publiquem, para que fiquem registados os factos; assim, qualquer um pode fazer as comparações que lhe aprouver!!!

Forte abraço
Vasco Pires
Ex-soldado de Artilharia
Gadamael (***)
_________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 1 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16152: FAP (95): de Gadamael a Kandiafara… sem passaporte nem guia de marcha (António Martins de Matos, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)


sexta-feira, 3 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16164: Dossiê Guileje / Gadamael (27): Tenho cada vez mais a certeza de que andaram a gozar comigo - ou connosco - durante 13 anos (António J. Pereira da Costa, cor art ref (ex-alf art, CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-cap art e cmdt, CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74)


Guiné > Região de Tombali > Sangonhá, a sul de Gadamael-Porto > c. 1967/68 > Vista aérea do destacamento, "uma espécie de fortim do faroeste", com um heliporto, uma pista de aviação, barracões e três poilões... Na altura  estava a chegar uma coluna militar [lado esquerdo]. Foto, provavelmente tirada de uma aeronave DO 27, de autor desconhecido. Proveniência: Álbum fotográfico Guiledje Virtual. Cortesia do nosso saudoso amigo Pepito (1949-2014), cofundador e líder da AD - Acção para o Desenvolvimento (Bissau) até à data da sua morte (, em Lisboa)

Foto: ©  / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados (Edição e legendagem: L.G.).




Guiné > Mapa da província > Escala 1/500 mil (1961) > Detalhe: Posição relativa de Sangonha e Cacoca, as nossas posições mais próximas da fronteira com a Guiné-Conacri, a sudeste. Estes dois destacamentos e tabancas foram abandonados pela CCAÇ 1621 em 29/7/1968, por ordem de Spínola.

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2015)


1. Comentário de António José Pereira da Costa ao poste P16152 (*)

Cor art ref (ex-alf art , CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-cap art e cmdt, CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74)

Olá,  Camaradas:

Considero que o abandono controlado de Sangonhá, Cacoca e, posteriormente, Ganturé, preparou o que viria a suceder em 1973. 

Sei, porque assisti à reunião, que o brigadeiro Spínola queria recuperar tropa da quadrícula para a intervenção e, por isso, contra a opinião do "meu capitão", determinou o abandono imediato de Sangonhá e Cacoca. Por fim, já em janeiro de 1969, Gandembel foi-o também e Mejo, onde chegou a haver uma companhia sediada, já o tinha sido. 

Podemos dizer que, em janeiro de 1969, a extremidade sul  da Guiné estava guarnecida por Cacine, Cameconde, Gadamael e Guileje o que é manifestamente pouco, até em termos de apoio mínimo. 

Tenho para mim que o controlo da estrada Cacine-Guileje era essencial para a manobra das NT, mas muito difícil de obter e manter. A superioridade do In em termos de apoio de fogo (artilharia) foi sendo cada vez maior (parece que com apoio topográfico e observação) e a possibilidade de cada uma das companhias actuar, com êxito, no seu sector, restringindo a passagem ao In era muito pequena. Além disso, o In não necessitava de residir na área, a não ser a sul de Cacine onde se estabelecera desde o início e ficou. 

A situação táctica tornou-se numa bomba-relógio que teria de explodir, mais tarde ou mais cedo.
Saliento que a capacidade de actuação do Comando do COP 5 era mínima, com três companhias dispersas, sem cavalaria (necessária para a movimentação das unidades) e sem qualquer unidade de intervenção que pudesse lançar no terreno numa acção mais elaborada. Podemos dizer que para além de boas(?) comunicações nada tinha que justificasse a sua existência. 

Já tenho pensado que alguém estava à espera de um "desenlace"...  Mas isto já é teoria da conspiração. 

Cacine era um bom local para desembarque de reabastecimento, especialmente material pesado, e juntamente com Gadamael concedia domínio sobre o rio e possibilidade de apoio de vária ordem.
Quanto à reunião de 15 de maio de 1973 só peca por tardia e eu não vejo como é que se poderia alterar de modo tão drástico e em tão curto espaço de tempo a FAP que operava na Guiné. A substituição das metralhadoras por canhões era elementar. Nunca supus que cada avião fosse tão mal armado, neste campo.

Sabemos que desde o começo se queria "embaratecer a guerra". Assim chegou-se, de facto a um pacto de silêncio em que a alta hierarquia das FA e "os políticos". Creio que aqueles não queriam levantar ondas junto daquelas. Já me referi ao facto de a nossa artilharia ser ceguinha e surda, respondendo a olhómetro às iniciativas do In. Já nesse tempo existiam radares contra-morteiro e referenciação pelo som e luz, só que...

E outro exemplo é o radar ANTPS-1D da BA 12, que repousava tranquilamente a 12 metros de altura. Já se perfilava então a possibilidade de sermos atacados com os tais MIG e nas condições que o António resume. Para lhes fazer frente nada melhor que três unidades AA da II GM. Pode não ser eficaz, mas é histórico.

Isto se não acontecer um ataque aéreo com qualquer teco-teco ou com um Antonov a largar bombas à mão, pela porta do fundo, sobre um pequeno quartel da periferia. Não se riam porque isto foi feito na Guiné... pelas NT. Nunca entendi aquela da contracção do dispositivo nem vejo quais as vantagens. Será que se esperava que se pudesse vir a expandi-lo? Boa táctica esta do encolher para, mais tarde, esticar...

Kandianfara era já nossa conhecida, em 1968, assim como o Porto de Camassó (no Quitafine), mas não era atacável por estar fora do TN [, território nacional]! Outra coisa que não entendo, mas aceito.

Já noutro lugar escrevi que não houve guerra e que Portugal nunca declarou guerra a nenhuma potência estrangeira e, por isso,  o Senegal e a República Guiné eram países contra os quais só "para gastos de casa" havia acusações. 

O emprego de tropa especial [, BCP 12,] naquele sector, "só depois da casa roubada", causa-me apreensão. Será que o comando empenhou todas as suas reservas e não tinha nenhuma para acorrer a uma nova situação? Ou estabeleceu prioridades e só actuou no Sul de pois de ter resolvido (?) o problema do Norte.

De qualquer modo parece que ficou provado que uma boa antecipação ou, no mínimo, uma resposta pronta, poderia ter resolvido os problemas no Sul, no Norte e no Leste. Assim, foi sempre que atamancada uma solução, com as consequências que se conhecem. 

Tenho cada vez mais a certeza de que andaram a gozar comigo - ou connosco - durante 13 anos (11, no caso da Guiné).  Mas felizmente houve o 25 de Abril, senão teríamos outra Índia. Pior e não é difícil ver porquê. Na Índia éramos prisioneiros de um exército regular de matriz britânica. Na Guiné éramos os colonialistas, salazaristas, imperialistas e lacaios de qualquer coisa que não me ocorre, o que era um problema, já que o nosso governo era relapso a aceitar os seus falhanços e adorava heróis mortos.

Um Ab e desculpem qualquer coisinha. (**)
António J. P. Costa
___________

quinta-feira, 2 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16158: Dossiê Guileje / Gadamael (26): É minha convicção que, se as Forças Paraquedistas demorassem mais 2 ou 3 dias, não era preciso mais, Gadamael teria caído (Manuel Reis, ex-alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã e Colibuia, 1972/74)

1. Comentário de Manuel Augusto Reis [, ex-alf mil  cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã e Colibuia, 1972/74], a  propósito do poste P16152 (*).

O texto foi enviado para a nossa caixa de correio, tendo nós a devida autorização para o publicar como poste, numa série que tem estado  parada há... quatro anos (Dossiê Guileje / Gadamael) e que suscitou muitas dezenas de comentários, nem todos serenos, como deveria ser timbre do nosso blogue.  (***)

O poste do António Martins de Matos foi reencaminhado, mal foi publicado, para um conjunto de camaradas e amigos da Guiné, grã-tabanqueiros, que se têm interessado pelo dossiê Guileje/Gadamael, quase todos protagonistas dos acontecimentos (ou que, em outros tempos, passaram por Guileje e/ou Gadamael, e que têm escrito sobre a guerra no sul da Guiné).

Trata-se, de resto, de um dossiê que nunca ficará encerrado, tão cedo,  por nos  faltar  a competente investigação historiográfica, de base científica, rigorosa, plural, contextualizada e comparada. 

Todos nós, portugueses (mas também os guineenses),  temos "velhas contas por saldar", fantasmas por exorcizar, ganhos e perdas a contabilizar e consolidar, ódios e amores mal resolvidos, histórias por contar, análises de custo-benefício, etc. Não vai ser na nossa geração que a gente vai decididamente "arrumar" esta parte da história pátria...

