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terça-feira, 4 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P18980: Blogpoesia (583): "Eu amo", poema de Júlio Corredeira, Piloto Aviador Reformado (Mário Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 31 de Agosto de 2018:

Caro Carlos.
Com votos de que encontres bem, daqui te envio para publicação em tempo oportuno, mais um poema do meu bom amigo Piloto/Aviador reformado Júlio Corredeira.
Um hino ao amor e à vida que merece ser lido por todos que apreciam a beleza da palavra escrita com todo o seu esplendor e significado.

Grande abraço,
Mário Santos

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Eu amo

Eu amo a Natureza e tudo
o que ela encerra:
O mar, os rios, o límpido ribeiro,
As campinas de searas que enchem o celeiro
Ou a neve a cair nos píncaros da serra.

Amo as aves do campo que bicam a terra
Ou a terna andorinha que apanha o argueiro,
E deleitam-me as flores de aromático cheiro
E os animais da selva cuja voz me aterra.

Porém amo bem mais o sorrir da criança
Tão cheio de ternura, pleno de esperança,
Que, ás vezes, me parece uma vera miragem.

E amo todo o ser, um reflexo do amor
Que manifesta em si o dedo criador,
Mas, acima de todos, o Homem, sua imagem.

jc
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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18972: Blogpoesia (582): "Brilhantina espanhola", "Magia das manhãs" e "O regato da serra", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18922: FAP (111): A Força Aérea Portuguesa e os incendios florestais (José Nico, TGen PilAv Ref / Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

Reabastecimento do C-130 H da FAP
Foto: João Girão/Global Imagens/Arquivo, com a devida vénia


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Hoje, em que os fogos Florestais estão permanentemente na ordem do dia, ocupando noticiários televisivos e acesas discussões e debates em regime de exclusividade, penso que não será desajustado esclarecer algumas mentes sobre o tão propalado uso do Avião C-130 H da nossa Força Aérea no combate a incêndios florestais.

Esclareço que este artigo foi elaborado pelo Gen. Pil./Av. José Nico que foi também Comandante destas aeronaves e nos diz o seguinte:


Já não estava a voar os C-130H quando a operação MAFFs teve início. No entanto fui dos primeiros a ter contacto com o sistema porque em 1980 ou 1981 fizemos um "squadron exchange" com os C-130 italianos que estavam baseados em Pisa. 
Levava a incumbência de pedir uma demonstração do funcionamento do MAFFS que os italianos já possuíam. Não foram capazes de fazer a demonstração mas mostraram o equipamento.

Deixei a operação C-130H em 1982, no entanto a minha opinião sobre a utilização dos C-130 no CI é basicamente a seguinte:
 

1. Num combate a um incêndio com meios aéreos é muito importante a quantidade de água que a aeronave consegue transportar mas ainda mais importante é a frequência da rotação. É necessário que o tempo entre descargas seja o mais curto possível. 
No caso do C-130, porque só tínhamos uma aeronave em alerta, o intervalo entre descargas era muito grande e, grosso modo, devia ser cerca de uma hora. Era preciso regressar à Base, aterrar, rolar, estacionar, parar motores, reabastecer, pôr em marcha, rolar, descolar, voar outra vez para o incêndio e fazer nova descarga. Num intervalo de tempo tão grande qualquer incêndio retomava facilmente a sua carga térmica e por isso penso que o combate se não era ineficaz, era, pelo menos muito pouco eficaz.

2. A calda retardante, que se chamava PHOSCHECK se bem me recordo, destinava-se a fazer baixar a temperatura do fogo e permitir a aproximação do pessoal que estava em terra, ou seja, pelos bombeiros. Isto pressupunha que os lançamentos da calda se fariam depois de os bombeiros terem sido posicionados nas proximidades. Ora isto raramente acontecia. O que acontecia é que os fogos se desenvolviam em zonas com relevo e sem caminhos que permitissem o acesso ao incêndio. 
Normalmente as matas iam ardendo mas os bombeiros estavam a quilómetros da linha de fogo e não conseguiam lá chegar. Chamavam então o C-130 que fazia um lançamento mas como os bombeiros não estavam lá perto para combater o fogo, este reganhava intensidade. Por sua vez o C-130 demorava muito tempo para fazer a segunda descarga e assim por diante, o que não resultava.

3. Resumindo, que eu saiba só os anfíbios CANADAIR, porque foram desenhados de propósito para combater fogos é que oferecem a resposta mais eficaz. Fazem uma descarga e vão reabastecer no lago ou albufeira mais próximos e estão de regresso ao fogo no menor espaço de tempo possível. 
Ao pé deles o C-130 com o MAFFS não vale nada.

Sobre a conversa que tem aparecido nos media quanto à utilização dos PUMA que foram abatidos, ou sobre a adaptação dos futuros KC-390, é tudo conversa de treta. Ninguém sabe do que está a falar, incluindo alguns dos meus camaradas.

José Nico

C-130 H - Carregamento do kit MAFF's
Foto: Com a devida vénia ao Blogue O Adamastor

C-130 H no combate a incêndio
Foto: Com a devida vénia a Associação Bombeiros para Sempre

C-130 H a usar Calda Retardante
Foto: Com a devida vénia ao Blogue O Adamastor

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Abraço
Mário Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de julho de 2018 > Guiné 61/74 - P18813: FAP (110): FIAT G-91, um caça entrado ao serviço de Portugal, na guerra do ultramar, em 1965 (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18902: Vídeos de guerra (16): O FIAT G-91 na Força Aérea Portuguesa, um filme da Defesa Nacional (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista de MMA da BA 12)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 1 de Agosto de 2018:

Caro amigo e camarada Carlos Vinhal
Desejando que saúde e qualidade de vida te acompanhem sempre a ti e a todos os teus, envio-te este vídeo que considero de grande interesse e relevância, não só para a Força Aérea Portuguesa, mas para todos os combatentes da nossa guerra em África.
Retratam e contam episódios de guerra não só do Fiat G-91, mas também de todas as outras aeronaves que apoiaram as nossas Forças Terrestres e Navais em todos os teatros de actividade em que estivemos envolvidos entre 1961 e 1974, na Guiné, Moçambique e Angola.
Particularmente singular o facto de que numa das sequências do vídeo, em 1968/1969, me revejo em acção na Linha da Frente da BA12 - Bissalanca em apoio de missão ao saudoso Capitão Pil./Av Amílcar Barbosa de saída para uma missão de bombardeamento e posteriormente após a aterragem, após cumprimento da missão.