Mas, enquanto os arquivos continuam em silêncio (e eles nunca falarão se não forem tratados,   disponibilizados e explorados pelos investigadores...) , os protagonistas, de um lado e do outro, vão desaparecendo, vão morrendo ou envelhecendo... Estamos todos cansados (da guerra, da vida, da Pátria, do blogue, etc.) e alguns de nós optaram já por se calar de vez, ao que parece, ou então deixaram-se cair na perigosa armadilha do cíclico nacional pessimismo. De resto, os portugueses são um povo bipolar, dado a euforias e depressões...

O Manuel Reis, no seu mail, via este seu comentário como um mero "desabafo"... Respondi-lhe em tom de brincadeira: "Camarada, o teu 'desabafo' também é para a história.. Vou publicá-lo, se mo autorizares. E dou conhecimento dele, desde já, ao nosso camarada e amigo AMM... Tudo o que se escreveu e a vier escrever  sobre Guileje e Gadamael ainda é pouco... E já não temos muito tempo, que 'a vida é curta, a arte é longa, a ocasião fugitiva, a experiência enganadora, o juízo difícil',  como diria o médico grego Hipócrates, pai da medicina ocidental  (Aforismos, Séc. IV/V a.C.).

A nós, que fomos protagonistas de uma guerra, depois de fazê-la. mal ou bem, por terra, ar e mar, compete-nos falar dela e escrever sobre ela, mal ou bem... Atores, não podemos ser juízes, mas podemos ter opinião, individualizada...   O  Manuel Reis foi o primeiro a responder  ao nosso desafio. E espero que não seja ele a encerrar de vez o "dossiê Guileje / Gadamael" que tem sido, afinal, um belo exemplo da pluralidade  (em termos de  conhecimentos,  memórias,  perceções, valores, sentimentos, emoções, etc,) que faz a riqueza e a originalidade da nossa Tabanca Grande... Aqui cabemos todos,  com tudo aquilo que nos une e até com aquilo que nos separa... (LG)
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De: Manuel Augusto Reis  
Data: 1 de junho de 2016 às 14:50

Assunto: Guiné 63/74 - P16152: FAP (95): de Gadamael a Kandiafara… sem passaporte nem guia de marcha (António Martins de Matos, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

Caro amigo António Matos,

Gostei imenso do teu texto,  muito esclarecedor,  sobre os tempos complicados de Guileje e Gadamel. Muito conversámos sobre isto nos almoços-convívios da Tabanca do Centro. Algumas discordâncias mantêm-se e assim vai continuar a ser. Só me referi ao que vi, tanto em Guileje como em Gadamael. Tu ofereces-nos uma visão mais ampla e mostras-nos outros métodos de actuação da Força  Aérea  e outras estratégias do PAIGC.

Dizer que Gadamael tinha sido apanhado de surpresa não é verdade. Gadamael, através do seu Comandante, conhecia o dia a dia de Guileje, naqueles dias turbulentos, e o Comandante do COP5 foi-o informando, mesmo pessoalmente, quando se deslocou a Bissau. Inclusivamente assistiu à tomada de decisão do Comandante do COP5, pois estava presente em Guileje, embora muito contrariado.

O Comandante do COP 5 [. o major art Coutinho e Lima,] tudo fez para aguentar Guileje. Deslocou-se a Bissau, em missão arriscada, à procura de ajuda. Regressou de mãos a abanar, mas regressou. Como era fácil provocar uma situação anómala e ficar retido, deixando o odioso para outro que o fosse substituir!. Mostrou um brio profissional invulgar ao não abandonar os seus militares. A tomada de decisão foi devidamente ponderada, a situação que se vivia no aquartelamento devidamente escalpelizada e os riscos de semelhante decisão calculados. Não deixou de referir que a sua vida tinha terminado aí.

Em Gadamael cabíamos todos, não havia falta de espaço e é errado responsabilizar Guileje sobre o sucedido em Gadamael. Novo Comandante [, cor pqdt  Rafael Durão], material humano em duplicado e 9 dias para preparar o embate, previsível.

O que foi feitio? Melhoraram-se as valas e fizeram-se patrulhamentos diários, de resultados nulos, apesar dos contactos frequentes com o PAIGC, de que resultaram alguns feridos leves.

A gravidade da situação de Gadamael foi mal avaliada, como o já havia sido em Guileje. O novo Comandante do COP5, a partir do dia 22 de Maio, parte no dia 31 de manhã para Cufar [. sede do CAOP1,],  julgando que a situação de Gadamael estava controlada. Regressa de imediato, na manhã do dia 1 de junho, mas nada há a fazer. Aliás a presença dele em nada alteraria o rumo dos acontecimentos. Não há homens no aquartelamento, nem material capaz de se opor à violência dos ataques do PAIGC. Algum desespero apodera-se de alguns Comandantes e acontecem desastres imprevistos. (**)

Meu caro amigo, no essencial estou de acordo contigo. Gadamael tremeu mas não caiu e tal se deve à actuação do Batalhão de Paraquedistas [, BCP 12,] e à actuação EFICAZ da Força Aérea. Como homem no terreno, é minha convicção que se as Forças Paraquedistas demorassem mais 2 ou 3 dias, não era preciso mais, Gadamael teria caído com estrondo, aprisionando ou matando tudo o que lá se encontrava.

Falei do que sabia, opinei sobre o vi. A tua perspectiva é mais global e interessante e entronca na situação política.  

Um forte abraço,
Manuel Reis.



Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 2769 (Gadamael e Quinhamel, de janeiro de 1971 a outubro de 1972) > Vista aérea de Gadamael Porto nos finais do ano de 1971. Foto do cor art ref António Carlos Morais da Silva, e por ele gentilmente cedida ao nosso camarada Manuel Vaz.

Foto: © Morais da Silva (2012) Todos os direitos reservados.[Edição: LG].
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Notas do editor:

(**) Todos os postes anteriores desta série:

12 de dezembro de  2009 > Guiné 63/74 - P5450: Dossiê Guileje / Gadamael (18): Estive 18 horas em escuta nesse dia fatídico para o Sr.Tenente Pessoa e a FAP, em 25 e 26 de Março de 1973 (Victor Affaiate)

11 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5444: Dossiê Guileje / Gadamael (17): Depois do que ouvimos da boca do Sr. Cor Pára Durão, tudo o que vier a ser dito, soa a elogio (Victor Alfaiate)

9 de dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5434: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (16): Guileje não caiu, foi abandonado (José da Câmara)

7 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5417: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (15): Ainda e Sempre Guileje (Victor Alfaiate, ex-Fur Mil Trms, CCAV 8350, 1972/74)

24 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4736: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (14): Na minha opinião pessoal, o Major Coutinho Lima foi um Herói! (Amílcar Ventura)

3 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4634: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito a contar a minha versão... (Constantino Costa)

14 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4344: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (12): Homenagem dos Homens Grandes de Guiledje a Coutinho e Lima (Camisa Mara / TV Klelé)

5 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4282: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (11): Heróis... (Constantino Costa, Sold CCav 8350, 1972/74)

1 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4271: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (10): Respondendo ao João Seabra (António Martins de Matos)

23 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4239: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (9): Eu, a FAP, o BCP 12 e a emboscada de 18 de Maio (João Seabra)

15 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4035: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (8): Amigo Paiva, confirmas que fomos vítimas de ameaças e pressões (Manuel Reis

4 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3982: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (7): Ferreira da Silva, ex-Capitão Comando, novo comandante do COP 5 a partir de 31/5/1973

1 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P3954: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (6): A posição, mais difícil do que a minha, do Cap Cmd Ferreira da Silva (João Seabra)

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16152: FAP (95): de Gadamael a Kandiafara… sem passaporte nem guia de marcha (António Martins de Matos, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)


Foto nº 2  > "Foto de  autor desconhecido mas já por várias vezes publicada,  refere-se à última missão do Cor Moura Pinto na Guiné, com os pilotos e mecânicos do FIAT G-91 (Co a devida vénia ao autor) 


Foto nº 2 A > 


Foto nº 2 B 

Cortesia do bogue Especialistas da Base Aérea 12 Guiné 65/74 > 25 de janeiro de 2009 > O fim de um grande homem, um grande comandante


 Foto e legenda de Arnaldo Sousa:  pessoal dos Fiat G91/R4 e alguns pilotos. O Comandante da Zona Aérea e da BA12, Coronel [Pilav] Gualdino Maria Moura Pinto (, já falecido [. por doença, segundo inmformação do AMM, e não no acidente  com avião da TAP, o TP 425, vindo de Bruxelas, ocorrido a 19/11/1977 no Aeroporto do Funchal]. 

Da esquerda para a direita: em pé: Sargentos Robalo, Antunes, Pinheiro, Gaudêncio; Cap Pilav Letras, Cor Pilav Moura Pinto, Major Pilav Pedrosa, Cabos Veríssimo, Pinto, Sousa, Sargento Duarte. 

Em baixo: Cabo Lopes, Furriel Pinheiro, Sargento Ramiro, Cabos Brás, Veríssimo (II). Na escada do avião o Ten Pilav Matos. 

Esta foto de despedida foi tirada dias antes da partida do Coronel Moura Pinto para a Metrópole. Pessoa muito educada e de poucas falas, passava com muita calma e esboçando um ligeiro sorriso, inspecção ao avião sem tecer comentários e sem encontrar ponta por onde pegar como se costumar dizer. Todos o admiravam.  [...]  Arnaldo Sousa,  MMA 1ª/72.



A. Mensagem, com data de 24 de maio, do nosso camarada António Martins de Matos [AMM]  [ex-tenente pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje ten gen pilav ref; membro da nossa Tabanca Grande]


Caros amigos

Quase chegados às datas importantes de Gadamael, aqui junto um texto que abarca o período de 1 de junho de 1973 até ao 25 de abril de 1974.

Se o acharem com “pés para ser publicado”, gostaria que o fizessem no 1 de junho, data em que os acontecimentos foram “complicados”.

Para adocicar o texto junto 4 fotos:

A 1ª, tirada por mim, é de Pirada, mostra a distância entre o aquartelamento e o marco da fronteira [Foto nº 1];

A 2ª (, de autor desconhecido mas já por várias vezes publicada, ) refere-se à última missão do Cor Moura Pinto na Guiné, com os pilotos e mecânicos do FIAT G-91:

A 3ª e 4ª foram tiradas da Internet, representam o MirageV e o Skyvan.

Abraço
AMM


B. De Gadamael a Kandiafara… sem passaporte nem guia de marcha

por António Martins de Matos

Numerosos são os textos, palestras, opiniões e até filmes sobre os acontecimentos em Guileje e Gadamael entre os meses de maio e junho de 1973, a maior parte das vezes descrevendo e prognosticando o principio do fim das nossas tropas (NT) e enaltecendo a manobra do PAIGC, no que alguns à posteriori e no sentido de valorizar o momento, denominaram de “Operação Amílcar Cabral”.

Inexplicavelmente os referidos textos, palestras e filmes só relatam os acontecimentos no brevissimo período de duas semanas, entre os dias 22 de maio e 5 de junho de 1973, ninguém se mostrou interessado em seguir a estória dos dias seguintes e saber o que realmente acabou por acontecer em Gadamael e em toda a zona sul da Guiné.

Quem se desse ao trabalho de analisar com maior profundidade os acontecimentos desse junho de 1973 acabaria por constatar que a grande ofensiva do PAIGC no sul da Guiné se resumiu apenas àquelas duas semanas e logo se volatilizou, tudo regressando à situação anterior a 1972.

Porquê? Que se passou?

O que travou o avanço do PAIGC e estancou o tão apregoado “efeito dominó”,propagandeado vezes sem conta por 'Nino' Vieira?

A explicação é simples e tem duas vertentes, por um lado a presença do Batalhão de Paraquedistas na área condicionou de imediato os movimentos dos guerrilheiros na zona, por outro lado a Força Aérea Portuguesa (FAP) bombardeou as matas à volta de Gadamael, silenciando várias bases de fogo, e em seguida entrou pelo território da República da Guiné-Conacri, destruindo a maior base de apoio do PAIGC, situada perto da localidade de Kandiafara.

Passados que são 43 anos e antes que o tema acabe por cair no esquecimento, aqui junto algumas considerações sobre a situação então vivida e factos ocorridos nesses dias.



Mirage V (Imagem, de origem desconhecida, recolhida na Internet, AMM)


1. O material em falta

Na Guiné e logo após a identificação do míssil Strela (6 de abril de 1973), os pilotos da FAP tinham pedido três melhoramentos urgentes.  a saber, pretendiam que: (i) fossem substituídas as metralhadoras 12,7 mm do FIAT G-91 por canhões de 20/30 mm: (ii) fosse instalado na aeronave um sistema de alerta anti-míssil:  e, (iii) na base de Bissalanca, necessitavam de um radar de busca/defesa aérea que os apoiasse em operações de dia/noite ou mau tempo.

Ainda que dispendiosos, todos estes requisitos eram fáceis de implementar, na Força Aérea Alemã havia aviões iguais aos nossos mas equipados com dois canhões de 30mm, sistemas anti-míssil já eram usados no Vietname, e Bissalanca até já tinha um radar de defesa aérea desde 1964, montado em torre metálica perto da cabeceira da pista, só que … não funcionava.

Em complemento a este pedido dos pilotos, o Comandante da Zona Aérea, Coronel Moura Pinto, tinha declarado em 15 de maio de 1973, durante a reunião de Comandos no Quartel-general do Comando Chefe, que, face à ameaça dos mísseis Strela e possível entrada no conflito de aviões MIG, para continuar a dar um apoio eficiente às NT precisava de  oito aviões SKYVAN, para substituir os DO-27, cinco helicópteros equipados com armamento axial, e doze aviões do tipo MIRAGE, com um raio de acção não inferior a 300 milhas náuticas.

Este requisito sobre o raio de acção não era inocente, no caso de um futuro ataque de MIG haveria necessidade de retaliar e destrui-los no solo e a única pista apta a receber os aviões, estava situada em Conacri, a uma distância de cerca de 200 milhas de Bissalanca.

Todos estes pedidos foram devidamente registados, logo os estados-maiores entraram na borbulhagem da burocracia e, de reunião em reunião, estudo em estudo e acta em acta, lá se foram adiando as soluções.

Esta inércia, ignorância, desleixo ou falta de respeito pelos militares que em 1973 combatiam na Guiné já há muito se tinha tornado por demais evidente, o Governo de Lisboa não sabia e/ou não estava minimamente interessado em resolver a situação no Ultramar, o seu lema pautava-se por um … “adiar é resolver”.

Tivessem lido os “Tratados sobre Guerra Subversiva” e deveriam saber que, com o passar do tempo, a situação iria evoluir da “tímida flagelação” para uma “guerra convencional”, onde a artilharia e a aviação acabariam por ter um papel fundamental.

No entanto, durante todos os anos do conflito e para além de alguns pequenos melhoramentos no armamento das nossas forças armadas, nada mais tinha sido feito.

Em boa verdade já não existia o capacete de ferro, cartucheiras a tiracolo e a Mauser mas os tempos da primeira mina encontrada (1963) já tinham passado, usávamos dilagramas e bazucas contra o RPG, obuses da 2ª Grande Guerra contra o canhão sem recuo e o FIAT G-91 contra uma previsível e futura aviação de MIG, de dono indefinido e, ao contrário do que muitos acreditavam, quase certamente pilotados por mercenários experientes, oriundos da Alemanha de Leste, URSS, Reino Unido, …como já anteriormente tinha acontecido na guerra Nigéria/Biafra.

Por outro lado e em termos de defesa aérea, a Guiné continuava totalmente desprotegida, não só contra aviões de combate mas também contra qualquer “avioneta” que, de noite, resolvesse vir largar sobre Bissau umas granadas, uns tijolos ou uns panfletos.

Ao chegar o 25 de abril de 1974, um ano depois do aparecimento do míssil Strela e depois de seis aviões terem sido abatidos, de todos os requisitos operacionais então solicitados e tidos como urgentes e imprescindíveis, nenhuma alteração/melhoramento tinha ocorrido.


Short Skyvan SC-7 (G-BEOL) of Invicta Aviation at the Cotswold Air Show at Cotswold Airport, Kemble, Gloucestershire, England. Later in the day it was used to drop a parachute team.
Date June 2010.  

[By Adrian Pingstone (Arpingstone) (Own work) [Public domain], via Wikimedia Commons ]


2. Estratégias

Entre 6 e 8  de junho de 1973 o então CEMGFA, General Costa Gomes, visitou a Guiné, trazendo a resposta/solução do Governo aos pedidos feitos a 15 de maio de 1973 no Quartel-general do Comando Chefe.

Segundo ele e por motivos não explicados, os pedidos de material militar dificilmente seriam satisfeitos, mas, em contrapartida, aceitavam/sugeriam a retracção dos aquartelamentos da fronteira.

Era a segunda visita de Costa Gomes nesse ano, desde logo se tornou evidente que, para transmitir aquelas decisões do Governo não teria sido necessário vir a Bissau, algo que poderia ter sido comunicado por mensagem, a razão da deslocação e a sua principal missão era a de tentar “amaciar” Spínola.

O General Spínola conhecia bem os textos de Clausewitz e Mao Tse Tung, sabia que a guerra na Guiné nunca poderia ser ganha pela força mas sim cativando as populações locais.  A sua estratégia há muito que estava definida, passava por não hostilizar as populações, criando ordenamentos auto-defendidos, com escolas e apoio sanitário, saudando o regresso dos que anteriormente tinham apoiado a guerrilha e deixando em aberto a possibilidade de, num futuro não muito distante, iniciar negociações com os líderes locais tendo em vista a oferta de uma autonomia negociada.