A todos, combatentes de Terra, Mar e Ar, particularmente aos camaradas da Guiné, o meu grande abraço de amizade.

Abraço,
Mário Santos



O Fiat G-91 na Força Aérea Portuguesa
Com a devida vénia a Defesa Nacional
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18342: Vídeos de guerra (15): "Guerre en Guinée" (ORTF, 1969, 13' 50'): o governo português suportou o custo das viagens e estadia de todos os elementos da equipa do programa "Point Contrepoint", da televisão pública francesa, durante cerca de um mês... Eu assisti à montagem do filme e trouxe, de Paris, cópia para o Marcelo Caetano... Quando viu a cena da emboscada, disse-me: "Temos que acabar com esta guerra" (Manuel Domingues)

quinta-feira, 5 de julho de 2018

Guiné 61/74 - P18813: FAP (110): FIAT G-91, um caça entrado ao serviço de Portugal, na guerra do ultramar, em 1965 (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

Bissau, 1969 - G-91 R4, com bombas


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Caro amigo Carlos

Como habitualmente, agradeço-te a publicação deste poste que considero de grande relevância para os camaradas que passaram pela Guiné. Embora de conteúdo técnico será de interesse para os camaradas e amigos terem mais e melhor percepção do protagonismo desta aeronave e de todo o pessoal que com ela lidou, Aviadores e Técnicos de manutenção.

Este é um artigo destinado a todos os que se interessam pela Aviação Militar, e muito em especial pelos Aviões de Caça antigos e que equiparam a nossa Força Aérea.
Descreve ao pormenor não só meras tecnicidades, mas também as razões porque este caça em particular foi criado, a intenção de o colocar ao serviço da NATO, e a razão por que Portugal “ganhou” a facilidade de o poder utilizar com grande êxito na guerra do Ultramar ou dita colonial.

Os detalhes técnicos do comportamento da aeronave em voo é da autoria do meu amigo e meu contemporâneo na Guiné Gen Pil/Av José Nico.

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Começaria então por dizer que o G-91 foi construído quando a guerra fria era muito quente e a possibilidade de um ataque das forças soviéticas estava sempre presente. Por isso a NATO quis equipar as forças aéreas dos aliados europeus com caça ligeiro, robusto e fiável, capaz de operar a partir de pistas improvisadas e que, além disso, introduzisse uma certa uniformidade visto que os meios que então equipavam as forças aéreas europeias primavam pela diversidade em todos os campos, desde a concepção passando pela operação e pela logística.

O G-91 nasce assim para cumprir requisitos NATO e é escolhido como o melhor entre outros projectos. Podemos assim afirmar que em 1960, para os requisitos que devia cumprir, era a melhor coisa que existia. O avião começou a ser fabricado para a RFA, Itália, Grécia e Turquia e só não teve mais compradores porque o projecto foi visto pela industria aeronáutica americana como uma grave ameaça à sua hegemonia. Foi por isso que os gregos e os turcos desistem do G-91 e aceitam em substituição os F-5 oferecidos pelos americanos. Foi a nossa sorte. E a sorte só não foi maior porque o modelo para os gregos e turcos tinha 4 metralhadoras 12,7 em vez dos dois DEFA 30mm. Embora não tenha provas documentais tudo leva crer que a NATO, dado o estado de tensão latente, entre os dois países, resolveu diminuir a letalidade dos aviões não fossem eles pegarem-se e acabarem a disparar com os DEFA uns contra os outros.

Quando tivemos de arranjar qualquer coisa para África, em 1965, os aviões que tinham sido encomendados por gregos e turcos estavam disponíveis e foi o melhor que conseguimos. Tinham apenas cinco anos e eram aviões perfeitamente actualizados para as tarefas que deviam cumprir.

 BA 12, 1967 - Linha da Frente - Esquadra de Tigres

Em operação, provou ser robusto, fiável e de simples manutenção. Tinha a velocidade que devia ter e não devia, nem era necessário ter mais. Era para voar baixo e tudo o que podia ser atacado tinha que ser adquirido visualmente. Ainda por cima o inimigo raramente andava em campo aberto e o seu ambiente preferido era a cobertura da vegetação. Portanto quem pensa que a velocidade era muito útil engana-se. No nosso caso era útil quando havia fogo antiaéreo mas nas outras situações não.

Estava equipado com um sistema de reconhecimento fotográfico do melhor que havia naquela época, associado a um gravador de voz. Aqui o que falhava não era o avião. É que para obter informações de forma sistemática por reconhecimento fotográfico são necessários muitos aviões, horas de voo e muita gente no chão a explorar os filmes (pessoal de informações especializado). Não tínhamos nada disso e por isso o reconhecimento fotográfico foi sempre uma capacidade limitada.

Estava equipado com um sistema de navegação autónomo. Naquele tempo não havia, nem sistemas de inércia, nem de GPS. Todavia o G-91 estava equipado com um radar Doppler associado a um sistema PHI, o que era um grande salto em frente neste tipo de aviões. Na prática não nos serviu de nada porque, como era um sistema de primeira geração, era muito pouco preciso. Com ele não se conseguiu chegar a nenhum cruzamento de trilhos ou outra coisa qualquer de natureza pontual. A navegação tinha que ser feita confrontando o que se estava a ver no terreno com as cartas geográficas que utilizávamos.

 Cockpit do Fiat G-91

Tinha uma cadeira de ejecção do melhor para a época. Foi a primeira em que o piloto se podia ejectar ainda no chão desde que que o avião tivesse 90 KIAS (knots indicated airspeed) de velocidade.

Resumindo, quando o recebemos o G-91 era um avião moderno e eficaz para as tarefas para que foi construído. Com o passar do tempo e o evoluir da indústria aeronáutica começaram a aparecer outros aviões melhor equipados, como é natural.

Ao fazer a análise do G-91 não podemos pôr de lado os requisitos a que devia obedecer e a tecnologia disponível. Não é razoável hoje em dia avaliarmos um avião de transporte construído nos anos cinquenta como o DC-6 com o Airbus 330 Neo.

Abraço,
Mário Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18767: FAP (109): Testemunho sobre a minha ejecção na Guiné em 04OUT1973 (Alberto Roxo Cruz / Mário Santos)

sexta-feira, 29 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18791: Blogpoesia (573): Mulher (ou lembranças da minha terra), de Júlio Corredeira (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 17 de Junho de 2018:

Caro amigo Carlos.
Desta vez, celebrando a vida na poesia, envio-te um poema (com foto a condizer com o tema da palavra) do meu camarada e amigo ex-piloto aviador Júlio Corredeira. que cumpriu comissão em terras de Angola no AB4 em Henrique de Carvalho.
Grande amigo e poeta sensível na palavra.
Esperemos que gostem...

Abração
Mário Santos

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MULHER (ou lembranças da minha terra)

São invernos frios, sem parente ou amigo
São giestas por companhia...
No escano velho, calor do seu abrigo.

É o peso de uma vida
O resto de um viver
É uma lágrima caída
No olhar do seu sofrer

Votada a tetro e frio esquecimento
E sem qualquer auxílio para o seu mal...
Vai morrendo abraçada ao sofrimento.

JC
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18774: Blogpoesia (572): "Festa das ventanias", "Lagoa de Melides" e "Pérolas na vidraça", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

terça-feira, 26 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18780: Historiografia da presença portuguesa em África (120): O primeiro voo, ligando Lisboa a Bolama, em 1925, e a primeira tentativa de usar a aviação com fins militares naquele território (Armando Tavares da Silva) (Parte I)





Lisboa > 1955 > O caça F-84, a ser descarregado, de um navio da armada dos EUA, no cais do Poço do Bispo.

Fotos ( e legenda): © Armando Tavares da Silva (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem, com data de 4 do corrente, :do nosso amigo e grã-tabanqueiro Armando Tavares da Silva, historiador, autor de “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar, 1878-1926”:

Caro Luís Graça,

A publicação do Post P18647 de 18.5.2018 relativo ao voo dos caças F-86 para a Guiné – Operação ATLAS (*) – fêz-me rever o que havia escrito sobre os primeiras desejos e tentativas de utilizar na Guiné a aviação com fins militares.

Como naquele Post se mencionam os caças F-84 (e que foram deslocados para Luanda com o início da guerra em Angola), ao texto que segue [sobre o raide Lisboa-Bolama em 1925]  junto algumas imagens por mim tiradas e que mostram os F-84 a serem descarregados de um navio da armada dos EUA no cais do Poço do Bispo, aquando da sua chegada a Lisboa em 1955. Pode ver-se que ainda mantinham o distintivo da USAF, e a respectiva numeração.

Anexo ainda algumas imagens tiradas de um texto da Net sobre o raide Lisboa-Bolama, o primeiro voo para a Guiné (1925), e que em parte utilizei.

Abraço,
Armando Tavares da Silva

(Continua)
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sexta-feira, 22 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18767: FAP (109): Testemunho sobre a minha ejecção na Guiné em 04OUT1973 (Alberto Roxo Cruz / Mário Santos)

FIAT G-91 R4 em voo


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Caro camarada Carlos.
Envio-te para publicação no blogue, este artigo descrito na primeira pessoa pelo meu amigo ex-Capitão Pil./Av. Alberto Roxo Cruz, do qual obtive prévia autorização para publicar.

Este é mais um dramático evento ocorrido nos dias da GUINÉ pelo Capitão Pil./Av. Alberto Roxo Cruz no decorrer da sua segunda comissão em Bissalanca em 04 Outubro de 1973.
Meu contemporâneo aquando da primeira estadia na BA12 em 1969 onde as acções se passaram dentro da normalidade de guerra, emparceirou depois entre 1972/74 com o nosso camarada tabanqueiro TGen. António Martins Matos que lhe deu cobertura após a ejecção do Fiat G-91 R4 n.° 5409 ocorrida em Outubro de 73.

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Este foi um acidente vivido já nos dias do Strela pelo Cap.Piloto/Aviador Alberto Roxo Cruz que se ejectou no Fiat G-91 5409 e felizmente sobreviveu para hoje nos poder contar como foi. A descrição contém opiniões e relata factos que não poderão obviamente ser comprovados, pela distancia temporal e também porque muita documentação relativa ao acidente foi destruída. 

Mário Santos

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Testemunho sobre a minha ejecção na Guiné em 04OUT1973

Alberto Cruz

Este acidente ocorreu a cerca de 50km Nordeste de Bissau, na zona do Tancroal.

Eu fazia parte, como asa, de uma formação de dois Fiat G91 R4.

Estávamos a desenvolver uma acção de bombardeamento, seguida de metralhamento, numa área onde tinha sido referenciada, por informações, a existência de um Grupo de atiradores de Míssil Strela. Creio que posteriormente estava prevista uma acção de pára-quedistas ou outras forças terrestres transportadas por helicópteros Alouette III.

Após termos executado dois passes de bombardeamento com bombas de 50 e 200 kg, iniciamos, um de cada vez, um passe de metralhamento de ângulos grandes (MAG).

Quando iniciei o disparo das metralhadoras, senti um grande estrondo no avião e a perda total de controlo do mesmo, assim como uma enorme quantidade de luzes acesas e a piscar.
Não era possível identificar qual a origem da "avaria", pois as vibrações eram tão violentas que me faziam bater com o capacete na "canopy" do avião. Ainda tentei desligar os "Yaw dampers", mas logo vi que não era essa a origem do problema.

Como me encontrava em ângulo de picada de 60º, decidi ejectar-me, pois entretanto as vibrações passaram à sensação de espiral descontrolada e tão violenta que perdi a capacidade de fixar a visão. Só via umas manchas verdes e cinzentas, que deduzo serem o solo e o céu que se apresentava nublado com alto-estratos.