Interessante e quase nunca referido, durante o seu Comando, Spínola proibira terminantemente que alguém, alguma vez, efectuasse algum disparo na zona da Ilha do Como.

Spínola logo rejeitou a solução apresentada pelo CEMGFA, a estratégia da retracção autorizada pela Metrópole só iria conduzir a um beco sem saída, quando, de retirada em retirada e por falta de espaço, não mais pudessem retrair as forças, a saída acabaria por ser semelhante à que os americanos de Saigão vieram a adoptar em 1975, dos telhados da cidade em direcção aos navios fundeados na baía.

Por outro lado, uma retracção iria destruir pela raiz todo o esforço em que se empenhara, iria deixar vulneráveis todas as populações das áreas junto às fronteiras, e às quais tinha prometido protecção.

A estratégia de Spínola não agradava ao Governo, podia vir a ser um mau exemplo para Angola, e, para o Governo de Marcelo Caetano, só Angola era importante.

Desiludido, sentindo-se manipulado, Spínola desistiu, … outros que fizessem melhor…

Ninguém fez melhor.

Entretanto, o Comandante da Zona Aérea, Coronel Moura Pinto, que sabia de estudos na FAP desde 1971 para a compra de aviões MIRAGE V, ao constatar que o apoio urgente e pedido em 15 de maio de 1973 continuava adiado e a não fazer parte das prioridades do Governo e que, em vez disso e em jeito de consolação, ia recebendo equipamento variado mas sem qualquer utilidade, logo criticou as chefias de Lisboa.

Desta vez foram rápidos a reagir, de imediato foi destituído do cargo que desempenhava.


3. Gadamael

Fazendo parte do então criado COP5, juntamente com Cacine e Guileje, Gadamael era um aquartelamento sem grande estória ou posição estratégica, a sua importância resumia-se a uma missão do tipo entreposto, receber via fluvial os abastecimentos destinados a Guileje e …expedi-los.

Até 1968 o aquartelamento tinha-se mantido protegido de ataques vindos da fronteira pela existência dos destacamentos de Cacoca e Sangonhá e, apesar de entretanto estas duas posições terem sido desactivadas, pouco ou nada se alterou, o rio Cacine era um obstáculo natural para o PAIGC, bem mais interessado em utilizar o Corredor do Guileje.

Raramente Gadamael era atacada, como consequência, o plano de defesa do aquartelamento não era muito elaborado, uns mini-abrigos e algumas valas eram mais que suficientes.

Quando em 22  de maio de 1973 e sem qualquer aviso lhe entraram pelo aquartelamento cerca de 200 militares e 500 civis fugidos de Guileje, logo as coisas se complicaram, não havia espaço para acomodar tanto pessoal.

Em 25 de maio de 1973 e depois de se ter recomposto da surpresa de lhe terem oferecido de bandeja um aquartelamento das NT, ainda por cima cheio de víveres, o PAIGC logo procurou explorar o seu inesperado êxito, em cinco dias recolocou a sua artilharia pesada na direcção de Gadamael e passou a executar um “tiro ao alvo” contra o aquartelamento, bem mais intenso do que tinha feito contra Guileje.

Tudo o que depois aconteceu, resultou apenas da … falta de espaço.

A segunda pedra do dominó oscilou, tudo isso sem que os militares de Gadamael merecessem algum reparo ou reprimenda, apenas tinham sido surpreendidos por acontecimentos estranhos e inopinados, para os quais em nada tinham contribuído e eram completamente alheios.

Oscilou mas não caiu.

Entre 1 e 3 de junho de 1973 a FAP evitou fazer bombardeamentos na zona, nada a ver com desculpas de mau tempo, Strelas ou AA [, antiaéreas], mas sim por se saber haver inúmeros militares e população espalhados e em debandada por toda a área, só com a chegada dos paraquedistas em 3 de junho de 1973 a situação ficou mais ordenada.

A partir do dia seguinte as áreas suspeitas foram devidamente identificadas, as bases de fogo dos morteiros de 120 mm acabaram por ser bombardeadas e calaram-se de vez.

De seguida foi a busca das armas de maior alcance, situadas para além da fronteira, durante alguns dias ainda se tentaram encontrar as bases de fogos nas clareiras perto de Satiguia, mas a área era demasiado vasta, mereceu um pensamento apropriado:  “Em vez de andarmos à procura das formigas, o melhor será encontrarmos o formigueiro”.

Estava lançado o mote para destruir Kandiafara.


4. Kandiafara

No inicio do conflito na Guiné os “estrategas” de então terão pensado que o armamento da guerrilha se limitaria à “catana, canhangulo e arma fina”, tal ideia fez com que o dispositivo das forças portuguesas fosse planeado essencialmente de modo a controlar as fronteiras, espalhando os efectivos pelo terreno, alguns quartéis mesmo no limite do nosso território, em missão do tipo controlo de polícia, ver quem entra e quem sai.

Com a evolução da guerra tal aproximação revelou-se desajustada, a Guiné era um território pequeno, tendo por vizinhos o Senegal e a Guiné-Conacri, ambos hostis, e com as suas fronteiras altamente permeáveis a infiltrações.

Não obstante o dispositivo nacional estar espalhado por todo o território, o apoio logístico do PAIGC ao interior conseguia facilmente ser executado através de corredores de abastecimento mesmo nas vizinhanças dos nossos aquartelamentos, Jumbembem e Sambuiá no Norte, e Guileje no Sul disso eram exemplos.

A missão das NT de tentar impedir o fluxo e refluxo de colunas de abastecimento através desses corredores de infiltração sempre se revelou de êxito duvidoso, algumas colunas terão sido bloqueadas, mas o melhor que se conseguia fazer era atrasar o seu deslocamento, grande parte delas terá passado incólume.

Mas não era só o problema de conter as infiltrações que nos devia preocupar, alguns dos aquartelamentos tinham sido construídos a escassos metros da fronteira e por essa razão ao alcance de um simples tiro de arma ligeira disparado do país vizinho, casos de Guidaje, Pirada e Buruntuma.

Com o passar do tempo e o aparecimento na panóplia do PAIGC de artilharia mais potente, inúmeros outros aquartelamentos logo vieram engrossar a lista dos que podiam ser atacados a partir do “estrangeiro”, a saber,  Bajucunda, Copa, Canquelifá, Guileje, Gadamael.

O abandono do Guileje em 22 de maio de 1973 deu ao PAIGC uma nova perspectiva de como bastava posicionar a sua artilharia pesada na zona da fronteira para poder forçar as NT a recuar, tudo isto sem serem obrigados a grandes riscos ou movimentações.

Com a introdução no conflito de uma nova peça de 130 mm (M-46, de alcance superior a 20 quilómetros), a breve trecho outros quartéis iriam ficar em semelhante situação, Piche, Cacine e Aldeia Formosa certamente seriam os próximos alvos.

A não ser tomada uma decisão que contrariasse este tipo de ataques, o PAIGC preparava-se para nos obrigar a retirar de todos os quartéis próximos da fronteira, sem sequer necessitar de entrar no nosso território.

A única maneira de conter estes ataques passava por destruir os grandes centros de logística, ambos situados na Guiné-Conacri, Kandiafara a cerca de 20 quilómetros a oriente de Guileje, recebia o material de guerra desembarcado em Boké e, com a ajuda de Simbeli e Kambera, abastecia todo o sul, e Koundara a uma distância de cerca de 40 quilómetros a leste de Buruntuma que, com o apoio de Kumbamori, abastecia o norte e leste.


5. Os riscos

Portugal já tinha passado por uma má experiência quando da “Operação Mar Verde”.

A maioria dos objectivos tinha falhado, de positivo tínhamos recuperado os prisioneiros portugueses, mas Sekou Touré continuava a ser o presidente da Guiné-Conacri, a oposição ao seu regime tinha sido aniquilada e não estava resolvido o mistério sobre a presença ou não de aviões MIG no seu território.

No plano internacional, de imediato tínhamos sido acusados de um acto de guerra e violação das fronteiras contra um estado soberano, tendo o Conselho de Segurança das Nações Unidas logo aprovado duas resoluções contra Portugal.

Em termos militares pagámos igualmente a ousadia de tal operação, Sekou Touré pediu e obteve um maior apoio militar da URSS, material de guerra que veio engrossar a panóplia do PAIGC.

O Governo Português ainda se esforçou por tentar defender a ideia que nada tinha a ver com a invasão, mas a deserção de alguns elementos dos comandos africanos puseram a nu a nossa participação.

Em termos de lições aprendidas e para um eventual novo ataque dentro do território da Guiné-Conacri havia uma série de riscos que Portugal não podia voltar a correr, a informação sobre o objectivo tinha de estar precisa e actualizada, o alvo tinha de ser totalmente destruído e não podiam ser deixadas “pontas soltas” em território da Guiné Conacri.