A ejecção deve ter acontecido com cerca de 450 nós, que estava perto do limite do cabo de disparo do pára-quedas de abertura (470 nós).
Ainda arranjei tempo para decidir ejectar-me com a alavanca superior, por permitir melhor posição e menos danos da coluna.

Após esse accionamento, só me recordo de uma explosão muito forte, e perdi os sentidos. No entanto, fiquei num estado de semiconsciência, e que permiti interrogar-me como isto me tinha acontecido; “vi” a minha vida a correr em “flashes” rapidíssimos.

Segundo os dados da cadeira a ejecção, até à abertura do pára-quedas decorre um período de 1 a 2 segundos. Eu tive a sensação de terem passado mais de 5 minutos…

Acordei muito lentamente, e um sentido de cada vez, ainda com o pára-quedas em desaceleração. O primeiro sentido a recuperar foi a visão com a explosão do avião, bastante perto. Nessa altura ainda não ouvia nem sentia.

 BA 12, 1973 - Cap Alberto Cruz

De repente, começo a ouvir um silvo que provinha do pára-quedas. Seguidamente, sinto uma corrente de ar enorme na cabeça e vejo meu corpo pendurado, mas sem me conseguir mexer.

De seguida, reparo que tenho sangue a cair-me nas luvas e nos braços.
Mais tarde é que vi que o sangue provinha de uma perfuração do lábio inferior por embate do meu estimado Breitling, que ainda mantenho.
Aí, apercebi-me que tinha perdido o capacete, que estava com o francalete bem justo, assim como a máscara e a viseira colocadas. Quem quiser, que experimente retirar o capacete da cabeça nestas circunstâncias. Nós tentamos essa experiência e ninguém conseguiu!

A cadeira naquela época ainda era a primeira versão da Martin Baker, que tinha uma aceleração de cerca de 39/45 G's no disparo da cadeira. Logo aí sofri a primeira compressão da coluna. Seguidamente, a velocidade a que o pára-quedas abriu foi tal, que senti um grande esticão.
Após um grande formigueiro em todo o corpo, recuperei os movimentos. O tempo de queda foi de cerca de 15 a 20 segundos, mas naquelas condições é difícil medir o tempo. No entanto, ainda me permitiu desfrutar do maravilhoso silêncio do voo de pára-quedas. A chegada ao solo não foi directa; fiquei pendurado numa árvore a cerca de 5 metros do solo. Fui deixando o pára-quedas deslizar até que a cerca de 2 metros ele se desprendeu e caí desamparado no solo; mais uma compressão na coluna.

As dores lombares e num joelho, bem com a perda de visão de um olho, foram as sequelas de que logo me apercebi. Mais tarde, confirmou-se que tinha ficado mais baixo 2cm e que tinha fractura ligeira da vértebra D5, lesão no joelho com derrame do líquido sinovial e lesão traumática no olho esquerdo durante a ejecção, possivelmente pelo “arrancamento” do capacete.

Ainda me consegui deslocar para uma clareira, com a intenção de me sinalizar. No entanto, dos “very-light” que levava só restaram os que me tinham sido entregues pelo Cap. Pedroso de Almeida, quando fez o “desquite”. Bem-haja!

Quando comecei a pensar, apercebi-me que tinha o fato de voo do meu amigo Cap. Pinto Ferreira, ainda com o nome dele na “etiqueta” de identificação. A primeira coisa que fiz, foi enterra-la e disfarçar esse local com vegetação.
Começo a olhar para o ar, e vejo o meu chefe de parelha, o então Cor. Tir. Lemos Ferreira, Comandante da Zona Aérea Cabo Verde e Guiné a voar em círculos.
Pensei que me tivesse visto a aterrar, mas por eu já estar tão baixo, vim mais tarde a saber que apenas viu a explosão do avião, e por um segundo, o pára-quedas ser “engolido” pelas árvores.

Seguidamente, começo a ouvir vozes e alguns assobios, o que em África, devido ao silêncio que todos conhecem, tanto podiam estar perto como longe.
Imaginei que poderia ser “recolhido” pela população ou pelos guerrilheiros que tínhamos acabado de bombardear. Não iam de certeza levar-me um whisky com Perrier…

Comecei a criar um espaço onde poderia colocar o pára-quedas, para assinalar a minha posição, mas comecei a ter dores violentas nas costas; mesmo rolando no solo, de maneira a deitar o capim que tinha mais de dois metros de altura, não consegui espaço para estender o pára-quedas.
Entretanto, comecei a sair do estado de choque e comecei a “engendrar” a conversa que teria se fosse capturado. Estabeleci um plano, e fiquei a aguardar que me fossem recuperar. Ainda notei que o meu chefe de formação abandonou o local (deve ter aterrado “seco”), e apareceu outro Fiat a sobrevoar a zona, que mais tarde vim a saber ter sido o Ten. A. Matos. Pensei cá para mim: estou safo, estava perto da Base e ainda não eram 15:00 horas.

Passaram cerca de 40 minutos, que a mim me pareceram horas, e começo a ouvir o “santo” ruído de um Heli e em “stereo”; eram dois, mas um, eu nunca o vi.
Levantei-me com muito custo e preparei os “flares” para me sinalizar.
A clareira onde me encontrava estava rodeada de árvores, e apenas num pequeno ângulo, é que tinha visão horizontal.

Como os Helis não tinham informação precisa da minha posição andaram ainda uns tempos à procura, e eu que só tinha dois “flares”, resolvi accionar um, quando ouvi um Heli mais perto.
Passado um tempo, que não consigo calcular, vi pela primeira vez um Heli; quando ele passou pela abertura das árvores, disparei o “flare” que me restava mesmo apontando ao Heli, pois era a maneira mais certa de não o atingir…

Fui visto! O piloto do Heli tenta uma aproximação já na clareira, mas o capim, com 2 metros, teima em não baixar com o vórtice do rotor principal. Nesta altura, em que o piloto tenta baixar o máximo possível, eu noto que o rotor de cauda se aproxima perigosamente de uns troncos secos e grossos que emergiam do capim já “abatido”.

Entretanto, eu que já estava em pé novamente, mas com muita dificuldade, reparo que o Heli é um Heli-canhão. E agora? O Heli-canhão descolou de Bissalanca, voou, no máximo meia hora, deve estar com muito peso e eu embora magro, vou provocar “overload”. Ainda pensei que íamos lá ficar à espera de um Heli sem canhão.
Mais tarde, fiquei a saber que tinham descolado dois heli-canhão para me dar protecção e me localizar. Como a zona era muito problemática, tomaram a decisão de me recuperar mesmo com o canhão.

Como o Heli não conseguia aterrar, aproximou-se de mim e fui içado à mão, ficando com o estribo de entrada entre as pernas e agarrado à estrutura vertical onde fecham as portas.
Descolámos, mas passado pouco tempo, começo a escorregar, prevendo que me ia estatelar no solo. O mecânico, atirador do canhão, ao ver a “cena”, largou tudo e enquanto me agarrava pelo pescoço, ia gritando para o piloto aterrar o mais depressa possível, que eu estava a cair. O piloto quase que fez um “quick stop” e eu aterrei primeiro do que o Heli; saltei para dentro dele, batendo com a cabeça não sei onde, e tombei desmaiado sobre a caixa das munições do canhão.

Chegamos a Bissalanca, e eu, já acordado, noto que alguém estava à minha espera com um copo numa bandeja. Como sabiam que eu gostava, na altura, de me refrescar com água Perrier um dedo de whisky, tentei sair em pé da viatura que me transportou do Heli para o Grupo Operacional, armado em herói; claro está que se não me agarrassem rapidamente, lá ia mais outra queda.
Bebi o copo de um golo.

Já na enfermaria da Base, começo a sentir a cabeça à roda e um enjoo terrível. Pensei que me estava a acontecer alguma coisa pós-choque, mas não era mais do que a “doença” provocada pelo “refresco” que os malandros dos meus amigos adulteraram. O “refresco” da Perrier com um dedo de whisky era afinal whisky com um dedo de Perrier. Ainda hoje não sei quem foi o artista.

Fui para o Hospital Militar, regressei à enfermaria, e fui evacuado para a “Metrópole” no primeiro avião militar.

Regressei à Guiné nos primeiros dias de Fevereiro de 1974, e por coincidência (?), a primeira missão operacional teve lugar no mesmo local onde me tinha ejectado. Ao fazer o passe de metralhadoras, o dedo parecia que não queria accionar o gatilho; respeitei esta hesitação do dedo e não premi o gatilho.
Na missão seguinte, tudo se normalizou, após uma consciente reflexão sobre a lei das probabilidades…
A minha ejecção já foi na segunda comissão.

Eu era um dos dois únicos pilotos que tinham sido nomeados para uma segunda comissão, em Fiat, para a Guiné; o outro foi o então Ten. Cor. Vasquez, como Comandante do Grupo Operacional.
Apenas alguns dias após o 25 de Abril, convivemos com os guerrilheiros que combatíamos em 1969 nas antiaéreas, onde eu fui protagonista e tendo feito parte das missões mais complicadas, que incluíram uma tentativa (gorada) de, com a acção dos pára-quedistas, os “apanharmos à mão”.
O ataque às antiaéreas na zona do Quitafine a Sudoeste de Bissau, perto do rio Cacine e a fronteira com a Guiné-Conakri, eram missões que tínhamos que fazer para que os guerrilheiros não nos conquistassem esse território, pois as forças terrestres já lá não tinham acesso…

Foram conversas interessantíssimas, e pelas quais vim a saber que eles para não serem afastados pelas bombas que rebentavam dentro do "caracol" (local onde eram colocadas as antiaéreas), eram atados às armas. Normalmente usavam as ZPU-4 de 14,5mm ou as duplas de 12,7mm.
Nessa época ainda não tinham chegado à Guiné os Grupos de mísseis.
No entanto, em 1972 (?) já havia conhecimento de que estavam a ser treinadas as equipas dos mísseis na URSS.

Eu vim a saber disso, porque sendo adjunto do Comandante de Grupo, na segunda comissão, ao arrumar uns arquivos, encontrei documentação de 1972 (?) com informação detalhada dos EUA sobre os mísseis Strela, bem como um completo estudo do seu envelope de acção. Também referiam ter informações fidedignas que o aparecimento dos mísseis SAM-7 estaria para breve no Teatro de Operações da Guiné e só mais tarde em Moçambique.
Na Guiné, nessa altura, já ninguém era apanhado de surpresa…
Mas mesmo assim, e como o outro elemento da parelha sobrevoava a zona em altitude, não viu a saída do míssil, eu fiquei convencido que se tinha aberto o painel das metralhadoras do lado esquerdo, pois na inspecção antes do voo notei que já apresentava alguma folga.

Isto deu origem a uma consulta à Força Aérea Alemã, que informou que apenas tinham conhecimento de um caso desses, a baixa velocidade, e que isso foi fatal para o piloto. A grande velocidade, o avião destruía-se em voo, não dando a mínima hipótese ao piloto.
Mesmo assim, devido a essa dúvida, foram inspeccionados todos os Fiat's e descobriu-se que a maior parte apresentavam fadiga de material na fixação das metralhadoras. Isso obrigou à respectiva reparação em todos os aviões. A causa dessa fadiga e de algumas fracturas terá que ficar confidencial… por enquanto!

Mais tarde, e já após o 25 de Abril, chegou uma informação proveniente do PAIGC, de que o meu avião (5409) tinha sido abatido por um grupo residente nessa área, e que até encontraram o meu capacete. As razões porque fui “abatido” dentro do "envelope" do míssil terão também que ficar pela confidencialidade…
No entanto, continuo convencido que não fui abatido pelo Strela, mas que tive uma violenta falha estrutural. Mas como me pareceu que era mais conveniente, para os então “poderes constituídos”, tratar o acidente como “abate”, em vez de falha estrutural, eu fui-me calando…

Alberto Cruz
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18742: FAP (108): Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18742: FAP (108): Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Caro Carlos.
Daqui te envio mais uma relíquia para publicação.