Quanto à situação internacional…. logo se veria.


6. O armamento

Cada avião FIAT G-91 foi armado com duas bombas de demolição de 750 libras (cerca de 340 quilos por cada bomba) e 200 munições 12,7 mm em cada uma das 4 metralhadoras.

As bombas de 750 libras, de origem americana, eram de demolição e actuavam por sopro. Obrigavam a um cuidado redobrado na pilotagem, estava-se perto do peso máximo autorizado para a descolagem e, devido à pequena dimensão da asa, não era possível manobrar o avião numa situação de assimetria, as duas bombas tinham que ser largadas na mesma picada de bombardeamento, ainda que pudessem bater dois alvos distanciados de 500 metros.

De referir que este problema de assimetria nas asas custou-nos a perda de um avião em 1 de setembro de 1973 quando, num bombardeamento na área do Morés, o piloto largou uma das bombas e, por motivos não esclarecidos, conservou a outra. (FIAT G-91 5416).

Quanto às metralhadoras, elas apenas seriam usadas para defesa próxima, na remota hipótese de algum encontro imediato com um MIG que nos viesse atacar.


7. A execução

Nessa manhã estavam 8 aviões prontos para operações mas na Guiné e nesse período só havia 6 pilotos qualificados na aeronave.

Logo pela manhã saíram 2 helicópteros de Bissalanca em direcção a Gadamael, tinham como missão ficarem de alerta para uma tentativa de resgate de algum piloto que eventualmente fosse abatido em território da Guiné-Conacri, algo que encarávamos como muito provável, já que sabíamos Kandiafara fortemente defendida com antiaéreas ZPU-4 de 14,5 mm, peças AA de 37 mm e mísseis Strela.

Havia ainda a possibilidade de, caso existissem, sermos confrontados e perseguidos por aviões MIG.

Os de Gadamael ouviram-nos passar, ainda vieram ao rádio, estavam habituados a ver-nos bombardear as matas na zona da fronteira, queriam saber onde íamos, não respondemos, desta vez o objectivo não era na vizinhança mas sim … no estrangeiro.

Em 20 minutos chegámos a Kandiafara, íamos altos, a cerca de 3500 metros de altitude, o que nos dava grande vantagem, lá de cima podíamos ver a área do objectivo na sua totalidade, estávamos ao abrigo de disparos de Strela e, uma vez identificados os alvos, permitia-nos uma picada imediata sobre os mesmos.

Fomos recebidos com um fogo cerrado das peças AA de 37 mm, os projecteis rebentavam um pouco abaixo de nós, formando um tapete branco de pequenas explosões.

Logo de seguida os seis aviões picaram sobre os respectivos alvos e cada um largou as suas duas bombas de 750 libras.

Na recuperação do passe sentimo-nos a ser perseguidos pelo fogo das ZPU-4, o chamado “calor na nuca”; pela minha parte vi algumas tracejantes passarem perigosamente perto da cauda do avião que me precedia, até que ele, com uma manobra brusca, inverteu a direcção da subida.

Depois de, no rádio, verificarmos que todos estavam bem, o regresso a Bissalanca foi “cada um por si”, interessava regressar o mais rápido possível, de modo aos mecânicos reabastecerem e remuniciarem as aeronaves.

Uma hora depois de termos aterrado já estávamos de novo no ar, novamente 6 FIAT G-91, cada um com outras 2 bombas de 750 libras.

Sabíamos que, a haver MIG, esta segunda missão seria o momento indicado para nos atacarem.

A chegada a Kandiafara foi bem diferente da vez anterior, já não houve tapete de explosões de 37 mm, apenas algumas tracejantes de ZPU-4, o que até nos permitiu localizá-las e largar bombas nas suas posições.

Nova verificação de que tudo estava bem e regresso imediato a Bissalanca para mais um remuniciamento.

Mais uma hora de espera e iniciámos uma terceira viagem ao estrangeiro, mais 12 bombas de 750 libras, ao chegarmos a Kandiafara já não vislumbrámos qualquer reacção hostil, nada, …, a área estava cheia de fumo e pó e … parecia deserta.

Esta última largada de armamento já não teve alvos definidos, foi mais na zona, o que tinha de ser destruído já o fora anteriormente.

Ainda ficámos algum tempo a circular à vertical do objectivo, tentando vislumbrar alguma reacção vinda do chão ou do ar, nada aconteceu.

A mais famosa e importante base de apoio do PAIGC acabara de ser destruída.


8. Os resultados 

Em termos diplomáticos a missão acabou por ser um sucesso já que, inexplicavelmente, não houve qualquer queixa internacional.

Como justificação para esta “não queixa” poder-se-á afirmar que, sendo certo que o bombardeamento foi bem dentro do território da Guiné-Conacri, por outro lado foi dirigido apenas contra instalações do PAIGC.

Numa análise mais “elaborada” arriscar-me-ia a dizer que este bombardeamento terá mesmo agradado ao presidente Sekou Touré, o qual há muito que não se sentia seguro com o crescente potencial bélico do PAIGC dentro do seu território, por comparação com a debilidade das suas forças armadas.

Em termos operacionais a missão foi igualmente um sucesso, por um lado nenhum avião foi atingido, por outro lado a capacidade de abastecimento do PAIGC na região sul ficou seriamente abalada e o grande esforço que vinha realizando nessa área, diluiu-se de imediato.

Em resumo, em Kandiafara foram largadas 36 bombas de 750 libras, o equivalente a mais de 12 toneladas de explosivos, o maior bombardeamento da FAP nos 13 anos de guerra em África.

Para o êxito da missão muito contribuíram os mecânicos, tantas vezes esquecidos, por vezes maltratados e que, nessa manhã, tinham feito um esforço sobre-humano para prepararem as 18 saídas e o respectivo armamento.


Foto nº 1 > Guiné > Zona leste > Pirada b> 1973 > "Foto  tirada por mim, é de Pirada, mostra a distância entre o aquartelamento e o marco da fronteira".

Foto (e legenda): © António Martins de Matos (2016). Todos os direitos reservados.


9. O rescaldo 

Em novembro de 1973 e como a indiferença perante a necessidade de melhorar o equipamento militar se continuasse a manifestar, o novo Comandante da Zona Aérea, Coronel Lemos Ferreira, subiu o tom das criticas, “SUGERINDO” que, à semelhança do ocorrido na Índia doze anos antes, o Governo preparava-se para tentar encontrar um “bode expiatório”, algo que permitisse justificar o fim do Ultramar, uma maneira hábil de tentar ilibar os políticos e culpar os militares.

Os recém nomeados Ministros da Defesa e Exército, Silva Cunha e Andrade e Silva e o então CEMGFA, General Costa Gomes, engoliram o “sapo” e nada fizeram.

E continuaram a nada fazer.

Algum tempo antes da missão a Kandiafara a FAP já havia bombardeado Kumbamori (no norte) e Kambera (no sudeste), enfraquecendo a logística de apoio do PAIGC nas zonas norte e sul.

O passo seguinte seria atacar e destruir Koundara, a base que apoiava o leste.

Foi feita uma missão de ensaio onde se verificou que o FIAT G-91 com o armamento apropriado e partindo de Bissalanca, apenas conseguia chegar a Buruntuma, devido ao seu pequeno raio de acção.

Ainda assim, a missão podia ser realizada, mas os aviões tinham de, no regresso, aterrar em Nova Lamego para reabastecer, nada de difícil, apenas mais demorado.

Inexplicavelmente … não fomos autorizados.  Ficava no ar a impressão que “alguém, algures” … queria perder a guerra.

Entretanto o nosso sobrevoo na zona de Buruntuma alertara as NT, nunca se saberá como os identificaram mas, … descobriram aviões MIG no ar.

Em dezembro de 1973 o General Bettencourt Rodrigues ordenou uma vasta operação no Cantanhez.

A comparação com Spínola estava a revelar-se difícil, no seu currículo já tinha uma má nota, responsável pela “comemoração da independência”, ainda que a mesma se tivesse efectuado fora da Guiné.  Necessitava urgentemente de marcar pontos.

Em termos de estratégia, a sua decisão desde logo deixava algumas dúvidas sobre a razão e oportunidade, outrora o Cantanhez fora um santuário do PAIGC mas tudo isso se diluíra devido a três factores: (i) a construção dos aquartelamentos das NT na margem esquerda do rio Cumbijã; (ii) o ataque e destruição de Kandiafara;  e (iii) os posteriores bombardeamentos na área, só terminados quando, depois de termos atacado a tabanca nossa/deles de Santa Clara, a população tinha entrado pelo aquartelamento de Cadique a pedir auxilio.

Tínhamos bombardeado a tabanca e de seguida fomos buscar os feridos, tivesse o Fernando Pessa sabido do acontecimento e logo diria … “E esta, heim?”.

Aos olhos de qualquer piloto habituado a sobrevoar a Guiné era evidente que os apoiantes do PAIGC e habituais no Cantanhêz, há muito se tinham apresentado aos nossos aquartelamentos ou … atravessado o rio Cacine, direcção Guiné-Conacri.

Para a FAP e face à não destruição de Koundara, o novo ponto crítico da Guiné estava há muito definido, o leste, onde a protecção das NT continuava a ser descurada.

Em 1 de janeiro de 1974 e com a missão no Cantanhez ainda a terminar, foi o momento do PAIGC iniciar os ataques a Canquelifá, Bajocunda e Copá, com o apoio logístico da entretanto poupada Koundara e a estratégia já anteriormente usada em Gadamael, o chamado “tiro ao alvo”, desta vez utilizando foguetões de 122 mm.


10. O fim

Quando em janeiro de 1974 o PAIGC se retraiu no sul e norte para poder iniciar os ataques ao leste, os “estrategas” do QG/CTIG já não estavam minimamente interessados em estudar e discutir as tácticas e os planos da guerra, mas sim em como se livrarem dela.

Desde logo identificavam como culpados Marcelo Caetano, o seu Governo e os 50 aviadores de Bissalanca que, segundo as más línguas, em vez de apoiarem as NT, “já nem voavam”, ainda que, misteriosamente, continuassem a largar ferro por tudo o que era sitio e a serem abatidos por Strelas (31 de janeiro de 1974, FIAT G-91 5437).

A 8 de fevereiro de 1974 foi a vez das NT abandonarem Copá.

Os passos seguintes foi lerem o livro de Spínola “Portugal e o Futuro”, prepararem a “estratégia revolucionária para aplicar no 26Abril” e … aguardar.

Quando George Orwell escreveu …“A maneira mais rápida de acabar com uma guerra é perdê-la”... não adivinhava ter conseguido tantos admiradores em Lisboa e … arredores.

Dedicado ao meu mui mui grande Comandante Moura Pinto e aos meus amigos Pedroso de Almeida, Bessa e Gil, todos eles já a voarem por outros céus.

AMM
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quarta-feira, 13 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14608: Blogues da nossa blogosfera (69): "De volta ao sul da Guiné", um artigo sobre Gadamael 1973, da autoria do Coronel Ref Manuel Ferreira da Silva, publicado na Revista "Mama Sume" da Associação de Comandos, reproduzido no Blogue da Tabanca do Centro

1. Com a devida vénia ao Coronel Ref Manuel Ferreira da Silva, autor do artigo; à Revista "Mama Sume" da Associação de Comandos, onde o artigo foi publicado e ao nosso camarada Miguel Pessoa, reproduzimos um Poste do passado dia 8 de Maio da Tabanca do Centro.


DE VOLTA AO SUL DA GUINÉ

No decorrer do nosso último convívio, no passado dia 27 de Março, tivemos o prazer de confraternizar com um novo camarigo, recém-chegado aos nossos encontros. Trata-se do Manuel Ferreira da Silva, Coronel Reformado.
Este camarada é um oficial de carreira vindo das escolas da Academia Militar, onde entrou em 1961. Como combatente comandou a 14.ª Companhia de Comandos em Angola e esteve na Guiné de Dezembro de 1971 a Novembro de 1973, nos Comandos Africanos em Bolama e em Gadamael.
Vem agora disponibilizar-nos o texto que se segue, artigo esse que foi publicado na revista da Associação de Comandos, "Mama Sume". Aqui divulgamos o referido texto, com a devida vénia ao autor e à revista da associação de Comandos, "Mama Sume", onde ele foi publicado.
A Tabanca do Centro







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Nota do editor

Último poste da série de 13 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13730: Blogues da nossa blogosfera (68): Quando dois desconhecidos se apaixonam (1): Início - Blogue Molianos, viajando no tempo (António Eduardo Ferreira)

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13945: (Ex)citações (252): Comentário ao artigo "Guiné, Guileje e o desnorte do reino" publicado em O Adamastor (4) (Coutinho e Lima)

1. Conclusão do comentário feito pelo nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª Reformado (ex-Cap Art.ª, CMDT da CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné entre 1968 e 1970 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73), ao artigo "Guiné, Guileje e o desnorte do reino" publicado no Blogue "O Adamastor":


2.ª Parte do Comentário ao artigo
"Guiné, Guileje e o desnorte do reino" (2)

Qualquer pessoa minimamente informada sobre o que se passava na altura, na região, podia prever, com grande probabilidade de acertar, que o PAIGC, logo que entrasse em Guileje, deslocaria todo o seu dispositivo para Gadamael, tanto mais que tinha ainda uma grande reserva, nomeadamente de munições da armas pesadas, que podia utilizar contra o novo objectivo.

Em minha opinião, impunha-se, ao novo Comandante do COP 5, em Gadamael - Sr. Coronel Durão, promover as seguintes acções:

1. Evacuar, o mais rapidamente possível, a população de Guileje para Cacine, porque em Gadamael só atrapalhava e não tinha nenhumas condições para ali permanecer.
2. Solicitar, de imediato, o reforço urgente de Gadamael, com tropa especial, para impedir, ou no mínimo, criar as maiores dificuldades ao In na fase de instalação do seu dispositivo. Logo que chegasse o reforço, evacuar, para Cacine os militares que estivessem em piores condições, não só para permitir a sua recuperação, como aliviar a sobrelotação da guarnição.
3. Melhorar as defesas do aquartelamento.
4. Patrulhar a zona de acção, com a intensidade possível.

Das 4 acções indicadas, tenho a certeza que a 4.ª foi efectuada.
Relativamente à 3.ª, admito que tenha havido alguma actividade.
As duas primeiras não foram promovidas.

Foi com as tropas no estado em que o Sr. Coronel Durão descreveu e nas situações física e psicológica indicadas pelo médico, que o Sr. Comandante do COP 5 preparou a guarnição para a acção, mais que provável, do PAIGC sobre Gadamael.

Nos diversos patrulhamentos efectuados no período de 22/31MAI, verificaram-se alguns contactos com o In que, compreensivelmente, se furtava ao contacto porque, estando numa fase de implantação do seu dispositivo de ataque, era essa a conduta mais apropriada aos seus objectivos.
Não foi este o entendimento do Sr. Coronel Durão, porque no dia 30 MAI, foi para Cufar (saiu de Gadamael, via fluvial) onde assumiu o Comando do CAOP 3 (Comando de Agrupamento n.º 3), ficando a comandar o COP 5, em Gadamael, o Sr. Capitão Comando, Ferreira da Silva, que tinha chegado nesse mesmo dia 30MAI.
Esta mudança de Comando deve ter sido proposta pelo Sr. Coronel Durão. Se este previsse o que iria acontecer, seguramente que não teria saído naquela data.
Penso que o Sr. Coronel Durão, durante o período em que comandou o COP 5, em Gadamael (22/30MAI73), não pediu nenhum reforço ao Comando-Chefe, pois se isso tivesse acontecido, tal reforço teria sido atribuído.

E pode perguntar-se qual a actuação do Comando Chefe e do seu Estado Maior, no período de 22/31MAI73.

Em 16MAI73, a CCAÇ 3566 (Empada), comunicou por mensagem à REF/INFO do Comando Chefe, “ a presença de carros de combate, na fronteira”, possivelmente para actuar sobre Gadamael, onde a configuração do terreno, mais aberta, era propícia aqueles veículos.

A própria REP/INFO, no seu PERINTREP (Relatório Periódico de Informações) n.º 21/73, (período de 20/27 MAI 73), referia:

“ …INIMIGO
…sendo provável que o IN continue a flagelar… ou GADAMAEL, com a Artilharia de KANDIAFARA, instalando bases de fogos na Rep. Guiné. De assinalar, ainda, os reconhecimentos efectuados ultimamente na área de GADAMAEL, constituindo possível indício de uma acção em força.”

Não obstante tudo isto, nomeadamente a última transcrição, o Comando-Chefe, que, seguramente, tinha muito mais informações do que o Comandante do COP 5, em Gadamael, como é óbvio, não tomou a iniciativa de enviar, para esta guarnição, o reforço que se impunha.

Em 31MAI73, pelas 14H00, o In iniciou as intensas flagelações a Gadamael; até às 18H00 do dia 02JUN73 caíram no aquartelamento cerca de 700 granadas, que provocaram às Nossas Tropas 5 Mortos e 14 Feridos (entre estes os 2 Capitães, Comandantes das Companhias de Gadamael e da que tinha vindo de Guileje), além de avultados danos materiais.

No início da acção do In, a maior parte dos militares e a população saíram para fora do quartel e espalharam-se pelas margens do rio a caminho de Cacine, sem que se conheça, verdadeiramente, o que provocou tal procedimento.