Grande abraço,
Mário Santos

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Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" e muitos deles mais tarde também pela Guiné

Esta foto foi retirada de um blogue de um destes Aviadores, infelizmente já desaparecido.
Como Especialista em F-86 e Fiat G-91, na BA12 em Bissalanca e mais tarde na BA5, em Monte Real, cruzei-me pessoalmente com muitos deles. No resto fui ajudado na identificação pelo Major PilAv Alberto Roxo Cruz e pelo Coronel PilAv Vítor Silva.
Como é obvio nesta foto não cabem todos os "Falcões" até porque como todos nós, eles são de idades, incorporações e cursos diferenciados.
A intenção quando publicamos a foto no nosso Blogue foi apenas de uma singela homenagem a estes homens com quem tive a honra de servir a nossa Pátria.
Para mim, independentemente da habilidade de cada um deles a voar, conta mais o humanismo, o espírito de justiça e o avaliar sensato das situações a resolver e que tornaram alguns, verdadeiros exemplos a seguir.

De acordo com o Coronel Vítor Silva, 6 morreram a voar, e muitos outros também já não se encontram entre nós devido à lei da vida.
Que descansem em Paz!

Em pé, da esquerda para a direita:
1º Vitor Silva, 2º F. Fernandes, 3º Rui Balacó, 4º L. Quintanilha, 5º Moura Pinto, 6º Soares Moura 7º C. Araújo, 8º Firmino Neves, 9 º Menezes, 10º E. Guerra, 11º António Abrantes.

Em baixo, da esquerda para a direita:
1º Luís António, 2º Bispo, 3º Amílcar Barbosa, 4º Luís Tuna, 5º M. André, 6º Calhau, 7º Mónica, 8º José Nico, 9º Costa Joaquim.

 Vista aérea da BA 12 - Bissalanca - 1970

 BA 12 - Bissalanca - Guiné

Equipa de Fiat's G91, Guiné, 1968
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18711: FAP (107): O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou… (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

terça-feira, 5 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18711: FAP (107): O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou… (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

FIAT's em Bissalanca


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, 1967/69), com data de 31 de Maio de 2018:

O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou…

Cumpri apenas uma comissão de serviço no Ultramar durante a minha carreira na Força Aérea Portuguesa. A comissão na Guiné, porém, sobrepôs-se a todas as outras acções e marcou-me indelevelmente para o resto da vida. A mim e certamente a todos os que, de algum modo, partilharam a mesma experiência. É de um destes acontecimentos que a lei da sorte permitiu, não só que vos esteja aqui hoje a relatar, mas que teria provavelmente mudado o destino de toda a guerra colonial se o pior naquele dia de Agosto de 1968 tivesse porventura acontecido. É deste evento que vos irei agora dar conta…

Naquele dia, cumpria-se a rotina habitual relativa à acção da Linha da Frente da Esquadra de Tigres “Os Fiat`s G-91 R4”. Isto é, as diferentes especialidades cumpriam escrupulosamente o seu trabalho com a dedicação e o sentido do dever a cumprir. Os mecânicos, (como eu) electricistas e pessoal de rádio procediam às inspecções de preparação para o voo, enquanto o pessoal de armamento cumpria o rearmamento dos aviões de acordo com o planificado pela chefia do Grupo Operacional. Eram oito as aeronaves a inspecionar, reabastecer e rearmar. Se bem me lembro duas parelhas com Foguetes e Drop tanques suplementares (para aumento de autonomia) e as restantes configuradas com bombas de 200 Kg (pylons internos) e 50 Kg (nos pylons externos) destinadas a bombardeamento de instalações AA inimigas que tinham entretanto sido detectadas e devidamente referidas no mapa..

 Bombas de 200Kg

Em tempos de Guerra, a azáfama de uma linha da frente é sempre frenética e bastante nervosa, uma vez que estamos permanentemente a lidar com material que causa destruição e eventualmente mata ou estropia seres humanos ou animais e arrasa com estruturas quer sejam urbanas ou rurais.

BA 12, 1968 - Assinando o Livro de Inspeção

Todos procuram fazer bem e depressa, o que nem sempre é uma boa mistura e em que por vezes apesar de toda nossa boa vontade não se consegue actuar em perfeita sintonia. No meio de todo aquele frenesim, alguém decidiu (porventura para poupar tempo) que as aeronaves podiam ser abastecidas de combustível ao mesmo tempo que algumas das aeronaves eram carregadas com as bombas e as restantes municiadas com rocketts e os respectivos pentes de balas 12,7mm colocadas nos compartimentos das metralhadoras.

Assim foi com naturalidade que vi chegar o autotanque de JP4 e o vi posicionar-se em frente aos aviões…

O meu camarada e amigo 1.º Cabo MMA, Luís Branco Tavares, após a passagem técnica de inspecção, dado ter sido um dos primeiros a terminar a vistoria, saltou de imediato para cima da asa direita pronto para o abastecimento… Deve ter algures vislumbrado um filme de terror… ou por qualquer outra razão impossível de explicar, deu um berro medonho (ele tinha e tem ainda hoje uma voz de tenor) e gritou a plenos pulmões: “Ó condutor, tira-me ESSA MERDA DAÍ”, o que o Soldado condutor auto cumpriu de imediato. Em boa altura o fez, já que passados minutos se ouviria um disparo que terá passado ao lado da traseira do camião cisterna e rebentado na terra desmatada entre a linha de delimitação da Base Aérea e um tabancal situado a uns quilómetros da zona.

Caros amigos, não creio haver um mínimo de exagero, se vos disser que se acaso o foguete tivesse acertado no camião cisterna, toda a Base teria sido incinerada. Não eram apenas as aeronaves mais próximas, seriam também todas as outras; os T-6, Hélis, DOs, Dakotas, hangar`s e Esquadras, etc., sem nunca esquecer que os depósitos onde eram fabricadas as bombas napalm estava ali bem pertinho a meia dúzia de metros!