No dia 01JUN, aterrou um helicóptero, em Gadamael, transportando o Sr. Coronel Durão, o Sr. Capitão Manuel Monge e o Sr. Capitão Caetano; o primeiro, depois de inteirar da situação regressou a Cufar, tendo os outros ficado em Gadamael, tendo o Sr. Capitão Monge assumido o Comando do COP 5.

No dia 02JUN, deslocou-se a Gadamael, de helicóptero, o Sr. General Spínola, acompanhado do Sr. Coronel Durão. Pouco depois de aterrar, tiveram que se abrigar numa vala, em consequência do início de mais um flagelação do In. Aproveitando um pequeno interregno do bombardeamento, embarcaram rapidamente. Imediatamente após a descolagem, caiu uma granada, no preciso local onde estivera o helicóptero.

Foi entretanto accionado o reforço, tendo chegado a Gadamael no dia 03JUN a Companhia de Caçadores Paraquedistas 122 (CCP 122), vinda de Cufar (Sector do COP 4); com esta veio o Sr. Major Pára Mascarenhas Pessoa, que assumiu o Comando do COP 5.
No dia 05JUN voltou o Sr. Coronel Durão, reassumindo o Comando do COP 5, até ao dia seguinte quando voltou para Cufar.
No dia 06JUN, chegou a Gadamael a CCP 123, acompanhada do Sr. Ten. Cor. Araújo e Sá, que passou a comandar o COP 5; mais tarde, juntou-se-lhes a CCP 121, que até 31MAI estivera de reforço a Guidage.
Desta forma, o BCP 12 (Batalhão de Caçadores Paraquedistas 12), com as suas 3 Companhias, esteve de reforço a Gadamael.

Não quero deixar de referir que o COP 5, em Gadamael, no período de 15 dias (22MAI/06JUN73), teve 6 Comandantes:
22/30MAI - Sr. Cor. Durão
30MAI/03JUN - Sr. Capitão Ferreira da Silva
01/03JUN - Sr. Cor. Monge
03/05JUN - Sr. Major Pessoa
05/06JUN - Sr. Coronel Durão
A partir de 06JUN - Sr. Ten. Cor. Araújo e Sá

Foi, seguramente, um recorde absoluto, fruto da indecisão do Comando-Chefe sobre Gadamael.
Apesar do considerável e muito importante reforço do Batalhão de Caçadores Para-quedistas (BCP) 12, apresentou-se em Gadamael, em 10JUN, o Sr. Major Leal de Almeida, enviado de Bissau, com a missão de preparar a retirada de Gadamael, que acabou por não se efectuar.

É de toda a justiça realçar a brilhante actuação do BCP 12, em Gadamael, sem a qual, estou certo disso, a guarnição não tinha condições para resistir à acção em força do PAIGC.

Para concluir esta análise sobre Gadamael (porque não estive lá, socorri-me, principalmente, das informações dos Oficiais da Companhia que veio de Guileje, bem como de alguns documentos oficiais), a minha opinião é que o que ali aconteceu foi por NEGLIGÊNCIA e INCOMPETÊNCIA, quer do Sr. Coronel Durão, quer do Comando-Chefe e seu Estado-Maior, pois nenhuma destas entidades teve a capacidade de prever o que, após a retirada de Guileje, tinha grande probabilidade de se verificar, no que respeita à actuação do PAIGC.
Se Gadamael tivesse sido devidamente reforçado, logo a seguir à retirada de Guileje (22MAI 73), tenho a firme convicção que a actuação do In, a verificar-se, teria tido para as NT, consequências bem menos gravosas.

Comparando a actuação do Comando-Chefe e seu Estado-Maior em Guidage, Guileje e Gadamael, a minha conclusão é:

Guidage - COMPETENTE
Guileje - NEGLIGENTE E INCOMPETENTE
Gadamael - NEGLIGENTE e INCOMPETENTE (até ao dia 03JUN73) - REFORÇO ADEQUADO (após 03JUN73)

Na guerra dos 3 Gs, não há nenhuma dúvida que Guileje foi o “parente pobre”, porque não teve direito a qualquer reforço.

Na parte final deste longo comentário, vou indicar documentos que relatam o conhecimento que o Comando Chefe tinha das intenções do PAIGC relativamente a Guileje, bem como a análise da situação feita na Reunião de Comandos, realizada em 15MAI73, em Bissau.

O processo de que fui alvo e na sua folha 608, pode ler-se uma cópia do seguinte documento CONFIDENCIAL, com data de 27DEZ72 (anterior à criação do COP 5 - 08JAN73) :

“ EXTRACTO DO RELATÓRIO DE INTERROGATÓRIO N.º 108
271800DEC72
DE: MAMADU BALDÉ - SEXO: MASCULINO - IDADE: 25 ANOS
GRUPO ÉTNICO: FULA - NATURALIDADE: CACINE - ESTADO: SOLTEIRO
………………………………………………………………………………………………….


INTENÇÕES DO INIMIGO …………………………………………………………………………………………………..

2. NA FRONTEIRA: 
Refere que o In pretende fazer um ataque com bastante força a GUILEJE, porque pretende obter uma maior liberdade de movimentos logísticos e de pessoal no Corredor de GUILEJE. Para isso, ficaram em KANDIAFARA alguns elementos que vieram recentemente dum estágio de Art.ª na RÚSSIA, para fazerem reconhecimentos na área de GUILEJE e preparar essa acção.

MODOS DE ACTUAÇÃO

Os chefes sabem que nas flagelações aos aquartelamentos não têm obtido resultados compensadores e por isso resolveram mandar vários elementos ao estrangeiro receber uma instrução mais adiantada da Artilharia.
Esses elementos ficam a saber trabalhar com cartas topográficas, para poderem determinar com precisão as distâncias de tiro. 
Aprendem também a trabalhar com goniómetros-bússolas e outros aparelhos, assim como ficam a saber através da regra do milésimo converter as correcções métricas em direcção, em correcções angulares. 
Estes elementos ficarão normalmente em observadores avançados durante as flagelações, ligados por telefone às bases de fogos, dirigindo a acção e regulando o tiro.
………………………………………………………………………………………………………………………………”.

Este documento, por mais estranho que pareça, não me foi dado a conhecer, pela REP/INFO do Comando-Chefe, após a minha nomeação para Comandante do COP 5, como era sua obrigação.

Se tivesse tido conhecimento do seu conteúdo, teria apresentado a absoluta necessidade de reforçar Guileje, com o objectivo de impedir ou, no mínimo, dificultar ao máximo, as intenções do In, porquanto os efectivos de que o COP 5 dispunha, não eram, nem suficientes, nem adequados para o efeito.

Mesmo que não me fosse atribuído qualquer reforço, o conteúdo do documento esta-ria sempre nas minhas preocupações e tudo teria feito para contrariar a intenção do In, dentro das possibilidades de que dispunha.

E é lícito perguntar qual o tratamento que tal documento teve por parte da REP/INFO do Comando Chefe. Esta tinha possibilidades e meios para confirmar o que nele era relatado; nem no processo, nem em outra qualquer fonte há informação de que tal tenha sido feito. Se a REP/INFO não procedeu, neste caso, como lhe competia, fez mui-to mal. As intenções do In confirmaram-se plenamente, culminando com a acção em força iniciada em 18MAI73.

Outra pergunta pertinente é a seguinte:  
Como é que um documento tão comprometedor para o Comando Chefe (por, aparentemente, não lhe ter dado a devida atenção), foi parar ao processo?

Em 30JUN73 fiz um requerimento ao Senhor Comandante Chefe das Forças Armadas da Guiné, solicitando que me fossem fornecidas cópias de diversos documentos, que considerava importantes para a organização e fundamentação da minha defesa.

Este requerimento foi objecto do seguinte despacho:

“… Os documentos solicitados devem ser entregues ao oficial de polícia judiciária mi-litar para serem apensos ao auto de corpo de delito, devendo o Major Coutinho e Lima deles tomar conhecimento através daquele oficial…”

Para cumprimento deste despacho, foram entregues ao Sr. Oficial da Polícia Judiciária Militar (PJM), para serem juntos ao auto de corpo de delito 124 documentos, que foram apensos ao processo, constituindo as folhas 485 a 627, sendo que o documento referido é a folha 608.

Incluído num conjunto de 124, tal documento passou despercebido, não tendo mereci-do a atenção de ninguém, nomeadamente do Sr. Oficial da PJM; se este o tivesse lido, certamente não seria apenso ao processo, por motivos óbvios.

Acta da reunião de Comandos realizada, em Bissau, em 15MAI73

Em 15MAI73, teve lugar no Quartel General do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné, sob a presidência do Sr. General António de Spínola, uma reunião de Comandos, na qual participaram os Senhores Comandantes dos 3 Ramos das Forças Amadas - Exército, Marinha e Força Aérea, o Sr. Comandante Adjunto Operacional. o Sr. Chefe de Estado-Maior do Comando-Chefe e os Senhores Chefes das Repartições de Informações (REP/INFO) e de Operações (REP/OPER).