A principal vantagem dos militares portugueses na guerra de 1961-74 foi, em meu entender, a superioridade aérea de que a FAP usufruiu durante a guerra. Foi uma vantagem militar sem paralelo do nosso lado e contra a qual durante muito tempo eles não tiveram qualquer forma eficaz de combater. Uma mais-valia que, no entendimento dos responsáveis militares e políticos, se deveu à aposta na intensificação da implementação da aviação militar em África. A actividade aérea, que até 1968 se desenrolou regularmente, só foi limitada pelos meios humanos e materiais ou pelas más condições atmosféricas, o que permitiu um contínuo apoio ao esforço de guerra, assumindo essencialmente três vertentes: transporte, informações e apoio de fogo.

 Bissalanca, 1968 - Fiat's

A partir de 1965 começaram a ser estabelecidos procedimentos para a coordenação entre meios aéreos e de superfície, sendo criados o Centro Conjunto de Apoio Aéreo, em Bissau, e a Secção Conjunta de Apoio Aéreo, em Nova Lamego. Estes organismos permitiram melhorar a comunicação e coordenação entre os três Ramos das Forças Armadas, a determinação de prioridades e a afectação racional dos meios aéreos. A guerra na Guiné teve características muito diferentes da guerra em Angola. A elevada organização da guerrilha e a forma como a sua luta se iniciou, através de acções de combate e não com massacres como em Angola, era reveladores das dificuldades que as FA iriam ter neste território. O principal movimento de libertação era o (PAIGC), que se preparou antecipadamente para a guerra através da formação de quadros, do recrutamento e doutrinação dos combatentes e do treino militar, passando três anos a analisar condições e a recolher apoios internacionais para a rebelião.

Por outro lado, o território guineense possuía um conjunto de características que favoreciam a actuação dos guerrilheiros. A extensa área fluvial, a linha costeira bastante recortada, os largos estuários e braços de mar que penetram profundamente no continente, exigiam operações militares com uma importante componente anfíbia, motivo pelo qual a Armada esteve tão presente neste teatro de operações.

O restante território tinha uma dimensão reduzida, cerca de um terço de Portugal, e era habitado na sua maioria por nativos de várias etnias, algumas estendendo-se para lá das fronteiras. Na Guiné, não só os factores históricos e a hostilidade da geografia e do clima tornaram difícil a actuação das FA, como também as independências da Guiné-Conakry (1958) e do Senegal (1960) tiveram um importante papel na condução da guerra. Estes dois países foram uma importante fonte de apoio aos guerrilheiros do PAIGC, proporcionando-lhe refúgio a Norte, Leste e Sul, onde puderam estabelecer as suas bases e desencadear acções militares na Guiné . O nível de organização do movimento e o armamento moderno de que dispunha (armas automáticas, morteiros, RPG’s, metralhadoras anti-aéreas) possibilitou aos guerrilheiros evoluírem de tal forma rápida que, em 1965, já tinham estendido a sua actuação a todo o território da Guiné. Para piorar a situação militar portuguesa, em termos de apoio aéreo, devido a pressões exercidas pelos EUA a Força Aérea Portuguesa foi obrigada a retirar da Guiné os oito F-86F, a principal arma de ataque aéreo de que dispunha.

F-86F 354 nos céus da Guiné

Desde a retirada destes, em finais de Outubro de 1964, e a chegada dos seus substitutos, os novos caças FIAT G-91 R4 adquiridos à Alemanha Ocidental, as missões de apoio aéreo próximo às forças no terreno foram garantidas pelas aeronaves T-6G. Este era um avião que estava longe de possuir o mesmo poder de fogo do anterior F-86F ou do posterior FIAT G-91 R4, o que terá contribuído para que no período de dezoito meses entre a saída de uns e a entrada ao serviço de outros, a guerrilha tenha reforçado a sua presença no terreno, especialmente na região a Sul. A evolução militar da guerrilha permitiu ao PAIGC, em 1966, anunciar publicamente o controlo de dois terços do território, afirmando que a Guiné era “um Estado em desenvolvimento, estando um terço do seu território a ser objecto de agressão imperialista". Por esta altura, o PAIGC começou a desencadear acções militares mais arrojadas, perto da guerra convencional, embora nestes casos ficasse muito exposto à acção aérea, especialmente nas áreas de menor densidade florestal. A inferioridade do inimigo na guerra aérea levou a que desde cedo procurassem anular esta vantagem das força armadas portuguesas, recorrendo para tal ao uso de artilharia anti-aérea.

Portanto, aquele foi um dia de sorte para todos nós, um dia em que as nossas vidas e própria guerra podia ter tido um final trágico na Guiné!

Mário Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18690: FAP (106): Fotos da montagem dos primeiros FIAT's G-91 R/4 destinados à Esquadra de Tigres de Bissalanca (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

terça-feira, 29 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18690: FAP (106): Fotos da montagem dos primeiros FIAT's G-91 R/4 destinados à Esquadra de Tigres de Bissalanca (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, 1967/69), com data de 23 de Maio de 2018:

Caros amigos e camaradas.
Estas são algumas das fotos de montagem em 1965 dos primeiros Fiat`s G-91 R/4 que iriam constituir a famosa “Esquadra de Tigres de Bissalanca” onde voaram alguns dos nossos Magnificos Tabanqueiros como José Fernandes Nico, António Martins Matos, e Miguel Pessoa.

Estas foram as primeiras cores onde em fundo cinzento escuro sobressairiam a Cabeça de Tigre e na entrada de ar do reactor uma Boca de Tubarão.
Sem ser uma máquina excepcional, equipada com um motor Bristol Siddeley Orpheus 803 turbojet, 22.2 kN (5,000 lbf) e com uma autonomia de apenas 1150 Km não era o ideal de que necessitávamos, tendo em conta que tínhamos de cobrir toda a área Guineense somente a partir de uma única Base em Bissalanca.
Aqui ficam as fotografias para vosso conhecimento. Envio em anexo.

Abraço
Mário Santos








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Nota do editor

Último poste da série de 18 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18648: FAP (105): 28 de julho de 1968, o dia em que o Fiat G-91, nº 5411, pilotado pelo ten cor Francisco Dias Costa Gomes, foi abatido sob os céus de Gandembel, por fogo de AA (Antiaérea)

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18673: Convívios (859): os cinco "piras" da Magnífica Tabanca da Linha: estrearam-se no passado dia 24... (Manuel Resende)


Vitor Manuel Alves Ferreira (Lourinhã): pertenceu  à CCAÇ 1566, os "Pilões" (Jabadá, Pelundo, Fulacunda e S. João, 1966/68) era 1º cabo mec auto e o fotógrafo da companhia)-


António Fernandes Costa  (Venda Nova, Amadora)


Luís Alegria  Barranhão (Damaia, Amadora)


Mário Santos (Faro), ex-1.º cabo especialista MMA da BA 12, 1967/69), membro nº 772 da Tabanca Grande



Carlos [Alberto de Jesus] Pinto (Reboleira, Amadora),  ex-1.º Cabo Condutor Apontador Daimler do Pel Rec Daimler 2208 (Mansabá e Mansoa, 1969/71). Faz parte da Tabanca Grande desde 12 de outubro de 2011.

Tabanca da Linha >  37º convívio > Algés, Oeiras > 24 de maio de 2018 > Restaurante "Caravela de Ouro"


Fotos (e legendas): © Manuel Resende (2018) . Todos os direitos reservados (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


1. O Manuel Resende‎, régulo de  A Magnífica da Tabanca da Linha deixou hoje  na página do grupo no Facebook a seguinte notícia:
 

Mais um convívio da Magnífica Tabanca da Linha se realizou hoje no restaurante "Caravela de Ouro" em que o prato foi arroz de garoupa em quantidade suficiente para os 55 mastigantes. Algumas baixas de última hora por motivos de saúde, mas em compensação tivemos 5 "periquitos", seguindo a tradição de aumento do nosso grupo.

A seguir as fotos dos "piras" e o link para verem as 63 fotos deste 37º convívio


2. Comentário do nosso editor LG:

Dos cinco "piras",  que se estrearam na Tabanca da Linha, dois pertencem à Tabanca Grande, o Carlos Pinto e o Mário Santos; os restantes, no caso de terem sido combatentes no TO da Guiné, ficam automaticamente convidados a sentarem-se à sombra do nosso poilão.  Ao Vitor Ferreira, meu conterrâneo e amigo, já fiz em tempos, pessoalmente, esse convite. 

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sexta-feira, 18 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18648: FAP (105): 28 de julho de 1968, o dia em que o Fiat G-91, nº 5411, pilotado pelo ten cor Francisco Dias Costa Gomes, foi abatido sob os céus de Gandembel, por fogo de AA (Antiaérea)


Guiné > Bissalanca > BA 12 > 1968 > O Fiat G-91 R4, nº 5411, uns dias antes de ser abatido (em 28 de julho de 1968). No cockpit, o cap piloto aviador José Nico

Foto (e legenda): © Mário Santos (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário de Mário Santos (ex-1.º  cabo especialista MMA da BA 12, 1967/69), membro nº 772 da Tabanca Grande, com data de 13 de maio último,  ao poste P18626 (*):

Caros amigos e camaradas: 

Apenas uma pequena correcção que se impõe: O 1º Fiat G-91 R4 foi o 5411, abatido por fogo de Anti-Aérea no dia 28 de Julho de 1968,  levando no cockpitt o nosso Comandante de Grupo Operacional Ten-Cor Costa Gomes, após ter dido atingido junto a Gandembel. Ejectou-se e fugiu por entre a mata até alcançar o aquartelamento de Gandembel. (**)

Tenho no meu espólio a foto dessa aeronave, pouco antes de ter sido atingida, uma vez que era eu que estava encarregado dela nesse longínquo dia de 1968.

Não a consigo colocar aqui, uma vez que esta zona apenas permite escritos em texto.


2. Mensagem, por email, do Mário Santos, nesse mesmo dia:

Meu caro Luís Graça:

Longe de mim qualquer idéia de despoletar polémicas no seio do grupo. A minha colaboração e espólio é apenas relativa ao conhecimento do meu tempo na BA12 entre 67/69 [, ou seja, antes do aparecimento do Strela, em 25 de março de 1973].

Tenho a valiosa e insubstituível cooperação do meu amigo contemporâneo e camarada de armas desses conturbados tempos, gen José Nico.

Este é o sumário do que se passou naquela longínqua manhã de 28 de Julho de 1968:

Como habitualmente naquele dia saltei da cama às 05.00 da matina; tocava-me estar na equipa de alerta e a "parelha" de Fiat G-91 deveria estar pronta para descolar às 06.00.

Éramos apenas dois, eu e o Luís Tavares; todos os restantes iniciariam a actividade normal cerca das 08.00 da manhã. Afinal não; a "parelha de alerta" naquele dia não descolou cedinho…

Só cerca das 11.00 chegaram o Ten Cor Costa Gomes, Comandante do Grupo Operacional  [nº 1201] e o Capitão Fernando Vasquez, nosso Comandante de Esquadra, para voarem respectivamente o 5411 e o 5416. 
Uma hora passada, chegou a noticia de que um deles não regressaria à Base. Abatido por fogo de Anti-Aérea. na zona de Gandembel. Naquela manhã, algo tinha corrido mal…

O Ten Cor [Francisco Dias] Costa Gomes, com o seu bigodinho à Clark Gable, era um homem sisudo, vaidoso, de poucas falas,  e que nunca sorria. Não era simpático. Mesmo quando interpelado, respondia sempre com monossílabos. Mas era um bom Piloto. Tinha já passado pela BA9-Luanda onde tinha sido “alcunhado” com um curioso epíteto que nunca entendi muito bem! Não o vou dizer, por respeito à sua memória. 
Já o Capitão Vasquez [, Fernando de Jesus Vasquez,] , era o seu oposto… simples, simpático, sorridente, comunicador e um excelente Piloto. Todos gostávamos dele. Um grande Oficial General felizmente ainda entre nós!

Envio em anexo [foto d]o 5411,  nesse dia  já com o J. Nico sentado no cockpit para mais uma missão de bombardeamento… não sei em que zona, nem penso que isso seja importante. Direi apenas que esta foto foi feita poucos dias do abate deste avião. (***)

Grande abraço,
Mário Santos,
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Notas do editor:

(***) Último poste da série > 18 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18647: FAP (104): Breve Historial: Operação Atlas (Mário Santos, 1.º Cabo Especialista MMA)