A acta dessa importante reunião, com 63 páginas encontra-se no Arquivo Histórico Militar e já foi difundida no nosso blogue.

Dessa acta, transcrevo, a seguir, algumas declarações

O Sr. Comandante Adjunto Operacional - Sr. Brigadeiro Leitão Marques, afirmou:

"..............
No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o IN está a preparar as necessárias condições de destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de acesso (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica - isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.
Quanto às vantagens para a manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa.
..............
Assisti ao pressionamento psicológico ao povo americano, por causa dos seus prisioneiros no Vietnam do Norte durante quatro anos e senti em toda a sua profundidade o efeito desmobilizador desse pressionamento, o qual, em larga medida, juntamente com o elemento económico, levou à agitação interna das massas e à capitulação, apesar de todo o poderio militar americano.
O que acontecerá se tivermos de enfrentar situação semelhante?
................."

Nota - Os sublinhados são meus.

Da intervenção do Sr. Chefe da REP/INFO ( Sr. Ten Cor. de Inf.ª Artur Baptista Beirão), transcreve-se:

"...........
No imediato, julga-se que o IN:
..........
intente uma acção tipo convencional com carros de combate contra GADAMAEL. GUILEJE e/ou BURUNTUMA, tirando partido da vulnerabilidade destes pontos a este tipo de acções e visando o aniquilamento ou captura das guarnições;
..........
Num futuro próximo, prevê-se que o IN, partindo do clima de denso agravamento que a sua actividade imediata proporcionará:
_ tente a eliminação sistemática das guarnições mais expostas sobre a fronteira, em acções isoladas de tipo convencional;…
...........
Resta referir, a finalizar, ...não permitem, como desejaria, uma melhor adjectivação das zonas preferenciais de esforço do IN...
...e apenas pode concluir-se por uma situação na qual todo o TO, sem qualquer exclusão, acaba por constituir uma vasta área de preocupação, na qual dificilmente se podem, no momento, visualizar priorizações.
..........."

Da intervenção do Sr. Chefe da REP/OPER (Sr.TCor. do CEM Mário Martins Pinto de Almeida), transcreve-se:

"............. 
Se não forem concedidos os reforços solicitados as armas que permitam às NF enfrentar o IN actual
.........
julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais e que permitam, à luz de outras concepções de manobra, desencadear mais tarde acções ofensivas de grande envergadura para recuperação das posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número de pontos de apoio a sustentar a todo o custo. Mas neste caso, as missões actualmente dadas às NF, em termos de protecção das populações e apoio ao esforço principal da manobra de contra- subversão centrado na manobra sócio-económica, teriam de ser revistas.
...........
A ameaça de utilização, pelo IN, de carros de combate, em golpes de mão sobre as guarnições de fronteira, aconselha a, desde já, dotar, pelo menos as guarnições indicadas pela Repartição de Informações como mais susceptíveis de ataques deste tipo, de meios que permitam a sua defesa anti-carro. Com o armamento que possuem e com o pessoal treinado para o tipo de guerra que temos enfrentado até ao presente, as guarnições apresentam-se impotentes e inaptas para fazer face à nova ameaça."

Lembra-se que, na data (15MAI73), em que se realizou a Reunião de Comandos, já estava em curso, desde 08MAI, o ataque do PAIGC a GUIDAGE: É bastante estranho que, na acta da referida reunião não apareça nenhuma alusão a tal acontecimento.

As transcrições atrás indicadas, merecem-me os comentários seguintes.

Acerca da intervenção do Sr. Brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional que, em 22MAI73, foi nomeado, pelo Sr. General Comandante-Chefe para proceder a auto de corpo de delito contra mim. Se eu tivesse conhecimento desta acta de Reunião de Comandos, quando fui por ele ouvido, em 31MAI73, perante a última pergunta:

"Quando decidiu retirar tinha ponderado os altos prejuízos para a Nação resultantes desse procedimento?

Certamente, ter-lhe-ia respondido com a pergunta seguinte:

Pensou bem na hipocrisia desta pergunta, face às suas declarações na Reunião de Comandos de 15MAI73?

Acerca das declarações do Sr. TCor. de Inf.ª Artur Baptista Beirão, Chefe da Repartição de Informações, teria formulado as seguintes perguntas:

- Quais as diligências que mandou efectuar, relativamente ao Relatório de Interrogatório, feito em 27DEZ72, ao nativo Mário Mamadu Baldé, tendo em vista a verosimilhança e fiabilidade desse relatório e a que conclusões chegou?

- Porque não me foi dado conhecimento desse relatório, depois de eu ter sido nomeado, em 08JAN73, Comandante do COP 5?

- Porque julgava que o IN, intentasse, no imediato, "uma acção tipo convencional, com carros de combate, contra GADAMAEL, GUILEJE,...", quando esta comunicação da Companhia de EMPADA, em 9 MAI 73, foi rectificada por outra mensagem da mesma Companhia?

- Porque não foi enviada ao COP 5, em 15 MAI 73, a mensagem 586/C da Companhia de BEDANDA, informando a chegada em 10 MAI, de 4 grupos vindos da REP. GUINÉ e a chegada a KANDIAFARA de cerca de 50 cubanos.

- As mensagens das Companhias de EMPADA e BEDANDA, associadas a outras eventuais informações que a REP/INFO tinha, não eram suficientes para prever, com grande probabilidade um ataque do IN a GUILEJE?

Acerca das declarações do Sr. Ten. Cor. do CEM Mário Martins Pinto de Almeida Chefe da Repartição de Operações, teria feito as seguintes perguntas:

- Nas suas declarações na Reunião de Comandos de 15MAI73, quando referiu que era necessário reforçar guarnições... que se considerassem essenciais, estava a pensar na guarnição de GUILEJE? Se a resposta for SIM, que propostas fez para que esta guarnição fosse reforçada?

- Tendo afirmado que era necessário dotar com meios de defesa anti-carro, as guarnições que a REP/INFO considerasse mais susceptíveis de ataques desse tipo e tendo esta Repartição indicado GUILEJE como uma das mais ameaçadas, no imediato, que propostas fez para que GUILEJE fosse dotada de meios de defesa anti-carro.

Da análise das transcrições anteriores da Acta da Reunião de Comandos de 15MAI73 dificilmente se pode entender que não tenha saído dessa reunião a necessidade urgente de reforçar Guileje.

Infelizmente não se conhece como o Sr. Chefe da REP/OPER (o primeiro responsável pela condução das operações, por parte das NT), pretendia resolver a situação de Guileje, após o início da acção In, em 18MAI73, porque tal não lhe foi perguntado pelo Sr. Brigadeiro Leitão Marques, no âmbito do processo, nem aquele teve a iniciativa de abordar este assunto, vá lá saber-se porquê.

Conhece-se, no entanto, como o Sr. General Spínola, via o problema. Para isso, transcrevo parte do depoimento do Sr. Coronel Para Rafael Durão, no processo:

“… No dia 21 recebi directamente de Sua Excelência o General Comandante-Chefe, ordem para manter a todo o custo o destacamento de GUILEJE, naquele local, para o que devia verificar as necessidades em meios para lá colocar os abastecimentos de toda a ordem.”

É de salientar a maneira redutora como o Sr. Comandante-Chefe analisava a situação, limitando-se a referir o problema dos abastecimentos. Muito mais importante era a neutralização da bases de fogos do In, para aliviar a pressão sobre Guileje.
A manutenção “a todo o custo”, é a missão que implica a resistência até ao último homem.
Numa altura em que nem o próprio Sr. General Spínola acreditava na solução militar para a guerra, é caso para nos interrogarmos se a Missão que atribuiu ao Sr. Coronel Durão, nas circunstâncias concretas vividas em Guileje, era aceitável e, se pelo contrário, não era um sacrifício injustificável a que ficavam sujeitas a guarnição e a população de Guileje.

Para terminar a análise ao artigo do Sr. Ten. Cor. Pil. Av. Ref. Brandão Ferreira, devo dizer que em tempos, tivemos o ARNALDO MATOS, o EDUCADOR DO POVO.
Qualquer dia vamos ter BRANDÃO FERREIRA, o REGENERADOR DO REINO. Para começar e por uma questão de coerência, para responder a uma “duvida existencial”, deve procurar regenerar os programas de ensino “dos cadetes e comandantes das actuais Forças Nacionais destacadas".

Com os meus cumprimentos
Alexandre da Costa Coutinho e Lima
(Cor. de Artª. Ref.- Comte do COP 5, em Guileje)
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de Novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13942: (Ex)citações (251): Comentário ao artigo "Guiné, Guileje e o desnorte do reino" publicado em O Adamastor (3) (Coutinho e Lima)